Teologia Sistemática - Augustus Hopkins Strong vol 1

July 7, 2017 | Autor: Diogenes Gimenes | Categoria: Teologia
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Descrição do Produto


332 Augustus Hopkins Strong
332 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 331
Teologia Sistemática 331
334 Augustus Hopkins Strong
334 Augustus Hopkins Strong

Teologia Sistemática 333
Teologia Sistemática 333
438 Augustus Hopkins Strong
438 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 275
Teologia Sistemática 275
276 Augustus Hopkins Strong
276 Augustus Hopkins Strong

Teologia Sistemática 161
Teologia Sistemática 161
# Augustus Hopkins Strong
# Augustus Hopkins Strong

Teologia Sistemática 162
Teologia Sistemática 162
214 Augustus Hopkins Strong
214 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 213
Teologia Sistemática 213
Teologia Sistemática 439
Teologia Sistemática 439

442 Augustus Hopkins Strong
442 Augustus Hopkins Strong
536 Augustus Hopkins Strong
536 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 535
Teologia Sistemática 535
562 Augustus Hopkins Strong
562 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 563
Teologia Sistemática 563
664 Augustus Hopkins Strong
664 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 665
Teologia Sistemática 665
Teologia Sistemática 513
Teologia Sistemática 513
514 Augustus Hopkins Strong
514 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 461
Teologia Sistemática 461
Teologia Sistemática 441
Teologia Sistemática 441
Teolooia Sistemática 440
Teolooia Sistemática 440
456 Augustus Hopkins Strong
456 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 455
Teologia Sistemática 455

Teologia Sistemática #
Teologia Sistemática #
160 Augustus Hopkins Strong
160 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 137
Teologia Sistemática 137
136 Augustus Hopkins Strong
136 Augustus Hopkins Strong
14 Augustus Hopkins Strong
14 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 13
Teologia Sistemática 13

Teologia Sistemática 17
Teologia Sistemática 17
15 Augustus Hopkins Strong
15 Augustus Hopkins Strong
48 Augustus Hopkins Strong
48 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 9
Teologia Sistemática 9
8 Augustus Hopkins Strong
8 Augustus Hopkins Strong





Copyright © 2003 por Editora Hagnos
Copyright © 2003 por Editora Hagnos
Copyright © 2003 por Editora Hagnos
Copyright © 2003 por Editora Hagnos


Teologia Sistemática 49
Teologia Sistemática 49
66 Augustus Hopkins Strong
66 Augustus Hopkins Strong

124 Augustus Hopkins Strong
124 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 123
Teologia Sistemática 123
128 Augustus Hopkins Strong
128 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 127
Teologia Sistemática 127

Teologia Sistemática 111
Teologia Sistemática 111
81 Augustus Hopkins Strong
81 Augustus Hopkins Strong
Teologia Sistemática 65
Teologia Sistemática 65
80 Augustus Hopkins Strong
80 Augustus Hopkins Strong
110 Augustus Hopkins Strong
110 Augustus Hopkins Strong

Teologia Sistemática #
Teologia Sistemática #
Teologia Sistemática 79
Teologia Sistemática 79
Augustus Hopkins
STRONG
Prefácio de Russell Shedd



AUGUSTUS HOPKINS STRONG
Nasceu em Nova York (Rochester), E.U.A., Em 1836. Homem de grande vigor intelectual, literato, filósofo e teólogo, Strong cresceu e se formou dentro da Igreja Batista. Tal perfil se faz presente em sua obra, não de forma limitante, mas criativa e atenta às mudanças que fervilhavam em sua época "fin-de-siécle". Sua obra teológica, prezando a reflexão teológica qualificada e aprofundada mais que a quantidade, marcou toda uma geração de estudantes do início do século passado, inclusive no Brasil. Dentre suas obras, desponta a Systematic Theology, sua opus magnum.
T E O L O G I A
SISTEMATICA
Augustus Hopkins
STRONG
Prefácio de Russell Shedd
A Doutrina de Deus
Vol.
I
HAGNOS
Supervisão Editorial
Luiz Henrique Alves da Silva Rogério de Lima Campos Silvestre M. de Lima Silvia Cappelletti
Tradução
Augusto Victorino
Revisão
Cláudio J. A. Rodrigues
Digitação de textos
Regina de Moura Nogueira
Capa
Rogério A. de Oliveira
Layout e Arte Final
Comp System
Diagramação
Pr. Regi no da Silva Noqueira Cícero J. da Silva
Coordenador de Produção
Mauro W. Tcrrcngui
Ia edição - março 2003 - 3000 exemplares
Impressão e acabamento
Imprensa da Fé
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP) (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Strong, Augustus Hopkins
Teologia sistemática/ Augustus Hopkins Strong ; prefácio de Russcll Shedd ; [tradução Augusto Victorino].
- São Paulo : Hagnos, 2003.
Título original: Systcmatic theology Conteúdo: V. 1. A doutrina de Deus
1. Batistas - Doutrinas 2. Teologia doutrinai I. Shcdd, Russell. II. Título.
ISBN 85-89320-09-X
03-0919 CDD-230
índices para catálogo sistemático:
1. Teologia sistemática : Religião 230
Todos os direitos desta edição reservados à EDITORA HAGNOS Rua Bclarmino Cardoso de Andrade, 108 São Paulo-SP- 04809-270 Tcl/Fax: (xxl 1) 5666 1969 e-mail: [email protected] www.hagnos.com.br







PREFÁCIO
Foi uma grande surpresa saber que a Teologia Sistemática de Strong, aquela obra monumental de pensamento teológico da minha juventude na Escola Graduada de Wheaton, bem como no Seminário da Fé, estava sendo traduzida e editada em português. Confesso que não tenho lido muito desta teologia, tão conhecida no mundo evangélico durante mais de cem anos. Mas descobri que é uma vasta fonte de informação teológica e bíblica. Não é necessário concordar com tudo que Strong escreveu para aproveitar a impressionante coletânea de ensinamentos e textos que o incansável teólogo ajuntou. Augustus Strong foi eleito presidente e professor de Teologia Bíblica do Seminário Teológico de Rochester no estado de Nova Iorque em 1872. Ocupou estes dois cargos durante 40 anos, após pastorear a Primeira Igreja Batista de Cleveland, estado de Ohio, por sete anos. Não abandonou o espírito pastoral na "torre de marfim" do seminário.
A Teologia Sistemática de Strong (primeira edição, 1886) encontra o seu centro em Cristo. Em suas palavras, "A pessoa de Cristo foi o fio da meada que segui; sua divindade e sua expiação eram os dois focos da grande elipse" (citado por W. R. Estep, Jr. na Enciclopédia Histórico Teológica da Igreja Cristã, ed. W. A. Elwell, Ed.Vida Nova, 1990, Vol. III, p. 420).O leitor não precisa ler os dois volumes para perceber a riqueza de apoio bíblico e teologia histórica. Entre os teólogos mais destacados dos Batistas do Sul dos Estados Unidos, E. Y. Mullins e W. T. Conner receberam forte influência de Strong Espero que o aparecimento desta Teologia Sistemática seja bem recebido no Brasil. Deve ser um referencial para os que procuram uma âncora para sua fé, mesmo que tenha sido escrita antes dos teólogos liberais tais como Paul Tillich e Rudolf Bultmann.
A Deus toda a glória!
Pr. Dr. Russell Shedd



OS EDITORES
PREFÁCIO DO AUTOR
A presente obra é uma revisão e ampliação da minha Systematic Theology, primeiramente publicada em 1886. Da obra original foram impressas sete edições, cada uma das quais incorporando sucessivas correções e supostos aprimoramentos. Durante os vinte anos que mediaram entre a primeira publicação, reuni muito material novo, que agora ofereço ao leitor. Meu ponto de vista filosófico e crítico nesse período também sofreu alguma mudança. Conquanto ainda eu sustente as doutrinas antigas, interpreto-as diferentemente e exponho-as com maior clareza, porque a mim me parece ter chegado a uma verdade fundamental que lança novas luzes sobre todas elas. Esta verdade tentei estabelecer em meu livro intitulado Christ in Creation, e delas faço referências ao leitor para mais informações.
Que Cristo é aquele único Revelador de Deus, na natureza, na humanidade, na história, na ciência, na Escritura, a meu juízo, a chave da teologia. Este ponto de vista implica uma concepção monística e idealista do mundo, juntamente com uma idéia evolutiva quanto à sua origem e progresso. Mas é o próprio antídoto do panteísmo que reconhece a evolução como único método do Cristo transcendente e pessoal, que é tudo em todos e que faz o universo teológico e moral a partir do centro da sua circunferência e desde o seu começo até agora.
Nem a evolução, nem a alta crítica tem algo de aterrador para aquele que as considera como parte do processo criador e educador da parte de Cristo. O mesmo Cristo em quem estão ocultos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento fornece todas as salvaguardas e limitações necessárias. Tão somente porque Cristo tem sido esquecido é que a natureza e a lei tem sido personificada, e a história tem sido considerada como um desenvolvimento sem propósito, que se tem feito referência ao judaísmo como tendo uma origem simplesmente humana, que se tem pensado que Paulo tirou a igreja do seu próprio curso mesmo antes de iniciar o seu próprio curso, que a superstição e ilusão vieram a parecer o único fundamento do sacrifício dos mártires e o triunfo das missões modernas. De modo nenhum creio numa evolução irracional e ateísta como esta. Contrariamente, creio naquele em quem consistem todas as coisas,
que está com o seu povo até o fim do mundo e prometeu conduzi-lo em toda a verdade.
A filosofia e a ciência são boas servas de Cristo, mas pobres guias quando rejeitam o Filho de Deus. Quando chego ao meu septuagésimo ano de vida e, no meu aniversário escrevo estas palavras, sou grato por aquela experiência da união com Cristo que me capacitou a ver na ciência e na filosofia o ensino do meu Senhor. Porém esta mesma experiência pessoal fez-me mais consciente do ensino de Cristo na Escritura, e fez-me reconhecer em Paulo e João uma verdade mais profunda do que a que foi descoberta por quaisquer escritores, uma verdade com relação ao pecado e a sua expiação e que satisfaz os mais profundos anseios da minha natureza e que por si mesma é evidente e divina.
Preocupam-me algumas tendências teológicas dos nossos dias, porque creio que elas são falsas tanto na ciência como na religião. Como homens que se sentem pecadores perdidos e que uma vez receberam o perdão do seu Senhor e Salvador crucificado podem daí em diante rebaixar seus atributos, negar a sua divindade e expiação, arrancar da sua fronte a coroa do milagre e soberania, relegá-lo ao lugar de um mestre simplesmente moral que nos influencia apenas como o fez Sócrates com palavras proferidas através dos tempos, passa pela minha compreensão. Eis aqui o meu teste de ortodoxia: Dirigimos nossas orações a Jesus? Invocamos o nome de Cristo como Estêvão e toda a igreja primitiva? O nosso Senhor vivo é onipresente, onisciente, onipotente? Ele é divino só no sentido em que nós também o somos, ou é ele o Filho unigênito, Deus manifesto em carne, em quem habita corporalmente toda a plenitude da divindade? Que pensais vós de Cristo? esta ainda é a pergunta crítica, e a ninguém que, diante da evidência que ele nos forneceu, se não pode responder corretamente, assiste o direito de chamar-se cristão.
Sob a influência de RitschI e seu relativismo kantiano, muitos dos nossos mestres e pregadores têm deslizado para negação prática da divindade de Cristo e da sua expiação. Parece que estamos à beira do precipício de uma repetida falha unitária, que esfacelará as igrejas e compelirá a cisões, de maneira pior que a de Channing e Ware há um século. Os cristãos americanos se recuperaram daquele desastre somente ao afirmar vigorosamente a autoridade de Cristo e a inspiração das Escrituras. Necessitamos de uma visão do Salvador como a que Paulo teve no caminho de Damasco e João na ilha de Patmos, para nos convencermos de que Jesus está acima do espaço e do tempo, que a sua existência antedata a criação, que ele conduziu a marcha da história dos hebreus, que ele nasceu de uma virgem, sofreu na cruz, levantou-se dentre os mortos, e agora vive para sempre, é Senhor do universo, o único Deus com quem nos relacionamos, nosso Salvador aqui e Juiz no futuro. Sem haver avivamento nesta fé nossas igrejas se tomarão secularizadas, a missão morrerá, e o castiçal será removido do seu lugar como ocorreu às sete igrejas da Ásia e como tem sido com as igrejas da Nova Inglaterra, que se apostataram.
Imprimo esta edição revista e ampliada da minha "Systematic Theology", na esperança de que a sua publicação possa fazer algo para refrear esta veloz maré que avança, e confirmar a fé nos eleitos de Deus. Não tenho dúvida de que os cristãos, em sua grande maioria, ainda mantêm a fé que, de uma vez por todas foi entregue aos santos e que eles, cedo ou tarde, hão de separar-se daqueles que negam o Senhor que os comprou. Quando o inimigo entra como um dilúvio, o Espírito do Senhor levanta o estandarte contra ele. É preciso que eu faça a minha parte levantando tal estandarte. E preciso que eu conduza outros a reconhecer, como eu, a despeito das opiniões arrogantes da moderna infidelidade, a minha firme crença, reforçada somente pela experiência e reflexão de meio século nas velhas doutrinas da santidade como atributo fundamental de Deus, de uma transgressão e pecado de toda a raça humana, na preparação divina da história hebréia da redenção do homem, na divindade, na preexistência, nascimento virginal, expiação vicária e ressurreição corporal do nosso Senhor Jesus Cristo, e na sua futura vinda para julgar os vivos e os mortos. Eu creio que estas são verdades da ciência assim como da revelação; que ainda se verá que o sobrenatural é mais verdadeiramente natural; e que não o teólogo de mente aberta, mas o cientista de mente estreita será obrigado a esconder a sua cabeça na vinda de Cristo.
O presente volume, ao tratar do Monismo Ético, da Inspiração, dos Atributos de Deus e da Trindade, contém um antídoto para a mais falsa doutrina que agora ameaça a segurança da igreja. Desejo agora chamar especialmente a atenção para o assunto Perfeição e os Atributos por ela envolvidos, porque eu creio que a recente fusão da Santidade com o Amor e a negação prática de que essa Retidão é fundamental na natureza de Deus são responsáveis pelos pontos de vista utilitários da lei e os pontos de vista superficiais sobre o pecado que agora prevalecem em alguns sistemas de teologia. Não pode haver nenhuma apropriada doutrina da retribuição, quando se recusa a sua preeminência. O amor deve ter uma norma ou padrão, e isto só pode ser encontrado na Santidade. A velha convicção do pecado e do senso de culpa que conduz o pecador convicto à cruz são inseparáveis de uma firme crença no atributo de Deus logicamente auto-afirmante, anterior ao auto-comunicante e condicionado a ele. A teologia da nossa época carece de um novo ponto de vista sobre o Justo. Tal ponto de vista esclarecerá que deve haver uma reconciliação com Deus antes que o homem seja salvo, e que a consciência humana seja apaziguada só na condição de que se faça uma propiciação à Justiça divina. Neste volume eu proponho o que considero a verdadeira Doutrina de Deus, porque nela deve basear-se tudo o que se segue nos volumes sobre a Doutrina do Homem e a da Salvação.
A presença universal de Cristo, luz que ilumina a todo homem tanto em terras pagãs como cristãs, para dirigir ou governar todos os movimentos da mente humana, dá-me a confiança de que os recentes ataques à fé cristã fracassarão no seu propósito. Torna-se evidente, por fim, que não só atacam-se as obras primorosas, mas até mesmo a cidadela. Pede-se que se abandone toda a crença na revelação especial. Dizem que Jesus Cristo veio em carne exatamente como qualquer um de nós, e ele era antes de Abraão senão só no mesmo sentido que nós somos. A experiência cristã sabe como caraterizar tal doutrina tão logo se estabelece de um modo claro. E a nova teologia entrará em voga possibilitando que até mesmo crentes comuns reconheçam a heresia destrui- dora de almas mesmo sob a máscara de professa ortodoxia.
Não faço apologia alguma do elemento homilético do meu livro. Para ser verdadeira ou útil, a teologia deve ser uma paixão. Pectus est quocl teologum facit, e nenhum zombador que apregoa a "Teologia Peitoral" rae impedirá de sustentar que os olhos do coração devem ser iluminados para perceber a verdade de Deus e qiie, para conhecer a verdade, é necessário praticá-la. A teologia é uma ciência cujo cultivo pode ser bem sucedido somente em conexão com sua aplicação prática. Por isso, em cada discussão dos seus princípios devo assinalar suas relações com a experiência cristã, e a sua força para despertar emoções cristãs e levar a decisões cristãs. Teologia abstrata, na verdade, não é científica. Só é científica a teologia que traz o estudioso aos pés de Cristo. Eu anseio pelo dia em que, em nome de Jesus, todo joelho se dobre. Creio que, se cada um servir a Cristo, o Pai o honrará, e ele honrará o Pai. Eu mesmo não me orgulharia de crer tão pouco, mas sim de crer muito. Fé é a medida com que Deus avalia o homem. Por que haveria de duvidar que Deus falou aos pais pelos profetas? Por que haveria de pensar que é incrível Deus ressuscitar os mortos? O que é impossível aos homens é possível a Deus. Quando o Filho do homem vier, porventura achará fé na terra? Queira Deus que encontre fé em nós, que professamos ser seus seguidores. Na convicção de que as trevas presentes são apenas temporárias e que serão banidas por um glorioso alvorecer, ofereço ao público esta nova edição da minha "Teologia" rogando a Deus para que qualquer que seja a boa semente que frutifique e qualquer que seja a planta que o Pai não plantou que seja arrancada.
ROCHESTER THEOLOGICAL SEMINARY ROCHESTER, N. Y., 3 de agosto de 1906.
SUMÁRIO
Parte I - PROLEGÔMENOS
Capítulo I - IDÉIA DE TEOLOGIA 21
Definição de Teologia 21
Alvo da Teologia 22
Possibilidade da Teologia 23
Na existência de um Deus que se relaciona com o universo 23
Na capacidade humana de conhecer Deus 26
Na revelação do próprio Deus 35
Necessidade da Teologia 41
No instinto organizador da mente humana 41
Na relação da verdade sistemática com o desenvolvimento do caráter 42
Na importância dos pontos de vista definidos e justos da doutrina cristã
para o pregador 43
Na íntima conexão entre a doutrina correta e o firme e agressivo poder
da igreja 44
Nas injunções diretas e indiretas da Escritura 45
Relação da Teologia com a Religião 46
Derivação 46
Falsas Concepções 47
Idéia Essencial 49
Inferências 50
Capítulo II - MATERIAL DA TEOLOGIA 53
Fontes da Teologia 53
A Escritura e a natureza 54
A Escritura e o Racionalismo 59
A Escritura e o Misticismo 61
A Escritura e o Romanismo 64
Limitações da Teologia 66
Na finitude do entendimento humano 66
No estado imperfeito da ciência natural e metafísica 67
Na inadequação da língua 67
No nosso conhecimento incompleto das Escrituras 68
No silêncio da revelação escrita 68
Na falta de discernimento espiritual causada pelo pecado 69
III. Relações do Material com o Progresso da Teologia 69
É impossível um sistema perfeito de teologia 69
Apesar de tudo isso a teologia é progressiva 70
Capítulo III - MÉTODO DA TEOLOGIA 72
Requisitos para o Estudo da Teologia 72
Uma mente disciplinada 72
Um hábito mental intuitivo distinto de um outro simplesmente lógico 73
Conhecimento das ciências física, mental e moral 73
Conhecimento das línguas originais da Bíblia 74
Afeição santa para com Deus 75
A influência iluminadora do Espírito Santo 75
Divisões da Teologia 76
História da Teologia Sistemática 80
Ordem de Tratamento na Teologia Sistemática 88
Vários métodos de ordenação dos tópicos de um sistema teológico 88
O método sintético 89
Parte II - A EXISTÊNCIA DE DEUS
Capítulo I - ORIGEM DA NOSSA IDÉIA DA EXISTÊNCIA DE DEUS 93
Primeiras Verdades em Geral 95
Sua natureza 95
Seus critérios 97
A Existência de Deus, uma Primeira Verdade 98
Outras Supostas Fontes da Nossa Idéia 106
Conteúdo desta Intuição 113
Capítulo II - EVIDÊNCIAS CORROBORATIVAS DA EXISTÊNCIA DE
DEUS 118
Argumento Cosmológico 120
Defeitos do Argumento Cosmológico 121
Argumento Teleológico 123
Mais explicações 124
Defeitos do Argumento Teleológico 128
Argumento Antropológico 131
Argumento Ontológico 138
De Samuel Clarke 138
De Descartes 139
De Anselmo 139
Capítulo III - EXPLICAÇÕES ERRÔNEAS E CONCLUSÃO 144
Materialismo 144
Idealismo Materialista 151
Panteísmo Idealista 158
Monismo Ético 165
Parte III - AS ESCRITURAS, UMA REVELAÇÃO DA PARTE DE DEUS
Capítulo I - CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES 175
Razões a Priori para Esperar uma Revelação da Parte de Deus 175
Necessidades da natureza do homem 175
Pressuposição de um suprimento 177
As Marcas da Revelação que o Homem pode Esperar 179
Quanto à sua substância 179
Quanto ao seu método 180
Quanto à sua certificação 183
Os Milagres, um Atestado da Revelação Divina 183
Definição de Milagre 183
Possibilidade do Milagre 189
Probabilidade dos Milagres 192
Testemunho necessário para se provar um milagre 197
Força Evidenciai dos Milagres 198
Falsos Milagres 203
Profecia Atestando uma Revelação Divina 206
Definição 206
Relação da profecia com os milagres 208
Requisitos na profecia, considerados como Evidência da Revelação 208
Caraterísticas Gerais da Profecia nas Escrituras 209
Profecia messiânica em geral 210
Profecias especiais pronunciadas por Cristo 210
Sobre o duplo sentido da Profecia 212
Propósito da Profecia - até onde não se cumpriu 214
Poder Evidenciai da Profecia - quando cumprida 216
Princípios de Evidência Histórica Aplicáveis à Prova de uma Revelação
Divina 217
Quanto à evidência documentária 217
Quanto ao testemunho em geral 218
Caítulo II - PROVAS POSITIVAS DE QUE AS ESCRITURAS SÃO A
REVELAÇÃO DIVINA 222
Genuinidade dos Livros do Novo Testamento 223
Genuinidade dos Livros do Velho Testamento 250
Credibilidade dos Escritores da Bíblia 259
O Caráter Sobrenatural do Ensino da Escritura 262
O ensino da Escritura em geral 262
Sistema Moral do Novo Testamento 266
A pessoa e o caráter de Cristo 279
O testemunho do próprio Cristo 282
Resultados Históricos da Propagação da Doutrina da Escritura 285
Capítulo III - INSPIRAÇÃO NAS ESCRITURAS 293
Definição de Inspiração 293
Prova da Inspiração 296
Teorias Sobre a Inspiração 302
Teoria da Intuição 302
Teoria da Iluminação 305
Teoria do Ditado 311
Teoria da Dinâmica 314
União dos Elementos Divino e Humano na Inspiração 316
Objeções à Doutrina da Inspiração 330
Erros em matéria de Ciência 331
Erros em matéria de História 336
Erros no campo da Moral 341
Erros de Raciocínio 345
Erros na citação ou interpretação do Velho Testamento 347
Erros na Profecia 349
Alguns livros não merecem um lugar na Escritura inspirada 351
Porções dos livros da Escritura escritos por outras pessoas que não são
aquelas a quem são atribuídos 353
Narrativas Céticas ou Fictícias 356
Reconhecimento da não inspiração de mestres da Escritura e de seus
escritos 359
Parte IV - NATUREZA, DECRETOS E OBRAS DE DEUS
Capítulo I - ATRIBUTOS DE DEUS 363
Definição do Termo Atributos 364
Relação dos Atributos Divinos com a Essência Divina 364
Os atributos têm uma existência objetiva 364
Os atributos são inerentes à essência divina 366
Os atributos pertencem à essência divina como tal 367
Os atributos manifestam a essência divina 367
Métodos para Determinar os Atributos Divinos 368
Método racional 368
Método bíblico 369
Classificação dos Atributos 369
Atributos Absolutos ou Imanentes 372
Primeira divisão - Espiritualidade e os atributos envolvidos por ela 372
Vida 374
Pessoalidade 376
Segunda Divisão - Infinitude e os atributos envolvidos por ela 378
Terceira Divisão - Perfeição e os atributos por ela envolvidos 388
Verdade 388
Amor 391
Santidade 399
Atributos Relativos ou Transitivos 410
Primeira Divisão - Atributos relacionados com Tempo e Espaço 410
Eternidade 410
Imensidade 415
Segunda Divisão - Atributos relacionados com a Criação 417
Onipresença 417
Onisciência 421
Onipotência 427
Terceira Divisão - Atributos relacionados com os seres morais 430
Veracidade e Fidelidade ou Verdade transitiva 430
Misericórdia e Bondade ou Amor Transitivo 431
Justiça e Retidão, ou Santidade Transitiva 433
Nível e Relações dos Vários Atributos 440
Santidade, atributo fundamental de Deus 441
A santidade de Deus, a base da obrigação moral 445
Capítulo II - DOUTRINA DA TRINDADE 452
Na Escritura há Três que são Reconhecidos como Deus 454
Provas do Novo Testamento 454
Indicações do Velho Testamento 472
Estes três são Descritos na Escritura de tal Modo que Somos Compelidos
a Concebê-los como Pessoas Distintas 479
O Pai e o Filho são pessoas distintas uma da outra 479
O Pai e o Filho são pessoas distintas do Espírito 480
O Espírito Santo é uma pessoa 480
Esta Tripessoalidade da Natureza Divina não é Simplesmente Econômica e
Temporal, mas Imancnte e Eterna 485
Prova da EscriLura dc que estas distinções de pessoalidade são eternas 485
Erros refutados pelas passagens anteriores 486
Esta Tripessoalidade não é Triteísmo; pois, Conquanto Haja Três Pessoas,
há Apenas Uma Essência 491
As Três Pessoas, Pai, Filho, e Espírito Santo, são Iguais 496
Estes títulos pertencem às Pessoas 496
Sentido qualificado destes títulos 497
Geração e processos consistentes com a igualdade 504
Inescrutável, Embora não Autocontraditória, esta Doutrina Fornece a
Chave para Todas as Outras Doutrinas 509
O modo desta existência triúna c inescrutável 509
A Doutrina da Trindade não é autocontraditória 512
A doutrina da Trindade tem importantes relações com outras doutrinas .... 514
Capítulo III - OS DECRETOS DE DEUS 522
Definição de Decretos 522
Prova da Doutrina dos Decretos 525
Da Escritura 525
Da Razão 527
Objeções à Doutrina dos Decretos 532
Que eles são inconsistentes com a livre atuação do homem 532
Que eles afastam todo o motivo do exercício humano 536
Que eles fazem Deus o autor do pecado 539
Notas Finais 544
Empregos práticos da doutrina dos decretos 544
O verdadeiro método da pregação da doutrina 545
Capítulo IV - AS OBRAS DE DEUS; OU A EXECUÇÃO DOS DECRETOS . 547 SEÇÃO I - CRIAÇÃO
Definição de Criação 547
Prova da Doutrina da Criação 551
Declarações diretas da Escritura 551
Evidência indireta da Escritura 556
Teorias que se opõem à Criação 556
Dualismo 556
Emanação 564
Criação a partir da eternidade 568
Geração espontânea 573
O Relato Mosaico da Criação 575
Interpretação adequada 579
O Fim de Deus na Criação 583
O testemunho da Escritura 583
O testemunho da razão 585
Relação da Doutrina da Criação com as outras Doutrinas 590
Com a santidade e a benevolência de Deus 590
Com sabedoria e livre vontade de Deus 592
Com Cristo como revelador de Deus 594
Com a Providência e a Redenção 597
Com a observância do Sábado 598
SEÇÃO II - PRESERVAÇÃO
Definição de Preservação 602
Prova da Doutrina da Preservação 603
Da Escritura 603
Da Razão 604
Teorias que virtualmente negam a doutrina da Preservação 607
Deísmo 607
Criação contínua 609
Notas sobre a Parceria Divina 612
SEÇÃO III - PROVIDÊNCIA
Definição de Providência 614
Prova da Doutrina da Providência 615
Prova escriturística 615
Prova racional 622
Teorias opostas à Doutrina da Providência 625
Fatalismo 625
Casualismo 626
Teoria de uma providência simplesmente geral 627
Relações da Doutrina da Providência 632
Com os milagres e com as obras da graça 632
Com a oração e a resposta 633
Com a atividade cristã 642
Com os maus atos dos agentes livres 646
SEÇÃO IV - OS ANJOS BONS E OS MAUS
Afirmações e Sugestões da Escritura 650
Quanto à natureza e atributos dos anjos 650
Quanto ao seu número e organização 655
Quanto ao seu caráter moral 658
Quanto às suas funções 660
Objeções à Doutrina dos Anjos 673
À doutrina dos anjos em geral 673
À doutrina dós anjos maus em particular 674
Empregos práticos da Doutrina dos Anjos 677
Emprego da doutrina dos anjos bons 677
Empregos da doutrina dos anjos maus 678
Parte I PROLEGÔMENOS
Capítulo I IDÉIA DE TEOLOGIA
DEFINIÇÃO DE TEOLOGIA
Teologia é a ciência de Deus e das relações entre Deus e o universo.
Embora a palavra "teologia" seja empregada às vezes em escritos dogmáticos para designar um simples departamento da ciência que trata da natureza e atributos divinos, o uso prevalecente, desde Abelardo (1079-1142 A.D.), que intitulou seu tratado geral "Theologia Christiana", o qual abrange sob este termo todo o acervo da doutrina cristã. Por isso, a teologia trata, não só de Deus, mas das relações entre Deus e o universo, motivo por que falamos da Criação, da Providência e da Redenção.
Os Pais chamam o Evangelista João de "o teólogo", porque ele trata mais plenamente do relacionamento interno das pessoas da Trindade. Gregório Nazianzeno (328) recebeu esta designação porque defendia a divindade de Cristo contra os arianos. Para um exemplo moderno deste emprego do termo "teologia" no sentido restrito, veja o título do primeiro volume do Dr. Hodge: "Systematic Theology, Vol. I: Teologia/'. Mas teologia não é somente "a ciência de Deus", nem mesmo "a ciência de Deus e do homem". Ela também dá conta das relações entre Deus e o universo.
Se o universo fosse Deus, a teologia seria a única ciência. Visto que o universo é apenas uma manifestação de Deus e distingue-se dele, há ciências da natureza e da mente. A teologia é a "ciência das ciências", não no sentido de incluir todas estas, mas no de empregar os seus resultados e mostrar a sua base subjacente; (ver Wardlaw, Theology, 1.1,2). A ciência física não é uma parte da teologia. Somente como físico, Humboldt não precisava mencionar o nome de Deus em seu Cosmos (contudo vejamos Cosmos, 2.413, onde ele diz: "O Salmo 104 apresenta uma imagem do cosmos todo"). O Bispo de Carlisle: "A ciência é atéia, mas nem por isso pode ser ateísta".
Só quando consideramos as relações das coisas finitas com Deus é que o estudo delas fornece material para a teologia. A antropologia é uma parte da teologia porque a natureza do homem é obra de Deus e porque a forma de Deus tratar o homem lança luz sobre o caráter de Deus. Deus é conhecido através das suas obras e das suas atividades. Por isso a teologia dá conta destas obras e atividades na medida que elas acompanham o nosso conhecimento. Todas outras ciências exigem a teologia para sua explicação completa.
Proudhon: "Se você se aprofundar muito na política, esteja certo de entrar na teologia".
ALVO DA TEOLOGIA
O alvo da teologia é a certificação dos fatos que dizem respeito a Deus e às relações entre Deus e o universo, e a apresentação de tais fatos em sua unidade racional como partes conexas de um formulado e orgânico sistema de verdade.
Ao definirmos a teologia como ciência, indicamos o seu alvo. A ciência não cria; descobre. A teologia responde a esta descrição da ciência. Descobre fatos e relações, mas não os cria. Fisher, Nature and Method of Revelation,
141 - "Schiller, referindo-se ao ardor da fé em Colombo, diz que, se o grande descobridor não tivesse achado um continente, ele o teria criado. Mas a fé não é criativa. Se Colombo não tivesse achado a terra - não teria havido uma resposta objetiva da sua crença - sua fé teria sido mera fantasia". Porque a teologia trata de fatos objetivos, recusamo-nos a defini-la como "ciência da religião"; versus Am. Theol. Rev., 1850.101-126, e Thornwell, Theology, 1.139. Tanto os fatos como as relações de que a teologia trata têm uma existência independente dos processos mentais subjetivos do teólogo.
Ciência não é apenas observação, registro, verificação e formulação de fatos objetivos; é também o reconhecimento e explicação das relações entre estes fatos e a síntese tanto dos fatos como dos princípios racionais que os unem em um sistema abrangente, corretamente proporcional e orgânico. Tijolos e madeiramento espalhados não são uma casa; braços, pernas, cabeças e troncos separados numa sala de dissecção não são homens vivos; e fatos isolados não constituem ciência. Ciência = fatos + relações; Whewell, Hist. Inductive Sciences, I, Introd., 43 - "Pode haver fatos sem ciência, como no conhecimento do cavouqueiro; pode haver pensamento sem ciência, como na antiga filosofia grega". A. MacDonald: "O método a priori relaciona-se com o método a posteríoricomo as velas com o mastro de uma embarcação: quanto melhor é a filosofia, maior é a providência de um número suficiente de fatos; doutra forma ocorre o perigo de transtornar o empreendimento".
Presidente Woodrow Wilson: "A enfática injunção da nossa era diz aos historiadores: 'dai-nos os fatos'. ... Mas os fatos em si não constituem a verdade. A verdade não é concreta; é abstrata. É só a idéia, a revelação correta, do sentido que as coisas têm. Ela só é evocada pela distribuição e ordenação dos fatos que sugerem o sentido". Dove, Logic of the Christian Faith, 14 - "Perseguir a ciência é perseguir as relações". Everett, Science of Thought, 3
"Logia" (p.ex. na palavra "teologia"), de Xóyoq, = palavra + razão, expressão + pensamento, fato + idéia; cf. Jo. 1.1 - "No princípio era o Verbo".
Como a teologia trata de fatos objetivos e suas relações, assim a disposição destes fatos não é opcional, mas determinada pela natureza da matéria de que ela trata. A verdadeira teologia repensa os pensamentos de Deus e os põe na disposição de Deus, como os construtores do templo de Salomão
tomaram as pedras já lavradas e as fixaram nos lugares para os quais o arquiteto as havia designado; Reginald Heber: "Não caiu nenhum martelo, nenhum machado tiniu; Como a longa palmeira, surgiu a fábrica mística".
Os cientistas não temem que os dados da física bitolem ou comprimam o seu intelecto; nem devem temer os fatos objetivos que são os dados da teologia. Não podemos fazer teologia do mesmo modo que não podemos fazer uma lei da natureza física. Como o filósofo natural é "Naturae minister et interpres", assim o teólogo é servo e intérprete da verdade objetiva de Deus.
POSSIBILIDADE DA TEOLOGIA
A possibilidade da Teologia tem uma tríplice base: 1. Na existência de um Deus que se relaciona com o universo; 2. Na capacidade da mente humana de conhecer Deus e algumas de tais relações; 3. Na provisão de meios pelos quais Deus se põe em real contato com a mente ou, em outras palavras, na provisão de uma revelação.
Qualquer ciência em particular só se torna possível quando combina três condições, a saber, a verdadeira existência do objeto de que ela trata, a capacidade subjetiva da mente humana conhecer tal objeto, e a provisão de meios definidos pelos quais os objetos entram em contato com a mente. Podemos ilustrar as condições da teologia a partir da selenologia - a ciência, não da "política lunar", que de modo tão infundado John Stuart Mill pensava perseguir, mas da física lunar. A selenologia é possível sob três condições:
1. a existência objetiva da lua; 2. a capacidade subjetiva da mente humana de conhecê-la; e 3. a provisão de alguns meios (p.ex., os olhos e o telescópio) pelos quais a lacuna entre o homem e a lua se ligam e pelos quais a mente pode apossar-se do conhecimento verdadeiro dos fatos relativos à lua.
Na existência de um Deus que se relaciona com o universo
Tem-se objetado, na verdade, que desde que Deus e estas relações são objetos apreendidos só pela fé, não são objetos próprios do conhecimento ou assuntos próprios da ciência.
Respondemos:
A Fé é conhecimento e o mais elevado tipo de conhecimento. - A ciência física também se apoia na fé - fé na nossa existência, na existência de um mundo objetivo e exterior a nós e na existência de outras pessoas além de nós mesmos; fé nas nossas convicções primitivas,tais como espaço, tempo, causa, substância, desígnio, certeza; fé na confiabilidade das nossas faculdades e no testemunho dos nossos semelhantes. Nem por isso a ciência física é invalidada, porque tal fé, embora diferente na percepção sensorial ou demonstração lógica, é ainda um ato cognitivo da razão e pode ser definido como certificação relativa à matéria em que a verificação é impossível.
A citada e respondida objeção à teologia expressa-se nas palavras de Sir William Hamilton, Metaphysics, 44, 531 - "Fé - crença - é o órgão pelo qual nós apreendemos o que está além do nosso conhecimento". Mas ciência é conhecimento e o que está além do nosso conhecimento não pode ser matéria de ciência. O Presidente E. G. Robinson diz com precisão que o conhecimento e a fé não podem ser separados um do outro, como os compartimentos de um navio, dos quais o primeiro pode ser esmagado enquanto o segundo ainda mantém o navio flutuando. A mente é uma só, - "ela não pode ser seccio- nada em duas com uma machadinha". Fé não é antítese do conhecimento, - ela é um tipo maior e mais fundamental de conhecimento. Ela nunca se opõe à razão, mas apenas à vista. Tennyson estava errado quando escreveu: "Nós temos somente fé: não podemos conhecer; Porque conhecemos aquilo que vemos" (In Memoriam, Introd...). Isto tornaria os fenômenos sensitivos os únicos objetos do conhecimento. A fé nas realidades supra-sensíveis, ao contrário, é o mais elevado exercício da razão.
Sir William Hamilton declara consistentemente que a mais elevada conquista da ciência é o levantamento de um altar "Ao Deus Desconhecido". Esta, entretanto, não é a representação da Escritura. Cf. Jo. 17.3 - "a vida eterna é esta, que te conheçam a ti como único verdadeiro Deus"; e Jr. 9.24 - "o que se gloriar glorie-se nisto: em me conhecer e saber que eu sou o Senhor". Para a crítica de Hamilton, verH. B. Smith, Faith and Philosophy, 297-336. Fichte: "Nós nascemos na fé". Até mesmo Goethe se dizia alguém que crê nos cinco sentidos. Balfour, Defense of Philosophic Doubt, 277-295, mostra que as crenças intuitivas nas categorias de espaço, tempo, causa, substância, justiça pressupõem uma aquisição de todo o conhecimento. Dove, Logic of the Christian Faith, 14 - "Se se deve destruir a teologia porque parte de termos e proposições primárias, deve-se, então, proceder de igual modo com todas as ciências". Mozley, Miracles, define fé como a "razão não verificável".
A fé é um conhecimento condicionado pelo sentimento santo. - A fé que apreende o ser divino e sua obra não é opinião ou imaginação. É certeza relativa às realidades espirituais sobre o testemunho da nossa natureza racional e sobre o testemunho de Deus. Sua única peculiaridade como ato cognitivo da razão é que está condicionado ao sentimento santo. Como a ciência da estética é produto da razão incluindo o poder de reconhecer o belo praticamente inseparável do amor ao belo e como a ciência da ética é produto da razão incluindo o poder de reconhecer o moralmente correto praticamente inseparável do amor ao moralmente correto, assim a ciência da teologia é produto da razão, mas da razão que inclui o poder de reconhecer o Deus, que é praticamente inseparável do amor a Deus.
Empregamos aqui o termo "razão" para significar a força total do conhecimento. Razão, neste sentido, inclui o estado de sensibilidade desde que seja "dispensável ao conhecimento. Não podemos conhecer uma laranja só de olhá-la; para entendê-la, é tão necessário saboreá-la como vê-la. A matemática do som não pode dar-nos entendimento da música; é necessário também ouvi-la. Só a lógica não pode demonstrar a beleza do pôr do sol, ou de um caráter nobre; o amor ao belo e à justiça antecede o conhecimento do belo e da justiça. Ullman chama a atenção para a derivação de sapientia, sabedoria, de sapere, saborear. Não podemos conhecer Deus só pelo intelecto; o coração deve acompanhar o intelecto a fim de possibilitar o conhecimento das coisas divinas. "As coisas humanas", diz Pascal, só precisam ser conhecidas para serem amadas; mas as coisas divinas primeiro precisam ser amadas para serem conhecidas". "Esta fé [religiosa] do intelecto", diz Kant, "fundamenta-se na aceitação do temperamento moral". Se alguém fosse totalmente indiferente às leis morais, continua o filósofo, até mesmo as verdades religiosas "teriam o apoio dos fortes argumentos da analogia, mas, do mesmo modo que o coração obstinado, o cético não poderia conquistá-las".
A fé, então, é o mais elevado conhecimento porque é a ação integral da alma, a perspicácia, não somente de um olho, mas dos dois olhos da mente, do intelecto e do amor a Deus. Com um olho podemos ver um objeto plano, mas, se quisermos vê-lo como um todo e captar o efeito estereótipo, devemos empregar ambos os olhos. Não é o teólogo, mas o astrônomo não devoto que tem a ciência caolha e, portanto, incompleta. Os erros do racionalista são os da visão defeituosa. O intelecto tem-se divorciado do coração, isto é, da disposição correta, das afeições corretas e do propósito correto da vida.
O intelecto diz: "Não posso conhecer Deus"; e o intelecto está certo. O que o intelecto diz, a Escritura também o diz: 1 Co. 2.14 - "O homem natural não compreende as coisas do Espírito de Deus, porque lhe parecem loucura; e não pode entendê-las porque elas se discernem espiritualmente"; 1.21 - "na sabedoria de Deus o mundo não conheceu a Deus".
Por outro lado, a Escritura declara que "pela fé, entendemos" (Hb. 11.3). Para a Escritura a palavra "coração" significa tão somente a disposição governante ou sensibilidade + vontade; e ela indica que o coração é um órgão do conhecimento: Ex. 35.25 - "mulheres que eram sábias de coração";
SI. 34.8 - "provai e vede que o Senhor é bom" = o provar vem antes do ver;
Jr. 24.7 - "Dar-lhes-ei um coração para que me conheçam"; Mt. 5.8 - "Bem- aventurados os limpos de coração, porque eles verão a Deus"; Lc. 24.25 - "tardos de coração para conhecer"; Jo. 7.17 - "Se alguém quiser fazer a vontade dele, pela mesma doutrina, conhecerá se ela é de Deus ou falo de mim mesmo"; Ef. 1.18- "tendo iluminados os olhos do vosso entendimento, para que saibais"; 1 Jo. 4.7,8 - "qualquer que ama é nascido de Deus e conhece a Deus. Aquele que não ama não conhece a Deus".
Portanto, a fé, e só a fé pode fornecer o material adequado e suficiente para uma teologia científica. - Como uma operação da mais elevada natureza racional do homem, embora distinta da visão ocular ou do raciocínio, a fé é o mais elevado tipo de conhecimento. Ela nos dá o entendimento que só pelos sentidos seria inacessível, a saber, a existência de Deus e ao menos algumas das relações entre Deus e a sua criatura.
Phillippi, Glaubenslehre, 1.50, segue Gerhard, ao tomar a fé um ato conjunto do intelecto e da vontade. Hopkins, Outline Study of Man, 77,78, fala não só da "razão estética", mas da "razão moral". Murphy, Scientific Bases of Faith,
91, 109, 145, 191 - "Fé é a certeza a respeito daquilo em que é impossível a verificação". Emerson, Essays, 2.96 - "A crença consiste em aceitar as afirmações da alma - a descrença em rejeitá-las". Morell, Philos. of fíeligion, 38,52,53, cita Colleridge: "A fé consiste na síntese da razão e da vontade do indivíduo, ... e em virtude daquela (isto é, da razão), a fé deve ser uma luz, uma forma de conhecimento, uma contemplação da verdade". A fé, então, não deve ser representada como uma menina cega apegada a uma cruz - a fé não é cega - "Doutra forma a cruz pode muito bem ser um crucifixo ou uma imagem de Gautama", "A cega descrença", não a fé cega, "sem dúvida deve errar, e esquadrinhar suas obras em vão". Como na consciência reconhecemos uma autoridade invisível, conhecemos a verdade em exata proporção com o nosso desejo de "praticar a verdade", assim na religião só a santidade pode conhecer a santidade e só o amor pode entender o amor (cf. Jo. 3.21 - "quem pratica a verdade vem para a luz").
Se um estado correto do coração for indispensável à fé bem como o conhecimento de Deus, pode haver qualquer "theologia irregenitorum", ou teologia dos irregenerados? Sim, respondemos; do mesmo modo que um cego pode ter uma ciência da ótica. O testemunho dos outros dá sua reivindicação a ele; a obscura luz que penetra a obscura membrana corrobora este testemunho. O irregenerado pode conhecer a Deus como poder e justiça, e temê-lo. Mas isto não é o conhecimento do mais íntimo caráter de Deus; ele fornece um certo material para uma teologia defeituosa ou desproporcional; mas não fornece material suficiente para uma correta teologia. Como, para tornar esta ciência da ótica satisfatória e completa, um oftalmologista competente deve remover a catarata dos seus olhos, assim, para qualquer teologia completa ou satisfatória, é preciso que Deus lhe retire o véu do coração (2 Co. 3.15,16 - "o véu está posto no coração deles. Mas, quando [marg. 'os homens'] se converterem ao Senhor, o véu se tirará").
A nossa doutrina da fé é o conhecimento e o mais elevado de todos; deve distinguir-se do de Ritschl, cuja teologia é um apelo ao coração para a exclusão da cabeça - para a fiducia sem notitia. Mas fiducia inclui notitia; doutra forma é cega, irracional e anticientífica. Robert Browning igualmente caiu num profundo erro especulativo quando, para comprovar sua fé otimista, estigmatizou o conhecimento humano como simplesmente aparente. O apelo tanto de Ritschl como de Browning da cabeça para o coração deve mais ser um apelo do mais estreito conhecimento do simples intelecto para o maior conhecimento condicionado à correta afeição.
Na capacidade humana de conhecer Deus
Porém tem-se argumentado que tal conhecimento é impossível pelas seguintes razões;
Podemos conhecer apenas os fenômenos.
Respondemos:
Como conhecemos os fenômenos físicos assim também conhecemos os mentais, b) Conhecendo os fenômenos, quer físicos, quer mentais, conhecemos a substância subjacente aos fenômenos, manifestada através deles e que constitui a base de sua unidade, c) A nossa mente traz à observação do fenômeno não só o conhecimento da substância, mas também de tempo, de espaço, de causa e de justiça, realidades que em nenhum sentido são fenomenais. Porque estes objetos do conhecimento não são fenomenais, o fato de que Deus não é fenomenal não nos impede de conhecê-lo.
Não precisamos aqui determinar o que é substância. Quer sejamos realistas ou idealistas, somos compelidos a admitir que não pode haver fenômenos sem os númenos, não pode haver aparências, não pode haver qualidades sem algo que seja qualificado. Este algo que serve de base ou está sob a aparência ou qualidade chamamos substância. Em nossa filosofia somos mais iotzeanos do que kantianos. Dizer que não conhecemos o eu, mas apenas as suas manifestações no pensamento, é confundir o eu com o seu pensamento e ensinar psicologia sem alma. Dizer que de modo nenhum conhecemos o mundo exterior, mas apenas as suas manifestações nas sensações, é ignorar o princípio que liga tais sensações; porque, sem algo a que as qualidades são inerentes, elas não têm base alguma para sua unidade. De igual modo, dizer que não conhecemos nada de Deus a não ser suas manifestações, é confundir Deus com o mundo e praticamente negar que haja Deus.
Stãhlin, em sua obra sobre Kant, Lotze e Ritschl, 186-191,218,219, diz com precisão que "a limitação do conhecimento dos fenômenos envolve, na teologia, a eliminação de todas as reivindicações do conhecimento dos objetos da fé cristã como são em si mesmas". Esta crítica, com justiça, põe na mesma classe Ritschl junto com Kant, ao invés de pô-los com Lotze que sustenta que, conhecendo os fenômenos, conhecemos também os númenos manifestos neles. Conquanto Ritschl professe seguir Lotze, toda a tendência da sua teologia caminha na direção da identificação kantiana do mundo com as nossas sensações, a mente com os nossos pensamentos e Deus, com atividades tais que lhe são peculiares como nós as percebemos. Nega-se a natureza divina, independente das suas atividades, o Cristo preexistente, a Trindade imanente. Afirmações de que Deus é amor e paternidade consciente de si mesmo tornam-se juízos de valor meramente subjetivo.
Admitimos que conhecemos Deus só até onde as suas atividades o revelam e até onde as nossas mentes e corações são receptivos à sua revelação. Deve-se exercer o conjunto de faculdades apropriadas - não as matemáticas, as lógicas ou as que se referem à prudência, mas a ética e a religiosa. Ritschl tem o mérito de reconhecer a razão prática da especulativa; seu erro não consiste em reconhecer que, quando usamos adequadamente os poderes do conhecimento, tomamos posse não simplesmente da verdade subjetiva, mas também da objetiva e não somente entramos em contato com as atividades de Deus, mas com o próprio Deus. Os juízos religiosos normais, embora dependam das condições subjetivas, não são apenas "juízos de mérito", ou "juízos de valor", - elas nos fornecem o conhecimento das "próprias coisas". Edward Caird diz do seu irmão John Caird (Fund. Ideas of Christianity, Introd... cxxi) - "A pedra fundamental da sua teologia é a convicção de que se pode conhecer e conhece-se a Deus e de que, no sentido mais profundo, todo o nosso conhecimento é o dele".
O fenomenalismo de Ritschl está aliado ao positivismo de Comte, que considera todo o assim chamado conhecimento de outro tipo que não sejam os objetos fenomenais puramente negativos. A expressão "Filosofia Positiva" na verdade implica que todo o conhecimento da mente é puramente negativo; ver Comte, Pos. Philosophy, tradução de Martineau, 26,28,33 - "Para observar o vosso intelecto deveis fazer uma pausa nas atividades - embora queirais observar essa mesma atividade. Se não puderdes fazer a pausa, não podereis observar; se a fizerdes, nada há a observar". Dois fatos refutam este ponto de vista: 1) a consciência e 2) a memória; porque a consciência é o conhecimento do eu ao lado do conhecimento dos seus pensamentos e a memória é o conhecimento do eu ao lado do conhecimento do passado dela.
Os fenômenos são "fatos, distintos da sua base, princípio, ou lei"; "não se percebem os fenômenos nem as qualidades, como tais, mas os objetos, as percepções, ou os seres; e é por um pensamento posterior ou por um reflexo que estes se ligam como qualidades e são tidos como substâncias".
Os fenômenos podem ser interiores, /'.e., pensamentos; neste caso, o númeno é a mente cujas manifestações são os pensamentos. Por outro lado, os fenômenos podem ser exteriores, e.g., a cor, a dureza, a forma, o tamanho; neste caso, o númeno é a matéria, cujas qualidades são as manifestações. Mas as qualidades, quer mentais, quer materiais, implicam a existência de uma substância a que pertencem; não se pode concebê-las como uma existência a parte da substância, mais do que como um lado superior de uma tábua assim como não se pode concebê-las como existentes sem um lado inferior; ver Martineau, Types of Ethical Theory, 1.455,456 - "A suposição de Comte de que a mente não pode conhecer a si mesma ou os seus estados opõe-se à de Kant, de que a mente nada pode conhecer a não ser a si mesma. ... É exatamente porque todo o conhecimento vem dos relacionamentos que ele não vem e nem pode vir só dos fenômenos. O absoluto não pode se conhecido per se porque, ao ser conhecido, ele se relacionaria ipso facto e não mais seria absoluto. Mas nem o elemento fenomenal pode ser conhecido per se, i. e., como fenomenal, sem a cognição simultânea do que é o não fenomenal". McCosh, Intuitions, 138-154, estabelece as caraterísticas das substâncias como 1) ser, 2) poder, 3) permanecer. Diman, Theistic Argument, 337,363
"A teoria que rejeita Deus, rejeita o mundo exterior e a existência da alma". Conhecemos algo além dos fenômenos, a saber, lei, causa, força, - ou não podemos ter ciência.
Porque só podemos conhecer o que tem analogia com a nossa natureza ou experiência.
Respondemos: d) Para o conhecimento não é essencial que haja semelhança de natureza entre conhecedor e conhecido. Conhecemos tanto pela diferença como pela semelhança, b) Nossa experiência passada, apesar de facilitar grandemente novas aquisições, não é a medida do nosso conhecimento possível. Se assim fosse, seria inexplicável o primeiro ato de conhecimento e toda a revelação dos mais elevados caracteres até os menores seria excluída assim como todo o progresso no conhecimento que ultrapassa o nosso presente conhecimento, c) Mesmo que o conhecimento dependesse da semelhança entre a natureza e a experiência, poderíamos conhecer Deus, visto que somos feitos à sua imagem e há importantes analogias entre a natureza divina e a nossa.
O dito de Empédocles, "Similia similibus percipiuntur", deve ser suplementado por um outro: "Similia dissimilibus percipiuntur". Mas conhecer é distinguir, e deve haver um contraste entre os objetos a fim de nos despertar a atenção. Deus conhece o pecado, embora este seja a antítese do seu santo ser. O eu conhece o não-eu. Não podemos conhecer até mesmo o eu sem considerá-lo objetivamente, distinguindo-o dos seus pensamentos e considerando-o como um outro.
Versus Herbert Spencer, First Principies, 79-82 - "Conhecimento é o reconhecimento e a classificação". Mas retrucamos que é necessário perceber primeiro uma coisa para reconhecê-la, ou compará-la com outra; e isto é verdade, tanto a respeito da primeira sensação como da última e as mais definidas formas de conhecimento; na verdade, não há nenhuma sensação que não envolva, como complemento, ao menos uma percepção incipiente.
Porter, Human Intellect, 486 - "A indução só é possível baseada na suposição de que o intelecto do homem é um reflexo do divino, ou que o homem é feito à imagem de Deus". Note, contudo, que o homem é feito à imagem de Deus, e não Deus à imagem do homem. A pintura é a imagem paisagística, não o contrário a paisagem, a imagem da pintura; porque há muito na imagem que não tem nada que corresponda a ela na pintura.
A idolatria perversamente faz Deus à imagem do homem e deifica as fraquezas das impurezas do homem. A Trindade em Deus pode não ter a exata contrapartida na atual constituição do homem, embora possa descortinar-nos o objetivo do desenvolvimento futuro do homem e o sentido da crescente diferenciação das forças do homem. Gore, Incarnation, 116 - "Se o antropo- morfismo aplicado a Deus é falso, ainda o teomorfismo aplicado ao homem é verdadeiro; o homem é feito à imagem de Deus, e as suas qualidades não são, a medida das divinas, mas a contrapartida destas e a verdadeira expressão".
Porque conhecemos apenas aquilo que podemos conceber, no sentido de formar uma imagem mental adequada.
Respondemos: d) É verdade que conhecemos só aquilo que podemos conceber se pelo termo "conceber" significamos nossa distinção entre o pensamento do objeto conhecido e os demais objetos. Mas b) a objeção confunde concepção com o que é meramente seu acessório ocasional e auxílio, a saber, o quadro que a imaginação faz do objeto. Neste sentido, não é teste final da verdade, c) Torna-se claro que a formação de uma imagem mental não é essencial à concepção ou ao conhecimento, quando lembramos que, de fato, tanto concebemos como conhecemos muitas coisas de que não podemos formar imagem mental seja ela qual for e que em nada corresponde à realidade; por exemplo: força, causa, lei, espaço, nossas próprias mentes. Assim podemos conhecer Deus apesar de que não podemos formar imagem mental adequada a respeito dele.
A objeção aqui refutada se expressa mais claramente nas palavras de Herbert Spencer, First Principies, 25-36, 98 - "A realidade subjacente às aparências é total e permanentemente inconcebível por nós". Mansel, Prolego- mena Logica, 77,78 (cf.. 26) sugere que a fonte deste erro encontra-se num ponto de vista falho da natureza do conceito: "A primeira caraterística distintiva de um conceito, a saber, que não pode por si mesmo ser descrito no sentido e na imaginação". Porter, Human Intellect, 392 (vertb. 429,656) - "Conceito não é uma imagem mental" - só a percepção o é. Lotze: "De um modo geral não se representa a cor através de qualquer imagem; ela não se apresenta nem verde nem vermelha, mas não tem qualquer caraterização". O cava
lo, genericamente, não tem uma cor particular, embora individualmente possa ser preto, branco ou baio. Sir William Hamilton fala das "noções de inteligência impossíveis de ser representadas em pintura".
Martineau, Religion and Materialism, 39,40 - "Esta doutrina da Nesciência encontra-se na mesma relação com o poder causai, quer você a construa com o Poder Material, quer com a Atuação Divina. Nem pode ser observada-, deve-se aceitar um ou outro. Se você admite para a categoria do conhecimento o que se aprende a partir da observação, seja particular, seja generalizada, então se trata de uma Força desconhecida; se você amplia a palavra ao que é importado pelo próprio intelecto em nossos atos cognitivos, para torná-los assim, então se conhece Deus". A matéria, o éter, a energia, o protoplasma, o organismo, a vida, - nenhum deles pode ser retratado para a imaginação; contudo, o Sr. Spencer os trata como objetos da Ciência. Se não são inescrutáveis, por que ele considera inescrutável a Força que dá unidade a todas estas coisas?
Na verdade, Herbert Spencer não é coerente consigo mesmo, pois, em diversas partes dos seus escritos, ele chama Realidade inescrutável dos fenômenos a Existência Absoluta, Poder e Causa unas, eternas, ubíquas, infinitas, últimas. "Parece", diz o Padre Dalgairns, "que se conhece muita coisa do Desconhecido". Chadwick, Unitarianism, 75 - "A pobre expressão 'Desconhecido' torna-se, depois das repetidas designações de Spencer, tão rica como todo o conhecimento salvador de Creso". Matheson: "Saber que nada sabemos já significa ter chegado a um fato do conhecimento". Se o Sr. Spencer pretendia excluir Deus do reino do Conhecimento, devia primeiro tê-lo excluído do reino da Existência; porque admitir que ele é, já é admitir que nós não podemos conhecê-lo, mas, na verdade, em certo ponto, nós o conhecemos.
Porque podemos conhecer, na verdade, só o que conhecemos no todo, não em parte.
Respondemos: d) A objeção confunde conhecimento parcial com o conhecimento de uma parte. Conhecemos a mente em parte, mas não conhecemos uma parte da mente, b) Se a objeção fosse válida, nenhum conhecimento real de qualquer coisa seria possível, visto que não conhecemos uma só coisa em todas as suas relações. Concluímos que, embora Deus não seja formado de partes, podemos ainda ter um conhecimento parcial dele e tal conhecimento, embora não exaustivo, pode ser real e adequado aos propósitos da ciência.
A objeção mencionada no texto é estimulada por Mansel, Limits of Religious Thought, 97, 98 e é Martineau, Essays, 1.291 quem a responde.
A mente não existe no espaço e não tem partes: não podemos falar do seu quadrante sudoeste, nem podemos dividi-la em metades. Contudo, encontramos o material para a ciência mental no conhecimento parcial da mente. Assim, conquanto não sejamos "geógrafos da natureza divina" (Bowne, Review of Spencer, 72), podemos dizer com Paulo, não que "agora conhecemos uma parte de Deus", mas que "agora conheço [Deus] em parte" (1 Co. 13.12). Podemos conhecer verdadeiramente o que não conhecemos exaustivamente; ver Ef. 3.19 - "conhecer o amor de Cristo, que excede todo entendimento". Não me entendo perfeitamente, contudo me conheço em parte; assim posso conhecer a Deus, apesar de não entendê-lo perfeitamente.
O mesmo argumento que prova que Deus é incognoscível prova também que também o mundo o é. Visto que todas partículas da matéria atraem- se mutuamente, nenhuma delas pode ser explicada exaustivamente sem levar em conta as demais. Thomas Carlyle: "É um fato matemático que o lançamento desta pedra da minha mão altera o centro de gravidade do universo". Tennyson, Higher Pantheism: "Flor na parede rachada, eu a arranco das rachaduras; / Segure-se aqui, raiz e tudo, na minha mão, ó florzinha, porém não posso entender / O que é você, raiz e tudo, e em tudo, / Devo conhecer o que Deus é e o que é o homem". Schurman, Agnosticism, 119 - "Mesmo parcial como é, esta visão do elemento divino transfigura a vida do homem sobre a terra". Pfleiderer, Philos. Religion, 1.167- "O agnosticismo de coração fraco é pior que o arrogante e titânico gnosticismo contra o qual ele protesta".
Porque todos os predicados de Deus são negativos e, por isso, não fornecem conhecimento real. Respondemos: d) Os predicados derivados da nossa consciência, tais como, espírito, amor e santidade são positivos, b) Os termos "infinito" e "absoluto", contudo, expressam não meramente uma idéia negativa, mas positiva, - a idéia, naquele caso, da ausência total de limite, a idéia de que o objeto assim descrito continua e continua sempre; a idéia, neste caso, de inteira auto-suficiência. Porque os predicados de Deus, portanto, não são meramente negativos, o argumento acima mencionado não fornece nenhuma razão válida por que não podemos conhecê-lo.
Versus Sir William Hamilton, Metaphysics, 530 - "O absoluto e o infinito podem ser concebidos somente com a negação do objeto do pensamento; a saber, de qualquer modo não temos em outras palavras nenhuma a concepção do absoluto e do infinito". Hamilton aqui confunde o infinito, ou ausência de todos limites, com o indefinido, ou a ausência de todos limites conhecidos. Per contra, ver Calderwood, Moral Philosophy, 248, e Philosophy of the Infinite, 2.12. - "A negação de uma coisa só é possível através da afirmação de outra". Porter, Human Intellect, 652 - Se os moradores da Ilha de Sandwich, por falta de nome, tinham chamado o boi de não porco (not-hog), o emprego de um nome negativo não autoriza necessariamente a inferência de falta de concepções definidas ou conhecimento positivo". Deste modo com o infinito, ou não finito, o incondicionado ou não condicionado, o independente, ou não dependente, - estes nomes não implicam que não podemos conceber e conhecer como algo positivo. Spencer, First Principies, 92 - "O nosso conhecimento do Absoluto, embora indefinido, não é negativo, mas positivo".
Schurman, Agnosticism, 100, fala da "farsa da nesciência atribuindo à onis- ciência os limites da ciência". "O agnóstico", diz ele, "erige o quadro invisível de um Grand Être, sem forma e sem cor, separado de modo absoluto do homem e do mundo - branco interiormente e vazio por fora - com sua existência indistinguível da sua não existência e, curvando-se diante da criação idólatra, derrama a sua alma em lamentações sobre a incognoscibilidade de tal mistério e pavorosa ausência de identidade. ... A verdade é que se desconhece a abstração agnóstica da Deidade, porque tal abstração é irreal". Ver McCosh, Intuitions, 194, nota; Mivart, Lessons from Nature, 363. Deus não é necessariamente infinito em todos aspectos. Ele só é infinito em toda a excelência. Um plano ilimitado em um aspecto de comprimento pode ser limitado em outro aspecto, como, por exemplo, a respiração. A nossa doutrina aqui não é, por isso, inconsistente com o que se segue de imediato.
Porque conhecer é limitar ou definir. Por isso o Absoluto como ilimitado e o Infinito como indefinido não pode ser conhecido. Respondemos:
Deus é absoluto, não como existindo sem nenhuma relação, mas como existindo sem nenhuma relação necessária; e b) Deus é infinito, não excluindo toda a coexistência do finito com ele mesmo, mas como a base do finito, e assim, não algemado por ele. c) Deus, na verdade, está limitado pela imutabilidade de seus atributos e distinções pessoais bem como pela auto-escolha das suas relações com o universo que ele criou e com a humanidade na pessoa de Cristo. Portanto, Deus se limita e se define no sentido de tornar possível o conhecimento dele.
Versus Mansel, Limitations ofReligious Thought, 75-84, 93-95; cf. Spinoza: "Omnis determinatio est negatio"; por isso definir Deus é negá-lo. Respondemos, entretanto, que a perfeição é inseparável da limitação. O ser humano pode ser um outro além do que é: com Deus não acontece isso, ao menos interiormente. Mas tal limitação inerente em seus imutáveis atributos e distinções pessoais, é a perfeição de Deus. Exteriormente, todas limitações sobre Deus são auto-limitações e, portanto consistentes com a sua perfeição. Esse Deus não deve ser capaz de limitar-se na criação e a redenção tornaria todo o seu sacrifício impossível e o sujeitaria à maior das limitações. Pelo exposto podemos dizer que 1. A perfeição de Deus envolve sua limitação a) à pesso- alidade, b) à Trindade, c) à retidão; 2. A revelação de Deus envolve sua auto- limitação a) no decreto, b) na criação, c) na preservação, d) no governo, e) na educação do mundo; 3. A redenção envolve sua infinita auto-limitação a) na pessoa e b) na obra de Jesus Cristo.
Bowne, Philos. of Creation, 135 - "O infinito não é o todo quantitativo; o absoluto não é o não relacionado ... Tanto o absoluto como o infinito significam apenas a base independente das coisas". Julius Müller, Doct. of Sin, lntrod..., 10 - "A religião tem a ver não com um Objeto que deve ser por si mesmo conhecido porque da sua própria existência é contingente em ser conhecido, mas com o Objeto com que nos relacionamos, na verdade, submissos, na dependência dele e no aguardo da sua manifestação". James Martineau, Study of Reiigion, 1.346 - "Não devemos confundir o infinito com o total. ... A abnegação própria da infinitude é tão somente a forma de auto- afirmação e a única em que ela pode revelar-se. ... Embora o pensamento onisciente seja instantâneo, embora certa a força onipotente, sua execução tem de ser distribuída no tempo e deve ter uma ordem de passos sucessivos; em outros termos, o eterno pode tornar-se temporal e o infinito falar articula- damente no finito".
A pessoalidade perfeita exclui não a determinação própria, mas a que vem de fora através de um outro. As auto-limitações de Deus são as do amor e, consequentemente, as evidências da sua perfeição. São sinais não de fraqueza, mas de poder. Deus limitou-se ao método da evolução desenvolvendo-se gradualmente na natureza e na história. O governo dos pecadores por um Deus santo envolve constante auto-repressão. A educação da raça é um longo processo de abnegação divina. Herder: "As limitações do aluno são também as do mestre". Na inspiração, Deus se limita através do elemento humano por quem ele opera. Sobretudo, na pessoa e obra de Cristo, temos infinita auto-limitação: A infinitude se estreita até na encarnação e a santidade suporta as agonias da Cruz. As promessas de Deus são também auto- limitações. Deste modo tanto a natureza como a graça são restrições impostas a si mesmo por Deus e são os recursos através dos quais ele se revela.
Porque todo o conhecimento é relativo ao agente conhecedor; isto é, o que conhecemos, conhecemos, não como é objetivamente, mas só no que se relaciona com nossos sentidos e faculdades. Respondemos: d) Admitimos que podemos conhecer só o que se relaciona com as nossas faculdades. Mas isto somente eqüivale a dizer que conhecemos só aquilo que vem ao nosso contato mental, isto é, conhecemos apenas o que conhecemos. Mas b) negamos que conhecemos aquilo que vem ao nosso contato mental como outra coisa além do que é. Até onde conhecemos, conhecemos como é. Em outras palavras, as leis do nosso conhecimento não são meramente arbitrárias e regulativas, mas
correspondem à natureza das coisas. Concluímos que, em teologia, temos a garantia de admitir que as leis do nosso pensamento são as leis do pensamento de Deus e que os resultados do pensamento normalmente conduzido em relação a Deus correspondem à realidade objetiva.
Versus Sir William Hamilton, Metaph., 96-116 e Herbert Spencer, First Principies, 68-97. Esta doutrina da relatividade deriva de Kant, que, na Crítica da Razão Pura, sustenta que os juízos a priori são somente "reguladores". Respondemos, entretanto, que, quando se acha que as crenças primitivas são apenas reguladoras, elas deixam de regulamentar. As formas de pensamento são também fatos da natureza. Diferentemente do vidro de um caleidoscópio, a mente não fornece as formas; ela reconhece que estas têm existência exterior a ela mesma. A mente lê as suas idéias não rumo ao interior da natureza, mas nela. Nossas intuições não são lentes verdes que fazem o mundo todo parecer verde: são lentes de um microscópio, que nos capacitam a ver o que é objetivamente real (Royce, Spirit of Mod. Philos., 125). Kant chamava o nosso entendimento de "legislador da natureza". Mas isto é verdade, só como descobridor das suas leis, não como seu criador. A razão humana impõe as suas leis e formas sobre o universo; mas, fazendo isso, ela interpreta o sentido real dele.
Ladd, Philos. of Knowledge: "Todo juízo implica uma verdade objetiva segundo a qual julgamos e que constitui o padrão e com a qual temos algo em comum, /.e., as nossas mentes são parte de uma mente infinita e eterna". Aforismo francês: "Quando você está certo, você está mais certo do que pensa estar". Deus não nos põe em permanente confusão intelectual. Foi debal- de que Kant escreveu "trânsito não impedido" sobre a razão em seu mais elevado exercício. Martineau, Study of Religion, 1.135,136 - "Bem ao contrário da suposição de Kant de que a mente nada pode conhecer além de si mesma, podemos estabelecer a suposição de Comte, igualmente sem garantia, de que a mente não pode conhecer-se a si mesma ou os seus estados. Não podemos ter filosofia sem suposições. Você dogmatiza se diz que as formas correspondem à realidade; mas igualmente você dogmatiza se diz que não correspondem. ... 79 - Que as nossas faculdades cognitivas correspondem às coisas tais quais são, é muito menos surpreendente do que se elas correspondem às coisas que não são". W. T. Harris, in Journ. Spec. Philos., 1.22, expõe as contradições próprias de Spencer: "Todo o conhecimento não é absoluto, mas relativo; nosso conhecimento deste fato, entretanto, não é relativo, mas absoluto".
Ritschl, Justification and Reconciiiation, 3.16-21, estabelece limites, com uma correta afirmação da natureza do conhecimento, e adere à doutrina de Lotze, distinta da de Kant. A declaração de Ritschl pode resumir-se da seguinte maneira: Tratamos, não do Deus abstrato da metafísica, mas do Deus que a si mesmo se limitou e se revela em Cristo. Não conhecemos ou as coisas, ou Deus independentemente dos seus fenômenos ou manifestações, como imaginava Platão; não conhecemos os fenômenos ou manifestações sozinhos, sem conhecer as coisas ou Deus, como supunha Kant; mas, na verdade, conhecemos tanto as coisas como Deus nos fenômenos e mani-
'estações, como ensinava Lotze. Não sustentamos a união mística com Deus, endo como retaguarda toda a experiência religiosa, como ensina o Pietismo; a alma está sempre e somente em atividade e a religião é a atividade do espírito humano no qual o sentimento, o conhecimento e a vontade combinam-se numa ordem inteligível".
Porém o Dr. C. M. Mead, Ritschl's Place in the History of Doctrine, bem mostra que Ritschl não seguiu Lotze. Seus "juízos de valor" são apenas uma aplicação do princípio "regulador" de Kant à teologia. Ele sustenta que podemos conhecer as coisas não como são em si mesmas, mas só como se nos apresentam. Retrucamos que, o que as coisas são para nós depende do que são em si mesmas. Ritschl considera as doutrinas da preexistência de Cristo, divindade e expiação como intromissões da metafísica na teologia, matéria a respeito da qual não podemos conhecer e com a qual nada temos a ver. Não há propiciação ou união mística com Cristo; e Cristo é o nosso exemplo, mas não o nosso Salvador expiador. Ritschl faz bem em reconhecer que o amor em nós dá olhos à mente e nos capacita a ver a beleza de Cristo e sua verdade. Mas o nosso juízo não é, como ele defende, um juízo de valor meramente subjetivo, - é uma entrada em contato com o fato objetivo.
Xa revelação do próprio Deus
Como neste lugar não tentamos apresentar uma prova positiva da existência de Deus ou da capacidade que o homem tem de conhecer a Deus, assim não tentamos, por ora, provar que Deus entrou em contato com a mente humana através da revelação. Daqui para frente consideraremos as bases desta crença. Por ora, nosso alvo é simplesmente mostrar que, admitindo o fato da revelação, é possível uma teologia científica. Isto tem sido negado nas seguintes bases:
Que a revelação, como um processo de tomar conhecido, é necessariamente interior e subjetiva - quer seja um modo de inteligência, quer um despertar das forças cognitivas - e, por isso, não pode fornecer nenhum fato objetivo que constitua material próprio para ciência.
Morell, Philos. Religion, 128-131,143 - "A Bíblia não pode com a estrita exatidão da língua, ser chamada de revelação, visto que uma revelação sempre implica um verdadeiro processo de inteligência em uma mente viva".
F. W. Newman, Phases of Faith, 152 - "Nada conhecemos do nosso Deus moral e espiritual exteriormente - sempre interiormente". Theodore Parker:
"A revelação verbal nunca pode comunicar uma simples idéia como a de Deus, da Justiça, do Amor, da Religião". James Martineau, Seat of Authority in Religion: "Tantas mentes quantas existem conhecem a Deus ao primeiro contato, tem havido tantos atos reveladores e tantos quantos o conhecem indiretamente são estranhos à revelação"; assim, admitindo que a revelação exterior seja impossível, Martineau sujeita todas provas de tal revelação à desleal crítica destrutiva. Pfleiderer, Philos. Religion, 1.185 - "Como toda revelação é origi- nariamente uma experiência de vida interna, o aparecimento da verdade religiosa no coração, nenhum evento pode pertencer de si mesmo à revelação, independente de ser natural ou sobrenaturalmente ocasionado". Prof. George M. Forbes: "Nada nos pode ser revelado que não se prenda à nossa razão. Segue-se que, na medida em que a razão age normalmente, ela é uma parte da revelação". Ritchie, Darwin and Hegel, 30 - "A revelação de Deus é o desenvolvimento da sua idéia".
Em resposta a esta objeção, apresentada principalmente pelos idealistas na filosofia:
Admitimos que a revelação, para ser eficaz, deve ser o meio de induzir a um novo modo de inteligência, ou, em outras palavras, deve ser entendida. Admitimos que este entendimento das coisas divinas é impossível sem um despertar das forças cognitivas do homem. Além disso, admitimos que a revelação, quando originariamente transmitida, via de regra era interior e subjetiva.
Matheson, Moments on the Mount, 51-53, sobre Gl. 1.16 - "revelar o seu Filho em mim"; "A revelação no caminho de Damasco não teria iluminado Paulo se não fosse somente uma visão dos seus olhos. Nada pode ser revelado para nós que não tenha sido revelado dentro de nós. O olho não vê a beleza da paisagem, nem o ouvido ouve a beleza da música. Do mesmo modo a carne e o sangue não nos revelam Cristo. Sem o ensino do Espírito, os fatos exteriores serão somente como as letras de um livro para uma criança que não sabe ler". Podemos dizer com Channing: "Estou mais certo de que minha natureza racional vem de Deus mais do que qualquer livro que expresse a sua vontade".
Mas negamos que a revelação exterior é, por isso, inútil e impossível. Mesmo que as idéias religiosas surgissem totalmente de dentro, uma revelação externa podia despertar os poderes dormentes da mente. Contudo, as idéias não surgem totalmente de dentro. A revelação exterior pode transmiti-las. O homem pode revelar-se através de comunicação exterior e, se Deus tem poder igual ao do homem, pode revelar-se de igual maneira.
Rogers, Eclipse of Faith, indaga assinaladamente: "Se a Sra. Morell e a Sra. Newman ensinam através de um livro, não pode Deus fazer o mesmo?" Lotze, Microcosm, 2.660 (livro 9, cap. 4), fala da revelação "contida em algum ato divino, da ocorrência histórica ou repetido continuamente no coração do homem". Mas, na verdade, não há nenhuma alternativa aqui; a força do credo cristão é que a revelação de Deus é tanto exterior quanto interior. Rainy, Criticai Review, 1.1-21, diz com precisão que, sem garantia, Martineau isola da alma do indivíduo a testemunha de Deus. As necessidades interiores precisam ser combinadas com as exteriores a fim de assegurar que não se trata de um capricho da imaginação. É necessário distinguirmos as revelações de "eus das nossas fantasias. Daí, antes de dar-nos o padrão interior, Deus, via se regra, nos dá o exterior, através do qual testamos nossas impressões. Somos finitos e pecadores e necessitamos de autoridade. A revelação exterior recomenda-se como tendo autoridade sobre o coração que reconhece as suas necessidades espirituais. A autoridade exterior evoca o testemunho interior e lhe dá maior clareza, mas só a revelação histórica fornece prova inconteste de que Deus é amor e nos dá a segurança de que os nossos anseios para com Deus não são vãos.
Por isso a revelação de Deus pode ser e, como veremos daqui em diante, é. em grande parte, uma revelação exterior em obras e palavras. O universo é uma revelação de Deus; as obras de Deus na natureza precedem as suas palavras na história. Contudo, reivindicamos que, em muitos casos em que se comunicou a verdade originariamente de forma interior, o mesmo Espírito que a comunicou efetuou seu registro exterior, de modo que a revelação interior pôde ser transmitida a outros além dos que primeiro a receberam.
Não devemos limitar a revelação às Escrituras. O Verbo eterno antedatou a palavra escrita e, através do Verbo eterno, Deus se fez conhecido na natureza e na história. A revelação exterior precede e condiciona a interior.
No tempo certo a terra aparece antes do homem e a sensação antes da percepção. A ação expressa melhor o caráter e a revelação histórica ocorre mais pelos fatos do que pelas palavras. Dorner, Hist. Prot. Theol., 1.231-264 - "O Verbo não está apenas nas Escrituras. Toda a criação o revela. Na natureza Deus mostra o seu poder; na encarnação a sua graça e verdade. A Escritura dá testemunho delas, mas não é a Palavra essencial. Na verdade, a Escritura a apreendeu e apropriou quando, nela e através dela vemos o Cristo vivo e presente. Ela não só confina a si os homens, mas aponta para Cristo de quem testifica. Cristo é a autoridade. Nas Escrituras ele nos aponta para si mesmo e demanda a nossa fé nele. Uma vez gerada esta fé, ela não nos leva a uma nova apropriação da Escritura, mas à uma nova crítica a respeito dela. Cada vez mais encontramos Cristo na Escritura e ainda julgamo-la cada vez mais segundo o padrão que há em Cristo".
Newman Smith, Christian Ethics, 71-82: "Há somente uma autoridade-Cristo. Seu Espírito opera de muitas maneiras, mas principalmente de duas: primeiro, a inspiração das Escrituras e segundo, a condução da igreja rumo à verdade. Esta não deve isolar-se ou separar-se daquela. A Escritura é a lei da consciência cristã, e a consciência cristã no tempo faz a lei voltar-se para a Escritura - interpretando-a, criticando-a, verificando-a. A palavra e o espírito respondem um ao outro. A Escritura e a fé são coordenadas. O protestantismo tem exagerado a primeira; o romanismo a segunda. Martineau deixa de captar a coordenação entre a Escritura e a fé."
Com este registro exterior também veremos que ocorre sob adequadas condições a influência especial do Espírito de Deus, de modo a despertar os poderes cognitivos que o registro exterior reproduz em nossas mentes as idéias de que as mentes dos escritores estavam divinamente cheias.
Podemos ilustrar a necessidade da revelação interna a partir da egiptolo- gia, que é impossível até onde a revelação externa nos hieróglifos não é interpretada; a partir do tique-taque do relógio no escuro compartimento, onde só a vela acesa capacita-nos a narrar o tempo; a partir da paisagem espalhada em volta do Rigi na Suíça, invisível até que os primeiros raios do sol toquem os nevosos picos da montanha. A revelação exterior ( = "o que de Deus se pode conhecer neles se manifesta". Compare o àitoKaXwt-texca do evangelho no vs. 17, com o àTtoKaVimxexai da ira no vs. 18 - duas revelações, uma da ôpyii, a outra da xápiç; yer Shedd, Homiletics, 11. Rm. 1.32 - "conhecendo a justiça de Deus"; 2.15 - "mostram a obra da lei escrita no seu coração". Por isso mesmo os pagãos são "inescusáveis" (Rm. 1.20). Há dois livros: A Natureza e a Escritura - uma escrita, a outra não: e há necessidade de estudar ambos.
Spurgeon falava de uma pessoa piedosa que, quando descia o Reno, fechava os olhos para não ver a beleza da cena que desviaria a sua mente dos temas espirituais. O puritano virava as costas para portulaca, dizendo que não levaria em conta coisa alguma encantadora na terra. Mas isto é desprezo às obras de Deus. J. H. Barrows: "O Himalaia contém as letras em alto relevo em que nós, crianças cegas púnhamos os dedos para ler o nome de Deus". Desprezar as suas obras é desprezar o próprio Deus. Ele está presente na natureza e fala através dela. SI. 19.1 - "Os céus declaram a glória de Deus e o firmamento anuncia a obra das suas mãos" - verbos no presente.
A natureza não só é um livro, mas também uma voz. Hutton, Essays, 2.236 - "O conhecimento direto da comunhão espiritual deve ser suplementado pelo dos processos divinos provindos do estudo da natureza. A negligência do estudo natural dos mistérios do universo conduz a uma intromissão arrogante e ilícita das aceitações morais e espirituais num mundo diferente. Esta é a lição do livro de Jó". Hatck, Hibbert Lectures, 85 - "O homem, servo e intérprete da natureza também o é, consequentemente, do Deus vivo". Os livros científicos são o registro das interpretações passadas do homem relativas às obras de Deus.
b) Teologia Natural Suplementada - A revelação cristã é a principal fonte da teologia. As Escrituras declaram plenamente que a revelação de Deus na natureza não supre todo o conhecimento de que um pecador necessita (At. 17.23; Ef. 3.9). Portanto, esta revelação é suplementada por outra na qual os atributos divinos e as misericordiosas provisões só obscuramente projetadas na natureza tomam-se conhecidas ao homem. Esta última revelação consiste em uma série de eventos sobrenaturais e comunicações cujo registro é apresentado nas Escrituras.
At. 17.23 - Paulo mostra que, embora os atenienses, na edificação do altar a um Deus desconhecido, "reconhecessem uma existência divina além de qualquer que os ritos comuns da sua adoração reconheciam, tal Ser ainda lhes era desconhecido; eles não tinham uma concepção exata da sua natureza e suas perfeições" (Hackett, in loco). Ef. 3.9 - "o mistério que esteve oculto em Deus" - mistério este que, no evangelho, tornou conhecida ao homem a salvação. Hegel, Philosophy of Religion, diz que o cristianismo é a única religião revelada porque o Deus cristão é o único de quem ela pode vir. Podemos acrescentar que, como a ciência é o registro da interpretação progressiva do homem relativa à revelação de Deus no reino natural, do mesmo modo a Escritura é o registro da interpretação progressiva do homem sobre a revelação de Deus no reino espiritual. A expressão "palavra de Deus" não indica primordialmente um registro, - é a palavra falada, a doutrina, a verdade vita- lizadora, descortinada por Cristo; Mt. 13.19 - "Ouvindo a palavra do Reino";
Lc. 5.1 - "ouvir a palavra de Deus"; At. 8.25 - "tendo falado a palavra do Senhor"; 13.48,49 - "glorificavam a palavra do Senhor: ... a palavra do
Senhor se divulgava"; 19.10,20- "ouviram a palavra do Senhor,... a palavra do Senhor crescia poderosamente"; 1 Co. 1.18-"a palavra da cruz" - designando não um documento, mas uma palavra não escrita; cf. Jr. 1.4 - "veio a mim a palavra do Senhor"; Ez. 1.3 - "veio expressamente a palavra do Senhor a Ezequiel, o sacerdote".
As Escrituras, o padrão final de apelo — A ciência e a Escritura lançam luz uma sobre a outra. O mesmo Espírito divino que deu ambas revelações ainda está presente, capacitando o crente a interpretar uma pela outra e, assim, progressivamente chegar ao conhecimento da verdade. Por causa da nossa adequação e por causa do pecado o registro total das comunicações de Deus passadas na Escritura é mais fidedigna fonte da teologia do que nossas conclusões a partir da natureza ou nossas impressões particulares do ensino do Espírito. A teologia, portanto, encara a própria Escritura como sua principal fonte de material e seu padrão final de apelo.
Existe uma obra interna do Espírito divino através da qual a palavra exterior tornou-se a obra interior e a sua verdade e poder manifestam-se no coração. A Escritura representa a obra do Espírito, não concedendo uma nova verdade, mas uma iluminação da mente para que perceba a plenitude do sentido que se encontra envolto na verdade já revelada. Cristo é "a verdade"
(Jo. 14.6); "em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e ciência" (Cl. 2.3); Jesus diz que o Espírito Santo "há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar" (Jo. 16.14). A encarnação e a cruz expressam o coração de Deus e o segredo do universo; todas as descobertas da teologia são apenas desdobramento da verdade que estes fatos envolvem. O Espírito de Cristo capacita-nos a comparar a natureza com a Escritura e vice-versa e corrigir os equívocos na interpretação de um à luz do outro. Porque a igreja como um todo através da qual entendemos o conjunto dos verdadeiros crentes em toda a parte e em todos os tempos tem a promessa de ser conduzida "em toda a verdade" (Jo. 16.13) é que podemos confiantes esperar o progresso da doutrina cristã.
A experiência cristã às vezes é considerada como uma fonte original de verdade religiosa. Contudo, ela é apenas teste e prova da verdade contida objetivamente na revelação de Deus. A palavra "experiência" deriva de expe- rior, testar, tentar. A consciência cristã não é "norma normans", mas "norma normata". Como a vida, a luz nos vem através da mediação dos outros. Embora esta vem de Deus como realmente aquela, da qual sem hesitação dizemos: "Deus me fez", apesar de termos pais humanos. Como através do encanamento recebo a mesma água que se encontra armazenada nos reservatórios no alto da montanha, assim nas Escrituras eu recebo a verdade que o Espírito Santo originariamente comunicou aos profetas e apóstolos. Calvi- no, Institutes, livro I, cap. 7 - "Como a natureza tem uma manifestação imediata de Deus na consciência, uma manifestação mediata nas suas obras, assim a revelação tem uma manifestação imediata de Deus no Espírito, e mediata nas Escrituras". "A natureza do homem", diz Spurgeon, "não é uma mentira organizada, embora sua consciência interior tenha sido deformada pelo pecado e apesar de que uma vez tenha sido um guia infalível à verdade e ao dever o pecado a fez muito enganadora. O padrão de infalibilidade não está na consciência do homem, mas nas Escrituras. Quando em qualquer matéria a consciência contraria a Palavra de Deus, devemos saber que ela não é a voz de Deus, mas do diabo". Dr. Geoge A. Gordon diz que "a história cristã é a revelação de Cristo adicional ao conteúdo do Novo Testamento". Não deveríamos dizer "ilustrativa", em vez de "adicional"?
H. Bawden: Deus é a autoridade máxima apesar de que existem autoridades delegadas, tais como a família, o estado, a igreja; os instintos, os sentimentos, a consciência; a experiência genérica da raça, as tradições, o valor utilitário; a revelação na natureza e na Escritura. Porém a autoridade de maior valor para os homens na moral e na religião é a verdade a respeito de Cristo contida na literatura cristã. A verdade a respeito de Cristo, encontra-se determinada 1) pela razão humana condicionada pela atitude correta dos sentimentos e da vontade; 2) à luz de toda a verdade derivada da natureza, incluindo o homem; 3) à luz da história do cristianismo; 4) à luz da origem e desenvolvimento das próprias Escrituras. A autoridade da razão em geral e a da Bíblia são correlatas visto que se desenvolveram sob a providência de Deus e esta em grande escala porém como reflexo daquela. Este ponto de vista capacita-nos a uma concepção racional da função da Escritura na religião. Este ponto de vista capacita-nos a raciocinar sobre o que se chama inspiração da Bíblia, natureza e extensão da inspiração, a Bíblia como elemento histórico - registro do desdobramento histórico da revelação; a Bíblia como literatura - compêndio dos princípios de vida, mais do que um livro de regras; a Bíblia cristocêntrica - encarnação do pensamento e da vontade divinos e no pensamento humano e na linguagem".
A teologia da Escritura não é antinatural - Apesar de termos falado que as verdades sistematizadas da natureza constituem a teologia natural, não devemos inferir que a teologia escriturística é fora do natural. Porque as Escrituras têm o mesmo autor que a natureza, os mesmos princípios são ilustrados em uma como na outra. Todas doutrinas da Bíblia têm sua razão na mesma natureza de Deus que constitui a base de todas as coisas materiais. O cristianismo é uma dispensação suplementar, não contradizendo ou corrigindo erros na teologia natural, porém de modo mais perfeito revelando a verdade. O cristianismo é o plano base no qual toda a criação é edificada - a verdade original e eterna cuja teologia natural é apenas uma expressão parcial. Por isso a teologia da natureza e a teologia da Escritura são interdependentes. A teologia natural não só prepara o caminho para a teologia escriturística, mas recebe o estímulo e auxílio dela. A teologia natural pode agora ser uma fonte da verdade, que, antes que a Escritura viesse, ela não poderia fornecer.
John Cairo, Fund. Ideas of Christianity, 23 - "Não existe esta coisa que se chama religião natural ou religião da razão distinta da revelada. O cristianismo é mais profunda, compreensiva e racionalmente, mais concorde com os mais profundos princípios da natureza e pensamento humanos que a religião natural; ou, como podemos situá-lo, o cristianismo é a religião natural engrandecida e feita religião revelada". Peabody, Christianity the Religion of Nature, preleção 2 - "Revelação é o desvendamento, o descobrimento daquilo que antes já existia e exclui a idéia de novidade, de invenção, de criação.... A religião terrena revelada é a religião natural do céu." Compare Ap. 13.8 - "o Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo" = a vinda de Cristo não se fez por mudança; no verdadeiro sentido, a Cruz existiu desde a eternidade; a expiação é a revelação de um fato eterno no ser divino.
Observe a ilustração de Platão da caverna que facilmente pode ser ameaçada por alguém que tinha entrado com uma tocha. A natureza é uma luz embaçada que vem da entrada da caverna; a tocha é a Escritura. Kant para Jacobi, in Jacobi's Werke, 3.523 - "Se o evangelho não tivesse ensinado as leis morais universais, a razão não teria adquirido tão perfeito discernimento delas". Alexander McLaren: "Os pensadores não cristãos falam agora eloqüentemente sobre o amor de Deus e até mesmo rejeitam o evangelho em nome de tal amor, chutando a escada pela qual subiram. Mas foi a cruz que ensinou ao mundo o amor de Deus e independentemente da morte de Cristo os homens podem esperar que haja um coração no centro do universo, mas nunca estão certos dele". O papagaio fantasia que ele ensinou os homens a falar. Do mesmo modo o Sr. Spencer fantasia que inventou a ética. Ele só está empregando o crepúsculo depois que o sol se pôs. Dorner, Hist. Prot. Theol., 252,253 - "Na Reforma, a fé primeiro forneceu certeza científica; daí em diante continuou a banir o ceticismo na filosofia e na ciência".
A Escritura e o Racionalismo
Apesar de que as Escrituras tornam conhecido muito do que está além do poder da razão humana desauxiliada para descobrir ou compreender plenamente seus ensinos, quando tomados juntos, de modo nenhum contradizem uma razão condicionada em sua atividade pelo santo sentimento e iluminada pelo Espírito de Deus. As Escrituras apelam para a razão, em seu amplo sentido, incluindo o poder da mente de reconhecer Deus e as relações morais - não no sentido estrito de um simples raciocínio ou o exercício da faculdade puramente lógica.
O ofício apropriado da razão, neste sentido amplo, é: d) Fornecer-nos as idéias primárias de espaço, tempo, causa, substância, desígnio, justiça e Deus, que são as condições de todo o subseqüente conhecimento, b) julgar com relação à necessidade de uma revelação especial e sobrenatural da parte do homem.
Examinar as credenciais da comunicação que professam ser tal revelação ou dos documentos que professam registrá-la. d) Avaliar e reduzir a um sistema os fatos da revelação quando estes foram achados apropriadamente atestados. e) Deduzir destes fatos suas conclusões naturais e lógicas. Assim a própria razão prepara o caminho para uma revelação acima da razão e garante uma confiança em tal revelação quando dada.
Dove, Logic of the Christian Faith, 318 - A razão termina na proposição: "Conte com a revelação". Leibnitz: "A revelação é o vice-rei que apresenta logo as suas credenciais à assembléia provincial (razão) e, depois, ele mesmo preside". A razão pode reconhecer a verdade depois que ela se tornou conhecida, como por exemplo nas demonstrações da geometria, embora ela nunca possa descobrir a verdade por si mesma, vera ilustração de Calderwood sobre o grupo perdido nos bosques, que toma sabiamente o curso indicado por alguém que se encontra no topo da árvore com maior visão do que a dele (Philosophy of the Infinite, 126). O noviço faz bem em confiar seu guia na floresta ao menos até que aprenda a reconhecer por si mesmo as marcas chamuscadas sobe as árvores. Luthardt, Fund. Thruts, lect. viii - "A razão nunca podia ter inventado um Deus auto-humilhante, tendo como berço uma manjedoura e morrendo numa cruz". Lessing, Zur Geschichte und Litterature (A Respeito da História e da Literatura), 6.134 - "Qual o sentido de uma revelação que não revela nada"?
Ritschl nega que as pressuposições de qualquer teologia baseada na Bíblia como a infalível palavra de Deus por um lado, e na validade do conhecimento de Deus obtido por processos científicos e filosóficos por outro. Porque os filósofos, cientistas e mesmo os exegetas, não concordam entre si, ele conclui que nenhum resultado fidedigno é atingível pela razão humana. Admitimos que a razão sem o amor cairá em muitos erros relativos a Deus e que, por isso, a fé é, portanto, o órgão pelo qual a fé religiosa deve ser apreendida. Reivindicamos que a fé inclui a razão e esta na sua mais elevada forma. A fé critica e julga os processos da ciência natural bem como o conteúdo da Escritura. Mas ela também reconhece, anteriormente, na ciência e na Escritura a operação do Espírito de Cristo que é a fonte e autoridade da vida cristã. Ritschl ignora as relações terrenas de Cristo e, por isso, seculariza e deprecia a ciência e a filosofia. A fé na qual ele confia como a fonte da teologia, sem garantia, está separada da razão. Torna-se um padrão subjetivo e arbitrário ao qual, mesmo o ensino da Escritura deve ter precedência. Sustentamos um ponto de vista contrário; o de que observam-se resultados na ciência e na filosofia e na interpretação da Escritura como um todo e que tais resultados constituem uma revelação que tem autoridade. verÜRR, The Theology of Ritschl; Dorner, Hist. Prot. Theol., 1.233 - "A questionável razão na razão empírica é escrava da fé, que é a verdadeira razão nascente, não confiante em si mesma, mas defensora do cristianismo objetivo".
Por outro lado, o racionalismo sustenta que a razão é a fonte última de toda a verdade religiosa enquanto a Escritura é a autoridade só naquilo que suas revelações concordam com as conclusões prévias da razão ou pode ser demonstrada racionalmente. Cada forma de racionalismo, portanto, comete ao menos um dos seguintes erros: d) O de confundir a razão com o simples raciocínio, ou com o exercício da inteligência lógica, b) O de ignorar a necessidade de um sentimento santo como condição de toda a correta razão nos assuntos religiosos, c) O da negação da nossa dependência das revelações de Deus no nosso estado presente de pecado, d) O de considerar a razão desa- poiada mesmo em seu estado normal e desapaixonado, como capaz de descobrir, compreender e demonstrar toda a verdade religiosa.
Não se deve confundir razão com raciocínio, ou simples arrazoado. Vamos seguir a razão? Sim, mas não o arrazoado individual contra o testemunho dos que têm melhor informação do que nós; nem insistir na demonstração, na qual a evidência provável por si só é possível; nem confiar somente na evidência dos sentidos quando estão em jogo as coisas espirituais. Coleridge, respondendo aos que argumentavam que todo o conhecimento nos vem dos sentidos, diz: "De qualquer modo devemos trazer à luz todos os fatos como os vemos". É isto que o cristão faz. A luz do amor revela muita coisa que, de outra forma, seria invisível. Wordsworth, Excursion, book 5 (598) - "A razão desnuda não deve garantir o apoio da mente. A verdade moral não é uma estrutura mecânica edificada através de regras".
O racionalismo é a teoria matemática do conhecimento. A ética de Spinosa é uma ilustração disso. Ela deduziria o universo a partir de um axioma.
O Dr. Hodge muito erroneamente descreveu o racionalismo como "um abuso da razão". Mais do que isso é o uso de uma razão anormal, pervertida, inadequadamente condicionada; ver Hodge, Syst. Theol., 1.34,39,55, e a crítica de Miller, O Fetiche na Teologia. A expressão "intelecto santificado" apenas significa o intelecto acompanhado de justos sentimentos para com Deus e instruídos na operação sob a influência deles. Bispo Butler: "Observe-se a razão, mas não se deixe que criaturas como nós continuem a opor-se a um esquema infinito a ponto de não vermos a necessidade ou utilidade de todas as suas partes e a isto chamemos razão". Newman Smith, Death's Place in Evolution, 86 - "A descrença é uma haste imersa nas trevas da terra. Afunde- a mais e aparecerá no raio solar do outro lado da terra". As pessoas mais desarrazoadas do mundo são as que dependem exclusivamente da razão, no sentido restrito. "Quanto mais elas exaltam a razão, mais tornam o mundo irracional". "A galinha que choca patinhos anda com eles até à beira da água, mas pára ali e fica assustada quando eles avançam. Do mesmo modo a razão pára e a fé continua encontrando o seu elemento mais adequado no invisível. A razão são os pés que se apoiam na terra sólida; a fé são as asas que nos capacitam a voar; o homem normal é uma criatura que tem asas". Compare yvcòctiç (1 Tm. 6.20 - "falsamente chamada ciência") com ètuyvcüctiç (2 Pe. 1.2 - "conhecimento de Deus e de Jesus, nosso Senhor" = pleno conhecimento, ou verdadeiro conhecimento).
A Escritura e o Misticismo
Como o racionalismo reconhece que muito pouca coisa vem de Deus assim o misticismo reconhece-a excessiva.
O Verdadeiro Misticismo - Vimos que há uma iluminação das mentes de todos os crentes pelo Espírito Santo. Contudo, o Espírito não faz nenhuma revelação nova da verdade já revelada por Cristo na natureza e nas Escrituras. A obra iluminadora do Espírito é, portanto, a de abrir as mentes dos homens para entender as revelações prévias de Cristo. Como um iniciado nos mistérios do cristianismo, cada crente verdadeiro pode ser chamado de místico. O verdadeiro misticismo é o mais alto conhecimento e comunhão que o Espírito Santo concede através do uso da natureza e da Escritura como meio subordinado e principal.
"Místico" = iniciado, de núco, "fechar os olhos" - provavelmente para que a alma possa ter a visão interior da verdade. Porém a verdade divina é um "mistério", não só como algo em que alguém deve iniciar-se, mas como újteppáAAo-uaa tfjç yvioaemç (Ef. 3.19) - ultrapassando o pleno conhecimento, mesmo para o crente; ver Meyer sobre Rm. 11.25 - "Não quero, irmãos, que ignoreis este mistério". Os alemães têm a palavra Mystik com um sentido favorável, Mysticismus com um sentido desfavorável, - correspondendo, respectivamente, ao nosso verdadeiro e falso misticismo. O verdadeiro misticismo é sugerido em João 16.13 - "aquele Espírito da verdade ... vos guiará em toda a verdade"; Ef. 3.9 - "dispensação do mistério"; 1 Co. 2.10 - "Deus no-las revelou pelo seu Espírito". Nitzsch, Syst. Of Christ. Doct., 35 - "Sempre que a verdadeira religião revive, há um clamor contra o misticismo, /'.e., um conhecimento mais elevado, uma comunhão, uma atividade através do Espírito de Deus no coração". Compare a acusação contra Paulo de que ele estava louco, em At. 26.24,25, com a sua própria vindicação em 2 Co. 5.13 - "se enlouquecemos, é para Deus".
Inge, Christian Mysthicism, 21 - "Harnack fala do misticismo como racionalismo aplicado à esfera acima da razão. Ele deveria ter dito razão aplicada à esfera acima do racionalismo. Sua doutrina fundamental é a unidade de toda a existência. O homem pode realizar a sua individualidade apenas transcendendo-a e achando-se na unidade maior do ser divino. O homem é um microcosmo. Ele recapitula a raça, o universo, o próprio Cristo". Ibid., 5 - O misticismo é "a tentativa de realizar no pensamento e no sentimento a ima- nência do temporal no eterno e do eterno no temporal. Isto implica 1) que a alma pode ver e perceber a verdade espiritual; 2) que o homem, para conhecer a Deus, deve ser participante da natureza divina; 3) que, sem a santidade, ninguém pode ver o Senhor; 4) que o verdadeiro hierofante dos mistérios de Deus é o amor. A 'scala perfectionis' é a) a vida purificadora; b) a vida ilumina- tiva; c) a vida unificadora". Stevens, Joanninne TheoL, 239,240 - "O misticismo de João ... não é do tipo subjetivo que absorve a alma na autocontempla- ção e devaneio, mas objetivo e racional, que vive no mundo da realidade, apreende a verdade divinamente revelada e baseia sua experiência nela.
É um misticismo que se alimenta, não dos seus próprios sentimentos e fantasias, mas de Cristo. Envolve uma aceitação e obediência a ele. O seu mote é: Perseverando em Cristo". Como a pressão da força não pode dispensar o tipo, assim o Espírito de Deus não dispensa a revelação externa de Cristo na natureza e na Escritura. E. G. Robinson, Christian Theology, 364, - "A palavra de Deus é uma forma ou molde ao qual o Espírito Santo nos entrega quando nos recria"; cf. Rm. 6.17 - "obedecestes de coração à forma de doutrina a que fostes entregues".
Falso Misticismo - O misticismo, contudo, como se usa comumente o termo, erra ao sustentar a aquisição do conhecimento religioso pela comunicação direta de Deus e da absorção passiva das atividades humanas na divina. Parcial ou totalmente perde de vista à) os órgãos externos da revelação, da natureza e das Escrituras; b) a atividade dos poderes humanos na recepção de todo conhecimento religioso; c) a personalidade do homem e, por conseqüência, a personalidade de Deus.
Em oposição ao falso misticismo, devemos lembrar que o Espírito Santo opera através da verdade revelada exteriormente na natureza e na Escritura (At. 14.17 - "Não se deixou a si mesmo sem testemunho"; Rm. 1.20 - "as suas coisas invisíveis, desde a criação do mundo, ... claramente se vêem";
At. 7.51 - "vós sempre resistis ao Espírito Santo; assim, vós sois como os vossos pais"; Ef. 6.17 - "a espada do Espírito, que é a palavra de Deus"). Através desta verdade já entregue devemos provar toda a nova comunicação que contradiz ou vai além dela (1 Jo. 4.1 - "não creiais em todo espírito, mas provai se os espíritos são de Deus"; Ef. 5.10 - "aprovando o que é agradável ao Senhor"). Através destes testes podemos por à prova o Espiritismo, o Mor- monismo, Swedenborgianismo. Note a tendência mística em Francisco de Sales, em Tomás à Kempis, em Madame Guyon, em Thomas C. Upham. Tais escritores parecem, às vezes, defender uma abnegação insustentável da nossa razão e vontade e uma "absorção do homem em Deus". Mas Cristo não nos priva da razão e da vontade; ele só nos tira a perversidade da nossa razão e o egoísmo da nossa vontade; assim restauram-se a razão e a vontade à sua clareza normal e força. Compare SI. 16.7 - "o Senhor me aconselhou; até o meu coração me ensina de noite" = Deus ensina o seu povo através do exercício das próprias faculdades deste.
O falso misticismo está presente, embora, às vezes, não reconhecido. Toda expectação dos resultados sem o emprego de recursos participa dele. Martineau, Seat of Authorlty, 288 - "A vontade preguiçosa gostaria de ter a visão enquanto o olho que a apreende dorme". Pregar sem preparação é como lançarmo-nos do pináculo de um templo e depender de que Deus mande um anjo a amparar-nos. A Ciência Cristã confiaria em agentes sobrenaturais enquanto deixa de lado os agentes naturais que Deus já providenciou; como se aquele que está se afogando confiasse na oração, recusando-se a agarrar na corda. Usando a Escritura "ad aperturam libri" é como guiar a ação de alguém lançando o dado. Allen, Jonathan Edwards, 171, nota - "Tanto Charles como John Wesley concordavam em aceitar o método morávio de solucionar as dúvidas como curso de uma ação, abrindo a Bíblia ao acaso e considerando a passagem em que o olho se fixou primeiro como uma revelação da vontade de Deus sobre o assunto"; cf. Wedgwood, Life of Wesley, 193;
Southey, Life of Wesley, 1.216. J. G. Paton, Life, 2.74 - "Após muitas orações e lutas e lágrimas, pus-me a sós diante do Senhor e, de joelhos, lancei sorte, com um solene apelo a Deus, e veio a resposta: 'Volte!'". Uma única vez ele fez isso na sua vida, em esmagadora perplexidade, sem encontrar luz vinda do conselho humano. "A quem quer que tenha esta fé", diz ele, "obedeça-lhe".
B. Meyer, Christian Living, 18 - "É um equívoco buscar um sinal do céu; correr de conselheiro a conselheiro; tirar sorte; ou confiar em alguma coincidência fortuita. Isto não significa que Deus não possa revelar a sua vontade desta forma; mas que este é um comportamento duro de um filho para com o Pai. Há um caminho mais excelente", - a saber, o próprio Cristo que é sabedoria e, quando avançamos, é certo que seremos guiados à medida em que se der um novo passo, ou a cada palavra proferida, ou decisão tomada.
O nosso culto deve ser "um culto racional" (Rm. 12.1); a ação cega e arbitrária é inconsistente com o espírito do cristianismo. Este tipo de ação nos torna vítimas de temporário sentimento e presas do engano satânico. No caso de perplexidade, aguardando a iluminação e aguardando a vontade de Deus, freqüentemente nos tornaremos capazes de tomar uma decisão inteligente, porque "o que não é de fé é pecado" (Rm. 14.23).
"O falso misticismo alcançou seu resultado lógico na teosofia budista. Nesse sistema o homem torna-se mais divino na extinção da sua própria pessoa- lidade. Chega-se ao Nirvana através de oito passos do ponto de vista correto, da aspiração, da palavra, da conduta, do viver, do esforço, da mente, do êxtase; Nirvana é a perda da capacidade de dizer: 'Este ser sou eu', e 'Isto é meu'.
Tal foi a tentativa de Hipatéia, através da sujeição própria, ao ser impelida aos braços de Jove. George Eliot equivocava-se quando dizia: 'A mulher mais feliz não tem história'. A autonegação não é auto-anulação. O sino quebrado não tem individualidade. Em Cristo tornamo-nos completos". Cl. 2.9,10-"porque nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade e nele estais perfeitos".
Royce, World and Individual, 2.248,249 - Impõe-se o homem espiritual;
O homem natural é abnegado. A carnalidade do eu é a raiz de todos os males; o eu espiritual pertence ao reino mais elevado. Mas este eu espiritual jaz, a princípio, fora da alma; ele se torna nosso somente pela graça. Platão está certo quando faz das idéias eternas a fonte de toda a verdade e bondade humanas. A sabedoria vem ao homem como o vo-úç de Aristóteles". A. H. Bradford, The Inner Light, ao fazer o ensino direto do Espírito Santo a fonte suficiente senão a única do conhecimento religioso, parece ignorar o princípio da evolução na religião. Deus constrói sobre o passado. A sua revelação aos profetas e apóstolos constitui a norma e correção da nossa experiência individual, mesmo quando a nossa experiência lança novas luzes sobre a revelação.
A Escritura e o Romanismo
Enquanto a história da doutrina, mostrando a progressiva apreensão e desdobramento da verdade contida na natureza e na Escritura da parte da igreja é uma fonte subordinada da teologia, o protestantismo reconhece a Bíblia, sob Cristo, como a autoridade primeira e final.
O Romanismo, por outro lado, comete o duplo erro de a) tomar a igreja, e não a Escritura, a fonte imediata e suficiente do conhecimento religioso; e b i de fazer a relação do indivíduo com Cristo depender de sua relação com a .greja, ao invés de fazer tal relação com a igreja depender, seguir e expressar sua relação com Cristo.
Há no Catolicismo Romano um elemento místico. As Escrituras não são
o completo e final padrão de fé e prática. Deus dá ao mundo, de tempo em tempo, através de papas e concílios, novas comunicações da verdade. Cipriano: "Quem não tem a igreja como sua mãe não tem Deus como seu Pai". Agostinho: "Eu não creria na Escritura, se a autoridade da igreja também me influenciasse''. Francisco de Assis e Inácio de Loyola representam a pessoa verdadeiramente obediente como um morto, movimentando-se só quando movido por seu superior; o verdadeiro cristão não tem vida própria, antes é um instrumento cego da igreja. John Henry Newman, Tracts, Theol. andEccl., 287 - "Os dogmas cristãos estavam na igreja desde o tempo dos apóstolos, - substancialmente sempre foram o que são agora". Mas demonstra-se que isto não é verdade a respeito da concepção imaculada da Virgem Maria; a respeito do tesouro dos méritos distribuídos em indulgências; da infalibilidade do papa (i/erGoRE, Incarnation, 186). Em lugar da verdadeira doutrina, "Ubi Spiritus, ibi ecclesia", o romanismo emprega a máxima, "Ubi ecclesia, ibi Spiritus". Lutero viu nisto o princípio do misticismo quando disse: "Papatus est merus enthusiasmus".
Em resposta ao argumento romanista de que a igreja é antes da Bíblia e que o mesmo corpo que deu a verdade no princípio pode fazer acréscimos à verdade, dizemos que a palavra não escrita existiu antes da igreja e possibilitou esta mesma igreja. A palavra de Deus existiu antes que fosse escrita e por aquela palavra os primeiros discípulos bem como os posteriores foram gerados (1 Pe. 1.23 - "fostes regenerados ... mediante a palavra de Deus").
A contextura da verdade na doutrina católica romana se expressa em 1 Tm. 3.15
"a igreja do Deus vivo, a coluna e firmeza da verdade" = a igreja é a procla- madora da verdade, eleita por Deus; cf. Fp. 2.16 - "retendo a palavra da vida". Mas a igreja só pode proclamar a verdade edificada sobre a verdade. Deste modo podemos dizer que a República Americana é a coluna e base da liberdade no mundo; mas isto só é verdade desde que a República seja edificada no princípio da liberdade como seu alicerce. Quando o romanista pergunta: "Onde estava a sua igreja antes de Lutero?" o protestante pode retrucar: "Onde estava o seu rosto antes de você lavá-lo? Onde estava a farinha antes que o trigo fosse para o moinho?" Lady Jane Grey, três dias antes da sua execução, em 12 de fevereiro de 1554, disse: "A minha fé está fundamentada na palavra de Deus, não na igreja; pois, se a igreja for boa, a sua fé deve ser testada pela palavra de Deus, e não a palavra de Deus ser testada pela palavra da igreja, nem ainda a minha fé".
A Igreja Romana queria manter os homens em perpétua infância - fazendo-os ir a ela em busca da verdade, ao invés de ir diretamente à Bíblia; "como a mãe tola que guarda o menino em casa para que não tope o seu artelho; e quer amá-lo mais fazendo-o permanecer sempre um bebê e assim continuar sendo a sua mãe". Martensen, Christian Dogmatics, 30 - "O romanismo está de tal modo preocupado com a construção de um sistema de salvaguardas que esquece a verdade do Cristo que ela quer garantir". George Herbert: "Que desastre pode causar-lhe qualquer lugar, Cuja casa é repugnante enquanto ele adora a sua vassoura!" É uma doutrina meio parasita de segurança sem inteligência ou espiritualidade. O romanismo diz: "O homem para a máquina!" O protestantismo: "A máquina para o homem!" O catolicismo reprime a individualidade; o protestantismo devolve-a. Não obstante o princípio romanista aparece em igrejas ditas protestantes. O catecismo publicado pela Liga da Santa Cruz, da Igreja Anglicana, contém o seguinte: "Só ao sacerdote a criança deve confessar seus pecados, se desejar que Deus lhes perdoe. Sabe por quê? É porque Deus, quando na terra, deu aos seus sacerdotes, e só a eles, o poder de perdoar pecados. Vá ao sacerdote, que é o médico da sua alma e que cura em nome de Deus". Mas isto contradiz Jo. 10.7 - "eu sou a porta"; e 1 Co. 3.11 - "ninguém pode pôr outro fundamento além do que já está posto, o qual é Jesus Cristo" = atinge-se a salvação pelo acesso imediato a Cristo e não há nenhuma porta entre a alma e ele.
LIMITAÇÕES DA TEOLOGIA
Apesar de a Teologia derivar seu material da dúplice revelação de Deus, ela não professa dar um exaustivo conhecimento de Deus e de suas relações com o universo. Depois de mostrar que material temos, devemos mostrar que material não temos. Já indicamos as fontes da Teologia; examinaremos agora suas limitações. São elas:
Nafinitude do entendimento humano
Isto dá surgimento a uma classe de mistérios necessários, ou mistérios em conexão com a infinitude e incompreensibilidade da natureza divina (Jó 11.7; Rm. 11.33).
Jó 11.7 - "alcançarás tu os caminhos de Deus, ou chegarás à perfeição do Todo-poderoso?" Portanto, cada doutrina tem seu lado inexplicável. Eis aqui o sentido próprio das palavras de Tertuliano: "Certum est, quia impossibile est; quo absurdius eo verius"; de Anselmo: "Credo ut intelligam"; e de Abelardo: "Qui credi cito, levis corde est". Drummond, Nat. Law in Spirit World: "Desconhece-se a ciência sem mistério; é absurdo uma religião sem mistério". E. G. Robinson: "Um ser finito não pode captar até mesmo suas próprias relações com o Infinito". Hovey, Manual of Christ. Theol., 7-"Inferir da perfeição de Deus que todas as obras [natureza, homem, inspiração] serão absoluta e imutavel- mente perfeitas; inferir do perfeito amor de Deus que não pode haver pecado algum ou sofrimento no mundo; inferir da soberania de Deus que o homem não é um agente moral livre; - tudo isso é precipitação; são inferências a partir da causa para o efeito enquanto se conhece a causa de um modo imperfeito".
No estado imperfeito da ciência natural e metafísica
Isto dá surgimento a uma classe de mistérios acidentais, ou mistérios que consistem na natureza aparentemente irreconciliável das verdades que, tomadas separadamente, são perfeitamente compreensíveis.
Somos vítimas de um astigmatismo, que permite ver só um ponto da verdade como se fossem dois. Vemos Deus e homem, sabedoria divina e liberdade humana, o natural e o sobrenatural, respectivamente, como dois fatos desconexos, quando numa visão talvez mais profunda seria apenas uma.
A astronomia tem suas forças centrípetas e centrífugas, embora sejam indubitavelmente uma só. A criança não pode segurar duas laranjas ao mesmo tempo na sua mãozinha. Disse um pregador negro: "Você não pode carregar duas melancias debaixo de um braço". Shakespeare, Antony and Cleopatra,
- "No infinito livro secreto da natureza, Eu, pequenino, leio". Cooke, Cre- dentials of Sciense, 34 - "O progresso do homem na ciência tem sido tão constante e rapidamente acelerado que se tem obtido mais durante a vida do ser humano que durante toda a sua história passada". E, contudo, podemos dizer com D'Arcy, Idealism and Theology, 248 - "A posição do homem no universo é excêntrica. Só Deus é o centro. Só em torno dele orbita a verdade completamente exposta. ... Há circunstâncias em que para nós o momento adiante da verdade pode parecer retrocesso".
Na inadequação da língua
Porque a língua é um meio pelo qual se expressa e se formula a verdade, a invenção de um vocabulário na Teologia, como em cada uma das outras ciências, é condição e critério de seu progresso. As Escrituras reconhecem uma dificuldade peculiar no emprego das verdades espirituais em linguagem terrena (1 Co. 2.13; 2 Co. 3.6; 12.4).
Co. 2.13-"não com palavras ensinadas pela sabedoria humana"; 2 Co. 3.6
"a letra mata"; 12.4 - "palavras inefáveis". Deus se submete a condições de revelação; cf. Jo. 16.12 - "Tenho ainda muita coisa que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora". Tem de ser criada a linguagem. As palavras tem de ser tomadas do emprego comum e ser postas numa aplicação mais ampla e sagrada de modo que "variem sob o peso do sentido" - p.ex., a palavra "dia", em Gn. 1, a palavra àyáTtri em 1 Co. 13. i/erGouLD, 1 Co. 13.12
"agora vemos como em espelho obscuramente" - metálico, cuja superfície é obscura e cujas imagens são obscuras = Agora contemplamos a Cristo, a verdade, apenas refletido na fala imperfeita - "mas então face a face" = imediatamente, sem a intervenção de um meio imperfeito. "Tão veloz como um túnel num banco de areia do pensamento, as pedras da linguagem devem ser construídas em paredes e arcos, para um futuro progresso rumo à mina ilimitada".
No nosso conhecimento incompleto das Escrituras
Porque não é a simples letra das Escrituras que constitui a verdade, o progresso da Teologia depende da Hermenêutica, isto é, da interpretação da Palavra de Deus.
Note o progresso ao comentar, do homilético ao gramatical, ao histórico, ao dogmático, ilustrado em Scott, Ellicott, Stanley, Lightfoot. John Robinson:
"Na verdade estou persuadido de que o Senhor tem mais verdade ainda para revelar a partir da sua palavra". Uma crítica recente mostrou a necessidade de estudar cada porção da Escritura à luz da sua origem e conexões. Tem havido uma evolução na Escritura, tão verdadeira como na ciência natural e o Espírito de Cristo que estava nos profetas causou um progresso desde a expressão germinal e típica até a completa e clara. Contudo, ainda necessitamos de apresentar a oração do SI. 119.18 - "Desvenda os meus olhos para que eu veja as maravilhas da tua lei".
No silêncio da revelação escrita
Para nossa disciplina e prova, muito se nos oculta, do que podemos compreender com nossas atuais forças.
Exemplo de silêncio da Escritura sobre a vida e morte da Virgem Maria, o aparecimento pessoal de Jesus e suas realizações no começo da sua vida, a origem do mal, o método de expiação, o estado depois da morte. A mesma coisa sobre questões sociais e políticas, tais como a escravidão, o tráfico de bebida alcoólica, virtudes domésticas, corrupção dos governantes. "Jesus estava no céu na revolta dos anjos, embora ele nos conte pouca coisa a respeito dos anjos ou do céu. Ele não faz discurso a respeito do Éden, ou de Adão, ou da queda do homem, ou da morte como resultado do pecado de Adão; e pouco diz dos espíritos desencarnados, se estão perdidos ou salvos". Foi melhor inculcar princípios e incumbir aos seus seguidores a sua aplicação. Seu evangelho não pretendia gratificar uma vã curiosidade.
Ele não desviaria a mente dos homens de perseguir uma coisa necessária; cf. Lc. 13.23,24 - "Senhor, são poucos os que se salvam? E ele lhes respondeu: Porfiai por entrar pela porta estreita, porque eu vos digo que muitos procurarão e não poderão". O silêncio de Paulo sobre questões especulativas que ele deve ter ponderado com absorvedor interesse é a prova da sua inspiração divina. Cf. Jo. 13.7 - "O que eu faço não o sabes tu, agora, mas tu o saberás depois". A coisa mais bela no rosto é aquilo que um quadro nunca pode expressar. Aquele que podia falar bem podia omitir bem. Story: "A parte silenciosa é a melhor de cada obra nobre; De todas expressões que não podem ser expressas". Cf. 1 Co. 2.9 - "As coisas que os olhos não viram e os ouvidos não ouviram e não subiram ao coração do homem são as que Deus preparou para os que o amam"; Dt. 29.29 - "As coisas encobertas são para o Senhor, nosso Deus; porém as reveladas são para nós e para os nossos filhos".
6. Na falta de discernimento espiritual causada pelo pecado
Porque o sentimento santo é condição do conhecimento religioso, toda a imperfeição moral no cristão individualmente, bem como na igreja, serve como embaraço na operação de uma Teologia completa.
Jo. 3.3 - "aquele que não nascer de novo não pode ver o reino de Deus".
As eras espirituais produzem mais progresso para a teologia - é o testemunho da metade do século após a Reforma e a metade do século após o grande avivamento na Nova Inglaterra na época de Jonathan Edwards. Ueberweg, Logic (trad. de Lindsay), 514 - "A ciência tem sofrido muita influência da vontade; e a veracidade do conhecimento depende da pureza da consciência.
A vontade não tem poder algum para resistir à evidência científica; mas não se obtém evidência científica sem a lealdade contínua à vontade". Lorde Bacon declara que o homem não pode entrar no reino da ciência do mesmo modo que não se pode entrar no reino do céu sem se tornar uma criança. Darwin descreve a sua própria mente como tendo se tornado uma espécie de máquina de triturar as leis gerais das grandes coleções de fatos que resultam na "atrofia da parte do cérebro de que dependem os mais elevados sabores". Porém é possível semelhante atrofia anormal no caso da faculdade moral e religiosa (yerGoRE, Incarnation, 37). O Dr. Allen diz na sua tntrod. Lecture at Lane Theol. Seminary. "Estamos muito alegres ao vê-los na qualidade de estudantes; mas as cadeiras dos professores estão todas ocupadas".
OI. RELAÇÕES DO MATERIAL COM O PROGRESSO DA TEOLOGIA
E impossível um sistema perfeito de teologia
Não temos esperança de construir tal sistema. Toda a ciência apenas reflete a presente aquisição da mente humana. Nenhuma ciência é completa ou conclusa. Aconteça o que acontecer com as ciências da natureza e do homem, nunca se chegará a um conhecimento exaustivo da ciência de Deus. Não podemos esperar que se demonstrem todas as doutrinas apoiados em bases racionais, ou mesmo em cada caso ver o princípio de conexão entre elas. Onde não podemos fazer isto, devemos, como em cada uma das outras ciências, estabelecer os fatos revelados em seus respectivos lugares e aguardar mais luz, ao invés de ignorá-las ou rejeitar qualquer uma delas porque não as podemos entendê-las ou não podemos entender a sua relação com as outras partes do nosso sistema.
Três problemas insolúveis os egípcios transmitiram à nossa geração:
1) a duplicação do cubo; 2) a trissecção do ângulo; 3) a quadratura de um
círculo. Dr. Johnson: "Os dicionários são como vigias; o pior é melhor do que nenhum; não se pode esperar que seja perfeitamente verdadeiro". Hood fala da "Contradição" do Dr. Johnson, tanto "interior" quanto "exterior". Sir William Thomson (Lorde Kelvin) no qüinquagésimo aniversário de magistério disse: "Uma palavra carateriza o mais árduo esforço para o avanço da ciência que eu, persistentemente, fiz por cinqüenta e cinco anos: a palavra é falha; eu não entendo mais de energia elétrica e magnética ou das relações entre o éter, a eletricidade e a matéria ponderável, ou de afinidade química, do que sei e tentei ensinar os meus alunos de filosofia natural cinqüenta anos atrás em minha primeira sessão como professor". Allen, Religious Progress, menciona três tendências. "A primeira delas diz: Destrua o novo! A segunda diz: Destrua o velho! A terceira diz: Não destrua nada! Deixe o velho gradual e silenciosamente desenvolver-se rumo ao novo, como queria Erasmo. Devemos aceitar as contradições quer sejam intelectualmente solucionáveis quer não.
A verdade nunca prosperou forçando alguma 'via media'. A verdade se encontra mais na união das proposições opostas, como divindade e humanidade de Cristo e graça e liberdade. Blanco partiu de Roma para a infidelidade; Orestes Brownson da infidelidade para Roma; assim os irmãos John Henry Newman e Francis W. Newman, e os irmãos George Herbert de Bemerton e Lorde Herbert de Cherbury. Um queria secularizar o divino, o outro divinizar o secular. Mas se um estava certo, o outro também. Adotemos ambos. Todo progresso é uma penetração mais profunda no sentido da antiga verdade e sua maior apropriação".
Apesar de tudo isso a teologia é progressiva
É progressiva no sentido de que nosso entendimento subjetivo dos fatos pode e na verdade se aperfeiçoa. Porém a Teologia não é progressiva no sentido de que seus fatos objetivos mudam, quer em número, quer em sua natureza. Com Martineau podemos dizer: "A religião tem sido rejeitada como não sendo progressiva; sendo imperecível, tem feito correções". Apesar de o nosso conhecimento poder ser imperfeito, ainda terá grande valor. Nosso sucesso em construir uma Teologia dependerá da proporção que os fatos claramente expressos da Escritura têm para com as simples inferências e sobre o grau em que elas são coerentes a respeito de Cristo, pessoa e tema centrais.
O progresso da teologia está na apreensão da parte do homem, não no progresso da comunicação da parte de Deus. A originalidade na astronomia não está na criação de novos planetas, mas na descoberta dos que nunca foram vistos antes, ou no esclarecimento das relações entre aqueles de cuja existência nunca se suspeitara. Robert Kerr Eccles: "A originalidade é um hábito de se voltar às origens - o hábito de garantir a experiência pessoal através da sua aplicação a fatos originais. Não se trata de uma inferência a partir de coisas novas quer da natureza, quer da Escritura, quer da consciência; em vez disso é o hábito de recorrer a fatos primitivos e garantir as expe-
riências pessoais que surgem do contato com tais fatos". Fisher, Nat. And Meth. Of Revelation, 48 - "Os céus estrelados são agora o que eram desde a antigüidade; não há um aumento no universo estelar, a não ser que surja através do aumento da capacidade e emprego do telescópio". Não podemos imitar o ingênuo marinheiro que, quando começou a dirigir, disse que tinha "navegado através daquela estrela".
Martineau, Types, 1.492,493 - "A metafísica desde que seja verdadeira no seu desempenho, é estacionária, exatamente porque trata não do que começa ou do que termina, mas do que sempre é.... É absurdo louvar o movimento porque sempre faz o caminho, enquanto zomba do espaço porque ele ainda é o que sempre foi: como se o movimento que você prefere pudesse existir, sem o espaço que você reprova". Newman Smith, Christian Ethics, 45,67-70,79
"O verdadeiro conservadorismo é o progresso que provém do passado e cumpre o que é bom; o falso conservadorismo é uma limitadora e desesperançada volta ao passado, e que trai a promessa do futuro. Jesus não veio 'destruir a lei ou os profetas'; ele não veio 'destruir, mas cumprir' (Mt. 5.17).... O último livro sobre a Ética Cristã não será escrito antes do Dia do Juízo". John Milton, Areopagitica: "A verdade é comparada na Escritura a uma fonte corrente; se as suas águas não fluírem em progressão perpétua, elas adoecerão na lagoa lodacenta da conformidade e tradição. O homem pode ser um herege na verdade". Paulo em Rm. 2.16 e 2 Tm. 2.8 - menciona o "meu evangelho". É dever de cada cristão ter seu próprio conceito sobre a verdade, conquanto respeite os dos outros. Não esperamos novos mundos, nem necessitamos de esperar novas Escrituras; mas podemos esperar progresso na interpretação de ambos. Os fatos findam, a interpretação não.
Capítulo III MÉTODO DA TEOLOGIA
REQUISITOS PARA O ESTUDO DA TEOLOGIA
Os requisitos para o bem sucedido estudo da Teologia já foram em parte indicados quando se falou das suas limitações. Em que pese alguma repetição, contudo, mencionamos os seguintes:
Uma mente disciplinada
Só essa mente pode, com paciência, coletar os fatos, sustentar em suas mãos muitos fatos de uma vez, inferir através de contínua reflexão seus princípios que estabelecem conexão, suspender um julgamento final até que suas conclusões sejam verificadas pela Escritura e pela experiência.
Robert Browning, Ring and Book, 175 (Pope, 228) - "A verdade não está em nenhum lugar, embora esteja em todos, nisto; Não em uma porção absoluta, apesar de evoluída pelo todo: por fim evolui dolorosamente, sustentada por mim de modo vigoroso". Os mestres e alunos podem dividir-se em duas classes: 1) os que já conhecem o suficiente; 2) os que querem aprender mais do que conhecem agora. O lema da Escola de Winchester na Inglaterra: "Dis- ce aut discede" [N.T.: Estuda ou retira-te]. Butcher, Greek Genius, 213,230 - "Os sofistas fingiam que estavam comunicando educação quando somente estavam transmitindo resultados. Aristóteles ilustra o método deles, dando o exemplo do sapateiro que, professando ensinar a arte de fazer sapatos indo- lores, põe na mão do aprendiz um grande sortimento de sapatos já prontos.
Um espirituoso francês põe na mesma classe os que supostamente tornam popular a ciência, inteligível a metafísica e respeitável o vício. A palavra oxóA/n, que, inicialmente, significava 'ócio', daí 'discussão filosófica', e, finalmente, 'escola', mostra o puro amor do aprendizado entre os gregos". Robert G. Ingersoll dizia que, em média, o clero provincial é como a terra do Potomac na fala de Tom Randolph, quase indigna do seu estado original e transformada totalmente assim pela cultura. Lotze, Metaphysics, 1.16 - "o amolar constante da faca é tedioso se ela não se dispõe a cortar". "Fazer os seus deveres é apenas uma diversão", é a descrição que Tucídides apresenta sobre o caráter ateniense. Chitty perguntou a um pai sobre as qualificações da lei: "O seu filho pode comer serragem sem manteiga?"
Um hábito mental intuitivo distinto de um outro simplesmente lógico
ou, confiar nas convicções primitivas assim como em seu processo de raciocínio. O teólogo deve ter insight (N.T.: discernimento), assim como entendimento. Ele deve acostumar-se a ponderar os fatos espirituais bem como os sensoriais e materiais; a ver estas coisas em suas relações interiores como também em suas formas exteriores; acalentar confiança na realidade e unidade da verdade.
Vinet, Outlines of Philosophy, 39,40 - "Se eu não sinto que o bem é bem quem o provará a mim?" Pascal: "A lógica, que é uma abstração, pode abalar tudo. Um ser puramente intelectual será irremediavelmente cético". Calvino: "Satanás é um teólogo refinado". Algumas pessoas vêem uma mosca na porta de um celeiro à uma milha de distância, e não vêem a porta. Zeller, Outlines of Greek Philosophy, 93 - "O sofista Górgias era capaz de mostrar, metafisicamente, que nada existe; que não podemos conhecer aquilo que existe; e que aquilo que conhecemos não se pode transmitir aos outros" (citado por Wenley, Sócrates and Christ, 28). Aristóteles diferia dos moderados que pensavam ser impossível passar pelo mesmo rio duas vezes, - sustentava que isto não podia ser feito nenhuma vez (cf. Wordsworth, Prelude, 536). Dove, Logic ofthe Christian Faith, 1-29 e especialmente 25, dá uma demonstração da impossibilidade do movimento: Uma coisa não pode mover-se no lugar onde está; não pode mover-se nos lugares onde não está; mas o lugar onde está e os lugares onde não está são os lugares que existem; por isso uma coisa não pode mover-se. Hazard, Man a Creative First Cause, 109, mostra que o fundo de um poço não se move porque não recua tão rápido como o topo também não avança. Uma fotografia instantânea torna a parte superior uma mancha confusa enquanto ele se refere à parte inferior distintamente visível. Abp. Whately: Os argumentos fracos freqüentemente são confiados diante do meu caminho; porém, embora não sejam mais substanciais, não é fácil destruí-los. Não se conhece proeza mais difícil do que cortar uma almofada com uma espada". Cf. 1 Tm. 6.20 - "oposições da falsamente chamada ciência";
- "que o bispo seja ... sóbrio" - amcppuv = "bem equilibrado". A Escritura fala da "sã [-òyvnç = sadia] doutrina" (1 Tm. 1.10). Contraste com 1 Tm. 6.4 - [voctôv = doentia] "delira acerca de questões e contendas de palavras".
Conhecimento das ciências física, mental e moral
O método para conceber e expressar a verdade da Escritura é assim afetado por nossas noções elementares de tais ciências e as armas com as quais a Teologia é atacada e defendida são tão freqüentemente tiradas dos arsenais que o estudante não pode permitir-se ignorá-las.
Goethe explica sua própria grandeza através da fuga da metafísica: Mein Kind, Ich habe es klug gemacht: Ich habe nie über's Denken gedacht" - "Meu filho, tenho sido sábio em nunca pensar em torno de uma coisa"; ele teria sido mais sábio se tivesse ponderado mais profundamente nos princípios fundamentais da sua filosofia. Muito do sistema teológico caiu, como Campanile em Veneza, porque os seus alicerces eram inseguros. Sir William Hamilton: "Nenhuma dificuldade levanta na teologia aquilo que antes não tinha emergido na filosofia". N. W. Taylor: "Dá-me um moço na metafísica e eu não terei preocupação com ele em teologia". Presidente Samson Talbot: "Amo a metafísica, porque ela trata de realidades". A máxima "Ubi tres mediei, ibi duo athei" (Onde há três médicos, lá estão dois ateus), atesta a verdade das palavras de Galeno: ãpia-coç iatpòç kccí (piAóaoípoç - "o melhor médico é também filósofo".
A teologia não pode dispensar a ciência nem a ciência pode dispensar a filosofia. E. G. Robinson: "A ciência não invalidou qualquer verdade fundamental da revelação, embora tenha modificado a afirmação de muitos. ... A ciência física, sem dúvida, chocar-se-á na cabeça de alguns dos nossos deuses de barro e quanto mais depressa melhor". Há grande vantagem para o pregador em dedicar-se, como o fez Frederick W. Robertson, a uma ciência após outra.
A química entrou na sua estrutura mental, como dizia ele, "como o ferro no sangue".
Conhecimento das línguas originais da Bíblia
Isto é necessário para capacitar-nos não só a determinar o sentido dos termos fundamentais da Escritura, tais como, santidade, pecado, propiciação, justificação, mas, também, a interpretar declarações da doutrina através das suas conexões com o contexto.
Emerson dizia que o homem que lê um livro numa língua estrangeira, quando pode ler numa boa tradução, é um tolo. O Dr. Behrenos retruca que é tolo quem se satisfaz com o substituto. E. G. Robinson: "A língua é um grande organismo e nenhum estudo disciplina a mente como dissecção de um organismo". Crisóstomo: "Eis a causa de todos os males - o nosso desconhecimento das Escrituras". Contudo, um erudito moderno disse: "A Bíblia é o mais perigoso de todos os dons que Deus concedeu ao homem". É possível adorar a letra enquanto deixamos de perceber o espírito. Uma interpretação bitolada pode contradizer o seu sentido. Depende muito da conexão das expressões, como por exemplo, o Sià toíjto e écp' cp, em Rm. 5.12. O Prof. Philip Linosley, de Princeton, 1813-1853, dizia aos seus alunos: "Um dos melhores preparos para a morte é o conhecimento integral da gramática grega". Erasmo, na sua juventude: "Quando recebo algum dinheiro, adquiro alguns livros de Grego e, depois disso, algumas roupas". As línguas mortas, na verdade, são vivas - livres do perigo do falso entendimento provindo da mudança do emprego.
A Providência divina pôs a revelação em formas fixas no Hebraico e no Grego. Sir Williams Hamilton, Discussions, 330 - "Ser um teólogo competente é, de fato, ser um erudito".
Afeição santa para com Deus
Só o coração renovado pode adequadamente sentir sua necessidade da revelação divina ou entender tal revelação quando concedida.
SI. 25.14 - "O segredo do Senhor é para os que o temem"; Rm. 12.2 - "para que experimenteis qual seja ... a vontade de Deus"; cf. SI. 36.1 - "A prevaricação do ímpio fala no íntimo do seu coração". "Não é o cérebro, mas o coração que chega ao altíssimo". "Aprender de cor é mais que aprender através da mente, ou da cabeça (N. Trad.: "de cor" é uma locução que, em Latim, significa de coração, ou relativo ao coração, ou a partir do coração). Toda heterodoxia (N.Trad.:ía\sa doutrina) é precedida da heteropraxia (N.Trad.: falsa prática, ou comportamento). No "Peregrino", de Bunyan, o Fiel não atravessa o Pantanal do Desânimo, como fez o Cristão; e ao atravessar por cima da cerca, deve achar um caminho mais fácil para que o Cristão e o Esperançoso entrem no Castelo da Dúvida e se entreguem nas mãos do Gigante Desespero. "Grandes pensamentos vêm do coração", diz Vauvenargues.
O pregador não pode, como fazia o Dr. Kane, acender uma fogueira com lente de gelo. Aristóteles: "O poder de alcançar a verdade moral depende de agirmos com justiça". Pascal: "Conhecemos a verdade, não só pela razão, mas pelo coração.... O coração tem razões que a razão desconhece". Hobbes: Até mesmo os axiomas da geometria seriam questionados se as paixões humanas não se preocupassem com eles". Macaulay: "A lei da gravidade ainda seria controvertida se ocorresse a interferência de interesses pessoais". Nor- dau, Degeneratiorr. "Os sistemas filosóficos somente apresentam as desculpas que a razão demanda para os impulsos da raça durante um dado período".
Lorde Bacon: "Uma tartaruga no seu passo normal vence um corredor no seu passo errado". Goethe: "Tais são as inclinações como as opiniões.... A cabeça só pode compreender uma obra de arte com a acessória do coração. ... Só a lei pode dar-nos liberdade". Fichte: "Nosso sistema de pensamento mui freqüentemente é a história do coração. ... A verdade descende da consciência.
... A vontade dos homens não atende a sua razão, mas a razão é que atende a sua vontade". O lema de Neander era: "Pectus est quod theologum facit" - "O coração é que faz o teólogo". John Stirling: "Terrível é o olho que pode dividir-se a partir de um vivo coração celestialmente humano, e ainda conservar sua visão introspectiva, - tal como o olho das Górgonas". Porém acrescentamos que esse olho não é introspectivo. E. G. Robinson: "Nunca estude Teologia com sangue frio". W. C. Wilkinson: "A cabeça é uma agulha magnética cuja verdade aponta para um dos pólos. Mas o coração é uma massa de ferro magnético oculta. A cabeça é atraída para o seu pólo natural, a verdade; mas a maior parte é atraída pelo magnetismo mais próximo".
A influência iluminadora do Espírito Santo
Como somente o Espírito sonda as coisas de Deus, só ele pode iluminar nossas mentes para apreendê-las.
Co. 2.11,12 - "ninguém sabe as coisas de Deus senão o Espírito de Deus. Mas ... foi-nos dado o espírito que provém de Deus, para que pudéssemos conhecer". Cícero, Natura Deorum, 66 - Nemo igitur vir magnus sine aliquo adflato divino unquam fuit". Prof. Beck de Tübingen: "Para o estudante não há nenhum caminho privilegiado que conduz à verdade; o único é o mesmo do inculto; é o da regeneração e da gradual iluminação através do Espírito Santo; sem ele, a teologia não só é uma pedra fria, como um perigoso veneno". Como todas as verdades dos cálculos diferenciais e integrais estão envoltas no mais simples axioma da matemática, do mesmo modo toda a teologia está compreendida na declaração de que Deus é santidade e amor, ou no proto-evangelho proferido nos portais do Éden. Entretanto, as mentes embotadas não podem por si mesmas desenvolver os cálculos a partir do axioma, nem os corações pecadores desenvolver a teologia a partir da primeira profecia. É preciso que os mestres demonstrem os teoremas geométricos, e que o Espírito Santo nos mostre que o "novo mandamento", ilustrado na morte de Cristo, é o único "antigo mandamento que tivestes desde o princípio" (1 Jo. 2.7). Os Princípios de Newton são uma revelação de Cristo do mesmo modo que as Escrituras. O Espírito Santo nos capacita a penetrar no sentido das revelações de Cristo tanto na Escritura como na natureza; a interpretar uma através da outra; e assim elaborar as demonstrações e aplicações originais da verdade; Mt. 13.52 - "Por isso, todo escriba instruído acerca do Reino dos céus é semelhante a um pai de família que tira do seu tesouro coisas novas e velhas".
DIVISÕES DA TEOLOGIA
Comumente a Teologia se divide em Bíblica, Histórica, Sistemática e Prática.
A Teologia Bíblica tem como alvo ordenar e classificar os fatos da revelação limitando-se às Escrituras quanto ao seu material e tratando a doutrina só na medida em que ela se desenvolveu até o fim da era apostólica.
Por exemplo: De Wette, Biblische Theologie; Hofmann, Schríftbeweis; Nitzsch, System of Chrístian Doctrine. Contudo, esta última tem mais de elemento filosófico do que de Teologia Bíblica. O terceiro volume de Justificação e Reconciliação pretende ser um sistema de Teologia Bíblica; o primeiro e segundo volumes são pouco mais do que uma introdução histórica. Mas a metafísica, de realidade e fenomenalismo kantianos, penetra tão grandemente na avaliação e interpretações de Ritschl, que torna suas conclusões parciais e racionalistas. Observe um emprego questionável do termo Teologia Bíblica para designar a parte da teologia de uma parte da Escritura separada do resto, como na Teologia Bíblica do Velho Testamento de Steudel; Teologia Bíblica do Novo Testamento de Schmidt e nas expressões comuns: Teologia Bíblica de Cristo, ou de Paulo. Estas expressões são passíveis de objeção ao indicar que os livros da Escritura têm uma origem humana. Aceitando a hipótese de que não há uma autoria divina comum da Escritura, concebe-se a
Teologia Bíblica como uma série de fragmentos correspondentes a diferentes ensinos dos vários profetas e apóstolos e sustenta-se que a teologia de Paulo não tem garantia e é um acréscimo incôngruo à teologia de Jesus.
A Teologia Histórica traça o desenvolvimento das doutrinas bíblicas desde o tempo dos apóstolos até os nossos dias e dá conta dos resultados deste desenvolvimento na vida da igreja.
O desenvolvimento doutrinário é o progressivo desenvolvimento e absorção que a igreja assume da verdade explícita e implicitamente contida na Escritura. Ao explicar a forma da fé cristã nas declarações doutrinárias, a Teologia Histórica é chamada História da Doutrina. Ao descrever o resultado e acompanhamento das mudanças exteriores e interiores na vida da igreja, a Teologia Histórica é chamada História da Igreja.
A Teologia Sistemática toma o material fornecido pelas Teologias Bíblica e Histórica e, com este material, busca edificar um todo orgânico e consistente do nosso conhecimento de Deus e de suas relações com o universo, quer este conhecimento seja originariamente derivado da natureza, quer das Escrituras.
Por isso a Teologia Sistemática é chamada teologia propriamente dita; a Teologia Bíblica e a Histórica são seus estágios incompletos e preparatórios. Deve-se distinguir a Teologia Sistemática da Teologia Dogmática. No emprego estrito, Teologia Dogmática é a sistematização das doutrinas expressas nos símbolos da igreja, associando a sua base às Escrituras e à apresentação, até onde possível, da sua necessidade racional. Por outro lado, a Teologia Sistemática não começa com os símbolos, mas com as Escrituras. Ela não indaga primeiro qual a crença da igreja, mas qual a verdade de Deus revelada na sua palavra. Examina a palavra com todos os acessórios que a natureza e o Espírito lhe deram, utilizando a Teologia Bíblica e a Histórica não como mestras, mas como suas servas e auxiliares. Note aqui o emprego técnico da palavra "símbolo", de au"ipáX,X,a>, = breve lançamento conjugado, ou afirmação condensada da essência da doutrina cristã. Sinônimos: Confissão, credo, consenso, declaração, formulário, cânones, artigos de fé.
O dogmatismo estimula os resultados inevitáveis. Contudo, dogmatismo não deriva de "dog", como jovialmente sugere Douglas Jerrold quando diz que "o dogmatismo é o caninismo na plenitude do seu desenvolvimento", mas de 5oKém, penso, opino. A Teologia Dogmática tem dois princípios: 1) A autoridade absoluta dos credos, nas decisões da igreja; 2) A aplicação de tais credos da lógica formal com o propósito de demonstrar sua verdade, visando ao entendimento. Na Igreja Católica Romana, a autoridade decisiva não se encontra na Escritura, mas na igreja e no dogma dado por ela. Contrariamente, o princípio protestante é que a Escritura decide e é ela que julga o dogma. Seguindo Schleiermacher, Albert Schweitzer defende o pensamento de que o
termo "Dogmatik" deve ser descartado como essencialmente anti-protestante e que "Glaubenslehre" deve ocupar o seu lugar; e Harnack, Hist. Dogma, 6, assinala que o "dogma sempre, no progresso da história, tem devorado seus progenitores". Conquanto seja verdadeiro que cada novo e avançado pensador na teologia tem sido contado como herege, sempre tem havido uma fé comum "a fé que uma vez foi dada aos santos" (Jd. 3) - e o estudo da Teologia Sistemática tem sido um dos principais meios de preservar esta fé no mundo. Mt. 15.13,14 - "Toda planta que o Pai celestial não plantou será arrancada. Deixai-os; são condutores cegos"; = a verdade é plantada por Deus e tem vida divina permanente. Os erros humanos não têm vitalidade permanente e por si mesmos perecem.
Teologia Prática é um sistema de verdades considerado como um meio de renovar e santificar o homem ou, em outras palavras, a Teologia em sua disseminação e reforço.
Pertencem a este departamento da teologia a Homilética e a Teologia Pastoral, visto que estas são apenas apresentações científicas dos métodos corretos de desdobrar a verdade cristã e de trazer aos homens e à igreja.
Às vezes se afirma que há outros departamentos da teologia não incluídos nos acima mencionados. Porém eles, em sua maioria, senão todos eles, pertencem a outras esferas da pesquisa e não podem apropriadamente ser classificados dentro da teologia. A assim chamada Teologia moral, ou ciência da moral cristã, ética, ou ética teológica, na verdade, é o resultado da teologia, mas não deve confundir-se com ela. A assim chamada teologia especulativa, que trata a verdade como matéria de opinião, ou é extra-escriturísti- ca e assim pertence ao campo da filosofia da religião, ou é uma tentativa de explicar a verdade já revelada e, deste modo, entra no campo da Teologia Sistemática. "A teologia especulativa parte de alguns princípios a priori, e deles empreende determinar o que é e o que deve ser. Deduz seu esquema da doutrina das leis da mente ou de axiomas que supõe operar-se em sua constituição". Biblia Sacra, 1852.376 - "A teologia especulativa tenta mostrar que os dogmas concordam com as leis do pensamento enquanto a filosofia da religião tenta mostrar que as leis do pensamento concordam com os dogmas". A Enciclopédia (a palavra significa "instrução em círculo") Teológica é uma introdução geral a todas as divisões da Teologia, juntamente com um cômputo das relações entre elas. A Enciclopédia de Hegel era uma tentativa de apresentar os princípios e conexões de todas as ciências.
As relações da teologia com a ciência e a filosofia têm sido variadamente estabelecidas, mas nenhuma melhor do que a de H. B. Smith, Faith and Philosophy, 18 - "A filosofia é um modo do conhecimento humano - não o conhecimento todo, mas um modo dele - o conhecimento racional das coisas".
A ciência pergunta: "O que conheço?" A filosofia pergunta: "O que posso conhecer?" William James, Psychology, 1.145 - "A metafísica não significa nada senão um incomum esforço obstinado de pensar claramente". Aristóteles: "As ciências em particular são o operário que trabalha com afinco enquanto a filosofia é o arquiteto. Os operários são escravos; existe para eles
um senhor livre. Deste modo é que a filosofia governa a ciência". Com relação à filosofia e à ciência Lorde Bacon assinala: "Aqueles que têm manejado o conhecimento têm sido homens ou observadores ou raciocinadores abstratos. Aqueles são como a formiga: só coletam o material e o põe em uso imediato. Os raciocinadores abstratos são como as aranhas que fazem as teias da sua própria substância. Mas a abelha assume um meio termo: ela colhe o seu material das flores do jardim e do campo e o transforma e digere o que ajuntou através da sua própria força. Não difere da obra do filósofo". Novalis: "A filosofia pode não assar nenhum pão; mas ela pode apresentar-nos Deus, liberdade e imortalidade". Prof. De Witt de Princeton: "A ciência, a filosofia e a teologia são os três grandes modos de organizar o universo em um sistema intelectual. A ciência nunca desce abaixo das causas secundárias; se o faz, já não é mais ciência, - torna-se filosofia. A filosofia encara o universo como uma unidade e a sua meta é sempre procurar encontrar a fonte e o centro desta unidade - o Absoluto, a Causa Primeira. Tal meta da filosofia é o ponto de partida para a teologia. O que a filosofia está lutando para achar, a teologia afirma que já achou. Por isso a teologia parte do Absoluto, a Causa Primeira". W. N. Clarke, Christian Theology, 48 - A ciência examina e classifica os fatos; a filosofia inquire os meios espirituais. A ciência procura conhecer o universo; a filosofia, entendê-lo".
Balfour, Foudantions ofBelief, 7 - "A ciência natural tem como assunto as coisas materiais e eventos. A filosofia é a apresentação sistemática das bases do nosso conhecimento. A metafísica é o nosso conhecimento sobre as realidades não fenomenais, /'.e., Deus e a alma". Knight, Essays in Philosophy, 81 - "O alvo das ciências é o crescimento do conhecimento através da descoberta de leis em que todos fenômenos podem ser incluídos e por meio dos quais podem ser explicados. Por outro lado, o alvo da filosofia é explicar as ciências incluindo-as e, ao mesmo tempo, transcendendo-as. A substância e essência são a sua esfera". Bowne, Theory of Thoughtand Knowledge, 3-5 - "Filosofia = doutrina do conhecimento (é a mente passiva ou ativa no conhecimento? - Epistemologia) + doutrina do ser (é fundamental que seja mecânica e não inteligente, ou proposicional e inteligente? - Metafísica). Os sistemas de Locke, Hume e Kant são proeminentemente teorias do conhecimento; os sistemas de Spinosa e de Leibnitz são proeminentemente teorias do ser. Historicamente as teorias do ser vêm em primeiro lugar porque o objetivo é o único determinante do pensamento reflexo. Porém o instrumento da filosofia é o próprio pensamento. Então, em primeiro lugar, devemos estudar a Lógica, ou a teoria do pensamento; em segundo lugar, a Epistemologia, ou a teoria do conhecimento; em terceiro, a Metafísica, teoria do ser".
Prof. George M. Forbes sobre a Nova Psicologia: "Locke e Kant representam as duas tendências da filosofia - por um lado, a empírica, física, científica, e, por outro, a racional, metafísica, lógica. Locke fornece a base para os esquemas associativos de Hartley, Mills e Bain; Kant para o esquema idealista de Fichte, Schelling e Hegel. As duas não são contraditórias, mas com- plementares e os escoceses Reid e Hamilton combinam ambas em reação contra o extremo empirismo e o ceticismo de Hume. Hickok, Porter e McCosh representam a escola escocesa na América. É exclusivamente analítica; sua psicologia é a das faculdades; representa a mente como um feixe de faculdades.
A filosofia unitária de T. H. Green, Edward Caird, na Grã Bretanha e, na América, de W. T. Harris, George S. Morris e John Dewey foi uma reação contra a psicologia das faculdades, sob a influência de Hegel. A segunda reação sob a influência da doutrina herbartiana da apercepção (N.Trad.: = intuição, faculdade de apreender imediatamente pela consciência e sem intermediário lógico, uma idéia, uma verdade) substitui a função pela faculdade tornando todos processos fases da apercepção. G. F. Stout e J. Mark Baldwin representam esta psicologia. Uma terceira reação vem da influência da ciência física. Todas tentativas de unificação relegam-se a um hades metafísico. Nada há a não ser estados e processos. A única unidade são as leis da sua coexistência e sucessão. Não existe nada a priori. Wundt identifica a apercepção com a vontade e considera-a como um princípio unitário. Külpe e Titchener não encontram um eu, ou uma vontade, ou uma alma, mas tratam isto como interesses quase sem garantia. A sua psicologia não tem alma. A antiga psicologia era exclusivamente estática, enquanto a nova dá ênfase ao ponto de vista genético. O crescimento e desenvolvimento são as idéias mestras de Herbert Spencer, Preyer, Tracy, e Stanley Hall. William James é explícito, enquanto George T. Ladd é descritivo. Cattel, Scripture, e Münsterberg aplicam os métodos de Fechner e o seu órgão é a Psichological Review. O erro deles está em sua atitude negativista. A antiga psicologia é necessária à suplementação da nova. Tem maior escopo e uma significação mais prática.
HISTÓRIA DA TEOLOGIA SISTEMÁTICA
Na Igreja do Oriente, pode-se dizer que a Teologia Sistemática teve seu
início e fim com João Damasceno (700-760).
Inácio (+115 A.D. Tralles, cap. 9) dá-nos "a primeira declaração de fé distinta composta de uma série de proposições. Tal sistematização formou, mais tarde, a base de todos os esforços" (Prof. A. H. Newman). Orígenes de Alexandria (186-254) escreveu o seu nepi 'Apxcõv; Atanásio de Alexandria (300-373) seu tratado sobre a Trindade e a Divindade de Cristo; e Gregório de Nissa na Capadócia (332-398) seu Aóyoç KaxrixriTiKÒç ó [léyaq. Hatch, Hibbert Lectures, 323, considera o "De Principiisí' de Orígenes como o primeiro sistema completo de dogma", e considera Orígenes como "o discípulo de Clemente de Alexandria, o primeiro grande mestre do cristianismo filosófico". Mas enquanto os Pais mencionados parecem ter concebido o plano de exposição ordenada das doutrinas e mostrar o seu relacionamento de umas com as outras, na verdade, foi João Damasceno (700-760), quem primeiro executou tal plano. Seu "EkSocjiç àKpipfiç rfjç òpSoSóÇcm nía-tecoç (Transmissão Exata da Fé Ortodoxa) pode ser considerada a mais antiga obra de Teologia Sistemática. Neander chama-a "o mais importante texto doutrinário da Igreja Grega". Como a Igreja Grega, em geral, João é especulativo, teológico, semi-pelagiano, sacramentalista. O assim chamado Credo dos Apóstolos, na sua forma presente, não é anterior ao século quinto; ver Schaff, Creeds of Cristendom, 1.19. O Sr. Gladstone sugere que o Credo dos Apóstolos é um desenvolvimento da fórmula batismal. McGiffert, Apostles' Creed, atribui à fraca forma original uma data do terceiro quartel do segundo século, e considera provável a origem romana do seu símbolo. Foi estruturado como fórmula batismal, mas não especificamente em oposição aos ensinos de Marcião, que, naquela época, causava muita perturbação a Roma. Contudo, Harnack data o Credo Apostólico original no ano de 150 e Zahn em 120.
Na Igreja do Ocidente, (com Hagenbach) podemos distinguir três períodos:
Período do Escolasticismo, - introduzido por Pedro Lombardo (11001160), chegando ao clímax com Tomás de Aquino (1221-1274) e Duns Scotus 1265-1308).
Embora a Teologia Sistemática tivesse tido o seu começo na Igreja do Oriente, seu desenvolvimento limitou-se quase totalmente ao Ocidente. Agostinho (353-430) escreveu o seu "Encheiridion ad Laurentiurrt' e a "De Civitate Del', João Scoto Erígena (+ 850), Roscelino (1092-1122) e Abelardo (10791142), na sua tentativa de uma explicação racional da doutrina cristã prefigu- ravam as obras dos grandes mestres escolásticos. Anselmo de Cantuária (10341109), com seu "Proslogion de Dei Existentia" e "Cur Deus Homo", tem sido, às vezes chamado, embora erroneamente, o fundador do Escolasticismo. Allen, Continuity of Christian Thought, apresenta a transcendência de Deus como o princípio controlador da teologia agostiniana e da Ocidental. A Igreja Oriental, sustenta ele, tinha baseado a sua teologia na imanência de Deus. Paine, Evolution of Trínitarism, mostra que isto é errado. Agostinho era um teísta da linha monista. Ele declara que "Dei voluntas rerum natura est" (N.Trad.: a vontade de Deus é a natureza das coisas), e considera a preservação de Deus uma criação contínua. A teologia ocidental reconhece a imanência de Deus tanto como a sua transcendência.
Contudo, Pedro Lombardo (1100-1160), o "magister sententiarum", foi o primeiro grande sistematizador da Igreja Ocidental e seu "Libri Sententiarum Quator" foi o livro de texto da Idade Média. Mestres proferiram preleções com base nas "Sentenças" (Sententia = sentença, Satz, locus, ponto, artigo de fé), como fizeram nos livros de Aristóteles, que forneceu ao Escolasticismo seu impulso e direção. Cada doutrina é tratada na ordem das quatro causas de Aristóteles: material, formal, eficiente e final. ("Causa" aqui = requisito:
1) matéria em que uma coisa consiste, p.ex. tijolos e argamassa; 2) forma que assume, p.ex. o plano ou projeto; 3) agente produtor, p.ex., o construtor;
4) a finalidade por que foi feita, p.ex., moradia). A organização da ciência física bem como da teológica deve-se a Aristóteles. Dante o chamou "o mestre dos que conhecem". James Ten Broeke, Bap. Quar. fíev., jan. de 1892.1-26
"O Avivamento do Aprendizado mostrou ao mundo que o verdadeiro Aristóteles era muito mais aberto que o Aristóteles escolástico - informação muito bem-vinda à Igreja Romana". Para a influência do Escolasticismo, compare os métodos literários de Agostinho e de Calvino, - aquele nos dá o seu material em desordem, como soldados em bivaque durante a noite; este, pondo-os em ordem como os mesmos soldados formados para a batalha.
Candlish, art.: Dogmatic, in Encyl. Brit., 7.340 - "Ao lado de uma poderosa força intelectual tem preponderância todo o material dogmático coletado, e crescido sem os grandes sistemas escolásticos, que têm sido comparados com as grandes catedrais góticas obra da mesma época". O dominicano Tomás de Aquino (1221-1274), o "doctor angelicus", agostiniano e realista, - e
o franciscano Duns Scotus (1265-1308), "doctor subtilis", - elaboraram a teologia escolástica de modo mais completo e deixaram atrás de si, em suas Summae, gigantescos monumentos de indústria intelectual e argúcia. O escolasticismo tinha como alvo a prova e sistematização das doutrinas da Igreja por meio da filosofia de Aristóteles. Por fim, tornou-se um ilimitado charco de sutilezas e abstrações e acabou no ceticismo nominalista de Guilherme de Occan (1270-1347).
Período do Simbolismo, - representado pela Teologia Luterana de Filipe Melanchton (1497-1560) e pela Teologia Reformada de João Calvino (15091564); aquela em conexão com a Teologia Analítica de Calixto (1585-1656) e esta em conexão com a Teologia Federal de Cocceius (1603-1669).
Teologia Luterana - Os pregadores vêm antes dos teólogos; Lutero (14851546) era mais pregador do que teólogo. Mas Melanchton (1497-1560), "o preceptor da Alemanha", como era chamado, incorporava a teologia da Igreja Luterana em suas "Loci Communes" = pontos de doutrina comuns aos crentes (primeira edição agostiniana, depois substancialmente arminiana; um desenvolvimento das preleções sobre a Epístola aos Romanos). Foi seguido de Chemnitz (1522-1586), "claro e preciso", o mais culto dos discípulos de Melanchton. Leonhard Hutter (1563-1616), chamado "Lutherus redivivus" e João Gerhard (1582-1637) seguiram Lutero mais do que Melanchton. "Cinqüenta anos após a morte de Melanchton, Leonhard Hutter, seu sucessor na cadeira de teologia em Wittenberg, numa época quando se apelava para a autoridade de Melanchton, destronava-se da parede o retrato do grande Reformador, e se esmagava sob os pés na presença da assembléia" (E. D. Norris, num jornal por ocasião do 609 aniversário do Seminário de Lane). George Calixto (1586-1656) seguiu Melanchton em vez de Lutero. Ele ensinava uma teologia que reconhecia o lado bom tanto na doutrina reformada como na romanista e a isto chamava "sincretismo". Separava a Ética da Teologia Sistemática e aplicava a esta o método analítico de investigação, começando com o fim, ou a causa final, de todas as coisas, a saber: a bem-aventu- rança. E em seu método analítico ele foi seguido por Dannhauer (1603-1666), que tratava a teologia de uma forma alegorizante; Calóvio (1612-1686), "o mais intransigente defensor da ortodoxia luterana e o mais drástico polemista contra Calixto"; Quenstedt (1617-1688), que Hovey chama "culto, abrangente e lógico"; e Hollaz (t 1730). A teologia luterana tinha como alvo purificar a igreja existente, sustentando que aquilo que não é contra o evangelho é por ele. Dava ênfase ao princípio material da Reforma: a justificação pela fé; mas conservava muitos costumes romanistas não proibidos expressamente na Escritura. Kaftan, Am. Jour. Theol., 1900.716 - "Porque a filosofia escolar medieval sustentava principalmente o emprego da arma, a teologia protestante, representando a nova fé, acomodava-se necessariamente ao conhecimento por ela condicionado, isto é, as formas essencialmente católicas".
Teologia Reformada - A palavra 'Reformada" é aqui empregada no sentido técnico, designando aquela fase da nova teologia que se originou na Suíça. O reformador suíço Zwínglio (1484-1531), diferindo de Lutero quanto à Ceia do Senhor e quanto à Escritura, mais do que Lutero era chamado pelo nome de teólogo sistemático. Alguns dos seus escritos podem ser considerados o começo da teologia reformada. Mas coube a João Calvino (1509-1564), após a morte de Zwínglio, pôr em ordem os princípios daquela teologia em forma sistemática. Calvino cavou canais para que o dilúvio de Zwínglio fluísse, como aconteceu com Melanchton em relação a Lutero. Seus Institutos ("Institutio Religionis Christianae), é uma das maiores obras de teologia (como obra sistemática superior à "Loci" de Melanchton). Calvino foi seguido por Pedro, o Mártir (1500-1562), Chamier (1565-1621) cTeodoro Beza (1519-1605). Beza levou a doutrina calvinista da predestinação ao extremo do supralapsa- rianismo, que é mais híper-calvinista do que calvinista. Cocceius (1603-1669) e, depois dele, Witsius (1626-1708) fizeram da teologia o centro em torno da idéia dos concertos e fundaram a teologia Federal. Leydecker (1642-1721) tratou da teologia na ordem das pessoas da Trindade. Amiraldo (1596-1664) e Plaques de Saumur (1596-1632) modificaram a doutrina calvinista, esta através da teoria da imputação mediata e aquela através da defesa do hipotético universalismo da graça divina. Turrettin (1671-1737), esclarecido e poderoso teólogo cuja obra ainda hoje é livro de texto em Princeton e Pictet (16551725), ambos federalistas mostram a influência da filosofia cartesiana. A teologia reformada tinha como alvo edificar uma nova igreja, afirmando que o que não deriva da Bíblia é contra ela. Dava ênfase ao princípio formal da Reforma: a autoridade única da Escritura.
Em geral, enquanto a linha entre católicos e protestantes na Europa corre do Ocidente para o Oriente, a linha entre os luteranos e reformados corre do sul para o norte; a teologia reformada flui com a corrente do Reno para o norte a partir da Suíça para a Holanda e para a Inglaterra, na qual os trinta e nove Artigos representam a fé reformada, conquanto o Livro de Oração da Igreja Inglesa é substancialmente arminiano.
Período da Crítica e da Especulação, - nas suas três divisões: a Raciona- lista, representada por Semler (1725-1791); a Transitória, por Schleiermacher (1768-1834); a Evangélica por Nitzsch, Müller, Tholuck e Dorner.
Primeira Divisão. Teologias racionalistas: Apesar de a Reforma, em grande parte, ter livrado a teologia dos laços do escolasticismo, após um certo tempo vieram outras filosofias. O exagero das forças da religião natural Leibnitzianas e Wollfianas abria o caminho para os sistemas racionalistas de teologia. Buddeus (1667-1729) combatia os novos princípios, mas a teologia de Semler (1725-1791) foi edificada sobre eles e representava as Escrituras como tendo um caráter simplesmente local e temporário. Michaelis (17161784) e Doederlein (1714-1789) seguiram Semler e a filosofia crítica de Kant (1724-1804) para quem "a revelação era problemática e a religião positiva simplesmente um meio através do qual comunicam-se as verdades práticas, assistiu grandemente a tendência para o racionalismo" (Hagenbach, Doctrine
Hist., 2.397). Ammon (1766-1850) e Wegscheider (1771-1848) representavam esta filosofia. Daub, Marheinecke e Strauss (1808-1874) eram dogmáticos hegelianos. O sistema de Strauss assemelhava-se "a teologia cristã como o cemitério assemelha-se a uma cidade". Storr, (1746-1805), Reinhard (17531812) e Knapp (1753-1825), empenhados em reconciliar a revelação com a razão, no centro evangélico, porém não eram mais nem menos influenciados pelo espírito racionalizante. Pode-se dizer que Bretschneider (1776-1828) e De Wette (1780-1849) tinham defendido uma base intermédia.
Segunda Divisão. Transição para uma teologia mais escriturística. Herder (1744-1803) e Jacobi (1743-1819), com a sua filosofia mais espiritual, prepararam o caminho para Schleiermacher (1768-1834) formar a base da sua doutrina nos fatos da experiência cristã. Os escritos de Schleiermacher marcaram época e tiveram grande influência no livramento que a Alemanha teve das armadilhas do racionalismo em que ela havia caído. Agora podemos falar de uma.
Terceira Divisão - e nesta podemos mencionar os nomes de Neander e Tholuck, Twesten e Nitzsch, Mliller e Luthardt, Dorner e Philippi, Ebrard e Thomasius, Lange e Kahnis, todos eles expoentes de uma teologia bem mais pura e evangélica do que era comum na Alemanha de um século atrás. Contudo, duas novas formas de racionalismo apareceram na Alemanha: uma baseada na filosofia de Hegel, que contava entre os seus seguidores Strauss e Baur, Biedermann, Lipsius e Pfleiderer; a outra baseada na filosofia de Kant e defendida por Ritschl e seus seguidores: Harnack, Hermann e Kaftan; aquela dava ênfase ao Cristo ideal e esta ao histórico; porém nenhuma delas reconhecia plenamente o Cristo vivo presente em cada crente (ver Johnsorís Cyclo- psedia, art. Theology, de A. B. Strong).
Entre os teólogos de pontos de vista diferentes da fé protestante prevale- cente, podem ser mencionados os seguintes:
Belarmino (1542-1621), Católico Romano.
Além de Belarmino, "o mais controvertido escritor da sua época" (Bayle), a Igreja Católica Romana conta entre os seus notáveis teólogos: - Petávio (15831652), cuja teologia dogmática Gibbon chama de "uma obra de incrível labor e alcance"; Melchior Canus (1523-1560), um opositor dos jesuítas e seus métodos escolásticos; Bossuet (1627-1704), que idealizou o catolicismo em sua Exposição da Doutrina e atacou o protestantismo na sua História das Igrejas Protestantes; Jansen (1585-1638), que tentou, em oposição aos jesuítas, reproduzir a teologia de Agostinho, e que contou no seu poderoso auditório com Pascal (1623-1662). O jansenismo, no que se refere às doutrinas da graça, mas não aos sacramentos, é o protestantismo virtual dentro da Igreja Católica Romana. O Simbolismo de Moehler, as "Prelectiones Theologicae" de Perrone e o "Compendium Theologiae Dogmaticae" de Hurter são as últimas e as exposições de maior aprovação da Doutrina Católica Romana.
Armínio (1560-1609), o opositor da doutrina da predestinação.
Entre os seguidores de Armínio deve-se contar Episcopius (1583-1643), que levou o arminianismo aos extremos do pelagianismo; Hugo Grotius (1553-1645),
jurista e estadista, autor da teoria governamental da expiação; e Limborch (1633-1712), o mais completo expositor da doutrina arminiana.
Lélio Socínio (1525-1562) e Fausto Socínio (1539-1604), líderes do movimento unitário.
As obras de Lélio Socínio e do seu sobrinho, Fausto Socínio constituíram- se o início do unitarismo moderno. Lélio Socínio era pregador e reformador e Fausto Socínio, o teólogo; ou, como se expressa Baumgarten Crusius: "aquele foi o fundador do socianismo e este o fundador da seita". Os seus escritos estão coletados na Bibliotheca Fratrum Polonorum. O Catecismo Racoviano, que tomou este nome devido à cidade polonesa de Racow, contém a mais resumida exposição dos pontos de vista deles. Em 1660, a Igreja Unitária dos Coccíneos, na Polônia, foi destruída por uma perseguição; uma ramificação dela, na Hungria, conta com mais de cem congregações.
Teologia Britânica, representada pelos seguintes grupos:
Os Batistas, John Bunyan (1628-1688), John Gill (1697-1771) e Andrew Fuller (1754-1815).
Parte da melhor teologia britânica é batista. Entre as obras de John Bunyan, podemos mencionar "Verdades Abertas do Evangelho", apesar de que "O Peregrino" e a "Guerra Santa" são tratados teológicos em forma alegórica. Macaulay chama Milton e Bunyan de as duas mentes criativas da Inglaterra durante a última parte do século XVII. "O Organismo da Divindade Prática" de J. Gill apresenta muita habilidade, apesar de que o aprendizado rabínico do autor apresenta-se numa curiosa exegese, como na análise da palavra "Abba" ele assinala: "Vós vedes que esta palavra que significa 'Pai' é lida da mesma forma para frente ou para trás; o que sugere que Deus é o mesmo e de qualquer modo que o vemos". "As Cartas sobre a Divindade Sistemática" de Andrew Fuller são um breve compêndio de teologia. Seus tratados sobre doutrinas especiais são marcados por um sadio juízo e um claro discernimento. Eles foram o mais influente fator de salvaguarda contra o antinomismo nas igrejas evangélicas da Inglaterra. Justificam o epíteto que Robert Hall, um dos maiores pregadores batistas, lhe deu: "sagaz", "esclarecido", "poderoso".
Os Puritanos John Owen (1616-1683), Richard Baxter (1615-1691), John Howe (1630-1705) e Thomas Ridgeley (1666-1734).
Owen foi o mais rígido, do mesmo modo que Baxter o mais liberal dos puritanos. A Enciclopédia Britânica assinala: "Como pensador e escritor teológico, John Owen mantém o seu próprio lugar distintamente definido entre aqueles titânicos intelectos dos quais a época era abundante. Ultrapassado por Baxter no assunto e no sentimento por Howe na imaginação e na mais elevada filosofia, não tem rival no poder do desdobramento dos ricos sentidos
da Escritura. Nos seus escritos foi proeminentemente o grande teólogo". Baxter escreveu um "Methodus Theologiae", e uma "Teologia Católica"; John Howe é conhecido principalmente por seu "Templo Vivo"; Thomas Ridgeley por seu "Corpo da Divindade". Charles H. Spurgeon nunca deixou de estimular os seus estudantes a se familiarizarem com os Puritanos Adams, Ambrósio, Bowden, Manton e Sibbes.
Presbiterianos escoceses Tomás Boston (1676-1732), John Dick (17641833) e Thomas Chalmers (1780-1847).
Dos presbiterianos escoceses, Boston é o mais prolífico, Dick o mais calmo e justo, Chalmers o mais fervoroso e popular.
Os Metodistas John Wesley (1703-1791) e Richard Watson (1781-1833).
Dos metodistas, a doutrina de John Wesley encontra-se presente na "Teologia Cristã", coletada dos seus escritos pelo Rev. Thornley Smith. O maior livro de texto metodista é "Institutos" de Watson, que sistematizou e expôs a teologia wesleyana. Pope, recente teólogo inglês, segue o arminianismo modificado e aprimorado de Watson, enquanto Whedon e Raymond, escritores americanos recentes, defendem um arminianismo radical e extremo.
Quacres [quakers], GeorgeFox(1624-1691) e Robert Barclay (1648-1690).
Como Jesus, o pregador e reformador, precedeu o teólogo Paulo; como Lutero, precedia Melanchton; como Zwínglio precedia Calvino; como Lélio Socínio precedia Fausto Socínio; como Wesley precedia Watson; assim Fox precedia Barclay. Barclay escreveu uma "Apologia à Verdadeira Divindade Cristã", que o Dr. E. G. Robinson descreve como "um tratado não formal de Teologia Sistemática, porém a mais hábil exposição dos pontos de vista dos Quacres". George Fox era reformador, William Penn o fundador social, Robert Barclay, o teólogo dos quacres.
Clérigos ingleses, Richard Hooker (1553-1600), Gilbert Burnet (16431715) e John Pearson (1613-1686).
A igreja inglesa não produziu nenhum grande teólogo sistemático (ver as razões em Dorner, Geschichte derProtest. Theologie, 470). O judicioso Hooker ainda é o seu maior escritor teológico, apesar de que a sua obra encontra-se apenas na "Política Eclesiástica". O Bispo Burnet é o autor da "Exposição dos XXXIX Artigoé', e a "Exposição do Credo" do Bispo Pearson. Ambos são livros de textos ingleses comuns. Um recente "Compêndio de Teologia Dogmática" de Litton mostra uma tendência para a volta do arminianismo comum da Igreja Anglicana para o velho agostinianismo; assim também os "Esboços da Doutrina Cristã' do Bispo Moule e a "Fé do Evangelho" de Mason.
Teologia Americana, em duas linhas:
O sistema Reformado de Jonathan Edwards (1706-1758), modificado sucessivamente por Joseph Bellamy (1719-1790), Samuel Hopkins (1721-1803), Tlmothy Dwight (1752-1817), Nathanael Emmons (1745-1840), Leonard Woods
1774-1854), Charles G. Finney (1792-1875), Nathanael W. Taylor (1786-1858) e Horace Bushnell (1802-1876). O calvinismo assim modificado, é freqüentemente chamado de teologia da Nova Inglaterra, ou da Nova Escola.
Jonathan Edwards, um dos maiores metafísicos e teólogos, é um idealista que sustenta que Deus é a única verdadeira causa, quer no reino da matéria, quer no da mente. Ele considera o principal bem como felicidade - uma forma de sensibilidade. A virtude é a escolha voluntária deste bem. Por isso a união com Adão nos atos e exercícios é suficiente. Esta vontade de Deus causou a identidade do ser com Adão. Isto conduziu ao sistema de exercício de Hopkins e Emmons, por um lado, e à negação da parte de Belamy e de Dwight de qualquer atribuição do pecado de Adão ou depravação inata, por outro lado - em que com a última negação concordam muitos outros teólogos da Nova Inglaterra que rejeitam o esquema de exercício, como, p.ex. Strong, Tyler, Smally, Burton, Woods e Park. O Dr. N. W. Taylor acrescenta um elemento mais distintamente arminiano: o poder da escolha contrária - e com este ensino da teologia de New Haven, Carlos Finney, de Oberlin, substancialmente concorda. Horace Bushnell praticamente sustenta o ponto de vista sabeliano da Trindade, e a teoria de uma influência moral na expiação. Assim, a partir de certos princípios admitidos por Edwards, que sustenta principalmente a teologia da Velha Escola, desenvolveu-se a Nova Escola.
Robert Hall chamava Edwards "o maior do filhos dos homens". O Dr. Chalmers considerava-o como "o maior dos teólogos". O Dr. Fairbairn diz: "Ele não é apenas o maior de todos os pensadores que a América produziu, mas também o mais elevado gênio especulativo do século dezoito. Em um grau bem mais elevado que Spinoza ele era 'um homem intoxicado de Deus'". Sua noção fundamental de que não há nenhuma causalidade senão a divina tornou-se a base de uma teoria da necessidade que está nas mãos dos deís- tas a que ele se opõe e que é estranha não só ao cristianismo, mas também ao teísmo. Edwards não podia ter recebido o seu idealismo de Berkeley; pode ter-lhe sido sugerido pelos escritos de Locke ou de Newton, Cudworth ou Descartes, John Norris ou Arthur Collier.
O velho Calvinismo representado por Charles Hodge, o pai, (17971878) e A. A. Hodge, o filho, (1823-1886), juntamente com Henry B. Smith (1815-1877), Robert J. Breckinridge (1800-1871), Samuel J. Baird e William G. T. Shedd (1820-1894). Todos estes, apesar das pequenas diferenças, sustentavam pontos de vista sobre a depravação humana e graça divina em mais próxima conformidade com a doutrina de Agostinho e Calvino e por esta razão se distinguem dos teólogos da Nova Inglaterra e seus seguidores pelo título popular de Velha Escola.
A teologia da Velha Escola, com o seu ponto de vista da predestinação, exalta Deus; a teologia da Nova Escola, dando ênfase à livre vontade, exalta o homem. Ainda mais importante é notar que a Velha Escola tem como doutrina caraterística a culpa pela depravação inata. Mas entre os que sustentam tal ponto de vista, uns são federalistas e criacionistas e justificam a condenação de todos os homens por Deus baseados em que Adão representava a sua posteridade. Em geral são teólogos de Princeton, incluindo Charles Hodge,
A. A. Hodge, e os irmãos Alexander. Contudo, entre os que sustentam a doutrina da Velha Escola sobre a depravação inata, há outros que são traducio- nistas e justificam a aplicação do pecado de Adão à sua posteridade baseados na união natural entre aquele e esta. O "Elohim Revelado" de Baird e o ensaio de Shedd sobre o pecado original (Pecado como natureza e a culpa da natureza) representam esta concepção realista do relacionamento da raça com o seu pai. R. J. Breckenridge, R. L. Dabney e J. H. Thornwell defendem o fato da corrupção inerente e culpa, mas recusam-se a admitir qualquer razão para isso, embora tendam para isso. H. B. Smith sustenta firmemente a teoria da atribuição mediata.
ORDEM DE TRATAMENTO NA TEOLOGIA SISTEMÁTICA
Vários métodos de ordenação dos tópicos de um sistema teológico
d) O método analítico de Calixto começa com o admitido fim de todas as coisas, bênçãos e daí passa para o sentido pelo qual ele é assegurado. b) O método trinitário de Leydecker e Martensen considera a doutrina cristã uma manifestação sucessiva do Pai, do Filho e do Espírito Santo, c) O método federal de Cocceius, de Witsius e de Boston trata a Teologia sob duas alianças. d) O método antropológico de Chalmers e Rothe; aquele começa com a doença do homem e passa para o remédio; este, dividindo a sua dogmática em consciência do pecado e consciência da redenção, e) O método cristológico de Hase, Tomasius e Andrew Fuller trata de Deus, do homem, como pressuposições da pessoa e obra de Cristo. Também pode-se fazer menção./) do método histórico seguido por Ursino e adotado pela História da redenção de Jonathan Edwards e g) o método alegórico de Dannhauer, no qual o homem é descrito como um peregrino, a vida como uma estrada, o Espírito Santo como uma luz, a igreja como um candeeiro, Deus como o fim e o céu como o lar; do mesmo modo é a Guerra Santa de Bunyan e o Templo Vivo de Howe.
A conhecida Hlst. of Redemption de Jonathan Eduards "era na realidade um sistema de teologia em forma histórica. Ela "começava e terminava com a eternidade, com todos os grandes eventos e épocas do tempo sendo visto 'sub specie eternitatis'. As três palavras - céu, terra e inferno - seriam as cenas deste grande drama. Era para incluir os tópicos da teologia como fatores
vivos, cada um deles em seu próprio lugar", e formando um todo completo e harmonioso; verALLEN, Jonatham Eduards, 379,380.
O Método Sintético
Que adotamos neste compêndio, é o mais comum e mais lógico de pôr em ordem os tópicos da teologia. Parte da causa para o efeito, ou, empregando a linguagem de Hagenbach (História da Doutrina), "começa com mais elevado princípio, que é Deus, e destina-se ao homem, Cristo, a redenção e, para encerrar, o fim de todas as coisas". Em tal forma de tratar a teologia, podemos pôr em ordem os nossos tópicos na seguinte disposição:
Io A existência de Deus.
2o As Escrituras, uma revelação de Deus.
3o Natureza, decretos e obras de Deus.
4° O homem, semelhança original com Deus e subseqüente apostasia.
5° A redenção através da obra de Cristo e do Espírito Santo.
6° Natureza e leis da igreja de Cristo.
1° O fim do atual sistema de coisas.
Parte II A EXISTÊNCIA DE DEUS
Capítulo I
ORIGEM DA NOSSA IDÉIA DA EXISTÊNCIA DE DEUS
Deus é o Espírito infinito e perfeito em quem todas as coisas têm sua fonte, sustento e fim.
Outras definições; Calovius: "Essentia spirituaiis infinita"; Ebrard: "A fonte eterna de tudo o que é temporal"; Kahnis: "O Espírito infinito"; John Howe: "Um ser eterno, não causado, independente, necessário, que tem poder ativo, vida, sabedoria, bondade e qualquer outra excelência na mais elevada perfeição em si e de si mesma"; Catecismo de Westminster: "Um Espírito infinito, eterno, imutável em seu ser, sabedoria, poder, santidade, justiça, bondade e verdade"; Andrew Fuller: "A primeira causa e o último fim de todas as coisas".
A existência de Deus é uma verdade primeira; em outras palavras, o conhecimento da existência de Deus é uma intuição racional. Logicamente precede e condiciona toda a observação e raciocínio. Cronologicamente, só o reflexo sobre os fenômenos da natureza e da mente ocasiona seu surgimento na consciência.
O termo intuição significa somente o conhecimento direto. Lowndes (Phil. of Primary Beliefs, 78) e Mansel (Metaphysics, 52) empregam o termo apenas para designar o nosso conhecimento direto das substâncias, como o eu e o corpo; Porter aplica-o, de preferência, ao nosso conhecimento das primeiras verdades como já foram mencionadas. Harris (Philos. Basis of Theism., 44-151, esp. 45,46) inclui ambos. Ele divide as intuições em duas classes:
1. Presentes, como a autoconsciência (em virtude da qual percebo a existência do espírito e já entro em contato com o sobrenatural), e a percepção através do sentido (em virtude da qual percebo a existência da matéria, ao menos em meu próprio organismo e entro em contato com a natureza); 2. Racionais, como espaço, tempo, substância, causa, causa final, justiça, ser absoluto. Podemos aceitar esta nomenclatura, empregando os termos "primeiras verdades" e "intuições racionais" como equivalentes uma à outra, classificando as intuições racionais sob o título de 1) intuições de relações, como espaço e tempo; 2) intuições de princípios, como substância, causa, causa final, justiça;
e 3) intuição do Ser absoluto, Poder, Razão, Perfeição, Personalidade, como Deus. Sustentamos que, na ocasião em que os sentidos conhecem
a extensão da matéria, b) sucessão, c) qualidades, d) mudança, e) ordem, f) ação, respectivamente, a mente conhece (a) espaço, (b) tempo, (c) substância, (d) causa, (e) desígnio, (/) obrigação, ao conhecermos nossa adequação, dependência e responsabilidade, a mente conhece diretamente a existência de uma Autoridade Infinita e Absoluta, Perfeição, Personalidade de que depen-demos e perante a qual somos responsáveis.
Bowne, Theory of Thought and Knowledge, 60 - "Quando andamos em completa ignorância dos nossos músculos, pensamos, com freqüência, na ignorância completa dos princípios que fundamentam e determinam o pensamento. Porém como a anatomia revela que o ato aparentemente simples de andar envolve uma atividade muscular altamente complexa, do mesmo modo a análise revela que o ato aparentemente simples de pensar envolve um sistema de princípios mentais". Dewey, Psychology, 238,244 - "A percepção, a memória, a imaginação, a concepção - cada uma delas é um ato de intuição. ... Cada ato concreto do conhecimento envolve uma intuição de Deus". Marti- neau, Types, 1.459 - A tentativa de despojar a experiência de cada um dos preceitos ou intuições é "como a tentativa de raspar uma bolha na pesquisa das suas cores e seu conteúdo: in tenuem ex oculis evanuit auram"; (N.Trad.: desaparece dos olhos com a suave brisa) Study, 1.199 - "tente com todas as suas forças fazer algo difícil, p.ex., fechar a porta contra o furioso vento e você reconhecerá o Eu e a Natureza - vontade causai, contra a causalidade externa; 65 - "Como a Percepção nos dá a Vontade na forma de causalidade contra nós no não eu, assim a Consciência nos dá a Vontade na forma de Autoridade contra nós no não eu"; Types, 2.5 - "Na percepção, é o eu e a natureza, na moral o eu e Deus, que frente a frente estão em antítese subjetiva e objetiva"; Study, 2.2,3 - "Na experiência volitiva enfrentamos a causalidade objetiva; na experiência moral, a autoridade objetiva, - ambas são objeto do conhecimento imediato, no mesmo nível de certeza que a apreensão do mundo material exterior. Não conheço nenhuma vantagem lógica que a crença nos objetos finitos possa ostentar sobre a crença na Causa infinita e justa de tudo"; 51 - "No reconhecimento de Deus como causa destacamos a Universidade; no reconhecimento de Deus como Autoridade, destacamos a Igreja".
Kant declara que a idéia de liberdade é a fonte da nossa idéia de personalidade; esta consiste na liberdade da alma inteira sobre o mecanismo da natureza. Lotze, Metaphysics, par. 244 - "Até onde e até quando conhece a si mesma como idêntica à experiência interior, é, e é chamada tão somente por esta razão, substância". Illingworth, Personality, Human and Divine, 32 - "Nossa concepção de substância não deriva do mundo físico, mas do mental. Antes de nada, substância é aquilo que apoia nossos sentimentos mentais e manifestações". James, Will to Believe, 80 - "Como diz Kant, substância significa 'das Beharrliche', o persistente, aquilo que será como tem sido, porque o ser é essencial e eterno". Neste sentido temos uma crença intuitiva em uma substância permanente que apoia os nossos pensamentos e vontade e a isto chamamos alma. Mas temos também uma crença intuitiva em uma substância permanente que apoia todos fenômenos naturais e todos os eventos da história, e este ser denominamos Deus.
PRIMEIRAS VERDADES EM GERAL
Sua natureza
d) Negativamente - Uma verdade primeira não é a) Verdade escrita antes da consciência sobre a substância da alma - pois tal conhecimento passivo implica um ponto de vista materialista da alma; b) O verdadeiro conhecimento de que a alma tem posse no nascimento - pois não se pode provar que a alma o tem; c) Uma idéia, não desenvolvida no nascimento, tem o poder de autodesenvolvimento independentemente da observação e da experiência - pois isto contraria todo o conhecimento das leis do desenvolvimento mental.
Orígenes, Adv. Celsum, 1.4 - "Os homens não seriam culpados se não tivessem em suas mentes noções comuns de moralidade, inatas e escritas com letras divinas". Calvino, Institutes, 1.3.3 - "Os que julgam corretamente sempre concordarão em que há um indelével senso de divindade inscrito nas nossas mentes". Fleming, Vocab. of Philosophy, art.: "Idéias inatas" - "Supõe- se que Descartes tenha pensado (e Locke dedicou o primeiro livro dos seus Ensaios à refutação da doutrina) que as idéias são inatas ou conatas à alma;
/'.e., o intelecto acha a si mesmo no nascimento, ou tão logo desperta para a atividade consciente a fim de ser possuído de idéias às quais cabe-lhe apenas atribuir nomes adequados, ou juízos que ele apenas precisa expressar em proposições adequadas - /'.e., antes de qualquer experiência sobre cada objeto".
Royce, Spirit of Modern Philosophy, 77 - "Descartes ensina que, em certas famílias, a boa conduta e a queda são inatas. Contudo, naturalmente, os filhos de tais famílias precisam ser instruídos nas boas maneiras e as crianças, aprendendo a andar, parecem perfeitamente felizes por estarem livres da queda. Do mesmo modo a geometria nos é inata, mas não vem ao nosso conhecimento sem muito esforço"; 79 - Locke não encontra idéias inatas.
Em resposta, ele sustenta que "as crianças, com as suas matracas, não dão sinais de consciência de que as coisas são iguais às mesmas que são iguais entre si". Schopenhauer diz que "Jacobi tem a banal fraqueza de tomar tudo o que aprendeu e aprovou antes dos quinze anos como idéias inatas da mente humana". Bowne, Principies of Ethics, 5 - "Ninguém questiona que a experiência dos sentidos condiciona as idéias racionais e são conseqüência dela (/'.e., da experiência); do mesmo modo ninguém duvida de que a experiência mostra uma ordem sucessiva de manifestações. Mas o sensacionalista tem sempre apresentado uma curiosa cegueira sobre a ambigüidade de tal fato. Para ele, o que vem depois deve ser uma modificação daquilo que veio antes; contudo, ela pode ser aquilo, e pode ser uma nova manifestação de uma natureza ou lei imanente, apesar de condicionada. Afinidade química não é gravidade, embora aquela não se manifeste até que a gravidade estabeleça certas relações entre os elementos".
Pfleiderer, Philosophy of Religion, 1.103-"Este princípio não se encontrava presente desde o começo na consciência do homem; pois, para produzir idéias no pensamento, a razão, que no primeiro homem da raça podia ser de tal modo pequena como nas crianças, precisa desenvolver-se claramente. Contudo, isto não exclui o fato de que havia desde o começo o impulso racional inconsciente que é base da formação da crença em Deus, por múltiplos que possam ter sido os motivos que cooperam com ele". O eu implica o mais simples ato de conhecimento. Os sentidos nos apresentam duas coisas, p.ex., preto e branco; mas não posso compará-los sem estabelecer a diferença para mim. Diferentes sensações não fazem nenhum conhecimento, sem um eu que as reúna. Upton, Hibbert Lectures, prel. 2 - "Pode-se provar tão facilmente a existência de um mundo exterior ao ser humano que não tem sentidos para percebê-lo, como se pode provar a existência de Deus a alguém que não tem consciência dele".
Positivamente - Uma verdade primeira é um conhecimento que, apesar de desenvolvido na ocasião da observação e reflexão, não deriva nem de uma, nem de outra; ao contrário, tem tal prioridade lógica que deve ser assumida ou suposta a fim de tomar possível qualquer observação ou reflexão. Por isso, tais verdades não são primeiro reconhecidas na ordem do tempo; algumas delas são admitidas em um período um tanto tardio no desenvolvimento da mente; para a grande maioria dos homens elas nunca são totalmente formuladas. Contudo, constituem as suposições necessárias nas quais repousa todo o conhecimento, e a mente não só tem a capacidade inata de envolvê-los tão logo se apresentem as ocasiões adequadas, mas o seu reconhecimento é inevitável logo que a mente começa a contar com o seu próprio conhecimento.
Mansel, Metaphysics, 52, 279 - "Descrever a experiência como a causa da idéia do espaço seria tão impreciso como falar do solo em que foi plantado, como a causa do carvalho - embora o plantio no solo seja a condição para que se manifeste a força do seu fruto". Coleridge: "Vemos antes de sabermos que temos olhos; mas uma vez tomado conhecimento disso, percebemos que os olhos devem ter preexistido para capacitar-nos a ver". Cole- ridge fala das primeiras verdades como "aquelas necessidades da mente ou formas de pensamento, que, embora reveladas a nós pela experiência, devem ter preexistido para torná-la possível". McCosh, Intuitions, 48,49 - As instituições são "como a flor e o fruto, que estão na planta desde o seu embrião, mas não podem ser realmente formados enquanto não tenham existido caule, ramos, e folhas". Porter, Human Intellect, 501, 519 - "Não se pode conhecer algumas verdades ou assenti-las antes de tudo". Algumas chegam ao fim de tudo. A intuição moral freqüentemente se desenvolve tarde e às vezes, até mesmo, por ocasião de um castigo físico. "Todo homem é tão ocioso quanto lhe permitam as circunstâncias". A nossa ociosidade física é ocasional; nossa ociosidade mental é freqüente; nossa ociosidade moral é incessante. Somos excessivamente ociosos para pensar e especialmente para pensar em religião. Por conta dessa depravação da natureza humana devemos esperar que, finalmente, a intuição para Deus se desenvolva. O homem se esquiva do contato com Deus e de pensar em Deus. Na verdade o seu desagrado da intuição para Deus o leva, não raro, a negar todas as outras intuições, mesmo as de liberdade e de justiça. Daí a moderna "psicologia sem alma".
Schurman, Agnosticism and Religion, 105-115 - "A idéia de Deus ... se desenvolve mais tardiamente na consciência clara ... e deve ser mais tardia porque é a unidade da diferença entre o eu e o não eu, porque estes são pressupostos". Mas "ela não tem menor valor em si; não atribui menos fidedigna certeza de realidade que a consciência do eu ou a do não eu.... A consciência de Deus é o príus lógico da consciência do eu e do mundo. Mas, como já se observou, não o (prius) cronológico; porque, conforme a profunda observação de Aristóteles, o que vem em primeiro lugar na natureza das coisas é a ordem do desenvolvimento final. Exatamente porque Deus é o primeiro princípio do ser e do conhecer, ele deve ser o último a manifestar-se e a ser conhecido. ... O finito e o infinito são conhecidos simultaneamente e é tão impossível conhecer um sem conhecer o outro como apreender um ângulo sem os lados que o formam".
Seus critérios
São três os critérios pelos quais as verdades primeiras devem ser testadas: b) Sua universalidade. Isto não significa que o homem concorda com elas ou as entenda quando propostas em forma científica, mas que todos os homens manifestam uma crença prática nelas através da linguagem, das ações e das expectações.
Necessidade. Não significa que é impossível negar estas verdades, mas que a mente é compelida por sua própria constituição a reconhecê-las com base na ocorrência de condições próprias e empregá-las em seus argumentos para provar sua não existência.
Independência e prioridade lógicas. Significa que estas verdades não podem ser resolvidas em nenhuma outra; que elas pressupõem a aquisição de todos os outros conhecimentos e, portanto, não podem derivar de nenhuma outra fonte que não seja um poder cognitivo da mente.
Exemplos da negação reconhecida e formal das primeiras verdades: o positivista nega a causalidade; o idealista nega a substância; o panteísta nega a pessoalidade; o necessitário nega a liberdade; o niilista nega a sua própria existência. De igual modo o homem pode argumentar que não há necessidade de uma atmosfera; mas ainda enquanto ele argumenta, ele respira. É um exemplo de argumento arrasador para demonstrar a liberdade da vontade. Admito minha própria existência ao duvidar dela; pois "cogito, ergo sum", como o próprio Descartes insiste, na verdade, significa "cogito, scilicet sum"; H. B. Smith: "Declaração é análise, não prova". Ladd, Philosophy of Knowledge, 59
"O cogito, no Latim bárbaro = cogitans sum: pensar é ser consciente de si mesmo". Bentham - "A palavra deve é de impostura de autoridade e precisa ser banida do reino da moral". Spinoza e Hegel, na verdade, negam a consciência própria quando fazem do homem um fenômeno do infinito. Royce assemelha o homem que nega a pessoalidade para aquele que sai da sua própria casa e declara que ninguém mora nela porque, quando olha para dentro da janela, não vê ninguém.
O Prof. James, em sua Psichology, admite a realidade de um cérebro, mas recusa-se a admitir a realidade de uma alma. Esta é essencialmente a posição do materialismo. Porém esta suposição de um cérebro é metafísica, embora o autor reivindique estar escrevendo uma psicologia sem metafísica. Ladd, Philosophy of Mind, 3 - "O materialista crê na causa própria ao explicar a origem da mente a partir da matéria, mas, quando se lhe pede que veja na mente a causa da mudança física, no mesmo instante ele se torna um simples fenomenalista". Royce, Spirít of Modern Philosophy, 400 - "Eu sei que todos seres, desde que saibam apenas contar, acham que três e dois são cinco. Talvez os anjos não saibam contar; mas, se eles souberem, este axioma é verdadeiro também para eles. Se eu encontrasse um anjo que declarasse que a sua experiência ocasionalmente havia mostrado que três e dois não são cinco, eu saberia de uma vez que tipo de anjo era ele".
A EXISTÊNCIA DE DEUS, UMA PRIMEIRA VERDADE
Que o conhecimento da existência de Deus responde ao primeiro critério da universalidade é evidente a partir das seguintes considerações:
É fato reconhecido que a grande maioria dos homens na verdade tem reconhecido a existência de um ser ou seres espirituais de quem eles supõem depender.
Os Vedas declaram: "Há apenas um Ser - não um segundo". Max Müller, Origin and Growth of Religion, 34 - "Não se invocam os seres visíveis, sol, lua, e estrelas, mas algo que não pode ser visto". As tribos inferiores têm consciência, têm medo da morte, crêem em bruxas, fazem propiciação ou exorcizam os maus fados. Mesmo o adorador de fetiche, que chama a pedra ou a árvore um deus, mostra que já tem a idéia de Deus. Não devemos medir as idéias dos pagãos pela sua capacidade de expressão, nem julgar a crença da criança na existência do seu pai pelo seu sucesso ao desenhar um quadro dele.
As raças e nações que, a princípio, parecem destituídas de tal conhecimento, uniformemente, têm sido encontradas como possuindo-o, de modo que nenhuma tribo de que temos conhecimento pode ser considerada desprovida de um objeto de culto. Podemos admitir que tal conhecimento será visto como verdadeiro mais adiante.
Moffat, que relata certas tribos africanas destituídas de religião, foi corrigido pelo testemunho do seu genro, Livingstone: "A existência de Deus e de
uma vida 1u\ura é reconhecida em toda a parte da Ãírica". Onde os homens são os mais destituídos de qualquer conhecimento formulado de Deus, as condições do despertar da idéia são as mais ausentes. Uma macieira pode ser de tal modo condicionada que nunca produza maçã. "Não julgamos os carvalhos pelo não crescimento, ou espécimens sem flores nos confins do Círculo Ártico". A presença de um ocasional cego, ou surdo ou mudo não anula a definição de que o homem é uma criatura que vê, ouve e fala. Bowne, Principies of Ethics, 154 - "Não precisamos tremer por causa da matemática, mesmo que se encontrem algumas tribos que desconhecem a tabuada. ... Sempre nos deparamos com a existência sub-moral e sub-racional no caso de crianças; e, se encontrássemos isto em outra parte, não teria maior importância".
Vítor Hugo: "Alguns homens negam o infinito; alguns também negam o sol; são cegos". Gladden, What is Left?, 148 - "O homem pode escapar da sua sombra indo para o escuro; se vem para a luz, ei-la de volta. Do mesmo modo o homem pode ser mentalmente tão indisciplinado que não reconheça estas idéias; mas aprenda ele a utilizar a razão e reflita sobre os seus próprios processos mentais e conhecerá que tais processos são idéias necessárias".
Corrobora esta conclusão o fato de que os indivíduos em terras pagãs ou cristãs que professam não ter qualquer conhecimento de um poder ou poderes superiores a eles manifestam indiretamente a existência de tal idéia em suas mentes e sua influência positiva sobre eles.
Comte diz que a ciência conduz Deus à fronteira e daí o lança fora agradecendo os serviços prestados. Mas Herbert Spencer afirma a existência de uma "Força de que não se concebe limite algum de tempo e de espaço, da qual todos os fenômenos presentes na consciência são manifestações".
A intuição de Deus, embora formalmente excluída, está contida implicitamente no sistema de Spencer, na forma de "irresistível crença" num Ser Absoluto, que distingue a sua posição da de Comte; ver H. Spencer, que diz: "Uma verdade deve tornar-se sempre mais clara - uma inescrutável existência manifesta em toda a parte, que nem podemos encontrar e cujo princípio ou fim não podemos conceber - aquela certeza absoluta de que estamos sempre na presença de uma energia infinita e eterna da qual procedem todas as coisas".
O Sr. Spencer admite unidade na Realidade subjacente. Frederick Harrison, escarnecendo, pergunta-lhe: "Por que não dizer 'forças' em vez de 'força'?" Enquanto Harrison nos dá um ideal moral supremo sem base metafísica, Spencer dá-nos um princípio metafísico último sem propósito moral final.
A idéia de Deus é a síntese das duas: "São apenas luzes que partem de Ti, e tu, ó Senhor, és mais do que elas" (Tennyson, in Memoriam).
Sólon fala de Deus como ó 0eóç e como tò 0evov, e Sófocles como ó "iéyaç Qeóç. O termo para Deus é idêntico em todas línguas indo-européias e, por isso, pertence a uma época anterior à separação daquelas línguas. Na Eneida de Virgílio, Mezêncio é um ateu e despreza os deuses e confia só na lança e em seu braço direito; mas, quando lhe trazem o cadáver de seu filho, seu
primeiro ato é levantar as mãos ao céu. Hume era cético, mas disse a Ferguson, em uma noite estrelada: "Adão, Deus existe"! Voltaire orou numa tempestade trovejante nos Alpes. Shelley escreveu seu nome no livro de visitantes na pousada em Montanvert, e acrescentou: "Democrata, filantropo, ateu"; contudo, ele gostava de pensar num "fino espírito penetrando o universo"; e também escreveu: "Aquele permanece, muitos mudam e passam; a luz do Céu brilha sempre, a sombra da terra voa". Strauss adora o Cosmos porque "a ordem e a lei, a razão e a bondade" são a sua alma. Renan confia na bondade, no desígnio, nos fins. Charles Darwin, Life, 1.274 - "Nas minhas extremas flutuações, nunca fui ateu, no sentido de negar a existência de Deus".
Este acordo entre indivíduos e nações tão amplamente separados no tempo e no espaço pode ser satisfatoriamente explicado supondo que tem sua base, não em circunstâncias acidentais, mas na natureza do homem como tal. As diversificadas e imperfeitamente desenvolvidas idéias do supremo ser que prevalecem entre os homens são levadas em conta de melhor forma como falsas interpretações e perversões de uma convicção intuitiva comum a todos.
Huxley, Lay Sermons, 163 - "Há selvagens sem Deus, em qualquer sentido apropriado da palavra; mas não há nenhum sem espíritos". Martineau, Study, 2.353, retruca com propriedade: "Ao invés de fazer outros povos voltarem-se para os espíritos e daí um apropriar-se de nós mesmos [e atribuir outro a Deus, podemos acrescentar] por imitação, partimos do senso de continuidade pessoal, e depois atribuímos os mesmos predicativos de outros, sob as figuras que conservam a maior parte do elemento físico e perecível". Grant Allen descreve as mais elevadas religiões como "um grosseiro desenvolvimento de um fungóide", que se reuniu em torno do culto ancestral. Mas isto faz derivar o maior do menor. Sayce, Hibbert Lectures, 358 - "Não vejo nenhum traço de culto ancestral na literatura babilônica que tenha sobrevivido até nós" - isto parece fatal para o ponto de vista de Huxley e de Allen de que a idéia de Deus deriva da primitiva crença do homem nos espíritos dos mortos. C. M. Tyler, in Am. Jour. Theol., jan., 1899.144 - "Parece impossível deificar um morto, a não ser que haja uma consciência primitiva embrionária anterior ao conceito de divindade".
Renouf, Religion of Ancient Egypt, 93 - "Toda a mitologia do Egito ... gira em torno das histórias de Rá e Osíris. ... Descobriram-se textos que identificam Osíris e Rá. ... Conhecem-se outros textos em que Rá, Osíris, Ámon e outros deuses desaparecem, a não ser como simples nomes, e afirma-se a unidade de Deus na mais nobre linguagem da religião monoteísta". Estes fatos são mais antigos que qualquer culto aos ancestrais. "Eles apontam para uma idéia original da divindade acima da humanidade" (ver Hill, Genetic Philosophy, 317). Podemos acrescentar a idéia do elemento sobre-humano, antes de considerarmos o animismo ou culto aos ancestrais em uma religião. Tudo o que o homem primitivo via na sua natureza sugeria tal elemento sobre-humano, especialmente a vista dos altos céus e aquilo que ele conhece de causalidade relacionado com eles.
Ver-se-á que o conhecimento da existência de Deus responde ao segundo critério da necessidade, considerando-se:
Que o homem, sob circunstâncias adequadas à manifestação deste conhecimento, não pode deixar de reconhecer a existência de Deus. A contemplação da existência finita, inevitavelmente sugere a idéia de um ser infinito como seu correlato. Quando a mente percebe a sua finitude, dependência, responsabilidade, imediata e necessariamente percebe a existência de um ser infinito e incondicionado de quem ela depende e perante o qual ela é responsável.
Não podemos reconhecer o finito como tal a não ser comparando-o com um padrão já existente - o Infinito. Mansel, Limits of Religious Thought, prel. 3
"A constituição da nossa mente nos compele a crer na existência de um Ser Absoluto e Infinito - crença que parece impor um complemento da nossa consciência do relativo e do finito". Fisher, Jour. Chr. Philos., jan. 1883.113 - "O ego e o não ego, cada um condicionado pelo outro, pressupõe um ser não condicionado de que eles dependem. O ser não condicionado é a pressuposição de todo o nosso conhecimento". O ser dependente percebido implica um independente; o independente é perfeitamente autodeterminante; autodeterminação é Personalidade infinita. John Watson, in Philos. Rev., set.
1893.526 - "Não há consciência do eu sem a consciência de outros eus e de outras coisas; não há consciência do mundo sem a consciência da Realidade simples que ambos pressupõem". E. Caird, Evolution of Religion, 64-68 - Cada ato da consciência implica elementos primários: "a idéia do objeto, ou do não eu; a idéia do sujeito, ou do eu; e a idéia da unidade que pressupõe a diferença entre o eu e o não eu que agem e reagem numa relação recíproca".
Que o homem, em virtude da sua humanidade, tem capacidade para a religião. Tal reconhecida capacidade para a religião é prova de que a idéia de Deus é necessária. Se a mente, na ocasião própria, não desenvolvesse esta idéia, não haveria nada no homem para o que a religião pudesse apelar.
"É a sugestão do Infinito que distancia a linha do horizonte, vista acima da terra ou do mar, muito mais do que as belezas de qualquer paisagem limitada".
Em situações de choque e de perigo, esta intuição racional torna-se cognos- cível; o homem se torna cada vez mais consciente da existência de Deus do que da existência dos seus companheiros e instintivamente clama por auxílio da parte de Deus. Nos mandamentos ou reprimendas de natureza moral a alma reconhece um Legislador e Juiz de cuja voz a consciência é simplesmente um eco. Aristóteles chamava o homem de "um animal político"; há mais verdade na declaração de Sabatier, de que "o homem é um religioso incurável". São Bernardo: "Noverim me, noverim te". O. P. Giffort: "Como a nata do leite que, em condições adequadas não sobe, não é leite, do mesmo modo o homem que, no tempo proprio, não apresenta nenhum conhecimento de Deus, não é homem; é bruto". Entretanto, não se deve esperar nata de um leite congelado. Há necessidade de condições e ambiente próprios.
É o reconhecimento de uma personalidade divina na natureza que constitui o maior mérito e encanto da poesia de Wordsworth. Em sua obra Abadia de Tintem, ele fala de "Uma presença que me perturba com a alegria de pensamentos elevados; um senso de algo muito mais profundamente mesclado Cuja moradia é a luz dos sóis poentes e o redondo oceano e o ar vivente, e o céu azul e, na mente do homem: Um movimento e um espírito que impele todas as coisas pensantes, todos os objetivos de todo pensamento, e rola através de todas as coisas". Robert Browning vê Deus na humanidade, como Wordsworth vê Deus na natureza. Na sua Hohenstiel-Schwangau ele escreve: "Eis a glória concebida, ou sentida ou conhecida em todos: Eu tenho uma mente - Não minha, mas como se o fosse - porque é a dupla alegria que faz todas as coisas por mim e eu em seu favor". John Ruskin sustenta que a fonte da beleza no mundo é a presença de Deus. Ele nos diz que, em sua juventude, tinha "uma contínua percepção da santidade na natureza toda, desde as menores às mais vastas coisas - um misto instintivo de temor e prazer, uma indefinível comoção tal como às vezes imaginamos indicar a presença de um espírito desencarnado". Porém o Espírito que nós vemos é encarnado. Nitzsch, Chrístian Doctrine, par. 7 - "A não ser que a consciência inata de Deus como uma predisposição operante preceda a educação e a cultura, nada há que estas consigam realizar".
Que aquele que nega a existência de Deus deve tacitamente assumir tal existência em seu próprio argumento, empregando processos lógicos cuja validade se apoia no fato da existência de Deus. A plena prova disto se encontra no subtítulo seguinte.
"Deus sabe que eu sou ateu" - é o absurdo que dá início à desaprovação da existência divina. Cutler, Beginnings of Ethics, 22 - "Mesmo os niilistas, cujo primeiro princípio é que Deus e o dever são grandes espantalhos a serem abolidos, admitem que Deus e o dever existem e são impelidos pelo senso do dever a aboli-los". Sra. Browning, The Cry of the Human: '"Não há Deus', diz o néscio; Porém ninguém diz: 'Não há tristeza'; E a natureza sempre clama por fé; Na amarga necessidade tomará emprestado; Olhos que o pregador não pode ensinar Pelas sepulturas à beira do caminho levantam-se; e os lábios dizem, 'Deus tem piedade', nunca dizem, 'Louvado seja Deus"'.
Dr. W. W. Keen, chamado para tratar da afasia de um irlandês, disse: "Bem, Dennis, como vai você?" "Oh! doutor, eu não posso falar!" "Mas, Dennis, você está falando". "Oh! doutor, há muitas palavras que eu não sei falar!" "Bem, Dennis, vou tentar ajudá-lo. Veja se você não pode dizer: 'cavalo'". "Oh! querido doutor, 'cavalo' é uma palavra que eu não sei dizer!"
Pode-se mostrar que o conhecimento da existência de Deus responde ao terceiro critério da independência lógica e prioridade da seguinte maneira:
Implica todos outros conhecimentos como condição e fundamentação lógica. A validade dos mais simples atos mentais, tais como percepção senso- rial, consciência própria e memória depende da aceitação de que existe um Deus que constituiu as nossas mentes de modo a dar-nos o conhecimento das coisas como são.
Pfleiderer, Philos. of Religion, 1.88 - "Não se deve encontrar a base da ciência e do conhecimento em geral, nem no sujeito, nem no objeto per se, mas só no pensar divino a combinar os dois, que, como base comum das formas de ser em todas as coisas, possibilita a correspondência entre aquele e este, ou, em uma palavra, possibilita o conhecimento da verdade". 91 - "Pressupõe-se a crença religiosa em todo o conhecimento científico, como base da sua possibilidade". Este é o pensamento do SI. 36.9 - "Na tua luz veremos a luz". A. J. Balfour, Foundations of Belief, 303 - "Não se pode provar a uniformidade da natureza a partir da experiência, pois é ela que possibilita a prova da experiência. ... Admita-o e acharemos que os fatos se conformam com ela. ... 309 - Só se pode estabelecer a uniformidade da natureza com o auxílio desse mesmo princípio que necessariamente está comprometido nas tentativas de prová-lo. ... Deve haver um Deus que justifique a nossa confiança nas idéias inatas".
Bowne, Theory of Thought and Knowledge, 276 - "A reflexão mostra que a comunidade de inteligências individuais só é possível através de uma Inteligência totalmente abrangente, originadora e criadora das mentes finitas".
A ciência apoia-se no postulado de uma ordem mundial. Huxley: "O objetivo da ciência é a descoberta da ordem racional que permeia o universo". Esta ordem racional pressupõe um Autor racional. Dubois, New Englander, nov.
1890.468 - "Admitimos a uniformidade e a continuidade, ou não podemos ter ciência. Uma Vontade Criativa inteligente é uma hipótese científica genuína [postulado?] que a analogia sugere e a experiência confirma, não contradizendo a lei fundamental da uniformidade, mas explicando-a". Ritchie, Darwin and Hegel, 18 - "A natureza como um sistema é uma suposição subjacente às mais antigas mitologias: preenche esta concepção no objetivo da mais tardia ciência". Royce, Relig. Aspect of Philosophy, 435 - "Existe uma coisa que se chama erro; mas o erro é inconcebível a não ser que haja uma sede da verdade, um Pensamento ou uma Mente que inclui tudo; é por isso que a referida Mente existe".
Só se pode confiar nos mais complicados processos da mente, tais como a indução e a dedução, supondo uma divindade pensante que fez as várias partes do universo e os vários aspectos da verdade corresponderem-se uns aos outros e às faculdades investigadoras do homem.
Argumentamos a partir de uma maçã para com as outras que estão na árvore. A partir da queda de uma maçã Newton raciocinou sobre a gravita- ção na lua e em todo o sistema solar. A partir da química do nosso mundo Rowland raciocinou sobre a de Sírius. Em todos esses raciocínios admite-se um pensamento unificador e uma Divindade pensante. Este é o "emprego científico da imaginação" de Tyndall. Diz ele: "Alimentado pelo conhecimento em parte adquirido e ligado pela cooperação da razão, a imaginação é o mais poderoso instrumento da física; descobridora". O que Tyndall chama de "imaginação" é, na verdade, o discernimento relativo aos pensamentos de Deus, o grande Pensador. O discernimento prepara o caminho para o raciocínio lógico; não é um simples produto do raciocínio. Por esta razão Goethe chama a imaginação "Die Vorschule des Denkens", "a pré-escola do pensamento".
Peabody, Christianity, the Religion of Nature, 23 - "A indução é um silogismo cujo termo constante são os imutáveis atributos de Deus". Porter, Hum. Intellect, 492 - "A indução apoia-se na suposição, quando demanda como base, que existe uma Divindade pessoal ou pensante"; 658 - "Ela não tem sentido ou validade a não ser que admitamos que o universo é constituído de tal modo que pressupõe um originador não condicionado, mas absoluto de suas forças e leis"; 662 - "Analisamos os vários processos do conhecimento em suas suposições subjacentes e achamos que a subjacente a todas é a de uma Inteligência auto-existente que o homem não só pode, mas deve conhecer para que possa conhecer outras coisas mais". Harris, Philos. Basis of Theism, 81 - "Os processos de pensamento reflexivo implicam que o universo se fundamenta na razão e em sua manifestação"; 560 - "A existência de um Deus pessoal é um dado necessário do conhecimento científico".
Nossa crença primitiva na causa final ou, em outras palavras, nossa convicção de que todas as coisas têm o seu fim, que o desígnio permeia o universo, envolve uma crença na existência de Deus. Admitindo que há um universo, que é um todo racional, um sistema de relações de pensamento, admitimos a existência de um pensador absoluto, de cujo pensamento o universo é expressão.
Pfleiderer, Philos. of Religion, 1.81 - "Só se pode pensar no real se se tratar de um pensamento realizado, previamente elaborado, que pode repetir- se. Por isso, o real, para ser objeto do nosso pensamento, deve ter sido realizado a partir da criação, de uma Razão divina eterna que se apresenta ao nosso pensar cognitivo". Royce, World and Individual, 2.41 - "A teologia universal constitui a essência de todos os fatos". A. H. Bradford, The Age of Faith, 142 - "O sofrimento e a tristeza são universais. Quer Deus possa ou não impedi-los e, por isso, ele nem é benéfico, nem amoroso; ou será que ele não pode impedi-los e consequentemente há alguma coisa maior que Deus e, por isso, não há Deus? Mas eis aqui o emprego da razão no raciocínio individual. O raciocínio no indivíduo necessita a razão absoluta ou universal.
Se há uma razão absoluta, então o universo e a história são administrados em harmonia com a razão; nesse caso o sofrimento e a tristeza nem podem ser sem sentido, nem finais, porque seriam uma contradição da razão. Não é possível no universal e absoluto aquilo que, no homem, contradiz a razão".
Nossa crença primitiva na obrigação moral ou, em outras palavras, nossa convicção de que o direito tem autoridade universal, envolve a crença na existência de Deus. Admitindo que o universo é um todo moral, admitimos a existência de uma vontade absoluta, de cuja justiça o universo é expressão.
Pfleiderer, Philos. of Religion, 1:88 - "A base da obrigação moral não é encontrada nem no sujeito nem na sociedade, mas somente na vontade universal e divina que combina a ambas ... 103 - A idéia de Deus é a unidade da verdade e do bem, ou das duas idéias mais altas que nossa razão pensa como razão teorética, mas requer como razão prática ... Na idéia de Deus nós encontramos a única síntese do mundo que é - o mundo da ciência e do mundo que deve ser - o mundo da religião." Seth, Ethical Principies, 425 - "Isto não é uma demonstração matemática. A filosofia jamais é uma ciência exata. É, pelo contrário, oferecida como o único fundamento suficiente da vida moral ... A vida de bondade ... é uma vida baseada na convição de que sua fonte e sua propagação estão no Eterno e no Infinito." Como verdade e bondade finitas só são compreensíveis à luz de algum princípio absoluto que fornece a elas um padrão ideal, desse modo a beleza finita é inexplicável exceto quando ali existe um padrão perfeito com o qual pode ser comparado.
A beleza é mais do que o agradável ou o útil. Proporção, ordem, harmonia, unidade na diversidade - tudo isto são características da beleza. Todas elas, porém, implicam um ser intelectual e espiritual, de quem elas procedem e por quem elas podem ser medidas. Tanto a beleza física quanto a moral, em coisas e seres finitos, são símbolos e manifestações daquele que é o autor e amante da beleza e que é em si mesmo a infinita e absoluta beleza. A beleza na natureza e nas artes mostra que a idéia da existência de Deus é logicamente independente e anterior. l/erCousiN, The True, The Beautiful, and the Good, 140-153; Kant, Metaphysic of Ethics, que sustenta que a crença em Deus é a pressuposição necessária da crença no dever.
Repetindo estes quatro pontos de outra forma - a intuição de uma razão absoluta é d) pressuposição necessária de todos os outros conhecimentos de modo que não podemos conhecer a existência de qualquer coisa sem, antes de mais nada, admitir que Deus existe; b) a base necessária de todo o pensamento lógico de modo que não podemos confiar em qualquer dos nossos processos de raciocínio a não ser admitindo que uma divindade pensante construiu nossas mentes com relação ao universo e à verdade; c) a implicação necessária de nossa crença primitiva no desígnio de modo que podemos admitir que todas as coisas existem com um propósito, fazendo uma pressuposição de que existe um Deus proponente - pode considerar o universo como um pensamento somente postulando a existência de um Pensador absoluto; e d) o fundamento necessário da nossa convicção de obrigação moral de modo que podemos crer na autoridade universal do direito, só admitindo que existe um Deus de justiça que revela sua vontade tanto na consciência do indivíduo como na moral do universo em toda a sua extensão. Não podemos provar que Deus é; mas podemos mostrar que, para a existência de qualquer conhecimento, pensamento, razão, consciência, o homem precisa admitir que Deus é.
Eis o que Jacobi diz a respeito do belo: "Es kann gewiesen aber nicht bewiesen werden" - pode-se mostrar, mas não provar. Bowne, Metaphysics, 472 - "O nosso conhecimento objetivo a respeito do finito deve apoiar-se na confiança ética no infinito"; 480 - "O teísmo é o postulado absoluto de todo conhecimento, ciência e filosofia"; "Deus é o fato mais certo do conhecimento objetivo". Ladd, Bibiia Sacra, out. 1877.611-616-"Cogito ergo Deus est. Somos constrangidos a postular um ser que não é nós mesmos e que age em favor da racionalidade assim como da justiça". W. T. Harris: "Até mesmo a ciência natural é impossível, onde a filosofia ainda não ensinou que a razão fez o mundo e que a natureza é a revelação do racional".
Pascal: "A Natureza confunde o pirrônico e a Razão confunde o dogmático. Temos uma incapacidade de demonstração que aquele não pode vencer; temos uma concepção da verdade que este não pode perturbar". "Não existe nenhum incrédulo! Qualquer que diz 'Amanhã', 'o Desconhecido', 'o Futuro', confia que a Força sozinha não ousa repudiar". Jones, Robert Browning, 314 - "Na verdade não podemos provar Deus como uma conclusão de um silogismo, porque ele é a primeira hipótese de todas as provas". Robert Browning, Hohenstiel-Schwangau: "Eu sei que ele está ali, como eu estou aqui, com a mesma prova, que parece não provar nada, e isto vai além das formas familiares de prova"; Paracelsus, 27 - "Conhecer consiste em abrir caminho pelo qual o esplendor aprisionado pode escapar em vez de efetuar a entrada de uma luz que se supõe estar do lado de fora". Tennyson, O Santo Graal: "Que as visões da noite ou do dia venham quando quiserem e muitas vezes. ... Nos momentos quando ele sente que não pode morrer e não conhece nenhuma visão de si mesmo, e nenhuma de Deus nos altos, nem daquele Ser que ressuscitou"; O Antigo Sábio, 548, - "Tu não podes provar o Inominável, ó meu filho! nem podes provar o mundo em que tu te moves. Tu não podes provar que tu és só um corpo, nem que tu és só espírito, nem que tu és ambos em um. Tu não podes provar que tu és imortal, não, nem ainda que tu és mortal. Ora, meu filho, tu não podes provar que eu, que falo contigo, não estou em conversa contigo mesmo. Porque nada que merece prova pode-se provar, nem rejeitar: Portanto, sê sábio, apega- te sempre ao lado mais ensolarado da dúvida e sobe em escalada para a fé além das formas da fé".
OUTRAS SUPOSTAS FONTES DA NOSSA IDÉIA
Nossa prova de que a idéia da existência de Deus é uma intuição racional não se completará enquanto não mostrarmos que são insuficientes as tentativas de contar, por outros meios, a origem da idéia e requerem como pressuposição a própria intuição que elas suplantariam ou reduziriam a uma posição secundária. Reivindicamos que isto não pode derivar de qualquer outra fonte que não seja uma força cognitiva originária da mente.
Não da revelação exterior, quer comunicada à) através das Escrituras, quer b) através da tradição; pois, a menos que o homem tivesse de outra fonte
um conhecimento prévio da existência de um Deus a partir do qual pudesse vir uma revelação, esta não teria nenhuma autoridade para ele.
H. B. Smith, Faith and Philosophy, 18 - "Uma revelação tem como certo que aquele a quem ela se faz tem algum conhecimento de Deus, embora possa ampliá-lo e purificá-lo". Não podemos provar Deus a partir da autoridade das Escrituras e daí provar as Escrituras a partir de Deus. A própria idéia da Escritura como revelação pressupõe a crença em um Deus que pode fazê- la. Newman Smyth, New Englander, 1878.355 - Não podemos derivar do relógio de sol nosso conhecimento da existência de um astro deste tipo. O relógio de sol pressupõe o sol e não pode ser entendido sem um prévio conhecimento deste. Wuttke, Christian Ethics, 2.103 - "A voz do ego divino não vem primeiro à consciência do ego do indivíduo a partir de fora; ao contrário disto, cada revelação externa pressupõe a interna; deve ecoar vindo de dentro do homem algo ligado à revelação exterior para ser reconhecido e aceito como divino".
Fairbairn, Studies in Philos. of Relig. and Hist., 21.22 - "Se o homem depende da revelação externa para a sua idéia de Deus, então ele deve ter aquilo que, com felicidade, Schelling expressou, denominando de 'um ateísmo original da consciência'. Em tal caso a religião não pode estar enraizada na natureza do homem; ela deve ser implantada a partir de fora". Schurman, Beliefin God, 78 - "A revelação primitiva de Deus dotara o homem da capacidade de apreender sua origem divina. Tal capacidade, como qualquer outra, realiza-se apenas na presença de condições apropriadas". Clarke, Christian Theology, 112 - "A revelação não pode demonstrar a existência de Deus, porque deve admiti-la; mas manifestará sua existência e caráter aos homens e lhes servirá como a principal fonte de certeza a respeito de Deus porque lhes ensinará o que não poderiam conhecer por outros meios".
Nem a nossa idéia de Deus vem primeiramente da tradição porque "esta só pode perpetuar o que já foi originado" (Patton). Se o conhecimento assim transmitido é o de uma revelação primitiva, então, aplica-se o argumento já estabelecido - que a própria revelação pressupunha naqueles que primeiro a receberam e pressupõe naqueles a quem é transmitida algum conhecimento de um ser de quem tal revelação poderia vir. Se o conhecimento assim transmitido é somente o dos resultados dos raciocínios da raça, então o conhecimento de Deus vem originariamente da razão - explicação que consideraremos adiante.
Semelhantes respostas devem ser dadas a muitas explicações comuns sobre a crença do homem em Deus. "Primus in orbe deos fecit timor" (Primeiro o medo na terra fez um deus); a Imaginação fez a religião; os Sacerdotes inventaram a religião; a Religião é matéria de imitação e moda. Porém perguntamos ainda: O que causou o medo? Quem fez a imaginação? O que tornou possível os sacerdotes? O que tornou natural a imitação e a moda? Dizer que o homem adora somente porque vê outros homens adorarem é tão absurdo como dizer que o cavalo come feno porque vê outros cavalos comerem-no. Deve haver na alma fome a ser satisfeita ou as coisas exteriores nunca atrairiam o homem à adoração. Os sacerdotes nunca poderiam impor
aos homens com tanta continuidade se não houvesse na natureza humana uma crença universal em um Deus que pudesse comissionar os sacerdotes como seus representantes. Por si mesma a imaginação requer alguma base de realidade, que aumenta ã medida que a civilização avança. O fato de que a crença na existência de Deus amplia o apoio sobre a raça, que aumenta a cada século, mostra que, ao invés de o medo ter causado a crença em Deus, a verdade é que a crença em Deus causou o temor; na verdade, "o temor do Senhor é o princípio de toda a sabedoria" (SI. 111.10).
Não da experiência, quer esta signifique d) percepção sensorial e reflexão do indivíduo (Locke), b) os resultados acumulados das sensações e associações das gerações passadas da raça (Herbert Spencer), quer c) o real contato da nossa natureza sensitiva com Deus, realidade supra-sensível, através do sentimento religioso (Newman Smyth).
A primeira forma desta teoria é inconsistente com o fato de que a idéia de Deus não é a idéia de um objeto sensível ou material, nem uma combinação de tais idéias. Porque o espiritual e o infinito são opostos diretos do material e finito, nenhuma experiência destes pode contar com a nossa idéia daqueles.
Com Locke (Essay on Hum. Understanding, 2.1.4), experiência é receptividade passiva das idéias pela sensação e pela reflexão. A teoria da "tábula rasa" de Locke confunde a ocasião das nossas idéias primitivas com a causa destas. Para a sua afirmação: "Nihil est in intellectu nisi quod ante fuerit in sensu" (N.Trad.: Nada há no intelecto, que não esteja anteriormente no sentido), Leibnitz responde: "Nisi intellectus ipse" (N.Trad.: a não ser o próprio intelecto). Às vezes a consciência é chamada a fonte do nosso conhecimento de Deus. Mas a consciência, como um simples conhecimento acessório de nós mesmos, ou dos nossos estados, não é propriamente a fonte de qualquer outro conhecimento. O alemão Gottesbewusstsein = não a "consciência de Deus", mas o "conhecimento de Deus"; Bewusstsein aqui = não um "com- ciência", mas o "ser-ciência".
Fraser, Locke, 143-147 - As sensações são os tijolos e a associação a argamassa, do edifício mental. Bowne, Theory of Thought and Knowledge, 47
"Desenvolver a linguagem permitindo que os sons se associem e evoluam o sentido por si mesmos? Contudo este é o exato paralelo da filosofia cujo objetivo é edificar a inteligência a partir da sensação. ... 52 - "Aquele que não sabe ler debalde olha para o sentido de uma página impressa e debalde procura auxiliar a sua deficiência utilizando óculos fortes". Contudo, mesmo que a idéia de Deus fosse um produto da experiência, não teríamos a garantia de rejeitá-la como irracional. verBROOKS, Foundations ofZoology, 132 - "Não há nenhum antagonismo entre os que atribuem o conhecimento à experiência e os que o atribuem à nossa razão inata; entre os que atribuem o desenvolvimento do germe a condições mecânicas e os que o atribuem à potencialidade inerente do próprio germe; entre os que sustentam que toda a natureza estava latente no vapor cósmico e os que crêem que tudo na natureza tem uma intenção imediata e predeterminada". Todos estes podem ser métodos do Deus imanente.
A segunda forma da teoria está aberta à objeção de que mesmo a primeira experiência do primeiro homem do mesmo modo que a última experiência do homem pressupõe tal intuição assim como outras intuições e portanto não podem ser a sua causa. Contudo, mesmo que esta teoria da origem fosse correta, ainda assim seria impossível pensar no objeto da intuição como se não existisse, ainda representaria para nós a mais elevada medida de certificação atualmente ao alcance do homem. Se a evolução das idéias destina-se à verdade ao invés da falsidade, é a parte da sabedoria que age sobre a hipótese de que a nossa primitiva crença é verdadeira.
Martineau, Study, 2.26 - "A natureza tanto é digna de confiança em seus processos, como em suas dádivas". Bowne, Examination of Spencer, 163,164
"Devemos nós buscar a verdade nas mentes dos macacos pré-humanos, ou nas cegas excitações de qualquer massa primitiva? Nesse caso podemos, na verdade, pôr de lado toda a nossa ciência, mas, juntamente com ela, pôr de lado a grande doutrina da evolução. A filosofia-experiência não pode escapar a esta doutrina; ou os pronunciamentos positivos da consciência da nossa natureza devem ser aceitos como se apresentam ou toda a verdade deve ser declarada impossível".
Charles Darwin, em uma carta escrita um ano antes da sua morte, referindo-se às suas dúvidas quanto à existência de Deus, pergunta: "Podemos nós confiar nas convicções da mente de um macaco?" Podemos responder: "Podemos confiar nas conclusões de alguém que outrora foi bebê"? Bowne, Ethics,
3 - "A gênese e emergência de uma idéia são uma coisa; sua validade é bem outra. O valor lógico da química não pode ser decidido recitando princípios da alquimia; e o valor lógico da astronomia independe do fato de que ela começou com a astrologia. ... 11 - Mesmo que o homem viesse do macaco, não teríamos necessidade de tremer pela validade da sua tabela de multiplicação ou da Regra Áurea. Se temos discernimento moral, não importa como o adquirimos; e se não temos tal discernimento, não há auxílio algum para qualquer teoria psicológica. ... 159 - Não devemos apelar para os selvagens e bebês a fim de encontrar o que é natural para a mente humana.... No caso de qualquer coisa que está sob a lei do desenvolvimento podemos achar a sua verdadeira natureza, não retrocedendo às suas rudes origens, mas estudando o resultado acabado". Dowson, Mod. Ideas of Evolution, 13 - "Se a idéia de Deus for o fantasma de um cérebro símio, podemos confiar na razão ou consciência em qualquer outra matéria? Não podem a ciência e a filosofia por si mesmas ser semelhantes a fantasias, envoltas por mero acaso ou pelo elemento desarrazoado?" Mesmo que o homem viesse do macaco, não há como explicar suas idéias através das dele: "O homem é o homem porque o é".
Devemos julgar os princípios pelos fins, não os fins pelos princípios.
O importante não é como ocorre o desenvolvimento do olho nem como era imperfeito o sentido da visão, já que o olho agora nos dá a informação correta dos objetos exteriores. Do mesmo modo não importa como se originaram as intuições de justiça e de Deus, visto que agora elas nos dão o conhecimento da verdade objetiva. Temos que admitir como certo que a evolução das idéias não vêm a partir do sentido para o não sentido. C. H. Lewes, Study of Psycho- logy, 122 - "Podemos entender a ameba e o pólipo só através da luz refletida do estudo do homem". Seth, Ethical Principies, 429 - "O carvalho explica o fruto até de modo mais veraz que o oposto". Sidgwick: "Ninguém apela do senso de belo do artista para o da criança". Os maiores matemáticos não são menos verdadeiros porque podem ser apreendidos só pelo exercício do intelecto. Não se atribui nenhuma importância estranha ao que se sentiu ou se pensou em primeiro lugar". Robert Browning, Paracelsus: "O homem, tendo descoberto, imprime para sempre a sua presença a todas as coisas inertes.
... Um refluxo suplementar da luz ilustra todos os graus inferiores, explica cada passo anterior no círculo". O homem, com as suas mais elevadas idéias, mostra o sentido e conteúdo de tudo o que se destina a ele. Ele é o último degrau na subida da escada e, a partir deste mais elevado produto e de suas idéias, podemos inferir quem é o seu Criador.
Bixby, Crisis in Morais, 162,245 - "A evolução dá ao homem apenas tamanha altura que ele pode ao menos discernir as estrelas da verdade moral que outrora estiveram abaixo do horizonte. Isto é muito diferente de dizer-se que as verdades morais são apenas produtos transmitidos da experiência da utilidade. ... O germe da idéia de Deus como da idéia de direito devem ter estado no homem logo que ele se tornou homem; ganhando do bruto, ela o tornou um homem. A razão não é apenas um registro dos fenômenos físicos e da experiência de prazer e de dor: é também criativa. Discerne a unidade das coisas e a supremacia de Deus". Sir Charles Lyell: "A presunção é enorme porque todas as nossas faculdades, embora sujeitas a errar, são verdadeiras na essência e apontam para os reais objetivos. A faculdade religiosa no homem é, de todas, uma das mais fortes. Existiu nas mais primitivas eras e, ao invés de desgastar-se ante o avanço da civilização, torna-se cada vez mais forte e hoje é mais desenvolvida entre as mais elevadas raças do que jamais fora antes. Penso confiar seguramente que ela aponta para uma grande verdade". Fisher, Nat. and Meth. of Rev., 137, cita Agostinho: "Securus judicat orbis terrarum" (N.Trad.: O universo seguro julga as terras), e diz-nos que se admite ser o intelecto um órgão do conhecimento, embora possa ter evoluído. Mas, se o intelecto é digno de confiança, também a natureza o é. George A. Gordon, The Christ of To-day, 103 - "Para Herbert Spencer, a história humana é apenas um incidente da história natural e suprema é a força. Para o cristianismo a natureza é tão somente o começo e o homem a sua consumação. O que é que dá a mais elevada revelação da vida da árvore: a semente, ou o fruto?"
A terceira parte da teoria parece fazer Deus um objeto sensorial a reverter a apropriada ordem do conhecimento e sentimento, a ignorar o fato de que em todo o sentimento há pelo menos algum conhecimento de um objeto e a esquecer que a validade deste mesmo sentimento só pode ser mantida admitindo anteriormente a existência de uma divindade racional.
Newman Smyth diz-nos que o sentimento vem em primeiro lugar; a idéia em segundo. Não se negam as idéias intuitivas, mas declara-se que são reflexos diretos dos sentimentos no pensamento. São elas a percepção imediata daquilo que ele sente que existe. Considera-se idealista o conhecimento direto de Deus pela intuição; considera-se que, chegar-se a Deus por inferência, é uma tendência racionalista.
Admitimos que, mesmo no caso dos impenitentes, grande perigo, grande regozijo, grande pecado freqüentemente transformam a intuição racional de Deus em intuição perceptível aos sentidos. Contudo, não se pode afirmar que a intuição perceptível aos sentidos seja comum a todos os homens. Não fornece fundamento ou explicação de uma capacidade universal para a religião. Sem a intuição racional, não seria possível a intuição perceptível aos sentidos, visto que é só o racional que capacita o homem a receber e a interpretar o elemento perceptível aos sentidos. A própria confiança que depositamos no sentimento pressupõe uma crença intuitiva em um Deus verdadeiro e bom.
Em 1869 Tennyson dizia: "Sim, é verdade que há momentos quando a carne nada é para mim; quando eu sei e sinto que a carne é a visão; Deus e o elemento espiritual são o elemento real; ele me pertence mais do que as minhas mãos e pés. Você pode dizer-me que as minhas mãos e os meus pés são apenas símbolos imaginários da minha existência; posso até crer em você; mas você nunca, nunca pode convencer-me de que o eu não é uma Realidade eterna e de que o espiritual não é a minha parte real e verdadeira".
Não do raciocínio, porque:
A verdadeira aparição deste conhecimento na grande maioria das mentes não resulta de qualquer processo consciente de raciocínio. Por outro lado, com base na ocorrência de condições próprias, ele lampeja sobre a alma a rapidez e força de uma revelação imediata.
O poder da fé do homem na existência de Deus não é proporcional ao poder da faculdade de raciocinar. Por outro lado, o homem de maior poder lógico é freqüentemente um inveterado cético, enquanto o de fé não oscilante está entre os que não podem mesmo entender os argumentos da existência de Deus.
Há mais neste conhecimento que o raciocínio jamais poderia ter fornecido. O homem não limita a sua crença em Deus às conclusões do argumento. Os argumentos da existência divina, valiosos para os propósitos a serem mostrados daqui para frente, não bastam por si mesmos para garantir nossa convicção de que existe um ser infinito e absoluto. Aparecerá apoiado no exame que um argumento a priori só é capaz de provar uma proposição abstrata e ideal, mas nunca pode conduzir-nos à existência de um Ser real. Parece que os argumentos aposteriori da existência meramente finita, nunca podem demonstrar a existência do infinito. Nas palavras de Sir Wm. Hamilton - "Uma demonstração do absoluto a partir do relativo é logicamente absurda como em tal silogismo podemos colecionar na conclusão o que não está distribuído nas premissas" - em resumo, a partir das premissas finitas não podemos tirar conclusão infinita.
Sir Wm. Hamilton: "Saindo do particular, admitimos que não é possível, em nossas mais elevadas generalizações, transcendermos o finito". E. G. Robinson: "A mente humana revela maior provisão do que jamais contiveram os grandes reservatórios". Existe mais na idéia de Deus do que poderia ter escoado de um tão pequeno funil como é o raciocínio humano. Uma simples palavra, uma nota acidental, ou uma atitude de oração sugere a idéia a uma criança. Helen Keller contou a Phillips Brooks que ela sempre soubera que há um Deus, mas não o conhecia pelo nome. Ladd, Philosophy of Mind, 119 —
"Há uma tola suposição de que nada se pode conhecer ao certo a não ser que seja alcançado como resultado de um processo silogístico, ou que, quanto mais complicado e sutil for tal processo, mais certa é a conclusão. O conhecimento por inferência sempre depende da certeza superior do conhecimento imediato". George Duncan, in Memorial ofNoah Porter, 246 - "Toda a dedução apoia-se num prévio processo de indução, ou nas intuições de tempo e espaço que envolvem Infinito e Absoluto".
Nem os homens chegam ao conhecimento da existência de Deus por inferência; pois a inferência é silogismo condensado e, como forma de raciocínio, está igualmente aberto à objeção já mencionada. Vimos, contudo, que todo processo lógico se baseia na aceitação da existência de Deus. Evidentemente o que se pressupõe em todo raciocínio não pode ser provado pela razão.
Referimo-nos, naturalmente, à inferência, mediata, porque na imediata {p.ex., "Todos os governantes são justos; logo, nenhum dos governantes injustos governa bem") não há nenhum raciocínio e nem progresso no pensamento. A inferência mediata é raciocínio - é silogismo condensado; e o que é muito condensado pode ampliar-se em forma lógica regular. Inferência dedutiva: "O negro é uma criatura como eu; logo aquele que bate no negro é uma criatura como eu". Inferência indutiva: "O primeiro dedo fica antes do segundo; logo fica antes do terceiro".
Flint, Theism, 77 e Herbert, Mod. Realism Examed, chegariam ao conhecimento da existência de Deus pela inferência. Esta declara que Deus é inde- monstrável, mas, quanto à sua existência, infere-se como a dos nossos semelhantes. Replicamos, porém, que, neste último caso, só inferimos o finito a partir do finito, mas, no caso de Deus, infere-se o infinito a partir do finito. Contudo, este processo de raciocínio pressupõe a existência de Deus como Razão absoluta, pelo processo já demonstrado.
Substancialmente, H. B. Smith, Introd. to Chr. Theol., 84-133, e Diman, Theistic Argument, 316,364, ambos cometem o mesmo erro dos que admitem um elemento intuitivo, mas empregam-no só para suprir a insuficiência do raciocínio. Consideram que a intuição nos fornece apenas uma idéia abstrata, que não contém em si nenhuma prova da existência de um verdadeiro ser que corresponde à idéia e que só chegamos ao ser real pela inferência dos fatos da nossa natureza espiritual e do nosso mundo exterior. Replicamos, entretanto, com as palavras de McCosh, que "as intuições, em primeiro lugar, dirigem-se individualmente aos objetos". Não conhecemos o infinito no abstrato, mas o espaço e o tempo infinitos, e o Deus infinito.
Schurman, Belief in God, 43 - "Sou incapaz de atribuir à nossa crença em Deus uma certeza mais elevada que aquela que possuímos através da hipótese da ciência ... 57 - A abordagem mais próxima que a ciência faz à nossa hipótese da existência de Deus encontra-se na afirmação da universalidade da lei ... baseada na convicção da unidade e na conexão sistemática de toda a realidade ... 64 - Só se pode encontrar esta unidade no espírito autocons- ciente". O defeito deste raciocínio é que ele não nos dá nenhum elemento necessário ou absoluto. Exemplos de hipóteses são a nebulosa na astronomia, a lei da gravitação, a teoria atômica da química, o princípio da evolução. Nenhuma destas é logicamente independente ou tem prioridade. Cada uma delas é provisória e cada uma pode ser ultrapassada por nova descoberta. Não é o caso da idéia de Deus. Todas as outras pressupõem esta idéia como condição de cada processo mental e garantia da sua validade.
rv. CONTEÚDO DESTA INTUIÇÃO
Neste conhecimento fundamental de que Deus é, necessariamente está implicado que, em certa extensão, o homem conhece intuitivamente o que Deus é, a saber, a) a Razão na qual se baseiam os processos mentais; b) uma Força superior de que o homem depende; c) uma Perfeição que impõe a lei sobre a natureza moral; d) uma Personalidade que pode ser reconhecida na oração e no louvor.
Sustentar que temos uma intuição racional de Deus de modo nenhum implica que é impossível uma intuição presente de Deus. Tal intuição presente talvez fosse característica do homem decaído; às vezes pertence ao cristão; será uma bênção do céu (Mt. 5.8 - "os limpos de coração verão a Deus"; Ap. 22.4
"verão a sua face"). As experiências dos homens de apreenderem Deus face a face, em perigo ou senso de culpa, dão alguma razão para crer que um conhecimento de Deus pela sua presença é condição normal da humanidade. Mas como esta intuição da presença de Deus não está no nosso estado universal atual, reivindicamos aqui somente que todo o homem tem uma intuição racional de Deus.
Convém lembrar, contudo, que a perda do amor a Deus obscureceu até mesmo a intuição racional, de modo que a revelação da natureza nas Escrituras necessita de ser despertada, confirmada e aumentada e a obra do Espírito de Cristo no sentido de tomar conhecida pela amizade e comunhão. Assim, a partir do conhecimento a respeito de Deus, conhecemos Deus (Jo. 17.3 - "A vida etema é esta, que te conheçam a ti"; 2 Tm. 1.12 - "Eu sei em quem tenho crido").
Platão dizia que a substância não pode ser nenhum cm oíSfv sem algo à oíSev. Harris, Philosophical Basis of Theism, 208 - "Através da intuição racional o homem sabe que o Ser absoluto existe; seu conhecimento daquilo que é progressivo, como progressivo é o conhecimento do homem e da natureza". Hutton, Essays: "Uma presença assombrosa assusta o homem atrás e adiante. É um mal a que ele não pode escapar. Dá novos sentidos aos seus pensamentos e novo terror aos seus pecados. Torna-se intolerável. O homem é levado a estabelecer um ídolo esculpido segundo a sua própria natureza, que tomará o seu lugar - um Deus não moral que não perturbará o seu sonho de descansar. É uma Vida e uma vontade justa, não uma simples idéia de justiça que importuna tanto os homens". Porter, Hum. Int., 661 - "O Absoluto é um Agente pensante". A intuição não se desenvolve na certeza; o que se desenvolve é a ansiedade por aplicá-la e o poder de expressá-la. A intuição não é complexa; complexo é o Ser intuitivamente conhecido.
O conhecimento de uma pessoa torna-se conhecimento pessoal através da verdadeira comunicação ou revelação. Em primeiro lugar vem o conhecimento intuitivo de Deus, o qual todo homem possui - a suposição de que existe uma Razão, uma Força, uma Perfeição, uma Pessoalidade que torna correto o pensamento e possível a ação. Em segundo lugar, vem o conhecimento do ser de Deus e os atributos que a natureza e a Escritura fornecem.
Em terceiro lugar, surge o conhecimento pessoal vindo através da experiência, derivado da verdadeira reconciliação e intercomunicação com Deus, através de Cristo e do Espírito Santo. Stearns, Evidence of Christian Experience,
208 - "A experiência cristã verifica as reivindicações da doutrina pela experimentação, transformando o conhecimento provável em conhecimento real". Biedermann, citado por Pfleiderer, Grundriss, 18 - "Deus se revela ao espírito humano, 1. como uma Base infinita, na razão; 2. como uma Norma infinita, na consciência; 3. como uma Força infinita, na ascendência à verdade religiosa, à bem-aventurança e à liberdade".
Objetarei eu a esta experiência cristã, só porque relativamente poucos a possuem e não estou entre eles? Porque eu não vi as luas de Júpiter, como duvidarei do testemunho do astrônomo quanto à sua existência? A experiência cristã como a visão das luas de Júpiter, não é possível a todos. Clarke, Christian Theology, 113 - "Quem tiver prova completa da realidade da bondade de Deus deve submetê-la ao teste experimental. Deve tomar o bom Deus como real e receber a confirmação que se seguirá. Quando a fé atinge Deus, ela o encontra.... Aqueles que o encontram serão os mais sensatos e os mais verdadeiros do seu gênero e as suas convicções estarão entre as mais seguras entre os homens. ... Os que vivem em comunhão com o bom Deus crescerão em bondade, e apresentarão evidência prática da sua existência além do testemunho oral que possam dar".
As Escrituras, portanto, não tentam provar a existência de Deus, mas, por outro lado, tanto admitem como declaram que o conhecimento de Deus é
universal (Rm. 1.19-21,28,32; 2.15). Deus embutiu a evidência desta verdade fundamental na própria natureza do homem de modo que em parte alguma há ausência de testemunho a seu respeito. O pregador pode, com confiança, seguir o exemplo da Escritura admitindo-a. Mas deve também explicitamente declará-la como faz a Escritura. "Pois os seus atributos invisíveis, o seu eterno poder e divindade, são claramente vistos desde a criação do mundo." (xaGopâTca - espiritualmente vistos); o órgão para este propósito é a vouç (vooúpeva); mas, então - eles são "percebidos mediante as coisas criadas" (xoiç 7toifipaCTiv, Rm. 1.20).
Sobre Rm. 1.19-21, ver Weiss, Biblische Theologie des Neuen Testament,
251, nota; vertambém os comentários de Meyer, Alford, Tholuck e Wordsworth; tò yvmaTOv Tcrô 9eoí> = não "o que se pode conhecer", mas "aquilo que se conhece" de Deus; vooúneva Kaeopâ-tai = vêem-se claramente no que é percebido pela razão - voo-òp.eva expressa o modo de meopâ-rai (Meyer); comp. Jo. 1.9; At. 17.27; Rm. 1.28; 2.15. Sobrei Co. 15.34, ver Calderwood, Philosophy of Infinite, 466 — àyvcoaíav 9eoí> xwèç exoucn. = não possuais o conhecimento de Deus especialmente exaltado, que pertence aos crentes em Cristo (cf. 1 Jo. 4.7 - "qualquer que ama é nascido de Deus e conhece a Deus"). Sobre Ef. 2.12, ver Pope, Theology, 1.240 - a0eoi èv tq> KÓan.co opõe- se a estar em Cristo, e significa mais abandonado de Deus do que negá-lo ou ignorá-lo inteiramente.
E. G. Robinson: "A primeira afirmação da Bíblia não é que existe um Deus, mas que 'no princípio criou Deus os céus e a terra' (Gn. 1.1). A crença em Deus nunca foi e nunca pode ser o resultado de argumento lógico; doutra forma a Bíblia nos apresentaria provas". Muitos textos em que se confia como provas da existência de Deus são simplesmente explicações da idéia de Deus; p.ex., SI. 94.9,10 - "Aquele que fez o ouvido não ouvirá? E o que formou o olho não verá? Aquele que interroga as nações não as castigará? E o que dá ao homem o conhecimento não saberá?" Platão diz que Deus sustenta a alma pelas raízes dela, pelo que não precisa demonstrar à alma o fato da sua existência. Martineau, Seat of Authority, 308, diz com precisão que a Escritura e a pregação só interpretam o que já está no coração ao qual se dirige: "Lançando um sopro quente ao interior dos oráculos ocultos na invisível tinta, ele os torna articulados e deslumbrantes como o manuscrito na parede. O divino Vidente não tem para vós a sua revelação, mas capacita-vos a receber a vossa própria. Esta relação mútua só é possível através da presença comum de Deus na consciência da humanidade". Shedd, Dogmatic Theology, 1.195220 - "A terra e o céu causam as mesmas impressões sensíveis nos órgãos de um bruto que os causam nos de um homem; mas o bruto nunca discerne as 'coisas invisíveis' de Deus 'tanto o seu eterno poder como a sua divindade"' (Rm. 1.20).
Nossa atividade subconsciente, até onde é normal, está sob a orientação da Razão imanente. A sensação, antes de resultar em pensamento, tem em si elementos locais fornecidos pela mente - não nossa, mas do infinito. Cristo o Revelador de Deus, revela-o na vida mental de cada homem e o Espírito
Santo pode ser o princípio da consciência própria no homem como também em Deus. Harris, God the Creator, diz-nos que "o homem encontra a Razão que é eterna e universal revelando-se no exercício da sua própria razão". Savage, Vida após a Morte, 268 - "Como você sabe que a sua consciência subliminar não fere a Onisciência e apossa-se dos fatos do universo?" Contudo, Savage nega esta sugestão e, erroneamente, favorece a teoria do espírito. Ver pp. 295-329 deste livro.
C. M. Barrows, Proceedings ofSoc. for Psychical Research, vol. 12, parte 30, pp. 34-36 - "Existe um agente subliminar. Que pensar se este é somente um Ator inteligente, enchendo o universo com a sua presença, como o éter faz com o espaço; o Inspirador comum de toda a humanidade, hábil músico, presidindo sobre muitas flautas e teclas e tocando através de cada um, que música se ouvirá? O eu subliminar é uma fonte universal de energia e cada homem é um canal da correnteza. Cada eu pessoal está contido nela, e assim cada homem se torna unido a cada ser humano. Nesta Força profunda, o último fato atrás do qual a análise não pode ir, todos efeitos psíquicos e físicos encontram sua origem comum". Esta afirmativa necessita de ser qualificada pela declaração da natureza ética do homem e personalidade distinta; ver nesta obra o Monismo Ético, no cap. III. Mas há aqui uma verda-de como aquela que Coleridge procurava expressar em sua Harpa Eólia: "E o que acontece se toda a Natureza animada for apenas harpas diversamente estruturadas, que tremem no pensamento, quando por elas passa, Plástica e vasta, uma brisa intelectual, a um só tempo a alma de cada um, e o Deus de todos?"
Dorner, System of Theology, 1.75 - "O conhecimento de Deus é a verdadeira firmeza da nossa própria consciência. ... Visto que é só na consciência de Deus que a mais íntima personalidade do homem vem à luz, de igual modo, por meio do entrelaçamento da consciência de Deus e do mundo, este mundo é visto em Deus (sub specie eternitatis), e a certeza do mundo obtém primeiro a segurança absoluta do seu espírito". Royce, Spirit ofMod. Philosophy, sinopse na N. Y. Nation: "O único fato indubitável é a existência de um eu infinito, um Logos, ou uma mente terrena (345). Isto se torna claro, I. Porque o idealismo mostra que as coisas reais não são nada mais, nem nada menos que idéias, ou 'possibilidade de experiência'; mas a mera 'possibilidade", como tal, nada é e o mundo das experiências 'possíveis', até onde ela é real, deve ser o mundo da experiência verdadeira para um certo eu (367). Se, então, há um mundo real, ele tem tudo enquanto existe como ideal e mental mesmo antes de tornar-se conhecido pela mente particular com a qual nós concebemos entrar em conexão (368). II. Mas há um mundo real; pois, quando eu penso em um objeto, quando eu me refiro a ele, não só tenho em mente uma idéia semelhante a ele porque eu o tenho por objeto, seleciono-o, em certa medida eu já o possuo. Então, o objeto já está presente em essência no meu eu oculto (370). Como a verdade consiste no conhecimento de conformidade com uma cognição do seu objeto, que, por si pode conhecer uma verdade que inclui tanto a idéia como o objeto. Este conhecedor é o Eu Infinito (374). Em essência sou idêntico a isso (371); é o meu eu maior (372); e só este eu maior é (379). Inclui toda a realidade, e conhecemos outras mentes finitas, porque estamos unidos a elas" (409).
É instrutiva a experiência de George John Romanes. Durante anos ele não pôde reconhecer nenhuma Inteligência pessoal no controle do universo. Cometeu quatro equívocos: 1. Esqueceu-se de que só o amor pode ver, que Deus não se revela simplesmente ao intelecto, mas apenas ao homem como um todo; à mente integral, que a Escritura chama "os olhos do coração" (Ef. 1.18). Finalmente, a experiência da vida ensinou-lhe a fraqueza do mero raciocínio e levou-o a depender mais dos sentimentos e intuições. Então, como se poderia dizer, ele deu ao raio X do cristianismo uma oportunidade de fotografar Deus na sua alma. 2. Começou pelo fim errôneo, mais com a matéria do que com a mente, mais com as categorias de causa e efeito do que com o certo e o errado e, deste modo, envolveu-se na ordem mecânica e tentou interpretar o reino moral através dela. Resultado: em vez de reconhecer a liberdade, a responsabilidade, o pecado, a culpa, descartou-os como pretensos. Porém o estudo da consciência e da vontade o puseram no caminho certo. Ele aprendeu a levar em conta o que ele encontrava, em vez de voltar- se para alguma coisa mais e, desta forma, veio a interpretar a natureza pelo espírito em vez de interpretar o espírito pela natureza. 3. Tomou as partes pelo cosmos, em vez de considerá-lo como um todo. Seu antigo pensamento insistia em encontrar uma determinação em cada parte em separado, ou em nenhuma parte. Porém, ao chegar à maior maturidade reconheceu que seria sábio e razoável tratá-lo como um todo ordenado. Entendendo que isto é um universo, não conseguiu desembaraçar-se da idéia de uma Mente organizadora. Passou a ver que o Universo, como um pensamento, implica a existência de um Pensador. 4. Fantasiou que a natureza exclui Deus, em vez de saber que ela é o único método de operação de Deus. Quando aprendeu como se fez uma determinada coisa, a princípio concluiu que Deus e natureza não são mutuamente exclusivos. Deste modo, passou a não ver dificuldade até mesmo na aceitação dos milagres e da inspiração; porque o Deus que está no homem e de cuja mente e vontade a natureza é apenas a expressão, pode revelar-se, se necessário, de formas especiais. Portanto, Georges John Romanes voltou a orar, voltou a Cristo, e voltou à igreja.
Capítulo II
EVIDÊNCIAS CORROBORATIVAS DA EXISTÊNCIA DE DEUS
Embora o conhecimento da existência de Deus seja intuitivo, pode ser explicado e confirmado por argumentos tirados do próprio universo e das idéias abstratas da mente humana.
Nota 1. Tais argumentos são prováveis, mas não demonstrativos. Por esta razão eles se suplementam um ao outro e constituem-se uma série cumulativa de evidências em sua natureza. Embora tomados de uma forma isolada, nenhum deles pode ser considerado absolutamente decisivo, juntos fornecem uma cor- roboração de nossa convicção primitiva da existência de Deus, que é de grande valor prático e em si mesmos suficientes para aglutinar a ação moral do homem.
Butler, Analogy, Introd., Bohn's ed., 72 - A evidência provável admite graus desde a mais elevada certeza moral até a mais baixa presunção. Contudo a probabilidade é o guia da vida. Em matéria de moral e religião, não vamos esperar uma evidência matemática ou demonstrativa, mas apenas a provável e a mais leve preponderância de tal evidência pode ser suficiente para cegar a nossa ação moral. A verdade da nossa religião como a verdade das matérias comuns, deve ser julgada pela total evidência global; porque, ao acrescentarem-se as supostas provas, não só aumentam a evidência, mas multipli- cam-na. Dove, Logic of Christian Faith, 24-0 valor dos argumentos, tomados englobadamente, é muito maior do que o de qualquer um isolado. Ilustração da água, do ar e do alimento juntos, não separadamente, sustentando a vida; o valor de 1000 de libras não está no papel, na estampa, na escrita, na assinatura, tomadas separadamente. Um feixe de varas não pode ser quebrado, apesar de que cada vara do feixe o pode separadamente. A resistência do feixe é a força do todo. Lord Bacon, Essay on Atheism: "Uma mirrada filosofia inclina a mente do homem para o ateísmo, mas o seu aprofundamento aproxima a mente humana da religião. Por algum tempo a mente do homem respeita algumas causas secundárias separadas, pode às vezes apoiar-se nelas e não ir mais adiante, porém, quando olha para o encadeamento delas confederadas e unidas, sente-se necessidade de voar para a Providência e para Divindade". Murphy, Scientific Bases of Faith, 221-223 - "A prova de um Deus e de um mundo espiritual que nos deve satisfazer consiste em numerosas linhas de prova divergentes e convergentes".
No caso em que só se alcança a evidência circunstancial, muitas linhas da prova convergem e embora nenhuma das linhas alcance a marca, a conclusão para a qual todas apontam torna-se a única racional. Duvidar de que haja uma Londres, ou de que houve um Napoleão, seria indicar insanidade; contudo, só a evidência provável demonstra a existência de Londres e de Napoleão. Não há nenhuma eficácia coativa no argumento da existência de Deus; mas o mesmo se pode dizer de todo o raciocínio não demonstrativo. É possível outra interpretação dos fatos, mas nenhuma outra é tão satisfatória como a de que Deus é; ver Fisher, Nature and Method of fíevelation, 129. Prof. Rogers:
"Se nos negócios práticos fomos levados a hesitar em agir até que tivéssemos demonstrada a certeza absoluta, nunca deveríamos começar a nos mover".
Por esta razão um velho oficial indiano aconselhou um jovem juiz a "dar sempre o seu veredicto, mas sempre evitar de apresentar os seus fundamentos.
Bowne, Philos. of Theism, 11-14 - "Ao invés de duvidar de cada coisa que oferece condições para tal, melhor é não duvidar de nada até que sejamos compelidos a isso. ... Na sociedade, é melhor admitirmos que os homens são verdadeiros, e só duvidarmos quando houver razão especial, do que admitirmos que todos homens são mentirosos e crermos só quando a isso formos compelidos. Por isso, em todas as nossas investigações progredimos mais se admitirmos a veracidade do universo e da nossa própria natureza do que duvidarmos de ambos. ... O primeiro método parece mais rigoroso, mas só pode ser aplicado à matemática, que é ciência puramente subjetiva. Quando tratamos da realidade, o método aproxima o pensamento de uma pausa.
... A lei que a lógica estabelece é: Não se pode crer em nada que não seja provado. A lei que a mente na verdade segue é: O que quer que a mente demande para a satisfação de seus interesses subjetivos e tendências pode- se admitir como real na ausência de uma refutação positiva".
Nota 2. Uma consideração destes argumentos pode também servir para explicar o conteúdo de uma intuição que reconstituiu o elemento obscuro e apenas semiconsciente por falta de reflexão. Na verdade, os argumentos são esforços da mente que já tem uma convicção da existência de Deus de dar a si mesma um relato final de sua crença. Uma exata apreciação do seu valor lógico e de sua relação com a intuição que buscam expressar de forma silogística é essencial para qualquer adequada refutação ao raciocínio ateísta e panteísta.
Diman, Theistic Argument, 363 - "Não tenho reivindicado que a existência até mesmo deste Ser se pode demonstrar como podemos fazer com as verdades abstratas da ciência. Tenho só reivindicado que o universo, como um grande fato, demanda uma explicação racional e que a mais racional que se pode dar é a concepção fornecida de um tal Ser. A razão apoia-se nesta conclusão e recusa apoiar-se em qualquer outra". Rückert: "Wer Gott nicht fühlt in sich und allen Lebens-kreisen, dem werdet ihr nicht ihn beweisen mit Beweisen". Harris, Philos. Basis of Theism, 307 - "A teologia depende da ciência noética (que se origina no intelecto) e empírica para dar a ocasião a que surja a idéia do Ser Absoluto e fornecer o conteúdo à idéia". Andrew Fuller, Part of Syst. of Divin., 4.283, questiona "se a argumentação em favor da existência de Deus não criou mais céticos do que crentes". Até onde isto é verdade, deve-se a um exagero nos argumentos e uma exagerada noção do que se deve esperar deles.
"Evidências do cristianismo?" diz Coleridge, "estou cansado dessa palavra". Quanto mais o cristianismo foi provado, menos se creu nele. O aviva- mento religioso sob Whitefield e Wesley fizeram o que todos os apologistas do século dezoito não conseguiram; ele despertou as intuições do homem para a vida, e praticamente as fez reconhecer Deus. Martineau, Types, 2.231
O homem pode "dobrar os joelhos diante do Zeitgeist (espírito do tempo), enquanto dá as costas para o consenso de todas as eras"; Seat ofAuthority,
312 - "Nosso raciocínio nos leva a explicitar o teísmo porque parte do teísmo implícito". Illingworth, Div. And Hum. Personality, 81 - "As provas são tentativas de dar conta e explicar e justificar algo que já existe; decompor um elevado complexo através de um juízo imediato em seus elementos constituintes, nenhum dos quais, quando isolado, pode ter a plenitude ou ação conjunta da convicção original como um todo."
Bowne, Philos. of Theism, 31,32 - A demonstração é o único paliativo para socorrer na ignorância do insight. ... Quando chegamos ao argumento em que se destina a natureza toda, o argumento parece ser fraco ou forte conforme a natureza é débil ou plenamente desenvolvida. O argumento moral em favor do teísmo não pode parecer forte a alguém que não tem consciência.
O argumento a partir dos interesses cognitivos esvaziará quando não há nenhum interesse desse tipo. As pequenas almas acharão muito pouco que exige explicação ou que desperta surpresa e estarão satisfeitos com um ponto de vista correspondentemente pequeno da vida e da existência. Em tal caso não podemos esperar um acordo universal. Só podemos proclamar a fé que está em nós na esperança de que esta proclamação não possa existir sem alguma resposta em outras mentes e corações. ... Só temos provável evidência da conformidade da natureza ou do sentimento dos amigos. Também não podemos provar através da lógica. As mais profundas convicções não são as certezas da lógica, mas as da vida".
Nota 3. Os argumentos da existência divina podem ser reduzidos a quatro; I) Cosmológico; II) Teleológico; III) Antropológico; IV) Ontológico. Examiná-los-emos em sua ordem, procurando determinar as precisas conclusões a que respectivamente conduzem e, então, certificar de que maneira os quatro podem ser combinados.
I. ARGUMENTO COSMOLÓGICO
Não se trata de um argumento do efeito para a causa; pois a proposição de que cada efeito deve ter uma causa é simplesmente idêntico e apenas significa çue o evento causado deve ter uma causa. Ao invés disso é um argumento da existência começada para uma causa suficiente de tal começo e pode ser pre- : samente estabelecido da seguinte maneira:
Tudo o que começa, quer substância, quer fenômeno, deve sua existência a i-guma causa produtiva. O universo, pelo menos no que se refere à sua forma presente, é algo começado e deve sua existência a uma causa que corresponde à sua produção. Tal causa deve ser indefinidamente grande.
Convém notar que este argumento move-se no reino da natureza. A partir da constituição do homem e início neste planeta ele é considerado sob um outro título (ver Argumento Antropológico). Não só a observação pessoal, mas o testemunho da geologia garante-nos que a presente forma do universo não é eterna no passado, mas teve um início. Freqüentemente Locke, Clarke e Robert Hall têm reivindicado que este argumento é suficiente para conduzir a mente a uma Primeira Causa Eterna e Infinita. Por esta razão prosseguimos mencionando
Defeitos do Argumento Cosmológico
É impossível mostrar que o universo, no que tange à sua substância, teve um começo. A lei da causalidade declara, não que cada coisa tem uma causa - pois, então, o próprio Deus teria uma causa - porém, ao invés disto, que cada coisa iniciada, ou em outras palavras, que cada evento ou mudança tem uma causa.
Hume, Phil. Works 2.411 sg., declara, com razão, que nós nunca vimos um mundo feito. Muitos filósofos em terras cristãs, como Martineau, Essays, 1.206 e as opiniões prevalecentes dos tempos pré-cristãos sustentam que a matéria é eterna. Bowne, Metaphysics, 107 - "Para o próprio ser, a razão reflexiva nunca exige uma causa, a menos que o ser mostre sinais de dependência.
A mudança é que primeiro ocasiona a demanda de uma causa". Martineau, Types, 1.291 - "Não é a existência como tal que exige uma causa, mas o surgimento daquilo que não existia anteriormente. A lei intelectual da causalidade é a lei dos fenômenos não da entidade".
Aceitando que o universo, no que se refere aos seus fenômenos, teve uma causa, é impossível mostrar que se requer qualquer outra além da que existe em si mesma, como supõem os panteístas.
Flint, Theism, 65-0 argumento cosmológico por si só prova a força; e esta sozinha não é Deus. "A inteligência deve caminhar com ela para fazer com que o Ser possa chamar-se Deus". Diman, Theistic Argument "O argumento cosmológico sozinho não pode decidir se a força que causa a mudança é a mente perene auto-existente, ou a perene matéria auto-existente". Só a inteligência fornece base para uma resposta. No universo apenas a mente nos capacita a inferir a mente do criador. Porém o argumento a partir da inteligência não é o Cosmológico, mas o Teológico e a este pertencem todas as provas da divindade a partir da ordem e combinação na natureza.
Upton, Hibbert Lectures, 201-296 - A ciência tem que ver com as mudanças que uma porção do universo visível causa em outra porção. A filosofia e a teologia tratam da Causa Infinita que faz existir e sustenta toda a série de causas finitas. Acaso perguntamos nós a causa das estrelas? A ciência diz:
A nebulosa ígnea, ou um retrocesso infinito de causas. A teologia diz: Admite- se; mas este retrocesso infinito demanda, para sua explicação, a crença em Deus. Devemos tanto crer em Deus como numa infinda série de causas finitas. Deus é a causa de todas as causas, a alma de todas as almas: "Centro e alma de cada esfera, Contudo, quão perto de cada coração que ama"! Não necessitamos somente da ciência para pensar em qualquer começo.
Admitindo que o universo deva ter tido uma causa exterior a si, é impossível mostrar que tal causa não foi causada, i.e. consiste em uma série infinita de causas dependentes. O princípio da causalidade não requer que todas as coisas começadas remontem a uma causa não causada; demanda que atribuamos uma causa, mas não uma causa primeira.
O mesmo ocorre com toda a série de causas. O materialista se sente na obrigação de encontrar uma causa para esta série, tão logo ela tem início. Porém a própria hipótese de uma série infinita de causas exclui a idéia de tal início. Uma cadeia infinita não tem nenhum elo extremo (versus Robert Hall); uma sucessão sem causa e eterna não necessita de causa (versus Clarke e Locke). Julius Müller, Doctrirt of Siri, 2.128, diz que o retrocesso até chegarmos a uma causa que não é em si mesma um efeito não pode satisfazer o princípio causai - aquele que é a causa sui; Aids to Study of German Theology, 15-17 - Ainda que o universo seja eterno, a sua natureza contingente e relativa requer que postulemos um Criador eterno. Diman, Theistic Argument, 86 - "Conquanto a lei de causa não conduz logicamente à conclusão de uma causa primeira, compele-nos a afirmá-la". Retrucamos que não é a lei da causa que nos compele a afirmá-la, porque esta, certamente "não nos leva, pela lógica, à conclusão". Se inferimos uma causa não causada, fazemo-lo, não por processo lógico, mas em virtude da crença intuitiva que há em nós. Assim pensam Secrétan e Whewell, em Indications ofa Creator, e em Hist. ofScien- tific Ideas, 2.321,322 - "A mente se refugia na suposição de uma Causa Primeira a partir de um emprego inconsistente com a sua própria natureza"; inferimos necessariamente uma Causa Primeira embora as ciências paleon- tológicas apenas apontam-na, mas não nos conduzem a ela".
Admitindo que a causa do universo não foi em si mesma causada, é impossível mostrar que esta causa não seja finita, como o próprio universo. O princípio causai requer uma causa não maior que a suficiente para o efeito.
Por isso, não podemos inferir uma causa infinita a não ser que o universo seja infinito e isto implica em admitir um infinito para provar um infinito. Porém nenhum número pode ser infinito porque qualquer número, embora grande, pode receber o acréscimo de uma unidade, o que mostra que anteriormente não era infinito. Mesmo aqui nós vemos que as formas mais aceitas do Argumento Cosmológico são obrigadas a avaliar-se sobre a intuição do infinito a fim de suplementar o processo lógico. Versus Martineau, Study, 1.418 - "Embora não possamos inferir diretamente a infinitude de Deus a partir de uma criação limitada, indiretamente podemos excluir qualquer outra posição recorrendo à ilimitada cena da existência (espaço)". Isto, porém, garantiria igualmente a nossa crença na infinitude dos nossos semelhantes. Ou se trata do argumento de Clarke e Gillespie (ver abaixo o Argumento Ontológico). Schiller, Die Grõsse Welt, parece defender a existência do universo ilimitado.
Ele mostra um espírito causado, buscando o limite da criação. Um segundo peregrino encara-o a partir dos espaços além, com as seguintes palavras: Steh! du segelst umsohnst, - vor dir Unendichkeit" - "Eia! em vão tu vagueias; diante de ti, só o infinito".
O valor do Argumento Cosmológico, é, pois, tão somente este; prova a existência de uma causa do universo indefinidamente grande. Quando vamos além disto e inquirimos se esta é uma causa do ser, ou simplesmente uma causa da mudança do universo; se é uma causa independente do universo ou é uma com ele; se é uma causa eterna ou uma causa dependente de outra; se é inteligente ou não, infinita ou finita, una ou múltipla, este argumento não nos pode garantir.
ARGUMENTO TELEOLÓGICO
Este não é um argumento do desígnio para o designador; pois que o desígnio implica um designador é uma proposição idêntica. Pode-se estabelecer mais corretamente o seguinte: A ordem e a colocação útil, permeando um sistema implicam respectivamente inteligência e propósito como a causa de tal ordem e colocação. Porque a ordem e a colocação útil permeiam o universo deve existir uma inteligência adequada à produção dessa ordem e uma vontade adequada a dirigir a colocação para fins úteis.
Etimologicamente, "argumento teleológico" = argumento destinado aos fins, ou causas finais, isto é, "causas que, começando com um pensamento, elaboram-se em um fato como um fim, ou um resultado (Porter, Human Intelect, 592-618); a saúde, p.ex., é a causa fina! do exercício, enquanto este é a causa daquela. Esta definição do argumento se ampliaria o bastante para abranger a prova de uma inteligência oriunda da constituição do homem. Este, contudo, é tratado como parte do Argumento Antropológico, que lhe sucede, e o Argumento Teleológico abrange apenas a prova de uma inteligência determinante provinda da natureza. Por isso, Kant, Crítica da Razão Pura, chama-o de argumento físico-teológico.
Hicks, Critique of Design-Arguments, 347-389, apresenta dois argumentos em vez de um: 1) o da ordem para a inteligência ao qual ele chama de Eutaxiológico; 2) o argumento da adaptação para o propósito a que ele restringe o nome Teleológico. Ele sustenta que a verdadeira teleologia não pode provar a inteligência porque, quando fala nos "fins", afinal de contas, deve admitir a própria inteligência que ele procura provar; já se estabeleceu anteriormente que ela apenas prova o exercício intencional de uma inteligência.
"As circunstâncias, forças, ou agentes que convergem para um resultado racional definido implicam volição - implicam que se pretende este resultado
a volição e o fim. Esta é a premissa maior da nova teleologia". Ele faz objeção à expressão "causa final". Na verdade, o fim não é a causa - é um motivo.
O elemento caraterístico da causa é o poder de produzir um efeito. Os fins não têm tal poder. A vontade pode escolhê-los, ou rejeitá-los. Admitida a inteligência, os fins não podem prová-la.
Concordamos com isto no ponto principal e consideramos um valioso auxílio para o estabelecimento e compreensão do argumento. Na própria observação da ordem, contudo, assim como no argumento a partir dela somos obrigados a admitir a mesma inteligência que estabelece a disposição total. Em vista disso, não vemos nenhuma objeção em fazer da Eutaxiologia a primeira parte do Argumento Teleológico como fizemos acima.
Mais explicações
à) A premissa maior expressa uma convicção primitiva. Isto não é invalidado pelas objeções: d) de que a ordem e a colocação útil podem existir sem propósito - pois a nossa própria constituição mental nos compele a negar isto em todos os casos onde a ordem e a colocação permeiam um sistema; b) de que a ordem e a colocação útil podem resultar da simples operação de forças e leis físicas - pois estas mesmas forças e leis implicam, ao invés de excluir, uma inteligência e vontade originadoras e superintendentes.
Janet, Final Causes, 8, nega que a finalidade seja uma convicção primitiva como a causalidade e chama-a resultado de uma indução. Por isso ele prossegue a partir 1) das marcas da ordem e colocação útil 2) para a finalidade na natureza e, a seguir, 3) para uma causa inteligente da referida finalidade, ou pré-conformidade com o evento futuro". Do mesmo modo também, Diman, Theistic Argument, 105, reivindica simplesmente que, como a mudança requer uma causa, assim a mudança ordenada requer uma causa inteligente. Contudo, já mostramos que a indução e o argumento de cada gênero pressupõem uma crença intuitiva na causa final. A natureza não a dá; mas ela também não nos dá a causa eficiente. A mente nos dá ambas e as dá de forma tão clara baseada na experiência como depois de um milheiro. Ladd:
"As coisas têm uma mente em si: também nós não podemos lembrá-las".
O Duque de Argyll disse a Darwin que lhe parecia totalmente impossível atribuir os ajustes da natureza a qualquer outro agente que não seja a mente. "Bem", disse Darwin, "esta impressão freqüentemente tem-me assediado com uma força intensa. Mas, então, outras vezes, ela me parece tudo e a seguir ele passou as mãos sobre os olhos, como que indicando uma visão alheia à vista. O Darwinismo não é uma refutação dos fins da natureza, mas apenas uma teoria particular relativa ao meio em que os fins se realizam no mundo orgânico. Darwin começaria com um germe infinitesimal e faria todo o subseqüente desenvolvimento não teológico.
Momerie, Christianity and Evoiution, 72 - "Só dentro dos estreitos limites é que se produzem, casualmente, os arranjos aparentemente propositais. E, por isso, à medida que os sinais do propósito se desenvolvem, a suposição da sua origem acidental diminui". Elder, ideas from Nature, 81,82 - "A uniformidade dos mármores de um menino mostra que eles são produto do desígnio. Quando se trata de um único pode ser acidental, mas uma dúzia não. Do mesmo modo a uniformidade atômica indica a manufatura". Dr. Carpenter: "O ateísta é como um homem que examina o mecanismo de um grande moinho e, achando que todo ele é movido por um eixo que se origina de uma parede de tijolos, infere que o eixo é a explicação suficiente para o que ele vê e que não há nenhuma força motora atrás de si". Lord Kelvin: "A idéia ateísta não é disparatada". J. G. Paton, Life, 2.191 - "A perfuração de um poço na ilha de Aniwa convence o chefe canibal Namakei de que Yahweh Deus, o Invisível, existe.
Bowne, Review of Herbert Spencer, 231-247 - "A lei não é uma causa; é um método. O homem não pode apresentar o próprio fato a ser explicado como razão suficiente". Martineau, Essays, 1.144 - "Damasco padronizado, não feito pelo tecelão, mas pelo tear"? Dr. Stevenson: "A casa não requer nenhum arquiteto porque é construída por especialistas em pedras e por carpinteiros"? Joseph Cook: "A lei natural sem Deus não é mais do que uma luva sem mão e tudo que se faz com a mão de Deus calçada na natureza, não é a luva que faz, mas a mão. A evolução não é uma força; é um processo; não é uma operatória, mas um método de operação. Um livro não é escrito pelas leis de soletração e da gramática mas de acordo com tais leis. Do mesmo modo, as leis do calor, da eletricidade, da gravitação, da evolução não escrevem o livro do universo, mas este é escrito de conformidade com tais leis". G. F. Wright, Ant. and Orig. of Hum. Race, lecture IX - "A evolução não pode fornecer evidência que afaste da natureza o desígnio. Ela pode retrocedê-lo a um ponto mais remoto da entrada, aumentando a nossa admiração na força do Criador no cumprimento dos desígnios ulteriores por processos diferentes".
A evolução é o método de Deus. Ela se refere ao como, não ao por quê, dos fenômenos e, por isso, não é inconsistente com o desígnio, porém é a sua nova e mais elevada ilustração. Henry Waro Beecher: "No atacado, o desígnio é maior do que no varejo". Francês Power Cobbe: "É singular o fato de que, sempre que achamos como se faz uma coisa, nossa primeira conclusão parece indicar que não foi Deus quem a fez". Por que iríamos dizer: "Quanto maior é a lei menor é Deus"? O teísta faz referência aos fenômenos como uma causa que se conhece por si mesma e sabe-se o que ela está fazendo;
o ateísta faz referência a eles como uma força de que nada se conhece e não se sabe o que ela está fazendo (Bowne). George John Romanes dizia que, se Deus fosse imanente, todas as causas naturais deveriam parecer mecânicas e não há argumento nenhum contra a origem divina que prove que se devem a causa natural: "As causas na natureza não tornam óbvia a necessidade de uma causa nela". Shaler, Interpretation of Nature, 47 - A evolução mostra que a direção dos negócios está sob o controle de algo como a nossa inteligência: "A evolução soletra o propósito". Clarke, Christ. Theology, 105 - "A moderna doutrina da evolução tem despertado a existência de inúmeros fins dentro do universo, mas não o grande fim em favor do próprio universo". Huxley, Criquitiques and Addresses, 274,275,307 - "Os pontos de vista teleológico e mecânico do universo não são mutuamente excludentes". Sir William Hamilton, Metaphysics: "A inteligência se põe em primeiro lugar na ordem da existência. As causas finais precedem as causas eficientes".
A premissa menor expressa um princípio operante de toda a ciência, a saber, que todas as coisas têm o seu uso, que a ordem permeia o universo e que os métodos da natureza são racionais. Evidências disto aparecem na correlação dos elementos químicos uns com os outros; na adequação do mundo inanimado que é a base e suporte da vida; nas formas típicas e na unidade do plano que aparece na criação orgânica; na existência e cooperação das leis naturais; na ordem cósmica e compensações.
Esta premissa menor não é invalidada pelas seguintes objeções: d) Que freqüentemente entendemos mal o fim na verdade submetido pelos eventos naturais e objetos; pois o princípio não é que conhecemos necessariamente o verdadeiro fim, mas que necessariamente cremos que há um certo fim em cada caso da ordem e colocação sistemáticas, b) Que a ordem do universo é manifestamente imperfeita; pois, se isto fosse aceito, argumentaríamos, não a ausência da invenção, um certo tipo de razão da imperfeição, ou nas limitações da própria inteligência inventora, ou na natureza do fim que se procura (como, por exemplo, a correspondência com o estado moral e provação dos pecadores).
As evidências de ordem e colocação útil encontram-se tanto na indefinidamente pequena como na indefinidamente grande. As moléculas são artigos manufaturados; e as compensações do sistema solar que guarnecem aquele achatamento da órbita terrestre resultarão num arredondamento dessa mesma órbita, como mostra uma inteligência bem mais transcendente que a nossa; verCooKE, Religion and Chemistry, and Credentials of Sciense, 23 - "O belo é a harmonia das relações que a perfeita adequação produz; a lei é o princípio prevalecente que sustenta essa harmonia. Por isso, tanto o belo como a lei implicam desígnio. A partir da energia, da adequação do belo, da ordem, do sacrifício, demonstramos o poder, a habilidade, a perfeição, a lei, e o amor numa Inteligência Suprema. O cristianismo implica desígnio e é a
complementação do seu argumento". Pfleiderer, Philos. Religion, 1.168-"Uma boa definição do belo é a intencionalidade imanente, o cenário teleoiógico da realidade ideal, o brilho da Idéia através dos fenômenos".
Bowne, Philos. of Theism, 85 - "O desígnio nunca é casual. Ele é apenas ideal e a sua realização demanda uma causa eficiente. Se o gelo não deve afundar existe alguma estrutura molecular que faça o seu volume maior que o de um peso igual ao da água". Jackson, Theodore Parker, 355 - "Os órgãos rudimentares são como as letras mudas em muitas palavras: ambos testemunham uma história passada; e há uma inteligência na sua preservação". Diman, Theistic Argument: "Observamos não somente a mudança no mundo, que é a base do Argumento Cosmológico, mas percebemos que tal mudança age de acordo com uma regra fixa e invariável; na natureza inorgânica, na ordem geral, ou na regularidade, na ordem orgânica, especial ou na adaptação". Bowne, Review of H. Spencer, 113-115, 224-230: "A ciência indutiva se apoia no postulado de que o racional e o natural são um". Kant: "O anatomista deve admitir que nada no homem existe em vão".
É fruto do desígnio que os rios sempre cortam grandes cidades? que as cidades são sempre fundadas em centros de jogatina? As plantas são feitas em benefício do homem e o homem em benefício dos vermes? Voltaire: "Os narizes são feitos para os óculos - vamos usá-los"! Pope: "Enquanto o homem exclama 'tudo existe para o meu uso', retruca o venturoso néscio: 'em meu benefício'". Não se colhem as cerejas no frio do inverno quando não têm bom sabor e as uvas no calor do verão quando o vinho novo se transforma em vinagre? A natureza divide os melões em seções por conveniência ao serem saboreados pela família? A corticeira é feita para arrolhar as garrafas? A criança a quem se perguntou por que existe sal no oceano, respondeu que isto se deve à existência do bacalhau, confundindo a causa final com a causa eficiente. O professor pergunta: "Que são marsupiais"? O aluno responde: "São animais que têm bolsas". "Para quê?", pergunta o professor. Resposta do aluno: "Para esconder-se dentro dela quando perseguidos". Por que os dias são mais longos no verão do que no inverno? Porque esta é a propriedade de todos objetos naturais: alongarem-se sob a influência do calor. Um professor da cidade de Hiena ensinava que os médicos não existem por causa da doença, mas as doenças é que existem para que possa haver médicos. Kepler era um quixotesco astrônomo. Discutia as reivindicações de onze diferentes donzelas de se tornarem a sua segunda esposa e comparava os planetas a animais correndo pelo céu. Muitas das objeções ao desígnio surgem da confusão de uma parte da criação com o todo ou uma estrutura no processo de desenvolvimento com uma estrutura completa.
Alphonse de Castile ofendeu-se com o sistema ptolomaico e insinuou que, se ele tivesse sido consultado na criação, teria sugerido progressos mais valiosos. Lange, em sua History of Materialism, ilustra alguns dos métodos da natureza com milhões de barris de armas atirando em todas direções para matar apenas uma lebre; comprando dez mil chaves ao acaso para entrar num compartimento fechado; edificando uma cidade para obter uma casa. Não é um exagero o gelo que cobre os pólos? O ataque à natureza de John Stuart Mill em sua obra póstuma, Essays on Religion, 29 - "A natureza fere o homem, quebra-o como se sobre uma roda o lançasse para ser devorado
pelos animais selvagens, esmaga-o com pedras como o primeiro mártir cristão, mata-o de fome, congela-o com o frio, envenena-o com a rápida ou lenta peçonha das suas exalações e centenas de outras terríveis mortes, tais como a engenhosa crueldade jamais ultrapassada por Nábis ou por Domiciano".
A doutrina da evolução responde muitas destas objeções, mostrando que a ordem e a colocação útil no sistema como um todo é necessária e adquirida ao baixo preço pela imperfeição e sofrimento nos estágios iniciais de desenvolvimento. Impõe-se a pergunta: O sistema como um todo implica um desígnio? Minha opinião é que não há nenhum valor quanto a utilidade de uma complicada máquina para cujo propósito eu ignoro. Se eu me posto no começo de uma estrada e não sei aonde ela me conduz, presumo que ela assinale um destino mais direto. Bowne, Philos. of Theism, 20-22 - "Para contrabalançar as impressões que a aparente desordem e a imoralidade operam em nós, temos de admitir que o universo, em sua raiz, não é apenas racional e bom.
Isto é fé, mas um ato do qual depende toda a vida moral". Metaphysics, 165 - "O mesmo argumento que nega a mente na natureza nega a mente no homem". Fisher, Nat. AndMeth. ofRev., 264- "Há cinqüenta anos, quando o guindaste tocou o topo da torre da Catedral de Colônia, ainda por terminar, não havia evidência nenhuma do desígnio da estrutura toda"? Embora aceitemos que, enquanto não podemos com John Stuart Mill explicar as imperfeições do universo por quaisquer limitações da Inteligência que a planejou, não nos dispomos a considerá-las como se pretendessem corresponder ao estado moral e provação dos pecadores que Deus previu e proveu para a criação.
Defeitos do Argumento Teleológico
Estes se ligam não às premissas, mas à conclusão que se busca tirar delas.
O argumento não pode provar um Deus pessoal. A ordem e colocações úteis do universo só podem ser os mutantes fenômenos de uma inteligência e vontade pessoais, como supõe o panteísmo. A finalidade só pode ser a ima- nente.
Existe uma coisa que se chama finalidade imanente e inconsciente. O espírito nacional, sem o propósito estabelecido, constrói a língua. A abelha trabalha inconscientemente para os seus fins. Estráton de Lâmpsaco considerava o mundo como um grande animal. Neander: "A obra divina parte de dentro para fora". John Fiske: "O argumento do relógio tem sido superado pelo da flor". Iverach, Theism, 91 - "O efeito da evolução tem sido somente o de transferir a causa da mera influência externa operando de fora para um princípio racional imanente". Martineau, Study, 1.349,350 - "De modo nenhum o teísmo comprometeu a doutrina de um Deus exterior ao mundo ... nem a inteligência requer, para alcançar seu objetivo, que se exteriorize".
Newman Smyth, Place of Death, 62-80 - "O universo existe em alguma Inteligência toda permeável. Suponha que você possa ver um pequeno monte de tijolos, fragmentos de metal, e pedaços de argamassa, formando-se gradualmente nas paredes e estrutura interna do edifício, acrescentando-se
o material necessário à medida que a obra avança e, por fim, apresentando em seu acabamento uma fábrica mobiliada com máquinas variadas e bem trabalhadas. Ou uma locomotiva contendo um processo de auto-reparo para compensar o desgaste, aumentando o seu tamanho, soltando de si, com relativa freqüência, pedaços de latão ou de ferro dotados de capacidade de desenvolver-se passo a passo em outras locomotivas capazes de correr e reproduzir-se, por sua vez, em novas locomotivas". Do mesmo modo, a natureza, em suas partes separadas, pode parecer mecânica, mas no seu todo ela é racional. Weismann não "nega a força diretiva"; tal força é "a retaguarda do mecanismo como sua causa final ... que deve ser teleológica".
Por serem impressionantes estas evidências da inteligência no universo como um todo e em número aumentado à luz da evolução, devemos ainda sustentar que a natureza por si só não pode provar que esta inteligência é pessoal. Hopkins, Miscellanies, 18-36 - "Até onde existe essa inteligência impessoal e adaptável na criação irracional, não podemos necessariamente inferir a partir de leis imutáveis um Deus livre e impessoal". Ver Fisher, Super- naturai Origin of Christianity, 576-578. Kant mostra que o argumento não prova a inteligência independentemente da palavra (Critique, 370). Devemos trazer a mente ao mundo, se quisermos achá-la nele. Deixe o homem ausente e a natureza não poderá ser apropriadamente interpretada: a inteligência e a vontade na natureza podem ainda estar inconscientes. Porém, no caso do homem, somos obrigados a ter a idéia da inteligência e da vontade na natureza a partir do mais elevado tipo de inteligência que conhecemos, isto é, a dele. "Nullus in microcosmo spiritus, nullus in macrocosmo Deus" "Recebemos apenas o que damos e, na nossa vida, só vive a Natureza".
Por isso, o Argumento Teleológico necessita de ser suplementado pelo Antropológico, isto é, da constituição mental e moral do homem. Por si só, ele não prova a existência de um Criador. Porque a justiça pertence só à pessoa- lidade, este argumento não pode provar a justiça de Deus. Flint, Theism, 66
"A força e a inteligência, por si só, não se constituem Deus, embora sejam infinitas. Um ser pode possuí-las e, se não houver justiça, pode tratar-se de um diabo". Vemos aqui novamente a necessidade da sua suplementação pelo Argumento Antropológico.
Mesmo que este argumento pudesse provar a pessoalidade na inteligência e na vontade que originou a ordem do universo, não poderia provar ou a unidade, ou a eternidade, ou a infinitude de Deus; a unidade - pois as colocações úteis do universo poderiam ser o resultado da unicidade do conselho, ao invés de a unicidade da essência, na inteligência inventiva; a eternidade - pois um demiurgo criado talvez pudesse ter designado o universo; nem a infinitude
porque todas as marcas da ordem e colocação dentro da nossa observação simplesmente são finitas.
Diman, TheisticArgument, 114 afirma que todos os fenômenos do universo se devem à mesma fonte - visto que todos, de igual modo, estão sujeitos ao mesmo método de seqüência, p.ex. gravitação - e que a evidência nos aponta irresistivelmente para alguma causa explicativa. Podemos considerar esta afirmação somente como um pronunciamento de uma crença primitiva numa causa primeira, não como a conclusão de uma demonstração lógica porque conhecemos uma parte infinitesimal do universo. Do ponto de vista de uma Razão Absoluta, contudo, podemos cordialmente assentir com as palavras de F. P. Patton: "Quando consideramos a 'correnteza da tendência', o 'incognoscível de Spencer', o 'mundo da vontade' de Schopenhauer e a elaborada defesa da finalidade como o produto da inteligência inconsciente de Hartmann, podemos perguntar se os teístas com a sua crença em um Deus pessoal não estão de posse da única hipótese que pode salvar a linguagem destes escritores da acusação de ausência de sentido e de delírio idiota"
(.Journ. Christ. Philos, abr. 1883,283-307).
O mundo antigo, que tinha apenas a luz da natureza, cria em muitos deuses. William James, Will to Believe, 44 - "Se houver um divino Espírito do universo, a natureza, tal como a conhecemos, possivelmente não é a última palavra para o homem. Ou não há um espírito revelado na natureza, ou ele se revela inadequadamente nela; e (como tem admitido as mais elevadas religiões) o que chamamos de natureza visível, ou este mundo, deve ser apenas um véu e uma aparência superficial cujo significado pleno reside num elemento suplementar invisível, um outro mundo". Bowne, Theory of Thougth and Knowledge, 234 - "Mas a inteligência não é em si mesma um mistério dos mistérios? ... Sem dúvida, o intelecto é um grande mistério. ... Porém há uma escolha neles. Alguns mistérios deixam outras coisas claras, e alguns deixam as deixam tão obscuras e impenetráveis como sempre. Naquele caso encontra-se o mistério da inteligência. Isto torna possível a compreensão de todas as coisas exceto ela mesma".
O valor do Argumento Teleológico é simplesmente este: prova a partir de suas colocações úteis e exemplos de ordem que claramente tivemos um começo, ou, em outras palavras, a partir da harmonia do universo, que existe uma inteligência e uma vontade adequadas ao seu plano. Mas este argumento não pode garantir-nos se esta inteligência e esta vontade são pessoais ou impessoais, se o criador ou moldador é um ou são muitos, se é finito ou infinito, se eterno ou deve seu ser a outro, se necessário ou livre.
Contudo, nisto damos um passo a frente. O poder causativo que provamos através do Argumento Cosmológico transformou-se numa força inteligente e voluntária.
John Stuart Mill, Three Essays on Theism, 168-170 - "No presente estado do nosso conhecimento, as adaptações da natureza fornecem um grande balanço da probabilidade em favor da causa através da inteligência". Ladd sustenta que, sempre que um ser age sobre o seu semelhante, cada um sofre mudanças de estado que pertencem à sua própria natureza sob certas circunstâncias. A ação de um corpo sobre o outro nunca consiste em transferir o estado de um para o outro. Por isso não há mais dificuldade nos seres que são díspares agirem sobre um outro do que em seres semelhantes. Não transferimos idéias para outras mentes, - apenas despertamo-las para que desenvolvam as suas próprias. Do mesmo modo a força não é positivamente trans- ferível. Bowne, Philos. of Theism, 49, começa com "a concepção das coisas que interagem segundo a lei e formam um sistema inteligível. Não se pode construir tal sistema através do pensamento sem que se suponha que um ser unitário é a realidade fundamental do sistema. 53 - Nenhuma passagem de influências ou forças terá valor para cobrir a lacuna, quando as coisas são consideradas independentes. 56-0 próprio sistema não pode explicar esta interação porque o sistema é formado apenas dos seus membros. Neles deve haver algum ser que é a realidade deles e de que em certo sentido são fases e manifestações. A saber, há um monismo fundamental''. Substancialmente este é o ponto de vista de Lotze. Falckenberg, Geschichte der neueren Philo- sophie, 454, mostra como o ponto de vista de Lotze de que a sua suposição da unidade monística e continuidade não explicam como a mudança de condição, como a equiparação e compensação seguem a mudança de estado de qualquer coisa. Lotze explica esta realidade através da concepção ética de uma Pessoa de total extensão.
ARGUMENTO ANTROPOLÓGICO
Este é um argumento da condição moral e mental do homem para com a existência de um Autor, Legislador e um Fim. Às vezes é chamado de Argumento Moral.
O título comum "Argumento Moral" é demasiadamente limitado, porque parece levar em conta apenas a consciência do homem, enquanto o argumento que este título tão imperfeitamente designa, na verdade, procede da natureza intelectual do homem do mesmo modo que a moral. Ao escolher a designação que adotamos, desejamos, contudo, resgatar do simples termo médico "Antropologia" - um termo a que ele atribuiu uma significação muito limitada e que, ao empregá-lo, implica que o homem é somente um animal, para o qual a Antropologia é apenas o estudo de Ia bête humaine. A Antropologia não é somente a ciência da natureza física do homem, sua origem, e relacionamentos, mas também a que trata do seu mais elevado ser espiritual.
Por isso, em Teologia, o termo Antropologia designa a divisão da matéria que trata da natureza espiritual e seus dotes, seu estado original e subseqüente apostasia. Por isso, como argumento a partir da natureza mental e moral do homem, podemos, com perfeita propriedade, chamar o presente argumento de Antropológico.
É um argumento complexo e pode dividir-se em três partes.
A natureza intelectual e moral do homem deve ter tido como seu autor um Ser intelectual e moral. Os elementos da prova são os seguintes: a) O homem, como ser intelectual e moral, teve um começo no planeta, b) As forças materiais e inconscientes não fornecem causa suficiente para a consciência, razão e vontade livre do homem, c) O homem, como um efeito, pode referir-se a uma causa possuidora de natureza autoconsciente e moral, em outras palavras, pessoalidade.
Este argumento é parte de uma aplicação dos princípios tanto do Argumento Cosmológico como do Teleológico ao homem. Flint, Theism, 74 - "Embora a causalidade não envolva o desígnio, nem o desígnio a bondade, contudo este envolve a causalidade, e a bondade envolve tanto a causalidade como o desígnio". Jacobi: "A natureza oculta Deus; o homem o revela".
O homem é um efeito. A História das eras geológicas prova que o homem nem sempre existiu e, mesmo que as criaturas inferiores fossem seus proge- nitores, seu intelecto e liberdade não são eternos a parte ante. Consideramos o homem não como um ser físico, mas espiritual. Thompson, Christian Theism,
75 - "Toda a verdadeira causa deve ser suficiente para explicar o efeito". Locke, Essays, book 4, cap. 10 - "A inteligência que cogita não pode ser produzida a partir da que não o faz".
Ainda que o homem tivesse sempre existido, não precisaríamos abandonar o argumento. Deveríamos partir, não do começo da existência, mas do começo dos fenômenos. Eu poderia ver Deus no mundo, do mesmo modo que vejo o pensamento, a vontade, no meu companheiro. Fullerton, Plain Argument for God: Eu não infiro a respeito de você, como a causa da existência do seu corpo: Reconheço que você está presente e operante através do seu corpo. As mudanças que ele apresenta no gesto e na fala revelam uma pessoalidade através deles. Deste modo não preciso argumentar sobre um Ser que outrora causou a natureza e a história; reconheço um Ser presente, exercendo sabedoria e poder, através de sinais tais que revelam pessoalidade no homem. A natureza é por si mesma o Relojoeiro manifestando-se no próprio processo da feitura do relógio. Este é o sentido do nobre Epílogo à Dramatis Personae de Robert Browning, 252 - "Aquele rosto, longe de desvanecer-se, desenvolve-se, Ou decompõe-se, mas recompõe-se, Torna-se o meu universo que sente e conhece". "Esse é o Rosto de Cristo; é assim que eu o sinto". A natureza é expressão da mente e da vontade de Cristo, do mesmo modo que o meu rosto o é da minha mente e da minha vontade. Porém em ambos os casos, formando a retaguarda e cobrindo o rosto, acha-se uma pessoalidade da qual este é apenas a expressão parcial e temporária.
Bowne, Philos. Theism, 104,107-"Os meus companheiros agem como se tivessem pensamento, sentimento e vontade. Assim a natureza olha como se o pensamento, o sentimento e a vontade servissem de sua retaguarda.
Se negarmos a mente na natureza, devemos negá-la no homem. Contudo, se não existir uma mente controladora na natureza, também não pode existir no homem porque, se o poder básico é cego e necessário, então tudo depende também do que é necessitado". LeConte, em Royce's Conception of God, 44
"Só existe um lugar no mundo onde podemos adquirir os fenômenos físicos, sob o véu da matéria, a saber, o nosso cérebro e nele encontramos o eu, a pessoa. Não será razoável que, se pudermos adquiri-lo sob o véu da natureza,
do mesmo modo achemos uma Pessoa? Porém a admitir-se isto, podemos deduzir uma Pessoa infinita e, portanto, a única Pessoalidade completa que existe. A pessoalidade perfeita não é apenas a consciência própria, mas a existência própria. Elas são apenas imagens imperfeitas, como se fossem fragmentos separados da Pessoalidade infinita de Deus".
Personalidade = consciência própria + determinação própria com vista a fins morais. O bruto tem inteligência e vontade, mas nem tem percepção própria, nem consciência, nem vontade livre. Diman, Theistic Argument, 91,251 - "Suponha que 'as intuições da faculdade moral sejam resultados da experiência recebida da raça lentamente organizados'; ainda, tendo achado que o universo oferece evidência de uma causa supremamente inteligente, podemos crer que a natureza moral do homem oferece a mais elevada ilustração do seu modo de operar"; 358 - "Explicaremos as formas inferiores da vontade pelas mais elevadas, ou as mais elevadas pelas inferiores"?
A natureza moral do homem prova a existência de um Legislador e juiz santo. Os elementos da prova são: d) A consciência reconhece a existência de uma lei moral que tem autoridade suprema, b) Os sentimentos de abandono do mal e temores do julgamento são conseqüências das conhecidas violações desta lei moral, c) Porque esta lei moral não é auto-imposta e porque as ameaças de julgamento não são auto-executadas defendem respectivamente a existência de uma vontade santa que impôs a lei e do poder punitivo que executará as ameaças da natureza moral.
Ver, do Bispo Butler, Sermons on Human Nature, in Works, Bohn's ed, 385-414. A grande descoberta de Butler é a da consciência na constituição moral do homem: "Se ela tivesse a mesma força que a justiça, se tivesse o mesmo poder com que manifesta a autoridade, governaria o mundo de um modo absoluto". Consciência = justiça moral da alma - sem lei, sem policiamento, mas com juiz; ver abaixo Antrologia. Diman, Theistic Argument, 251 - "A consciência não depõe uma lei; adverte-nos da sua existência; e não só da lei, mas do propósito - não nosso, mas dos outros, missão a ser realizada". IferMuRPHY, Scientific Bases of Faith, 218, seg. Isto prova a pessoalidade do Legislador porque os seus pronunciamentos não são abstratos, como os da razão, mas encontram-se na natureza do mandamento; eles não estão no modo indicativo, mas no imperativo; o mandamento diz: "farás", ou "não farás".
Isto convence a vontade.
Hutton, Essays, 1.11 - "A consciência é um Moisés ideal, e os trovões de um Sinai invisível"; o ateu não considera a consciência como clarabóia, aberta para penetrar na natureza humana uma infinita aurora vinda do alto, mas como um arco polido ou domo, completando e refletindo todo o edifício embaixo". Porém a consciência não pode ser um simples reflexo e expressão da natureza, pois ela reprime e condena-a. Tullock, Theism: "Como a agulha magnética, a consciência indica a existência de uma Força desconhecida que, de longe, controla suas vibrações e treme diante da sua presença". Nero passa noites de terror vagando pelos salões da sua Casa Dourada. Kant sustenta
que a fé no dever requer fé num Deus que defenderá e galardoará o dever - ver Crítica da Razão Pura, 359-387.
Kant, em sua Metafísica da Ética, representa a ação da consciência como "conduzindo um processo perante a corte" e acrescenta: "Agora que ele é acusado diante da sua consciência seria absurdo imaginar que seja justo a própria pessoa exercer a função de juiz no tribunal; em tal circunstância, o acusador sempre perderia a sua causa. Por isso a consciência deve representar para si sempre uma outra pessoa como Juiz, a não ser que pretenda entrar em contradição consigo mesma". Ver também Crítica da Razão Prática, Werke, 8.214 - "Dever, sublime e poderoso nome, que nada tens em ti que atraia ou lucre, porém a mais desafiadora submissão; e ainda não ameaças dirigir a vontade através daquilo que pode despertar o terror natural ou aversão, mas somente divagar sobre a Lei; a Lei, que por si mesma descobre entrada na mente e mesmo quando nós desobedecemos, contra a nossa vontade compele-nos à reverência, uma Lei em cuja presença todas inclinações se tornam mais surdas, mesmo quando se tornam ocultamente rebeldes; que origem existe que seja digna de ti? Onde podes encontrar a raiz da tua nobre descendência, que orgulhosamente rejeitas todo o reinado com as inclinações? O Arcebispo Temple responde em suas Bampton Lect., 58,59, "Esta Lei eterna é o próprio Eterno, o Deus Onipotente". Robert Browning: "Dentro de mim o senso de que eu tenho um débito Garante-me - Em algum lugar deve haver Alguém, pronto a cumprir o seu dever. Tudo se volta para o seguinte: Onde há o dever existe a conseqüente aceitação: procura Aquele que aceita
o dever".
Salter, Ethicai Religion, citada no artigo de Pfleiderer sobre Moralidade sem Religião, Am. Jour. Theol., 3.237 - "A terra e as estrelas não criam a lei da gravidade a que elas obedecem; nem o homem, ou os exércitos dos seres racionais no universo unidos, criam a lei do dever". A vontade expressa no imperativo moral é superiora nossa porque doutra forma não haveria ordens. Contudo ela é uma com a nossa como a vida de um organismo está unida à dos seus membros. A teonomia não é heteronomia, mas a mais elevada autonomia, a garantia da nossa liberdade pessoal contra toda a servidão humana. Sêneca: "Deo parere libertas est" (A liberdade se parece com Deus). Knight, Essays in Philosophy, 272 - "Na consciência vemos um 'alter ego', em nós embora não de nós, mas outra Pessoalidade apoiando-nos". Martineau, Types, 2.105 - "Só uma pessoa pode ter autoridade sobre outra pessoa. ... Um ser solitário sem natureza sensível no universo não sentiria nenhum dever"; 1.26
"Como a Percepção nos dá a Vontade na forma de Causalidade contra nós no Non-Ego, do mesmo modo a Consciência nos dá a Vontade na forma de Autoridade em oposição completa a nós nele.... 2.7 - "Não podemos deduzir os fenômenos do caráter a partir de um agente que nada possui". Hutton, Essays, 1.41,42 - "Quando desobedecemos à consciência, a Força interna deixou de mover-nos; retirou-se apenas para observar- vigiar como nos moldamos a nós mesmos". Cardeal Newman, Apology, 377 - "Se não fosse pela voz que tão claramente fala à minha consciência e ao meu coração, eu seria um ateu ou um panteísta, ou um politeísta ao examinar cuidadosamente o mundo".
3. A natureza emotiva e voluntária do homem prova a existência de um ser
_e pode fornecer em si um objeto satisfatório do sentimento humano e de um fim que manifestará as mais elevadas atividades do homem e garantirá o seu oeis elevado progresso.
Só um ser que possui poder, sabedoria, santidade e bondade e tudo isto infinitamente maior do que conhecemos na terra pode atender a demanda da alma humana. Não há dúvida de que tal ser existe. Caso contrário, não seria suprida a maior necessidade do homem e a crença em uma mentira seria mais produtiva virtude do que a crença na verdade.
Feuerbach chama Deus "o reflexo do próprio homem arruinado"; "a consciência de Deus = a consciência de si mesmo"; "a religião é um sonho da alma humana"; "a teologia toda é uma antropologia"; "o homem fez Deus à sua imagem". Porém a consciência mostra que o homem não reconhece em Deus apenas um seu semelhante, mas também o seu antagônico. Não como Galeno; Piedade = consciência + instabilidade". As mais refinadas mentes são as do tipo debilitado; ver Agostinho, Confessions, 1.1 - "Tu nos fizeste para ti, e o meu coração não tem repouso enquanto não descansa em ti". Sobre John Stuart Mill - "uma mente que não pôde achar Deus e uma mente que não pôde agir sem Deus" . Comte, em seus últimos dias, construiu um objeto de adoração na Humanidade Universal e inventou um ritual que Huxley chama "Catolicismo minus Cristianismo". Ver também Tyndall, Belfast Address: "Se eu não cresse, dizia-me certa ocasião um grande homem, que existe uma Inteligência no cerne das coisas, minha vida na terra seria intolerável".
A última linha do Peregrino de Schiller diz: "Und das Dort ist niemals Hier ("O ali nunca está aqui"). O finito nunca satisfaz. Tennyson, Two lfoices: "Eis a vida de que os nossos nervos são escassos, Oh vida, não morte, por cuja causa ofegamos; Mais vida, mais completa eu quero". Seth, Ethicai Principies, 419 - "Um universo moral, um Ser moral absoluto, é o ambiente indispensável da vida ética, sem o qual não pode atingir o desenvolvimento perfeito. ... Há um Deus moral, ou isto não é universo". James, Wiil to Beiieve, 116 — "Deus é o mais adequado objeto possível das mentes estruturadas como a nossa para conceber como enganosa a raiz do universo. Qualquer coisa sem muito de Deus não é um objeto racional, qualquer coisa mais do que Deus não é possível, se o homem não necessita de um objeto de conhecimento, sentimento e vontade".
Romanes, Thoughts on Religion, 41 - "Falar da Religião do Incognoscível, Religião do Cosmismo, a Religião da Humanidade, em que não se reconhece a pessoalidade da Primeira Causa não tem sentido do mesmo modo que falar do amor de um triângulo ou da racionalidade do equador". Dizia-se que, no sistema de Comte, "derramando-se o vinho da presença real, pedia-se que adorássemos a taça vazia". "Queremos um objeto de devoção e Comte nos brinda com espelho" (Martineau). Huxley dizia que ele adoraria a selvageria dos macacos logo que a dos positivistas racionalizassem o conceito de humanidade. Trata-se apenas da humanidade ideal, seu elemento divino que pode ser adorado. Uma vez concebido isto, não podemos nos satisfazer enquanto isto não se realize em algum lugar ou em alguém, como em Jesus Cristo.
Upton, Hibbert Lectures, 265-272 - Huxley crê que a evolução é "um processo lógico materializado"; que nada permanece exceto o fluxo de energia e "a ordem racional o permeia"; Na sua primeira parte deste processo, a natureza, não existe moralidade nem benevolência. Mas o processo termina com a produção do homem, que pode ser a causa daquele apenas utilizando a guerra moral contra as forças naturais que o impelem. Ele deve ser benévolo e justo. Não diremos nós, em que pese o ponto de vista do Sr. Huxley, que isto deixa claro em que consiste a natureza do sistema e que deve existir um Ser benévolo e justo que a põe em ordem? Martineau, Seat of Authority, 63-68 - "Embora se conheça a autoridade do mais elevado incentivo, ela não pode ser criada; por enquanto ela está em mim e acima de mim. ... A autoridade a que a consciência me introduz, embora emergindo na consciência, é objetiva em todos nós e necessariamente se refere à natureza das coisas independentemente dos acidentes da nossa constituição. Ela não depende de nós, é independente. Todas as mentes nascidas no universo são introduzidas à presença de uma justiça real, tão certamente como numa cena de um espaço real. A percepção revela um outro ser além de nós mesmos; a consciência revela um mais elevado que nós mesmos".
Contudo, livremente devemos admitir que este argumento a partir das aspirações do homem só tem peso se supusermos que existe um Deus sábio, verdadeiro, santo e benévolo, que constituiu as nossas mentes para que o seu pensamento e sentimentos correspondam à verdade e a ele mesmo. Um ímpio poderia ter-nos constituído tal lógica que nos induziria ao erro.
Por isso, o argumento é o desenvolvimento e expressão da nossa idéia de Deus. Luthard, Fundamental Truths: "A natureza é como um documento escrito contendo apenas consoantes. Nós é que devemos fornecer as vogais que o decifrarão. A não ser que portemos conosco a idéia de Deus, a natureza mostrar-se-nos-á apenas muda".
d) Defeitos do Argumento Antropológico: a) não pode provar um criador do universo material, b) Não pode provar a infinitude de Deus. c) Não pode provar a misericórdia de Deus. Mas
O valor do Argumento é que ele nos assegura da existência de um ser pessoal, que nos dirige em justiça e que é o próprio objeto do sentimento supremo e serviço. Mas se este Ser é o criador original de todas as coisas, ou simplesmente o autor da nossa existência, quer seja ele infinito ou finito, quer seja ele um Ser de simples justiça ou também de misericórdia, este argumento não nos garante.
Entre os argumentos da existência de Deus, contudo, atribuímos a este o lugar principal, visto que ele acrescenta às idéias de poder causativo (que derivamos do Argumento Cosmológico) e da inteligência criativa (que deri- ' amos do Argumento Teleológico), as bem mais amplas idéias de pessoalidade e justo senhorio.
Sir William Hamilton, Works of Reid, 2.974, nota U; Lectures on Metaph.,
1.33 - "Os únicos argumentos válidos da existência de Deus e da imortalidade da alma encontram-se na natureza moral do homem"; "a teologia depende inteiramente da psicologia, pois, com a prova da natureza moral do homem permanece em pé ou cai a da existência de Deus". Porém Diman, Theistic Argument, 244, muito apropriadamente rebate este argumento a partir da natureza do homem como única prova da divindade: "Seria mais adequado mostrar os atributos do Ser cuja existência já tem sido provada a partir de outras fontes"; "por isso o Argumento Antropológico depende tanto do Cosmológico e do Teleológico como estes dependem daquele".
Contudo, o Argumento Antropológico é necessário para suplementar as conclusões dos dois outros. Aqueles que, como Herbert Spencer, reconhecem um Ser infinito e absoluto, Poder e Causa, podem ainda deixar de reconhecer o referido ser como espiritual e pessoal somente porque não reconhecem a si mesmos como tais, isto é, não reconhecem a razão, a consciência e a livre vontade do homem. O agnosticismo na filosofia envolve-o na religião.
R. K. Eccles: "Todas as línguas mais avançadas escrevem as palavras 'Deus' e 'Eu' com letra maiúscula". Cook, Religion and Chemistry. "Deus é amor; mas a natureza não pode prová-lo e é para atestá-lo que o Cordeiro foi morto desde a fundação do mundo".
Na filosofia, tudo depende do nosso ponto de partida, quer da natureza ou do eu, quer do elemento necessário quer do livre. Por isso, em certo sentido, na prática devemos começar com o Argumento Antropológico e, a partir daí empregar o Cosmológico e o Teleológico para garantir a aplicação das conclusões que temos tirado do homem para natureza. Como Deus está frente a frente ao homem na Consciência e diz-lhe: "Tu"; semelhantemente o homem está com relação a Deus na Natureza e pode dizer-lhe "Tu". Mulford, Republic of God, 28 - "Como a pessoalidade do homem tem seu fundamento na pessoalidade de Deus, assim também a realização da sua própria pessoalidade pelo homem aproxima-o mais de Deus".
É muito comum em tais circunstâncias tratar o que se chama os Argumentos Histórico e Bíblico da existência de Deus - aquele argumentando, a partir da unidade da história, este a partir da Bíblia; tal unidade deve, em cada caso, ter a sua causa e explicação na existência de Deus. É uma razão suficiente para não discutir estes argumentos; sem a prévia crença na existência de Deus, ninguém verá unidade nem na história, nem na Bíblia. O pintor Turner expôs um quadro que parecia um nevoeiro e uma nuvem até que ele lhe deu uma pincelada escarlata. Foi o que bastou para dar-lhe o verdadeiro ponto de vista e o resto tornou-se inteligível. Deste modo, a vinda de Cristo e o seu sangue tornaram inteligíveis tanto as Escrituras como a história humana. Ele ostenta em seu cinto a chave de todos mistérios. Schopenhauer, que não conhecia a Cristo, não admitia a filosofia da história. Considerava a história um simples jogo fortuito do capricho do indivíduo. Pascal: "Jesus Cristo é o centro e o objeto de todas as coisas; aquele que não o conhece ignora a natureza e a si mesmo".
ARGUMENTO ONTOLÓGICO
Este argumento infere a existência de Deus a partir de idéias abstratas e necessárias da mente humana. Apresenta-se em três formas:
1. De Samuel Clarke
Espaço e tempo são atributos da substância ou ser. Mas espaço e tempo são, respectivamente, infinito e eterno. Portanto, deve haver uma substância infinita e eterna ou Ser a quem pertencem tais atributos.
Gillespie apresenta o argumento de um modo um tanto diferente. Espaço e tempo são modos de existência. Mas eles são respectivamente infinitos e eternos. Por isso, certamente há um ser infinito e eterno que subsiste em tais modos. Porém replicamos:
Espaço e tempo nem são atributos de substância, nem modos de existência. Se válido, o argumento provaria que Deus não é mente, mas matéria, pois não poderia ser mente, mas só matéria, da qual o espaço e o tempo seriam ou atributos ou modos.
O Argumento Ontológico é chamado freqüentemente de argumento a priori, isto é, daquilo que é logicamente anterior, ou mais antigo que a experiência, a saber, nossas idéias intuitivas. Todas as formas do Argumento Ontológico, neste sentido, são a priori. Para o ponto de vista contrário ver Calderwood, Moral Philos., 226 - "Começar, como Clarke, com a proposição de que 'algo existia desde a eternidade', é virtualmente propor um argumento depois de ter admitido o que falta ser provado. A forma do argumento a priori de Gillespie, partindo da proposição de que 'a infinitude da extensão existe necessariamente', está sujeita à mesma objeção com a desvantagem de atribuir a Deus uma propriedade da matéria."
B. Smith diz que Brougham interpretou mal Clarke: "O argumento de Clarke está na sua sexta proposição e supõe a existência provada daquilo que vem antes. Seu alvo aqui é estabelecer a infinitude e onipresença deste Primeiro Ser. Ele não prova a existência a partir da imensidão". Porém retrucamos que, ele nem pode provar a infinidade de Deus a partir da imensidão do espaço. Espaço e tempo não são substâncias nem atributos, mas relações. A doutrina de que espaço e tempo são atributos ou modos da existência de Deus tende ao panteísmo materialista como o de Spinosa, que defende que a "substância una e simples" (substantia una et unica) nos é conhecida através dos dois atributos: pensamento e extensão; mente = Deus no modo do pensamento; matéria = Deus no modo da extensão. Dove, Logic of the Christian Faith, 127, diz, com propriedade que um Deus extenso é um Deus material; "espaço e tempo nem são atributos da matéria, nem da mente"; "devemos ter a idéia moral no mundo natural não a idéia natural no mundo moral". H. M. Stanley, on Space and Sciense, in Philos. Rev., Nov. 1898; 615
"O espaço não é cheio de coisas, mas as coisas são espaçosas. ... Espaço é uma forma de aparecimento dinâmico". Prof. C. A. Strong: "O mundo composto de consciência e outras existências não se encontra no espaço, embora possa estar em algo de que o espaço é o símbolo".
De Descartes
Temos a idéia de um Ser infinito e perfeito. Esta idéia não pode ser derivada de coisas imperfeitas e finitas. Portanto, deve haver um Ser infinito e perfeito que é a sua causa.
Porém respondemos que este argumento confunde a idéia de infinito com uma idéia infinita. A idéia que o homem tem do infinito não é infinita, mas finita e de um efeito finito não podemos argumentar uma causa infinita.
Esta forma do argumento Ontológico, conquanto seja a priori, baseada na idéia necessária da mente humana é, diferentemente das outras formas do mesmo argumento, a posteriori, raciocinando a partir desta idéia, como um efeito, para a existência de um Ser que é a sua causa. Argumento a posteriori
daquilo que é mais tardio para o que é mais antigo, isto é, do efeito para a causa. Os Argumentos Cosmológico, Teleológico e Antropológico são a posteriori. Deste tipo é o de Descartes; ver Descartes, Meditação, 3: Haec idea quae in nobis est requirit Deum pro causa; Deusque proinde existit". A idéia na mente dos homens é a impressão do nome do trabalhador indelevelmente estampada no seu trabalho - a sombra projetada na alma humana pelo Ser invisível de cuja existência e presença obscuramente ela nos informa. Blunt, Dict. of Theol., 739; Saisset, Pantheism, 1.54 - "Descartes restringe o fato da consciência, enquanto Anselmo a concepção abstrata"; "O argumento de Descartes podia ser considerado um ramo do Argumento Antropológico ou Moral, pelo fato de que este último procede da constituição humana e não das suas idéias abstratas".
De Anselmo
Temos a idéia de um Ser absolutamente perfeito. Porém a existência é um atributo da perfeição. Deve existir um ser absolutamente perfeito.
Respondemos que este argumento confunde existência ideal com existência real. Nossas idéias não são a medida da realidade externa.
Anselmo, Poslogion, 2 - "Id quod majus cogitari nequit, non potest esse in intellectu solo". A premissa maior aqui não é que todas idéias perfeitas implicam a existência do objeto que elas representam, porque então, como Kant contrapõe, eu poderia argumentar da minha idéia perfeita de uma nota de $100 que eu realmente possuía, o que está longe do fato. Deste modo eu tenho uma idéia perfeita de um mau ser, de um centauro, de nada, - mas não se segue que o mau ser, o centauro, ou que o nada existe. O argumento é mais exatamente da idéia do Ser absoluto e perfeito - de "que, não se pode conceber maior do que ele". Só pode haver um ser assim como uma só idéia com esta mesma caraterística.
Contudo, mesmo que se entenda deste modo, não podemos argumentar a partir desta idéia em favor da existência real de tal ser. Case, Physical fíea- lism, 173 - "Deus não é uma idéia e consequentemente não se pode inferir a partir de simples idéias". Bowne, Philos. Theism, 43-0 Argumento Ontológico "apenas assinala que a idéia do perfeito deve incluir a da existência; mas nada há que mostre que a idéia autoconsistente representa uma realidade objetiva". Imagino a serpente do mar, o Jinn das Mil e Uma Noites, "A Antropofagia e os homens cujas cabeças crescem sob os seus ombros". O Cavalo Alado de Uhland tinha todas as virtudes possíveis, mas faltava-lhe só uma, - não tinha vida. Se cada idéia perfeita implica a realidade do seu objetivo, pode haver cavalo com dez patas e árvores com raízes no ar.
"O argumento de Anselmo implica", diz Fisher, in Journ. Christ. Philos., jan., 1883.114, que a existência in Re. é um elemento constituinte do conceito. Concluir-se-ia a existência do ser a partir da definição de uma palavra. Esta inferência só se justifica com base no realismo filosófico". Dove, Logic of the Christ. Faith, 141 - "O Argumento Ontológico é a fórmula algébrica do universo que conduz a uma conclusão válida sobre a existência real só quando a enchemos de objetos que conhecemos nos argumentos a posteriori.
Dorner, Glaubenslehre, 1.197, dá-nos a melhor afirmativa do Argumento Ontológico: "A razão pensa em Deus como existente. Se não fosse a razão, não se pensaria na existência de Deus. A razão só existe quando se admite que Deus é". Porém, evidentemente, isto não é argumento; é uma vivida afirmação da suposição necessária da existência de uma Razão absoluta que condiciona e valida a nossa.
Apesar de que esta última deve ser considerada a mais perfeita forma do Argumento Ontológico, é evidente que nos conduz a uma conclusão ideal, não a uma existência real. Em comum com as duas formas anteriores do argumento, contudo, admite tacitamente, como já existindo na mente humana, aquele conhecimento da existência de Deus que derivaria da demonstração lógica. Tem valor, portanto, para mostrar o que Deus deve ser, se é que ele existe.
Mas a existência de um Ser infinitamente grande, Causa pessoal, Criador e Legislador, tem sido provada nos argumentos anteriores; pois a lei da parcimônia requer que apliquemos as conclusões dos três primeiros argumentos àquele único Ser e não a muitos. A este Ser devemos agora atribuir a infinitude e a perfeição, idéia na qual se assenta a base do Argumento Ontológico - não porque são demonstradamente dele, mas porque a nossa constituição mental não nos permitirá pensar de outra forma. Assim, revestindo-o de toda a perfeição que a mente humana pode conceber e esta na ilimitada plenitude, temos aquele que com justiça chamamos Deus.
McCosh, Div. Gov., 12, nota-"É neste lugar, se não nos enganamos, que entra a idéia do Infinito. Não se pode provar (como defende Kant) que a capacidade que a mente humana tem de formar tal idéia ou, mais do que isto, sua crença intuitiva, num Infinito que sente ser-lhe impossível formar um conceito adequado da existência de um Ser infinito; mas estamos convencidos de que os meios pelos quais a mente se capacita de revestir a Divindade, mostra-se existir em outras bases, com os atributos da infinitude, isto é, de ver este ser, poder, bondade, e todas as suas perfeições como infinitas". Even Flint, Theism, 68, que sustenta que chegamos à existência de Deus por inferência, fala das "condições necessárias do pensamento e sentimento e aspirações inerradi- cáveis que nos impõem idéias da existência absoluta, infinitude e perfeição, e nunca nos permitirão negar estas perfeições a Deus, nem atribuí-las a qualquer outro ser". A crença em Deus não é a conclusão de uma demonstração, mas a solução de um problema. Calderwood, Moral Philosophy, 226 - "Ou se admite a questão toda logo de início, ou não se atinge o Infinito".
Clarke, Christian Teology, 97-114, divide a sua prova em duas partes:
Evidência da Existência de Deus a partir do ponto partida intelectual: Faz- se a descoberta da Mente no universo, 1. inteligibilidade do universo para conosco; 2. através da idéia da causa; 3. através da presença dos fins do universo. II. Evidência da existência de Deus a partir do elemento religioso: Faz-se a descoberta do bom Deus, 1. através da natureza religiosa do homem; 2. através do grande dilema - Deus: o melhor ou o pior; 3. através da experiência espiritual do homem especialmente no cristianismo. Deste modo, até onde a prova do Dr. Clarke pretende ser uma afirmativa, não de uma crença primitiva, mas de um processo lógico, devemos sustentar que ela é defeituosa, do mesmo modo que as três formas de prova que vimos fornecer alguma evidência corroborativa da existência de Deus. Por isso Dr. Clarke, com muita propriedade, acrescenta: A religião não se produz através da prova da existência de Deus e não será destruída pela sua insuficiência em algumas mentes. A religião existia antes do argumento; de fato é a preciosidade da religião que induz a buscar toda a confirmação possível da realidade de Deus".
As três formas de provar a existência de Deus já mencionadas - o Argumento Cosmológico, o Teleológico e o Antropológico - podem ser comparadas a três arcos de uma ponte sobre um largo e veloz rio. A ponte tem apenas dois defeitos, mas bem sérios. O primeiro é que não se pode avançar para ela; a extremidade da borda aquém não existe; não se pode entrar na ponte do argumento lógico a não ser que se admita a validade dos processos lógicos; esta suposição tem como certo, de início, a existência de um Deus que induziu nossas faculdades a agirem corretamente; avançamos para a ponte, não por um processo lógico, mas somente por um salto da intuição e admitindo, logo ao começo, a própria coisa que se pretende provar. O segundo defeito da assim chamada ponte do argumento é que, quando se caminha, nunca se sai. Também falta a conexão com a outra margem. Todas as premissas com que argumentamos, sendo finitas, garantem-nos apenas a extração de uma conclusão finita. O argumento não pode atingir o Infinito e só Um merece ser chamado Deus. Não podemos sair da nossa ponte lógica por processo lógico, mas somente por outro salto final da intuição e admitindo mais uma
vez a existência do Ser infinito que em vão temos procurado alcançar por mero argumento. Parece haver aqui uma referência a Jó 11.7 - "Porventura alcançarás os caminhos de Deus, ou chegarás à perfeição do Todo-poderoso?"
Como processo lógico este é defeituoso, visto que toda lógica bem como toda observação para sua validade depende da pressuposta existência de Deus e, visto que este processo particular, mesmo admitindo a validade da lógica em geral, não garante a conclusão de que Deus existe, exceto com base na suposição de que nossas idéias abstratas de infinitude e de perfeição se apliquem também ao Ser a quem o argumento nos conduziu.
Porém, apesar de que ambos os fins da ponte lógica são totalmente falhos, o processo pode servir e na verdade serve a um propósito mais útil que o da simples demonstração, a saber, o de despertar, explicando e confirmando uma convicção que, apesar de a mais fundamental de todas, pode ter sido parcialmente adormecida por falta de pensamento.
Morell, Philos. Fragments, 177,179 - "De fato, não podemos provar a existência de um Deus através de um argumento lógico do mesmo modo em que não o podemos no que tange a um mundo externo; mas também não podemos ao menos obter tão forte convicção prática de um como do outro". "Chegamos a uma crença científica na existência de Deus do mesmo modo em que o fazemos em qualquer outra verdade humana possível. Admitimo-lo, como uma hipótese absolutamente necessária a fim de explicar os fenômenos do universo; e então as evidências de cada quadrante começam a convergir para ele, até que, com o passar do tempo, o senso comum da humanidade, cultivada e iluminada por todo o conhecimento acumulado, pronuncie a validade da hipótese com uma voz raramente menos decisiva e universal que no caso das nossas mais elevadas convicções científicas".
Fisher, Supernat. Origin of Christianity, 572 - "Qual é, então, o propósito e qual a força dos vários argumentos da existência de Deus? Respondemos que tais provas são os diferentes modos em que a fé se expressa e busca confirmação. Neles concebe-se ou define-se a fé ou o objeto desta e neles não se encontra a corroboração arbitrária, mas a substancial e valiosa daquilo que a fé extrai da própria alma. Por isso, tais provas nem são, por um lado, suficientes para criar e sustentar a fé, nem, por outro lado, para desprezá-las como se não tivessem valor algum. A. J. Barrett: "Os argumentos, em si mesmos, não são tanto uma ponte, mas cabos que sustentam firmes a qran- de ponte pênsíl da intuição, através da qual atravessamos o abismo entre o homem e Deus. Ou, conquanto não sejam uma escada pela qual podemos alcançar o céu, são o Ossa no Pélion de cuja altura combinada podemos divisá-lo".
Anselmo: "Negligentia mihi videtur, si postquam confirmati sumus in fide non studemus quod credimus intelligere". Bradley, Apperence and Reality.
"A metafísica é a descoberta das más razões por que cremos no instinto; mas descobrirmo-las não é menos que um instinto". Illingworth, Div. and Hum.
Personality, Lect. III - "A crença num Deus pessoal é juízo instintivo justificado progressivamente pela razão". Knight, Essays in Philosophy, 241 - "Os argumentos são memoriais históricos dos esforços da raça humana para vindicar a si mesma a existência de uma realidade da qual ela está consciente, mas que não pode definir perfeitamente". H. Fielding, The Hearts of Men, 313 - "Os credos são a gramática da religião. Eles são para a religião o que a gramática é para a fala. As palavras são a expressão da nossa vontade; a gramática é a teoria formada posteriormente. A fala nunca procede da gramática, mas ocorre o contrário. Como a fala procede e muda a partir de causas desconhecidas, a gramática deve segui-la". Pascal: "O coração tem razões que a própria razão desconhece". Francês Power Cobbe: "As instituições são 'tuições' de Deus".
Hegel, em sua Logic, p. 3, falando da disposição relativa às provas da existência de Deus como o único meio de produzir fé em Deus, diz: "Tal doutrina encontraria seu paralelo se disséssemos que comer é impossível antes de ter adquirido o conhecimento das propriedades químicas, botânicas e zoológicas do nosso alimento; e que devemos adiar a digestão até que tenhamos terminado o estudo da anatomia e da fisiologia". É um erro supor que não há vida religiosa sem uma teoria correta da vida. Devo recusar-me a beber água ou a respirar o ar até que eu possa fabricá-los por mim mesmo? Algumas coisas nos são dadas. Entre elas estão "a graça e a verdade" (Jo. 1.17; cf. 9). Mas sempre há os que não querem receber nada de graça e insistem em operar todo o seu conhecimento, assim como toda a salvação, através do seu próprio processo. O pelagianismo, com a sua negação das doutrinas da graça é apenas um desenvolvimento de um racionalismo que se recusa a aceitar as verdades primitivas a menos que sejam demonstradas logicamente. Visto que a existência da alma, do mundo, e de Deus não pode ser provada por este processo, o racionalismo é levado a reduzir ou a interpretar falsamente os pronunciamentos da consciência e disso resultam alguns sistemas a serem mencionados a seguir.
Capítulo III
EXPLICAÇÕES ERRÔNEAS E CONCLUSÃO
Qualquer explicação correta do universo deve postular um conhecimento intuitivo da existência do mundo externo, de si mesmo, e de Deus. O desejo da unidade científica, contudo, tem ocasionado tentativas de reduzir estes três fatores a um e, conforme um e outro destes três, tem sido considerado como o princípio todo inclusivo, tem resultado em Materialismo, Idealismo Materialista ou Panteísmo Idealista. Um sistema que podemos designar como Monis- mo Ético satisfaz mais a contento este impulso científico.
Podemos resumir o presente capítulo da seguinte forma: 1. Materialismo: Universo = átomos. Resposta: Os átomos nada podem fazer sem a força e não podem ser coisa alguma (inteligível) sem as idéias. 2. Idealismo Materialista: Universo = Força + Idéias. Resposta: As Idéias pertencem à Mente e a Força só pode ser exercida pela Vontade. 3. Panteísmo Idealista: Universo = Mente e Vontade Imanentes e Impessoais. Resposta: O espírito no homem mostra que o Espírito Infinito deve ser Mente e Vontade Transcendentes e Pessoais. Destas três formas de erro somos levados a uma conclusão que podemos denominar 4. Monismo Ético: Universo = Manifestação finita, parcial, graduada da Vida divina; a matéria é a autolimitação de Deus sob a lei da necessidade; a humanidade é a autolimitação sob a lei da liberdade; a Encarnação e a Expiação são as autolimitações de Deus sob a lei da graça. O Monismo Metafísico, ou a doutrina de uma Substância, Princípio ou Base do Ser, é consistente com o Dualismo Psicológico, ou a doutrina de que a alma é, por um lado, pessoalmente distinta da matéria e, por outro, de Deus.
MATERIALISMO
O Materialismo é o método de pensamento que dá maior prioridade à matéria do que à mente nas explicações do universo. Com base neste ponto de vista os átomos materiais constituem a realidade última e fundamental de que todas as coisas, quer racionais, quer irracionais, são apenas combinações e
fenômenos. A força é considerada como uma propriedade universal e inseparável da matéria.
O elemento de verdade no materialismo é a realidade do mundo externo. Seu erro está em considerar o mundo externo como tendo existência original e independente e considerar a mente como seu produto.
O materialismo considera os átomos como tijolos com cujo universo material é construída a casa em que moramos. Sir William Thomson (Lord Kelvin) imagina que, se uma gota de água fosse aumentada ao tamanho da nossa terra, os átomos em que ela consiste pareceriam maiores do que as bolinhas de vidro de um menino, e ainda bem menores que as bolas de bilhar. Todas coisas, visíveis e invisíveis, são feitas destes átomos. A mente, com todas as suas atividades, é uma combinação ou fenômeno de átomos. "Man ist was er iszt: ohne Phosphor kein gedanke" (A pessoa é o que come: sem fósforo, não há nenhum pensamento). A ética é um bilhete de passagem; e a adoração, como o calor, é um tipo de movimento. Contudo, Agassiz, espirituosamente perguntou: "Então, os pescadores são mais inteligentes que os agricultores, porque eles comem tanto peixe e, por isso, ingerem mais fósforo"?
E evidente que muito do que se atribui aos átomos, na realidade pertence à força. Prive da força os átomos e tudo o que sobra é extensão, que = espaço = zero. Contudo, "se se estendem os átomos, estes não podem ser os últimos, porque a extensão implica divisibilidade e aquilo que se concebe como divisível não pode ser o último elemento filosófico. Porém, se os átomos não se estendem, conseqüentemente uma infinita multiplicação e combinação deles não pode produzir uma substância extensa. Além do mais, não se concebe um átomo que nem é substância extensa, nem substância pensante. O último elemento real é a força, que não pode ser exercida pelo nada, mas, como veremos doravante, só um Espírito pessoal pode exercê-la porque só ele possui as caraterísticas da realidade, a saber, definibilidade, unidade e atividade".
Não só a força, mas também a inteligência, deve ser atribuída aos átomos antes de poderem explicar qualquer operação da natureza. Herschel não só diz que "a força da gravitação parece assemelhar-se à de uma vontade universal", mas os próprios átomos, ao reconhecerem-se uns aos outros para combinarem-se, mostram em grande parte "a presença da mente". Ladd, Introd. to Philosophy, 269 - "Um distinto astrônomo disse que cada corpo no sistema solar comporta-se como se soubesse precisamente como deveria fazê-lo em consonância com a sua própria natureza e com o comportamento de cada um dos outros corpos no mesmo sistema solar. ... Cada átomo já percorreu incontáveis milhões de milhas com incontáveis milhões de pares, muitos dos quais requeriam importante modificação no seu modo de mover- se sem jamais apartarem-se do seu passo correto ou ritmo". J. P. Cooke, Cre- dentials of Science, 104, 177, sugere que há algo mais necessário do que os átomos para explicar o universo. Deve-se admitir uma Inteligência correlata.
Por si mesmo, os átomos seriam como um montão de pregos soltos, que necessitam de ser magnetizados para manterem-se unidos. Precisariam ser resolvidas todas as estruturas e desaparecer todas as formas da matéria se se quisesse afastar a Presença que as sustenta. O átomo, como as mônadas de Leibnitz, é "parvus in genere deus" - "um deus pequenino na sua natureza" - tão somente por ser a expressão da mente e da vontade de um Deus imanente.
Platão fala dos homens que ficam "deslumbrados quando se aproximam de coisas materiais". Não percebem que as próprias coisas materiais, visto que só podem ser interpretadas em termos de espírito, devem ser na essência espirituais. O materialismo é a explicação de um mundo do qual conhecemos alguma coisa - o mundo da mente - através de um mundo do qual quase nada conhecemos - o da matéria. Upton, Hibbert Lectures, 297, 298 - "Como estão os átomos materiais e as moléculas cerebrais? Eles não têm existência real a não ser como objeto do pensamento e, por isso, o próprio pensamento, que você diz que os átomos produzem, voltam a ser a precondição da sua própria existência". Com isto concordam as palavras do Dr. Ladd: "O conhecimento da matéria envolve repetidas atividades da sensação e da reflexão, da inferência indutiva e da dedutiva, da crença intuitiva na substância. Tudo isto são atividades da mente. Só quando ela tem vida autoconsciente obtém-se qualquer conhecimento do que é a matéria ou do que ela pode fazer. ... Tudo aquilo que está sempre sujeito a estados mutantes é real. O que toca, sente, vê é mais real do que o tocado, sentido, visto".
N. Gardner, Presb. Ftev., 1885.301, 665, 666 - "A mente dá à matéria seu principal sentido - por isso a matéria por si só nunca pode explicar o universo". Gore, Incarnation, 31 - "A mente não é um produto da natureza, mas seu constituinte necessário, considerado como um sistema ordenado cognoscível". Fraser, Philos. ofTheisrrr. "Um ato imoral deve proceder de um agente imoral; não se conhece um efeito físico que origina sua causa física".
A matéria orgânica ou inorgânica pressupõe uma mente; mas não é verdade que a mente pressupõe a matéria. LeConte: "Se eu pudesse remover a cobertura do seu cérebro, o que eu veria? Só alterações físicas. Mas quanto a você
o que você pode perceber? A consciência, o pensamento, a emoção, a vontade. Agora, tome o exterior da natureza, o Cosmos. De fora, o observador só vê fenômenos físicos. Mas não deve haver também neste caso - por outro lado - fenômenos psíquicos, o Eu, a Pessoa, a Vontade"?
A impossibilidade de encontrar na matéria, considerada como simples átomos, quaisquer atributos de uma causa, tem levado a um abandono geral deste velho materialismo de Demócrito, Epicuro, Lucrécio, Condillac, Holbach, Feuerbach, Büchner; e o Idealismo Materialista tomou o seu lugar, que, ao invés de considerar a força como uma propriedade da matéria, considera-a como manifestação da força. Por isso, a partir desta seção, passaremos ao sistema de forças e de idéias. Há um quarto de século, John Tyndall, em seu discurso de abertura como Presidente da Associação Britânica em Belfast, declarou que, na matéria, dever-se-ia encontrar a promessa e a potência de cada forma de vida. Mas, em I898, Sir William Crookes, em seu discurso como Presidente daquela mesma Associação Britânica, reverteu o apotegma e declarou que, na vida, ele via a promessa e a potência de cada forma da matéria.
Em acréscimo ao erro geral indicado acima objetamos a este sistema do seguinte modo:
Em conhecendo a matéria, a mente se julga necessariamente diferente sm gênero e em nível mais elevado do que a matéria que ela conhece.
1) Expomos aqui simplesmente uma convicção intuitiva. Ao usar seu organismo físico e ao pôr a natureza exterior a seu serviço, a mente reconhece-se diferente da matéria e superior a ela. VerMARTiNEAU, citado na Brit. Quar., April, 1882.173, e no artigo do Presidente Thomas Hill, Bibliotheca Sacra, abril, 1852.353 - "Tudo o que, na verdade, a ação sentido-percepção dá é existência do eu consciente, flutuando no ilimitado espaço e no ilimitado tempo rodeado e apoiado pela ilimitada força. A matéria móvel, que inicialmente pensamos ser a grande realidade, é apenas a sombra do nosso verdadeiro ser, que é imaterial". Harris, Philos. Basis of Theism, 317 - "Imagine um ser infinitesi- mal no cérebro, vigiando a ação das moléculas, mas omitindo o pensamento.
Do mesmo modo a ciência observa o universo, mas omite Deus".
Robert Browning, "o mais sutil afirmador da alma em cântico", faz o Papa, em Anel e o Livro, dizer: "A mente não é matéria, nem provém da matéria, mas do alto". De igual modo o Presidente Francis Wayland: "O que é a mente"? "O que é a matéria"? "Não vai ao caso". Sully, The Human Mind, 2.369 - "A consciência é uma realidade inteiramente distinta dos processos materiais e, por isso, não pode ser resolvida neles. O materialismo faz o que é conhecido imediatamente (nossos estágios mentais) subordinado àquilo que só indiretamente ou por inferência se conhece (coisas exteriores). Contudo, é um absurdo uma entidade material existente per se fora da relação com uma mente pensante". Como os materialistas elaboram a sua teoria, a sua assim chamada matéria torna-se cada vez mais etérea, até, finalmente, chegar a um estágio quando não se pode distinguir daquilo que os outros chamam de espírito. Martineau: "A matéria que eles descrevem é tão excessivamente inteligente, que a tudo supera, mesmo ao escrever Hamlet e ao descobrir a sua própria evolução. Em resumo, mas ao soletrar o seu nome, ela não parece diferir apreciavelmente dos nossos velhos amigos: Mente e Deus". A. W. Momerie, Christianity and Evolution, 54 - "Um ser consciente da sua unidade não pode, possivelmente, ser formado de numerosos átomos inconscientes da sua diversidade. Qualquer pessoa que pensa ser isto possível é capaz de afirmar que meia dúzia de tolos poderiam resultar em um sábio".
Visto que os atributos da mente - a) identidade contínua, b) atividade própria, c) não relacionamento com o espaço - são diferentes em gênero e de nível mais elevado que os atributos da matéria, é racional concluir que a mente é em si mesma diferente da matéria em gênero e mais elevada em nível que esta.
Este é um argumento a partir das qualidades específicas que é subjacente às qualidades e as explica, a) A memória prova a identidade pessoal. Não se trata de uma identidade de átomos materiais, porque os átomos mudam.
As moléculas que vêm não podem lembrar as que partiram. Há alguma parte imutável no cérebro, organizado, ou não? O organizado desaparece; o desorganizado = a alma. b) A inércia mostra que a alma move-se a si mesma. Duas porções são necessárias, e estas, para a ação útil, requerem o ajuste através de uma força que não pertence à matéria. Evolução do universo é inexplicável a não ser que a matéria seja movida primeiro por alguma força exterior a si mesma, c) As mais elevadas atividades da mente independem das condições físicas. A mente controla e domina o corpo. Ela não pára de desenvolver-se mesmo quando o corpo pára de crescer. Quando o corpo se aproxima da dissolução, a mente, com freqüência, afirma-se mais notadamente.
Kant: "A unidade da apreensão é possível por causa da unidade transcendental da autoconsciência". Obtenho a minha idéia de unidade a partir do eu indivisível. Stout, Manual of Psichology, 53 - "Até onde a matéria existe, independentemente da presença de um sujeito cognitivo, não pode ter propriedades materiais, tais como extensão, dureza, cor, peso etc. ... O mundo dos fenômenos materiais pressupõe um sistema de atuação imaterial. Neste se origina a consciência individual. Alguns dizem que este agente é o pensamento, outros, que é a vontade". A. J. Dubois, in Century Magazine, dez. 1894.228 - Visto que cada pensamento envolve um movimento molecular no cérebro e este movimenta o universo inteiro, a mente é o segredo do universo e não devemos interpretar a natureza como a expressão de um propósito subjacente. A ciência é a mente que segue os traços desta. Não pode haver mente sem uma antecedente. O fato de que todos os seres humanos têm os mesmos modos mentais mostra que estes não se devem somente ao meio ambiente. Bowne: "As coisas agem sobre a mente e esta reage com o conhecimento. O conhecimento não é uma aquisição passiva, mas uma construção ativa". Wundt: "Somos compelidos a admitir que o desenvolvimento físico não é a causa, porém é muito mais; é o efeito do desenvolvimento psíquico".
Paul Carus, Soul of Man, 52-64, define a alma como "a forma de um organismo", e a memória como "o aspecto psíquico da preservação da forma na substância viva". Isto parece dar prioridade ao organismo ao invés de dá-la à alma, sem considerar o fato de que sem a alma não se concebe o organismo.
A argila não pode ser o ancestral do oleiro, nem a pedra o ancestral do pedreiro, nem a madeira, do carpinteiro. W. N. Clarke, Christian Theology, 99
"A inteligibilidade do universo para nós é forte e evidência sempre presente de que há uma Mente racional que invade todas as coisas e, a partir dela, o universo recebe a sua caraterística". À máxima "cogito, ergo sum" devemos acrescentar a outra: "Intelligo, ergo Deus est". Pfleiderer, Philos. Relig., 1.273
"Toda a filosofia idealística dos tempos modernos é, de fato, a elaboração e o embasamento da convicção de que o Espírito ordena a Natureza como um meio subserviente visando aos seus fins eternos; por isso não é, como pensava o naturalismo pagão, um e todos, a última e mais elevada das coisas, mas tem sobre si o Espírito e os fins morais, como seu Senhor e Mestre".
A percepção pela qual as coisas são conhecidas precede-as na ordem lógica e, por isso, não pode ser explicada através delas ou derivar delas.
Por isso, não a matéria, mas a mente deve ser considerada como a entidade original e independente a menos que se possa cientificamente demonstrar esta é material na sua origem e natureza. Mas são reconhecidamente falhas
todas tentativas de explicar o psíquico a partir do físico, o orgânico a partir do inorgânico. Quando muito, o que se pode reivindicar é que as mudanças psíquicas são sempre acompanhadas de mudanças físicas e que o inorgânico é o esteio do orgânico. Apesar de que se desconhece a exata conexão entre a mente e o corpo, o fato de que a continuidade das mudanças físicas é insolúvel quando da atividade psíquica toma certo que a mente não é uma transformação da força física. Se os fatos da sensação indicam a dependência da mente em relação ao corpo, os fatos da volição igualmente indicam a dependência do corpo em relação à mente.
O químico pode produzir substâncias orgânicas, mas não organizadas.
A vida não pode ser produzida a partir da matéria. Mesmo nas coisas vivas só o plano pode garantir o progresso. A multiplicação da vantagem desejada no esquema darwiniano requer um pensamento selecionado; a saber, afinal de contas, a seleção natural é artificial. John Fiske, Destinyofthe Creature, 109 —
"A fisiologia do cérebro diz-nos que, durante a vida presente, apesar de que o pensamento e o sentimento sempre se manifestam em conexão com uma forma peculiar da matéria, ainda não pode haver nenhuma possibilidade do pensamento e o sentimento serem produtos da matéria. Nada pode ser mais grosseiramente anticientífico do que a famosa nota de Cabanis, de que o cérebro segrega o pensamento como o fígado segrega a bílis. Nem mesmo se deve dizer que se processa no cérebro. O que se processa no cérebro é uma série admiravelmente complexa de movimentos moleculares com os quais o pensamento e o sentimento são de alguma desconhecida forma correlatos, não como efeitos ou como causas, mas como concomitantes".
A "harmonia preestabelecida" de Leibnitz indica a dificuldade de definir a relação entre a mente e a matéria. Elas são como dois relógios inteiramente desconexos, um dos quais tem o mostrador e indica a hora através dos ponteiros, enquanto o outro simultaneamente indica a mesma hora por seu aparelho de bater as horas. Para Leibnitz o mundo é um agregado de almas atômicas que conduz almas absolutamente separadas. Não há nenhuma ação real de um sobre o outro. Tudo na mônada é o desenvolvimento de sua atividade não estimulada. Contudo, há uma harmonia entre todos eles ordenada desde o começo pelo Criador. O desenvolvimento interno de cada mônada ajusta-se de tal modo a todas as outras que produz a falsa impressão de que elas são mutuamente influenciadas entre si. A teoria de Leibnitz envolve a completa rejeição da liberdade da vontade humana no sentido libertário. Para escapar desta arbitrária conexão da mente e da matéria na harmonia preestabelecida de Leibnitz, Spinoza rejeita a doutrina cartesiana das duas substâncias criadas por Deus e sustenta que há apenas uma substância, a saber, o próprio Deus.
Há um fluxo aumentado de sangue para a cabeça nos tempos de atividade mental. Às vezes, no calor intenso da composição literária, o sangue brota com fartura através do cérebro. Nenhuma diminuição da atividade física acompanha os maiores esforços da mente, mas um maior aumento dela. "A consciência causa mudanças físicas, porém a recíproca não é verdadeira. Dizer
que a mente é uma função do movimento é dizer que a mente é uma função de si mesma, porque o movimento só existe em função da mente. É melhor supor que os elementos físicos e psíquicos são apenas um, do mesmo modo que o som do violino é a mesma coisa que a vibração. A volição é uma causa na natureza porque tem atuação cerebral do seu lado anverso e inseparável. Mas, se não há movimento sem a mente, então não pode haver universo sem Deus".... 34 - Porque dentro dos limites da experiência humana só se conhece a mente associada com o cérebro, não se segue que a mente não pode existir sem ele. A explicação de Helmholtz sobre o efeito de uma das sonatas de Beethoven no cérebro pode ser perfeitamente corrigida, mas a explicação do efeito causado por um músico pode igualmente ser corrigida dentro da sua categoria".
Herbert Spencer, Principies of Psichology, 1. par. 56 - "Duas coisas coexistem: a mente e a ação nervosa; mas não podemos imaginar de que forma elas se relacionam". Tyndall, Fragments of Science, 120 - "É impossível pensar na passagem da física do cérebro para os fatos". Schurman, Agnosticism and Religion, 95 - "Facilmente se crê que a metamorfose das vibrações para as idéias conscientes é um milagre em comparação com a flutuação do ferro (2 Re. 6.6), ou a transformação da água em vinho". Bain, Mind and Body, 131
Não há rompimento na continuidade física.
Negando a prioridade do espírito, a teoria materialista não pode fornecer nenhuma causa suficiente das mais elevadas caraterísticas do universo existente, a saber, sua inteligência pessoal, suas idéias intuitivas, sua livre vontade, seu progresso moral, sua crença em Deus e na imortalidade.
Herbert, Modern Realism Examined: "O materialismo não tem nenhuma evidência física da existência da consciência nos outros. Como ele declara que os nossos semelhantes são destituídos de livre vontade, deve declarar também que o são de consciência; deve chamá-los, do mesmo modo que os brutos, de puros autômatos. Se o elemento físico é tudo, nem Deus, nem o homem existem". Alguns dos mais antigos seguidores de Descartes costumavam chutar os seus cães e bater neles, rindo enquanto eles ganiam, chamando-os de "máquinas de chiar". Huxley, que chama os brutos de "autômatos conscientes", crê no gradual banimento daquilo que chamamos espírito e espontaneidade de todas as regiões do pensamento humano; trata-se apenas de um efeito sem causa".
Clerk Maxwell, Life, 428 - "Tenho olhado para a maior parte dos sistemas filosóficos e nada vi que opere sem um Deus". Presidente E. B. Andrews:
"A mente é a única coisa substantiva neste universo; tudo o mais é adjetivo.
A matéria não é primordial, mas é uma função do espírito". Theodore Parker:
"O homem é o mais elevado produto da sua própria história. O descobridor não encontra nada de tamanha estatura e grandeza como ele mesmo; nada tão valioso como ele. A maior estrela acha-se no pequeno terminal do telescópio - ela olha, e não indaga, e nem vê".
O materialismo faz do homem "uma comitiva sério-cômica de figuras de cera ou de graciosos elencos de barro" (Bowne). O homem é "o mais gracioso
dos relógios". Mas se não existisse nada a não ser a matéria, não poderia haver materialismo porque um sistema de pensamento como este implica consciência. Martineau, Types, prefaces, xii, xiii - "É a irresistível alegação da consciência moral que primeiro me induziu a rebelar-me contra os limites da concepção simplesmente científica. Tornou-se incrível para mim que nada era possível a não ser o real". Dewey, Psichology, 84 - "Sem elementos ideais o mundo seria o lar formado de quatro paredes e um teto para proteger do frio e da chuva; a mesa, uma refeição para animais; e o túmulo, um buraco na terra". Omar Khayyám, Rubaiat, estrofe 72 - "E aquela tigela invertida chamam de Céu, sob o qual, engaiolados vivemos e morremos, levantamos as mãos pedindo-lhe auxílio - porque a impotência nos impele tanto a você como a mim". Vítor Hugo: "Você diz que a alma nada é a não ser o resultado das forças corpóreas? Por que, então, a minha alma se mostra mais luminosa quando as minhas forças corporais começam a fracassar? O inverno cobre a minha cabeça, e a eterna primavera domina o meu coração. ... Quanto mais me aproximo do fim, mais claramente ouço as imortais sinfonias dos mundos, que me convidam".
Diman, Theistic Argument, 348 - "O materialismo nunca pode explicar o fato de que a matéria sempre está combinada com a força. Princípios coordenados? então se trata de dualismo ao invés de monismo. Força causa da matéria? então preservamos a unidade, mas destruímos o materialismo; porque ligamos a matéria a uma fonte imaterial. Atrás da multiplicidade das forças naturais devemos postular alguma força simples - que nada pode a não ser a mente coordenadora". Mark Hopkins resume o materialismo na Princen- ton Rev., nov. 1879.490, da seguinte maneira: "1. O homem, que é uma pessoa, é feito por uma coisa, isto é, matéria. 2. A matéria deve ser adorada como criadora do homem, se ela deve ser alguma coisa (Rm. 1.25). 3. O homem deve adorar a si mesmo - o seu Deus é o ventre".
IDEALISMO MATERIALISTA
O idealismo propriamente dito é o método de pensamento que considera todo o conhecimento como versado só com os sentimentos da mente perceptiva.
Seu elemento de verdade consiste no fato de que tais sentimentos da mente perceptiva são condições do nosso conhecimento. Seu erro está em negar que através destes e nestes conhecemos aquilo que existe independentemente da nossa consciência.
O idealismo dos nossos dias é principalmente materialista. Define a matéria e a mente de igual modo em termos de sensação e considera ambos como lados opostos ou manifestações sucessivas de uma força subjacente e desconhecida.
O moderno idealismo subjetivo é o desenvolvimento de um princípio fundado desde Locke. Ele deriva todo o nosso conhecimento da sensação; a mente apenas combina as idéias que a sensação fornece, mas não dá matéria
alguma propriamente sua. Berkeley sustenta que exteriormente podemos estar certos somente das sensações; não se pode estar certo de qualquer mundo exterior sem a mente. O idealismo de Berkeley, contudo, é objetivo; porque ele sustenta que, conquanto as coisas não existem independentes da consciência, elas independem da nossa consciência, a saber, na mente de Deus, que na filosofia correta toma o lugar de um mundo exterior que não tem a mente como a causa das nossas idéias. De igual modo, Kant defende existências fora das nossas mentes embora as considere como desconhecidas e desconhecíveis. Em oposição a estas formas de idealismo objetivo devemos colocar o subjetivo de Hume, que sustenta que internamente também não podemos estar certos de qualquer coisa que não sejam os fenômenos mentais; conhecemos pensamentos, sentimentos e vontade, mas não conhecemos a substância mental dentro deles, mais do que a substância material de fora; nossas idéias são uma fieira de contas sem qualquer fieira; não necessitamos de causa alguma para estas idéias, no mundo exterior, na alma, ou em Deus. Mill, Spencer, Bain e Tyndall são humistas (seguidores de) e é ao idealismo subjetivo deles que nos opomos.
Todos eles consideram o átomo material como um simples centro de força, ou uma causa hipotética das sensações. Por isso a matéria é uma manifestação da força como para o velho materialismo a força era uma propriedade da matéria. Mas se matéria, mente e Deus são apenas sensações, então o corpo não é nada mais que sensações. Não há nenhum corpo com a finalidade de ter sensações e nenhum espírito, a não ser o humano e o divino, que as produzam. John Stuart Mill, Examination of Sir William Hamilton, 1.234-253, faz das sensações as únicas fontes originais do conhecimento. Ele define a matéria como "uma possibilidade permanente da sensação", e a mente como "uma série de sentimentos despertos para ela mesma". Deste modo, Huxley chama a matéria "tão somente um nome da causa desconhecida dos estados da consciência"; apesar disso, ele também declara: "Se sou compelido a escolher entre o materialismo de um homem como Büchner e o materialismo de Berkeley, optarei por Berkeley". Ele defende a prioridade da matéria e ainda considera-a totalmente ideal. Visto que John Stuart Mill, de todos os materialistas idealistas, dá as mais precisas definições da matéria e da mente, tentaremos mostrar a inadequação deste modo de tratar o assunto.
Porter sustenta que a percepção original dá-nos somente os sentimentos do nosso próprio aparelho sensorial do corpo; como causa deles adquirimos o conhecimento da extensa exterioridade. Sir William Hamilton: "A sensação própria não tem nenhum objetivo a não ser um sujeito-objeto". Mas Porter e Hamilton sustentam que, através destas sensações conhecemos aquilo que existe independentemente das nossas sensações. O realismo natural de Hamilton, contudo, é um exagero da verdade. Bowne, Introd. To Psych. Theory, 257, 258 - "No desejo de Sir William Hamilton de não ter nenhum intermédio na percepção, ele se sente forçado a sustentar que cada sensação é sentida onde parece estar e por isso a mente ocupa o corpo inteiro. Do mesmo modo ele foi obrigado a afirmar que o objeto da visão não é a coisa em si, mas os raios de luz e, mesmo que o próprio objeto tivesse ao menos trazido à consciência. Assim ele chegou ao absurdo de que o verdadeiro objetivo da percepção é algo de que somos totalmente inconscientes". Seguramente não podemos estar imediatamente conscientes do que está fora do nosso conhecimento. James, Psychology, 1.11 - "Os órgãos terminais são telefones, e as células cerebrais são os receptores que a mente ouve".
Existe, contudo, um idealismo que não está aberto às objeções de Hamilton, às quais os filósofos modernos, em sua maioria, aderiram. É o idealismo objetivo de Lotze. Ele argumenta que nada conhecemos sobre a extensão do mundo a não ser através do ar ou do éter, e o interpretamos como som, luz, movimento, conforme eles afetam nossos nervos auditivos, ópticos, ou táteis. Mas a única força que conhecemos imediatamente é a da nossa vontade; afinal de contas não podemos entender a matéria, ou devemos entendê-la como o produto de uma vontade comparável à nossa. As coisas são apenas "leis concretas de ação", ou idéias divinas a que a vontade divina deu a realidade permanente. Já vimos na seção anterior que os átomos não podem explicar o universo; eles pressupõem tanto as idéias como a força. Agora podemos ver que tal força pressupõe a vontade e tais idéias pressupõem a mente. Mas como se pode ainda reivindicar que esta mente não é autocons- ciente e que esta vontade não é pessoal, passaremos na seção seguinte a considerar o Panteísmo Idealista de que tais reivindicações são caraterísti- cas. O Idealismo Materialista, na verdade é apenas a residência em meio ao caminho entre o Materialismo e o Panteísmo em que a lógica da inteligência não encontra nenhum abrigo permanente.
Lotze, Outlines of Metaphysics, 152 - "Pelo exposto, a objetividade do nosso conhecimento consiste em que não é despropositado tratá-lo como simples aparência; mas põe diante de nós um mundo cuja coerência se ordena na busca da injunção da Realidade única do mundo, a profundidade do entendimento, o Bem. Por isso, o nosso conhecimento possui mais verdade do que se copiasse exatamente um mundo que não tem valor em si mesmo. Embora não compreenda tudo o que é fenômeno que se apresenta à vista, ainda entende qual é o seu sentido total; é como o espectador que compreende a significação estética daquilo que ocorre no palco de um teatro e não obteria nada de essencial se ele fosse ver ao lado o mecanismo pelo qual alteram-se os efeitos no referido palco". Prof. C. A. Strong: "A percepção é uma sombra lançada sobre a mente por uma coisa em si mesma". A sombra é o símbolo da coisa; e, como as sombras não têm alma nem vida, pode parecer que os objetos físicos também não têm alma e são mortos, conquanto a realidade simbolizada nunca é a da presença de uma alma e de uma vida. A consciência é uma realidade. A única existência que podemos conceber é de natureza mental. Toda a existência em favor da consciência é, na verdade, da consciência. A sombra do cavalo o acompanha, mas não o ajuda a puxar a carroça. O evento cerebral é apenas o estado mental em si mesmo considerado a partir do ponto de vista da percepção".
Aristóteles: "A natureza da substância antecede ao relacionamento" = não pode haver relacionamento sem coisas que se relacionem. Fichte: O conhecimento, exatamente porque é conhecimento, não é realidade; não vem em primeiro lugar, mas em segundo". Veitch, Knowing and Being, 216, 217, 292, 293 - "O pensamento nada pode fazer, senão como um sinônimo do Pensador. Nem o consciente finito, nem o infinito, sozinhos ou juntos, podem constituir um objeto exterior ou explicar a sua existência. Esta logicamente precede
a sua percepção. Percepção não é criação. Não é o pensar que faz o ego, mas o ego que faz o pensar". Seth, Hegelianism and Personality. "Os pensamentos divinos pressupõem um Ser divino. Os pensamentos de Deus não constituem o mundo real. A força real não se encontra neles; ela está no Ser divino, como vontade viva e ativa". Eis aqui o erro fundamental de Hegel, que considera o universo simplesmente como uma Idéia e tributa pouco pensamento ao Amor e à Vontade que o constituem.
A este ponto de vista podemos apresentar as seguintes objeções:
Sua definição de matéria como uma "permanente possibilidade de sensação" contradiz nosso juízo intuitivo de que, conhecendo os fenômenos da matéria, temos o conhecimento direto da substância como fenômenos subjacentes, distintos das nossas sensações, e exteriores à mente que as experimenta.
Bowne, Metaphysics, 432 - "Provavelmente pode-se desconhecer a possibilidade de um odor ou gosto ser a causa da cor amarelada de uma laranja, a não ser para a mente que entende que dois mais dois são cinco". Martineau, Study, 1.102-112 - "Se as impressões exteriores são telegrafadas para o cérebro, a inteligência deve receber a mensagem no começo assim como liberá-la no fim. ... É o objeto exterior que dá a possibilidade, não a possibilidade que dá o objeto exterior. A mente não pode ser tanto a sua própria cognita como a sua cognitio. Não se pode dispensar uma base de apoio para os pés, ou a atmosfera para as asas". Professor Charles A. Strong: "Kant sustenta que as coisas em si mesmas têm como retaguarda os fenômenos físicos bem como as coisas em si têm como retaguarda os fenômenos mentais; o seu pensamento é que as coisas em que formam a retaguarda da força física são idênticas às coisas em si como retaguarda dos fenômenos mentais. E visto que os fenômenos mentais, nesta teoria, não são espécimes da realidade e a realidade manifesta-se indiferentemente através delas e dos fenômenos físicos, naturalmente ele conclui que nós não temos base para supor que a realidade seja semelhante ou, que devemos concebê-la com 'weder Materie noch ein denkend Wesen', 'nem matéria nem ser pensante', uma teoria do desconhecível. Seria o caso também do Impensável e do Indi- zível!" Ralph Waldo Emerson era um idealista subjetivo; mas, quando chamado a inspecionar uma carga de madeira de um fazendeiro, disse aos seus companheiros: "Desculpem-me por um momento, meus amigos; temos que dar atenção a estes assuntos, como se fossem reais".
Sua definição de mente como "uma série de sentimentos conscientes dela mesma" contradiz nosso juízo intuitivo de que, conhecendo os fenômenos da mente, temos conhecimento direto de uma substância espiritual de que tais fenômenos são manifestações, que retém sua identidade independentemente de nossa consciência e que, neste conhecer, ao invés de ser o recipiente passivo das impressões vindas de fora sempre age a partir de dentro através de uma força que lhe é própria.
James, Psichology, 1.226 - "É como se o fato psíquico elementar não fosse pensamento, ou este pensamento, ou aquele pensamento, mas o meu pensamento e todo ele possuído. O fato consciente universal não é o de que 'os pensamentos e sentimentos existem', mas o de que 'eu penso', e 'eu sinto'".
O Professor James é compelido a dizer isto apesar de que ele começa a sua obra Psicologia sem insistir na existência de uma alma. Hamilton, Reid, 443 - "Acaso suporei que o pensamento subsiste por si mesmo? ou que as idéias podem sentir prazer ou dor"? R. T. Smith, Man's Knowledge, 44 - "Dizemos 'minhas noções e minhas paixões' e, quando empregamos tais expressões, implicamos que o nosso eu central se sente algo diferente das noções ou paixões que lhe pertencem, ou caraterizam-no durante um certo tempo". Lichtenberg: "Deveríamos dizer: 'Pensa-se'; do mesmo modo que dizemos: 'Brilha', ou 'Chove". Então as faculdades são uma arma sem um general, ou uma locomotiva sem um maquinista? Neste caso não deveríamos ter, sensações; mas ser sensações.
Professor C. A. Strong: "Tenho conhecimento de outras mentes. Este conhecimento não empírico - que transcende as coisas em si não derivam da experiência nem do raciocínio e, ao admitir que semelhantes conseqüências (movimentos inteligentes) devem ter semelhantes antecedentes (pensamentos e sentimentos) e, ao admitir também instintivamente que existe algo fora da minha mente - isto refuta o fenomenalismo pós-kantiano. Percepção e memória também envolvem transcendência. Em ambas eu transcendo os limites da experiência de modo tão verdadeiro como no meu conhecimento de outras mentes. Na memória eu reconheço um passado, distinto do presente. Na percepção eu conheço uma possibilidade de outras experiências semelhantes ao presente e isto só dá um senso de permanência e realidade.
A percepção e a memória refutam o fenomenalismo. Convém admitir as coisas em si a fim de preencher as lacunas entre as mentes individuais e dar coerência e inteligibilidade ao universo e desta forma evitar o pluralismo. Se a matéria pode influenciar e mesmo extinguir as nossas mentes, ela deve ter alguma força de si mesma, alguma existência de si mesma. Se a consciência é um produto evolutivo, deve ter surgido de fatos mentais mais simples. Porém tais fatos mentais são apenas outro nome para as coisas em si mesmas. Um profundo instinto pré-racional compele-nos a reconhecê-los porque não se pode demonstrá-los logicamente. Devemos admiti-los para dar continuidade e inteligibilidade às nossas concepções do universo".
Até onde esta teoria considera a mente como o anverso da matéria ou como um mais tardio e mais elevado desenvolvimento da matéria, mera referência tanto da mente como da matéria a uma força subjacente não poupa a teoria de quaisquer dificuldades do já mencionado materialismo puro; porque, neste caso, também a força é considerada como puramente física e se nega a prioridade do espírito.
Herbert Spencer, Psychology, citado por Fiske, Cosmic Philosophy, 2.80 - "A mente e a ação nervosa são faces subjetivas e objetivas da mesma coisa.
Contudo ainda continuamos totalmente incapazes de ver, ou mesmo de imaginar, como ambas se relacionam. A mente ainda continua a ser para nós algo como o reinado de outras coisas". Owen, Anatomy of Vertebrates, citado pov Talbot, Bap. Quar., Jan. 187A.5 - "Tudo que eu sei sobre a matéria e a mente em si é que aquela é um centro exterior da força e esta um centro interior". New Englander, set. 1883.636 - "Se o átomo for simplesmente um centro da força e não uma coisa real em si, então ele é uma essência supersensívei, um ser imaterial. Fazer de algo imaterial a fonte da mente consciente é fazer algo tão maravilhoso como uma alma imortal ou um Criador pessoal". Martineau, Study, 102-130, e Relig. and Mod. Materialism, 25- "Se se toma a mente para construir o universo, como pode a negação da mente constituí-lo"?
David Hill, Genetic Philosophy, 200,201, parece negar que o pensamento precede a força ou que a força precede o pensamento: "Objetos, ou coisas do mundo exterior, podem ser os elementos do processo do pensamento em um assunto cósmico sem que eles mesmos estejam conscientes. ... Uma verdadeira análise e uma gênese racional requerem o igual reconhecimento dos elementos da experiência tanto objetiva quanto subjetiva sem prioridade de tempo, separação no espaço ou ruptura do ser. Até onde as nossas mentes podem penetrar a realidade, descoberta nas atividades do pensamento, em qualquer lugar enfrentamos uma Razão Dinâmica". No relato do Dr. Hill sobre a gênese do universo, contudo, vem em primeiro lugar o inconsciente e dele parece derivar o consciente. A consciência do objeto é apenas o anverso do objeto da consciência. Isto é, segundo assinala Martineau, Study, 1.341, fazer o mar embarcar no navio". Preferimos grandemente o ponto de vista de Lotze, 2.641 - "As coisas são atos do Infinito operadas só dentro das mentes ou estados que o Infinito não experimenta em parte alguma a não ser nas mentes. ... As coisas e os eventos são a soma das ações que o mais elevado Princípio apresenta em todos espíritos de modo tão uniforme e coerente que, para tais espíritos pode parecer um mundo de coisas substanciais e eficientes que existem no espaço fora delas". Os dados dos quais extraímos nossas inferências quanto à natureza do mundo exterior mental e espiritual é mais racional atribuir ao mundo uma realidade espiritual do que aquela de que a nossa experiência não tem nenhum conhecimento.
Até onde esta teoria sustenta a força subjacente de que a matéria e a mente são manifestações em qualquer sentido inteligentes e voluntárias, toma necessária a suposição de que há um Ser inteligente e voluntário que exerce tal força. As sensações e as idéias, contudo, só são explicáveis como manifestações da Mente.
Muitos recentes pensadores cristãos como Murphy, Scientific Bases of Faith, 13-15, 29-36, 42-52, definiriam a mente como uma função da matéria, a matéria como função da força, a força como função da vontade e, conseqüentemente, o poder de um Deus onipresente e pessoal. Toda força, exceto a da vontade livre do homem, é a vontade de Deus. Escritores como Herschel,
Lectures, 460; Argyll, fíeign of Law, 121-127; Wallace, on Nat. Selection, 363-371; Martineau, Essays, 1.63, 121, 145, 265; Bowen, Metaph. and Ethics, 146-162, são levados à sua conclusão em grande parte pelas considerações 3e que nenhuma coisa morta pode ser uma causa própria; essa vontade é a única causa de que temos conhecimento imediato; que as forças da natureza são inteligíveis só quando consideradas como esforços da vontade. Por isso a matéria é o centro da força - a expressão da mente e da vontade de Deus regular e, como se fosse, automática. As causas secundárias na natureza são apenas atividades secundárias da grande Primeira Causa.
Bowne sustenta também este ponto de vista em sua Metaphysics. Ele considera como real apenas a pessoalidade. A matéria é fenomenal, embora seja uma atividade da vontade divina fora de nós. Por isso, o fenomenalismo de Bowne é um idealismo objetivo, altamente preferível ao de Berkeley, que, na verdade, defende a energia de Deus, mas só dentro da alma. Este idealismo de Bowne não é panteísmo, pois sustenta que, conquanto não haja causas secundárias na natureza, o homem é uma segunda causa com uma pessoa- lidade distinta da de Deus e elevada acima da natureza pelas forças da vontade livre. Contudo, Royce, Religious Aspect of Philosophy, and The World and the Individual, faz a consciência do homem uma parte ou aspecto de uma consciência universal e, assim, em vez de fazer Deus vir à consciência no homem, faz o homem vir à consciência em Deus. Enquanto em um ponto de vista este esquema parece poupar a pessoalidade de Deus, pode-se duvidar que garanta igualmente a pessoalidade do homem ou abra espaço para a liberdade, a responsabilidade, o pecado e a culpa do homem. Bowne, Philos. Theism, 175 - "A 'razão universal' é um termo de classe que não denota nenhuma existência possível e que tem realidade só na existência possível de que se abstrai". Bowne reivindica que o finito impessoal só tem procedimento de um outro quando um pensamento ou ato o tem para com o seu sujeito. Não há nenhuma existência substancial a não ser em pessoas. Seth, Hegelianismo e Pessoalidade: "O neokantismo erige a Deus a simples forma da consciência própria em geral, isto é, confunde consciência überhaupt (genérica) com uma consciência universa!'.
Bowne, Theory of Thought and Knowledge, 318-348 - "Há na existência algo que não seja eu mesmo? Sim. Para escapar ao solipsismo devo admitir ao menos outras pessoas. Existe o mundo de objetos que só aparecem para mim? Não; ele existe também para os outros, de modo que vivemos num mundo comum. E este mundo comum consiste em algo mais do que uma semelhança de impressões nas mentes infinitas, de modo que além dele não há nada? Este ponto de vista não pode ser desaprovado, mas concorda tão mal com a nossa experiência total que é praticamente impossível. Então, o mundo das coisas é uma existência contínua de algum tipo finito independente do pensamento e da consciência? Este ponto de vista não pode ser demonstrado, mas é o único que não envolve dificuldades insuperáveis. O que é a natureza e onde fica o lugar desta existência cósmica? Eis a questão entre o Realismo e o Idealismo. O Realismo vê as coisas existirem num espaço real e como verdadeiras entidades ontológicas. O Idealismo tanto as vê como o espaço em que elas estão existindo só, como para uma Inteligência cósmica e independente de serem elas absurdas e còrrtráditórias. As coisas inde-
pendem do nosso conhecimento total, de uma grosseira materialidade que é a antítese e negação da consciência".
PANTEÍSMO IDEALISTA
Panteísmo é o método de pensamento que concebe o universo como o desenvolvimento de uma substância inteligente e voluntária, embora impessoal, que atinge a consciência só no homem. Portanto, identifica Deus, não com cada objeto individualmente no universo, mas com a totalidade das coisas. O Panteísmo corrente nos nossos dias é idealista.
Os elementos de verdade no Panteísmo são a inteligência e a voluntarieda- de de Deus e sua imanência no universo; seu erro está em negar a pessoalidade e transcendência de Deus.
O panteísmo nega a existência real do finito ao mesmo tempo que priva o infinito da sua consciência própria e liberdade. Hutton, Popular Pantheism, in Essays, 1.56-76 - "O 'creio em Deus' do panteísta é uma contradição. Ele diz:
'Eu percebo o exterior diferente de mim mesmo; porém, ao refletir mais tarde, percebo que tal exterioridade era em si mesmo um agente percebedor'. Assim, o objeto de adoração afinal de contas é o próprio adorador". Harris, Philosophical Basis of Theism, 173 - "O homem é uma garrafa nas águas do oceano, por pouco tempo distinguível por sua limitação dentro da garrafa, mas perdida outra vez no oceano tão logo estes frágeis limites se quebrem". Martineau, Types, 1.23 - A simples imanência exclui o Teísmo; a transcendência conserva-o ainda possível; 211-225 - O panteísmo declara que "não existe nada a não ser Deus; ele não é apenas causa, mas efeito total; ele é tudo em todos". Espinosa tem sido chamado falsamente "o homem intoxicado de Deus". "Ao contrário, Spinoza trouxe Deus para o universo; foi Malebran- che que o transfigurou em Deus".
O bramanismo tardio é panteísta. Rowland Williams, Christianity and Hinduism, citado em Mosley, Miracles, 284 - "No estado finai a pessoalidade desvanece. Você não aceita, diz o brâmane, o termo 'vazio' como descrição adequada da natureza misteriosa da alma, mas você a apreenderá claramente no estado fina! para tornar-se um pensamento, conhecimento, regozijo invisível e intocável - o que vem a ser o próprio Deus". Flint, Theism, 69 - "Onde se deseja o fim da existência, como entre os hindus, há marcante incapacidade de pensar em Deus como causa ou vontade e constante tendência inveterada para o panteísmo".
Hegel nega a transcendência de Deus: "Deus não é um espírito além das estrelas; ele é um espírito em todo espírito"; o que significa que Deus, o impessoal e inconsciente Absoluto, vem apenas à consciência do homem.
Se o sistema eterno dos pensamentos abstratos fossem por si mesmos conscientes, o consciente finito desapareceria; daí a alternativa: ou \não Deus,/Ou não homem. Stirling: "A Idéia, desta forma concebida, é um Ídoto-Gegofsurdo, invisível e a teoria é a mais desesperançada jamais apresentada à huma-
nidade". Trata-se de uma autolatria prática, ou autodeificação. O mundo reduz-se a um mero processo de lógica; o pensamento pensa; há pensamento sem pensador. A esta doutrina de Hegel podemos opor as seguintes notas de Lotze: "Não podemos fazer a mente o equivalente ao infinitivo pensar, sentimos para que isto possa ser aquilo que pensa; a essência das coisas não pode ser ou a existência ou a atividade; ela deve ser aquilo que existe e aquilo que age. Pensar não significa nada se deixarmos de fora o conceito de um sujeito distinto daquelas e de que eles procedem". Para Hegel, o Ser é o Pensamento; para Spinosa o ser tem Pensamento + Extensão; parece que a verdade é que o ser tem Pensamento + Vontade e pode revelar-se na extensão e na evolução (Criação).
Contudo, para outros filósofos, Hegel se interpreta de outra forma. O Prof.
Jones, Mind, Jul., 1893, 289-306, reivindica que a Idéia fundamental de Hegel não é o Pensamento, mas o ato de Pensar: Para ele o universo não é um sistema de pensamentos, mas uma realidade pensante manifesta mais completamente no homem. ... A realidade fundamental é a inteligência universal cuja operação devemos procurar detectar em todas as coisas. No fundo toda realidade é explicável como Espírito, ou Inteligência, pelo que a nossa ontologia deve ser uma Lógica e as leis das coisas devem ser as do ato de pensar". De igual modo, Sterrett, Studies in Hegefs Philosophy of Religion, 17, cita a Lógica de Hegel, tradução para o inglês de Wallace, 89,91,236: "A Substância de Spinoza é, como se fosse, um escuro abismo sem forma, que devora todo conteúdo definido como totalmente nulo e, a partir dele, nada produz que tenha subsistência positiva em si. ... Deus é Substância; contudo, não é menos que Pessoa Absoluta". Isto é essencial para a religião; entretanto, diz Hegel, Spinoza nunca o percebeu: "Tudo depende da percepção da Verdade Absoluta, não simplesmente como Substância, mas como Sujeito". Deus é um Espírito autoconsciente e autodeterminante. Fica excluída a necessidade. O homem é livre e imortal. Os homens não são componentes mecânicos de Deus, nem perdem a sua identidade, apesar de que verdadeiramente se acham nele. Com esta avaliação do sistema de Hegel concordam substancialmente Caird, Erdmann e Mulford. Este é o "Mais Elevado Panteísmo" de Tennyson.
Seth, Ethical Principies, 440 - "Hegel concebe a superioridade do seu sistema ao spinozismo consistente na substituição do Sujeito pela Substância. O verdadeiro Absoluto deve conter relações ao invés de aboli-las; o verdadeiro monismo deve incluir o pluralismo e não excluí-lo. Aquele que, como a Substância de Spinoza, ou o Absoluto hegeliano, não é capaz de pensar nos muitos, não pode ser o verdadeiro Uno - a unidade da multiplicidade. ... Visto que o mal existe, Schopenhauer substitui o Panlogismo de Hegel, que afirma a identidade do racional e do real, um impulso cego da vida, para a Razão absoluta ele substitui uma Vontade irracional" - sistema de pessimismo prático. Alexander, Theories of Will, 5 - "Spinoza não reconhece distinção entre a vontade e a afirmação ou negação-intelectual". Hegel chama a Identidade ou o Absoluto de Schelling "a noite infinita em que todas as vacas são pretas" - uma alusão ao Fausto de Goethe, parte 2, ato 1, onde se acrescentam as palavras: "e os gatos são pardos". Embora a preferência de Hegel pelo termo Sujeito, em lugar de Substância, tenha levado muitos a sustentar que
ele cria em uma pessoalidade de Deus distinta da do homem, sua ênfase na Idéia, e seu relativo desprezo aos elementos do Amor e da Vontade, fica ainda a dúvida se a sua Idéia é algo mais que a inteligência inconsciente e impessoal - na verdade menos materialista que a de Spinoza, contudo, abrem-se muitas das mesmas objeções.
Objetamos a este sistema da seguinte maneira:
Sua idéia de Deus contradiz-se a si mesma porque ela o faz infinito, embora consistindo só no finito; absoluto, embora existindo na relação necessária com o universo; supremo, embora contendo em si um processo de auto- evolução e dependência da autoconsciência do homem; sem autodeterminação, contudo, a causa de tudo o que existe.
Saisset, Pantheism, 148 - "Um Deus imperfeito, embora a perfeição surja da imperfeição". Shedd, Historyof Doctrine, 1.13-"O panteísmo aplica a Deus um princípio de desenvolvimento e imperfeição, que só pertence ao finito". Calderwood, Moral Philos., 245 - Seu primeiro requisito é o momento, ou o movimento, que assume mas não explica". Aplica-se aqui o sarcasmo de Caro:
"O vosso Deus ainda não foi feito - ele ainda está em processo de fabricação". VerH. B. Smith, Faith and Philosophy, 25. O panteísmo é um ateísmo prático, pois o espírito impessoal é apenas uma força cega e necessária. Angelus Silesius: "Wir beten 'Es gescheh', mein Herr und Gott, dein Wille'; Und sie', Er hat nicht Will', - Er ist ein ew'ge Stille" - o que Max Müller traduz da seguinte forma: "Rogamos, Senhor, nosso Deus: Faze a tua santa vontade'; e vê! Deus não tem vontade; ele está calmo e tranqüilo". Angelus Silesius consistentemente faz Deus depender da consciência própria no homem:
"Eu sei que Deus não pode viver um instante sem mim; ele deve deixar o espírito se eu deixar de existir". Seth, Hegelianism and Personality. "O hege- lianismo destrói tanto Deus como o homem. Reduz o homem a um objeto do Pensador universal e deixa-o sem qualquer verdadeira pessoalidade". O panteísmo é um jogo de solitário, em que Deus joga em ambos os lados.
A sua suposta unidade substancial não somente carece de prova, mas contradiz diretamente nossos juízos intuitivos.
Martineau, Essays, 1.158 - "Mesmo para imanência deve haver algo em que se pode abrigar e, para a vida, sobre o que se pode apoiar para agir". Muitos deles confundem harmonia entre duas e absorção em uma. "Na Escritura nunca encontramos o universo chamado de to 7câv, porque isto sugere a idéia da unidade contida em si mesma; em lugar disto temos em toda parte -cà itáv-ca". A Bíblia reconhece o elemento de verdade no panteísmo - Deus é 'por todos'; também o elemento de verdade no misticismd - Deus está 'em vós todos'; mas acrescenta o elemento transcendência que ambos deixam de reconhecer - Deus é 'acima de todos' (Ef. 4.6). G. D. B. PEPPÈRi-"Âquele que é sobre todos e em todos é, contudo, distinto de todos. Se alguém é acima de alguma coisa, ele não é aquela mesma coisa sobre a qual ele é. Se alguém está em alguma coisa deve ser distinto dela. E do mesmo modo o universo sobre o qual e no qual Deus está deve-se pensar como alguma coisa distinta de Deus. A criação não pode ser idêntica a Deus ou uma simples forma de Deus". Contudo, acrescentamos que pode ser uma manifestação de Deus de quem depende como os nossos pensamentos e atos são manifestações da nossa mente e vontade e dependem delas embora eles não sejam a nossa mente e a nossa vontade.
Pope escreve: "Todos são apenas partes de um estupendo todo; A eles pertence a natureza corpórea; e Deus é a sua alma". Mas Case, Phisical Realism, 193, replica: "Não é assim. A natureza é para Deus o que as obras são para os homens; e, como as obras dos homens não são o seu corpo, assim também a natureza não é o corpo de Deus". Matthew Arnold, on Heine's Grave: "O que somos nós todos senão um modo, um simples modo da vida Do Ser em quem existimos Que é o único de todas as coisas em um"? Hovey, Studies, 51 - "A Escritura reconhece o elemento de verdade no panteísmo, mas também ensina a existência de um mundo de coisas, animadas e inanimadas, distintas de Deus. Ele representa os homens como propensos a adorar a criatura em lugar do Criador. Descreve-os como pecadores dignos de morte ... agentes morais. ... para ele, os homens são, literalmente, partes de Deus mais do que os filhos partes dos seus pais, como os súditos são parte do seu rei". A. F. J. Behrends: "A verdadeira doutrina está entre dois extremos;
o do dualismo grosseiro, que faz Deus e o mundo duas entidades contidas em si mesmas, e um monismo substancial em que o universo tem apenas uma existência fenomenal. Não se trata de nenhuma entidade da substância, nem de divisão da divina. O universo é eternamente dependente do produto não simplesmente fabricado do Verbo divino. A criação é principalmente um ato espiritual". Prof. Forbes: "A matéria existe numa dependência subordinada a Deus. O corpo de Cristo é o Cristo exteriorizado, manifesto à percepção sensível. Quando apreendo a matéria, estou apreendendo a mente e a vontade de Deus. Este é o mais elevado tipo de realidade. Nem a matéria nem os espíritos finitos são meros fenômenos".
Não atribui nenhuma causa suficiente ao fato do universo que é do nível mais elevado e, portanto, carece da maior explicação, a saber, a existência de inteligências pessoais. Uma substância que em si mesma é inconsciente e está sob a lei da necessidade não pode produzir seres que são autoconscientes e livres.
Gess, Foudations of our Faith, 36 - "O instintô animal e o espírito de uma nação que elabora a sua linguagem, poderiarfi fornecer analogias se, como resultado, produzissem personalidades, mas não o oposto. Tais tendências não se originam por si mesmas; são recebidas dejjjna fonte exterior". Seth, Freedom as na Ethical Postuiate, 47 - "Se o homem é um 'imperium in império', não uma pessoa, mas apenas um aspecto ou expressão quer do universo quer de Deus, então ele não pode ser livre. O homem pode ser desperso- nalizado na natureza ou em Deus. Através da concepção da nossa própria personalidade chegamos à de Deus. Para desenvolver a nossa personalidade na de Deus seria necessário negar a própria grandeza divina, invalidando a concepção através da qual se chegou a ela". Bradley, Appearance and Reality, 551, é ainda mais ambíguo: "A relação positiva de cada aparência para com a Realidade é como um adjetivo; e é como a presença da realidade perante as suas aparências em diferentes graus e com diversificados valores; achamos que esta dupla verdade é o centro da filosofia". Ele protesta tanto contra "uma transcendência vazia" como contra um "raso panteísmo".
A imanência hegeliana e o conhecimento, afirma ele, identificam Deus e o homem. Porém Deus é mais do que o homem ou do que o pensamento deste. Deus é espírito e vida - melhor entendido a partir do eu humano, com seus pensamentos, sentimentos e vontade. É necessário que a transcendência qualifique a imanência. "Deus não é Deus até que se torne tudo em todos e, um Deus que é tudo em todos não é o Deus da religião. Deus é um aspecto, e isto pode apenas significar uma aparência do Absoluto".
Portanto, contradiz as afirmações da nossa natureza moral e religiosa ao negar a liberdade e responsabilidade do homem; fazendo Deus incluir em si todo o mal assim como todo o bem; e excluindo toda oração, todo louvor e toda esperança de imortalidade.
A consciência é a testemunha eterna contra o panteísmo. Ela dá testemunho da nossa liberdade e responsabilidade e declara que as distinções morais não são ilusórias. Renouf, Hibbert Lect., 234 - "Está fora da condescendência para com a linguagem popular que os sistemas panteístas podem reconhecer as noções de certo e errado, de iniqüidade e pecado. Se tudo, na verdade, emana de Deus, não pode haver pecado. E os mais capazes filósofos que têm sido conduzidos aos pontos de vista panteístas debalde têm-se empenhado em harmonizar tais pontos de vista com o que entendemos por noção de pecado ou mal moral. A grande obra sistemática de Spinosa intitula-se 'Ética'; porém podemos encontrar a verdadeira ética consultando os Elementos de Euclides". Hodge, Sistematic Theol., 1.299-330 - "O panteísmo é fatalista. Em tal teoria, dever = prazer; direito = poder; pecado = bom de se fazer. Satanás, do mesmo modo que Gabriel, é um desenvolvimento de Deus.
Os efeitos práticos do panteísmo sobre a moral popular e a vida, onde quer que tenha prevalecido, tanto na índia budista como na China, demonstram sua falsidade".
Wordsworth: "Volte os olhos para o alto céu! o industrioso sol Já corre em meio ao seu curso; Ele não pode parar ou desviar-se; Porém nosso^ espíritos imortais o podem". Presidente John H. Harris: "Você nunca pede a opinião do ciclone a respeito dos dez mandamentos". Bowne, Philos. of Theism, 245 - "O panteísmo torna o homem um autômato. Mas como pode umiautômato ter deveres"? Principies of Ethics, 18 - "A Ética é definida como a ciência da conduta e apoia-se nas convenções da linguagem contam com á^eebertura total do fato de que não há nenhuma 'conduta' neste caso. Se o homem é, na verdade, um autômato, bem podemos falar da conduta dos ventos do mesmo
modo que da conduta de um sei humano; e um \ta\ado sobte os movimentos planetários do sistema solar é tão verdadeiramente ético como um tratado sobre os movimentos humanos é a ética do homem". Porque falta um claro reconhecimento da pessoalidade quer humana, quer divina, a Ética de Hegel é desprovida de todo o alimento espiritual, - sua "Rechtsphilosophie" tem sido chamada de "repasto de fibras". Contudo, o Professor Jones, Mind, jul., 1893.304, diz-nos que a tarefa de Hegel é "descobrir que concepção do princípio simples ou unidade fundamental é por si só e coaduna-se com as diferenças que apresenta. Ele acha que o 'Ser1, não abre espaço para diferenças; elas o potencializam excessivamente.... Ele acha, ainda, que a Realidade só pode existir como consciência própria absoluta, como um Espírito, que é universal e que a si mesmo se conhece em todas as coisas. Em tudo isto ele trata não somente dos pensamentos, mas da Realidade". Contudo, a vindica- ção do Prof. Jones a respeito de Hegel ainda deixa por decidir se aquele filósofo considera a consciência própria da parte de Deus distinta da dos seres finitos, ou se inclui somente estes.
Nossa convicção intuitiva da existência de um Deus de perfeição absoluta compele-nos a conceber um Deus possuído de cada uma das mais altas qualidades e atributos dos homens e, portanto, especialmente daquilo que constitui a principal dignidade do espírito humano, sua personalidade.
Diman, Theistic Argument, 328 - "Não temos direito de representar a causa suprema como inferior a nós mesmos, embora o façamos quando a descrevemos com expressões derivadas da causa física". Mivart, Lessons from Nature, 351 - "Não podemos conceber qualquer coisa como impessoal, ainda que de natureza mais elevada que a nossa; qualquer ser que não tenha conhecimento e vontade deve ser indefinidamente inferior àquele que os tem". Lotze sustenta, com verdade, não que Deus é supra-pessoal, mas infra-pessoal e vê que só no Ser infinito está a auto-suficiência e, por isso, a pessoalidade perfeita. Knight, Essays in Philosophy, 224 - "A caraterística radical da pessoalidade é a sobrevivência do eu permanente sob todas as fases inconstantes ou efêmeras da experiência; a saber, a identidade pessoal que está envolvida na afirmação 'eu sou'. ... É a limitação um acessório necessário dessa noção"? Seth, Hegelianism: "Como em nós há mais para nós mesmos do que para os outros, do mesmo modo em Deus há mais pensamento para ele mesmo do que o próprio Deus nos manifesta. A doutrina de Hegel é a da imanência sem a transcendência". Heinrich Heine foi aluno e amigo íntimo de Hegel. Diz ele: "Eu era jovem e me sentia orgulhoso e era agradável a minha vangloria quando eu aprendia de Hegel que o verdadeiro Deus não era, como cria a minha avó, o Deus que vivia no céu, porém era, em vez disso, eu-mes- mo aqui na terra". John Fiske, Idea of God, xvi - "Visto que a nossa noção de força é puramente uma generalização das nossas sensações subjetivas de resistência superada, dificilmente há menos antropomorfismo na expressão 'Poder Infinito' do que em 'Pessoa Infinita'. Devemos simbolizar a divindade de alguma forma que tem sentido para nós; não podemos simbolizá-la como
física; temos de simbolizá-la como psíquica. Por isso podemos dizer: Deus é Espírito. Isto implica pessoalidade de Deus".
Sua objeção à pessoalidade divina, que diante do Infinito não pode haver na eternidade passada nenhum non-ego que invoque a autoconsciência, se refuta considerando que mesmo a cognição do non-ego por parte do homem logicamente pressupõe conhecimento do ego, do qual o non-ego se distingue; que, na mente absoluta, a autoconsciência não pode ser condicionada, como no caso da mente finita, ao contato com o não-eu; e que, se a distinção do eu em relação ao não-eu fosse condição essencial da autoconsciência divina, as eternas distinções pessoais na natureza divina ou estados eternos da mente divina poderiam fornecer tal condição.
Pfleiderer, Die Religion, 1.163,190 sgt. - "A autoconsciência não é primordialmente uma distinção entre o ego e o não ego, porém, ao invés disto, é uma distinção entre o próprio ser e ele mesmo, isto é, entre a unidade do eu e a pluralidade do seu conteúdo. ... Antes que a alma estabeleça distinção entre o eu e o não eu, ela deve conhecer o eu - ou não poderá perceber tal distinção. Seu desenvolvimento tem conexão com o conhecimento do não eu, porém isto se deve, não ao fato da pessoalidade, mas da pessoalidade finita. O homem maduro pode viver por muito tempo com seus próprios recursos. Deus não precisa de um outro, para estimular a atividade mental. A fini- tude é um embaraço no desenvolvimento da nossa personalidade". Lotze, Microcosm, vol. 3, cap. 4; trad. na N. Ingl. mar., 1881.191-200 - "O espírito finito, não tendo por si mesmo condições de existência, só pode conhecer o ego na ocasião em que conhece o não ego. Por isso o infinito não é limitado.
Só ele tem existência independente que não é introduzida nem desenvolvida através qualquer coisa a não ser ele mesmo, mas, numa atividade interior sem início nem fim, sustenta-se a si mesmo".
Dorner, Glaubenslehre: "Pessoalidade Absoluta = consciência perfeita do eu e perfeito poder sobre o eu. Nós necessitamos de algo exterior para despertar a nossa consciência - apesar de que a autoconsciência vem [logicamente] antes da consciência do mundo. É o ato da alma. Só depois de se distinguir o eu do próprio eu pode-se conscientemente distinguir o eu de um outro ser". Revista Bristish Quarterly, jan. 1874.32, nota; jul 1884.108 - "O ego só é pensante em relação ao não ego; mas o ego é vivente muito tempo antes de qualquer relacionamento. Shedd, Dogm. Theol., 1.185,186 - No esquema panteísta, "Deus se distingue do mundo e, conseqüentemente, encontra o sujeito que o objeto requer;... no esquema cristão, Deus se distingue de si mesmo não a partir de algo que não seja ele mesmo".
Sobre o panteísmo, ver Martineau, Study of Religion, 2.141-194resp. 192
"A pessoalidade de Deus consiste na sua atuação voluntária como causa livre numa esfera não comprometida, isto é, a que transcendei a da lei imanente. Mas também isto constitui precisamente sua infinitude, estendendo sua influência depois que ela cobriu o real, sobre todo o possível, comandando
alternativas indefinidas. Embora você possa negar sua infinitude sem prejuízo da sua pessoalidade, não pode negar esta sem sacrificar aquela: porque há um modo de ação - o preferencial, o próprio que distingue os seres racionais - do qual você o exclui"; 341 - "Os metafísicos que, na impaciência de distingir, insistem em levar o mar a bordo de uma embarcação, não só a inundam, o pensamento que ela defende, como abandonam uma infinitude que, quando não penetra nenhum olho e não cochicha a nenhum ouvido, contradizem-se na sua própria afirmação".
Para o ponto de vista oposto, ver Biedermann, Dogmatik, 638-647 - "Só o homem, espírito finito, é pessoal; Deus, espírito absoluto, não o é. Contudo, na religião as relações mútuas de intercâmbio e comunhão são sempre pessoais. ... Pessoalidade é o único termo adequado pelo qual podemos representar a concepção teísta de Deus". Bruce, Providential Order, 76 - "Scho- penhauer não nivela por cima a força cósmica à humana, mas nivela por baixo a força de vontade à cósmica. Spinosa sustenta que o intelecto em Deus não é mais semelhante ao do homem do que a estrela da constelação do Cão ao cão. Hartmann acrescentou o intelecto à vontade de Schopenhauer, porém o intelecto é inconsciente e nada entende das distinções morais". ... Panteísmo = Deus consiste em todas as coisas; Teísmo = Todas as coisas consistem em Deus, base delas, não a sua soma. O espírito no homem mostra que o Espírito infinito deve ser uma Mente e uma Vontade pessoal e transcendente.
MONISMO ÉTICO
Monismo Ético é o método de pensamento que sustenta uma só substância, base, ou princípio do ser, isto é, Deus, mas também sustenta os fatos éticos da transcendência de Deus assim como sua imanência e a pessoalidade de Deus distinta da pessoalidade do homem, garantindo-a.
Embora não admitamos aqui a autoridade da Bíblia, reservando a nossa prova disto à divisão seguinte sobre As Escrituras, uma Revelação de Deus, podemos, contudo, citar passagens que mostram que a nossa doutrina não é inconsistente com os ensinos da Escritura Sagrada. A imanência de Deus está implicada em todas declarações da sua onipresença, como por exemplo:
SI. 139.7 sq. - "Para onde me irei do teu Espírito, ou para onde fugirei da tua face"? Jr. 23.23,24 - "Eu sou apenas Deus de perto, diz o Senhor, e não também Deus de longe? ... não encho os céus e a terra"? At. 17.27,28 - "não está longe de cada um de nós; porque nele vivemos, nos movemos, existimos". A transcendência de Deus está implicada em passagens tais como:
Re. 8.27 - "Eis que os céus e até o céu dos céus te não poderiam conter";
SI. 113.5 - "que habita nas alturas"; Is. 57.15 - "o Alto e «rSublime que habita na eternidade". "
Eis a fé que Agostinho sentia: "Ó Deus, tu nos fizeste para ti e o nosso coração não repousa enquanto não descansar em ti. ... Brtão poderia ser, ó meu Deus, não poderia ser afinal de contas se tu não fosses comigo; se eu
não estivesse em ti, de quem são todas as coisas, por quem são todas as coisas, em quem são todas as coisas". E Anselmo, Proslogion, fala sobre a natureza divina: "É a essência do ser, o princípio da existência, de todas as coisas. ... Sem partes, sem as diferenças, sem acidentes, sem mudanças, pode-se dizer, em certo sentido, que só ela existe porque, comparadas a ela, as outras coisas que aparecem não têm existência. O Espírito imutável é tudo o que é e ela é isto sem limite de modo simples e intérmino. É a Existência perfeita e absoluta. O resto proveio da não entidade e para lá voltará se não for sustentada por Deus. Ela não existe por si mesma. Neste sentido só o Criador existe; as coisas criadas não".
Enquanto o Monismo Ético abrange o elemento de verdade contido no Panteísmo - a verdade de que Deus está em todas as coisas e que todas as coisas estão em Deus - considera esta unidade científica inteiramente consistente com os fatos da ética - liberdade, responsabilidade, pecado e culpa do homem; em outras palavras, o Monismo Metafísico, ou a doutrina da substância, base ou princípio do ser, é qualificado pelo Dualismo psicológico, ou doutrina de que a alma é pessoalmente distinta, por um lado da matéria e, por outro, de Deus.
O Monismo Ético defende os fatos éticos da liberdade do homem e a transcendência e pessoalidade de Deus; é o monismo da livre vontade em que a pessoalidade tanto humana como divina, o pecado e a justiça, Deus e o mundo permanecem - dois em um, um em dois - em sua antítese moral bem como em sua unidade natural. Ladd, Introd. to Philosophy. "O dualismo é submissão, na história e nas salas da razão, a uma filosofia monística. ... Alguma forma do monismo filosófico é indicada pelas pesquisas da psicofísica e pela filosofia da mente que constrói sobre princípios alicerçados em tais pesquisas. Como realidades correlatas, o corpo e a mente devem ter uma espécie de base comum. ... Eles se completam na Realidade última; têm a sua vida entrelaçada como expressões daquela Vida que é imanente nos dois. ... Apenas alguma forma do monismo que satisfará os fatos e verdades a que tanto o realismo como o idealismo apelam podem ocupar o lugar da filosofia verdadeira e final.... Deste modo, o monismo deve construir seus princípios quanto à preservação, ou pelo menos não contradizer e destruir as verdades implicadas na distinção entre o eu e o não eu, ... entre o moralmente bom e o moralmente mau. Nenhuma forma de monismo que erige seu sistema sobre as ruínas dos princípios e ideais fundamentalmente éticos pode persistentemente sustentar-se".... Filosofia da Mente, 411 - "O dualismo deve ser diluído em alguma solução monística última. O Ser do mundo de qué todos os seres em particular constituem-se apenas partes e devem assim concebidos como o que nele pode ter a base de todas existências e atividades ir^terrelacionadas.
... Este Princípio é a Outra Mente Absoluta". ?
Dorner, Hist. Doct. Person of Christ, II, 3.101, 231 - "A unidade da essência em Deus e no homem é a grande descoberta da época presente. ... A carate- rística marcante de toda a Cristologia recente é o empenho em assinalar a unidade essencial, Deus e homem. Para a teologia dos nossos dias o divino e o humano não são magnitudes mutuamente excludentes, mas conexas.
... Contudo, a fé postula uma diferença entre o mundo e Deus, entre os que a religião procura unir. A fé não quer um relacionamento consigo mesma ou com suas representações e pensamentos; isto seria um monólogo; a fé deseja um diálogo. Por isso não combina com um monismo que reconhece só Deus, ou só o mundo; contrapõe tal monismo como este. A dualidade é, de fato, uma condição da verdadeira unidade vital. Mas dualidade não é dualismo. Ela não tem nenhuma pretensão de opor-se à demanda pela unidade". Professor Small de Chicago: "Com raras exceções de cada lado, toda a filosofia atual é monística em suas pretensões ontológicas; é dualística em seus procedimentos metodológicos". A. H. Bradford, The Age of Faith, 71 - "Os homens e Deus são, em substância, os mesmos, embora não idênticos como indivíduos". A teologia de cinqüenta anos atrás era simplesmente individualista e ignorava a verdade complementar da solidariedade. Do mesmo modo pensamos a respeito dos continentes e ilhas do nosso globo separados uns dos outros. O dissociável mar é considerado como uma barreira absoluta entre eles. Mas se se pudesse secar o oceano, ver-se-ia que, durante todo o tempo tinha havido conexões submarinas e a unidade escondida de todas as terras apareceria. Do mesmo modo a individualidade dos seres humanos, real como é, não é apenas realidade. Há o fato mais profundo da vida comum. Mesmo os grandes picos das montanhas da personalidade são distinções superficiais comparadas com a unidade orgânica em que elas estão arraigadas, em que elas se aprofundam e de que todas elas, como os vulcões, recebem às vezes rápidos e transbordantes impulsos de discernimento, emoção e energia.
Em contraste com os dois erros do Panteísmo - a negação da transcendência de Deus e a negação da pessoalidade de Deus - o Monismo Ético sustenta que o universo, ao invés de ser um com Deus e contérmino com Deus, é apenas uma manifestação finita e progressiva da Vida divina: A Matéria é a autolimitação de Deus sob a lei da Necessidade; a Humanidade é a autolimitação de Deus sob a lei da Liberdade; a Encarnação e a Expiação a autolimitação de Deus sob a lei da Graça.
O universo se relaciona com Deus/do mesmo modo que os meus pensamentos se relacionam com o pensadór, que sou eu. Eu sou maior do que os meus pensamentos e os meus pensamentos variam em valor moral. O Monismo Ético remonta a um começo, enquahtCLopanteísmo considera o universo coeterno com Deus. O Monismo Ético afirma a transcendência de Deus, enquanto o panteísmo considera Deus aprisionado no universo. O Monismo Ético afirma que o céu dos céus não podem contê-lo, mas que, contrariamente, o universo tomado em seu todo, com seus elementos e forças, seus sóis e sistemas solares são apenas um leve bafejo da boca divina ou uma gota de orvalho caída sobre a franja das suas vestes. Upton, Hibbert Lect:. "O Eterno está presente em cada coisa finita e sente-se e se conhece a sua presença em cada alma racional; porém ainda não está quebrada em individualidades; ao contrário, sempre permanece um e a mesma substância eterna, um e o mesmo princípio unificador, presente de modo imanente e indivisível em cada um dos que formam a incontável pluralidade dos indivíduos finitos em que o entendimento analítico dos homens disseca o Cosmos". James Martineau, abr. 1895.559 - "O que é a natureza senão a província dos comprometidos com Deus e a habitual causalidade? E o que é o Espírito senão a província da livre causalidade atendendo às necessidades e sentimentos dos seus filhos?
... Deus não é um arquiteto aposentado, que pode a qualquer momento ser chamado a fazer reparos. A natureza não é por si mesma ativa e a atuação de Deus não é intrometida".
Muitos poetas mostram sua simpatia por esta doutrina. "Cada nova criação vigorosa, Improvisação divina, procede do coração de Deus". Robert Browning assevera a imanência de Deus; Hohenstiel-Schwahgau: "Eis a glória que em tudo que se concebe Ou se sente, ou se conhece, Reconheço uma mente - não a minha, mas semelhante a ela - para duplo regozijo, Faz tudo em meu benefício e eu em seu benefício"; Pope, The Ring and Book. "Tu, que neste lugar a mim és representado do modo como o concebe a minha alma - Sob a tua imensurabilidade, na minha amplitude atômica! A mente humana, o que é senão uma lente convexa, que converge todos os pontos espalhados Colhidos da imensidão do céu, Para nele reunir, seja o nosso céu pela terra,
O nosso Conhecido Desconhecido, nosso Deus revelado ao Ser humano"?
Mas Browning também afirma a transcendência de Deus; Morte no Deserto:
"O homem não é Deus, mas tem como fim servi-lo, Como um Senhor a ser obedecido, uma causa a ser defendida, Como algo a ser lançado, algo a ser transformado"; em Véspera de Natal, o poeta escarnece: "Importante tropeço De acrescentar, ele, o sábio e humilde, é também um só com o Criador".
Assim também o Alto Panteísmo de Tennyson "O sol, a lua as estrelas, os mares, os montes, e as planícies, não são estas, Ó minha alma, a visão daquele que reina? As trevas são o mundo para ti; tu mesmo és o motivo; Pois não ele, mas tu és tudo, tu, que tens o poder de sentir o 'eu sou eu'? Fala-lhe tu, porque ele ouve e o espírito pode encontrar-se com o espírito; Ele está mais perto do que o sopro do que as mãos e os pés. E o ouvido do homem não pode ouvir e nem o olho pode ver; Mas se pudéssemos ver e ouvir não seria Ele mesmo esta visão"?
A imanência de Deus, como uma substância, base e princípio do ser, não destrói, mas garante a individualidade e os direitos de cada porção do universo de modo que há variedade de nível e dotação. No caso dos seres morais, determina-se o grau do reconhecimento voluntário e apropriação do divino. Enquanto Deus é tudo, ele também está em tudo; faz assim o universo uma manifestação graduada e progressiva de si mesmo tanto no seu amor pela retidão como na sua oposição ao mal moral.
Tem-se acusado que esta doutrina do monismo envolve necessariamente indiferença moral; que a presença divina em todas as coisas quebra todas as
distinções de nível e torna as coisas iguais umas às outras; que se legitima e se consagra o mal do mesmo modo que o bem. Isto é verdade a respeito do monismo panteístico, mas não o é a respeito do monismo ético; porque este é o monismo que reconhece o fato ético da inteligência e da vontade pessoais tanto em Deus como no homem e, com estes, o propósito de Deus tornar o universo uma variada manifestação de si mesmo. A adoração de gatos, de touros e de crocodilos no antigo Egito, e a deificação da luxúria nos templos bramânicos da índia eram expressões de um monismo não ético, que não via em Deus atributos morais e identificava Deus com as suas manifestações. Como ilustração dos equívocos em que os críticos do monismo podem cair por falta de discriminação entre o monismo que é panteísta e o monismo que é ético, fazemos a seguinte citação de Emma Marie Caillard: "As partes integrantes de Deus estão, nas premissas monísticas, enganosas, sensualistas, assassinas, de mau humor dos maus pensadores em cada descrição. Seus crimes e suas paixões intrinsecamente entram na experiência divina. O Indivíduo infinito em sua inteireza pode, na verdade, rejeitá-las, mas estes maus indivíduos finitos não se constituem partes dele, em menor escala que os rebentos de uma árvore, embora não sejam árvore e, embora a árvore transcenda qualquer ou todas elas, apesar de que se constituem partes dela. Pode aquele cuja consciência universal inclui e define toda a consciência finita ser outra coisa a não ser a responsável por todas ações e motivos finitos"?
A esta acusação podemos responder com as palavras de Bowne, The Divine Immanence, 130-133 - "O vinho novo da imanência tem aquecido algumas cabeças fracas a ponto de pôr todas as coisas no mesmo nível, e considerar os homens e camundongos como se fossem de igual valor. Porém nada há na dependência de todas as coisas relativamente a Deus que remova as suas distinções valorativas. Um conversador confuso deste tipo foi levado a dizer que ele não tinha nenhuma dificuldade quanto à noção de um homem divino, como também cria em uma ostra divina. Outros têm utilizado a doutrina para cancelar as diferenças morais; porque, se Deus estiver em todas as coisas e, se todas as coisas representam a sua vontade, qualquer coisa está certa. Mas isto é muito precipitado. Sem dúvida, mesmo a vontade má não independe de Deus, mas vive, e se move, e existe na vontade divina e através dela. Porém, pelo seu poder misterioso de individualidade e de autodeterminação, a vontade má é capaz de assumir uma atitude de hostilidade para com a lei divina que imediatamente vindica para si através das reações próprias.
"Tais reações não são divinas no sentido ideal ou mais elevado. Elas nada representam daquilo que Deus deseja ou de que ele se deleita; mas são divinas como coisas a serem feitas sob certas circunstâncias. No caso do bem, a reação divina se distingue daquela que é contra o mal. Ambas são divinas por representarem a ação de Deus, mas só a primeira o é por representar a aprovação e simpatia da parte de Deus. Todas as coisas prestam serviço, diz Spinoza. As coisas boas prestam serviço e este as favorece. As coisas más também prestam serviço de uma forma completa. Segundo Jonathan Edwards, os ímpios são úteis 'pelo que eles representam e pelo de que dispõem'. Como 'vasos de desonra' eles podem revelar a majestade de Deus. Por isso nada
há na imanência divina em sua forma defensável, que cancele as distinções morais, ou minorem a retribuição. A reação divina contra a iniqüidade é ainda mais solene nesta doutrina. O cerceamento de Deus é o eterno e inevitável ambiente; e somente quando estamos em harmonia com ele é que podemos ter paz. ... O que Deus pensa a respeito do pecado e qual a preocupação da sua vontade pode-se claramente perceber nas conseqüências naturais que advêm do referido pecado. ... Na própria lei temos de encarar Deus face a face; e as conseqüências naturais têm um sentido sobrenatural".
Porque Cristo é o Logos de Deus, o Deus imanente, Deus revelado na Natureza, na Humanidade, na Redenção, o Monismo Ético reconhece o universo criado, sustentado, e governado pelo mesmo ser que, no curso da história, manifestou-se em forma humana e fez a expiação peío pecado do homem na morte no Calvário. O segredo do universo e a chave para os seus mistérios encontram-se na Cruz.
Jo. 1.1-4, 14, 18 - "No princípio era o Verbo e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus. Todas as coisas foram feitas por intermédio dele; e sem ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida e a vida era a luz dos homens.... E o Verbo se fez carne e habitou entre nós.... Ninguém jamais viu a Deus. O Filho unigênito que está no seio do Pai, este o fez conhecer". Cl. 1.16,17-"porque nele foram criadas todas as coisas que há nos céus e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades; tudo foi criado por ele e para ele. E ele é antes de todas as coisas, e todas as coisas subsistem por ele".
Hb. 1.2,3 - "pelo Filho ... por quem ele também fez o mundo ... sustentando todas as coisas pela sua palavra do seu poder"; Ef. 1.22,23 - "igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que cumpre tudo em todos" = preenche todas as coisas com tudo o que elas contêm de verdade, beleza e bondade;
Cl. 2.2,3,9 - "mistério de Deus - Cristo, em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência. ... porque nele habita corporalmente a plenitude da divindade".
Este ponto de vista da relação do universo com Deus lança o fundamento para uma aplicação cristã da recente doutrina filosófica. A matéria não mais é cega e morta, mas é de natureza espiritual, não no sentido de que ela é espírito, mas no sentido de que é a manifestação contínua do espírito, do mesmo modo que os meus pensamentos são uma manifestação viva e contínua de mim mesmo. Contudo, a matéria não consiste em idéias, pois estas, desprovidas de um objeto externo e de um sujeito interno, ficam suspensas no ar.
As idéias são o produto da Mente. Porém só se conhece a matéria como a operação da força, e a força é produto da Vontade. Visto que esta força opera de forma racional, só pode ser o produto do Espírito. O sistema de forças que chamamos universo é o produto imediato da mente e da vontade de Deus; e, porque Cristo é a mente e a vontade de Deus em exercício, Cristo é o Criador e Sustentador do universo. A natureza é o Cristo onipresente, manifestando Deus às criaturas.
Cristo é o princípio da coesão, atração, interação não só no universo físico, mas também no intelectual e no moral. Em todo o nosso conhecimento, o conhecedor e a coisa conhecida estão "ligados por algum Ser que é a realidade deles"; este ser é Cristo, "luz que alumia todo homem (Jo. 1.9). Nós conhecemos em Cristo, assim como "nele vivemos, nos movemos e existimos" (At. 17.28). Como a atração gravitacional e o princípio da evolução apenas são nomes para Cristo, do mesmo modo ele é a base do raciocínio indutivo e o suporte da unidade moral na criação. Sou constrangido a amar o meu próximo como a mim mesmo porque ele tem em si a mesma vida que está em mim: a vida de Deus em Cristo. O Cristo em quem toda a humanidade é criada e em quem ela consiste, sustenta o universo moral, trazendo todo homem para si e, conseqüentemente para Deus. Através dele Deus "reconcilia consigo mesmo todas as coisas, tanto as que estão na terra como as que estão nos céus" (Cl. 1.20).
Como o Panteísmo = imanência exclusiva = Deus aprisionado, assim o Deísmo = transcendência exclusiva = Deus banido. O Monismo Ético defende a verdade contida em cada um destes sistemas, enquanto evita os seus erros. Fornece a base para uma nova interpretação de muitas doutrinas teológicas e filosóficas. Ajuda-nos a entender a Trindade. Se dentro dos limites do ser divino podem existir multidões de pessoalidades finitas, torna-se mais fácil compreender como dentro dos mesmos limites pode haver três pessoalidades eternas e infinitas; na verdade, a integração da consciência de plural em uma consciência divina de total alcance pode encontrar analogia na integração da consciência subordinada na pessoalidade una do ser humano.
O Monismo Ético, porque é ético, abre espaço para a vontade humana e para a sua liberdade. Conquanto o homem não pode romper o limite natural que o une a Deus, pode romper o espiritual e introduzir na nova criação um princípio de discórdia e mal. Amarre firme um cordão em torno do seu dedo; você o isola em parte, diminui a sua nutrição, provoca atrofia e enfermidade. Do mesmo modo se tem dado a cada agente pensante e moral o poder, a espiritualidade para isolar-se de Deus conquanto naturalmente ele ainda esteja ligado a Deus. Como a humanidade é criada em Cristo e vive só nele, o isolamento próprio do homem consiste na sua separação. Simon, Redemp- tion of Man, 339 - "Rejeitar Cristo não é tanto recusar tornar-se um com ele, como é recusar continuar a ser um com ele e não deixar que ele seja a nossa vida". Todos os homens são naturalmente um com Cristo através do nascimento físico antes de se tornarem moralmente um com ele através do nascimento espiritual. Os homens podem posicionar-se contra ele e opor-se a ele para sempre. Isto o nosso Senhor dá a entender quando nos diz que há varas naturais de Cristo, que não "estão na videira" ou que não "produzem frutos" e por isso "são lançadas fora", "secam-se" e "são queimadas" (Jo. 15.4-6).
Contudo, o Monismo Ético, porque é Monismo, capacita-nos a entender o princípio da Expiação. Embora a santidade de Deus nos constranja a punir o pecado, o Cristo que se juntou ao pecador deve compartilhar do seu castigo. Aquele que é a vida da humanidade deve tomar sobre o seu próprio coração o fardo da vergonha e da pena que pertence aos seus membros. Amarre o cordão em torno do seu dedo; não é só o dedo que sofre mas também o coração; a vida de todo o sistema ergue-se para expulsar o mal, para desatar o cordão, para livrar o membro enfermo e sofredor. A humanidade está ligada a Cristo como o dedo ao corpo. Visto que a natureza humana está entre "todas coisas" que "subsistem" ou mantém-se unida em Cristo (Cl. 1.17), e o pecado do homem é uma autoperversão de uma parte do próprio corpo de Cristo, todo ele deve ser ferido pelo ferimento auto-aplicado; "convinha que Cristo padecesse" (At. 17.3). Simon, Redemption of Man, 321 - "Se o Logos é o Mediador da imanência divina na criação, especialmente no homem; se os homens são diferenciações da efluente energia divina; e se o Logos é o princípio imanente controlador de toda a diferenciação - isto é, o princípio de toda a forma - não deve haver autoperversão de todas estas diferenciações que reagem naquele que é o seu princípio constitutivo"? Uma explicação mais completa das relações do Monismo Ético com outras doutrinas deve estar reservada ao nosso tratamento da Trindade, Criação, Pecado, Expiação, Regeneração.
Parte III
AS ESCRITURAS, UMA REVELAÇÃO DA PARTE DE DEUS
Capítulo I CONSIDERAÇÕES PRELIMINARES
RAZÕES A PRIORI PARA ESPERAR UMA REVELAÇÃO DA PARTE DE DEUS
Necessidades da natureza do homem
A natureza intelectual e moral do homem, para preservar-se da constante deterioração, e garantir seu desenvolvimento e progresso, requer uma revelação de autoridade e auxílio da verdade religiosa de um mais elevado e mais completo tipo que qualquer outro a que, em seu presente estado de pecado, pode atingir sem o uso de forças auxiliares. A prova desta proposição é em parte psicológica e em parte histórica.
Prova psicológica - a) Nem a razão, nem a intuição lançam luz sobre certas questões cuja solução é da mais elevada importância para nós; por exemplo, Trindade, expiação, perdão, método de adoração, existência pessoal após a morte, ti) Mesmo a verdade a que chegamos através dos nossos poderes naturais necessita da confirmação divina e autoridade quando dirige as mentes e vontades pervertidas pelo pecado, c) Para quebrar esta força do pecado e fornecer estímulo para o esforço moral necessitamos de uma revelação especial do aspecto misericordioso e auxiliador da natureza divina.
Bremen Lectures, 72, 73; Platão, Segundo Alcibíades, 22, 23; Fedo, 85 - Xóyox> 0eíov> "uvoç Jâmblico, Ttepi toú ITuGayopiKoãj Pioíi, cap. 28. Esquilo, em Agaménon, mostra quão completamente a razão e a intuição deixaram de suprir o conhecimento de Deus necessário ao homem: "O renome é espalhafatoso", diz ele, "e não deve perder o senso de que Deus é a maior dádiva.
... Ser louvado de modo ultrajante é grave; porque aos olhos de tal pessoa Zeus lança a pedra fulminante. Pelo que, na verdade, eu decido por tantas coisas e não por mais prosperidade do que a sua inveja não possa vigiar". Embora os deuses pudessem ter seus preferidos, eles não gostavam dos homens como tais, mas tinham inveja deles e os odiavam. William James, Is Life Worth Living? Intern. Jour. Ethics, out., 1895.10 - "Tudo o que sabemos de bom e de belo procede da natureza, mas nada menos do que conhecemos
do mal. ... Para uma mulher de baixa reputação não devemos nenhuma fidelidade moral. ... Se há um Espírito divino do universo, ou da natureza tal como a conhecemos, é possível que, para o homem, não seja ela a última palavra. Ou o Espírito não se revela na natureza, ou revela-se de forma inadequada; e como todas as religiões elevadas tem admitido, o que chamamos de natureza visível, ou denominamos este mundo, deve ser apenas um véu e uma apresentação superficial cujo pleno sentido reside num outro mundo, ou num mundo invisível".
Versus Sócrates: Os homens só fazem o que é certo se o conhecem. Pfleiderer, Philos. of Relig., 1.219 - "Em oposição à opinião de Sócrates de que a maldade apoia-se na ignorância, Aristóteles já lembrava o fato de que a prática do bem nem sempre está combinada com o seu conhecimento, porque isso também depende das paixões. Se a maldade consistisse apenas na falta de conhecimento, então os teoricamente mais cultos deveriam ser os melhores, o que ninguém se arrisca a afirmar". W. S. Lilly, Shibboleths: "Com freqüência sustenta-se que a ignorância é a raiz de todos os males. Porém só o conhecimento não transforma o caráter. Ele não pode ministrar a uma mente enferma. Não pode converter a vontade má em boa. Pode conduzir o crime por diferentes canais e torná-lo menos fácil de detectar. Não muda as propen- soes Tia\wta\s úo homem ou a sua disposição âe graWicà-^as a custa de outras. O conhecimento faz o homem bom mais poderoso para o bem e o mau mais poderoso para o mal. E é só isso que ele pode fazer". Gore, Incar- nation, 174 - "Não devemos subestimar o método do argumento, porque Jesus e Paulo ocasionalmente o empregaram na forma socrática, mas devemos reconhecer que ele não é a base do sistema cristão, nem o método primordial do cristianismo". Martineau, in Nineteenth Century, 1.331, 531 e Types, 1.112 - "Platão diluiu a idéia do que é certo naquilo que é bom e isto ainda indistintamente se mescla com a do verdadeiro e do belo".
Versus Thomas Paine: "A religião natural ensina-nos, sem qualquer possibilidade de equívoco, tudo o que é necessário e apropriado para ser conhecido". Platão, Laws, 9.854, c, "Sede bons; mas, se não puderdes, suicidai- vos". Farrar, Darkness and Dawn, 75 - "Platão diz que o homem nunca conhecerá Deus enquanto ele não se tiver revelado na aparência de um homem sofredor e que, quando tudo estiver à beira da destruição, o mesmo Deus veja a aflição do universo e, pondo-se ao leme, restaure-o à ordem". Prometeu, tipo da humanidade, nunca será libertado "enquanto um deus não desça a ele nas negras profundezas do Tártaro". De igual modo, Sêneca ensina que o homem não pode salvar-se a si mesmo". Diz ele: "Você acha estranho que o homem se dirija aos deuses? Deus vem aos homens, sim, para dentro dos homens". Somos pecadores; os pensamentos de Deus não são os nossos, nem os seus caminhos o são. Por isso ele deve torná-los conhecidos a nós, ensinar-nos o que somos, o que é o verdadeiro amor e o que é do seu agrado. Shaler, Interpretation of Nature, 221 - "O inculcamento das verdades morais só pode efetuar-se com sucesso de modo pessoal; ... demanda influência da pessoalidade; o peso da impressão depende da voz e do olho de um mestre". A saber, não só precisamos exercer autoridade, como também a manifestação do amor.
Prova histórica - a) O conhecimento da verdade moral e religiosa das nações e épocas em que se desconhece a revelação especial é grosseira e crescentemente imperfeito, b) A verdadeira condição do homem nos tempos pré- cristãos e nas modernas terras pagãs é de extrema depravação moral, c) Com tal depravação há uma convicção geral de desamparo e da parte das mais nobres naturezas um anseio e esperança de cima.
Pitágoras: "Não é fácil conhecer [os deveres], a não ser que o próprio Deus, ou alguma pessoa que os tenha recebido dele, ou os obtenha através dos seus recursos, os ensine aos homens". Sócrates: "Aguardemos com paciência, até que tenhamos a certeza do conhecimento de como devemos nos portar para com Deus e para com o homem". "Aguardaremos alguém, seja Deus, seja um homem inspirado, que nos instrua sobre os nossos deveres e que afastemos as trevas dos nossos olhos". Discípulo de Platão: "Façamos da probabilidade a nossa jangada enquanto navegamos pela vida, a não ser que possamos ter um meio de transporte mais seguro e garantido, como deve ser alguma comunicação divina". Platão pensava três coisas a respeito de Deus: 1. que ele nasceu com uma alma racional; 2. que ele nasceu grego; e 3. que ele viveu nos dias de Sócrates. Contudo, com todas estas vantagens é provável que ele tivesse apenas uma jangada em que navegava por mares estranhos ao pensamento além das suas próprias profundidades e aguardava "uma mui firme palavra dos profetas" (2 Pe. 1.19).
Pressuposição de um suprimento
O que conhecemos de Deus através da natureza fornece base para a esperança de que estas carências de nosso ser intelectual e moral encontrarão um suprimento correspondente na forma de uma revelação divina especial. Argumentamos isto a partir de:
Nossa convicção necessária da sabedoria de Deus. Tendo feito o homem um ser espiritual, para fins espirituais, pode-se esperar que ele forneça os meios necessários para assegurar tais fins. b) Sua verdadeira, embora incompleta, revelação já dada na natureza. Visto que Deus, na verdade, empreendeu tomar-se conhecido aos homens, podemos esperar que ele completará a obra que começou, c) A conexão geral da carência e suprimento. Quanto mais elevadas as nossas necessidades, mais intrincados e engenhosos são, em geral, os artifícios para ir ao seu encontro, d) Analogias da natureza e da história. Sinais de bondade reparadora na natureza e tolerância no providencial trato levam-nos a esperar que, conquanto se execute a justiça divina, Deus pode tomar conhecido o caminho da restauração dos pecadores.
Houve dois estágios na fuga que o Dr. Duncan fez do panteísmo: 1. quando ele primeiro creu na existência de Deus e "dançou de alegria o brig o'
Dee"; e 2. quando, sob a influência de Malan, ele veio a crer que Deus devia conhecê-lo". Na história do velho Leitor da Aldeia, a mãe sucumbiu completamente quando o seu filho parecia tornar-se cada vez mais tolo, mas as suas lágrimas conquistaram-no e o mudaram. Laura Bridgeman era cega, surda e muda e tinha apenas um leve sentido do paladar e do olfato. Quando sua mãe, após longa separação, foi visitá-la em Boston, o seu coração materno estava grandemente aflito, supondo que sua filha não viesse a reconhecê-la. Finalmente, com um sinal que era peculiar à mãe, ela perfurou o véu da insensibilidade, o que proporcionou um momento feliz para ambas. Do mesmo modo, Deus, nosso Pai, tenta revelar-se às nossas almas cegas, surdas e mudas. A agonia da cruz é o sinal do pesar pela insensibilidade do ser humano causada pelo pecado. Se ele é o Criador do ser humano, sem dúvida procurará adequá-lo à comunhão consigo para o que foi designado.
Gore, Incarnation, 52, 53 - "A natureza é o primeiro volume incompleto que demanda um segundo que é Cristo", c) R. T. Smith, Marís Knowledge of Man and of God, 228 - "Os mendigos não fazem os seus pedidos num deserto onde não há quem lhes atenda. Eles têm recebido um suprimento suficiente para manter vivo o senso de necessidade", d) Na ordem natural da cura das escoriações nas plantas e na soldadura dos ossos quebrados na criação animal, na provisão de agentes medicinais para a cura de doenças humanas e especialmente no adiamento da aplicação do castigo sobre o transgressor e o espaço concedido a ele para que se arrependa, temos algumas indicações que, se não contraditadas por outra evidência, podem levar-nos a considerar o Deus da natureza como o da paciência e misericórdia. O tratado de Plutarco "De Sera Numinis Vindicta" é uma prova de que este pensamento tinha ocorrido entre os pagãos. Na verdade, é possível duvidar de que uma religião pagã continue a existir livremente sem algum elemento de esperança. Contudo, este próprio adiamento na execução do juízo divino gerou dúvida sobre a existência de um Deus que, ao mesmo tempo é bom e justo. "A Verdade perene no patíbulo, O Erro sempre no trono", é um escândalo para o governo divino que só o sacrifício de Cristo pode remover plenamente.
O problema também se apresenta no Velho Testamento. Em Jó 21 e nos Salmos 17, 37, 49, 73 há respostas parciais; ver Jó 21.7 - "Por que razão vivem os ímpios, envelhecem, e ainda se esforçam em poder?" 24.1 - "Visto que do Todo-poderoso se não encobriram os tempos, por que não vêem os seus dias os que o conhecem?" O Novo Testamento sugere a existência de uma testemunha da bondade de Deus entre os pagãos, enquanto, ao mesmo tempo, declara que só Cristo traz o pleno conhecimento e a salvação. Compare At. 14.17 - "contudo, não se deixou a si mesmo sem testemunho, beneficiando-vos lá do céu, dando-vos chuvas e tempos frutíferos, enchendo de mantimento e de alegria o vosso coração"; 17.25-27 - "ele mesmo é quem dá a vida a respiração e todas as coisas; e, de um só, fez todas as gerações de homens.... para que buscassem ao Senhor, se, porventura, tateando, pudessem achar"; Rm. 2.4 - "a benignidade de Deus te leva ao arrependimento"; 3.25 - "para demonstrar a sua justiça pela remissão dos pecados dantes cometidos sob a paciência de Deus"; Ef. 3.9 - "e demonstrar a todos qual seja a dispensação do mistério, que, desde os séculos, esteve oculto em Deus,
que tudo criou"; 2 Tm. 1.10 - "nosso Salvador Jesus Cristo, o qual aboliu a morte e trouxe à luz a vida e a incorrupção, pelo evangelho".
Concluímos esta seção sobre as razões a priori esperando uma revelação da parte de Deus no reconhecimento de que os fatos garantem que o grau de expectação que chamamos esperança podemos melhor chamar de grau de expectação de segurança: e isto em razão de que, enquanto a consciência dá prova de que Deus é um Deus de santidade, não temos, à luz da natureza, igual evidência de que Deus é um Deus de amor. A razão ensina ao homem que, como pecador, merece condenação; mas ele não pode, só a partir da razão, saber que Deus terá misericórdia dele e prover-lhe salvação. Suas dúvidas só podem ser removidas pela voz do próprio Deus garantindo-lhe a "redenção ...
perdão ... dos delitos" (Ef. 1.7) e revelando-lhe o caminho pelo qual o perdão se tomou possível.
A consciência não conhece nenhum perdão, nem Salvador. Hovey, Manual of Christian Theology, 9, parece-nos ir longe demais quando diz: "Mesmo o sentimento natural e a consciência fornecem alguma diretriz para bondade e a santidade de Deus, embora seja necessário muito mais da parte daquele que se submete ao estudo da teologia cristã". Admitimos que o sentimento natural dá alguma diretriz para a bondade de Deus, mas consideramos a consciência apenas como um reflexo da santidade de Deus e da sua aversão ao pecado. Concordamos com Alexander McLaren: "O amor de Deus necessita de prova? Sim, como mostra o paganismo. Há deuses cheios de vícios, deuses descuidados, deuses cruéis, deuses belos em abundância; mas onde há um deus que ama"?
AS MARCAS DA REVELAÇÃO QUE O HOMEM PODE ESPERAR
Quanto à sua substância
Podemos esperar que esta mais tardia revelação não se contraponha, mas confirme e amplie o conhecimento de Deus que derivamos da natureza enquanto remedeia os defeitos da religião natural e lança luz sobre os seus problemas.
Isaías apela para as anteriores comunicações da verdade da parte de Deus: Is. 8.20 - "À lei e ao testemunho! Se eles não falarem segundo esta palavra, nunca verão a minha alva". Malaquias segue o exemplo de Isaías;
Mq. 4.4 - "Lembrai-vos da Lei de Moisés, meu servo". O próprio nosso Senhor baseou seus argumentos nos primitivos pronunciamentos de Deus:
Lc. 24.27 - "Começando por Moisés e por todos os profetas, explicava-lhes o que dele se achava em todas Escrituras".
Quanto ao seu método
Esperamos que ele siga os métodos de Deus no procedimento em outras comunicações da verdade.
Bispo Butler (Analogy, parte ii, cap. iii) nega que haja qualquer possibilidade de julgar a priori como se dará uma revelação divina. "Nós não somos nenhum tipo de juizes por antecipação", diz ele, "por cujos métodos, ou em cuja proporção se espera que esta luz e instrução sobrenaturais nos sejam fornecidas". Porém o Bispo Butler, um pouco mais tarde, em sua grande obra (parte ii, cap. iv) mostra que o plano progressivo de Deus na revelação tem analogia com os lentos e sucessivos passos através dos quais Deus cumpre os seus fins na natureza. Sustentamos que a revelação na natureza fornece algumas suposições sobre a revelação da graça como, por exemplo, as que aparecem abaixo.
Leslie Stephen, Niniteenth Century, fev. 1891.180 - "Butler respondeu o argumento dos deístas, de que o Deus do cristianismo é injusto, argumentando que o Deus da natureza era igualmente injusto. James Mill, admitindo a analogia, recusa-se a crer em ambos os Deuses. O Dr. Martineau diz, por semelhantes razões, que Butler 'escreveu um dos mais terríveis argumentos ao ateísmo jamais produzidos'. Do mesmo modo o argumento da 'morte ou da cura' de J. H. Newman é, em sua essência, ou que Deus não revelou nada, ou fez revelações em algum outro lugar além da Bíblia. Seu argumento, como o de Butler, pode ser de tal modo bem persuasivo ao ceticismo como à crença". A esta acusação de Leslie Stephen respondemos que ele é convincente só na medida em que ignoramos o fato do pecado humano. Admitindo este fato, o nosso mundo passa a ser de disciplina, provação e redenção e, tanto o Deus da natureza como o Deus do cristianismo são escoimados de toda a suspeita de injustiça. A analogia entre os métodos de Deus no sistema cristão e os seus métodos na natureza torna-se um argumento a favor daqueles.
Do contínuo desenvolvimento histórico; para ele que seja dado em germe às primitivas eras e seja mais completamente desenvolvido quando a raça estiver preparada para recebê-lo.
Exemplos de desenvolvimento contínuo na comunicação de Deus encontram-se na história geológica; no desenvolvimento das ciências; na educação progressiva do indivíduo e da raça. Nenhuma outra religião, a não ser o cristianismo, mostra "um firme progresso da visão de um Caráter infinito desdobrando-se em favor do homem por um período de muitos séculos". Arthur H. Hallan, John Browrís Rab and his Friends, 282 - "A Revelação é uma aproximação gradual do Ser irífinito com os recursos e pensamentos da humanidade finita". Uma centelha pode incendiar uma cidade ou o mundo; porém o décuplo do calor desta centelha, desde que amplamente fracionado, não incendiará coisa alguma.
Do pronunciamento a uma simples nação e a simples pessoas nessa nação para que possa através delas ser comunicado à humanidade.
Cada nação representa uma idéia. Como o grego tinha o gênio da liberdade e do belo, e o romano da organização e da lei, a nação hebréia tinha "o gênio da religião" (Renan); contudo, esta última teria sido inútil sem o auxílio e supervisão divinos especiais, como testemunham outras produções desta mesma raça semítica, tais como Bel e o Dragão, no Velho Testamento Apócrifo; os evangelhos do Novo Testamento Apócrifo; e, por fim, o Talmude e o Corão.
Os Apócrifos do Velho Testamento relatam que, quando Daniel foi lançado pela segunda vez na cova dos leões, um anjo agarrou Habacuque, pelos cabelos, na Judéia, e o levou com uma tigela de sopa para dar a Daniel no jantar. Sete leões e Daniel entre eles permaneceram sete dias e sete noites. Tobias parte da casa de seu pai para garantir a sua herança e o seu cachor- rinho vai junto. Nas barrancas de um grande rio um grande peixe ameaça devorá-lo, mas ele o captura e despoja. Finalmente, retorna com sucesso à casa do pai juntamente com o cachorrinho. Nos Evangelhos Apócrifos, Jesus leva água em seu manto quando da quebra do seu cântaro; faz passarinhos de barro no dia de sábado, e, repreendido, os faz voar; fere de morte um grupo de jovens, e, a seguir, amaldiçoa seus acusadores com a cegueira; zomba dos seus mestres e ressente-se do controle. Mais tarde, lendas muçulmanas declaram que Maomé causou trevas ao meio-dia; depois disso, a lua voou para ele, rodeou sete vezes a Caaba, curvou-se, entrou na sua manga direita, cortou em duas metades; lançando-se, depois, à esquerda e a duas metades; retirou-se para o extremo oriente e para o extremo ocidente reuniu-as. Estes produtos da raça semítica mostram que nem a influência do ambiente nem um gênio nativo da religião fornecem uma explicação adequada das nossas Escrituras. Como a chama no altar de Elias não foi causada por varas mortas, mas pelo fogo do céu, do mesmo modo a inspiração do Onipotente pode explicar a única revelação do Velho e do Novo Testamentos.
Os hebreus vêem Deus na consciência. Porque a mais genuína expressão da sua vida "devemos ver sob a superfície, na alma, onde a adoração e a aspiração encontram-se face a face com Deus" (Genung, Epic of the Inner Life, 28). Mas a religião do hebreu precisava ser suplementada pela vista de Deus na razão e na beleza do mundo. Os gregos tinham a beleza do conhecimento e do senso estético. Butcher, Aspects of the Greek Genius, 34 - "Os fenícios ensinaram a escrita aos gregos, mas foram estes que escreveram". Aristóteles foi o iniciador da ciência e além da raça ariana, ninguém, a não ser os sarracenos, jamais sentiu o impulso científico. Porém os gregos evidenciaram o seu problema solucionando todas as quantidades desconhecidas. Pensavam que nunca teriam obtido a aceitação universal e estabilidade se não fosse a jurisprudência e imperialismo romanos. A Inglaterra contribuiu com o seu governo constitucional e a América com o seu sufrágio universal e liberdade religiosa. Um pensamento tão definido a respeito de Deus incorporou-se a cada nação e cada uma tem uma mensagem para a outra. At. 17.26
Deus "fez de toda geração dos homens para habitar sobre toda a face da terra determinando os tempos já dantes ordenados e os limites da sua habitação"; Rm. 3.1,2 - "Qual é, logo, a vantagem do judeu? ... primeiramente as palavras de Deus lhe forma confiadas". A escolha da nação hebréia por Deus, como guardadora e comunicadora da verdade religiosa, tem analogia com a das outras nações, com relação à verdade estética, científica, e política.
Hegel: "Nenhuma nação que exerceu um papel de peso e ativo na história do mundo jamais produziu a partir do simples desenvolvimento de uma só raça as linhas estáveis de relacionamento sangüíneo. Deve haver diferenças, conflitos, um conjunto de forças opostas". A consciência do hebreu, o pensamento do grego, a organização do latino, a lealdade pessoal do teutônico, devem unir-se para formar um todo perfeito. "Enquanto a igreja grega era ortodoxa, a latina era católica; enquanto os gregos tratavam das duas vontades em Cristo, os latinos tratavam da harmonia das nossas vontades para com Deus; enquanto os latinos salvavam através de uma corporação, os teu- tônicos salvavam através de uma fé pessoal". Bereton, Educational Review, nov. 1901.339 - O problema da França é o das ordens religiosas; o da Alemanha, da construção da sociedade; o da América, do capital e trabalho". Pfleiderer, Philos. Religion, 1.183,184 - "As grandes idéias nunca vieram das massas, mas de indivíduos marcados. Contudo, quando propostas, estas idéias despertaram nas massas um eco que mostra que elas tinham estado inconscientemente adormecidas nas almas dos outros". Surgem as horas e aparece um Newton, que interpreta a vontade de Deus na natureza. Do mesmo modo, um Moisés ou um Paulo que interpretam a vontade de Deus na moral e na religião. Os poucos grãos de trigo encontrados no punho fechado da múmia egípcia ter-se-iam perdido totalmente se um grão tivesse sido semeado na Europa, um outro na Ásia, outro na África e, por fim, um outro na América; plantados juntos todos num pote de argila e o seu produto no leito de um jardim e, mais tarde o seu produto, no campo de um agricultor, haveria o trigo do novo Mediterrâneo suficiente para distribuir ao mundo todo. Deste modo Deus seguiu o seu método comum concedendo a verdade religiosa a princípio a uma única nação através da qual pôde transmitir-se à humanidade toda.
Da preservação escrita de documentos transmitidos por aqueles a quem originariamente foi comunicada.
Para o conhecimento da história do passado dependemos principalmente dos alfabetos, dos escritos, dos livros; todas as grandes religiões do mundo são religiões de livros; os carênios (da Birmânia) esperavam que os seus mestres da nova religião lhes trouxessem um livro. Porém note que as falsas religiões têm escrituras, mas não a Escritura; seus livros sagrados não têm o princípio da unidade fornecido pela inspiração divina. H. P. Smith, Biblical Scho- larship and Inspiration, 68 - "Maomé descobriu que as Escrituras dos judeus eram a fonte da religião deles. Chamou-os 'povo do livro', e empenhou-se em construir um código similar para os seus discípulos. Nele Deus é o único que fala; o profeta conhece todo o seu conteúdo por revelação direta; seu estilo arábico é perfeito; seu texto é incorruptível; é a autoridade absoluta na lei, na ciência e na história". O Corão é uma grosseira paródia humana da Bíblia;
suas exageradas pretensões sobre a divindade, sem dúvida, são a melhor prova da sua origem puramente humana. Por outro lado, a Escritura não tem essas reivindicações para si mesma, mas aponta Cristo como a única e final autoridade. Neste sentido, podemos dizer como Clarke, Christian Theology,
20 - "O cristianismo não é uma religião do livro, mas uma religião da vida.
A Bíblia não nos dá Cristo, mas Cristo no-la dá". Ademais, é verdade que, para o nosso conhecimento de Cristo, dependemos totalmente da Escritura.
Ao dar a sua revelação ao mundo, Deus seguiu o seu método comum de transmitir e preservar documentos através da escrita. Contudo, recentes investigações tornam agora provável que a expectação que os carênios tinham de um livro foi a sobrevivência do ensino dos missionários nestorianos que, no começo do século oitavo, penetraram os lugares mais remotos da Ásia e deixaram no muro da cidade de Singuádu ao noroeste da China uma tábua como monumento dos seus trabalhos.
Quanto à sua certificação
Podemos esperar que esta revelação seja acompanhada da evidência de que seu autor é o mesmo que anteriormente reconhecemos com o o Deus da natureza. Esta evidência deve constituir-se d) numa manifestação do próprio Deus; b) no mundo exterior assim como no interior; c) só o poder ou conhecimento de Deus pode fazê-lo; e d) como tal não pode ser contraditado pelo mal ou equivocado pela alma cândida. Em resumo, podemos esperar que Deus ateste pelos milagres e pela profecia a missão e autoridade divinas daqueles a quem ele comunica uma revelação. Tal sinal parece ser necessário, não só para assegurar ao recipiente original que a suposta revelação não é um capricho da sua própria imaginação, mas também dar autoridade à revelação recebida por um só indivíduo e transmitida a todos (compare Jz. 6.17,36-40 - Gideão pede um sinal para si; 1 Re. 18.36-38 - Elias pede um sinal para os outros).
Mas para que a nossa prova positiva de uma reveíação divina possa não ser obstada pela suspeita de que os elementos miraculosos e proféticos na história da Escritura criem uma pressuposição contra sua credibilidade convém ocupar- mo-nos neste ponto do assunto geral dos milagres e profecia.
OS MILAGRES, UM ATESTADO DA REVELAÇÃO DIVINA
Définição de Milagre
Definição preliminar
Milagre é um evento perceptível aos sentidos, produzido com um propósito religioso pela atuação imediata de Deus; portanto, um evento que, apesar de não contrariar qualquer lei da natureza, se plenamente conhecida, não se explica sem a atuação direta de Deus.
Esta definição corrige várias concepções errôneas de milagre: - d) Milagre não é a suspensão ou violação de uma lei natural; porque a lei natural está em operação na época em que ocorre o milagre como anteriormente, b) Não é um produto súbito de agentes naturais - simplesmente previstos por aquele que o opera; é o efeito de uma vontade exterior à natureza, c) Não é um evento sem causa; porque tem sua causa direta na volição de Deus. d) Não é um ato irracional ou caprichoso de Deus; mas um ato de sabedoria realizado segundo as leis imutáveis de seu ser de modo que, nas mesmas circunstâncias, segue-se o mesmo curso, e) Não é contrário à experiência; porque não é contrário à experiência de uma nova causa seguida de um novo efeito, f) Não é matéria de experiência interior como a regeneração e a iluminação; mas um evento perceptível aos sentidos e que em tudo pode servir como prova objetiva de que o seu operador é divinamente comissionado como mestre religioso.
A definição acima tem a intenção simplesmente de referir-se aos milagres da Bíblia, ou, em outras palavras, aos eventos que professam atestar uma revelação divina contida nas Escrituras. O Novo Testamento designa estes eventos de uma dupla forma, focalizando-os, quer subjetivamente, produzindo efeitos sobre os homens, quer objetivamente, revelando o poder e a sabedoria de Deus. Naquele primeiro aspecto eles são chamados xépata, 'maravilhas', e oTmEía 'sinais', (João 4.48; At. 2.22). Neste segundo são chamados 8vvá"j.eiç, 'poderes' e epya 'obras' (Mt. 7.22; Jo. 14.11). VerH. B. Smith, Lect.
On Apologetics, 90-116, esp. 94 - "atuxeíov, sinal, marcando o propósito ou objetivo, o fim moral, colocando o evento em conexão com a revelação".
A Versão da União Bíblica uniforme e adequadamente traduz xépaç por 'maravilha', 5-úv(x"iiç por 'milagre', êpyov por 'obra', e armetov por 'sinal'. Goethe, Fausto: "Alies Vergãngliche ist nur ein Gleichniss: Das Unzulãngliche wird hier Ereigniss" - "Todo o transitório é uma parábola; o inatingível aparece como um fato sólido". Assim os milagres do Novo Testamento são parábolas em ação; Cristo abre os olhos ao cego para mostrar que ele é a luz do mundo; multiplica os pães para mostrar que ele é o pão da vida; ressuscita os mortos para mostrar que ele levanta os homens da morte dos delitos e pecados. \/erBROADus, Com. de Mateus, Casa Publicadora Batista, 1949, 1ã vol. p. 144a.
Contudo, um grande grupo de físicos cristãos, no suposto interesse de uma lei natural demanda uma modificação desta definição de milagre.
Tal modificação é proposta por Babbage, Ninth Bridgewater Treatise, cap. viii.
Ele ilustra o milagre com uma ação de uma máquina calculadora, que apresenta ao observador numa sucessão regular a série de unidades a partir de um até dez milhões, mas dá um salto e mostra, não dez milhões e um, mas cem milhões; Ephraim Peabody ilustra o milagre como um relógio de catedral que apenas soa uma vez em cada cem anos; contudo, ambos resultados devem-se tão somente à construção original das respectivas máquinas. Babbage e Peabody negam que o milagre se deve à atuação direta ou indireta
de Deus, e consideram-no pertencente a uma ordem mais elevada da natureza. Deus só é o autor do milagre no sentido de que, no princípio, ele instituiu as leis da natureza e no tempo próprio providenciou o seu resultado. A favor deste ponto de vista tem-se reivindicado que ele não dispensa a operação divina, mas apenas a recua para a origem do sistema enquanto ainda sustenta que a obra de Deus é essencial, não só para sustentar o sistema, mas também para inspirar o mestre religioso ou líder no conhecimento necessário à predição da obra incomum do sistema. A maravilha está limitada à profecia que pode igualmente atestar uma revelação divina.
Mas é claro que um milagre deste tipo não tem muito da 'sinalização' necessária se a finalidade é cumprir o seu propósito. Apresenta a grande vantagem de que o milagre, como a princípio se define, possui uma providência muito especial como um atestado da revelação - a saber, a vantagem de que, enquanto a providência especial fornece alguma garantia de que esta revelação vem de Deus, o milagre dá garantia plena de que ele vem de Deus. Visto que o homem pode por meios naturais apossar-se do conhecimento das leis físicas, o verdadeiro milagre que Deus opera e o pretenso milagre que só o homem opera, estão nesta teoria bem menos fácil de distinguir-se entre si: Cortez, por exemplo, poderia enganar Montezuma predizendo um eclipse solar. Certos milagres típicos, como a ressurreição de Lázaro, recusam- se ser classificados como eventos pertencentes ao reino da natureza, no sentido em que esta se emprega comumente. Contudo, o nosso Senhor parece excluir claramente uma teoria como esta quando diz: "Se eu expulso demônios pelo dedo de Deus" (Lc. 11.20); Mc. 1.41 - "Eu quero; sê limpo". O ponto de vista de Babbage é inadequado, não só porque deixa de reconhecer qualquer exercício imediato da vontade no milagre, mas porque considera a natureza como uma simples máquina que pode operar independentemente de Deus - um método de concepção puramente deística. Sobre este ponto de vista muitos dos produtos da mera lei natural poderiam ser chamados milagres. Os milagres seriam apenas a manifestação ocasional de uma ordem da natureza mais elevada, como o cometa que ocasionalmente invade o sistema solar. William Elder, Ideas from Nature: "A planta do século que vimos crescer desde a nossa infância pode não desabrochar suas flores até que cheguemos à velhice, porém, não obstante, a súbita maravilha é natural". Contudo, se interpretarmos a natureza mais que dinamicamente, e a considerarmos como a operação regular da vontade divina ao invés de considerarmos a operação automática de uma máquina, há muita coisa que podemos adotar neste ponto de vista. O milagre pode ser tanto natural como sobrenatural. Podemos sustentar com Babbage que ele tem seus antecedentes naturais, enquanto, ao mesmo tempo, sustentamos que ele é produzido pela atuação imediata de Deus. A seguir, apresentaremos, portanto, uma definição alternativa e preferível, que, a nosso juízo, tem ambos méritos já mencionados.
Definição Alternativa e preferível
Milagre é um evento na natureza em si mesmo tão extraordinário e tão coincidente com a profecia ou a determinação de um mestre religioso ou um
líder que garante plenamente a convicção da parte dos que o testemunham que Deus o operou com o desígnio de certificar que o mestre ou líder foi comissionado por ele.
Esta definição tem algumas marcantes vantagens em comparação com a anterior: - a) Reconhece a imanência de Deus e sua atuação imediata na natureza ao invés de assumir uma antítese entre as leis da natureza e a vontade de Deus. b) Considera o milagre simplesmente como um ato extraordinário do mesmo Deus que já está presente em todas operações naturais e que está revelando nelas seu plano geral, c) Sustenta que a lei natural como método da atividade regular de Deus de modo nenhum exclui os esforços do seu poder quando estes garantiriam melhor seu propósito na criação, d) Permite a possibilidade de que todos os milagres tenham suas explicações naturais e daí em diante sejam atribuídos a causas naturais enquanto tanto os milagres como suas causas naturais podem ser apenas nomes da única e mesma vontade de Deus. e) Harmoniza as reivindicações tanto da ciência como da religião: da ciência, permitindo quaisquer possíveis ou prováveis antecedentes físicos do milagre; da religião, sustentando que estes mesmos antecedentes juntamente com o milagre devem ser interpretados como sinais da comissão especial de Deus através daquele cujo ensino ou liderança o milagre se opera.
Agostinho, que declara que "Dei voluntas rerum natura est" (A natureza das coisas é a vontade de Deus), define o milagre em De Civitade Dei, 21.8 - "Portentum ergo fit non contra naturam, sed contra quam est nota natura" (Não há milagre na natureza, mas no que se observa nela). Ele diz também, que o nascimento é mais miraculoso do que a ressurreição porque é mais maravilhoso que algo que nunca havia começado a ser, do que qualquer coisa que tinha sido e deixou de ser e começasse a ser outra vez. E. G. Robinson,,
104 - "O natural é obra de Deus. Ele o originou. Não há nenhuma separação entre o natural e o sobrenatural. O natural é sobrenatural. Deus opera em todas as coisas. Cada fim, embora atingido por processos mecânicos, é tão verdadeiramente o fim de Deus como se ele o operasse através de um milagre". Shaler, Interpretation of Nature, 141, considera o milagre como algo excepcional, embora sob o controle da lei natural; o elemento latente na natureza manifestando-se subitamente; a resultante revolução da lenta acumulação das forças naturais. No incêndio do Hotel Windsor o madeiramento aquecido e carbonizado subitamente irrompeu em chamas. A chama é bem diferente do simples calor, mas pode ser o resultado de uma temperatura regularmente crescente. A natureza pode ser a ação regular de Deus; o milagre, o seu único resultado. A ação regular de Deus pode ser inteiramente livre, embora o seu resultado extraordinário possa ser inteiramente natural. Com estas qualificações e explicações podemos adotar a afirmação de Biedermann, Dogma- tik, 581-591 - "Tudo é milagre; por isso a fé enxerga Deus em toda a parte; Nada é milagre; pelo que a ciência não enxerga Deus em lugar algum".
Os escritores da Bíblia nunca consideram os milagres como infrações da lei. Bp. Southampton, Place of Miracles, 18 - "O historiador ou profeta hebreu considera os milagres apenas como a emergência na experiência sensível da força divina que estava desde o princípio, embora de modo invisível, controlando o curso da natureza". Hastings' Bible Dictionary, 4.117 - "O hebreu não sentiria a força do milagre surgindo da noção da lei porque ele não tinha noção de lei natural". SI. 77.19,20 - "Pelo mar foi o teu caminho, e tuas veredas, pelas grandes águas e as tuas pegadas não se conheceram" = Eles e nós não as conhecemos e por que meios precisos operou-se o livramento, ou por que trilha se efetuou a passagem do Mar Vermelho; tudo o que sabemos é que "Guiaste o teu povo, como a um rebanho, pela mão de Moisés e de Arão". J. M. Whiton, Miracles and Supernatural Religion: "O sobrenatural está na própria natureza, no seu próprio cerne, como a sua própria vida; não se trata de uma força exterior interferindo no curso da natureza, mas uma força interior vitalizando-a e operando através dela". Griffith-Jones, Ascent through Christ, 35 - "O milagre, ao invés de um sortílego 'monstro', no dizer de Emerson, somente testemunha o aspecto de outra forma desconhecido ou irreconhecível do caráter divino". Shedd, Dogm. Theol, 1.533 - "Fazer o sol e Lázaro levantarem-se, demanda onipotência; mas a forma como a onipotência opera em um caso difere da outra".
Milagre é uma operação direta de Deus; porém, porque todos processos naturais são operações imediatas de Deus, não é preciso negar o emprego destes processos naturais, aonde quer que eles se dirijam, no milagre. Deste modo, as maravilhas do Velho Testamento, como a destruição de Sodoma e de Gomorra, a separação do Mar Vermelho e do Jordão, a invocação do fogo do céu por Elias e a destruição do exército de Senaqueribe são obras de Deus quando se considera que foram operadas pelo emprego de recursos naturais. No Novo Testamento Cristo transformou a água em vinho, tomou cinco filões para torná-los pães, como em dez mil vinhas hoje as torna em mosto ao molhar a terra e em dez mil campos está transformando o carbono em cereais. O nascimento virginal de Cristo pode ser um exemplo extremo de partenogênese, que o Professor Loeb, de Chicago, demonstrou ocorrer em outra forma de vida, além das inferiores e que ele crê ser possível em todos. A ressurreição de Cristo pode ser uma ilustração do poder do normal e perfeito espírito humano tomar para si um corpo próprio e ser o tipo e profecia da grande mudança quando deixarmos a nossa vida e a retomarmos. O cientista pode ainda achar que a sua descrença não se refere apenas a Cristo, mas também à ciência. Todo milagre pode ter seu lado natural, embora no momento não sejamos capazes de discerni-lo; e ainda que isto fosse verdade, o argumento cristão não se enfraqueceria nem um pouquinho porque ainda o milagre evidenciaria a extraordinária obra do Deus imanente e a concessão do seu conhecimento ao profeta ou apóstolo que se tornou seu instrumento.
Este ponto de vista do milagre torna inteiramente desnecessário e irracional o tratamento que alguns teólogos modernos fazem para harmonizar as narrativas da Escritura. Há uma credulidade do ceticismo que minimiza o elemento miraculoso na Bíblia e o trata como mítico ou legendário apesar da nítida evidência de que ele pertence ao reino da história real. Pfleiderer, Philos. Relig., 1.295 - "As lendas miraculosas surgem de dois modos: em parte da idealização do rea\ e em parte da realização do idea\. ... Toda ocorrência pode obter em favor do juízo religioso a significação de um sinal ou prova do poder, da sabedoria, da justiça de Deus, governante do mundo. ... As histórias miraculosas são realizações poéticas de idéias religiosas". Pfleiderer cita o apotegma de Goethe: "O milagre é o filho queridinho da fé". Foster, Finality of the Christian Religion, 128-138 - "Honramos mais as narrativas dos milagres bíblicos quando procuramos entendê-los como poesias". Ritschl define os milagres como "aquelas ocorrências que têm conexão com a experiência relativa ao auxílio especial de Deus". Ele apresenta dúvida sobre a ressurreição corpórea de Cristo e muitos da sua escola negam isso. Não precisamos interpretar a ressurreição de Cristo como simples aparição do seu espírito aos discípulos. Gladden, Seven Puzzling Books, 202 - "Nas mãos do homem perfeito e espiritual as forças da natureza são dóceis e tratadas como se não fossem nossas. A ressurreição de Cristo é apenas um sinal da superioridade da vida do espírito perfeito sobre as condições exteriores. Ela pode estar em perfeito acordo com a natureza". Myers, Human Personality, 2.288 - "Faço uma predição de que, como conseqüência da nova evidência, daqui a um século todos homens razoáveis crerão na ressurreição de Cristo". Podemos acrescentar que o próprio Jesus apresenta indícios de que a operação de milagres daqui em diante será uma manifestação comum e natural da nova vida que ele concede: Jo. 14.12 - "Aquele que crê em mim também fará as obras que eu faço e as fará maiores do que estas, porque eu vou para meu Pai".
Acrescentamos numerosas opiniões antigas e modernas a respeito dos milagres; todas no intento de mostrar a necessidade de defini-los desta forma para não se chocar com as justas reivindicações da ciência. Aristóteles: "A natureza não é cheia de episódios como uma tragédia ruim". Shakespeare, All's Well that Ends Well, 2.3.1 - "Dizem que os milagres já passaram; e temos nossas pessoas filosofantes que modernizam e familiarizam as coisas sobrenaturais e sem causa. Por isso é que damos pouca importância aos terrores, ocultando-nos no aparente conhecimento quando deveríamos nos submeter a um temor desconhecido". Hill, Genetic Philosophy, 334 - "A ciência biológica e a psicológica unem-se para afirmar que cada evento orgânico ou psíquico deve ser explicado nos termos dos seus antecedentes imediatos e só assim podem ser explicados. Por isso não há necessidade alguma, não há lugar nenhum para interferências. Se a existência de Deus depende da evidência de uma intervenção e atuação sobrenatural, a fé no elemento divino parece destruir-se na mente científica". Theodore Parker: "Em Deus não há capricho; por isso não há milagre na natureza". Armour, Atonement and Law, 15-33 - "O milagre da redenção, como todos os milagres, ocorre por intervenção de uma força adequada, não da suspensão da lei. A redenção não é 'a grande exceção'. É a mais completa revelação e vindicação da lei". Gore, Lux Mundi, 320 - "A redenção não é natural, mas sobrenatural - isto é, em vista da falsa natureza que o homem fez para si excluindo Deus. Caso contrário, a obra da redenção é apenas a reconstrução da natureza que Deus projetou". Abp. Trench: "O mundo da natureza é uma testemunha integral do mundo do espírito, procedentes da mesma mão, desenvolvendo-se a partir da mesma raiz e constituindo-se para a mesma finalidade. Os caracteres da
natureza que em toda parte encontram o olho não são uma escrita comum, mas uma escritura sagrada; são os hieróglifos de Deus". Pascal: "A natureza é a imagem da graça". Presidente Mark Hopkins: "O cristianismo e a razão perfeita são idênticos".
Possibilidade do Milagre
Um evento na natureza pode ser causado por um agente nela embora acima dela. Isto é evidente nas seguintes considerações:
As forças e leis inferiores na natureza freqüentemente contrapõem e transcendem as mais elevadas (forças e leis mecânicas pelas químicas e as químicas pelas vitais), conquanto ainda as forças e leis inferiores não são suspensas ou aniquiladas, mas surgem em mais elevadas, e assistem em propósitos complementares no que são diferentes quando deixadas ao léu do seu destino.
James Robertson, Early Religion of Israel, 23 - "Acaso é impossível haver coisas únicas no mundo? É científico afirmar que não haja"? Gore, Incarnati- on, 48 - "A Evolução vê a natureza numa ordem progressiva em que há novos departamentos, ganha vigorosos níveis, desconhece os fenômenos anteriores. Quando apareceu a vida orgânica, o futuro não se assemelhava ao passado. O mesmo aconteceu quando o homem apareceu. Cristo é uma nova natureza - o Verbo criativo que se fez carne. Espera-se que, com a nova natureza ele apresente novos fenômenos. Dele irradiará nova energia vital controladora das forças materiais. Os milagres são os acessórios adequados à sua pessoa". Podemos acrescentar que, como Cristo é o Deus imanente, ele está presente na natureza e, ao mesmo tempo, acima dela, e a sua firme vontade é a essência de toda lei natural; transcende a todos óbices passados dessa vontade. O Infinito não é um ser de infinda monotonia. William Elder, Ideas from Nature, 156 - "Deus não está, sem esperança, limitado ao seu processo, como íxion, preso à sua roda" (íxion = deus grego condenado a ser amarrado no inferno a uma roda e a girá-la sem cessar).
A vontade humana age sobre seu organismo físico e sobre a natureza e produz resultados que a natureza deixada ao léu do seu destino, nunca cumpriria enquanto ainda não se suspende ou viola nenhuma lei da natureza. A gravi- tação ainda opera sobre o machado enquanto o homem o levanta à superfície da água - pois o machado ainda tem seu peso (cf. 2 Re. 6.5-7)
Versus Hume, Philos. Works, 4.130 - "Milagre é violação das leis da natureza". Os apologistas cristãos com freqüência têm desnecessariamente se embaraçado ao aceitarem a definição de Hume. O estigma é totalmente desmerecido. Se o homem pode manter o machado na superfície da água enquanto a gravitação age sobre ele, não há dúvida de que Deus também pode, através da palavra do profeta, fazer o ferro flutuar enquanto a gravita- ção age sobre ele. Mas este último é um milagre. Mansel, Essay on Miracles, em Aids to Faith, 26, 27 "Depois que a maior onda da estação fixou a pedra no alto da praia, eu posso removê-la um pouco mais adiante sem alterar a força do vento, ou da onda, ou do clima à distância de um continente. A. A. Hodge: Retirar um novo registro do órgão não o impede de funcionar nem destrói a harmonia dos outros registros. A bomba não suspende a lei da gravitação, nem o lançamento de uma bola no ar. Se a gravitação não agisse, a velocidade da bola para cima não diminuiria e a bola nunca retornaria. "A gravitação atrai o ferro para baixo. Mas o magneto vence essa atração e traz o ferro para cima. Contudo aqui não há suspeita ou violação das leis, mas uma harmoniosa obra de duas leis, cada qual na sua esfera. Não é a vida, mas a morte que é a lei da natureza. Não obstante, os homens vivem. A vida é sobrenatural. Só uma força adicional às simples obras da natureza causam a existência da vida. Do mesmo modo a vida espiritual emprega as leis da natureza e as transcende" (Sunday School Times). Gladden, What Is Leffí 60 - "Onde quer que esteja o pensamento, a escolha, o amor, você encontra algo que não está sob o domínio de uma lei rígida. São atributos da livre pessoalidade". William James: "Precisamos substituir o ponto de vista pessoal da vida pelo impessoal e mecânico. O racionalismo mecânico é a mais estreita e parcial indução dos fatos - isto não é ciência".
Em toda causalidade livre há uma atuação sem meio. O homem age sobre a natureza exterior através do seu organismo físico, mas, ao movê-lo, ele age diretamente sobre a matéria. Em outras palavras, a vontade humana pode valer-se de meios só porque ela tem o poder de agir inicialmente sem eles.
A. J. Balfour, Foundations of Belief, 311 - "Não é só a Divindade que intervém no mundo das coisas. Toda alma viva, em sua medida e grau, faz o mesmo". De qualquer forma, cada alma ao seu redor, age assim com relação ao princípio do milagre. Phillips Brooks, Life, 2.350 - "A prática de todos feitos miraculosos não é uma abolição do milagre assim como o brilho solar, inundando o mundo, não é a extinção do sol". George Adam Smith, sobre Is. 33.14 - "fogo devorador... chamas eternas": "Se olhamos para um incêndio através de um vidro enfumaçado, vemos prédios desmoronando, mas não vemos fogo. Assim também a ciência vê os resultados, mas não a força que os produz; vê a causa e o efeito, mas não vê Deus". P. S. Henson: "A corrente em um fio elétrico é invisível mesmo circulando uniformemente. Corte o fio e insira um pedaço de carvão entre os dois terminais rompidos e você terá um arco de luz que afasta a escuridão. Do mesmo modo o milagre é apenas uma interrupção momentânea na operação das leis uniformes, o que fornece luz por muito tempo"; ou, melhor dizendo, a mudança momentânea no método operacional pelo qual a vontade de Deus toma nova forma de manifestação.
O que a vontade humana, considerada como força sobrenatural, e o que as forças químicas e vitais da própria natureza são visivelmente capazes de rranprir não pode ser considerado como além do poder de Deus, porquanto =ie habita e controla o universo. Se a vontade do homem pode agir diretamente sobre a matéria em seu organismo físico, Deus pode operar imediatamente >:-bre o sistema que ele criou e sustenta. Em outras palavras, se há um Deus, e ele é um ser pessoal, os milagres são possíveis. A impossibilidade dos milagres só pode ser sustentada nos princípios do ateísmo ou do panteísmo.
Cox, Miracles, Argumento e Desafio: "É preferível o antropomorfismo ao hilomorfismo". Newman Smyth, Old Faiths in a New Light, cap. 1 - "Milagre não é um súbito golpe aplicado na cara da natureza, mas o emprego desta, conforme a sua capacidade vcxeteute, attavés das mavs etev&das torças". Ouaovs,, Science and Miracle, New Englander, jul., 1889.1-32 - Três postulados:
1) Todas partículas do universo atraem-se reciprocamente; 2) A vontade do homem é livre; 3) Cada volição se faz acompanhar da ação cerebral correspondente. Por isso cada uma das nossas volições muda através do universo inteiro; ver também Century Magazine, dez, 1894.229-As condições nunca são dúplices na mesma natureza; tudo resulta da vontade, por sabermos que pelo menos o nosso pensamento abala o universo; milagre é tão somente a ação da vontade em condições singulares; o começo da vida, a origem da consciência, são milagres embora estritamente naturais; a oração, e a mente que a estrutura são condições que, na natureza, a Mente não pode ignorar.
Cf. SI. 115.3 - "o nosso Deus está nos céus e faz tudo o que lhe apraz" = sua força onipotente e liberdade afastam todas objeções a priori sobre os milagres. Se Deus não é só uma força, mas uma pessoa, então os milagres são possíveis.
é) Tal possibilidade dos milagres toma-se duplamente segura aos que vêem em Cristo o Deus imanente manifesto às criaturas. O Logos, ou a Razão divina, que é o princípio de todo o desenvolvimento e evolução, pode tornar Deus conhecido tão somente por meio de sucessivas concessões novas de sua energia. Porque todo o progresso implica em incremento e Cristo é a única fonte da vida, toda a história da criação é testemunha da possibilidade do milagre.
A. H. Strong, Christ in Creation, 163-166 - "Este conceito de evolução é o de Lotze. Esse grande filósofo cuja influência é mais poderosa do que qualquer outra neste pensamento, não considera o universo como um plenum ao qual nada se pode acrescentar por meio da força. Ele considera o universo mais como um organismo plasmável ao qual novos impulsos podem-se conceder a partir daquele de cujo pensamento e vontade o universo é expressão. Tais impulsos, uma vez concedidos, continuam no organismo e daí em diante sujeitam-se à sua lei. Embora tais impulsos venham de dentro, não partem de um mecanismo finito, mas do Deus imanente. "A expressão de Robert Browning, 'Tudo è amor, mas tudo é lei' (Browning faz um jogo de palavras 'love' 'Va^í \ q to 'wmv
mertos dos ç\ac\e\as e Xodas oçetações da ualuteia são 'te\ie\ações de um
Deus pessoal e presente, mas não se deve interpretar como se Deus corresse em trilhas, entre as quais ele está bitolado a um mecanismo inevitável de manifestações de poder único e surpreendente.
"O homem constrói uma casa. Ao lançar o alicerce ele emprega pedra e argamassa, mas faz as paredes de madeira e o forro de folha-de-flandres.
Na superestrutura ele se vale de leis diferentes das que se aplicam no alicerce. Há continuidade não material, mas de planejamento. O desenvolvimento desde o porão até ao sótão requer quebras aqui e ali, e o emprego de novas forças; de fato, sem o emprego dessas novas forças, seria impossível a evolução da casa. Agora substitua o alicerce e a superestrutura por coisas vivas como a crisálida e a borboleta; imagine a força de trabalho a partir não de fora, mas de dentro; e você observará que a verdadeira continuidade não exclui novos começos, mas envolve-os."
"A evolução, então, depende do incremento de forças somadas à continuidade do plano. Há possibilidade de novas criações porque o Deus imanente não se cansa. O milagre é possível porque Deus não está muito distante, mas bem próximo para atender quaisquer necessidades que o universo moral possa requerer. São possíveis a regeneração e as respostas à oração pelo mesmo motivo de que são elas o objetivo para o qual o universo foi construído. Se fôssemos deístas, crendo em um Deus distante e em um universo mecânico, a evolução e o cristianismo seriam irreconciliáveis. Mas porque cremos em um universo dinâmico de que o Deus pessoal e vivo é a fonte interior da energia, a evolução é apenas a base, o alicerce e o cenário do cristianismo, a silenciosa e regular obra daquele que, na plenitude dos tempos, profere a sua voz em Cristo e na Cruz".
A afirmação do ponto de vista do próprio Lotze pode encontrar-se em seu Microcosmos, 2.479 sq. O Professor James Ten Broeke interpretou-a da seguinte forma: "Ele faz a possibilidade do milagre depender da ação e reação próximas e íntimas entre o mundo e o Absoluto pessoal, em cuja conseqüência os movimentos do mundo natural realizam-se só através do Absoluto, com a possibilidade de variação no curso geral das coisas, conforme os fatos existentes e o propósito do divino Governante".
Probabilidade dos Milagres
Reconhecemos que, até onde confinamos nossa atenção à natureza, há uma predisposição contra os milagres. A experiência atesta a uniformidade da lei natural. A uniformidade geral é necessária para tomar possível um cálculo racional do futuro, e uma ordem própria da vida.
G. D. B. Pepper: "Onde não há lei, não há ordem e não pode haver milagre. O milagre pressupõe a lei e a importância atribuída aos milagres é o reconhecimento do reino da lei. Porém a fabricação e lançamento de um navio podem ser regidos por uma lei do mesmo modo que a navegação após o seu lançamento. Do mesmo modo a introdução de uma ordem espiritual mais elevada em uma ordem simplesmente natural constitui um novo e único evento".
Alguns apologistas cristãos têm cometido o erro de afirmar que o milagre era anteriormente tão provável como qualquer outro evento, mas, na verdade, só a sua improbabilidade antecedente lhe dá o valor de prova da revelação.
Mas negamos que esta uniformidade da natureza seja absoluta e universal. d) Não é uma verdade da razão que não pode ter nenhuma exceção, a não ser que o todo seja maior que as partes, b) A experiência não poderia garantir uma crença na uniformidade universal a não ser que a experiência fosse idêntica ao conhecimento absoluto e universal, c) Sabemos, ao contrário, com base na geologia, que tem havido lapsos nesta uniformidade, tais como a introdução da vida vegetal, da animal e da humana que não pode ser tida senão como manifestação de um poder sobrenatural.
Compare a probabilidade de o sol levantar-se amanhã cedo, com a certeza de que dois mais dois são quatro. Huxley, Lay Sermons, 158, com indignação nega que há um 'deve' em torno da uniformidade da natureza: "Ninguém tem o direito de dizer a priori que qualquer assim chamado evento miraculoso é impossível". Ward, Naturalism and Agnosticism, 1.84 - "Não há nenhuma evidência para afirmar-se que a massa do universo é quantitativamente definida e imutável"; 108, 109 - Por que se admite com tanta confiança que uma rígida e monótona uniformidade é a única, ou a mais elevada indicação da ordem, a de um Espírito eternamente vivo, acima de tudo? Como é que depreciamos os artigos industrializados e preferimos os que apresentam o impulso artístico, ou a adequação do caso individual, livre para dar forma e fazer o que literalmente é manufaturado (feito à mão)? ... Tão perigoso como os argumentos teleológicos genericamente sejam, podemos ao menos com confiança dizer que o mundo não foi destinado a tornar fácil a ciência.
... Chamar de mecânicos os versos de um poeta, a política de um estadista, a ponderação de um juiz, implica, como Lotze assinala, notável disparate, embora isto implique, também, precisamente tais caraterísticas - exatidão e inva- riabilidade - em que Maxwell nos mostra um sinal do elemento divino". Sem dúvida não devemos, então, insistir em que a sabedoria divina deve sempre correr em sulcos, que ela deve sempre ser repetitiva, nunca deve apresentar- se em atos exclusivos como na encarnação e na ressurreição.
S. T. Coleridge, Table Talk, 18 de dezembro de 1831 - "A luz que a experiência nos fornece é uma lanterna na popa do navio e só brilha nas ondas que deixamos atrás de nós". Hobbes: "A experiência nada conclui de modo universal". Brooks, Foundations of Zoology, 131 - "A evidência só nos pode dizer o que aconteceu, mas nunca nos garantir que o futuro deve ser semelhante ao passado; 132 - A prova de que toda a natureza é mecânica não seria inconsistente com a crença de que tudo na natureza é sustentado imediatamente pela Providência e que a minha vontade explica alguma coisa na determinação do curso dos eventos". Royce, World and Individual, 2.204 - "A uniformidade não é absoluta. A natureza é um reino da vida e do sentido mais vasto e nós, seres humanos, fazemos parte dele; a sua unidade final está na vida de Deus. O ritmo da pulsação cardíaca tem sua regularidade normal, embora sua persistência seja limitada. A natureza pode constar simplesmente de hábitos da vontade livre. Cada região deste mundo universalmente consciente pode ser o centro de onde procede a nova vida consciente para a comunicação com todos os mundos". Reitor Fairbairn: "Natureza é Espírito". Preferimos dizer: "A natureza é a manifestação do espírito, da regularidade da liberdade".
Outras quebras na uniformidade da natureza são a vinda de Cristo e a regeneração da alma humana. Harnack, Whatis Christianity, 18, sustenta que, embora não haja nenhuma interrupção na obra da lei natural, esta não é ainda plenamente conhecida. Conquanto não haja nenhum milagre, há uma fartura de milagrosos. O poder da mente sobre a matéria vai além das nossas concepções atuais. Bowne, Philosophy of Theism, 210 - Os efeitos não são mais conseqüências das leis do que as leis conseqüências dos efeitos = tanto as leis como os efeitos são exercícios da vontade divina. King, Reconstruction in Theology, 56 - Não devemos sustentar a uniformidade da lei, mas a sua universalidade-, porque a evolução tem estágios sucessivos e novas leis entram e dominam o que não aparecia anteriormente. O novo e mais elevado estágio é praticamente um milagre do ponto de vista do inferior.
Porque a invocação da lei moral na constituição e curso da natureza mostra que a natureza existe, não para si mesma, mas para a contemplação e uso dos seres morais, é provável que o Deus da natureza produza os efeitos além dos da lei natural, sempre que haja fins morais suficientemente importantes a serem servidos por ela.
Sob a expectação da uniformidade acha-se a intuição da causa final; por isso aquela pode ocasionar esta. Ver Porter, Human Intelect, 592-615 - "As causas eficientes e as finais podem entrar em conflito e então as eficientes dão lugar às finais. Eis o milagre. Shedd, Dogm. Theol., 1.534,535 - "A ordem do universo não é um fim; é um meio e, como todos outros meios, deve abrir caminho quando o fim pode ser promovido de forma melhor sem ela. É um marco da mente fraca idolatrar a ordem e o método; apegar-se a formas estabelecidas de negócios quando dificultam ao invés de desenvolvê- los. Balfour, Foundations of Belief, 357 - "A estabilidade dos céus à vista de Deus é menos importante que o desenvolvimento moral do espírito humano".
Isto é o que prova a Encarnação. O cristão vê em sua minúscula terra a cena da maior revelação de Deus. A superioridade do elemento espiritual sobre o físico ajuda-nos a ver a nossa verdadeira dignidade na criação, a dirigir o nosso corpo, a vencer os nossos pecados. O sofrimento de Cristo nos mostra que Deus não é um espectador indiferente à dor humana. Ele se sujeita às nossas condições ou, ao invés disso, revela-nos o eterno sofrimento de Deus por causa do nosso pecado. A expiação capacita-nos a solucionar o problema do pecado.
A existência da desordem moral conseqüente dos atos livres da vontade humana, portanto, muda a pressuposição contra os milagres em pressuposição em seu favor. O não aparecimento dos milagres, neste caso, seria a maior das maravilhas.
Stearns, Evidence of Christian Experience, 331-335 - Deste modo, a consciência pessoal que o homem sente a respeito do pecado e acima de tudo a sua experiência pessoal da graça regeneradora, constituirá a melhor preparação para o estudo dos milagres. "Não se pode provar o cristianismo a não ser para uma consciência má". Com precisão disse o moribundo Vinet:
"O maior milagre que eu conheço é a minha conversão. Eu estava morto e estou vivo; era cego e vejo; era escravo e sou liberto; era inimigo de Deus e amo-o; a oração, a Bíblia, a comunhão dos cristãos eram para mim a fonte do profundo ennui (tédio); agora são os prazeres do mundo que me entediam e a piedade é a fonte de toda a minha alegria. Eis o milagre! E se Deus foi capaz de operá-lo, nada há de que ele seja incapaz".
Contudo os elementos físico e moral não são "como que separados por um machado". A natureza é apenas um estágio inferior ou uma forma imperfeita da revelação da verdade, da santidade e do amor de Deus. Ela abre o caminho para o milagre sugerindo, embora de forma obscura, as mesmas caraterísticas essenciais da natureza divina. A ignorância e o pecado precisam de um novo descortino. G. S. Lee, The Shadow Christ, 84 - "A coluna de nuvem era a lâmpada noturna obscura que o Senhor conservava queimando acima dos seus infantes para mostrar-lhes que ele estava ali. Eles não sabiam que a própria noite era Deus". Por que temos presentes de Natal em lares cristãos? É porque os pais não amam os seus filhos em outros tempos? Não; mas é porque a mente se torna preguiçosa ante a generosidade meramente regular e há necessidade de dons especiais a despertar-lhe a gratidão. Deste modo, as nossas mentes preguiçosas e desamorosas necessitam de testemunhos especiais sobre a misericórdia divina. Será que só Deus silencia para as tolas uniformidades de ação? Será que só o Pai celeste é incapaz de produzir comunicações especiais de amor? Então, por que os milagres e aviva- mentos da religião não são constantes e uniformes? Porque as bênçãos uniformes seriam consideradas simplesmente mecânicas.
Como a crença na possibilidade dos milagres se apoia na nossa crença na existência de um Deus pessoal, assim a crença na probabilidade dos milagres se apoia na nossa crença de que Deus é um ser moral e benevolente. Aquele que não tem nenhum Deus, a não ser um Deus de ordem física considerará os milagres como uma importante intromissão na referida ordem. Mas aquele que cede ao testemunho da consciência e considera Deus como o Deus de santidade verá que a falta de santidade do homem toma a interposição miraculosa de Deus mais necessária ao homem e mais apropriada a Deus. Nosso ponto de vista sobre os milagres, portanto, será determinado pela nossa crença em um Deus moral, ou amoral.
Filo, Life of Moses, 1.88, falando dos milagres das codornizes e da água que jorrou da rocha, diz que "todas estas inesperadas e extraordinárias coisas são divertimentos e brinquedos de Deus". Ele crê que há lugar para arbitrariedade no procedimento divino. Contudo, a Escritura representa o milagre como um ato extraordinário e não arbitrário. É "a sua obra, a sua estranha obra ... o seu ato, o seu estranho ato" (Is. 28.21). O método extraordinário de Deus é o do crescimento e desenvolvimento regulares. Chadwick, Unitarianism, 72 - "A natureza é econômica. Se ela quer uma maçã, desenvolve uma folha; se quer um ramo, desenvolve uma vértebra. Sempre formulamos um bom pensamento a respeito da coluna vertebral; e se foi uma sugestão sadia de Goethe, agora pensamos melhor a respeito dela".
É prático, mas bem errôneo, admitir que o milagre requer um exercício maior de poder do que aceitarem-se os processos comuns naturais da parte de Deus. Porém as nossas medidas de tal poder não se aplicam a um Ser onipotente. A questão não se prende ao poder, mas à racionalidade e ao amor. O milagre implica uma limitação, bem como um desdobramento da parte daquele que o opera. Por isso não se trata de um método de ação divina comum; é adotado somente quando não bastam os regulares; freqüentemente parece acompanhado de um sacrifício de sentimento da parte de Cristo (Mt. 17.17 - "Ó geração incrédula e perversa! Até quando estarei convosco e até quando vos sofrerei? Trazei-mo aqui"; Mc. 7.34 - "levantando os olhos ao céu, suspirou e disse: Efatá, isto é, abre-te"; cf. Mt. 12.39 - "Uma geração má e adúltera pede um sinal, porém não se lhe dará outro sinal, senão o do profeta Jonas".
Do ponto de vista do monismo ético a probabilidade do milagre toma-se ainda maior. Porque Deus não é simplesmente a razão intelectual, mas a razão moral do mundo, as perturbações na sua ordem devidas ao pecado são matéria que o afetam mais profundamente. Cristo, a vida do sistema todo, assim como a humanidade, deve sofrer; e porque temos evidência de que ele é misericordioso e justo é provável que ele retificará o mal através de recurso extraordinário quando não forem suficientes os recursos simplesmente ordinários.
Como a criação e a providência, como a inspiração e a regeneração, o milagre é uma obra em que Deus limita-se a si mesmo, através de um novo e peculiar exercício do seu poder, como parte de um processo de amor condescendente e como recurso para ensinar a humanidade sob o senso do ambiente e o fardo do pecado o que não aprenderia de outro modo. Contudo, a limitação própria é a própria perfeição e glória de Deus, porque sem ela nenhum amor que a si mesmo se sacrifica seria possível (verp. 9 F). Por isso, defende-se a probabilidade dos milagres não só a partir da santidade de Deus, mas também do seu amor. O seu desejo de salvar os homens dos seus pecados deve ser de natureza infinita. A encarnação, a expiação, a ressurreição, quando se nos tornam conhecidas, recomendam-se, não só como satisfação das nossas necessidades humanas, mas como dignas da perfeição moral de Deus.
Um argumento em favor da probabilidade do milagre pode ser tirado das concessões de Thomas H. Huxley, um dos seus principais opositores modernos.
Em diferentes lugares, ele nos diz que o objetivo da ciência é "a descoberta
da ordem racional que permeia o universo"; apesar do seu agnosticismo declarado é um testemunho inconsciente da Razão e Vontade, base de todas as coisas. Diz-nos, ainda, que não há necessidade alguma na uniformidade da natureza: "Quando mudamos 'faremos' por 'devemos', introduzimos uma idéia de necessidade que não tem nenhuma garantia nos fatos observados, e nem de que eu posso descobri-la em parte alguma". Ele fala da "iniqüidade infinita que assistiu o curso da história humana". Contudo, não tem esperança de que o homem possa salvar-se a si mesmo: "Eu gostaria de, em breve, adorar a selvageria dos macacos", como a concepção panteísta de humanidade racionalizada. Ele admite que Jesus Cristo é "o mais nobre ideal que a humanidade jamais adorou". Por que ele não avançou e admitiu que Jesus Cristo com muito maior veracidade representa a Razão infinita no cerne das coisas e que a sua pureza e amor, demonstrados através do sofrimento e da morte tornam provável que Deus empregará extraordinários recursos em favor do livramento do homem? É de duvidar que Huxley reconhecesse a sua própria pecaminosidade pessoal tão plenamente como reconhecia a da humanidade em geral. Fizesse ele isso, e teria desejado aceitar o milagre até mesmo apoiado na mais leve base atribuída por Hume, a qual passaremos doravante a mencionar.
O testemunho necessário para provar um milagre
Não é maior do que o requisito para provar a ocorrência de qualquer outro evento incomum, mas perfeitamente possível.
Hume, na verdade, argumentava que o milagre é tão contraditório a toda a experiência humana que é mais razoável crer em qualquer soma de falso testemunho do que crer que um milagre seja possível.
A forma original do argumento pode ser encontrada em Hume, Philosophical Works, 4.124-150. Ver também Biblia Sacra, out. 1867.615. O argumento sustenta, em substância, que as coisas são impossíveis porque são improváveis. Ele ridiculariza a credulidade daqueles que "comprimem os seus punhos contra os postes E ainda insistem em ver os espíritos", apoia o filósofo alemão que declara não crer em milagre mesmo que veja com os seus próprios olhos. O cristianismo é tão miraculoso que produz o milagre para fazer alguém crer nele.
O argumento é falaz porque:
É acusável de petitio principi, fazendo a nossa experiência pessoal a medida de toda a experiência humana. O mesmo princípio tomaria impossível a prova de qualquer fato novo. Mesmo operando um milagre, Deus nunca o poderia provar.
Envolve uma autocontradição porque procura derrotar a nossa fé no testemunho humano acrescentando ao contrário a experiência geral dos homens de que conhecemos só a partir do testemunho. Tal experiência geral, contudo, é simplesmente negativa e não pode neutralizar a que é positiva a não ser apoiada em princípios que invalidariam todo o testemunho qujalquer que seja.
Requer crença em uma maravilha maior do que aquelas que escapariam. Que a multidão de homens inteligentes e honestos se uniriam contra todos os seus interesses na deliberada e persistente falsidade sob as circunstâncias narradas no Tegistt o doNovoTestamento, envolve uma mudança nas seqüências da natureza bem mais incríveis do que os milagres de Cristo e de seus apóstolos.
John Stuart Mill, Essays on Theism, 216-241, admite que, mesmo que tivesse ocorrido um milagre, seria impossível prová-lo. Nisto ele só repete Hume, Miracles, 112 - "O padrão último através do qual determinamos todas polêmicas que podem surgir derivam sempre da experiência e da observação". Porém neste ponto a nossa experiência pessoal torna-se o padrão através do qual se julga toda experiência humana. Whately, Hist. Doubts, relativas a Napoleão Bonaparte, mostra que a mesma regra exigiria que negássemos a existência do grande francês, porque as conquistas dele contrariam toda experiência e as nações civilizadas nunca tinham sido subjugadas anteriormente. O Periódico Londrino de 18 de junho de 1888, pela primeira vez em pelo menos cem anos ou em 31.200 edições, apareceu com a data errada e em algumas páginas lia-se 17 de junho apesar de que esse dia era domingo. Contudo esse jornal o teria admitido em uma corte de justiça como evidência de um casamento. A verdadeira maravilha não é a falha na experiência, mas a sua continuidade sem a falha.
Lyman Abbott: "Se o Velho Testamento contasse a história de uma batalha naval entre o povo judeu e um pagão, em que todos os navios dos pagãos fossem absolutamente destruídos e nenhum só homem entre os judeus foi morto, todos os céticos teriam escarnecido da narrativa. Agora todos crêem na narrativa, exceto os que moram na Espanha" (Trata-se do fato histórico da Invencível Armada). Há pessoas que, de igual modo, recusam-se a investigar os fenômenos do hipnotismo, segundo a vista, a clarividência e a telepatia, declarando a priori que todas essas coisas são impossíveis. Desacredita-se a profecia no sentido de predição. Com base no mesmo princípio, o telégrafo sem fio poderia ser denunciado como uma impostura. O filho de Erin, acusado de homicídio, defendeu-se dizendo: "Meritíssimo, eu posso trazer cinqüenta pessoas que não me viram cometer tal ato". A nossa fé no testemunho não pode dever-se à experiência.
Força Evidenciai dos Milagres
Os milagres são os acessórios e atestados naturais das novas comunicações da parte de Deus. As grandes épocas dos milagres - representadas por Moisés, pelos profetas, pela primeira e pela segunda vindas de Cristo - coincidem com as grandes épocas da revelação. Os milagres servem para atrair a
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atenção para uma nova verdade e cessam quando esta nova verdade ganhou curso e apoio.
Os milagres não estão disseminados uniformemente em todo o curso da história. Poucos são registrados durante os 2.500 anos no período entre Adão e Moisés. Quando o Cânon do Novo Testamento se completou e a evidência interna da Escritura atingiu a plenitude da sua força, os atestados exteriores através do milagre ou são afastados ou começam a desaparecer. As maravilhas espirituais da regeneração permanecem e por estas o caminho tem sido preparado pelo longo progresso desde os milagres do poder operado por Moisés até os da graça operados por Cristo. Os milagres desapareceram porque mais recentes e mais elevadas provas os tornaram desnecessários. Melhores coisas do que estas estão agora em evidência. Thomas Fuller: "Milagres são cueiros da igreja infante". John Foster: "Os milagres são o grande sino do universo que convoca os homens para o sermão de Deus". Henry Ward Beecher: "Os milagres são as parteiras das grandes verdades morais; as velas acendem antes do nascer do sol, mas apagam-se após o seu aparecimento". Illingworth, Lux Mundi, 210 - "Quando nos dizem que os milagres contradizem a experiência, apontamos para a ocorrência diária do milagre espiritual da regeneração e perguntamos: 'Que é mais fácil? Dizer ao paralítico: Perdoados te são os teus pecados, ou: Levanta-te e anda?' (Mt. 9.5)".
Os milagres e a inspiração caminham juntos; se aqueles permanecem na igreja, esta também. A. J. Gordon, Ministry of the Spirit, 167 - "Os apóstolos foram comissionados para falar por Cristo até que as Escrituras do N.T., voz de autoridade dele, se completassem; o primeiro ser dotado de autoridade ad Ínterim para perdoar pecados, e o segundo com autoridade in perpetuo".
O Dr. Gordon traça uma analogia entre o carvão, que é a luz solar fossilizada, e o Novo Testamento que é a inspiração fossilizada. Sabatier, Philos. Religion, 74 - "A Bíblia está bem livre dos prodígios da mitologia oriental. Os grandes profetas - Isaías, Amós, Miquéias, Jeremias, João Batista, não operaram nenhum milagre. A tentação de Jesus no deserto é uma vitória da consciência moral sobre a religião do mero prodígio físico". Trench diz que os milagres agrupam-se em torno da fonte do reino teocrático sob o governo de Moisés e de Josué, e em torno da restauração desse reino sob Elias e Eliseu. No A.T., os milagres refutam os deuses do Egito sob Moisés, o Baal fenício sob Elias e os deuses da Babilônia sob Daniel.
Os milagres geralmente certificam a verdade da doutrina não direta, mas indiretamente; de outra forma um novo milagre necessitaria acompanhar cada nova doutrina ensinada. Os milagres, em primeiro lugar e diretamente, certificam a comissão e autoridade divinas de um mestre religioso e, portanto, garantem a aceitação das suas doutrinas e aceitação das ordens de Deus, quer sejam comunicadas em intervalos, quer juntos, oralmente ou em documentos escritos.
As exceções do que se afirmou acima são bem poucas & ocorrem apenas em casos que não envolvem alguma doutrina fragmentária, mas toda comissão e autoridade de Cristo. Jesus apela para os seus milagres como prova da verdade do seu ensino em Mt. 9.5,6 - "Que é mais fácil? Dizer ao paralítico: Perdoados te são os teus pecados, ou: Levanta-te e anda? Ora, para que saibais que o Filho do Homem tem na terra autoridade para perdoar pecados
disse então ao paralítico: Levanta-te, toma a tua cama e vai para a tua casa"; 12.28 - "se eu expulso os demônios pelo Espírito de Deus, é consequentemente chegado a vós o Reino de Deus". Do mesmo modo Paulo em Rm. 1.4 diz que Jesus "foi declarado Filho de Deus em poder... pela ressurreição dos mortos". Mair, Christian Evidences, 223, cita de Natural Religion,
181 - "Conta-se que o teofilântropo Larévellière-Lépeaux confidenciou a Talleyrand seu desapontamento com o insucesso na tentativa de trazer à voga um tipo de cristianismo melhorado, um tipo de racionalismo benévolo, que ele inventara para ir ao encontro dos anseios de uma era benévola. 'Sua propaganda não vingou', disse ele. 'O que teria acontecido'? perguntou. O ex-bispo Talleyrand educadamente lamentou, temeu ser difícil a tarefa de descobrir uma nova religião, e mais difícil do que imaginava, tão difícil que não tinha condições de aconselhá-lo. 'Ainda', depois de alguns momentos de reflexão,
'há um plano que você poderia pelo menos tentar: Eu recomendaria que você fosse crucificado e ressuscitasse ao terceiro dia".
Portanto, os milagres, não são as únicas evidências. O poder sozinho não prova a comissão divina. A pureza da vida e a doutrina devem acompanhar os milagres para garantir-nos que um mestre religioso veio da parte de Deus. Os milagres e a doutrina sustentam-se um ao outro e fazem parte de um todo. A evidência interna do sistema cristão pode ter maior força em certas mentes e em certas épocas do que a evidência externa.
O aforismo de Pascal - "as doutrinas devem ser julgadas pelos milagres e os milagres pelas doutrinas" - necessita de ser suplementado pela afirmação de Mozley de que "um fato sobrenatural é a própria prova de uma doutrina também sobrenatural, conquanto esta não é a própria prova de um fato sobrenatural". E. G. Robinson, Christian Theology, 107, "defende os milagres, mas não faz deles um apoio para o Cristianismo. ... Quantidade nenhuma de milagres pode convencer um bom homem da comissão divina de um homem reconhecidamente mau; nem, por outro lado, qualquer tipo de poder miraculoso basta para silenciar as dúvidas de um ser humano de má índole.
... O milagre é uma certificação só para aquele que pode perceber o seu sentido. ... A igreja cristã tem em si a ressurreição sobrescrita. Sua própria existência é a prova da ressurreição. Doze homens nunca poderiam tê-la fundado, se Cristo tivesse permanecido na tumba. A igreja viva é a sarça ardente que não se consumiu". Gore, Incarnation, 57 - "Após a ressurreição, Jesus não apareceu aos incrédulos, mas só aos crentes, o que significa a coroação de uma fé já existente, não a criação de uma fé que não existia".
Christian Union, 11 de jul. de 1891 - "Se a antecipada ressurreição de Joseph Smith tivesse ocorrido, nada acrescentaria à autoridade dos Mórmons".
Schurman, Agnosticism and Religion, 57 - "Os milagres são apenas sinos a chamar os povos primitivos para a igreja. Doces como a música que outrora faziam, os ouvidos modernos os acham desagradáveis e desentoados e suas notas dissonantes afugentam almas piedosas que, resignadas, entrariam no templo de adoração". Uma nova definição de milagre que reconhece sua possível classificação como ocorrências extraordinárias na natureza, embora vendo em toda ela a obra do Deus vivo, pode remover tal preconceito. Bispo de Southampton, Place of Miracles, 53 - "Sozinhos, os milagres não podem produzir convicção. Os fariseus os atribuíam a Belzebu. Embora Jesus tivesse feito tantos sinais, não creram. ... Embora fossem operados com tanta freqüência, raramente constituíam-se um apelo para a evidência do evangelho. Eram apenas sinais da presença de Deus no mundo. Por si só o milagre não tem força evidenciai. O único teste distintivo dos milagres divinos em oposição aos satânicos é o caráter moral e o propósito de quem os opera; em vista disto, por sua força na apreciação anterior, os milagres dependem do caráter e personalidade de Cristo (79). Os mais antigos apologistas não se valiam dos milagres. Estes não tinham valor a não ser em conexão com a profecia."
Os milagres são a revelação de Deus não a sua prova.
Contudo, os milagres cristãos não perdem o seu valor evidenciai no correr dos tempos. Quanto mais elevada for a estrutura da vida e da doutrina cristãs maior a necessidade da sua segurança. A autoridade de Cristo como mestre de verdade sobrenatural apoia-se em seus milagres e especialmente no da sua ressurreição. O milagre a que a igreja remonta como a fonte da sua vida leva consigo irresistivelmente todos os outros mil registrados na Escritura; só nele podemos firmar com segurança a prova de que as Escrituras são uma revelação de autoridade da parte de Deus.
Os milagres de Cristo são simples correlatos da Encarnação - a própria insígnia da sua realeza e divindade. Contudo, através da mera evidência externa podemos mais facilmente provar a ressurreição do que a encarnação. Em nossos argumentos para com os céticos não devemos começar com a jumenta de Balaão, ou o peixe que engoliu Jonas, mas com a ressurreição de Cristo; admitido isto, todos os outros milagres bíblicos parecerão apenas preparação natural, acessórios, ou conseqüências. G. F. Wright, Biblia Sacra, 1889.707 - "As dificuldades criadas pelo caráter miraculoso do cristianismo podem ser comparadas às assumidas pelo construtor quando se deseja grande permanência na estrutura que foi levantada. É mais fácil lançar o alicerce de uma estrutura temporária do que a de uma que deve resistir por séculos". Pressencé: "A tumba vazia de Cristo foi o berço da igreja e, se neste fundamento da fé a igreja tem-se equivocado, afirmo que ela deve ter necessidade de lançar-se junto aos restos mortais, não de um homem, mas de uma religião".
Presidente Schurman crê que a ressurreição de Cristo seja um "quadro obsoleto de uma verdade eterna - o fato de uma vida contínua com Deus. Harnack, Wesen des Christenthums, 102, pensa que não há nenhuma união consistente dos relatos da ressurreição de Cristo contidos nos evangelhos; aparecem dúvidas sobre uma ressurreição literal e física; contudo, o cristianismo remonta a uma fé invencível na vitória de Cristo sobre a morte. Mas por que crer nos evangelhos quando falam da simpatia de Cristo e descrer deles quando falam do poder miraculoso? Não temos direito de confiar na narrativa quando nos apresentam as palavras de Cristo "Não chores" à viúva de Naim,
(Lc. 7.13), e desconfiar dela quando nos fala da ressurreição do seu filho.
As palavras "Jesus chorou" pertencem inse^aravelmente à história de que faz parte a expressão "Lázaro, sai para fora" (Jo. 11.25,43). É improvável que os discípulos tivessem crido num tão estupendo milagre como o da ressurreição de Cristo, se não tivessem antes visto outras manifestações do poder miraculoso da parte dele. O próprio Cristo é o grande milagre. A sua concepção como o Salvador ressurrecto e glorificado só pode ser explicada pelo fato de que ele ressuscitou. E. G. Robinson, Theology, 109 - "A igreja atesta o fato da ressurreição exatamente do mesmo modo que atesta a origem divina da igreja. Como uma evidência, a ressurreição depende da existência da igreja que a proclama".
A ressurreição do Nosso Senhor Jesus Cristo - pela qual significamos a saída do sepulcro em corpo e em espírito - é demonstrada pela evidência como variada e conclusiva que nos prova qualquer fato da história antiga. Sem ela o próprio cristianismo é inexplicável como a falha das modernas teorias racionalistas mostram no seu aparecimento e progresso.
Ao discutir a evidência da ressurreição de Jesus, defrontamo-nos com três teorias racionalistas:
Teoria do desmaio, de Strauss. Ele sustenta que Jesus na verdade não morreu. O frio e as especiarias despertaram-no. Respondemos que o sangue e a água e o testemunho do centurião (Mc. 15.45) provam que ele estava realmente morto. A pedra removida e a força imediata de Jesus logo depois, são inconsistentes com o desmaio e suspensa animação imediatamente antes. Como foi preservada a sua vida? aonde ele foi? quando ele morreu? a não morte dele implica mentira da parte dele ou da parte dos seus discípulos.
Teoria do espírito, de Keim. Na verdade morreu, mas apareceu apenas o seu espírito. O espírito deu aos discípulos um sinal da sua vida contínua, uma espécie de telegrama do céu. Porém respondemos que o telegrama não foi verdadeiro porque afirmou que o seu corpo ressuscitou do sepulcro.
O sepulcro estava vazio e as peças de linho mostraram uma saída ordeira.
O próprio Jesus negou que fosse um espírito sem corpo: "um espírito não tem carne nem ossos, como vedes que eu tenho (Lc. 24.39). A "sua carne viu corrupção" (At. 2.31)? O ladrão arrependido ressuscitou dos mortos como ele? Godet, Lectures in Defence ofthe Christian Faith, prel. i: Um dilema para os que negam o fato da ressurreição de Cristo: ou o seu corpo permaneceu nas mãos dos seus discípulos ou foi entregue aos judeus. Se os discípulos o retivessem, seriam impostores: mas os racionalistas modernos não defendem isto. Se os judeus o retiveram, por que não o apresentaram como evidência contra os discípulos?
Teoria da visão, de Renan. Jesus morreu e não houve nenhuma aparição objetiva até mesmo do seu espírito. Maria Madalena foi vítima de alucinação subjetiva contagiante. Isto ocorreu porque os judeus esperavam que o Messias operasse milagres e que ressuscitaria dentre os mortos. Respondemos que os discípulos não esperavam a ressurreição de Jesus. As mulheres não foram ao sepulcro para ver o Redentor ressuscitado, mas para embalsamar um corpo morto. Tomé e os que caminhavam para Emaús abandonaram toda esperança. Quatrocentos anos tinham-se passado desde os dias dos milagres; João Batista "não fez nenhum sinal" (Jo. 10.41); os saduceus diziam "não haver ressurreição" (Mt. 22.23). Houve treze aparições diferentes: 1. a Maria Madalena; 2. a outras mulheres; 3. a Pedro; 4. aos caminhantes de Emaús; 5. aos doze; 6. novamente, após oito dias, aos doze; 7. junto ao mar da Galiléia; 8. na montanha na Galiléia; 9. a quinhentas pessoas na Galiléia; 10. a Tiago; 11. ascensão em Betânia; 12. a Estêvão; 13. a Paulo, no caminho de Damasco. Paulo descreve o aparecimento de Cristo a ele como algo não subjetivo, mas objetivo e implica que os aparecimentos anteriores de Cristo aos outros também foram objetivos: "por derradeiro de todos [os aparecimentos físicos], ... me apareceu também a mim" (1 Co. 15.8). Bruce, Apologetics, 396 - "O interesse e intenção de Paulo em classificar ambas juntas era nivelar a sua própria visão [de Cristo] à objetividade das cristofanias primitivas. Ele cria que os onze, particularmente Pedro, tinham visto o Cristo ressurrecto com os olhos do seu corpo e reivindicava para si uma visão do mesmo tipo". Paulo tinha uma natureza sã e forte. Visões subjetivas não transformam vidas humanas; a ressurreição moldou os apóstolos; eles não criaram a ressurreição. Tais aparições logo cessaram, diferentemente da lei das alucinações, que aumentam em freqüência e intensidade. É impossível explicar as ordenanças, o dia do Senhor, e até o próprio cristianismo, se Jesus não ressuscitou dentre os mortos.
A ressurreição de nosso Senhor ensina três importantes lições: 1) Mostra que a sua obra da expiação completou-se e obteve a aprovação divina:
Que ele é o Senhor de tudo e que deu uma suficiente prova externa do cristianismo; 3) Forneceu a base e penhor da nossa ressurreição e deste modo "trouxe à luz a vida e a incorrupção" (2 Tm. 1.10). Convém lembrar que a ressurreição foi o único sinal sobre o qual o próprio Jesus apoiou as suas reivindicações - "o sinal de Jonas" (Lc. 11.29); e que a ressurreição não é só uma prova do poder de Deus, mas do poder do próprio Cristo: Jo. 10.18 — "tenho poder para a dar e para tornar a tomá-la"; 2.19- "Derribai este templo, e em três dias o levantarei". ... 21 - "ele falava do templo do seu corpo".
6. Falsos Milagres
Porque só um ato operado por Deus pode, com propriedade, ser chamado de milagre, segue-se que os eventos surpreendentes operados pelos espíritos maus ou por homens através do uso de agentes além do nosso conhecimento não têm o direito a esta designação. As Escrituras reconhecem a sua existência, mas os chamam de "prodígios de mentira" (2 Ts. 2.9).
Estes falsos milagres em várias épocas mostram que a crença neles é natural à raça e em algum lugar deve existir a verdade. Servem para mostrar que nem todas ocorrências sobrenaturais são divinas e mostrar a necessidade de cuidadoso exame antes de aceitá-las como divinas.
Os falsos milagres comumente podem distinguir-se dos verdadeiros: d) pela conduta imoral que os acompanha ou doutrina contrária à verdade já revelada
como no espiritismo moderno; b) por suas características interiores de ina-
nidade e extravagância - como na liquefação do sangue de São Januário, ou nos milagres do Novo Testamento Apócrifo; c) pela insuficiência de objetivos que se propõem a promover - como no caso de Apolônio de Tiana, ou dos milagres que se dizem acompanhar a publicação das doutrinas da Imaculada CowceÃçãa e, da. w&ivhU.vàada d) %\j&. ÇaJifca. 8i8óvtoç 'õeov) = doação não é um episódio no seu ser - dar é a sua natureza. E não só dar, mas dar a si mesmo.
Isto acontece eternamente na comunicação de si mesmo na Trindade; isto ele faz transitivamente, e temporariamente ao entregar-se em nosso benefício na pessoa de Cristo, e a nós na pessoa do Espírito Santo.
Jonathan Edwards, Essays on Trinity, (ed. G. P. Fisher), 79 - "O fato de que em João, Deus é amor mostra que há mais do que uma pessoa na divindade, pois mostra que o amor é essencial e necessário à divindade, de sorte que a sua natureza consiste nela, o que leva a supor que há um objeto eterno e necessário, porque todo amor se relaciona com outro que é amado. Para o apóstolo, amor significa algo além do que vulgarmente se chama amor-próprio, que impropriamente é chamado amor e que é de natureza muito diferente do sentimento ou virtude do amor de que o apóstolo está falando". Quando Newman Smith, Christian Ethics, 226-239, considera o amor a primeira carate- rística da auto-afirmação e quando Dorner, Christian Ethics, 73, faz da auto- afirmação parte essencial do amor, estão violando o emprego lingüístico ao incluir sob a palavra amor o que apropriadamente pertence à santidade.
O amor imanente de Deus constitui a base da bem-aventurança divina. Porque há um objetivo do amor infinito e perfeito assim como do conhecimento e vontade na natureza a existência do universo não é necessária à sua serenidade e alegria.
A bem-aventurança não é por si mesma um atributo divino; ao invés disto é o resultado do exercício dos atributos divinos. É um resultado subjetivo deste exercício do mesmo modo em que a glória é um resultado objetivo.
As faculdades perfeitas com os objetos perfeitos para o seu exercício garantem a felicidade de Deus. Entretanto, o amor é de um modo especial a sua fonte. At. 20.35 - "Mais bem-aventurada coisa é dar do que receber". Felicidade (ingl. happiness [hap, happen = ocorrer, acontecer]) baseia-se nas circunstâncias; a bem-aventurança, no caráter.
O amor precede a criação e é a sua base. Por isso o seu objeto não pode ser o universo porque ele não existe e, se não existia, não podia ser o apropriado objeto do amor de um Deus infinito. O único objeto do seu amor é a imagem da sua própria perfeição, porque só ela é igual a ele mesmo. Upton, Hibbert Lectures, 264 - De um modo mais verdadeiro o homem realiza a sua própria natureza quando ele é dirigido pelo amor racional, que se esquece de si mesmo. Ele não pode ajudar a inferir que a coisa mais elevada na consciência do indivíduo é o elemento dominante em toda a extensão do universo". Podemos aqui concordar, se nos lembrarmos de que não o próprio amor, mas
o que é amado deve ser o elemento dominante e veremos que não é o amor, mas a santidade.
Jones, Robert Browning, 219 - Para Browning, o amor é o conceito mais elevado, mais rico que o ser humano pode formar. É a nossa idéia daquilo que é perfeito; nem mesmo podemos imaginar algo melhor. A idéia de evolução explica necessariamente o mundo como a volta do mais elevado para si mesmo. O universo volta para o seu limite. ... Potencialmente tudo é espírito e todos os fenômenos do mundo são manifestações do amor.... A emanação direta do mais íntimo ser de Deus não é a razão do homem, mas o homem". (345) Browning deveria ter aplicado à verdade e à santidade o mesmo princípio que ele reconheceu a respeito do amor. Mais gratos nos sentimos em aceitar os seus ditos: "Aquele que criou o amor não ama? ... Deus! Tu és o amor! Nisto edifico a minha fé".
O amor de Deus envolve também a possibilidade do sofrimento divino e o sofrimento por causa do pecado que a santidade necessita da parte de Deus é em si a expiação.
Cristo é "o Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo" (Ap. 13.8);
Pe. 1.19,20 - "com o precioso sangue de Cristo, como de um cordeiro imaculado e incontaminado, o qual, na verdade, noutro tempo foi conhecido, ainda antes da fundação do mundo". Enquanto a santidade requer expiação, o amor a provê. A felicidade de Deus é consistente com a tristeza da miséria humana e do pecado. Deus é passível ou capaz de sofrimento. A permissão do mal moral no decreto da criação foi custosa para Deus. A Escritura atribui-lhe emoções de pesar e ira contra o pecado humano (Gn. 6.6 - "pesou-lhe em seu coração"; Rm. 1.18 - "a ira de Deus"; Ef. 4.30 - "Não entristeçais o Espírito Santo de Deus"); doloroso sacrifício na entrega de Cristo (Rm. 8.32 - "nem mesmo a seu próprio filho poupou"; cf. Gn. 22.16 - "não negaste o teu filho") e a participação no sofrimento do seu povo (Is. 63.9 - "em toda angústia deles foi ele angustiado"); Jesus Cristo em sua tristeza e simpatia, lágrimas e agonia, é o revelador dos sentimentos de Deus para com a raça e somos estimulados a seguir os seus passos, para sermos perfeitos, como perfeito é o Pai que está no céu. Na verdade, não podemos conceber amor sem sacrifício próprio, nem sacrifício próprio sem sofrimento. Parece, então, como a imutabilidade é inconsistente com as volições imperativas na história humana, do mesmo modo a felicidade de Deus pode ser consistente com as emoções de tristeza.
Mas será que Deus sente, na proporção da sua grandeza, como a mãe sofre mais do que o filho doente de quem ele cuida? Será que Deus sofre infinitamente a cada sofrimento das suas criaturas? Devemos lembrar que Deus é infinitamente maior que a sua criação e que vê todo o pecado humano e sofrimento como parte do seu grande plano. Só temos o direito de atribuir- lhe só tal passibilidade quando ela é consistente com a infinita perfeição. Combinando a passibilidade com a felicidade, então, concordaremos com que a felicidade seja o elemento controlador, porque a nossa idéia fundamental de Deus é a da perfeição absoluta. Martensen, Dogmatics, 101 - "Esta limitação é devorada no interior da perfeição que Deus vive, em independência total da sua criação e numa perspectiva triunfante do cumprimento dos seus grandes desígnios. Por isso podemos dizer com os velhos escritores teosóficos: 'Nas câmaras exteriores está a tristeza, mas nas interiores o gozo não confuso'". Cristo foi "ungido com óleo de alegria mais do que os seus companheiros" e "pelo gozo que lhe estava proposto, suportou a cruz" (Hb. 1.9; 12.2). O amor se regozija mesmo na dor, quando esta faz bem aos amados. "O eterno brilho do sol se estabelece à sua cabeça embora as nuvens circundantes que se espalham rondem a sua base".
Na George Adam Smith's Life, 11, Drummond clama por ouvir as confissões dos homens que vêm a ele: "Sinto-me doente com os pecados destes
homens! Como é que Deus agüenta?" Simon, Reconciliation, 338-343, mostra que, antes da encarnação, o Logos sofria por causa dos pecados dos homens. Contudo, este sofrimento foi verificado e contrabalançado por sua consciência como um fator da divindade e pelo nítido conhecimento de que os próprios homens são a causa de tal sofrimento. Depois da sua encarnação, ele sofreu sem saber de onde veio todo o sofrimento. Tinha uma vida subconsciente em que se entrelaçavam elementos devidos à conduta pecaminosa da raça cuja energia foi extraída dele mesmo e em acréscimo uniu-se a ela. Se isto é limitação, é também autolimitação que Cristo poderia ter evitado deixando de criar, preservar e redimir a humanidade. Nós nos alegramos em entregar a filha a um casamento apesar de que isto resulte em dor. A mais elevada felicidade do cristão coincide com a agonia pelas almas dos outros. Participamos da alegria de Cristo só quando conhecemos a comunhão dos seus sofrimentos. Gozo e tristeza podem coexistir, como o fogo grego, que queima sob a água.
Abbé Gratry, La Morale et Ia Loi de l'Histoire, 165,166 - O quê! Você realmente supõe que o Deus pessoal, livre e inteligente, que ama e é bom, que conhece cada pormenor da tortura humana e ouve cada suspiro - este Deus que vê, que, como nós, ama, e o faz mais do que nós - você crê que ele está presente e sem piedade olha para o que quebranta o seu coração e, o que para ele deve ser o espetáculo de Satanás revelado no sangue da humanidade? A história nos ensina que deste modo os homens sentem pelos sofredores que eles foram tirados para morrer com eles de sorte que os seus executores se tornaram os próximos mártires. E ainda você representa Deus, a bondade absoluta, apenas como impassível? Aí é que entra a nossa fé evangélica. O nosso Deus se fez homem para sofrer e morrer! Sim, eis aqui o verdadeiro Deus. Desde o princípio ele sofreu em todos que sofreram. Ele teve fome em todos que tiveram fome. Ele foi imolado em todos e com todos que ofereceram as suas vidas. Ele é o Cordeiro desde a fundação do mundo". Do mesmo modo Alexander Vinet, Vital Christianity, 240, assinala que, "O Deus sofredor não é somente o ensino dos teólogos modernos. É o pensamento de um Novo Testamento e é alguém que responde todas as dúvidas que surgem à vista do sofrimento humano. Saber que Deus está sofrendo torna esse sofrimento mais terrível, porém dá força e vida e esperança, pois sabemos que, se Deus está nele, o sofrimento é a estrada da vitória. Ele participa do nosso sofrimento e nós participaremos a sua coroa", e podemos dizer com o salmista, 68.19 - "Bendito seja o Senhor, que de dia em dia nos cumula de benefícios; o Deus que é a nossa salvação", e com Is. 63.9
"Em toda angústia deles foi ele angustiado e o Anjo da sua presença os salvou".
Borden P. Bowne, Atonement: "Algo como esta obra da graça é uma necessidade da graça para com a obra de Deus. Terrível a responsabilidade lançada com as suas temíveis possibilidades do bem e do mal. Por isso Deus se submete à obrigação infinita de cuidar da sua família humana; e as reflexões sobre a sua posição como criador e governador, em vez de remover só tornam mais patente esta obrigação. Enquanto concebermos Deus sentado separado na tranqüilidade suprema e satisfação própria, ele não é, afinal de contas, amor, mas tão somente um reflexo do nosso egoísmo e vulgaridade.
Enquanto o concebemos como doador de bênçãos sobre nós por causa da sua plenitude infinita, mas sem custar nada de real para si mesmo, ele mergulha a um nível inferior ao dos heróis da nossa raça. Sempre é possível um pensamento mais elevado, até que vejamos Deus tomando o mundo sobre o seu coração, comungando com a nossa tristeza, e tornando-se o portador do nosso supremo fardo e líder no sacrifício próprio. Só então as possibilidades da graça e da condescendência e do amor e do heroísmo se enchem de modo que não haja nada de mais elevado. E a obra de Cristo, enquanto um evento histórico, deve ser vista não simplesmente como uma peça da história, mas também como uma manifestação daquela cruz oculta no amor divino desde a fundação do mundo e que está envolvida na existência do mundo todo".
Royce, Spirit of Modem Philosophy, 264 - "A eterna resolução de que, se o mundo há de ser trágico, ainda será, apesar de que Satanás, um ser espiritual, é a própria essência do gozo desse Espírito do Mundo de cuja sabedoria a nossa é apenas um reflexo fragmentário. ... Quando você sofre, os seus sofrimentos são de Deus; não a sua obra exterior, nem a sua pena externa, nem o fruto da sua negligência, mas de modo idêntico a sua dor pessoal.
Em você o próprio Deus sofre, exatamente como você, e tem toda a razão que você tem para vencer esta mágoa". Henri N. Dodge, Christus Victor. "Ó tu, que, desde a eternidade, sobre o teu coração ferido, suportas cada dor lancinante e grito de miséria em que o nosso coração humano se dilacera, na dolorosa cruz teu amor, fanal do tempo, arde, sempre compartilhando a dor e a perda em cada ser humano em todo o lugar. Quão grande, quão grande sacrifício, indo e vindo os séculos, esperando-o até que o sacrifício retire o último gélido e tardio coração!"
Santidade
Santidade é a pureza auto-afirmada. Em virtude deste atributo da sua natureza, Deus eternamente quer e mantém sua excelência moral. Esta definição contém três elementos: primeiro, pureza; segundo, vontade de pureza; terceiro, vontade de pureza em si mesma.
Ex. 15.11 - "glorificado em santidade"; 19.10-16 - o povo de Israel deve purificar-se antes de vir à presença de Deus; Is. 6.3 - "Santo, santo, santo é o Senhor dos Exércitos" - note o contraste com os lábio impuros, que devem ser purificados com uma brasa tirada do altar (v. 5-7); 2 Co. 7.1 - "purifique- mo-nos de toda a imundícia da carne e do espírito, aperfeiçoando a santificação no temor de Deus"; 1 Ts. 3.13 - "irrepreensíveis em santidade"; 4.7 - "Deus não nos chamou para a imundícia, mas para a santificação"; Hb. 12.29
"o nosso Deus é um fogo consumidor" - de toda a iniqüidade. Estas passagens mostram que a santidade se opõe à impureza e que santidade é pureza.
O desenvolvimento do conceito de santidade na história hebraica era, sem dúvida, gradual. No começo pode ter incluído pouco mais do que a idéia de separação de tudo o que é comum, pequeno e fraco. A limpeza física e a
aversão pelo mal moral foram elementos adicionais que, com o tempo tornaram-se dominantes. Contudo devemos lembrar que o sentido próprio de um termo deve ser determinado não pelo uso primitivo mas pelo recente. A natureza humana é ética desde o começo e procura expressar o pensamento de uma regra ou padrão de obrigação e de um Ser justo que impõe essa regra ou padrão. Aos primeiros conceitos de majestade e separação que se ligam à apreensão da divindade na infância da raça mistura-se ao menos um certo sentido do contraste entre a pureza de Deus e o pecado do homem. O homem menos desenvolvido tem uma consciência que condena algumas formas de cometer erro, e causa um sentimento de separação entre o poder e os poderes superiores. A contaminação física torna-se um símbolo natural do mal moral. Investem-se lugares e vasos e ritos de dignidade associada com a divindade ou consagrada a ela.
O fato de que só aos poucos esse conceito de santidade purifica-se dos elementos estranhos e não essenciais e recebe expressão plena só na revelação do Novo Testamento e especialmente na vida e obra de Cristo não nos deve cegar sobre o fato de que os germes da idéia estão bem atrás, no começo da existência do homem na terra. Mesmo aí o sentido de erro interior teve como seu correlato uma justiça exterior obscuramente reconhecida. Tão logo o homem conhece a si mesmo como um pecador, passa a conhecer algo da santidade do Deus que ele ofendeu. Por isso devemos abrir exceção à nota de Schurman, Belief in God, 231 - "Provavelmente os primeiros deuses não eram seres morais", pois o próprio Schurman já havia dito: "Um Deus sem caráter moral na realidade não é Deus". Dillmann, O. T. Theology, com muita propriedade, faz do pensamento fundamental da religião do A.T. não a unidade ou a majestade de Deus, mas a sua santidade. Só isto forma a base ética da revelação e da lei. E. G. Robinson, Christian Theology -"O único objetivo do cristianismo é a santidade pessoal. Mas este será o objetivo que absorve e atinge o homem só quando este reconhece ser o atributo proeminente em Deus. Daí tudo o que é divino é santo - o templo, as Escrituras, o Espírito".
O desenvolvimento da idéia de santidade assim como da idéia de amor foi preparado antes do advento do homem. A. H. Strong, Education and Optimism: "Houve tempo quando a história passada da vida sobre o planeta parecia a de carnificina sem coração e cruel. A sobrevivência do mais adequado teve como o outro lado da moeda a destruição de miríades. A natureza tinha o dente vermelho e garras de ravina'. Porém o pensamento mais tarde mostrou que este ponto de vista sombrio resulta de uma indução parcial dos fatos. A vida paleontológica foi marcada não só por uma luta pela vida, mas por uma luta pela vida dos outros. O começo do altruísmo deve ser visto no instinto de reprodução e no cuidado dos filhos. Em cada cova de leões e toca dos tigres, na provisão de alimentos da águia para com os filhotes, há um sacrifício que palidamente mostra a subordinação dos interesses do homem aos interesses dos outros. Mas, nas priscas eras do homem, pode ser encontrada a justiça numa forma incipiente como também o amor numa forma incipiente. A luta pela vida própria tem seu lado moral do mesmo modo que a luta pela vida dos outros. O instinto de autopreservação é o princípio do direito da retidão, da justiça e da lei terrena. Cada criatura tem o dever diante de Deus de preservar o seu próprio ser. Deste modo podemos achar um esboço da
moralidade até mesmo na luta predatória e exterminadora das eras geológicas. O Deus imanente estava preparando o caminho para o direito, a dignidade, a liberdade do ser humano'. E, podemos acrescentar, estava preparando o caminho para o entendimento do seu próprio atributo fundamental da santidade pelos homens.
Para maior explicação assinalamos que:
Negativamente, a santidade não é:
Justiça ou pureza exigindo a pureza das criaturas. Justiça, atributo relativo ou transitivo, na verdade é a manifestação e expressão do atributo imanente da santidade, mas não deve ser confundido com ele.
Quenstedt, Theol., 8.1.34, define santidade como "summa omnisque labis expers in Deo puritas, puritatem debitam exigens a creaturis" - definição de santidade transitiva, ou justiça, em vez do atributo imanente. Is. 5.16 - "O Senhor dos exércitos será exaltado em juízo, e Deus, o santo, será santificado em justiça" = a justiça é somente a santidade de Deus em sua atividade judicial. Apesar de que a santidade normalmente é um termo de separação e expressa a oposição inerente de Deus a todo o que é pecador, também é empregada como um termo de união, como em Lv. 11.44 - "serei santos porque eu sou santo". Quando Jesus voltou do encontro com o moço rico (Mc. 10.23) ele ilustrou a primeira; Jo. 8.29 ilustra a segunda: "aquele que me enviou está comigo". Lowrie, Doctrine of St. John, 51-57 - " 'Deus é luz'
(1 Jo. 1.5) indica o caráter de Deus, pureza moral revelada, produzindo gozo e vida, em contraste com as más obras, andando nas trevas, num estado de perdição".
A consciência humana universal é em si mesma uma revelação da santidade de Deus e a reunião do sofrimento em todo o lugar com o pecado é a revelação da justiça de Deus. A cólera, a ira, o ciúme de Deus mostram que esta reação da natureza de Deus é necessária. A própria natureza de Deus é santa, justa e boa. A santidade não é substituída pelo amor, como sustenta Ritchl, visto que não há nenhuma doação própria sem auto-afirmação. A santidade não demanda apenas lei, mas concede o Espírito Santo. Santayana, Sense of Beauty, 69 - "Se a perfeição é a justificação última do ser, podemos entender a base da dignidade moral do belo. O belo é um penhor da possível conformidade entre a alma e a natureza e, conseqüentemente a base da fé na supremacia do bem". Contudo, consideramos a natureza apenas como o símbolo e expressão de Deus e, deste modo, consideramos o belo como a base da fé na sua soberania. Há mais verdade a respeito do que Santayana diz sobre o belo com relação à santidade. Em qualquer lugar que o vemos, reconhecemos nele um penhor da possível conformidade entre a alma e Deus e, conseqüentemente, a base da fé na supremacia de Deus.
Santidade não é um termo complexo designativo do conjunto das perfeições divinas. Por outro lado, a noção de santidade é, tanto na Escritura como
na experiência cristã, perfeitamente simples e perfeitamente distinta dos outros atributos.
Dick, Theol., 1.275 - Santidade = veneração, i.e., "nenhum atributo particular, mas o caráter geral de Deus que resulta dos atributos morais". Wardlaw chama a santidade de união de todos atributos, como a pura luz branca é a união de todos os raios coloridos do espectro (Theology, 1.618-634). H. W. Beecher: "Santidade = totalidade". A abordagem desta concepção é a definição de W.N. Clarke, Christian Theology, 83 - "Santidade é a gloriosa plenitude da bondade de Deus, consistentemente sustentada como o princípio da sua própria ação e o padrão para as suas criaturas". Isto implica, segundo o Dr. Clarke: 1. O caráter interior da sua bondade; 2. O caráter como princípio consistente da sua própria ação; 3. A bondade que é o princípio da sua própria ação é o padrão da deles". A saber; santidade é 1. caráter; 2. autocon- sistência; 3. requisito. A esta definição objetamos que ela deixa de definir. Não se diz que é essencial ao caráter; a definição inclui em santidade aquilo que apropriadamente pertence ao amor; omite toda a menção dos mais importantes elementos na santidade, a saber, a pureza e a justiça.
Semelhante falta de definição clara aparece na afirmação de Mark Hopkins, Law of Love, 105 - "É este duplo aspecto do amor revelando a natureza moral toda e voltando a cada caminho como a espada flamejante que guarda o caminho da árvore da vida que se chama santidade". Como já mostramos acima, na Escritura, a santidade não se contrasta com a simples fini- tude ou pequenez, ou o infortúnio, ou mesmo a irrealidade, mas só com a impureza e com a pecaminosidade. E. G. Robinson, Chrst. Theology, 80 - "A santidade no homem é a imagem de Deus. Mas é claro que a santidade no homem não é proporcional às outras perfeições do seu ser - à sua força, ao seu conhecimento, à sua sabedoria apesar de ser proporcional à retidão da sua vontade - e, por isso, não pode ser a resultante de todas as perfeições.... Identificar a santidade com a soma de todas as perfeições é fazer dela apenas a plenitude do caráter".
Santidade não é o amor próprio de Deus, no sentido da suprema consideração no seu próprio interesse e felicidade. Não há nenhum elemento utilitário na santidade.
Buddeus, Theol. Dogmat., 2.1.36, define santidade como o amor próprio de Deus. Mas Deus ama e se afirma, não como o eu, mas como o mais santo. Não existe em Deus uma busca de si mesmo. Nem dos interesses de Deus, mas o amor a Deus como santo, é o princípio e fonte da santidade no homem. Chamar a santidade de Deus de amor próprio é dizer que Deus é santo em razão do que ele pode fazer através disso, i.e., negar que a santidade tem existência independente.
Não devemos negar, mas, ao contrário, sustentar que há um adequado amor próprio que não é egoísmo. Contudo, este amor próprio não é, afinal de contas, amor. Ao invés disso, é o respeito próprio, a preservação própria,
a vindicação própria e constitui uma importante caraterística da santidade. Porém, definir santidade como amor de Deus por si mesmo é deixar de lado a definição da razão para este amor na pureza e retidão da natureza divina. O respeito próprio de Deus implica que Deus respeita a si mesmo por algo em seu próprio ser. E o que é este algo? A santidade é "excelência moral" de Deus (Hopkins), ou a sua "bondade perfeita" (Clarke)? Mas o que é esta excelência moral, ou bondade perfeita? Temos aqui descritos o método e o fim, mas não o motivo e a base. Deus não ama a si mesmo por causa do seu amor, mas ele ama a si mesmo por causa da sua santidade. Os que sustentam que o amor é a auto-afirmação assim como autocomunicação e, por isso, a santidade é o amor de Deus por si mesmo, devem ainda admitir que este autoafirmante que é a santidade condiciona e fornece o padrão ao amor auto- comunicante que é a benevolência.
G. B. Stevens, Johannine Theology, 364, diz-nos que "a justiça de Deus é o respeito próprio do perfeito amor". Miller, Evolution of Love, 53 - "O amor próprio é o tipo de ação que no ser perfeito realiza, no finito procura realizar o eu perfeito ou ideal". A saber, o amor é a auto-afirmação. Porém, objetamos que o amor próprio não é, afinal de contas, amor porque nele não há nenhuma comunicação própria. Se em qualquer sentido a santidade é uma forma ou manifestação do amor - questão que ainda temos de considerar - sem dúvida, não se trata de um amor próprio unitário e utilitário, que seria idêntico ao egoísmo, mas, ao invés disso, um sentimento que implica centralização trinitária no outro ser e o apoio do eu como um objeto ideal. Este parece ser o sentido de Jonathan Edwards, Essay on the Trinity (ed. Fischer), p. 79 - "Todo amor se refere a outro ser, que é amado. Para o apóstolo, a palavra amor certamente significa algo mais que aquilo que normalmente se chama amor próprio: isto é impropriamente chamado de amor e faz parte de uma natureza bem diversa do sentimento ou virtude de que o apóstolo está falando". Veremos ainda que, conquanto Jonathan Edwards nega que a santidade seja um amor próprio unitário e utilitário, ele considera a essência deste como sendo o amor trinitário de Deus para consigo mesmo, de excelência moral perfeita.
A falta de convicção trinitária de Ritschl faz ser-lhe impossível fornecer qualquer base própria para o amor ou para a santidade na natureza de Deus. Ritschl sustenta que, como pessoa, Cristo é um fim em si mesmo; ele realizou o seu próprio ideal; desenvolveu a sua própria personalidade; atingiu a sua perfeição na sua obra em favor do homem; ele não é somente um homem destinado à salvação dos homens. Mas, ao chegar à sua doutrina de Deus, estranhamente Ritschl é inconsistente com tudo isso, porque deixa de representar Deus como tendo um fim em si mesmo, e trata-o somente como um meio para o reino de Deus assim como um fim. Garvie, fíitschilian Theology, 256,278,279, com propriedade assinala que pessoalidade significa a posse de si mesmo assim como a autocomunicação, distinção de outros seres assim como união com eles. Ritschl não considera que o amor de Deus em primeiro lugar se dirige ao seu Filho e só depois à comunidade cristã. Deste modo ele ignora a Trindade imanente. Antes da autocomunicação deve haver uma auto-sustentação. Caso contrário, Deus deixa a sua independência e torna necessária a existência criada.
Santidade não é idêntica ao amor, ou sua manifestação. Porque a auto- manutenção deve preceder a autoconcessão e porque a benevolência tem seu objetivo, motivo, padrão e limite na retidão, na santidade, o atributo auto- afirmante não pode de modo algum ser resolvido no amor autocomunicante.
A doutrina de Jonathan Edwards é que a santidade é uma forma de amor; Essay on the Trinity(ed. Fisher), 97 - "É no infinito amor de Deus a si mesmo que consiste a santidade. Como toda criatura, a santidade deve ser resolvida no amor, como nos ensina a Escritura, assim a santidade do próprio Deus consiste no amor infinito a si mesmo. A santidade de Deus é a beleza infinita e a excelência da sua natureza, e a excelência de Deus consiste no amor a si mesmo". Em seu tratado sobre The Nature of Virtue, Jonathan Edwards define a virtude com relação ao ser em geral. Ele considera que o amor de Deus, antes de tudo, destina-se a si mesmo tendo a maior quantidade do ser e, só depois, às suas criaturas cuja quantidade de seres é infinitesimal comparada com ele. Por isso Deus acha o seu principal fim em si mesmo e o amor próprio de Deus é a sua santidade. Este princípio tem permeado e dominado a subseqüente teologia da Nova Inglaterra, desde Samuel Hopkins, Works, 2.9-66, que defende que esta santidade = amor do ser em geral. Horace Bushnell, Vicarious Sacrifice, declara: "A justiça, mudada em uma palavra de sentimento, é o amor; o amor, traduzido em uma palavra da consciência, é a justiça; a lei eterna do direito é apenas uma outra concepção da lei do amor; os dois princípios, justiça e amor, aparecem exatamente um na medida do outro".
Dorner, Christian Ethics, 73,93,184, ensina doutrina semelhante-"O amor une a existência do eu com a existência dos outros, auto-afirmação e entrega de si mesmo. ... Amor próprio em Deus não é egoísmo, porque ele é a sede original e necessária do bem em geral e do bem universal. Deus conserva a sua honra até dando de si mesmo aos outros. ... O amor é a força e o desejo de ser do eu enquanto no outro ser e, enquanto o eu de qualquer pessoa estiver em outro ser recebido no coração até o fim. ... Devo amar o meu próximo só como a mim mesmo. ... Contudo, a virtude requer não só a boa vontade, mas a vontade daquilo que é justo". Do mesmo modo, Newman Smith, Christian Ethics, 226, 239, sustenta que 1. O amor é uma auto-afirmação.
Daí ele defende que santidade ou respeito próprio envolve amor. A justiça não é uma excelência independente em contraste com a benevolência, ou em oposição a ela; é parte essencial do amor. 2. O amor é a doação de si mesmo. O único limite é ético. Eis aqui uma imanência sempre profunda, apesar de que sempre de Deus, porque Deus não pode negar-se a si mesmo.
O amor encontra-se a si mesmo em outro ser. O elemento vicário pertence ao amor. Retrucamos a Dorner e a Smith que o seu reconhecimento de que o amor tem sua condição, seu limite, seu motivo, objeto e padrão mostra que há um princípio mais elevado que o amor e que o regula. Reconhece-se este princípio como sendo ético. É idêntico ao direito. Deus não pode negar-se a si mesmo porque ele é fundamentalmente justo. Esta auto-afirmação é a santidade e a santidade não pode ser uma parte do amor, ou uma forma dele porque ela condiciona e domina o amor.
Chamá-la benevolência é ignorar sua distinção majestosa e pôr em perigo sua legítima supremacia.
Deus deve em primeiro lugar sustentar o seu próprio ser antes de poder dar a outro e esta auto-sustentação deve ter sua razão e motivo no merecimento daquilo que é sustentado. Santidade não pode ser amor porque o amor é irracional e caprichoso a não ser quando tem um padrão pelo qual ele é regulado e este não pode ser o próprio amor, mas a santidade. Concordamos com Clarke, Christian Theology 92, em que "o amor é o desejo de conceder santidade". O amor é um meio de santidade e, por isso, a santidade é o supremo bem, algo mais elevado que só o amor. Então, ao invés de dizer, com Clarke, que "a santidade é o centro em Deus, mas o amor é essencial à santidade", é preferível dizer: "O amor é o centro em Deus, mas a santidade é
o centro do amor", apesar de que, neste caso, devemos empregar o termo amor incluindo o amor próprio. Melhor ainda é não empregar a palavra amor referindo-se ao cuidado de Deus para consigo mesmo. No uso comum, amar significa considerar os outros e ter comunhão com eles. Abranger nele a auto- afirmação de Deus é interpretar mal a santidade e considerá-la um meio de alcançar um fim, ao invés de fazer o que realmente é, o objeto superior e o princípio regulador, do amor.
Aquele que lança a norma ou padrão do amor deve ser superior ao referido amor. Quando esquecemos que "justiça e juízo são a base do seu trono" (SI. 97.2), destruímos um dos principais marcos da doutrina cristã e envol- vemo-nos numa névoa de erro. Ap. 4.3 - "ao redor do trono há um arco-íris" = no meio do arco-íris do perdão e da paz há um trono de santidade e juízo. Em Mt. 6.9,10, "Venha o teu reino" não é a primeira petição, mas ao invés disso, "Santificado seja o teu nome". É uma falsa idéia da simplicidade divina reduzir os atributos a um. A auto-afirmação não é uma forma de doação de si mesmo. A não sensibilidade, estado de sensibilidade, apesar de ser a mais pura benevolência, é fundamental, porém, mais do que isso, é a atividade daquela vontade e a sua justa direção. Hodge, Essays, 133-136, 262-273, bem mostra que o amor santo é controlado pela santidade. A santidade não é um simples meio para a felicidade. Ser feliz não é a razão última de ser santo. Certo e errado não são matéria de lucro e perda. Dizer que Deus é apenas benevolência e que ele pune apenas quando a felicidade do universo o requer destrói toda a nossa lealdade para com Deus e violenta a constituição da nossa natureza.
A doutrina de que Deus é apenas amor tem sido chamada de "o papado de Deus". Deus é um "mar de verão de bondade, nunca agitado por tempestades" (Dale, Ephesians, 59). Jesus, porém nos dá a melhor idéia a respeito de Deus e nele achamos não só a piedade, mas às vezes a indignação moral. Jo. 17.11 - "Pai santo" = mais do que amor. O amor pode ser exercido por Deus só quando é o amor correto. A santidade é o trilho no qual a locomotiva do amor deve correr. O amor não pode ser a locomotiva. Se um inclui o outro, então a santidade é que inclui o amor, visto que a santidade é a manutenção da perfeição de Deus e a perfeição envolve amor. Aquele que é santo afirma a si mesmo como também o perfeito amor. Se o amor fosse fundamental, nada haveria para dar e, deste modo, o amor seria vão, e inútil. Não se pode dar o eu, sem que haja antes a auto-afirmação. Deus não é santo porque ele ama, mas ama porque é santo. O amor não pode dirigir-se a si próprio; ele está limitado à santidade. A justiça não depende do amor para ser reta. Stephen G. Barnes: "O simples bem não é o único conteúdo da lei; ele não basta nos tempos de prova de fogo; é inadequado como base para a retribuição. O amor necessita da justiça e a justiça do amor; ambos são comandados pela lei de Deus e são revelados perfeitamente no caráter de Deus".
Pode haver um atrito entre ambas as mãos do homem e pode haver um conflito entre a consciência e a vontade do homem, entre o seu intelecto e o seu sentimento. A força é a energia de Deus sob a resistência; a força e a energia pertencem-lhe. Deste modo, quando o homem peca, a santidade e o amor em Deus tornam-se pólos ou forças opostas. O primeiro e mais sério efeito do pecado não é o que ocorre sobre o homem, mas sobre Deus. A santidade necessariamente requer sofrimento e o amor o suporta. Este sofrimento eterno de Deus por conta do pecado é a expiação; o Cristo encarnado apenas mostra o que foi no coração de Deus desde o princípio. Fazer a santidade uma forma de amor é, na verdade, negar a sua existência e, conseqüentemente, negar a necessidade de qualquer expiação para a salvação do homem. Se santidade é a mesma coisa que amor, como é que o mundo clássico, que conhecia a santidade de Deus, não conhecia também o seu amor? Aqui a ética lembra o caldo de carne de Abraão Lincoln feito da sombra de um pombo que morreu de fome. Santidade que é só boa vontade não é santidade, porque lhe faltam os elementos essenciais da pureza e retidão.
Nas bases da agulha (desvio de estrada de ferro) para o leste de Rochester, existe um homem cuja responsabilidade é movimentar para a esquerda ou para a direita uma barra de ferro de duas ou três polegadas. Deste modo ele determina se o trem vai para Nova Iorque ou para Washington, para Nova Orleans ou para São Francisco. Neste ponto da teologia a nossa conclusão igualmente determina qual será o nosso sistema futuro. O princípio de que a santidade é uma manifestação de amor, ou uma forma de benevolência, leva à conclusão de que a felicidade é o único bem e o único fim; que a lei é um mero expediente para a garantia da felicidade; que a pena é simplesmente dissuasiva, ou tem um fim reformatório; que não há necessidade de nenhuma expiação a ser oferecida a Deus pelo pecado humano; que não se pode vin- dicar a retribuição eterna porque não há esperança de recuperação. Este ponto de vista ignora o testemunho da consciência e da Escritura de que o pecado é Introdinsecamente mau e, por isso, deve ser punido não porque a punição vai operar o bem do universo; na verdade, não poderia operar o bem ao universo a não ser que este fosse justo e reto. Ignora o fato de que a misericórdia é uma opção de Deus, enquanto a santidade é invariável; que a punição muitas vezes está ligada à santidade de Deus, mas nunca ao amor; que Deus não é somente amor, mas luz - luz moral - e, por isso, "um fogo consumidor" (Hb. 12.29) para toda a iniqüidade. O amor castiga (Hb. 12.6), mas a santidade pune (Jr. 10.24 - "Castiga-me, ó Senhor, mas com medida; não na tua ira"; Ez. 28.22 - "quando executar juízos e nela me santificar"; 36.21,22 - em juízo "Não é por vosso respeito que faço isto, ó casa de Israel, mas pelo meu santo nome"; 1 Jo. 1.5 - "Deus é luz e não há nele treva nenhuma" - treva moral; Ap. 15.1,4 - "a ira de Deus ... só tu és santo ... os teus juízos são manifestos"; 16.5 - "justo és tu ... porque julgaste estas
coisas"; 19.2 - "verdadeiros e justos são os seus juízos, pois julgou a grande prostituta").
Positivamente, santidade é:
Pureza de substância - Na natureza moral de Deus, agindo necessariamente, há, na verdade, os dois elementos da vontade e do ser. Mas o passivo precede logicamente o ativo; o ser vem antes da vontade; Deus é puro antes de desejar a pureza. Porque a pureza, contudo, ordinariamente é um termo negativo e significa apenas liberdade da mácula e do erro, devemos incluir nele também a idéia positiva de retidão moral. Deus é santo no sentido de que ele é a fonte e o padrão do direito.
E. G. Robinson, Christian Theology, 80 - "Santidade é pureza moral, não só no sentido de ausência de toda mancha moral, mas de complacência em todo bem moral". Shedd, Dogm. Theology, 1.362 - "Santidade em Deus é conformidade com a sua própria natureza perfeita. A única regra para a vontade divina é a razão divina; e esta prescreve tudo o que é benéfico que um Ser faça. Deus não está sob lei, nem acima dela. Ele é a lei. Ele é reto por natureza e por necessidade. ... Deus é a fonte e o autor da lei para todos os seres morais". Podemos melhorar a definição de Shedd dizendo que santidade é o atributo em virtude do qual o ser divino e a vontade divina conformam- se eternamente um com o outro. Deste modo, sustentando que o ser santo logicamente precede o querer santo, diferimos do ponto de vista de Lotze, Philos. of Religion, 139 - "Tal vontade de Deus não segue a partir da natureza como secundária a ela, ou precede-a como primordial a ela mais do que, no movimento, a direção pode ser antecedente ou subseqüente à velocidade". Bowne, Philos. of Theism, 16 - "A natureza de Deus = uma lei fixa da atividade ou modo de manifestação. ... Mas as leis do pensamento não são limitação alguma porque são apenas modos do pensamento com atividade. Elas não regem o intelecto, mas apenas expressam o que o intelecto é".
Apesar destas afirmações de Lotze e de Bowne, devemos sustentar que, a verdade do ser logicamente precede a verdade do conhecer e uma natureza amorosa precede as emoções amorosas, do mesmo modo a pureza da substância precede à pureza da vontade. A doutrina oposta conduz a afirmações tais como a de Whedon (On the Will, 316): "Deus é santo naquilo que livremente ele escolhe para fazer a sua própria felicidade no direito eterno. Que ele não pudesse fazer-se igualmente feliz no erro é mais do que podemos dizer. ... A sabedoria infinita e a santidade infinita consistem eternamente nas volições de Deus e delas resultam". Whedon, contudo, não crê na imutabilidade de Deus, mas sim em sua constância. Ele não pode dizer se motivos quaisquer não podem em algum tempo provar-se mais fortes que conduziriam à apostasia. A santidade essencial de Deus não proporciona base para uma certificação. Como dizíamos a respeito da verdade, do mesmo modo aqui dizemos a respeito da santidade que, fazer da santidade assunto de mera vontade, em vez de considerá-la caraterística do ser de Deus, é negar que qualquer coisa é santa em si mesma. Se Deus pode transformar a impureza
em pureza, então Deus em si mesmo é indiferente à pureza ou impureza e, portanto deixa de ser Deus. Robert Browning, A Soul's Tragedy, 223 - "Confio em Deus - o Justo será o Justo e outra coisa que não seja o Erro enquanto ele existir". RS. Moxom: "Revelação é descoberta da retidão divina. Não adicionamos o pensamento quando dizemos que é também a descoberta do amor divino, porque o amor é uma manifestação ou realização daquela retidão que é a integridade. H.B. Smith, System, 223-231 - Virtude = amor tanto na felicidade como na santidade, apesar de que a santidade é como o último elemento; o amor à mais elevada Pessoa e aos seus fins e objetivos".
Energia da vontade - A pureza não é simplesmente uma qualidade passiva e morta; é penetrada e permeada pela vontade. Santidade é o movimento moral livre de Deus.
Como existe uma Mente mais elevada que a nossa e um coração maior que o nosso, do mesmo modo também existe uma Vontade maior do que a nossa. A santidade contém este elemento de vontade, embora seja uma vontade que expressa a natureza, ao invés de causá-la. Não é uma pureza calma e imóvel, da neve recentemente caída, ou do azul sem mancha do céu estivai. É a mais tremenda das energias num movimento insone. É um "mar de vidro" (Ap. 15.2), mas um "mar de vidro misturado com fogo". A. J. Gordon: "Santidade não é uma pureza de brancura mortal, perfeição da estátua de mármore perfeito. A vida, assim como a pureza entra na idéia de santidade.
Os que são 'perfeitos diante do trono' são os que 'seguem o Cordeiro aonde quer que ele vá'; atividade santa que atende e expressa o seu estado santo". Martensen, Christian Ethics, 62,63 - "Deus é a unidade perfeita do eticamente necessário e do eticamente livre"; "Deus não pode agir de outra forma que não seja a sua natureza essencial".
(274) O centro da personalidade é a vontade. O conhecimento tem seu fim no sentimento e o sentimento tem seu fim na vontade. Por isso devo subordinar o sentimento à vontade e a felicidade à justiça. Devo querer com Deus e empregar toda a minha influência sobre os outros para torná-los como Deus na santidade. William James, Will to Believe, 123 - "A mente deve primeiramente obter sua impressão sobre o objeto; depois definir o que é esse objeto e que medidas ativas a sua presença demanda; e, finalmente, reagir.
... Toda fé e toda filosofia, modo e sistema, são subservientes e passam a um terceiro estágio, o da ação". O que é verdade a respeito do homem também o é a respeito de Deus. Toda vontade do homem, combinada, na verdade, toda energia ativa da humanidade em todo lugar e em todas as eras nada é comparada com a extensão e vontade de Deus. O momento todo do ser divino está escudado na lei moral. Tal lei é a expressão dele mesmo. Seu braço benéfico ao mesmo tempo que terrível está sempre defendendo e executando. Deus deve manter a sua santidade porque ela é a divindade. Se ele não a mantivesse, o amor não teria nada a apresentar, ou não tornaria os outros participantes dele.
Será que Deus quer o bem porque este é bom, ou o bem é bom porque Deus o quer? No primeiro caso, parece que o bem está acima de Deus; no
segundo, o bem é algo arbitrário e mutável. Kaftan, Dogmatik, 186,187, diz que nenhuma destas opções é verdadeira; ele sustenta que não há nenhum bem a priori antes da vontade dele e sustenta que a vontade sem a direção não é vontade; o bem é bem por causa de Deus não antes, mas em sua autodeterminação. Dorner, System Doctrine, 1.432, contrariamente, sustenta que ambos são verdadeiros porque Deus não é simplesmente uma forma de ser, quer necessária, quer livre, mas ao invés disso, um ser multiplamente diverso, embora absolutamente correlato e reciprocamente condicionante; isto é, um ser trinitário, tanto necessário como livre. Aqui concordamos com Dorner e defendemos a crença de que o ser de Deus é necessário a uma ética correta e a uma teologia também correta. Celsus justificava o politeísmo sustentando que seja o que for Deus se revela Deus, serve Deus e, conseqüentemente, pode racionalmente ser adorado. Ele livra o cristianismo desta ampla tolerância, porque este adora um Deus zeloso, que não se satisfaz em ser um entre muitos. Mas este zelo realmente significa que Deus é um Ser para quem as distinções morais são reais. O Deus de Celsus, o do panteísmo, é zeloso, não porque é Santo, mas somente porque é Absoluto. A categoria da ética surge da categoria do ser. O grande defeito da teologia moderna é precisamente o ético; a santidade surge da benevolência; não há o reconhecimento próprio da justiça de Deus. Jo. 17.25 - "Pai justo, o mundo não te conheceu" - é um texto tão verdadeiro atual como o foi nos tempos de Jesus. Isole, Begriff der Heiiigkeit in N. T., 41,84, define a santidade em Deus como "perfeição ética de Deus na exaltação dela acima de tudo o que é pecaminoso" e a santidade no homem como a "condição correspondente à de Deus em que o homem se conserva puro relativamente ao pecado".
Auto-afirmação - Santidade é a vontade própria de Deus. Sua própria pureza é o supremo objetivo de sua própria consideração e sustento. Deus é santo no sentido de que sua excelência moral infinita afirma e se declara como
o mais elevado motivo e fim possíveis. Como a verdade e o amor este atributo só pode ser entendido à luz da doutrina da Trindade.
Santidade é a pureza que deseja a si mesma. Temos analogia no dever de autopreservação, respeito próprio e auto-afirmação do homem. A virtude se obriga a sustentar-se e defender-se como no caso de Jó. Nos seus melhores momentos, o cristão sente que a pureza não é apenas a negação do pecado, mas a afirmação de um princípio de justiça interior e divino. Thomasius, Christi Person und Werk, 1.137 - Santidade é a concordância perfeita da vontade divina com o ser divino; pois, como a criatura pessoal é santa quando quer e determina a si mesma quanto à vontade de Deus, assim Deus é o santo porque ele deseja ser o que ele é. Em virtude deste atributo, Deus está isento de tudo o que contradiz a sua natureza, e se afirma em seu ser absolutamente bom: ser semelhante a si mesmo". Tholuck, on Romans, 5â ed., 151 - "O termo santidade deve ser empregado para indicar uma relação de Deus consigo mesmo. É santo aquele que, não se perturba com o que vem de fora; é totalmente semelhante a si mesmo". Dorner, System of Doctrine, 1.456 - "Faz parte da sua bondade proteger a bondade". Quando considerar-mos a Trindade, veremos que esta doutrina tem estreitas relações com a dos atributos imanentes. É no Filho que Deus tem o objeto perfeito da sua vontade bem como do conhecimento e do amor.
O objeto da vontade de Deus na eternidade passada não é nada fora de si mesmo. Ela deve ser a mais elevada de todas as coisas. Vemos o que ela deve ser só quando nos lembramos de que a justiça é o imperativo incondicional da nossa natureza moral. Visto que nós fomos feitos à imagem de Deus, devemos concluir que ele quer eternamente a justiça. Nem todos atos de Deus são de amor, mas todos são de santidade. O respeito próprio, a preservação de si mesmo, a auto-afirmação, a vindicação de si mesmo, que chamamos santidade de Deus, apenas palidamente se refletem em afirmações tais como em Jó 27.5,6 - "Até que eu expire, nunca apartarei de mim a minha sinceridade. À minha justiça me apegarei e não a largarei"; 31.37 - "O número dos meus passos lhe mostraria; como príncipe me chegaria a ele".
fato de que o Espírito de Deus é denominado Espírito Santo deve ensinar- nos qual é a natureza essencial de Deus e a exigência de que nós sejamos santos como ele o é ensinam-nos qual é o verdadeiro padrão do dever humano e o objetivo da ambição humana. Contudo, porque a santidade de Deus é auto-afirmação, fornece a garantia de que o amor de Deus não deixa de garantir o seu fim e que todas as coisas atendem ao seu propósito. Rm. 11.36 — "Porque dele, e por ele, e para ele são todas as coisas; glória, pois, a ele eternamente. Amém".
VI. ATRIBUTOS RELATIVOS OU TRANSITIVOS.
Primeira Divisão - Atributos relacionados com Tempo e Espaço
Eternidade
Isto significa que a natureza de Deus d) não tem começo nem fim; b) não
tem sucessão de tempo; e c) contém em si a causa do tempo.
Dt. 32.40 - "Porque levantarei a minha mão aos céus e direi: Eu vivo para sempre"; SI. 90.2 - "Antes que os montes nascessem ... de (desde a) eternidade ... tu és Deus"; 102.27 - "os teus dias nunca terão fim"; Is. 41.4 - "Eu, o Senhor, o primeiro, e com os últimos"; 1 Co. 2.7 - Jtpò tcòv aicóvcov - "antes dos séculos" = 7ipò KaxaPoXfjç kóctuod - "antes da fundação do mundo" (Ef. 1.4).
Tm. 1.17 - BccoiXeí -cwv aicDvwv - "Rei dos séculos" (também Ap. 15.8).
Tm. 6.16 - aquele que tem, ele só, a imortalidade". Ap. 1.8 - "o Alfa e o Ômega". Dorner: "Não devemos fazer o Cronos (tempo) e o Urano (espaço) divindades mais antigas do que Deus". Eles estão entre "todas as coisas" que "foram feitas por ele" (Jo. 1.3). Apesar de que nem tempo, nem espaço são substâncias; nem são atributos (qualidades da substância); ao invés disso, são relações da existência finita". (Porter, Human Intellect, 568, prefere chamar o tempo e o espaço "correlatos aos seres e eventos"). Eles apareceram
com a existência finita; não são meros conceitos reguladores da nossa mente; eles existem objetivamente quer os percebamos, quer não. Ladd: "O tempo é a pressuposição mental da duração dos eventos e dos objetos. Tempo não é uma entidade; caso fosse, seria necessário supor algum outro tempo em que ele continuasse a existir. Pensamos no espaço e no tempo como incondicionais, porque eles fornecem as condições do nosso conhecimento. A idade de um filho condiciona-se à do seu pai. As próprias condições não podem ser condicionadas. Espaço e tempo são formas, mas não apenas isso. Há algo além da mente no caso do espaço e do tempo, como no caso do som".
Ex. 3.14-"Eu sou"- envolveeternidade. SI. 102.12-14-"Mas tu, ó Senhor, permanecerás para sempre ... Tu te levantarás e terás piedade de Sião; pois é tempo de te compadeceres dela ... Porque os teus servos ... se compadecem do seu pó" = porque Deus é eterno, ele terá compaixão de Sião: ele fará isto, porque até mesmo nós, seus filhos, amamos até o seu próprio pó. Jd. 25
"glória e majestade, domínio e poder, antes de todos os séculos, agora e para todo o sempre". Pfleiderer, Philos. Religion, 1.165 - "Deus é 'Rei dos éons (séculos)' (1 Tm. 1.17), porque ele distingue, em seu pensamento, sua eterna essência desde a sua obra mutável no mundo. Ele não está absorvido no processo". Edwards, o moço, descreve a intemporalidade como "a posse imediata e invariável de toda a vida ilimitada junta e de uma vez". Tyler, Greek Poets, 148 - "Os deuses pagãos tinham apenas existência sem fim. Parece que os gregos nunca conceberam a existência sem começo". Tennyson, Life, 1.322 - "Porque era, é e será significam apenas é: E toda a criação é um ato instantâneo, O nascimento da luz; mas nós que não somos tudo, como partes, podemos ver apenas partes, ora esta, ora aquela, por força de pensar sobre o pensamento e fazer do ato um fantasma da sucessão: Nossa fraqueza é como a forma da sombra, o Tempo".
Agostinho: "Mundus non in tempore, sed cum tempore, factus est" (O mundo foi feito não no tempo, mas com o tempo). Não há nenhum sentido na pergunta: Por que ocorreu a criação num tempo, quando poderia ter ocorrido antes? ou outra pergunta: O que Deus estava fazendo antes da criação? Estas perguntas pressupõem um tempo independente no qual Deus criou - um tempo antes do tempo. Por outro lado, a criação não ocorreu antes do tempo, mas Deus deu tanto o mundo como o tempo da sua existência. Royce, World and Individual, 2.111-115 - "O tempo é a forma da vontade, assim como o espaço é a forma do intelecto (cf. 124,133). O tempo corre só numa direção (diferentemente do espaço), para o cumprimento da luta ou expectação. Perseguindo seus objetivos, o eu vive no tempo. Todo o agora é também uma sucessão, como ilustra cada melodia. Para Deus o universo é 'totum simul', como para nós qualquer sucessão é um todo. 233 - A morte é uma mudança na pequena extensão de tempo - o mínimo de tempo em que uma sucessão pode aparecer como um todo completo. Para Deus "mil anos são como um dia" (2 Pe. 3.8). 419 - Deus, na sua totalidade, como um Ser Absoluto, está consciente, não no tempo, mas do tempo, e tudo o que o tempo infinito contém. No tempo, seguem-se, na sua seqüência, as cordas da sua infinita sinfonia. Para ele esta é a sinfonia toda da vida de uma só vez ... Você une presente, passado e futuro numa só consciência sempre que você ouve qualquer das três palavras sucessivas: uma para o passado, outra para o presente, ao
mesmo tempo que uma terceira é o futuro. Assim Deus une na percepção ausente do tempo a sucessão toda dos eventos finitos. ... As notas simples não se perderam na melodia. Você está em Deus, mas você não está perdido em Deus". Mozart, citado em William James, Principies of Psychology, 1.255 - "Toda a invenção e a feitura prosseguem em mim como um belo sonho forte. Mas o melhor de tudo é ouvi-lo todo de uma só vez".
Eternidade é infinitude com relação ao tempo. Implica que a natureza dr Deus não está sujeita à lei do tempo. Deus não está no tempo. Mais correto 4 dizer que o tempo não está em Deus. Apesar de que há sucessão lógica nc pensamentos de Deus, não há sucessão cronológica.
O tempo é a duração medida por sucessões. Duração sem sucessão ainda seria duração, apesar de imensurável. Reid, Intellectual Powers, ensaio 3, cap. 5 - "Podemos medir a duração pela sucessão dos pensamentos na mente, como podemos medir a distância por polegadas ou pés, mas a noção ou idéia de duração deve anteceder a sua medida, como a noção de distância antecede o ser medido". Deus não está sob a lei do tempo. Solly, Will, 254 - "Deus olha através do tempo e nós olhamos através do espaço". Murphy, Scientific Bases, 90 - "A eternidade não é, como se pensa, anterior e posterior a nós, uma linha sem fim. Não, ela é um círculo, infinitamente grande - todas as circunferências com criações amontoadas: Deus habita no centro, contemplando tudo. Quando nos movemos neste círculo eterno, a porção finita que só vemos atrás de nós já passou; o que está adiante chamamos de futuro. Mas para aquele que habita longe no centro, igualmente distante de cada ponto da circunferência, ambos são semelhantes, tanto o futuro como o passado". Vaughan (1655): "Outra noite vi a eternidade, como um grande anel de pura e intérmina luz e calma em seu brilho; e em torno abaixo dele, o tempo, nas horas, dias, anos, dirigidos pelas esferas, como uma grande sombra se movia e nela o mundo e todo o seu séquito se arremessava".
Não podemos ter derivado da experiência nossa idéia de duração no passado porque a experiência nos dá só a duração que teve começo. Por isso a idéia de duração sem começo deve ser-nos dada pela intuição. Case, Physi- cal Realism, 379,380 - "O tempo é a continuação, ou contínua duração, do universo". Bradley, Appearance and Reality, 39 - Considere o tempo como uma correnteza - sob uma forma espacial: "Se você tomar o tempo como uma relação entre as unidades sem duração, então o tempo todo não tem duração alguma e, na verdade não é tempo algum. Mas se você atribuir duração ao tempo todo, então, de uma vez por todas as unidades passam a possuí-lo e elas deixam de ser unidades". O agora não é tempo a não ser que de passado se torne futuro e isto é um processo. O agora consiste em agoras e estes não podem ser descobertos. A unidade nada é a não ser a sua própria relação com alguma coisa além, impossível de se descobrir. Por isso o tempo não é real, mas uma aparência.
John Caird, Ideas, 1.185 - "Aquilo que se prende e correlaciona objetos no espaço não pode por si mesmo ser uma das coisas do espaço; aquilo que apreende e estabelece conexão entre os eventos que se sucedem uns aos
outros no tempo deve permanecer acima da sucessão ou corrente de eventos. Por ser capaz de medi-los, não pode estar fluindo com eles. Não poderia haver para a consciência própria tal coisa como o tempo, se não fosse, em um dos seus aspectos, acima do tempo, se não pertencesse a uma ordem que é ou tem em si um elemento que é eterno. ... Como pensamento a sucessão não é sucessiva". A. H. Strong, Historical Discourse, 9/5/1900 - "Deus é acima do espaço e do tempo e nós estamos em Deus. Assinalamos a passagem do tempo e escrevemos as nossas histórias. Mas não podemos fazer isto apenas porque em nosso mais elevado ser não pertencemos ao espaço e ao tempo, mas temos em nós uma pitadinha da eternidade. John Caird, nos diz que não podemos perceber o fluxo da correnteza se não fizermos parte da corrente; só quando os pés estão plantados na sólida rocha podemos observar que a água corre junto dela. Pertencemos a Deus; estamos aquém de Deus; enquanto o mundo passa e a sua concupiscência; mas aquele que faz a vontade de Deus permanece para sempre". J. Eslin Carpenter e P. H. Wicksteed, Studies of Theology, 10 - "Dante fala de Deus como aquele em quem 'qualquer lugar e em qualquer tempo focalizam-se num ponto', isto é, para quem cada estação é agora e cada lugar é aqui'.
Amiel's Journal: "O tempo é a ilusão suprema. É o prisma interior através do qual decompomos o ser e a vida, o modo pelo qual percebemos sucessivamente o que é simultâneo à idéia. ... O tempo é a dispersão sucessiva do ser, do mesmo modo que a palavra é a análise sucessiva de uma intuição, ou de um ato da vontade. Em si mesmo ele é um ser relativo e negativo, e desaparece dentro do absoluto. ... Tempo e espaço são fragmentos do Infinito para o uso das criaturas finitas. Deus os permite para que ele não fique sozinho. Eles são o modo sob o qual tornam-se possíveis e concebíveis. ... Se o universo subsiste é porque a Mente eterna ama para perceber o seu próprio conteúdo, em toda a sua riqueza e expressão especialmente em seus estágios de preparação. ... As radiações da nossa mente são reflexos imperfeitos da grande demonstração dos fogos de artifício movimentados por Brama e a grande arte só é grande por causa da sua conformidade com a ordem divina
com aquilo que ela é".
Ainda que estamos longe de dizer que o tempo, que agora existe, não tem nenhuma realidade objetiva para com Deus. Para ele passado, presente e futuro são "um eterno agora", não no sentido de que não há nenhuma distinção entre eles, mas só no sentido de que ele vê o passado e o futuro de um modo tão vivido como o presente. O tempo começou com a criação e porque as sucessões da história são verdadeiras sucessões, aquele que vê segundo a verdade deve reconhecê-las.
Thomas Carlyle chama Deus de "o Eterno Agora". Mason, Faith ofthe Gos- pel, 30 - "Deus não é um zombador do tempo. ... Um dia é para o Senhor como mil anos. Ele vale o infinitésimo no tempo, assim como no espaço. Daí a paciência, a longanimidade, a expectação de Deus". Devemos lembrar a inscrição no relógio de sol em que se fala a respeito das horas: "Pereunt et
imputantur"- "Eles passam de largo e são acusados por nossa causa". Um certo pregador assinalou sobre a sabedoria de Deus que assim ordenou que os momentos de tempo vêm sucessivamente e não de um modo simultâneo e deste modo impedem a confusão infinita! Shedd, Dogm. Theol., 1.344, ilustra a eternidade de Deus através de dois meios nos quais uma pessoa pode ver uma procissão: em primeiro lugar, de um portal na rua pelo qual a procissão está passando; em segundo lugar do alto de uma torre que comanda a visão de toda a procissão ao mesmo tempo.
S. E. Meze, citado em Royce, Conception ofGod, 40 - "Como se todos nós fôssemos cilindros, com os seus terminais removidos movendo-se através das águas de um lago plácido. Para os cilindros as águas parecem mover-se.
O que passou é uma memória; o que está para vir é duvidoso. Mas o lago sabe que toda a água é igualmente real e que é tranqüila, imóvel não turbulenta. Falando tecnicamente, o tempo não é uma realidade. As coisas parecem passadas e futuras e, em certo sentido, não existentes para nós, mas, na verdade, são tão genuinamente reais como o presente o é". Mesmo aqui existe uma ordem. Você não pode executar uma sinfonia do fim para o começo e ter uma música. Esta qualificação deve ao menos ser posta nas palavras de Berkeley: "Acho que uma sucessão de idéias constitui o tempo e não é apenas a medida sensível dele, como pensam o Sr. Locke e outros".
Finney, citado em Biblia Sacra, out. 1877.722 - "Eternidade para nós significa toda a duração passada, presente e futura. Mas para Deus significa só agora. Duração e espaço, com relação à existência dele, significa coisas infinitamente distintas do que elas fazem com referência a nossa existência. A existência de Deus e seus atos, com relação à existência finita, referem-se ao tempo e ao espaço. Mas quando se relacionam com a nossa existência, tudo é aquie agora. Sobre todas existências finitas, Deus pode dizer: Eu fui, eu sou, eu serei, eu farei; mas sobre a sua própria existência, tudo o que ele pode dizer é: Eu sou, eu faço".
Edwards, o moço, Works, 1.386,387 - "Na mente divina não há sucessão alguma; por isso não ocorre nenhuma nova operação. Todos atos divinos são desde a eternidade; para Deus não há tempo. Os efeitos destes atos divinos, na verdade, todos ocorrem no tempo e numa sucessão. Se se pudesse dizer que nesta suposição os efeitos não ocorrem senão após os atos através dos quais eles são produzidos, eu responderia que eles agem assim de acordo com o nosso ponto de vista, mas não no de Deus. Para ele o tempo não existe; nem antes nem depois a respeito do tempo; o tempo não tem existência na mente divina nem na natureza das coisas separadas das mentes e percepções das criaturas; mas ele depende da sucessão das percepções". Devemos qualificar esta afirmação do jovem Edwards com a de Julius Müller, como segue: "Se a operação de Deus pode não ter nenhuma relação com o tempo, todos os limites da união entre Deus e o mundo transformam-se em pedaços através das dentadas".
Pergunta interessante é esta se o espírito humano é capaz de uma existência independente do tempo e se a concepção deste é puramente física. Em sonhos parece que perdemos de vista a sucessão; na dor extrema a idade se comprime num minuto. Será que isto lança luz sobre a natureza da profecia? É a alma do profeta um rapto na existência e visão independente do
tempo? É de duvidar que Ap. 10.6 - õti xpóvoç o-úicè-ti. eoxai (Strong cita uma tradução bem próxima da língua original: "não existirá mais tempo"; a Revista e Atualizada dá: "já não haverá demora"; a Revista e Corrigida: idem) merece confiança como prova afirmativa; porque a Revised Version marg. e American Revisers traduzem "there shall be delay no longer" (não haverá mais demora). Julius Müller, Doct. of Sin, 2.147 - "Toda a consciência própria é uma vitória sobre o tempo". Shedd, Dogm. Theol., 1.351 - "Há aqui sucessão e série tão grandemente rápida que parece simultânea". Esta rapidez, contudo, é tão grande que mostra que cada homem pode no fim ser julgado num instante.
Imensidade
Isto significa que a natureza de Deus a) não tem extensão; b) não está sujeita a nenhuma limitação de espaço; e c) contém em si a causa do espaço.
Re. 8.27 - "eis que os céus e até o céu dos céus te não poderiam conter". O espaço é uma criação de Deus; Rm. 8.39 - "nem a altura, nem a profundidade, nem outra criatura". Zahn, Bib. Dogmatik, 149 - "A Escritura não ensina a imanência de Deus no mundo, mas a imanência do mundo em Deus". Dante não põe Deus como centro, mas Satanás; e, no centro, Satanás é esmagado com todo o peso do universo. Deus é o ser que abrange tudo. Todas as coisas existem nele. E. G. Robinson: "O espaço é uma relação; Deus é o autor das relações e dos nossos modos de pensamento; por isso Deus é o autor do espaço. O espaço condiciona o nosso pensamento, mas não condiciona o de Deus".
Jonathan Edwards: "Lugar em si é mental e dentro e fora são concepções.
... Quando digo que o universo material existe só na mente, quero dizer que ele depende absolutamente da concepção da mente para a sua existência e não existe como os espíritos, cuja existência não consiste na concepção das nossas mentes, nem depende delas". H. M. Stanley, sobre Espaço e Ciência, em Philosophical Rev., nov. 1898.615 - "O espaço não é cheio de coisas, mas as coisas são espaçosas. ... O espaço é uma forma de aparências dinâmicas". Bradley leva ao extremo a idealidade de espaço quando, em sua Appearance and Reality, 35-38, diz-nos: Espaço não é uma simples relação, porque ele tem partes e o que podem ser as partes de uma relação? Mas o espaço não é nada a não ser uma relação porque é distâncias de distâncias
nada que possamos achar. Não podemos achar nenhum termo quer dentro, quer fora. O espaço, para ser espaço, deve ter espaço exterior a si mesmo.
Por isso Bradley conclui que espaço não é realidade, mas apenas aparência.
Imensidade é infinitude em relação ao espaço. A natureza de Deus não está sujeita à lei de espaço. Deus não está no espaço. É mais correto dizer que o espaço está em Deus. Contudo, o espaço tem uma realidade objetiva para Deus. Com a criação o espaço começou a ser e, porque Deus vê segundo a verdade, ele reconhece as relações de espaço na criação.
Muitas das notas apresentadas na explicação do tempo aplicam-se ao espaço. O espaço não é uma substância, nem um atributo, mas uma relação. E ele existe tão logo a matéria extensa exista, e existe como sua condição necessária, quer suas mentes percebam, quer não. Reid, Intellectuat Powers, ensaio 2, cap. 9 - Espaço não é tão apropriadamente um objeto do sentido como um elemento concomitante dos objetos da visão e do tato". Quando vemos ou tocamos um corpo temos a idéia do espaço em que o corpo existe, mas a idéia de espaço não é fornecida pelo sentido; é uma cognição da razão a priori. A experiência fornece ocasião para a sua evolução, mas a mente evolui a sua concepção através da sua própria energia nativa.
Anselmo, Proslogion, 19 - "Nada te contém, mas tu conténs todas coisas". Contudo, não é absolutamente preciso dizer que o espaço está em Deus porque esta expressão parece sugerir que Deus é um espaço maior que de certo modo inclui o menor. Ao invés disto, Deus é não espacial e Senhor do espaço. A noção de que espaço e a imensidão divina são idênticos conduz à uma concepção materialista de Deus. Espaço não é atributo de Deus, como sustentava Clarke e nenhum argumento da existência divina pode ser construído a partir desta premissa (ver pp. 85,86; Apost. 14; Apênd. Criação, p. 36). Martineau, Types, 1.138,139,170 - "Malebranche dizia que Deus é o lugar de todos os espíritos, do mesmo modo que o espaço é o lugar de todos os corpos. ... Descartes sustentava que não há esta coisa de espaço vazio. O nada não pode possivelmente ter extensão. Onde quer que esteja a extensão ali está alguma coisa estendida. Daí a doutrina de um plenum. É inconcebível a existência de um vácuo". Lotze, Outlines Methaphysics, 87 - "Segundo o ponto de vista comum ... o espaço existe, e as coisas existem ne/e; segundo o nosso ponto de vista, só as coisas existem e entre elas não existe nada, mas o espaço existe ne/as".
Case, Physical Realism, 379,390 - "Espaço é a continuidade, ou a extensão contínua, do universo como substância". Ladd: "É o espaço extenso? Então deve ser extenso em algum outro espaço. Esse outro espaço é o de que falamos. Então o espaço não é uma entidade, mas uma pressuposição mental da existência da substância extensa. Espaço e tempo nem são finitos nem infinitos. Nem é circunferência, nem centro; seu centro seria toda a parte. Afinal de contas nem podemos imaginar o espaço. É somente uma precondi- ção da mente capacitar-nos a perceber as coisas". Em Biblia Sacra, 1890.415444, art.: É o Espaço uma realidade? O prof. Mead se opõe à doutrina de que o espaço é puramente subjetivo, como ensina Bowne; também a doutrina de que o espaço é uma certa ordem de relações entre realidades; que o espaço nada é sem as coisas; mas que as coisas, quando existem, ocorrem em certas relações, e que a soma, ou sistema, de tais relações constitui o espaço.
Preferimos o ponto de vista de Bowne, Metaphysics, 127,137,143, de que "Espaço é a forma da experiência objetiva e nada é da abstração dessa experiência. ... "É uma forma de intuição e não um modo de existência. Segundo este ponto de vista, as coisas não estão no espaço e nas relações de espaço, mas aparentam estar. Em si mesmas essencialmente elas são não espaciais; mas através das suas interações recíprocas e com a mente, elas causam a aparência de um mundo de coisas extensas num espaço comum. Então, os predicados de espaço pertencem apenas aos fenômenos, não às coisas em
si.... A realidade aparente existe de um modo espacial; mas a própria realidade ontológica existe de um modo não espacial e sem predicados espaciais".
Segunda Divisão - Atributos relacionados com a Criação
Onipresença
Isto significa que Deus, na totalidade da sua essência, sem difusão ou expansão, multiplicação ou divisão, penetra e ocupa o universo em todas as suas partes.
SI. 139.7 sq. - "Para onde me irei do teu Espírito? ou para onde fugirei da tua face?"; Jr. 23.23,24 - "Sou eu apenas Deus de perto, diz o Senhor, e não também Deus de longe? Não encho eu os céus e a terra?"; At. 17.27,28 - "não está longe de nós; porque nele vivemos, nos movemos e existimos". Faber: "porque Deus nunca está tão longe; na verdade, está perto. Ele está dentro de nós. Nosso espírito é o lar que ele sustenta com apreço. Pensar nele como alguém que está ao nosso lado é quase tão inverídico como remover o seu santuário dos céus azuis coalhados de estrelas. Do mesmo modo, sempre quando pensava em mim mesmo como sem-teto, abandonado e fatigado, perdendo o meu regozijo, caminhava pela terra ao santuário de Deus". Henri Amiel: "De cada ponto da terra estamos igualmente perto do céu e do infinito". Tennyson, The Higher Pantheisrrr. "Fala-lhe, então, porque ele ouve, e o espírito com o espírito pode encontrar-se; ele está mais perto do que o fôlego, mais perto do que as mãos e os pés". "Tão pleno, tão perfeito, como a um fio de cabelo do coração".
O ateu escreveu: "Deus não está em lugar nenhum", mas a sua filhinha leu: "Deus está agora aqui", e isto o converteu. [Em inglês: "God is nowhere (nowhere = em parte alguma, em nenhum lugar)" e a menina leu: "God is now here (now here = agora aqui)"]. A criança às vezes pergunta: "Se Deus está em toda a parte, como pode haver lugar para nós?" e a única resposta é que Deus não é um ser material, mas espiritual, cuja presença não exclui a existência finita, mas, ao invés disso, torna tal existência possível. Esta presença universal de Deus teve de ser aprendida gradualmente. Requereu grande fé em Abraão para que saísse de Ur dos caldeus, e ainda sustentar que Deus estaria com ele numa terra distante (Hb. 11.8). Jacó aprendeu que a escada celeste o seguia por qualquer lugar aonde ele fosse (Gn. 28.15). Jesus ensinou que "nem neste monte, nem em Jerusalém adorareis o Pai" (Jo. 4.21).
As misteriosas vindas e idas do nosso Senhor após a sua ressurreição pretendiam ensinar aos seus discípulos que estaria com eles "todos os dias, até a consumação dos séculos" (Mt. 28.20). A onipresença de Jesus demonstra, a fortiori, a onipresença de Deus.
Como explicação deste atributo, podemos dizer:
A onipresença de Deus não é potencial, mas essencial. - Rejeitamos a representação sociniana de que a essência de Deus está no céu e só o seu
poder está na terra. Quando se diz que "Deus habita no céu", deve-se entender ou como linguagem simbólica ou como expressão de exaltação acima das coisas terrenas, ou como uma declaração de que suas mais especiais e gloriosas manifestações próprias são aos espíritos do céu.
SI. 123.1 - "Para ti, que habitas nos céus"; 113.5 - "que habita nas alturas"; Is. 57.15 - "o Alto e o Sublime, que habita na eternidade". A simples onipresença potencial é tanto deística como Sociniana. Como as aves do céu, ou os peixes do mar, "em casa ou fora ainda estamos rodeados com Deus". Não precisamos subir até o céu para pedir que ele desça ou ao abismo para que ele suba (Rm. 10.6,7). A melhor ilustração se encontra na presença da alma em cada parte do corpo. Parece que a mente não está confinada ao cérebro. Na filosofia, o realismo natural, diferente do idealismo, requer que a mente esteja no ponto de contato com o mundo exterior, ao invés de ter relacionamentos e idéias trazidas para o cérebro. Todos os que crêem numa alma consideram-na presente ao menos em todas as partes do cérebro e isto é uma onipresença relativa em princípio não menos difícil que a sua presença em todas as partes do corpo. O cérebro de um animal pode estar congelado num pedaço sólido como um gelo, apesar de que, após o degelo, ele agirá como antes: apesar de que o congelamento de todo o corpo causará a morte.
Se o princípio imaterial estivesse confinado ao cérebro, seria de esperar que
o congelamento do cérebro causasse a morte. Mas se a alma pode estar onipresente no corpo ou mesmo no cérebro, o Espírito pode estar onipresente no universo. Bowne, Metaphysics, 136 - "Se as coisas finitas são modos do infinito, cada coisa deve ser um modo do infinito inteiro; e o infinito deve estar presente em sua unidade e plenitude em cada coisa finita, exatamente como a alma inteira está presente em todos os seus atos". Esta concepção idealista da mente toda presente em todos os seus pensamentos deve ser considerada como a melhor analogia da onipresença de Deus no universo. A este ponto de vista objetamos que esta onipresença é simplesmente potencial conforme encontramos em Clarke, Christian Theology, 74 - "Nós sabemos e só nós sabemos que Deus é capaz de produzir a sua ação, sem levar em conta o lugar. ... A onipresença é um elemento da imanência de Deus. ... Se ele não está em toda a parte, na verdade, ele não é Deus em parte nenhuma. A onipresença está implicada em toda a providência, em toda a oração, em toda a comunhão com Deus e confiança nele".
Até onde se concebe que a consciência não está confinada a um só ponto no cérebro, a pergunta se outras porções do cérebro ou do corpo também podem ser sede da consciência pode ser considerada como puramente acadêmica, e a resposta não precisa afetar o nosso presente argumento. Admitimos o princípio da onipresença uma vez que sustentamos que a alma é consciente em mais de um ponto do organismo físico. Contudo a pergunta sugerida acima é interessante e a respeito dela os psicólogos estão divididos. Paulsen, Einleitung in die Philosofie (1892), 133-159, sustenta que a consciência é correlata à soma total dos processos corporais e com ele concordam Fechner e Wundt. "Plüger e Lewes dizem que, como os hemisférios do cérebro devem a sua inteligência à consciência que sabemos estar nele assim a inteligência
dos atos do nervo espinhal deve realmente ser devido à presença de uma consciência de grau inferior". A cascavel do Prof. Brewer após várias horas de ter sido decapitada ainda o atacava com o seu pescoço ensangüentado quando ele tentava agarrá-la pela cauda. A partir da reação da perna do sapo decapitado não podemos inferir alguma consciência? "Robin, ao fazer cócegas no peito de um criminoso uma hora depois da sua decapitação viu o braço e a mão moverem-se para a marca". Hudson, Demonstration Ofa Future Life, 239-249, cita Hammond, Tratise on Insanity, cap. 2, para provar que o cérebro não é o único órgão da mente. O instinto não reside exclusivamente no cérebro; ele está situado na medulla oblongata, ou nervo espinhal ou em ambos órgãos. A mente objetiva, no entender de Hudson, é função do cérebro físico e cessa quando o cérebro perde a sua vitalidade. Alguns animais executam atos instintivos após a retirada do cérebro e seres humanos nascidos sem o cérebro fazem o mesmo. Johnson, Andover Ftev., abr 1890.421 - "O cérebro não é a única sede da consciência. A mesma evidência que aponta para o cérebro como a principal sede da consciência também aponta para os centros nervosos situados no nervo espinhal ou em outra parte como sede de uma consciência ou inteligência mais ou menos subordinada". Ireland, Blot on the Brain, 26 - "Não vejo prova de que a consciência está totalmente limitada ao cérebro".
A despeito destas opiniões, contudo, devemos admitir que o consenso geral entre os psicólogos está do outro lado. Dewey, Psychology, 349 - Os nervos sensoriais e os motores têm pontos de contato no nervo espinhal. Quando se transfere o estímulo de um nervo sensorial para um motor sem a intervenção consciente da mente, temos uma ação reflexa.... Se alguma coisa se aproxima do olho o estímulo é transferido para o nervo espinhal e, em vez de ser contínuo até o cérebro e causar o aparecimento de uma sensação, descarrega-se num nervo motor e o olho se fecha imediatamente. ... A ação reflexa em si mesma não envolve consciência". William James, Psychology, 1.16,66,134,214 - "O córtex cerebral é o único órgão da consciência do homem. ... Se houver qualquer consciência pertencente aos centros inferiores, trata-se de uma consciência de que o eu nada conhece. ... Nos animais inferiores não é este o caso. ... A sede da mente no que se refere às suas relações dinâmicas, encontra-se em alguma parte no córtex do cérebro".
A onipresença de Deus não é a presença de uma parte, do todo divino em toda a parte. - Isto se segue da concepção de Deus como incorpóreo. Rejeitamos a representação materialista de que Deus é composto de elementos materiais que podem ser divididos e separados. Não há nenhuma multiplicação ou difusão de sua substância que corresponda às partes dos seus domínios. A essência una de Deus está presente ao mesmo tempo em tudo.
Re. 8.27 - "o céu e até o céu dos céus não poder-te-iam conter (circunscrever)". Deus deve estar presente em toda a sua essência e em todos os seus atributos em todo lugar. Ele é o "totus in omne parte". Alger, A Poesia do Oriente: "Apesar de que Deus se estende além dos limites da Criação, cada
um dos menores átomos contém todo o seu ser". Disto se segue que o Logos todo pode estar unido ao homem Jesus Cristo presente nele, enquanto ao mesmo tempo ele ocupa e governa o universo todo; e deste modo o Cristo todo pode estar unido ao simples crente e presente nele, de modo tão pleno como se o crente fosse o único a receber a sua plenitude.
A. J. Gordon: "Na matemática o todo é igual à soma das partes. Mas sabemos que, no Espírito, cada parte é igual ao todo. Cada igreja, cada verdadeiro corpo de Jesus Cristo tem o tanto de Cristo como qualquer outra e que tem o Cristo por inteiro". Mt. 18.20 - "Onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles". "O pároco de austeridade subiu à torre de uma Igreja Anglicana a fim de estar mais próximo de Deus de modo a poder entregar a sua palavra ao povo. E no esboço do sermão escreveu o que ele pensava que ter vindo do céu. E ele o despejou na cabeça do povo duas vezes por dia durante sete dias. Foi então que Deus disse: 'Desce e morre', e ele clamou lá da torre: 'Onde estás, Senhor"? E o Senhor respondeu:
'Lá embaixo no meio do meu povo' ".
A onipresença de Deus não é necessária, mas livre. - Rejeitamos a noção panteísta de que Deus está confinado ao universo como o universo está confinado a Deus. Deus é imanente no universo, não por coação, mas por ato livre da sua vontade, e esta imanência é qualificada por sua transcendência.
Deus poderia por sua vontade deixar de ser onipresente, porque ele poderia destruir o universo; mas, enquanto o universo existir, ele está e deve estar em toda a parte. Deus é a vida e a lei do universo; esta é a verdade do panteísmo. Mas ele também é pessoal e livre; isto o panteísmo nega. O Cristianismo sustenta a liberdade do mesmo modo que a onipresença essencial - entretanto, qualificada e suplementada pela transcendência de Deus. A alardeada verdade no panteísmo é um princípio elementar do cristianismo e é só a pedra de travessia para uma verdade mais nobre: a presença pessoal de Deus na sua igreja. O Talmude contrasta a adoração de um ídolo com a do Senhor: "O ídolo parece tão próximo, mas está tão longe, enquanto o Senhor está tão longe, mas está tão perto!" A onipresença de Deus garante-nos que ele está presente conosco para ouvir-nos e presente em cada coração nos confins da terra para responder a oração.
O puritano voltou da moita de beldroega, dizendo: "Eu aprendi a não chamar nada na terra de encantador". Entretanto, este é o desprezo não só do artesanato, mas da presença do Todo-poderoso. A menor coisa na natureza merece estudo porque é a revelação do Deus presente. A uniformidade da natureza e o reino da lei nada são a não ser a firme vontade do Deus onipresente. A gravitação é a onipresença de Deus no espaço, como a evolução é a presença de Deus no tempo. Dorner, System of Doctrine, 1.73 - Sendo Deus onipresente, o contato com ele pode ser conseguido em qualquer momento em oração e na contemplação; é certo que é sempre verdade que nele vivemos, nos movemos e existimos como a fonte perene e onipresente da nossa existência". Rm. 10.6-8 - "Não digas em teu coração: Quem subirá ao céu (isto é, para trazer do alto a Cristo;)? Ou: Quem descerá ao abismo (isto é, a tornar a trazer dentre os mortos a Cristo)? Mas o que diz? A palavra está junto de ti, na tua boca e no teu coração". Lotze, Metaphysics, par. 256, citado em Illingworth, Divine Immanence, 135,136. Aluno da Escola Dominical: "Deus está no meu bolso"? "É claro que sim". "Não. Ele não está porque eu não tenho bolso". Deus é onipresente até onde há um universo, mas ele deixa de ser onipresente quando o universo deixa de ser.
Onisciência
Isto significa que Deus conhece perfeita e eternamente todas as coisas que são objeto do seu conhecimento quer reais ou possíveis, passadas, presentes ou futuras.
Deus conhece a sua criação inanimada: SI. 147.4 - "conta o número das estrelas, chamando-as todas pelos seus nomes". Ele tem conhecimento dos brutos: Mt. 10.29 - pardais - "nenhum deles cairá em terra sem a vontade de vosso Pai". Dos homens e suas obras: SI. 33.13-15 - "olha todos os filhos dos homens ... contempla todas as suas obras". Do coração dos homens e seus pensamentos: At. 15.8 - "Deus, que conhece os corações"; SI. 139.2 - "de longe entendes o meu pensamento". Das nossas necessidades: Mt. 6.8 - "sabe o que vos é necessário". Das mínimas coisas: Mt. 10.30 - "até mesmo os cabelos das vossas cabeças estão contados". Do passado: Ml. 3.16 - "um memorial escrito". Do futuro: Is. 46.9.10 - "anuncio o fim desde o princípio". Dos atos livres dos homens: At. 2.23 - "a este que vos foi entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus". Do idealmente possível: 1 Sm. 23.12 - "Entregar-me-iam os cidadãos de Queila, a mim e aos meus homens, nas mãos de Saul? E disse o Senhor: Entregariam" (sc. se tu permaneces- ses); Mt. 11.23 - "se em Sodoma tivessem sido feitos os prodígios que em ti se operaram, teria ela permanecido até hoje". Desde a eternidade: At. 15.18 - O Senhor, que faz estas coisas que são conhecidas desde a eternidade". Incompreensível: SI. 139.6 - "Tal ciência é para mim maravilhosíssima"; Rm. 11.33 - "Ó profundidade das riquezas tanto da sabedoria como da ciência de Deus". Relacionada com a sabedoria: SI. 104.24 - "Todas as coisas fizeste com sabedoria"; Ef. 3.10 - ""multiforme sabedoria de Deus".
Jó 7.20 - "Ó Guarda dos homens"; SI. 56.8 - "tu contaste as minhas vagueações" = toda a minha vida tem sido um exílio contínuo; põe as minhas lágrimas no teu odre" = o odre do oriente; há tantas lágrimas que podem enchê-lo; "não estão elas no teu livro?" = nenhuma lágrima caiu no solo sem ser notada; Deus as reuniu todas. Hb. 4.13 - "Não há nenhuma criatura encoberta diante dele, antes todas as coisas estão nuas e patentes aos olhos daqueles com quem temos de tratar" - xe-tpaxriXiciiéva - com a cabeça pendida para trás e o pescoço nu como os animais mortos em sacrifício, ou agarrados pela garganta e lançados às costas de modo que o sacerdote pudesse descobrir se havia qualquer mancha. Diz o provérbio japonês: "Deus se esqueceu de esquecer".
A onisciência de Deus pode ser demonstrada a partir da sua onipresença assim como a partir da sua verdade ou autoconhecimento, no qual o plano d.- criação tem sua eterna base e a partir da profecia, que expressa a onisciência de Deus.
Convém lembrar que a onisciência, como designação de um atributo relativo e transitivo, não inclui o autoconhecimento de Deus. O termo é empregado num sentido técnico de Deus conhecer todas as coisas pertencentes ao universo da sua criação. A.H. Gordon: "Viagens leves mais rápidas que o som". Você pode ver um lampejo do fogo da boca do canhão a uma milha de distância, bem antes que o ruído da descarga chegue ao ouvido. Deus produziu o lampejo de uma predição nas páginas da sua palavra e nós o vemos. Aguardemos um pouco e veremos o próprio evento".
Royce, The Conception of God, 9 - "O ser onisciente deve ser aquele que se apresenta não em virtude de processos de investigação fragmentários e gradualmente completos, mas em virtude de um discernimento de alcance total direto e transparente para com a sua própria verdade; o que eu digo é que ele apresenta a si mesmo a resposta realizada, a cada pergunta genuinamente racional".
Porque ela é livre de toda a imperfeição, o conhecimento de Deus é imediato como distinto do conhecimento que vem através do sentido ou da imaginação; simultâneo, não adquirido por observação ou construído por processos de raciocínio; distinto, livre de toda a vacuidade ou confusão; verdadeiro, correspondendo perfeitamente à realidade das coisas; eterno, compreendido em um ato que independe do tempo na mente divina.
Uma mente infinita deve sempre agir e agir de um modo absolutamente perfeito. Em Deus não há sentido, símbolo, memória, abstração, crescimento, reflexo, arrazoado; seu conhecimento é totalmente direto e sem intermediários. Os egípcios com propriedade não representavam Deus tendo olho, mas sendo-o. Para nós, seus pensamentos "são mais do que se podem contar" (SI. 40.5), não porque haja sucessão neles, ora lembrando, ora esquecendo, mas porque nunca há um momento da nossa existência em que estejamos fora da sua mente; ele está sempre pensando em nós. Gn. 16.13 - "tu és Deus que vê". Mivart, Lessons from Nature, 374 - "Cada criatura de cada ordem de existência, conquanto sustentada, é tão complacentemente contemplada por Deus, que a atenção de todos os homens de ciência juntos podem apenas formar um símbolo inadequado de tal contemplação divina". Deste modo, o escrutínio de Deus sobre cada ato das trevas é mais do que um simples relance de um Coliseu total de espectadores e o seu olho é mais vigilante sobre os bons do que todos os exércitos do céu e da terra juntos.
Armstrong, God and the Soul: "A energia de Deus é a atenção concentrada, concentrada em toda a parte. Podemos dar atenção a duas ou três coisas ao mesmo tempo; o pianista toca e conversa ao mesmo tempo; o mágico faz
uma coisa enquanto aparenta fazer outra. Deus dá atenção a todas as coisas ao mesmo tempo". Marie Corelli, Master Christian, 104 - "O biógrafo é uma indicação de que cada cena da vida humana panorama movendo-se em algum lugar, para ver alguma pessoa". O telégrafo sem fio é uma estupenda advertência de que para Deus não há segredo e que "nada há encoberto que não haja de revelar-se, nem oculto que não haja de saber-se" (Mt. 10.26).
Os raios de Róntgen (raios x) que fotografam o nosso interior, mesmo através das nossas roupas e mesmo na escuridão da meia-noite, mostram que, para Deus "a noite resplandece como o dia" (SI. 139.12).
O telescópio equatorial do Prof. Mitchel, que vagarosamente é movimentado por um cronógrafo na direção do ocaso, subitamente tocou o horizonte e descobriu um menino numa árvore roubando maçãs, mas o menino não sabia que estava sob a mira do astrônomo. Nada tão temível para o prisioneiro no cachot (calabouço) francês como o olho do guarda que nunca parava de vigiá-lo em perfeito silêncio pelo furo na porta. Como no Império Romano o mundo todo era para um malfeitor uma grande prisão e, em sua fuga para as mais distantes terras, o imperador podia saber o que se pensava dele, do mesmo modo, no governo de Deus nenhum pecador pode escapar ao olho do seu Juiz. O texto de Gn. 16.13 - "Tu és Deus que vê" - tem sido empregado como um constrangimento do mal ao invés de um estímulo para o bem. Para os filhos do diabo, sem dúvida deve haver tal constrangimento. Para os filhos de Deus, entretanto, não há dúvida de que se trata do estímulo para o bem. Deus não deve ser considerado como um exator que supervisiona ou que ameaça, mas, ao invés disso, alguém que nos entende, nos ama e nos ajuda.
SI. 139.17,18 - "Quão preciosos são para mim, ó Deus, os teus pensamentos! Quão grande é a soma deles! Se os contasse, seriam em maior número do que a areia; quando acordo, ainda estou contigo".
Porque Deus conhece as coisas como são, ele conhece as seqüências necessárias de sua criação como necessárias, os atos livres da criaturas como livres, os idealmente possíveis como idealmente possíveis.
Deus sabe o que teria acontecido sob circunstâncias não presentes agora; sabe o que o universo teria sido se ele tivesse escolhido um plano diferente para a criação; sabe o que teriam sido as nossas vidas se tivéssemos tomado decisões diferentes no passado (Is. 48.18 - "Ah! se tivesses dado ouvido ... Então a tua paz seria como um rio"). Clarke, Christian Theology, 77
"Deus tem um duplo conhecimento do seu universo. Ele o conhece desde a eternidade como é em sua mente, como existe desde, do mesmo modo que conhece a sua idéia; e conhece-o como realmente é no tempo e no espaço, movendo-se, mudando, crescendo, num processo de perpétua sucessão. Em sua própria idéia, ele conhece tudo ao mesmo tempo; mas ele também sabe da perpétua transformação e, com referência aos eventos, ele tem a presci- ência, o conhecimento presente, e o conhecimento posterior sobre como eles ocorrem. ... Ele concebe todas as coisas simultaneamente, mas observa-as em sua sucessão".
Royce, World and Individual, 2.374 - sustenta que Deus não prevê temporariamente qualquer coisa exceto quando ele expressa nos seres finitos, ainda que o Absoluto possua um conhecimento perfeito num relance de toda a ordem temporal, presente, passada e futura. Isto, diz ele, não é presciência, mas conhecimento eterno. Priestley negava que qualquer evento contingente fosse objeto do conhecimento. Mas Reid diz que a negação de que qualquer ação livre pode ser prevista envolve a negação da própria atuação livre de Deus visto que as suas ações futuras podem ser previstas pelos homens; além disso, conquanto Deus prevê as suas ações livres, isto não as determina de modo necessário.
O fato de que nada há na condição presente das coisas a partir das quais as ações futuras das criaturas livres necessariamente se seguem por lei natural não impede Deus de prever tais ações porque seu conhecimento não é mediato. mas imediato. Ele não só conhece antecipadamente os motivos que ocasionarão os atos dos homens, mas diretamente conhece diretamente os próprios atos. A possibilidade de tal conhecimento direto sem atribuir sua base é aparente se admitirmos que o tempo é uma forma de pensamento finito a que a mente divina não está sujeita.
Aristóteles sustentava que não há nenhum conhecimento exato das ocorrências futuras eventuais. De igual modo, Socínio, conquanto admita que Deus conhece todas as coisas cognoscíveis, resume os objetos do conhecimento divino, afastando do número aqueles cuja existência futura ele considera incerta, tais como as determinações dos agentes livres. Estes, sustenta ele, não podem ser conhecidos antecipadamente porque nada há na condição presente das coisas a partir das quais eles necessariamente vêm em conseqüência de um causa natural. O homem que fabrica um relógio pode dizer quando ele vai bater as horas. Mas a vontade livre, não estando sujeita às leis mecânicas, não pode ter seus atos preditos ou conhecidos com antecedência. Deus conhece as coisas nas suas causas - os eventos futuros só nos seus antecedentes.
Com esta doutrina sociniana concordam alguns arminianos, como McCabe em Foreknowlegde of God e em Divine Nescience of Future Contingencies a Necessity. McCabe, contudo, sacrifica o princípio da livre vontade, em defesa do qual ele faz esta rendição da presciência de Deus, dizendo que, nos casos de profecia cumprida, como a negação de Pedro e a traição de Judas, Deus exerceu influências especiais a fim de garantir o resultado; de modo que a vontade de Pedro e a de Judas agiram isentas da responsabilidade sob a lei de causa e efeito. Ele cita o Dr. Daniel Curry declarando que a negação absoluta da presciência divina é complemento essencial à teologia metodista sem o que sua incompleta filosofia é indefensável contra a consistência lógica do calvinismo". Ver também o artigo de McCabe na Methodist Review, set. 1892.760-773. l/ertambém Simon, Reconciliation, 287-"Deus constituiu uma criatura cujas ações ele só pode conhecer como tais depois de executadas. Na presença do homem, em certa extensão, até mesmo o grande Deus
condescende em esperar; ainda mais: ele assim ordenou as coisas para que pudesse aguardar, inquirindo: 'O que ele vai fazer?'"
Também Dugald Stewart: "Arriscarei afirmar aquilo que excede ao poder de Deus permitir tal conjunto de eventos contingentes para que ocorram quando a sua própria presciência não alcança?" Martensen sustenta este ponto de vista e Rothe, Theologische Ethik, 1.212-234, que declara que as escolhas livres dos homens aumentam continuamente o conhecimento de Deus. Do mesmo modo também Martineau, Study of Religion, 2.279 - "A crença na presciência divina sobre o nosso futuro não apresenta base nenhuma na filosofia. Nós não mais consideramos ser verdade que Deus conhece o memento da minha vida moral que virá a seguir. Até mesmo ele não sabe se eu vou me entregar à tentação secreta ao meio-dia. Para ele a vida é um drama cuja conclusão ele desconhece". Então, diz o Dr. A.J. Gordon, nada há tão lúgu- bre e tão terrível como viver sob a direção de um Deus assim. O universo está correndo como um trem expresso sem farol ou sem maquinista; a qualquer momento podemos cair no abismo. Lotze não nega a presciência de Deus a respeito das livres ações do homem, mas considera para o intelecto humano insolúvel o problema da relação de tempo para com Deus e tal presciência como "um dos postulados a respeito dos quais não sabemos como eles podem cumprir-se". Bowne, Philosophy of Theism, 159 - "A presciência de um ato livre é o conhecimento sem a base própria para conhecer. Sobre a suposição de um tempo real, é difícil achar uma saída para esta dificuldade. ... A doutrina da idealidade do tempo ajuda-nos, sugerindo a possibilidade de um presente de total alcance, ou um eterno agora, para Deus. Neste caso, o problema desaparece com o tempo, que é a sua condição".
Quanto à doutrina da nesciência divina, insistimos não só na nossa fundamental convicção sobre a perfeição de Deus, mas no constante testemunho da Escritura. Em Is. 41.21,22 Deus faz da sua presciência o teste da sua divindade na controvérsia com os ídolos. Se Deus não pode antecipar o conhecimento dos atos livres do homem, "o Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo" (Ap. 13.8), então foi somente um sacrifício a ser oferecido no caso de Adão cair, e Deus não sabia se cairia ou não, e no caso de Judas trair Cristo, Deus não sabia se Judas trairia ou não. Na verdade, visto que o curso da natureza muda de acordo com a vontade do homem quando ele queima cidades e derruba florestas, segundo esta teoria Deus não pode predizer nem mesmo o curso da natureza. Por isso, toda a profecia é um protesto contra este ponto de vista.
Não somos capazes de dizer de que modo Deus tem a presciência das livres decisões do homem, mas então o método do conhecimento de Deus a respeito de muitas outras coisas nos é desconhecido. Têm sido propostas as seguintes explicações. Deus pode ter a presciência dos atos livres:
Mediatamente, tendo a presciência dos motivos destes atos, quer porque estes motivos induzem a tais atos, 1) necessariamente, ou 2) com certeza. Deve-se aceitar este último caso quer porque os motivos nunca são causas, mas somente ocasiões, da ação. A causa é a vontade, ou o próprio homem. Mas pode-se dizer que ter presciência dos atos através dos motivos, afinal de contas não é ter presciência, mas é raciocinar ou, ao invés disso, inferir. Contudo, apesar de que os seres inteligentes normalmente agem
segundo motivos previamente dominantes, eles também, em momentos críticos, como na queda de Satanás e na de Adão, escolheram entre motivos e, em tais casos, o conhecimento dos motivos que eles tinham não lhes deu a chave para as suas decisões. Por isso, outra afirmação se propõe a resolver estas dificuldades, a saber, Deus pode ter a presciência dos atos livres;
Imediatamente, através da pura intuição, inexplicável para nós. Julius Müller, Doctrine ofSin, 2.203,225 - "Se Deus pode conhecer um evento futuro como certo apenas através do cálculo das causas, pode-se admitir que ele não pode ter a presciência com certeza de qualquer ato livre do homem; porque a sua presciência seria, então, uma prova de que o ato em questão é a conseqüência necessária de algumas causas e não é em si mesma livre.
Ao contrário, se o conhecimento divino for considerado intuitivo, vemos que ele está na mesma relação que o próprio ato quanto aos seus antecedentes e deste modo fica removida a dificuldade". Mesmo sobre este ponto de vista permanece a dificuldade de perceber como pode haver na mente de Deus uma certeza subjetiva relativa aos atos a respeito dos quais não há nenhuma base objetiva fixa da certeza. Contudo, a despeito desta dificuldade, sentimo- nos tanto limitados à Escritura como à idéia fundamental da perfeição de Deus a fim de sustentar o perfeito conhecimento de Deus sobre os atos livres das suas criaturas. Dizemos com o Presidente Pepper: "O conhecimento da contingência não é necessariamente conhecimento contingente". Com Whedon: "Não se trata de cálculo, mas de puro conhecimento".
é) A presciência não é em si mesma causativa. Não deve ser confundida com a vontade pré-determinante de Deus. As ações livres não ocorrem porque são previstas, mas são previstas porque ocorrem.
Ver uma coisa no futuro não a faz ser, mais do que ver uma coisa no passado. Quanto aos eventos do futuro, podemos, com Whedon, dizer:
"O conhecimento os recebe, não os fez". A presciência pode, e faz, pressupor, mas não é a predeterminação. Tomás de Aquino, em sua Summa, 1.38;
1.1, diz que o conhecimento de Deus é a causa das coisas"; mas ele se sente na obrigação de acrescentar: "Deus não é a causa de todas as coisas que ele conhece, visto que as coisas más que ele conhece não provêm dele".
A onisciência abrange o real e o possível, mas não abrange o autocontra- ditório e impossível porque estes não são objetos do conhecimento.
Deus não sabe qual seria o resultado se dois e dois fossem cinco, nem sabe "se uma quimera ruminando no vácuo devorasse segundas intenções"; e isso, simplesmente em razão de que ele não pode conhecer a autocontradi- ção e o absurdo. Tais coisas não são objeto de conhecimento. Clarke, Christian Theology, 80 - "Pode Deus fazer um velho num minuto? Poderia ele fazer o bem ao ímpio enquanto este permanecesse ímpio? Poderia ele criar um mundo em que dois e dois são cinco?" Royce, Spirit of Modem Philosophy,
366 - "Deus conhece o número total que é a raiz quadrada de 65? ou que
montanhas adjacentes há que não têm vales entre si? Deus conhece quadrados redondos e cubos de sal formados de açúcar, sinarcas, 'Boojums' e Abra- cadabra?"
A onisciência, qualificada por vontade santa, denomina-se na Escritura "sabedoria". Em virtude da sua sabedoria Deus escolhe os mais elevados fins e usa os mais adequados meios para cumpri-los.
Sabedoria não é somente "consideração de todas as coisas segundo o seu próprio valor" (Olmstead); ela tem também em si o elemento do conselho e propósito. Tem sido definida como "o talento de empregar os talentos próprios". implica em duas coisas: primeiro, a escolha do mais elevado fim; segundo, a escolha do melhor recurso para garanti-lo. J. C. C. Clarke, Self and the Father, 39 - "A sabedoria não consiste em concepções inventadas, ou harmonia de teorias com teorias; mas na humilde obediência da mente ao recebimento dos fatos encontrados nas coisas". Deste modo, a sabedoria do homem, a obediência, a fé são nomes para os diferentes aspectos da mesma coisa. Em Deus a sabedoria é a escolha moral que torna a verdade e a santidade supremas. Bowne, Principies of Ethics, 261 - "O socialismo persegue um fim louvável através de recursos insanos ou destrutivos. Não basta ser bom. Nossos métodos devem levar em conta a natureza das coisas, se se espera que sejam bem sucedidas. Não podemos produzir bem-estar através da lei. Nenhuma legislação remove desigualdades da natureza e da constituição. A sociedade não pode produzir igualdade, assim como não pode fazer um rinoceronte cantar, ou legislar a transformação de um gato em leão".
Onipotência
É o poder de Deus fazer todas as coisas que são objeto do seu poder com o sem o uso de meios.
Gn. 17.1 - "Eu sou o Deus Todo-poderoso". Ele forma as maravilhas naturais: Gn. 1.1-3 - "Haja luz"; Is. 44.24 - "estendo os céus por mim mesmo";
Hb. 1.3 - "sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder". Maravilhas espirituais: 2 Co. 4.6 - "Deus, que disse que das trevas resplandecesse a luz, é quem resplandeceu em nossos corações"; Ef. 1.19- "sobreexcelente grandeza do seu poder sobre nós, os que cremos"; Ef. 3.20 - "poderoso para fazer muito mais abundantemente". Poder para criar novas coisas: Mt. 3.9 - "mesmo destas pedras Deus pode suscitar filhos a Abraão"; Rm. 4.17 - "vivi- fica os mortos e chama as coisas que não são como se fossem". Segundo o seu próprio prazer: SI. 115.3-"faz tudo o que lhe apraz"; Ef. 1.11 -"faz todas as coisas segundo o propósito da sua vontade". Nada impossível: Gn. 18.14
"Haveria alguma coisa difícil para o Senhor?" Mt. 19.26 - "a Deus tudo é possível". E. G. Robinson, Christian Theology, 73 - "Se, para a sua existência, todo o poder do universo depende da sua vontade criativa, é impossível conceber qualquer limite para o seu poder a não ser aquele deixado por sua
própria vontade. Mas esta é apenas uma prova negativa; a onipotência absoluta não é demonstrável logicamente, embora prontamente reconhecida como um justo conceito do Deus infinito, quando proposto na autoridade de uma revelação positiva.
A onipotência de Deus é ilustrada pela obra do Espírito Santo, que na Escritura é comparado ao vento, à água e ao fogo. As manifestações comuns destes elementos não fornecem nenhum critério sobre os efeitos que eles podem produzir. O poderoso vento que soprou no Pentecostes é a analogia do vento Espírito, que teve tudo diante de si no primeiro dia da criação (Gn. 1.2; Jo. 3.8; At. 2.2). O derramamento do Espírito assemelha-se ao dilúvio de Noé quando as janelas do céu se abriram e não houve lugar suficiente para receber aquilo que caía Ml. 3.10. E o batismo do Espírito Santo é como
o fogo que destruirá toda a impureza até o fim do mundo (Mt. 3.11; 2 Pe. 3.7-13).
A onipotência não implica poder de fazer o que não é objeto do poder; por exemplo, aquilo que é autocontraditório ou contradiz a natureza de Deus.
Coisas autocontraditórias: "facere factum infectum" - fazer de um evento passado que não tenha ocorrido (daí a inutilidade de orar: "Faça-se aquilo que é bom"); fazer, entre dois pontos, um caminho mais curto do que a reta; reunir duas montanhas separadas sem um vale entre elas. Coisas contrárias à natureza de Deus: mentir, pecar, morrer. Fazer tais coisas não implicaria poder, mas impotência. Deus tem todo o poder consistente com a perfeição infinita - todo o poder para fazer o que é digno dele mesmo. Deste modo, o homem não pode dizer coisa maior do que esta: "Eu me atrevo a fazer tudo quanto possa tornar-se um homem; quem se atreve a fazer mais é filho de nada". Até mesmo Deus não pode fazer o errado ser certo, nem detestar-se por ser bendito. Há quem sustente que o evitar o pecado num sistema moral não é objeto de poder e, por isso, Deus não pode evitar o pecado num sistema moral. Sustentamos o contrário.
Dryden, Imitation of Horace, 3.29.71 - "Sobre o passado nem o céu tem poder; Aquilo que foi, foi e já tive a minha hora" - palavras aplicadas por Lord John Russell à sua própria carreira. Emerson, The Past: "Tudo agora está garantido e firme; Nem os deuses podem abalar o passado". Um aluno da Escola Dominical: Professor, Deus pode fazer uma rocha tão grande que não possa erguê-la?" Professor do Seminário: "Pode Deus mentir?" Estudante do Seminário: "Tudo para Deus é possível".
Onipotência não implica o exercício de todo o poder da parte de Deus. Ele tem poder sobre o seu poder; em outras palavras, o seu poder está sob o controle da sábia e santa vontade. Deus pode fazer tudo o que ele quer, mas não quer tudo o que ele pode. De outra forma seu poder seria mera força agindo necessariamente, e Deus seria escravo de sua onipotência.
Schleiermacher sustenta que a natureza não se baseia apenas na causalidade divina, mas expressa-a plenamente; não existe em Deus uma força causativa de algo que não seja real e verdadeiro. Tal doutrina não difere essencialmente da natura naturans e natura naturata de Spinoza. Mas a onipotência não é instintiva; é uma força utilizada segundo o beneplácito de Deus.
De modo algum Deus está limitado às leis da natureza, ou preso a uma evolução necessária do seu próprio ser, como supõe o panteísmo. Como Rothe já demonstrou, Deus tem um poder livre sobre o poder da natureza e não está compelido a tudo o que ele pode fazer. Das pedras que estão na rua ele pode "suscitar filhos a Abraão", mas ele não o fez. Em Deus estão encerrados os tesouros, uma fonte inexaurível de novos princípios, novas criações, novas revelações. Supor que, na criação, ele despendeu todas as possibilidades do seu ser é negar a sua onipotência. Jó 26.14 - "Eis que isto são apenas as orlas dos seus caminhos; e quão pouco é o que temos ouvido dele! Quem, pois, entenderia o trovão do seu poder?"
Pe. 5.6 - "Humilhai-vos, pois, debaixo da potente mão de Deus" - sua poderosa mão da providência, da salvação, da bênção - para que, a seu tempo, vos exalte; lançando sobre ele toda a vossa ansiedade, porque ele tem cuidado de vós". "As poderosas forças sobre o poderoso controle" - esta é a maior apresentação do poder. A ausência de limites não é a maior liberdade. Os jovens devem aprender que a autolimitação é a verdadeira força.
Pv. 16.32 - "Melhor é o longânimo do que o valente, e o que governa o seu espírito do que o que toma uma cidade". Shakespeare, Coriolano, 2.3 - "Temos em nós mesmos poder para fazê-lo, mas é um poder de termos força para não fazermos". Quando a dinamite se abre, tudo se abre: sem reservas. Deus emprega o seu poder tanto quanto lhe apraz: o que lhe sobra da ira, do mesmo modo que nos outros, ele sufoca.
A onipotência em Deus não exclui, mas implica, o poder de autolimitação. Porque toda essa limitação é livre, é ato e manifestação do poder de Deus. A liberdade humana não se toma impossível por causa da onipotência divina, mas existe em virtude dela. Há um ato de onipotência quando Deus se humilha e assume a carne humana na pessoa de Jesus Cristo.
Tomásio: "Se Deus está sobre todas as coisas e em todas as coisas, ele não as pode ser". SI. 113.5,6 - "Quem como o Senhor, nosso Deus ... que se curva para ver o que está no céu e na terra"? Fp. 2.7,8 - "esvaziou-se a si mesmo ... humilhou-se a si mesmo". O Presidente Woolsey apresentou o verdadeiro poder quando controlou a sua indignação e deixou um estudante que
o ofendeu ir embora. A respeito de Cristo na Cruz, ver Moberly, Atonement and Personality, 116 - "Foi o poder [de conservar a sua vida, a fim de escapar do sofrimento], com a vontade de valer-se dele e não o empregou, que deu provas daquilo que ele era: homem obediente e perfeito". Somos mais parecidos com o onipotente quando nos limitamos em função do amor. O atributo da onipotência é a base da confiança assim como do temor, da parte das criaturas de Deus. Isaac Watts: Cada palavra da sua graça é tão forte como aquele que edifica os céus; a voz que gira as estrelas profere todas as promessas".
Terceira Divisão - Atributos relacionados com os seres morais
Veracidade e Fidelidade ou Verdade transitiva
Veracidade e fidelidade são a verdade transitiva de Deus em sua dupla relação com as criaturas em geral e com seu povo redimido em particular.
SI. 138.2 - "louvarei o teu nome pela tua benignidade e pela tua verdade: pois engrandeceste a tua palavra acima de todo o teu nome"; Jo. 3.33 - "aquele que aceitou o testemunho, esse confirmou que Deus é verdadeiro"; Rm. 3.4 - "seja Deus verdadeiro e todo homem mentiroso"; Jo. 14.17 - "o Espírito de verdade"; 1 Co. 1.9 - "Fiel é Deus"; 1 Ts. 5.24 - "Fiel é o que vos chama"; Nm. 23.19 - "Deus não é homem para que minta"; Tt. 1.2 - "Deus, que não pode mentir, prometeu"; Hb. 6.18 - "nas quais é impossível que Deus minta".
à) Em virtude da sua veracidade, todas as suas revelações às criaturas são consistentes com o ser essencial dele e umas com as outras.
Na veracidade de Deus temos a garantia de que as nossas faculdades em seu exercício normal não nos enganam; que as leis do pensamento são as leis das coisas; que o mundo exterior e as causas secundárias que há nele têm existência objetiva; que as mesmas causas sempre produzem os mesmos efeitos; que as ameaças da natureza moral executar-se-ão no transgressor impenitente; que a natureza moral do homem é a imagem de Deus; e que podemos tirar justas conclusões a respeito do que é a consciência em nós sobre o que a santidade é nele. Por isso podemos esperar que todas as revelações passadas, quer na natureza, quer na sua palavra não serão contraditadas pelo nosso conhecimento futuro, mas, ao invés disso, provarão ter nelas mais verdades do que jamais sonhávamos. A palavra do homem pode passar, mas a palavra de Deus permanece para sempre (Mt. 5.18 - "nem um jota, nem um til se omitirá da lei sem que tudo seja comprido"; Is. 40.8 - "a palavra de Deus permanece para sempre").
Mt. 6.16 - "não sejais como os hipócritas". Em Deus, a expressão exterior e a realidade interior correspondem-se sempre. Os desejos dos assírios eram escritos numa tabuinha encaixada em outra sobre a qual estava escrita a mesma coisa. A quebra ou falsificação do invólucro exterior podia ser corrigida pela referência interior. Do mesmo modo a nossa vida exterior deve estar em conformidade com o coração, que se acha no interior, e o coração, no interior, com a vida exterior. Sobre o dever de falar a verdade e as limitações desse dever, veja-se Newman Smith, Christian Ethics, 386-403 - "entrega a verdade sempre àqueles que, no âmbito da humanidade têm o direito à verdade; esconda-a, ou falsifica-a só quando o direito à verdade tiver sido perdido, ou esteja em falta, por doença, fraqueza, ou alguma intenção criminosa".
Em virtude da sua fidelidade, ele cumpre todas as suas promessas ao seu povo, quer expressas em palavras quer implicadas na constituição que ele lhes conferiu.
Na fidelidade de Deus temos uma base segura da confiança de que ele executará aquilo que o seu amor o levou a prometer aos que obedecem o evangelho. Visto que as suas promessas não se baseiam naquilo que somos ou que temos feito, nas no que Cristo é e fez, nossos defeitos e erros não os invalidam, desde que sejamos verdadeiramente penitentes e tenhamos fé:
Jo. 1.9 - "fiel e justo para nos perdoar os pecados" = fiel à sua promessa e justo para com Cristo. A fidelidade de Deus também garante um suprimento de todas as reais necessidades do nosso ser tanto aqui como daqui em diante, visto que tais necessidades implicam promessas daquele que nos fez:
SI. 84.11 - "não negará bem algum aos que andam na retidão"; 91.4 - "A sua verdade é escudo e broquel"; Mt. 6.33 - "e as demais coisas vos serão acrescentadas"; 1 Co. 2.9 - "as coisas que o olho não viu, e o ouvido não ouviu, e não subiram ao coração do homem são as coisas que Deus preparou para os que o amam".
Régulo volta a Cartago para morrer ao invés de quebrar a sua promessa aos seus inimigos. George William Curtis economiza durante anos e desiste de ser rico para pagar as dívidas do seu pai, que morreu. Quando o General Grant vendeu todos os presentes que lhe deram as cabeças coroadas da Europa e pagou em que o seu filho insolvente o envolvera, disse: "A pobreza e a honra é melhor do que a riqueza e a desgraça". Muitos homens de negócio prefeririam morrer a deixar de cumprir a sua promessa e permitir que o seu título fosse a protesto. A veracidade de Deus não é menor do que a do homem mortal.
Misericórdia e Bondade ou Amor Transitivo
Misericórdia e bondade são o amor transitivo de Deus em sua dupla relação com o desobediente e com as porções de suas criaturas.
Tt. 3.4 - "amor de Deus ... para com os homens"; Rm. 2.4 - "benignidade de Deus"; Mt. 5.44.45 - "amai a vossos inimigos ... para que sejais filhos do Pai"; Jo. 3.16 - "Deus amou o mundo"; 2 Pe. 1.3 - "nos deu tudo o que diz respeito à vida e piedade"; Rm. 8.32 - "nos dará com ele todas as coisas";
Jo. 4.10 - "Nisto está o amor: não em que nós tenhamos amado a Deus, mas em que ele nos amou e enviou seu Filho para propiciação pelos nossos pecados".
Misericórdia é o princípio eterno da natureza de Deus que o leva a buscar o bem temporal e a salvação eterna dos que se opuseram à vontade dele, mesmo a custo do sacrifício próprio.
Martensen: "Visto na relação com o pecado, o amor eterno é a graça compassiva". A contínua entrega da vida natural da parte de Deus é uma prefigu- ração, numa esfera menor, a comunicação da vida espiritual e eterna através de Jesus Cristo. Quando ele nos determina que amemos os nossos inimigos, ele só nos manda seguirmos o seu exemplo. Shakespeare - Titus Andronicus,
2.2 - "Podes aproximar-te da natureza dos deuses? Aproxima-te deles, então, sendo misericordioso". Twelfth Night, 3.4 - "Não há na natureza nenhuma mácula a não ser a mente; nada pode deformar-se a não ser a ausência de bondade. Virtude é beleza".
Bondade é o princípio eterno da natureza de Deus que o leva a comunicar sua própria vida e bênção aos que são semelhantes a ele no caráter moral. Bondade, portanto, é quase idêntica ao amor da complacência; misericórdia ao amor da benevolência.
Note, contudo, que o amor transitivo é apenas uma manifestação exterior do amor imanente. O eterno e perfeito objetivo do amor de Deus está na sua própria natureza. Os homens tornam subordinados os objetivos desse amor só quando eles se tornam conexos e identificados com o seu principal objetivo, a imagem da perfeição de Deus em Cristo. Os homens se tornam filhos de Deus somente no Filho. O requisito para isto acha-se na aceitação de Cristo pelo homem. Deste modo pode-se dizer que Deus entrega-se ao homem justo quando este deseja recebê-lo. E como Deus se dá ao homem, em todos os seus atributos morais, a fim de responder por ele e renovar o seu caráter, há verdade na afirmação de Nordell (Examiner, 17/01/1884) de que a manutenção da santidade é função da justiça divina; a difusão da santidade é função do amor divino". Admitimos que isto é substancialmente verdade, conquanto neguemos que o amor é uma simples forma ou manifestação da santidade.
A entrega própria é diferente da auto-afirmação. O atributo que move Deus a derramar não é idêntico ao que o leva a mantê-lo. Estas duas idéias, de santidade e de amor, são de tal modo distintas como, por um lado, a da integridade e, por outro, da generosidade. Park: "Em certo sentido Deus ama Satanás e nós também devemos amá-lo". Shedd: "Este mesmo amor de compaixão Deus sente para com o não eleito; mas proíbe-se a expressão dessa compaixão por razões que, para Deus, são suficientes, mas inteiramente desconhecidas da sua criatura". A bondade de Deus é a base do galardão, sob o governo de Deus. A fidelidade leva Deus a guardar as suas promessas; a bondade o leva a cumpri-las.
Edwards, Nature of Virtue, in Works, 2.263 - O amor da benevolência não pressupõe beleza no seu objeto. O amor da complacência a pressupõe. Virtude não é amor a um objeto por sua beleza. A beleza dos seres inteligentes não consiste no amor à beleza, ou a virtude no amor a esta. Virtude é o amor ao ser em geral, exercido numa boa vontade geral. Esta é a doutrina de Edwards. Preferimos dizer que virtude é amor, não ao ser em geral, mas ao bom ser, e assim a Deus, o Santo. O amor da compaixão é perfeitamente compatível com a abominação do mal e com a indignação contra aquele que o comete.
O amor não implica necessariamente aprovação, mas o desejo de que todas
as criaturas cumpram o propósito da sua existência através da moral, de conformidade com o Santo.
Rm. 5.8 - "Deus prova o seu amor para conosco em que Cristo morreu por nós, sendo nós ainda pecadores". Devemos amar os nossos inimigos e Satanás é o nosso pior inimigo. Devemos querer o bem de Satanás e acalentar para com ele o amor da benevolência, apesar de não o amor da complacência. Isto não envolve tolerância para com o seu pecado, ou ignorância da sua depravação moral como os versos de Wm. C. Gannett parecem implicar:
"O poema tem o fruto do arbusto quando chega ao olho do poeta; a rua começa para o mascarado quando Shakespeare passa por ela. Cristo vê a brancura do coração de Judas e ama também o seu traidor; para o anjo, Deus explora o seu novo céu, o seu mais profundo inferno".
Justiça e Retidão, ou Santidade Transitiva
Justiça e retidão são a santidade transitiva de Deus, em virtude da qual seu tratamento para com as criaturas se conforma com a pureza de sua natureza, - a retidão demandando de todos os seres morais a conformidade com a perfeição de Deus, e a justiça visitando a inconformidade com aquela perfeição na perda judicial ou sofrimento.
Gn. 18.25 - "Não faria justiça o Juiz de toda a terra"? Dt. 32.4 - "todos os seus caminhos juízos são; Deus é a verdade e nele não há injustiça; justo e reto é"; SI. 5.5 - "aborreces a todos os que praticam a maldade"; 7.9-12 - "ó justo Deus, provas o coração ... salvas os retos ... é um juiz justo, um Deus que se ira todos os dias"; 18.24-26 - retribuiu-me o Senhor conforme a minha justiça ... com o benigno te mostrarás benigno ... com o perverso te mostrarás indomável". Mt. 5.48 - "Sede vós, pois, perfeitos, como é perfeito o vosso Pai, que está nos céus"; Rm. 2.6 - "recompensará a cada um segundo as suas obras"; 1 Pe. 1.16 - "Sede santos porque eu sou santo". Estas passagens mostram que Deus ama as mesmas pessoas que ele detesta. Não é verdade que ele detesta o pecado, mas ama o pecador; ele tanto ama como detesta o pecador; detesta-o quando ele é um vivo e voluntário antagonista da verdade e da santidade, ama-o quando ele é uma criatura capaz do bem e arruinado pela sua transgressão.
Não há nenhum pecado abstrato separado das pessoas em quem esse pecado está representado e incorporado. Thomas Fuller achava difícil esfomear a profanação, mas alimentar a pessoa do impudico mendigo que recorre a ele por alimento. O Sr. Finney declarava que mataria o caçador de escravos, mas o amaria de todo o seu coração. Na guerra civil dos Estados Unidos o Dr. Kirk dizia: "Deus sabe que nós amamos os rebeldes, mas Deus também sabe que nós os mataremos se eles não depuserem as suas armas".
A complexa natureza de Deus não só permite como necessita deste mesmo duplo tratamento para com o pecador e o pai terreno experimenta o mesmo conflito de emoções quando o seu coração anseia pelo filho corrompido que ele é obrigado a banir da sua casa. Moberly, Atonement and Personality, 7 - Quem é punido é o pecador, não o pecado".
Porque justiça e retidão são simplesmente santidade transitiva - e a retidão designa esta santidade principalmente em seu aspecto determinativo, a justiça principalmente no punitivo, - elas não são manifestações de benevolência, ou da disposição de Deus de assegurar a mais alta felicidade das suas criaturas, nem se baseiam na natureza das coisas como algo separado de Deus ou acima dele.
Cremmer, N. T. Lexicorr. Síkcxioç = a perfeita coincidência que existe entre a natureza de Deus a qual é o padrão para todos e para os seus atos". Justiça e retidão são apenas santidade exercida para com as criaturas. A mesma santidade que existe em Deus na eternidade passada manifesta-se como justiça e retidão logo que as criaturas inteligentes passam a existir. Muito do que se disse da santidade como atributo imanente de Deus aplica-se também aqui. A tendência moderna de se confundir santidade com amor mostra-se na incorporação de justiça e retidão na simples benevolência. Vejamos alguns exemplos desta tendência: Ritschl, Unterricht, par. 16 - "A retidão de Deus denota a maneira como Deus opera a sua amorosa vontade na redenção do mesmo modo que a humanidade como um todo e o homem em particular; por isso a sua justiça não se distingue da sua graça". Prof. Georges M. Forbes:
"Só o justo faz o amor moral; só o amor faz o justo moral". Jones, Robert Browning, 70 - "Não é a beneficência que coloca a morte como o centro do pecado? Carlyle se esqueceu disso. Deus não é apenas um grande realizador de tarefas. O poder que impõe a lei não é um poder estranho". D'Arcv, Idealism and Theology, 237-240 - "Como a auto-realização pode ser a realização dos outros? Como o verdadeiro bem pode ser sempre o bem comum?
Por que o fim de cada um é o fim de todos? ... Precisamos um universal concreto que unifique todas as pessoas".
Do mesmo modo também, Harris, Kingdom of Christ on Earth, 39-42; God, The Creator. 287,299,302 - "O amor, como a razão requer e regula, pode chamar-se retidão. Amor é boa vontade universal ou benevolência, regulada em seu exercício pela retidão. Amor é escolha de Deus e do homem como objeto de confiança e serviço. Esta escolha envolve a determinação da vontade de buscar o bem-estar universal e, neste aspecto, está a benevolência. Envolve também o consentimento da vontade sobre a razão, e a determinação de regular toda ação na busca do bem-estar através da verdade, da lei, e do ideal; neste aspecto ele é retidão. ... Justiça é o consentimento da vontade para com a lei do amor, com sua autoridade, seus requisitos e sanções. A ira de Deus é a reação necessária da lei do amor na constituição e na ordem do universo contra o malfeitor que não lhe obedece e os sacrifícios de Cristo expiam o pecado afirmando e mantendo a autoridade, a universalidade e a inviolabilidade da lei do amor de Deus na redenção dos homens e perdão dos seus pecados. ... A retidão não pode ser o todo do amor porque isto nos encerraria no espírito formal da lei sem dizer-nos o que a lei requer de nós.
A benevolência não pode ser o amor completo porque isto nos encerraria no hedonismo, na forma de utilitarismo, excluindo a retidão do caráter de Deus e do homem".
Newman Smith também, em Christian Ethics, 227-231, diz-nos que "o amor, como auto-afirmação, é retidão; a entrega de si mesmo é benevolência; como o seu encontro próprio nos outros, é simpatia. A retidão como consideração subjetiva ao nosso ser moral é santidade; como consideração objetiva pela pessoa dos outros é justiça. A santidade está envolvida no amor como respeito a si mesma; o Pai celeste é o Pai santo (Jo. 17.11). O amor contém em sua unidade uma virtude trina. O amor afirma sua própria dignidade, concede o bem aos outros e acha sua vida ainda no bem-estar dos outros. O limite ético da entrega própria encontra-se na auto-afirmação. O amor em doação de si mesmo não pode tornar-se suicida. A benevolência do amor tem os seus laços morais na santidade do amor. Em Deus o verdadeiro amor mantém a sua transcendência e exclui o panteísmo".
A doutrina acima, citada substancialmente de Newman Smith, parece-nos incluir no amor, sem garantia, aquilo que apropriadamente pertence à santidade. Virtualmente nega que a santidade tenha qualquer existência independente como atributo de Deus. Fazer da santidade uma manifestação do amor parece-nos tão irracional como dizer que a auto-afirmação é uma forma de auto-entrega. Admitir que a santidade regula e limita o amor mostra que a santidade não pode por si mesma ser amor, mas deve ser um atributo independente e superior. O justo fornece a regra e a lei para o amor, mas não é verdade que o amor fornece a regra e a lei para o justo. Não existe esta tal dupla soberania como esta teoria quer implicar. O único atributo independente e supremo é a santidade e o amor é somente o impulso para comandar esta santidade.
William Ashmore: "O Dr. Clarke dá grande ênfase ao caráter de um 'bom Deus'. ... Mas ele é muito mais que um bom Deus; ele é um Deus justo e um Deus reto e um Deus santo - um Deus que se 'ira contra o ímpio' mesmo enquanto ele está pronto a perdoar se o ímpio se arrepende do seu caminho e não do próprio ímpio. Ele é o Deus que trouxe o dilúvio sobre o mundo dos ímpio; que fez chover fogo e enxofre dos céus; e que deve vir no 'fogo fazendo vingança sobre aqueles que não conhecem a Deus' e não obedecem ao evangelho do seu Filho. ... Paulo raciocinava a respeito da 'bondade' e da 'severidade' de Deus".
Santidade transitiva, como retidão, impõe a lei na consciência e na Escritura e pode ser chamada santidade legislativa. Como justiça, executa as penas da lei e pode ser chamada santidade distributiva ou judicial. Na retidão Deus revela principalmente seu amor de santidade; na justiça principalmente sua aversão ao pecado.
A auto-afirmativa pureza de Deus demanda igual pureza naqueles que foram feitos imagem sua. Como Deus quer e mantém a sua própria excelência moral, do mesmo modo todas as criaturas devem querer e manter a excelência moral de Deus. Só pode haver um centro no sistema solar; o sol é o seu centro bem como o de todos os planetas. Bixby, Crisis in Morais, 282 - "Não é racional ou seguro para a mão separar-se do coração. Isto é um universo, e Deus é o coração do grande sistema. O altruísmo não resulta da sociedade, mas esta resulta daquele. Começa com as criaturas e desce até o homem.
Os animais que sabem como agrupar-se têm maior chance de sobrevivência.
Os animais anti-sociais morrem mais cedo. O organismo mais perfeito é o mais sociável. A justiça é o dever que a parte deve ao todo". Isto nos parece apenas uma expressão parcial da verdade. A justiça é maior que uma dívida para com os outros; é uma dívida para com o eu, e o elemento auto-afirman- te, auto-preservador, auto-respeitador constitui-se o limite e o padrão de toda a atividade. O sentimento de lealdade é em grande parte uma reverência a este princípio de ordem e estabilidade no governo. SI. 145.5 - "Falarei da magnificência gloriosa da tua majestade e das tuas obras maravilhosas"; 97.2
"Nuvens e obscuridade estão ao redor dele; justiça e juízo são a base do seu trono".
John Milton, Eikonoklastes: "Verdade e justiça são uma coisa só; porque a verdade é apenas a justiça no nosso conhecimento e a justiça é apenas a verdade na nossa prática. ... Porque a verdade não é propriamente mais que contemplação e a sua suprema eficiência é apenas o ensino; mas, na sua própria essência, a justiça é com toda força e atividade e tem posta uma espada na sua mão a fim de usar contra toda a violência e opressão da terra.
Ela não aceita a pessoa e não isenta ninguém da severidade do seu golpe".
A. J. Balfour, Foundations of Belief, 326 - "Até mesmo o poeta não tem se atrevido a representar Zeus torturando Prometeu sem a terrível figura de um Fado Vingativo que aguarda em silêncio na retaguarda. ... A evolução, operando uma justiça cada vez mais nobre é prova de que Deus é justo. Eis aqui uma 'ação preferencial'". S. S. Times, 9/06/900 - "O homem natural nasce com uma errônea astronomia pessoal. Deveria abandonar o conceito de ser o centro de todas as coisas. Deveria aceitar a teoria copérnica e contentar-se com um lugar à beira das coisas, que é o seu verdadeiro lugar. Nós sempre rimos de John Jasper e de sua tese de que 'o sol se move'. A teoria de Copér- nico está destruindo todas as relações humanas, como aparece na expressão corrente: 'Há outros"'.
Nem a justiça nem a retidão, portanto, é matéria de vontade arbitrária. São revelações da mais íntima natureza de Deus: uma na forma de exigência moral e a outra na forma de sanção judicial. Como Deus não pode demandar de suas criaturas que sejam como ele no caráter moral assim ele não pode forçar a execução da lei que impõe sobre eles. A justiça leva Deus a punir como leva o pecador a ser punido.
Aqui se exclui toda a arbitrariedade. Deus é o que é: pureza infinita. Ele não pode mudar. Se as criaturas precisam atingir o fim do seu ser, devem assemelhar-se a Deus na pureza moral. Justiça não é apenas o reconhecimento e execução desta necessidade natural. A lei é apenas a transcrição da natureza de Deus. A justiça não faz a lei; ela apenas a revela. A pena é tão somente a reação da santidade de Deus contra aquilo que é o seu oposto. Visto que a retidão e a justiça são apenas santidade legislativa e retributiva,
Deus pode deixar de exigir pureza e punir o pecado só quando deixa de ser santo, isto é, quando deixa de ser Deus. "Judex damnatur cum nocens abolvitur".
Simon, Reconciliation, 141 - "Reivindicar a execução do dever é tão verdadeiramente obrigatório como executar o dever prescrito". E. H. Johnson, Systematic Theology, 84 - "A benevolência pretende o que é bom para a criatura; a justiça insiste naquilo que é próprio. Mas o que é bom e o que é adequado para nós coincidem. A única coisa que é boa para nós é a nossa aplicação normal e desenvolvimento; mas prover isto é precisamente o que é adequado e por isso é o nosso dever. Na natureza divina, a distinção entre justiça e benevolência é quanto à forma". Criticamos esta afirmação por não levar suficientemente em conta a natureza do direito. O direito não é simplesmente o que é adequado. A adequação é apenas a adaptação geral que não pode ter em si nenhum elemento enquanto o direito é apenas e exclusivamente ético. Por isso o direito regula o adequado e constitui o seu padrão.
O que é bom para nós deve ser determinado por aquilo que nos é justo, mas a recíproca não é verdadeira. George W. Northrup: "Deus não é obrigado a conceder as mesmas dádivas às criaturas, nem a conservar todos em estado de santidade para sempre, nem redimir o decaído, nem garantir a maior felicidade do universo. Mas ele deve propor e fazer o que a sua santidade absoluta requer. Ele não tem nenhum atributo, nenhuma vontade, nenhuma soberania, acima desta lei do seu ser. Ele não pode mentir, não pode negar-se a si mesmo, olhar para o pecado com complacência, dispensar a culpa sem uma expiação".
Nem a justiça nem a retidão concedem recompensas. Isto se segue do fato de que a obediência se deve a Deus ao invés de ser opcional ou uma gratuidade. Nenhuma criatura pode reivindicar qualquer coisa pela sua obediência. Se Deus recompensa, ele o faz em virtude de sua bondade e fidelidade, não em virtude de sua justiça ou retidão. O que a criatura não pode reivindicar, contudo, Cristo pode, e as recompensas que são bondade para a criatura são retidão para Cristo. Deus recompensa a obra de Cristo por nós e em nós.
Bruch, Eigenschaftslehre, 280-282, e John Austin, Province of Jurispru- dence, 1.88-93, 220-223, negam, e nisso estão certos, que a justiça concede galardões. A justiça simplesmente pune as infrações da lei. Em Mt. 25.34 - "possuí por herança o reino" - herança não implica mérito; 46 - os ímpios são adjudicados ao castigo eterno; os justos não ao galardão eterno, mas à vida eterna. Lc. 17.7-10 - "quando fizerdes tudo o que vos for mandado, dizei: Somos servos inúteis, porque fizemos somente o que devíamos fazer". Rm. 6.23 - o castigo é "o salário do pecado": mas a salvação é "o dom de Deus"; 2.6 - Deus galardoa não por causa da obra do homem, mas "segundo as suas obras". Deste modo o galardão é visto na Escritura como matéria de graça para com a criatura; só a Cristo, que opera por nós na expiação e em nós na regeneração e santificação, é matéria de dívida (vertambém Jo. 6.27 e 2 Jo. 8). Martineau, Types, 2.86, 244, 249 - "O mérito é para o homem; a virtude é para Deus".
Todo o simples serviço não tem proveito porque só produz o equivalente ao dever e não existe nenhum crédito. Não há possibilidade de obras supe- rerrogatórias porque tudo o que fazemos é devido a Deus. Ele nos conduz à região da amizade, compreende que ele fez, tratando-nos não como um senhor (relativamente aos escravos), mas como Pai, entra numa relação de amor incalculável. Com esta cláusula de que os galardões são matéria de graça, não de dívida, podemos concordar com a máxima de Sólon: "Uma república anda com os dois pés - a justa punição para os indignos e o devido galardão para os dignos". George Harris, Moral Evolution, 139 - "O amor busca a retidão e não se satisfaz com nada que não seja isso". Mas quando Harris adota as palavras do poeta: "A própria ira da piedade brota, do amor dos homens, a ira do erro", ele nos parece negar virtualmente que Deus detesta o mal por qualquer outra razão de suas desvantagens utilitárias e parece também implicar que o bem não tem existência independente na sua natureza. Bowne, Ethics, 171 - "O mérito exige galardão, ou melhor, exige a aprovação". Tennyson: "Porque o mérito vive de homem para homem e não do homem para ti, Ó Senhor". Baxter: A palavra merecimento está escrita acima do portal do inferno; acima da porta do céu, apenas O Dom de Deué'.
Em Deus, a justiça como revelação de sua santidade é destituída de toda paixão ou capricho. Em Deus não há uma ira egoísta. As penas que ele inflige sobre a transgressão não são vingativas, mas vindicativas. Elas expressam a reação da natureza de Deus ao mal moral, a indignação judicial da pureza contra a impureza, a auto-declaração da santidade infinita contra seu antagonista e suposto destruidor. Mas porque suas decisões são calmas, são irreversíveis.
Dentro de certos limites, a ira é um dever do homem. SI. 97.10 - "Vós que amais ao Senhor, aborrecei o mal"; Ef. 4.26 - "Irai-vos e não pequeis".
A indignação calma do juiz que com lágrimas pronuncia a sentença é a verdadeira imagem da ira santa de Deus contra o pecado. Weber, Zorn Gottes, 28, torna a ira apenas um zelo do amor. Com mais verdade é o zelo da santidade. Prof. W. A. Stevens, Com. on 1 Thess. 2.10-"santa e justamente" são termos que descrevem a mesma conduta em dois aspectos; aquela, a conformidade do próprio caráter de Deus; esta, conformidade com a sua lei; ambas são positivas". Lillie, 2 Thess 1.6 - "O juízo é 'justo diante de Deus;. A justiça divina o requer para a sua própria satisfação".
De Gaston de Foix, o velho cronista admiravelmente escreveu: "Ele amava o que devia ser amado e detestava o que devia ser detestado e nunca houve descrença para com ele". Compare SI. 101.5,6 - "aquele que tem o olhar altivo e o coração soberbo não suportarei. Os meus olhos procurarão os fiéis da terra para que estejam comigo". Até mesmo Horace Bushnell falava do "princípio da ira" em Deus. 1 Re. 11.9 - "Pelo que o Senhor se indignou contra Salomão" por causa da sua poligamia. A ira de Jesus não era menos nobre que o seu amor. O amor do justo envolvia a ira contra o erro. Aqueles que se iram contra o mal podem irar-se porque o mal merece ira e por amor a Deus.
Detestai primeiro o pecado em vós mesmos e depois detestai-o nele mesmo e no mundo. Irai-vos só em Cristo e com a ira de Deus. W. C. Wilkinson, Epic of Paul, 264 - "Mas devemos purificar-nos a nós mesmos do respeito próprio ou pecaremos ao detestar o pecado".
A "Ira furor brevis est" de Horácio - "A ira é uma loucura temporária" - é verdade só em se tratando da ira egoísta ou pecaminosa. Por isso o homem que se ira é popularmente chamado de "louco". Mas a ira, embora capaz de tornar-se pecaminosa, não o é necessariamente. A justa ira nem é loucura, nem é breve. Um exemplo é a ira judicial da igreja de Corinto infligindo a exclusão (em ingl. excomunication = excomunhão): 2 Co. 7.11 - "Que apologia, que indignação, que temor, que saudade, que zelo, que vingança!". O único revide permitido à igreja cristã é aquela em que persegue e extermina o pecado. Ser incapaz de indignação moral contra o erro é faltar o amor para com o justo. Dr. Arnold de Rugby nunca estava certo a respeito de um menino que só amava o bem; enquanto ele não começou a detestar o mal, Dr. Arnold não sentia que ele estava seguro. Herbert Spencer dizia que a boa natureza para com os americanos tornou-se um crime. Lecky, Democracy and Liberty. "Há uma coisa pior que a corrupção: é a tolerância para com ela".
Colestock, Changing Viewpoint, 139 - "Xenofonte pretende proferir uma coisa bem recomendável a respeito de Ciro, o moço, quando escreve a seu respeito que ninguém fizera mais bem aos seus amigos ou coisa mais danosa aos seus inimigos". Lutero disse a um monge antagonista: "Quebrarei o teu coração de latão e pulverizarei o teu cérebro de ferro". Shedd, Dogmatic Theology, 1.175-178 - "O caráter humano é indigno na proporção em que a aversão pelo pecado esteja faltando nele. Está no mesmo nível de Carlos II. que 'não sentiu nenhuma gratidão pelos benefícios e nenhum ressentimento pelos erros; não amou quem quer que seja, e não sentiu ira por ninguém'. Era indiferente ao certo e ao errado e o único sentimento que ele tinha era de desdém" . Mas veja a cena do leito de morte do alegre monarca no Bispo Burnet, Memórias de Evelyn, ou na Vida do Bispo Ken. Na verdade "o fim da alegria é a tristeza" (Pv. 14.13 b).
Stout, Manual of Psychology, 22 - "Charles Lamb conta-nos que seu amigo George Dyer nunca podia ser trazido para dizer qualquer coisa em condenação dos mais atrozes crimes, mas o criminoso deve ter sido muito excêntrico". Prof. Seeley: "Nenhum coração que não é apaixonado é puro". D. W. Simon, Redemption of Man, 249,250, diz que o ressentimento de Deus "é de um caráter essencialmente altruísta". Se isto significa que ele é perfeitamente consistente com o amor pelo pecador, podemos aceitar esta afirmação; se significa apenas que o amor é a fonte do ressentimento, consideramos a afirmação uma falsa interpretação da justiça de Deus, que é apenas a manifestação da santidade e não é uma simples expressão do seu amor. Ver semelhante afirmação de Lidgett, Spiritual Príncipe ofthe Atonement, 251 - "Porque Deus é amor, o seu amor coexiste com a sua ira contra os pecadores, é a própria vida dessa ira e é tão persistente que emprega a sua ira como um instrumento, enquanto, ao mesmo tempo, busca e fornece uma propiciação". Esta afirmação ignora o fato de que, na Escritura, a punição nunca é considerada como uma expressão do amor de Deus, mas da sua santidade. Quando dize-mos que amamos a Deus, estejamos certos de que é o verdadeiro Deus,
o Deus da santidade, que nós amamos, porque só este amor nos assemelhará a ele.
A indignação moral de um universo todo dos seres santos contra o mal moral, acrescida das agonizantes auto-condenações da consciência despertada de todos os não santos, é apenas um fraco e pequeno reflexo da terrível reação da infinita justiça de Deus sobre a impureza e o egoísmo das suas criaturas e da intensa reação orgânica, necessária e eterna do seu ser moral na sua própria vindicação e punição do pecado; ver Jr. 44.4 - "Ora, não façais esta coisa abominável que aborreço!"; Nm. 32.23 - "sentireis o vosso pecado quando vos achar"; Hb. 10.30,31 - "Porque bem conhecemos aquele que disse: Minha é a vingança, eu darei recompensa. E outra vez: O Senhor julgará o seu povo. Horrenda coisa é cair nas mãos do Deus vivo".
VIL NÍVEL E RELAÇÕES DOS VÁRIOS ATRIBUTOS
Os atributos se relacionam uns com os outros. Como o intelecto, o sentimento e a vontade no homem não se deve conceber nenhum deles exercido separado dos demais. Cada um dos atributos é qualificado por todos os outros. O amor de Deus é imutável, sábio, santo. A infinitude pertence ao conhecimento, ao poder, à justiça de Deus. Contudo, isto não significa que um atributo tem o mesmo nível que o outro. Os atributos morais de verdade, amor, santidade, merecem maior reverência dos homens cuidadosamente guardados por Deus do que os atributos naturais da onipresença, onisciência e onipotência. Mesmo ainda entre os atributos morais um se apresenta como supremo. Sobre este e sua supremacia passaremos a falar.
A água só será água, se for composta de oxigênio e hidrogênio. O oxigênio não pode ser resolvido no hidrogênio, nem o hidrogênio no oxigênio.
O oxigênio tem o seu próprio caráter, apesar de que, na combinação com o hidrogênio, aparece a água. A vontade do homem nunca age sem o intelecto e a sensibilidade, e a vontade, mais que o intelecto ou a sensibilidade ela é a manifestação do homem. Deste modo, quando Deus age, ele não manifesta um atributo sozinho, mas a sua total excelência moral. Ainda a santidade, como um atributo de Deus, tem direito peculiar a si mesma; ela determina a atitude dos sentimentos; mais do que qualquer outra faculdade ela constitui o ser moral de Deus.
Clarke, Christian Theology, 83,92 - "Deus não seria santo se não fosse amor e não poderia ser amor se não fosse santo. O amor é um elemento da santidade. Se faltasse, não haveria caráter perfeito como princípio da sua própria ação ou como padrão para nós. Por outro lado só sendo perfeito ele pode ser amor. A santidade requer que Deus haja como amor, porque a santidade é a auto-consistência de Deus. O amor é o desejo de transmitir santidade. A santidade faz do caráter de Deus o padrão para as suas criaturas; mas o amor, desejando transmitir o melhor bem, faz o mesmo. Toda a obra de amor é obra de santidade e toda a obra de santidade é obra de amor.
É impossível haver conflito de atributos, porque a santidade sempre inclui o amor e o amor sempre expressa a santidade. Eles nunca necessitam de reconciliação recíproca".
A correção geral da afirmação anterior é prejudicada porque o conceito de santidade é vago. As Escrituras não consideram que a santidade inclua o amor, ou fazem todos os atos de santidade serem atos de amor. Auto-afirmação não inclui doação de si mesmo, e o pecado necessita de um exercício de santidade que também não é um exercício de amor. Mas para a Cruz, e para o sofrimento de Deus por causa do pecado cuja expressão se encontra nela, haveria conflito entre santidade e amor. A sabedoria de Deus apresenta-se principalmente, não na reconciliação entre o homem e Deus, mas na reconciliação entre a santidade de Deus e o seu amor.
Santidade, atributo fundamental de Deus
É evidente que a santidade é o atributo fundamental de Deus:
A partir da Escritura, - na qual a santidade de Deus não só constante e poderosamente atraem a atenção do homem, declara-se que é o principal do regozijo e adoração no céu.
O atributo da santidade de Deus é o que primeiro e mais proeminentemente apresenta-se à mente do pecador e a consciência só segue o método da Escritura: 1 Pe. 1.16- "Sede santos, porque eu sou santo"; Hb. 12.14 - "santificação, sem a qual ninguém verá o Senhor"; cf. 5.8 - "Senhor, ausenta- te de mim, porque sou um homem pecador". Contudo, esta insistência constante sobre a santidade não pode ser somente devida ao atual estado de pecado do homem, porque no céu, onde não há pecado, existe a mesma reiteração. Is. 6.3 - "Santo, santo, santo é o Senhor dos exércitos"; Ap. 4.8 - "Santo, santo, santo é o Senhor Deus, o Todo-poderoso". De nenhum outro atributo se diz que o trono de Deus está sobre ele: SI. 97.2 - "justiça e juízo são a base do seu trono"; 99.4,5,9 - "A força do Rei ama o juízo ... Exaltai ao Senhor nosso Deus ... nosso Deus é santo". Devemos substituir a palavra santidade na afirmação de Newman Smith, Christian Ethics, 95 - "Admitimos que o amor é senhor na vontade divina, não que a vontade de Deus seja soberana sobre o seu amor. A onipotência de Deus, como diria Dorner, existe por causa do seu amor".
A partir da nossa constituição moral, - na qual a consciência declara sua supremacia sobre cada um dos outros impulsos e sentimentos da nossa natureza. Como podemos ser bondosos, mas devemos ser retos, assim Deus, a cuja imagem fomos feitos, pode ser misericordioso, mas deve ser santo.
Ver os Sermões do Bispo Butler sobre Human Nature, ed. de Bohn, 385-414, que mostram a supremacia da consciência na constituição moral do homem". Devemos ser justos antes de sermos generosos. Deste modo, para Deus,
deve-se fazer sempre a justiça; a misericórdia é optativa para ele. Deus não tem obrigação de prover uma redenção para os pecadores: 2 Pe. 2.4 - "porque Deus não perdoou os anjos, quando pecaram, mas, havendo-os lançado no inferno... ". Salvação é matéria de graça não de dívida. Shedd, Discourses and Essays, 277-298 - "A qualidade da justiça é exigência necessária, mas não se (co)age a qualidade da misericórdia'" [cf. Denham: "A sua alegria é forçada e intensa"]. Deus pode aplicar a salvação após tê-la operado a qualquer que ele queira: Rm. 9.18-"compadece-se de quem quer". Young, Night- Thoughts, 4.233 - "Um Deus que é todo misericórdia é um Deus injusto". Emerson: "A sua bondade deve ter o seu limite; caso contrário ela não é nada". Martineau, Study, 2.100 - "Ninguém pode ser justo sem subordinar a Piedade ao senso de Justiça".
Podemos aprender a santidade de Deus a priori. Até mesmo os pagãos podiam dizer: "Fiat justitia, ruat coelum", ou "pereat mundus". Mas, para o nosso conhecimento da misericórdia de Deus, dependemos de uma revelação especial. A misericórdia, como a onipotência, pode existir em Deus mesmo sem ser exercida. Misericórdia não é graça, mas dívida se é que Deus deve o seu exercício quer ao pecador, quer a si mesmo; versus G. B. Stevens em New Engi., 1888.421-443. "Mas a justiça é um atributo que não existe por necessidade, mas deve ser exercido por ela; porque não exercê-lo seria injustiça". Se se disser que, por paridade de raciocínio, para Deus o não exercer misericórdia é mostrar-se incompassivo, - respondemos que isto não é verdade porque os interesses mais elevados requerem que tal exercício seja recusado. Eu não sou incompassivo quando me recuso a dar ao pobre o dinheiro necessário para pagar uma dívida honesta; nem ainda o governador é incompassivo quando se recusa a perdoar o criminoso condenado e não arrependido. A misericórdia tem suas condições, continuamos a mostrar, e não deixa de ser quando estas condições não permitem que ela seja exercida. Com a justiça não é assim; deve-se sempre exercer a justiça; quando ela deixa de ser exercida, também deixa de ser justiça.
A história do Filho Pródigo mostra o amor que sempre se interessa pelo filho na terra distante, mas que sempre está condicionado pela santidade do pai e deixa de agir até que o filho abandona a sua vida rebelde. Um pai justo pode banir um filho corrupto da sua casa, apesar de que pode amá-lo tão carinhosamente que o seu banimento causa uma estranha dor. E. G. Robinson: "Deus, Cristo e o Espírito Santo têm uma consciência, isto é, distinguem entre o certo e o errado". E. H. Johnson, Syst. Theology, 85,86 - "A santidade relaciona-se primeiramente com a benevolência; porque a) a santidade é em si mesma excelência moral, enquanto a excelência moral da benevolência pode ser explicada . b) A santidade é um atributo do ser, enquanto a benevolência é um atributo da ação; mas a ação pressupõe e é controlada pelo ser.
A benevolência deve tomar conselho da santidade, visto desejar o contrário da santidade seria querer para si o dano, enquanto a santidade leva Deus a buscar a benevolência, o melhor para a criatura, d) A dispensação mosaica elaborada simbolicamente e a dispensação cristã faz a provisão atender os requisitos da santidade como supremos; Tg. 3.17- 'Primeiramente pura, depois, [consequentemente] pacífica'11.
Devemos praticar "a justiça" bem como "amar a beneficência e andar humildemente" para com Deus (Mq. 6.8). Dr. Samuel Johnson: "Como surpreende encontrar muito mais beneficência do que justiça contida na sociedade"! Existe uma misericórdia pecaminosa. Um inspetor escolar acha um trabalho horrível ouvir professores incompetentes pedindo para que não os dispensem e pode ficar nervoso apenas porque as crianças cuja educação pode ser afetada por recusar-se a fazer justiça. Amor e piedade não são o todo do dever cristão, nem são os atributos diretivos de Deus.
A partir dos reais procedimentos de Deus, - nos quais a santidade condiciona e limita o exercício dos outros atributos. Assim, por exemplo, na obra redentora de Cristo, apesar de que o amor faz a expiação, viola-se a santidade que o requer; na punição eterna do ímpio, a exigência da santidade para a auto-vindicação reprime a defesa do amor aos sofredores.
O amor não pode ser o atributo fundamental de Deus porque o amor sempre requer uma norma ou padrão e tal norma ou padrão só se encontra na santidade; Fp. 1.9 - "E também faço esta oração: que o vosso amor aumente mais e mais em pleno conhecimento e toda a percepção"; ver A. H. Strong, Christ in Creation, 388-405. Esta é a mais elevada de todas as condições. Por isso a misericórdia de Deus não consiste em ultrajar a própria lei da santidade, mas em permanecer firme na aflição penal pela qual se satisfaz a lei da santidade. A consciência do homem é apenas o reflexo da santidade de Deus.
A consciência não demanda retribuição ou expiação. Esta demanda Cristo atende através do seu sofrimento vicário. O seu sacrifício sacia a sede da consciência do homem assim como que se demanda do homem a santidade de Deus: Jo. 6.55 - "Porque a minha carne verdadeiramente é comida e o meu sangue verdadeiramente é bebida". Ver Shedd, Discourses and Essays, 280,291,292; Dogmatic Theology, 1.377,378 - "A soberania e a liberdade de Deus a respeito da justiça não se relacionam com a abolição, nem com o relaxamento [linguagem jurídica significando diminuição da pena], mas com a substituição, da punição. Não consiste em poder violar ou desistir das exigências legais. O exercício dos outros atributos de Deus é regulado e condicionado através dessa justiça. ... Onde está, então, a misericórdia de Deus se a justiça é estritamente satisfeita através de uma pessoa vicária? Existe misericórdia em permitir que uma outra pessoa faça pelo pecador o que o pecador precisa fazer por si mesmo; e maior misericórdia em prover tal pessoa; e ainda maior misericórdia em tornar-se aquela pessoa".
O entusiasmo, como o fogo, não só deve queimar, mas deve ser controlado. O homem inventou as chaminés para reter o calor, mas para soltar a fumaça. Há necessidade de parede de discrição e controle próprio para conduzir a chama do amor. A santidade de Deus é o princípio regulador da sua natureza. O oceano da sua misericórdia limita-se às praias da sua justiça. Mesmo que a santidade seja o amor próprio de Deus no sentido de respeito próprio ou auto-preservação, ainda tal amor próprio deve condicionar o amor às criaturas. É apenas porque Deus se mantém na sua santidade que ele pode ter qualquer coisa digna de ser dada; na verdade o amor nada é senão a auto-comunicação da sua santidade. E, se dizemos, como J. M. Whiton, que a auto-afirmação no universo no qual Deus é imanente por si mesmo é uma forma de doação própria, ainda assim esta forma de doação própria deve condicionar e limitar a outra forma de doação própria a que chamamos amor às criaturas.
A partir do eterno propósito da salvação da parte de Deus, - em que a justiça e a misericórdia se reconciliam somente através do sacrifício previsto e predeterminado de Cristo. A declaração de que Cristo é "o Cordeiro imolado desde a fundação do mundo" implica a existência de um princípio na natureza divina que requer satisfação, antes que Deus possa entrar na obra da redenção. Tal princípio não pode ser outro a não ser a santidade.
Visto que a misericórdia e a justiça são exercidas para os pecadores da raça humana, de outra forma o antagonismo entre elas só se remove através da morte expiatória do Deus-homem. As suas reivindicações opostas não impedem a bênção divina porque a reconciliação existe nos conselhos eternos de Deus. Isto se acha indicado em Ap. 13.8 - "Cordeiro que foi morto desde a fundação do mundo". Esta mesma reconciliação aparece mencionada em SI. 85.10 - "A misericórdia e a verdade se encontraram; a justiça e a paz se beijaram"; e em Rm. 3.26 - "para que ele seja justo e justificador daquele que tem fé em Jesus". Então, se o homem deve ser salvo, a expiação é necessária, não principalmente por causa do homem, mas de Deus. Shedd, Discourses and Essays, 279 - O sacrifício de Cristo foi uma "expiação ab Introda, uma oblação da parte do próprio Deus através da qual satisfazem-se os imperativos imanentes e eternos da natureza divina sem a qual deve encontrar sua satisfação no castigo do transgressor, ou caso contrário, ser ultrajado". Assim, a palavra de Deus sobre a redenção do mesmo modo que sobre a criação para sempre "permanece no céu" (SI. 119.89). Sua execução na cruz estava "de acordo com o padrão" nas alturas. O sacrifício mosaico prefigurava o sacrifício de Cristo; mas este foi apenas uma revelação temporal de um fato eterno na natureza de Deus.
Deus requer a satisfação porque ele é santo, mas ele satisfaz porque ele é amor. O próprio Juiz, com a ira contra a transgressão, ainda ama o transgressor e desce da tribuna para tomar o lugar do criminoso e suportar a sua pena. Mas esta é uma eterna provisão e um eterno sacrifício. Hb. 9.14 - "o sangue de Cristo, que, pelo Espírito eterno, se ofereceu a si mesmo imaculado a Deus". Matheson, Voices of the Spirit, 215, 216 - "O sacrifício de Cristo foi oferecido através do Espírito. Não foi arrancado de uma alma relutante através da obediência a uma lei exterior; veio do interior do coração, do impulso do imorredouro coração. Foi uma oferta completa que começou antes do Calvário; foi vista pelo Pai antes que o mundo a visse. Findou no Espírito antes que começasse na carne, terminou na hora em que Cristo exclamou: 'não seja como eu quero, mas como tu queres' (Mt. 26.39)".
Lang, Homer, 506 - "É Apoio é quem traz a peste e a afasta, conforme a bem conhecida regra de que os dois grandes atributos opostos devem combinar-se na mesma divindade". Lord Bacon, Confission of Faith'. Nem anjo, homem ou mundo podem subsistir, ainda que por um momento à vista de Deus sem contemplá-lo na face do Mediador; e, por isso, diante dele, juntamente com quem estão presentes todas as coisas, o Cordeiro de Deus morto antes de todos os mundos; sem cujo conselho eterno seria impossível descer a qualquer obra da criação". Orr, Christ View of God and the World, 319 - "A criação está edificada sobre as linhas da redenção" - o que significa dizer que a encarnação e a expiação estavam incluídas no desígnio original de Deus a respeito do mundo.
A santidade de Deus, a base da obrigação moral
Pontos de vista errôneos. A base da obrigação moral não está:
No poder, - quer da lei civil (Hobbes, Gassendi), quer da vontade divina (Occan, Descartes). Não somos obrigados a obedecer qualquer um destes apoiados no fato de que eles são certos. Esta teoria admite que nada é bom ou certo em si, e que a moral é simples prudência.
Lei civil: Ver Hobbes, Leviatã, parte i, caps. 6 e 13; parte ii, cap. 30; Gassendi, Opera, 6.120. Neste ponto de vista o poder faz o direito; as leis de Nero são sempre coativas; o homem pode quebrar a sua promessa quando a lei civil permite; não existe obrigação alguma de obedecer o pai, um governador civil, e até o próprio Deus, quando é certo que a desobediência se ocultará ou quando o ofensor está disposto a sofrer a punição. Martineau, Seat ofAuthority,
67 - "A mera magnitude da escala não tem nenhuma qualidade moral; nem a multidão toda dos demônios, por uma votação unânime, poderia conferir justiça à vontade deles ou torná-la obrigatória ainda que fosse a um Abdiel". Robert Browning, Christimas Eve, xvii - "A justiça, o bem, a verdade ainda seriam divinas, ainda que, por alguma vontade demoníaca, ódio e erro tivesse sido proclamada uma lei por todo o mundo e o direito fosse falseado".
Vontade divina: Martineau, Types, 148 - "Descartes sustentava que a vontade de Deus não revela, mas inventa as distinções morais. Deus podia ter de feito de Euclides uma mistura de mentiras, e de Satanás um modelo de perfeição moral". Sobre este ponto de vista, o certo e o errado são quantidades variáveis. Duns Scotus sustentava que a vontade de Deus não apenas faz a verdade, mas também o direito. Deus pode fazer a mentira ser virtuosa e a pureza ser um erro, um bem e um mal. Respondemos que, atrás da vontade divina, encontra-se a natureza divina e que, na perfeição moral dessa natureza encontra-se a única base da educação moral. Deus derrama o seu amor e exerce o seu poder conforme algum princípio determinante da sua própria natureza. Tal princípio não é a felicidade. Finney, Syst. Theology, 936,937 - "O mando de Deus pode tornar obrigatória a má vontade para com ele?
Se não pode, então, a sua vontade não é base para a obrigação moral.
A coisa mais valiosa, a saber, o mais elevado bem de Deus e o do universo
devem ser tanto o fim como a base. É a razão divina e não a sua vontade que invade e confirma a lei da conduta. A vontade divina publica, mas não origina, a regra. A vontade de Deus não pode fazer do vício uma virtude".
Como, por um lado, entre o poder e a utilidade e, por outro, o direito, devemos considerar este como o mais fundamental. Contudo, como veremos mais adiante, não podemos situar a base da obrigação moral, mesmo no direito, considerada como um princípio abstrato; mas, ao invés disto colocá-la na excelência moral daquele que é o Direito pessoal e, portanto a fonte do direito. O caráter obriga e o senhor freqüentemente se curva no seu coração ao servo, quando este é o mais nobre ser humano.
Não na utilidade, - ou nossa própria felicidade ou vantagem presente ou eterna (Paley), pois a consideração suprema do nosso interesse não é virtude; ou a maior felicidade ou vantagem de ser em geral (Edwards), pois julgamos que a conduta é útil porque é reta, não reta porque é útil. Esta teoria nos compeliria a crer que na eternidade passada Deus era santo só por causa do bem que ele aufere, isto é, não havia algo como a santidade em si e não havia uma coisa como o caráter moral em Deus.
Nossa própria felicidade: Paley, Moral, and Poiit. Philosophy., livro i, cap. vii - "Virtude é fazer bem à humanidade, em obediência à vontade de Deus e por amor à felicidade eterna". Isto une a) e b). John Stuart Mill e o Dr. N. W. Taylor sustentavam que a nossa felicidade é o fim supremo. Estes escritos na verdade consideram que a mais alta felicidade se atinge só através dos outros (altruísmo de Mill), mas eles não atribuem nenhuma razão por que alguém que não conhece nenhuma outra felicidade além dos prazeres dos sentidos não adotaria a máxima de Epicuro, que, segundo Lucrécio, ensinava que "ducit quemque voluptas" (o prazer conduz cada pessoa). Esta teoria torna impossível a virtude; porque a virtude que considera tão somente o nosso interesse não é virtude, mas prudência. Temos um senso do certo e do errado independente de todas considerações da felicidade ou da sua perda". James Mill sustenta que a utilidade não é o critério da moralidade, mas ela mesma constitui a moralidade. G. B. Foster responde com propriedade que a virtude não é uma simples sagacidade egoística e o ato moral não é somente um inteligente empreendimento de negócio. Todas as línguas distinguem entre virtude e prudência. Dizer que a virtude é uma grande utilidade é confundir o efeito com a causa. Carlyle diz que o homem pode agir sem a felicidade. Browning, Red Cotton Nightcap Country: "Os cabeçudos devem reconhecer o Diabo, aquele oscilante, com o seu truque da utilidade geral, que talvez conduz para baixo, mas que só apresenta futilidades". Esta é a modalidade da Mãe Ganso: Ele Introduz o seu polegar e arranca uma pluma e diz: 'que bom menino que eu sou!'".
E. G. Robinson, Principies and Pratice of Morality, 160 - "A utilidade não tem nada de último em si e por isso não pode fornecer nenhuma base para a obrigação. A utilidade é uma simples adequação de alguma coisa à finalidade de ministrar outra". Dizer que as coisas são certas porque são úteis é como
dizer que elas são belas porque são agradáveis. Martinekj, Types of Ethical Theory, 2.170,511,556 - "No momento em que os apetites passam para o estado de consciência própria e se tornam fins ao invés de impulsos, eles tiram para si mesmos os termos da censura. ... Deste modo a consciência intelectual ou a estrita submissão da mente à evidência tem sua inspiração no amor puro da verdade e não sobrevive uma hora se não depositar a sua confiança na providência ou no sentimento social. ... Os instintos permitem que eles conheçam não o que são a prova de que a necessidade é o impulso original para a ação ao invés de ser o prazer do seu fim". Na teoria da felicidade os apelos para o interesse próprio em favor da religião devem ser eficazes; na verdade poucos são movidos por eles.
Dewey, Psichology, 300,362 - "A emoção se volta para dentro e engole-se a si mesma. Viva nos sentimentos ao invés de viver nas coisas a que os sentimentos pertencem, e você derrotará o seu próprio fim, esgotará o seu próprio poder de sentimento, cometerá o suicídio emocional. Daí surgirão o cinismo, o espírito do nil admirari, a incansável busca pela mais tardia sensação. O único remédio é sair de si mesmo, dedicar o seu eu a algum objeto digno, não por amor ao sentimento, mas ao objeto. ... Não desejamos o objeto porque ele nos dá prazer, mas ele nos dá prazer porque satisfaz o impulso que, em conexão com a idéia do objeto, constitui o desejo. ... O prazer é o acessório da atividade ou desenvolvimento do eu".
Salter, First Steps in Philosophy, 150 - "É um direito ter como alvo a felicidade. Esta é um fim. O utilitarismo erra ao fazer da felicidade o único e mais elevado fim. Ela exalta um estado de sentimento para com a coisa supremamente desejável. A institucionalização dá o mesmo lugar ao estado da vontade. A verdade inclui ambos. O verdadeiro fim é o mais elevado desenvolvimento do ser, do eu e de outros, a realização da idéia divina, Deus no homem". Bowne, Principies of Ethics, 96 - "O padrão de apelo não é a verdadeira felicidade do verdadeiro ho-mem, mas a felicidade normal do homem normal. ... A felicidade não deve ter lei. Mas, neste caso, a lei deve dirigir a felicidade. ... O verdadeiro alvo ético é realizar o bem. Mas, neste caso, o conteúdo deste bem tem de ser determinado segundo o ideal inato do merecimento e dignidade humanos. ... Nem todo o bem deve ser alvo da ação, mas só o verdadeiro, não só as coisas que agradam, mas as que causam prazer".
Bixby, Crisis in Morais, 223 - "O unitário está realmente investigando sobre o mais sábio método de encarnar o ideal. Ele pertence ao segundo estágio em que o artista moral considera através de que material e em que forma ou cor ele pode realizar melhor o seu pensamento. Ele deve dizer-nos o que é o ideal e por que é o mais elevado. A moral começa não no sentimento, mas na razão. A razão é impessoal. Ela discerne a igualdade moral das personalidades". Genung, Epic of the Inner Life, 20 - Jó fala do seu caráter como um dos heróis de Robert Browning. Ele ensina que "há um serviço de Deus que não opera o galardão: é a lealdade do coração, a fome da presença de Deus, que sobrevive à perda e ao castigo; que, a despeito da aparência contraditória, apega-se ao que é divino como a agulha busca o pólo; e que excede às trevas e dureza da sua vida à luz e ao amor".
O maior bem do ser. Não apenas Edwards, mas Priestley, Bentham, Dwight, Finney, Hopkins, Fairchild sustentam este ponto de vista. Ver Edwards, Works, 2.261 -304 - "Virtude é benevolência para com o ser em geral"; Dwight, Theology, 3.150-162 - "A utilidade é o fundamento da virtude". Esta teoria considera o bem somente como um estado da sensibilidade, ao invés de consistir na pureza do ser. Esquece que na eternidade passada "amor pelo ser em geral" = somente o amor próprio de Deus, ou a consideração que Deus tem pela sua própria felicidade. Isto implica que Deus é santo só com um propósito; ele está impedido de não ser santo, se o resultado for bem maior; isto é, a santidade não independe da sua natureza. Admitimos que freqüentemente se sabe que uma coisa é certa pelo fato de que ela é útil; mas isto é bem diferente de dizer que a sua utilidade a torna correta. "A utilidade é apenas o aparelho de diamante que marca, mas não determina o seu valor". "Se a utilidade for um critério de retidão será apenas por se tratar de uma revelação de natureza divina". Bp. Butler, Nature of Virtue, em Works, ed. de Bohn, 334 - "A benevolência é o verdadeiro amor próprio". O amor e a santidade são obrigatórios em si mesmos, não por promoverem o bem geral. Cícero, com propriedade, disse que aqueles que confundem o honestum com o utile merecem ser banidos da sociedade.
Encyc. Britannica, 7.690, sobre Jonathan Edwards - "Ser em geral, sem quaisquer qualidades, é coisa muito abstrata para ser a causa primordial do amor. O sentimento a que Edwards se refere não é o amor, mas o temor ou reverência e ainda necessariamente o temor cego. Apropriadamente afirmava-se, por isso, que a verdadeira virtude, segundo Edwards, consistiria num temor cego do ser em geral; apenas isso seria inconsistente com a sua definição de virtude existente em Deus. Na verdade, quando ele faz da virtude somente o segundo objeto do amor, esta teoria se identifica com o utilitarismo ao qual estão associados os nomes de Hume, Bentham e Mill". Hodge, Essays, 275 - "Se a obrigação em primeiro lugar se deve ao ser em geral, então não há mais virtude em amar Deus - desejar o seu bem - do que amar Satã. Mas, em sua natureza, o amor a Cristo difere da benevolência para com o Diabo". A virtude consiste claramente, não no amor em benefício do ser, mas no amor ao ser que é bom, ou, em outras palavras, no amor ao Deus santo. A santidade de Deus é a base da obrigação moral, não o bem maior do ser.
Dr. E. A. Park entende que a teoria de Edwards sustenta que a virtude é o amor a todos os seres segundo o seu valor, por isso, mais o amor do maior do que do menor, "amor a alguns seres em particular numa proporção gradual dos seres e de virtude ou benevolência para com o seu ser". Amor é escolha. Park diz que a felicidade não é o único bem e menos ainda a felicidade das criaturas. O maior bem é a santidade apesar de que o último é a felicidade. A santidade é o amor desinteresseiro - a livre escolha do bem geral, acima do particular. Mas retrucamos que isto não nos dá nenhuma razão ou padrão de virtude. Não nos diz o que é bom e por que deve ser escolhido. Martineau, Types, 2.70,77,471,484 - "Por que promover o bem geral? Por que sacrificar- me pelos outros? Só porque isto é bom. Nunca teria sido prudente fazer o que é certo se não tivesse sido algo infinitamente maior. ... Não é a adequação que torna moral um ato, mas é a moralidade que o torna adequado".
Herbert Spencer, deve ser classificado como um utilitarista. Ele diz que a justiça requer que "cada homem seja livre para fazer o que quer desde que não infrinja o igual direito dos outros". Mas desde que isto permite ferir o outro
submetendo-o a uma ofensa como revide, o Sr. Spencer limita a liberdade a "ações tais como uma vida de subserviência". Isto praticamente eqüivale a dizer que a maior felicidade é o fim último.
Nem na natureza das coisas (Price), - ou pelo que significamos sua adequação (Clarke), verdade (Wollaston), ordem (Jouffroy), relacionamentos (Wayland), merecimento (Hickok), simpatia (Adam Smith), ou direito abstrato (Haven e Alexander); pois esta natureza de coisas não é a última, mas tem sua base na natureza de Deus. Somos compelidos a adorar o altíssimo; se existe algo além e acima de Deus somos compelidos a adorá-lo, - o que, na verdade, é Deus.
Em oposição a todas as formas desta teoria, argumentamos que não há nada que independa de Deus ou que esteja acima dele. "Se a base moral não depende de Deus, ou ela não tem nenhuma autoridade última, ou usurpa o trono do Onipotente. Qualquer ser racional que guarda a lei seria perfeito sem Deus e o centro moral de todos os seres inteligentes estaria fora de Deus" (Talbot). Deus não é um Júpiter controlado pelo Fado. Ele não está sujeito a nenhuma lei a não ser à lei da sua própria natureza. Noblesse oblige (a nobreza exige), - o caráter dirige - a pureza é o elemento mais elevado. Por isso, para que haja santidade, todas as criaturas, voluntária ou involuntariamente, são constrangidas a curvar-se diante dele. Hopkins, Law of Love, 77 - "O certo e o errado nada têm a ver com a natureza das coisas que existem necessariamente, mas apenas com a natureza das pessoas". Houve uma outra pessoa que disse: "A idéia do direito não pode ser original, visto que direito significa conformidade com algum padrão ou regra". Este padrão ou esta regra não é uma abstração, mas um ser existente: o Deus infinitamente perfeito.
Faber: O direito é direito, visto que Deus é Deus; e o dia do direito triunfará; duvidar implicaria em deslealdade, hesitar seria pecado" Tennyson: E porque o certo é certo, seguir o que é certo seria sabedoria, sem medir conseqüências". O Certo é certo e eu devo querer o certo, não porque Deus o quer, mas porque Deus é certo. E. G. Robinson, Principies and Practice of Morality,
178-180 - "A utilidade e as relações somente revelam a constituição das coisas e deste modo representam Deus. A lei moral não é feita com o propósito utilitário, nem as relações constituem a razão da obrigação. Elas apenas mostram qual é a natureza do Deus que fez o universo e nele se revela.
Na sua natureza encontra-se a razão da moral". S. S. Times, 17 de out. 1891
"Só o nível se conforma com a curvatura da terra. A reta tangente à curva da terra estaria mais nas extremidades distantes do centro da terra do que no seio meio. Ora, eqüidade significa nível. O padrão de eqüidade não é algo impessoal, 'natureza das coisas' fora de Deus. Não se deve conceber eqüidade ou retidão independente do centro divino em iugar do nível compreensível independente do centro da terra.
Visto que Deus acha a regra e limitação das suas ações apenas no seu próprio ser e o seu amor está condicionado à sua santidade, devemos divergir de pontos de vista tais como os de Moxom: "Quer definamos a natureza de Deus como perfeita santidade quer o perfeito amor seja imaterial, visto que a natureza divina se manifesta apenas através da sua ação, ela se opera através da sua relação com os outros seres. A maior parte do nosso raciocínio sobre o padrão divino de retidão ou a última base da obrigação moral é o raciocínio em círculo, visto que nós sempre podemos voltar para Deus como princípio da sua ação; tal princípio podemos conhecer só através da sua ação. Deus, o ser perfeitamente justo, é o padrão ideal da retidão humana. Por isso a retidão no homem é a conformidade com a natureza de Deus. Deus, em conformidade com a sua natureza perfeita, sempre deseja o que é perfeitamente bom para o homem. Sua retidão é uma expressão do seu amor; este é uma manifestação da sua retidão".
Do mesmo modo também Smith: "A retidão é a genuinidade eterna do amor divino. Por isso não é uma excelência independente a ser contrastada com a benevolência, ou mesmo em oposição a ela; é parte essencial do amor".
Em replica, argumentamos, como antes, que aquilo que é objeto de amor, que limita e condiciona o amor, que fornece a norma e a razão do amor não pode por si mesmo ser o amor nem pode estar no mesmo nível dele. Um duplo padrão é tão irracional na ética como no comércio e nela conduz à mesma diminuição dos valores e ao mesma instabilidade das relações como resultou na nossa moeda na tentativa de fazer a prata regular o ouro ao mesmo tempo que o ouro regular a prata.
B) Ponto de vista Escriturístico. - Segundo as Escrituras, a base da obrigação moral é a santidade de Deus, ou a perfeição moral da natureza divina, em conformidade com a qual está a lei do nosso ser moral (Robinson, Chalmers, Calderwood, Gregory, Wuttke). Demonstramos isto:
à) A partir dos mandamentos: "Sede santos", onde a base da obrigação é simples e única: "porque eu sou santo" (1 Pe. 1.16); e "portanto, sede perfeitos" onde se estabelece o padrão: "como vosso Pai celestial é perfeito" (Mt. 5.48). Aqui temos uma última razão e base para sermos e fazermos o reto, a saber, que Deus é reto, ou, em outras palavras, que a santidade é a sua natureza.
A partir da natureza do amor no qual se resume toda a lei (Mt. 22.37 - "Amarás o Senhor, teu Deus"; Rm. 13.10 - "portanto, o amor é o cumprimento da lei"). Este amor não é considerado direito abstrato, ou a felicidade do ser, muito menos seu próprio interesse, mas considera Deus como a fonte e padrão de excelência moral ou, em outras palavras, amor a Deus como santo. Por isto, este amor é o princípio e fonte da santidade no homem.
A partir do exemplo de Cristo, cuja vida foi essencialmente a apresentação da consideração de Deus e da suprema dedicação à sua santa vontade. Como Cristo não viu nada de bom a não ser o que estava em Deus (Mc. 10.18
"não há bom senão um que é Deus") e só fez o que viu o Pai fazer (Jo. 5.19;
ver. 30 - "busco não a minha própria vontade, mas a vontade daquele que me enviou"), assim a nós sermos semelhantes a Deus é a súmula de todo o dever e a infinita excelência moral é a suprema razão porque devemos ser semelhantes a ele.
Talbot, Ethical Prologomena, in Bap. Quar., jul., 1877.257-274- "A base de toda a lei moral é a natureza de Deus, ou a natureza ética de Deus na relação com semelhante natureza no homem ou o imperativo da natureza divina". Platão: "A vontade divina é a fonte de toda a eficiência; a razão divina é a fonte de toda a lei; a natureza divina é a fonte de toda a virtude". Se se disser que Deus é amor assim como santidade, perguntamos: Amor a quê?
E a única resposta é: Amor ao direito ou à santidade. Perguntar por que o direito é bom não sensibiliza mais do que perguntar por que a felicidade é um bem. Deve existir alguma coisa última. Schiller diz que há pessoas que querem saber por que dez não é doze. Não podemos estudar o caráter separado da conduta e nem a conduta separada do caráter. Mas isto não nos impede de reconhecer que o caráter é a coisa fundamental e que a conduta é tão somente a sua expressão.
A perfeição moral da natureza divina inclui a verdade e o amor, mas, visto que é a santidade que condiciona o exercício de cada um dos outros atributos, devemos concluir que a santidade é a base da obrigação moral. A infinitude também se une com a santidade para fazê-la a base perfeita, mas porque o elemento determinante é a santidade, chamamos esta e não a infinitude de base da obrigação. J. H. Harris, Baccalaureate Sermon, Bucknell, Univer- sity, 1890 - "Como a santidade é atributo fundamental de Deus, deste modo é o supremo bem do homem. Aristóteles percebe isto quando declara que o principal bem do homem é o fortalecimento segundo a virtude. O cristianismo conta com o suprimento do Espírito Santo e torna possível tal suprimento".
A santidade é o alvo da carreira espiritual do homem; ver 1 Ts. 3.13 - "para confortar os vossos corações para que sejais irrepreensíveis em santidade diante de nosso Deus e Pai".
Arthur H. Hallan, em John Brown's fíab andhis Friends, 2.T2. - "Santidade e felicidade são duas noções da mesma coisa. ... Por isso, a não ser que o coração de um ser criado esteja unido ao coração de Deus, ele só pode ser miserável". Há mais verdade em dizer que a santidade e a felicidade são, como a causa e o efeito, inseparavelmente ligados entre si. Martineau, Types,
1. xvi; 2.70-77 - "É indispensável que haja duas classes de fatos para que tenhamos conhecimento: quais as fontes da conduta voluntária e quais os seus efeitos"; Study, 1.26 - "A Ética deve aperfeiçoar-se na religião ou desintegrar-se no hedonismo". William Law assinala: "A Ética não é exterior, mas interior. A essência de um ato moral não está no seu resultado, mas no motivo de que ele brota. E ele é bom ou mau se se conforma ou não com o caráter de Deus".
Capítulo II DOUTRINA DA TRINDADE
Na natureza de Deus há três distinções eternas que se nos representam sob a figura de pessoas e estas três são iguais. Esta tripessoalidade de Deus é uma verdade exclusiva da revelação. Faz-se claramente, apesar de não formalmente conhecida no Novo Testamento e podem achar-se indicações dela no Velho Testamento.
A doutrina da Trindade pode expressar-se nas seguintes seis afirmações: 1. Há na Escritura três que são reconhecidos como Deus. 2. Estes três são descritos de tal modo que somos compelidos a concebê-los como pessoas distintas. 3. Esta tripessoalidade da natureza divina não é simplesmente econômica e temporal, mas imanente e eterna. 4. Esta tripessoalidade não é triteís- mo; pois, conquanto haja três pessoas, há apenas uma essência. 5. As três pessoas, Pai, Filho e Espírito Santo são iguais. 6. Inescrutável, embora não autocontraditória, esta doutrina fornece a chave de todas outras doutrinas. - Passamos agora a provar e elucidar estas declarações.
A razão nos mostra a unidade de Deus; só a revelação nos mostra a sua Trindade, preenchendo os contornos desta Unidade e vivificando-a. O termo 'Trindade' não se encontra na Escritura, apesar de que o conceito que ela expressa é escriturístico. Atribui-se a invenção do termo a Tertuliano. Os mon- tanistas foram os primeiros que definiram a pessoalidade do Espírito e os primeiros que formularam a doutrina da Trindade. O termo 'Trindade' não é metafísico é apenas a designação de quatro fatos: 1) o Pai é Deus; 2) o Filho é Deus; 3) o Espírito é Deus; 4) há um só Deus.
Park: "Por um lado a doutrina da Trindade não afirma que as três pessoas estão unidas numa pessoa, ou três seres num só ser, ou três deuses num só Deus (triteísmo); nem, por outro lado, que Deus simplesmente se manifesta em três diferentes modos (trindade modal, ou de manifestações); mas, ao invés disso, que há três eternas distinções na substância de Deus". Smith, Prefácio a Edwards, Observations on Trinity. "A doutrina da igreja sobre a Trindade afirma que há em Deus três hipóstases distintas ou subsistências - Pai, Filho, e Espírito Santo - cada um possuindo uma única e mesma natureza divina embora de maneira diferente. Os pontos essenciais são 1) a unidade da essência; 2) a realidade das distinções imanentes ou ontológicas".
Ver Park em Eduards' View of The Trinity a respeito da Trindade, em B/Ma Sacra, abr. 1881.333. Princeton, Essays, 1.28 - "Há um Deus; Pai, Filho e Espírito Santo são este Deus uno; há esta distinção entre Pai, Filho e Espírito Santo quanto ao lançamento de uma base suficiente para o emprego recíproco dos pronomes pessoais". Joseph Cook: "(Pai, Filho e Espírito Santo são um Deus; 2) cada um tem uma peculiaridade incomunicável aos outros; 3) nenhum é Deus sem os outros; 4) cada um, com os outros é Deus".
Consideramos a doutrina da Trindade implicitamente sustentada pelos apóstolos e envolvida nas declarações do Novo Testamento sobre Pai, Filho e Espírito Santo, enquanto admitimos que a doutrina não foi formulada pelos escritores do Novo Testamento. Eles a defendiam como solução; só o tempo, a reflexão e o choque da controvérsia e oposição fizeram-na cristalizar-se na forma definida e dogmática. Chadwick, Old and New Unitarianism, 59,60, reivindicam que a origem judaica do cristianismo mostra que o Messias judaico não podia originariamente ter sido concebido como divino. Se Jesus tivesse reivindicado isso, ele não teria sido levado a Pilatos; os judeus o teriam matado. A doutrina da Trindade, diz Chadwick, não se desenvolveu até o Concilio de Nice, 325. E. G. Robinson: "Não havia doutrina da Trindade no período da patrística, como também não havia a doutrina da expiação antes de Anselmo. The Outlook, Notes and Queríes, 30 de mar 1901 - "Não se pode dizer que a doutrina da Trindade assumiu a forma final antes do aparecimento do assim chamado Credo Atanasiano no século 8a, ou 9e. O Credo Niceno formulado no quarto século, é chamado pelo Dr. Schaff, do ponto de vista ortodoxo, 'semitrinitário'. O mais antigo tempo que se sabe que Jesus foi deificado encontra-se, depois dos escritores do Novo Testamento, nas cartas de Inácio, no começo do segundo século".
Gore, Incarnation, 179 - "A doutrina da Trindade não é muito ouvida ou defendida nas afirmações da Escritura". George P. Fisher cita um amigo capaz e piedoso que diz: "O que encontramos no Novo Testamento é a disjecta membra (membros separados) da Trindade". G. B. Foster: "A doutrina da Trindade é a tentativa cristã de tornar inteligível a pessoalidade de Deus sem depender do mundo". Charles Kingsley dizia que, se a doutrina da Trindade está ou não na Bíblia, deveria estar nela, porque a nossa natureza espiritual clama por ela. Shedd, Dogmatic Theology, 1.250 - "Apesar de que a doutrina não pode ser descoberta pela razão humana, ela é suscetível à defesa racional, quando revelada". Sobre o trinitarismo na Nova Inglaterra, ver New World, 1896.272-295 - art. de Levi L. Paine. Ele diz que a sua última fase é representada por Phillips Brooks, James M. Whiton e George A. Gordon. Estes sustentam a divindade essencial da humanidade e principalmente de Cristo, o único representante da humanidade, que, neste sentido é a verdadeira encarnação da divindade.
Neander declara que a Trindade não é doutrina fundamental do cristianismo. Contudo, ele falava da forma especulativa, metafísica que a doutrina assumiu na teologia. Mas ele fala bem diferentemente da forma devota e prática em que as Escrituras a apresentam, como na fórmula batismal e na bênção apostólica. A respeito disto, diz ele: "Reconhecemos o conteúdo essencial do cristianismo resumido de uma forma breve". Whiton, Gloria Patri, 10,11,55,91,92
"O Deus transcendente, o Pai, releva-se através do Deus imanente, o Filho.
Esta natureza pertence tanto a Deus como a Cristo e à humanidade e neste fato baseia-se a imutabilidade das distinções morais e a possibilidade do progresso moral. ... A vida imanente do universo é a mesma do poder transcendente; a corrente filial é a mesma da Fonte paternal. Pertence à supremacia de Cristo o nome de Filho, que inclui toda essa vida que é gerada de Deus.
Em Cristo o outrora Filho inconsciente do mundo desperta a consciência do Pai. O Pai é a vida transcendente, acima de tudo. Em Cristo temos o coletivis- mo; no Espírito Santo temos o individualismo; como diz Bushnell: "O principal poder do mundo é a pessoalidade".
I. NA ESCRITURA HÁ TRÊS QUE SÃO RECONHECIDOS COMO DEUS
Provas do Novo Testamento
O Pai é reconhecido como Deus, - e em tão grande número de passagens (tais como Jo. 6.27 - "o Pai, Deus, o selou", e 1 Pe. 1.2- "presciência de Deus, Pai") que não precisamos nos delongar acrescentando extensas provas.
Jesus Cristo é reconhecido como Deus.
Ele é expressamente chamado Deus.
Em João 1.1 - 0eòç fjv ó ^.óyoç - a ausência do artigo mostra que Geóç é predicativo (cf. 4.24 — nveíi^a ó 0eóç). Este predicativo precede o verbo para dar ênfase, indicando progresso no pensamento = 'o Logos não só estava com Deus, mas era Deus' (ver Meyer e Luthardt, Com. in loco). "Só ó Xóyoc pode ser o sujeito, pois na Introdução toda, a questão não é, quem é Deus, mas quem é o Logos" (Godet).
Westcott, Bib. Com., in loco - "O predicado está, de um modo enfático, em primeiro lugar. Necessariamente está sem o artigo visto que descreve a natureza do Logros e não identifica a sua pessoa. Seria puro sabelianismo dizer: 'O Logos era ó 0eóç'. Assim temos neste verso 1 estabelecido o Logos em seu absoluto ser eterno, a) sua existência: além do tempo; b) sua existência pessoal: em comunhão ativa com Deus; c) sua natureza: Deus em essência". Marcus Dods, em Expositor's Greek Testament, in loco: "O Logos se distingue de Deus, contudo, 08Òç fjv ô Xóyoç — o Logos era Deus, quanto à natureza divina; não 'um Deus', o que ao ouvido de um judeu teria sido abominável, nem ainda idêntico a tudo o que pode ser chamado Deus, porque, então, o artigo teria sido inserido (cf. 1 Jo. 3.4)".
Em João 1.18, laovoyEVTiç 0eóç — 'o Deus unigênito' - deve-se considerar como a leitura correta e uma clara atribuição da divindade absoluta a Cristo.
Ele não é simplesmente o único revelador de Deus, mas ele é o próprio Deus elado.
Jo. 1.18 - "Deus nunca foi visto por alguém. O Filho unigênito, que está no seio do Pai, este o fez conhecer" (Rev. e Corr.). "Ninguém jamais viu a Deus; o Deus unigênito, que está no seio do Pai, é quem o revelou" (Rev. e Atual, no Br.). Nesta passagem, apesar de que Tischendorf (8- ed.) tem ixovoyevTiç móç, Westcott e Hort (com K*BC*L Peshita Siríaca) reza novoyeviiç ©eóç, e a Rev. Vers. "the only begotten God" (o unigênito Deus) na margem, apesar de que conserva "o Filho unigênito" no texto. Harnack diz que a leitura novoyevriç 0eóç está "além de uma contradição estabelecida". Aqui temos uma nova e inequívoca afirmação da divindade de Cristo. Meyer diz que os apóstolos realmente chamam Cristo de Deus só em Jo. 1.1 e 20.28 e que Paulo nunca o reconhece deste modo. Porém Meyer é capaz de sustentar a sua posição chamando as doxologias a Cristo, em 2 Tm. 4.18, Hb. 13.21 e 2 Pe. 3.18 de pós-apostólicas.
Em João 20.28, a palavra dirigida por Tomé ó KÚpióç n.ou Kai ó 9eóç pou,
'meu Senhor, meu Deus' - porque não foi repreendida por Cristo, eqüivale a uma declaração da sua parte como reivindicação da divindade.
Jo. 20.28 - "Tomé respondeu e disse-lhe: Senhor meu e Deus meu". Isto não pode ser interpretado como um súbito apelo a Deus causado por surpresa e admiração, sem acusar o apóstolo de profanação. Nem se pode considerar uma simples apresentação super-elaborado entusiasmo, já que Cristo a aceitou. Contraste a conduta de Paulo e Barnabé, quando os pagãos em Listra apresentavam-lhes sacrifícios como se eles fossem Júpiter e Mercúrio (At. 14.11-18). As palavras de Tomé, proferidas diretamente a Cristo e aceitas por ele, podem ser consideradas como um justo reconhecimento da parte de Tomé de que Cristo era o seu Senhor e seu Deus. Alford, Comentary, in loco:
"O ponto de vista sociniano de que estas palavras são simplesmente uma exclamação é refutado 1) pelo fato de que tais exclamações não eram empregadas entre os judeus; 2) pelo eírcev amcò; 3) pela impossibilidade de ó KÚpióç liou referir-se a outra pessoa que não fosse Jesus; ver v. 13; 4) pelo emprego no Novo Testamento da expressão do vocativo pelo nominativo com o artigo;
5) pelo absurdo psicológico de tal suposição; de que alguém convencido da presença daquele que com apreço amava, ao invés de se dirigir a ele, irrompia em irrelevante clamor; 6) por outro absurdo, o de supor que, se tal fosse o caso, o apóstolo João, que, de todos os escritores sacros, de modo mais constante conserva em mente o objetivo para o qual ele escreveu, tenha registrado alguma coisa tão alheia ao objetivo; 7) pela íntima conjunção de jtejúa-cE-üKcxç (2 pess. sing. perf. ind. de Tucrceúa))" Cf. Mt. 5.34 - "de maneira nenhuma jureis ... pelo céu" - não se diz jurar por Yahweh porque nenhum judeu juraria desta forma. Esta exclamação de Tomé, o que mais duvidou entre os doze, é a conclusão natural do evangelho de João. A tese "o Logos era Deus" (Jo. 1.1) torna-se agora parte da vida e consciência dos apóstolos.
O capítulo 21 é apenas um Epílogo, ou Apêndice, que João escreveu mais tarde, para corrigir o erro de que ele não deveria morrer. A divindade de Cristo é o assunto do apóstolo que melhor entendeu o seu Mestre. Lyman Beecher: "Jesus Cristo é a divindade atuante do universo".
Em Romanos 9.5, a oração ó cov èrci 7iávxcov 0eóç ei>À,0Yr"TÓç não pode ser traduzida "bendito seja o Deus sobre todos', pois cov é supérfluo se a oração é uma doxologia; "£Í>À,oyriT;óç precede o nome de Deus numa doxologia, mas segue-o, como aqui, em uma descrição" (Hovey). A oração pode, portanto, corretamente ser interpretada só como uma descrição da mais alta natureza do Cristo que já se dissera, tò ícaxà aápm, ou conforme sua mais humilde natureza ter tido sua origem em Israel (ver Tholuck, Com. in loco).
Sanday, Comentary on Rm. 9.5 - 'As palavras naturalmente referem-se a Cristo, a não ser que a palavra 'Deus' seja tão nitidamente um substantivo próprio que implica um contraste consigo mesmo (isto é, com o próprio substantivo). Já vimos que isto não é assim". Por isso, Sanday traduz: "de quem é Cristo, segundo a carne, o qual é sobre todos, Deus bendito eternamente".
Em Tito 2.13, ènupáveiav xfjç 5óí;r"Ç xoü peyáÀou 0eoí> kccí ccoiípoç f""j.c5v Triaoí) XpiGxoí) consideramos (com Ellicott) como "uma declaração direta, definida e mesmo estudada da divindade de Cristo" = "o aparecimento .... da glória do nosso grande Deus e Salvador Jesus Cristo" (assim é a Versão Inglesa Revisada). 'Ercicpáveia é um termo aplicado especialmente ao Filho e nunca ao Pai e (j.eyáXot) não é um termo exigido se empregado em relação ao Pai, mas peculiarmente apropriado se empregado em relação a Cristo. Apoiados nos mesmos princípios devemos interpretar semelhante texto em 1 Pedro
(ver Huther, no Com. de Meyer. "A estreita justaposição indica a certeza da unidade de Deus e Jesus Cristo da parte do autor").
Tt 2.13 - "aguardando a bem-aventurada esperança e o aparecimento da glória do grande Deus e nosso Senhor Jesus Cristo" (Rev. e Corr.). "aguardando a bendita esperança e a manifestação da glória do nosso grande Deus e Salvador Cristo Jesus" (Rev. e Atual, do Br.); Westcott e Hort põem entre parênteses a palavra Tprâv. Estas considerações diminuem o poder de convicção desta passagem como texto comprobatório, ainda que a média do argumento nos pareça pender em favor da interpretação de Ellicott dada acima.
Em Hebreus 1.8, rcpòç ôè tòv móv: ó Gpóvoç cot>, ó 0eóç, eiç tòv aicbva cita-se dirigindo a Cristo e o verso 10, que se segue - "Tu, Senhor, no princípio lançaste o fundamento da terra" - aplicando a Cristo uma atribuição a Yahweh, mostra que ó 0eóç no verso 8, é empregado no sentido do Deus absoluto.
Objeta-se às vezes que atribuir o nome de Deus a Cristo nada prova quanto à divindade absoluta, visto que os anjos e até mesmo os juizes humanos são chamados deuses, ao representar a autoridade de Deus e executar a sua vontade. Mas respondemos que, conquanto seja verdade que o nome às vezes é assim aplicado, é sempre com adjuntos e em conexões que não deixam dúvida sobre o seu sentido figurado e secundário. Entretanto, quando aplicado a Cristo, ao contrário, é com adjuntos e em conexões que não deixam dúvida de que significa o Deus absoluto. Ver Ex. 4.16 - "tu lhe serás por Deus"; 7.1 - "Eis que te tenho posto por Deus sobre Faraó"; 22.28 - "os juizes não amaldiçoarás e o príncipe dentre o teu povo não maldirás" (Rev. e Corr.); "Contra Deus não blasfemarás, nem amaldiçoarás o príncipe do teu povo" (Rev. e Atual, no Br.) SI. 82.1 - "Deus está na congregação dos poderosos; julga no meio dos deuses" (Rev. e Corr.); "Deus assiste na congregação divina; no meio dos deuses, estabelece o seu julgamento" (Rev. e Atual, no Br.) [entre os poderosos]; 6 - "eu disse: vós sois deuses e vós outros todos filhos do Altíssimo"; 7 - todavia, como homens morrereis como qualquer dos príncipes". Cf. Jo. 10.34-36 - "se a lei chamou deuses àqueles a quem a palavra de Deus foi dirigida" (que foram comissionados e indicados representantes), quanto mais àquele que é um com o Pai chama-se a si mesmo Deus.
Como em SI. 82.7 - aqueles que foram chamados bons são representados como morrendo, do mesmo modo em 97.7 - "Prostrai-vos diante dele todos os deuses" - são ordenados a que se curvem diante do Senhor. Ann. Par. Bible: "Apesar de que as divindades dos pagãos não têm existência positiva, freqüentemente são descritas na Escritura com se a tivessem e curvando-se diante da majestade do Senhor". Este verso é citado em Hb. 1.6 - "e todos os anjos de Deus o adorem" - i.e., a Cristo. Aqui Cristo é identificado com Yahweh. Trata-se de uma citação da Septuaginta, que tem a palavra "anjos" em lugar de "deuses". Seu emprego aqui está de acordo com o espírito da palavra hebraica, que inclui tudo o que o erro humano podia considerar como objeto de culto". Determina-se aos que figurada e retoricamente são chamados "deuses" que se dobrem em adoração diante de Jesus Cristo, que é o verdadeiro Deus.
Em 1 João 5.20 - èo)j.èv èv xrâ áÀ/r"0ivcò, èv xcò mô amoú 'Iriooti Xpioxrâ. oúxóç èaxiv ó á?tr"0ivòç 0eóç - "seria uma categórica repetição depois que o Pai tinha chamado duas vezes ó à^r"0ivóç, dizer outra vez: 'este é ó àÀr"0ivóç. Nosso ser em Deus tem sua base em Cristo, seu Filho, e este também torna mais natural que oüxoç se refira a mô. Mas não deve ó à^rjOivoç estar sem o artigo (como em João 1.1- 0eòç fjv ó A.óyoç)? Não, pois é o propósito de João dizer em 1 João 5.20, não o que Cristo é, mas quem ele é. Declarando o que alguém é, o predicativo não deve ter artigo; declarando quem alguém é deve ter o artigo. João aqui diz que este Filho, em quem nosso ser repousa no verdadeiro Deus, é o mesmo verdadeiro Deus" (ver Ebrard, Com. in loco).
Outras passagens podem ser aqui acrescentadas, como Cl. 2.9 - "nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade"; Fp. 2.6 - "sendo em
forma de Deus"; mas preferimos considerar estas sob outros títulos como prova indireta da divindade de Cristo. Contamos ainda com outras passagens como afirmações diretas dadas como razão textual. São elas At. 20.28 cuja leitura correta, com toda probabilidade, não é èKKÀriaíav tem ©eofi, mas êkkA.t"C7íccv -uoíiKupíou (como se acha em ACDE Tregelles bTiscihendorf; contudo, B e N, contudo, têm toü 0eoü. A Versão Revista continua a registrar "a igreja de Deus; contudo, os revisores americanos continuam a registrar "a igreja do Senhor"); e 1 Tm. 3.16, onde õç inquestionavelmente deve ser substituído por 0eóç, apesar de que mesmo aqui ètpavepôeTi indica preexistência.
O Rev. George E. Ellis, D. D., diante do Unitarian Club, Boston, Nov. 1882
"Cinqüenta anos de estudo, pensamento e leitura dedicados em grande parte à Bíblia e à literatura peculiarmente relaciona-se com ela, trouxeram- me a esta conclusão de que o livro, tomado com a qualidade divina especial e seu caráter, e deste modo, por extensão, atribuído a ele, como inspirado e infalível como um todo, e em todo o seu conteúdo - é um livro ortodoxo. Ele produz aquilo que se chama credo ortodoxo. A grande maioria dos seus leitores, seguindo a sua letra, seu sentido óbvio, seu significado natural e causando a impressão de que alguns dos seus textos enfáticos encontram nele ortodoxia. Só esse tipo de tratamento forçado, ingênuo, especial, discri- minativo e, acrescente-se, de candura, que recebe de nós, os liberais podem fazer o livro ensinar qualquer coisa que não seja a ortodoxia. As assim chamadas seitas evangélicas estão claramente certas ao sustentar que este seu ponto de vista da Escritura e de suas doutrinas traça uma profunda e ampla divisão dos credos entre eles e nós. Na sua vibrante controvérsia através de panfletos entre os Drs. Channing e Ware, de um lado, e os Drs. Worcester e Woods e o Professor Stuart, de outro, - controvérsia que fez o povo da nossa comunidade há sessenta anos passados mais do que fizeram as nossas recentes campanhas políticas - estou plenamente convencido de que os polemistas pioraram. A exegese bíblica, a lógica e o argumento estavam claramente ao lado dos polemistas ortodoxos. E, deste modo, isto aconteceu principalmente porque o grupo liberal se pôs no mesmo plano que o ortodoxo no seu modo de considerar e tratar os textos bíblicos no seu procedimento sobre a controvérsia. O liberalismo não pode vencer a ortodoxia se ele faz concessões a este último no seu próprio modo de considerar e tratar a Bíblia como um todo. Martinho Lutero dizia que os papistas queimavam a Bíblia porque não lhes favorecia. Ora, não devo atacar a Bíblia por não estar do meu lado; mas devo objetar com tanta ênfase quanto eu posso contra o caráter e qualidade atribuídos à Bíblia, que por si mesma não reivindica, que não pode certificar-se em seu favor; e a origem e o crescimento e a intensidade das influências ternas e supersticiosas resultantes desse ponto de vista não podemos trazer de modo distinto a agentes por conta da crença corrente, mas sem garantia. A ortodoxia não pode reajustar os seus credos enquanto não reajustar a sua avaliação das Escrituras. A única salvação que alguém que professa o credo ortodoxo pode encontrar é, ou forçar sua ingenuidade sobre os textos que servem de prova, ou abrir mão da sua liberdade fora deles".
Com esta confissão de um notável unitário é interessante comparar a opinião do assim chamado trinitário, Lyman Abbott, que diz que o Novo Testamento em parte alguma chama Cristo de Deus, mas em toda a parte o chama
homem, como em 1 Tm. 2.5 - "Porque há um só Deus e um só mediador entre Deus e os homens, Jesus Cristo, homem". Sobre esta passagem o próprio Prof. L. L. Paine assinala no New World, dez. 1894 - "Que Paulo contundiu Cristo com o próprio Deus ou considerou-o de qualquer modo como a Suprema Divindade, é uma posição invalidada não só pelas afirmações diretas, mas também pela tendência das suas epístolas".
Descrições veterotestamentárias de Deus aplicadas a ele.
Esta aplicação de nomes e títulos a Cristo exclusivamente apropriados a Deus é inexplicável, se Cristo não era considerado como sendo ele mesmo Deus. O temor peculiar com que o termo 'Yahweh' era separado por uma nação de firmes monoteístas como nome sagrado e incomunicável nome do Deus auto-existente e guardador da aliança proíbe crer que os escritores da Bíblia o poderiam ter usado para designar um ser subordinado e criado.
Mt. 3.3 - "Preparai o caminho do Senhor" - é uma citação de Is. 40.3 - "Preparai ... o caminho de Yahweh". João 12.41 - "Isaías disse isso quando viu a sua glória e falou dele" [i.e., Cristo] - refere-se a Is. 6.1 - "No ano em que morreu o rei Uzias, eu vi ao Senhor assentado sobre um alto e sublime trono". Do mesmo modo em Ef. 4.7,8 "a medida do dom de Cristo. ... levou cativo o cativeiro" - é uma aplicação do que se diz em SI. 68.18 a Cristo. Em 1 Pe. 3.15, contudo, lemos, com todos os grandes unciais, vários dos Pais e todas as melhores versões: "santificai a Cristo, como Senhor, em vosso coração"; aqui o apóstolo toma de empréstimo a linguagem de Is. 8.13, onde se lê:
"Ao Senhor dos exércitos, a ele santificai". Quando nos lembramos de que, com os judeus, o título pactuai de Deus é tão sagrado que, para o Kethib (= "escrito") Yahweh é sempre substituído por Keri (= "leia" - imperativo) Adonai, para evitar a pronúncia do grande nome, parece mais notável que
equivalente grego de 'Yahweh' deve ter sido empregado constantemente para designar Cristo. Cf. Rm. 10.9 - "confessarmos ... Jesus como Senhor";
Co. 12.3 - "Ninguém pode dizer que Jesus é o Senhor, senão pelo Espírito Santo". Convém lembrar também a indignação dos judeus na afirmação de Cristo sobre a sua igualdade e unidade com o Pai. Comparar a expressão de Goethe, "Er dar ihm nennen? com a de Carlyle, "O terrível inominável deste Universo". Tem-se dito que os judeus sempre oscilaram entre o monoteísmo e o moneyteísmo. Contudo, Tiago, o mais forte dos hebreus, na sua epístola emprega a palavra 'Senhor' livre e alternadamente referindo-se a Deus, o Pai e a Cristo, o Filho. Isto teria sido impossível se Tiago não cresse na comunidade da essência entre o Filho e o Pai.
É interessante notar que 1 Mc. (Macabeus) não emprega a palavra 0eóç, ou Kúpioç, ou qualquer outra designação direta de Deus exceto oúpavóç (cf.
'de maneira nenhuma jureis nem pelo céu' - Mt. 5.34). Do mesmo modo o livro de Ester não contém nenhuma menção do nome de Deus apesar de que os apócrifos acréscimos de Ester, encontrados só no grego, contém o nome de Deus no primeiro verso e menciona-o ao todo oito vezes.
Ele possui os atributos de Deus.
Entre eies estão: vida, existência própria, imutabilidade, verdade, amor. santidade, eternidade, onipresença, onisciência, onipotência. Todos estes atributos são aplicados a Cristo em conexões que mostram que os termos não são empregados em nenhum sentido secundário, nem em qualquer sentido aplicável a uma criatura.
Vida\ Jo. 1.4 - "Nele estava a v\da"; 14.6 - "Eu sou ... a \nda". Existência própria'. Jo. 5.26 - "ter vida em si mesmo"; Hb. 7.16 - "virtude de vida incorruptível (cxKaTaXmou)". imutabilidade'. "Jesus Cristo é o mesmo ontem, e hoje, e eternamente". Verdade: Jo. 14.6 - "Eu sou ... a verdade"; Ap. 3.7 - "o que é verdadeiro". Amor. 1 Jo. 3.16 - "Conhecemos o amor (xf"v àyáitTiv = Amor pessoal, como a Verdade pessoal) nisto: que ele deu a vida por nós". Santidade: Lc. 1.35 - "o santo, que de ti há de nascer, será chamado Filho de Deus";
Jo. 6.69 - "tu és o Santo de Deus"; Hb. 7.26 - "santo, inocente, imaculado, separado dos pecadores".
Eternidade: Jo. 1.1 - "No princípio era o Verbo". Godet diz áv àpxri' = não 'na eternidade', mas 'no começo da criação'; a eternidade do Verbo é uma inferência de fjv - o Verbo era, quando o mundo foi criado: cf. Gn. 1.1 - "No princípio criou Deus". Porém Meyer diz: èv àpxrf aqui está acima da concepção histórica de "no princípio" em Gênesis (que inclui o começo do próprio tempo) até a concepção absoluta de anterioridade no tempo; a criação é algo subseqüente. Ele acha um paralelo em Pv. 8.23 - èv àp;cn jtpò -toú xnv yfjv rcoifiaai. A interpretação 'no princípio do evangelho' é inteiramente não exe- gética. Do mesmo modo Jo. 17.5 - "glória que tinha contigo antes que o mundo existisse"; Ef. 1.4 - "também nos elegeu antes da fundação do mundo". Dorner também diz que èv àpxri em Jo. 1.1 não é 'o começo do mundo', mas designa o ponto atrás do qual é impossível recuar, i.e., a eternidade; a primeira vez que se fala do mundo é no verso 3. Jo. 8.58 - "antes que Abraão existisse, eu sou"; cf. 1.15; Cl. 1.17 - "E ele é antes de coisas as coisas"; Hb. 1.11 - os céus "perecerão, mas tu permanecerás"; Ap. 21.6 - "Eu sou o Alfa e o Ômega, o Princípio e o Fim".
Onipresença: Mt. 28.20 - "eu estou convosco todos os dias"; 18.20 - "Porque onde dois ou três estiverem reunidos em meu nome, aí estou eu no meio deles". Onisciência: Mt. 9.4 - "Mas Jesus, conhecendo os seus pensamentos..."; Jo. 2.24,25 - "porque a todos conhecia ... ele bem sabia o que estava no homem"; 16.30 - "sabes tudo"; At. 1.24 - "Tu, Senhor, conhecedor do coração de todos ..." oração dirigida antes do dia de Pentecostes e que mostra a atitude dos discípulos para com o seu Mestre; 1 Co. 4.5 - "até que o Senhor venha, o qual trará à luz as coisas ocultas das trevas e manifestará os desígnios dos corações"; Cl. 2.3 - "em quem estão escondidos todos os tesouros da sabedoria e da ciência". Onipotência: Mt. 28.18 - "Toda a autoridade me foi dada no céu e na terra"; Ap. 1.8 - "Eu sou o Alfa e o Ômega,
o princípio e o fim, diz o Senhor, que é, que era, e que há de vir, o Todo- poderoso".
Beyschlag, N. T. Theology, 1.249-260, sustenta que a preexistência de Jesus é simplesmente a forma completa dada a uma concepção ideal. Jesus recua a si mesmo no tempo, como tudo o que é santo e divino recua nas concepções do seu tempo até uma origem celeste na qual preexistiam antes do seu aparecimento terreno; p.ex.: o tabernáculo em Hb. 8.5; Jerusalém em Gl. 4.25 e Ap. 21.10; o Reino de Deus em Mt. 13.24; muito mais o Messias em Jo. 6.62 - "subir o Filho do Homem para onde primeiro estava"; 8.58 - "antes que Abraão fosse, eu sou"; 17.24 - "tu me amaste antes da fundação do mundo". Este ponto de vista de que Jesus existia antes da criação só numa forma ideal na mente divina, significa só que Deus o conhecia anteriormente e sabia da sua vinda. O ponto de vista é refutado pelas múltiplas indicações de uma preexistência pessoal, distinta da ideal.
Lowrie, Doctrine of St. John, 115 - "A expressão 'no princípio' (Jo. 1.1) sugere que o autor está empenhado em escrever um segundo livro de Gênesis, sobre uma nova criação". Como a criação pressupõe um criador, a preexistência de um Verbo pessoal aparece como uma explicação do ser do universo. O fjv indica existência absoluta, o que é uma idéia mais elevada que a da simples preexistência, apesar de que esta a inclui. Enquanto se diz que João Batista e Abraão ressuscitaram, apareceram, vieram a ser, diz-se que o Logos era, e que o Logos era Deus. Isto implica coeternidade com o Pai. Mas se o ponto de vista que estamos combatendo fosse correto, João Batista e Abraão preexistiriam do mesmo modo que Cristo. Sem dúvida não é este o sentido de Jesus em Jo. 8.58 - "Antes que Abraão nascesse eu sou"; cf. Cl. 1.17
"ele é antes de todas as coisas" - "a\nóç dá ênfase à pessoalidade, enquanto êativ declara que a preexistência é existência absoluta" Lightfoot);
Jo. 1.15- "o que vem depois de mim é antes de mim, porque foi primeiro do que eu" = não que Jesus tivesse nascido antes de João Batista, porque ele nasceu seis meses mais tarde, mas que ele existia antes. Ele é antes de João em grau, porque ele existia muito antes de João, no tempo; 6.62 - "Subir o Filho do Homem para onde primeiro estava"; 16.28 - "Saí do Pai e vim ao mundo". Também Is. 9.6,7, chama Cristo de "Pai eterno" = a eternidade é um atributo do Messias. T. W. Chambers, em Jour. Soc. Bib. Exegesis, 1881.169171 - "Cristo é o Eterno, 'cujas origens são desde os tempos antigos, desde os dias da eternidade' (Mq. 5.2). 'Do incremento deste principado da paz, não haverá fim' (Is. 9.7) porque a sua existência não teve começo".
As obras de Deus são atribuídas a ele.
Não falamos aqui dos milagres, que podem ser operados por poder comunicado, mas de obras tais como a criação do mundo, o sustento de todas as coisas, a ressurreição final dos mortos e o julgamento de todos os homens. O poder de realizar estas obras não pode ser delegado, pois são características da onipotência.
Criação: Jo. 1.3 - "Todas as coisas foram feitas por intermédio dele";
Co. 8.6 - "um só Senhor, Jesus Cristo, pelo qual são todas as coisas":
Cl. 1.16 - "tudo foi criado por meio dele e para ele"; Hb. 1.10-"Tu, Senhor, no princípio fundaste a terra e os céus são obra das tuas mãos"; 3.3,4 - "o que edificou todas as coisas é Deus" = Cristo, o edificador da casa de Israel, é o Deus que fez todas as coisas; Ap. 3.14 - "o princípio da criação de Deus" (cf. Platão: "A mente é a àppí do movimento"). Sustentando: Cl. 1.17- "todas as coisas subsistem por ele"; Hb. 1.3 - "sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder". Ressuscitando os mortos e julgando o mundo: Jo. 5.27-29 - "autoridade para exercer o juízo ... todos os que estão nos sepulcros ouvirão a sua voz, e sairão"; Mt. 25.31,32 - "... se assentará no trono da sua glória; e todas as nações se reunirão diante dele". Se o nosso argumento fosse dirigido totalmente aos crentes poderíamos também argumentar com a obra de Cristo no mundo como Revelador de Deus e Redentor dos pecados, como prova da sua divindade.
Afirmações sobre a atividade criadora de Cristo e seu sustento estão combinadas em Jo. 1.3,4 - návra ôi^amoti èyéve-to, Kat xuPiÇ crinoí} èyéveTO oú5è ev. ó yéyovev èv aúxcb Çwri fjv - "Todas as coisas foram feitas por intermédio dele, e sem ele nada foi feito. Nele estava a vida e a vida era a luz dos homens". Westcott: "Seria difícil encontrar um consenso mais completo das antigas autoridades em favor de qualquer leitura do que a que defende esta pontuação". Por isso Westcott a adota. A passagem mostra que o universo
existe dentro dos limites do ser de Cristo; 2. que ele não é morto, mas vivo;
que ele deriva a sua vida de Cristo. A criação requer a presença divina, assim como a sua atuação. Deus cria através de Cristo. Todas as coisas foram feitas, não vnò cxíitoí) - "por ele", mas sraúxoti - "através dele".
Van Oosterzee, Christian Dogmatics, Iv, Ivi - Aquilo que muitos teólogos conjeturavam obscuramente, a saber, que Deus não produziu o mundo de uma forma absoluta, imediata, mas de um modo ou de outro, mediatamente, aqui se nos apresenta com a clareza da revelação e exalta tanto mais a reivindicação do Filho de Deus à nossa profunda e reverente homenagem". Ah! Se tais cientistas como Tyndall e Huxley pudessem ver Cristo na natureza, e, fazendo a sua vontade, pudessem aprender a sua doutrina e ser conduzidos ao Pai! O mais humilde cristão que vê a mão de Cristo no universo físico e na história humana conhece mais do segredo do universo do que todos os cientistas juntos.
Cl 1.17- "todas as coisas subsistem por ele", ou "reúnem-se", não significa nada menos que Cristo é o princípio da coesão no universo, fazendo um cosmos, não um caos. Tyndall dizia que a atração do sol sobre a terra é tão inconcebível como se um cavalo puxasse a carroça sem varais. Sir Isaac Newton: "A gravitação deve ser causada por um agente em acordo constante com determinadas leis" Lightfoot: "A gravitação é uma expressão da mente de Cristo". A evolução também é o método da sua operação. As leis da natureza são os hábitos de Cristo e a natureza em si é apenas a sua firme e constante vontade. Ele determina em conjunto com o homem e a natureza num todo orgânico de modo que podemos falar de um universo. Sem ele não haveria nenhuma ligação, nenhuma uniformidade da lei, nenhuma unidade da verdade. O meio de interação entre as coisas é também o meio de interco- municação entre as mentes. É adequando isso que ele reúne e sustenta o físico e o intelectual, deve reunir o universo, moral trazendo para si todos
homens (Jo. 12.32) e deste modo para Deus e reconciliando todas as coisas no céu e na terra (Cl. 1.20). Em Cristo "a lei aparece, em caracteres vivos", porque ele é a base e a fonte de toda a lei tanto na natureza como na humanidade.
Ele recebe a honra e o louvor devidos só a Deus.
Em acréscimo às palavras de Tomé em João 20.28, que já citamos entre as provas de que Jesus é expressamente chamado Deus e em que a honra divina é tributada a ele, podemos fazer referência à oração e adoração oferecidas pelas igrejas apostólicas e pós-apostólicas.
Jo. 5.23 - "que todos honrem o Filho, como honram o Pai"; 14.14 - "Se pedirdes alguma coisa em meu nome, eu o farei"; At. 7.59 - "Estêvão, que em seu coração dizia: Senhor Jesus, recebe o meu espírito" (cf. Lc. 23.46
Palavras de Jesus: "Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito"); Rm. 10.9
"Se, com a tua boca, confessares Jesus como Senhor"; 13 - "todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo" (cf. Gn. 4.26 - "então se começou a invocar o nome do Senhor"; 1 Co. 11.24, 25 - "fazei isto em memória de mim" = adoração a Cristo; Hb. 1.6 - "todos os anjos de Deus o adorem";
Fp. 2.10,11 - "ao nome de Jesus se dobre todo joelho ... toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor"; Ap. 5.12-14 - "Digno é o Cordeiro, que foi morto, de receber o poder..."; 2 Pe. 3.18 - "Senhor e Salvador Jesus Cristo.
A ele seja dada a glória"; 2 Tm. 4.18 e Hb. 13.21 - "a quem seja glória para todo sempre" - estas inscrições de glória eterna a Cristo implicam sua divindade. Ver também 1 Pe. 3.15 - "santificai a Cristo, como Senhor e Ef. 5.21
"sujeitando-vos uns aos outros no temor de Cristo". Aqui está uma atitude da mente para com Cristo, o que seria uma idolatria se Cristo não fosse Deus.
Foster, Christian Life and Theology, 154 - "Na liturgia eucarística do 'Ensino' lemos: 'Hosana ao Deus de Davi'; falando do 'sangue de Deus', em evidente alusão a At. 20.28; a epístola a Diogneto toma as palavras de Paulo e o chama 'arquiteto e construtor do mundo por quem [Deus] criou os céus', e o chama Deus (cap. vii); Hermas fala a respeito dele como 'o santo Espírito preexistente, que criou toda a criatura'; estilo de expressão seguido por Justino, que o chama Deus, como mais tarde o fizeram os grandes escritores.
Na segunda epístola de Clemente (130-160, Harnack), lemos: 'irmãos, cabe a vós pensar em Jesus Cristo como Deus - como Juiz dos vivos e dos mortos'.
E Inácio o descreve como 'gerado e não gerado, passível e impassível,... que era antes da eternidade com o Pai'. "
Estes testemunhos são dão evidência de que os Pais da Igreja viram na Escritura divina honra atribuída a Cristo. Mais tarde eles foram apenas precursores de uma hoste de intérpretes. Num período de calmaria do massacre dos cristãos armênios em Sassouan, ouviu-se um dos selvagens curdos perguntar: "Quem era o 'Senhor Jesus' que eles estavam invocando?" Na sua agonia de morte, os cristãos, como Estêvão no passado, ele invocou o nome do Senhor. Robert Browning citou, numa carta a uma senhora na sua enfermidade terminal, as palavras de Charles Lamb, quando "em alegre fantasia com alguns amigos sobre como ele e os seus amigos se sentiriam se o maior dos mortos aparecesse repentinamente em carne e osso mais uma vez - na primeira sugestão, 'E se Cristo entrasse nessa sala?' mudasse o seu tom num instante e gaguejasse como quando estava comovido: 'Veja só - se Shakespeare entrasse, nós nos levantaríamos; se Ele aparecesse, nós nos ajoelharíamos'."
Seu nome é associado ao de Deus no mesmo pé de igualdade.
Não fazemos alusão aqui a 1 João 5.7 (as três testemunhas celestiais), pois esta parte do verso é inquestionavelmente espúria; mas à fórmula do batismo, às bênçãos apostólicas e às passagens em que se diz que a vida eterna depende igualmente de Cristo e de Deus, ou em que os dons espirituais são atribuídos a Cristo do mesmo modo que ao Pai.
Fórmula do batismo: Mt. 28.19 - "batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo"; cf. At. 2.38 - "cada um de vós seja batizado em nome de Jesus Cristo"; Rm. 6.3 - "batizados em Jesus Cristo". "Na fórmula batismal comum o Filho e o Espírito são coordenados com o Pai e eíç ovo^a tem significação religiosa". Seria tanto absurdo como profano falar em batizar em nome do Pai e de Moisés.
Bênção apostólica: 1 Co. 1.3 - "graça e paz, da parte de Deus, nosso Pai, e do Senhor Jesus Cristo"; 2 Co. 13.13 - "A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com vós todos". "Na bênção a graça é algo divino e Cristo tem poder para concedê-la. Mas por que encontra-mos a palavra 'Deus' e não 'Pai' como na fórmula do batismo? Porque é só o Pai que não se torna homem ou tem existência histórica. Em outra parte ele é chamado 'Deus, o Pai', para distingui-lo de Deus, o Filho e de Deus, o Espírito Santo (Gl. 1.3; Ef. 3.14; 6.23)".
Outras passagens: Jo. 5.23 - "para que todos honrem o Filho, como honram o Pai"; Jo. 14.1 - "crede(s) em Deus, crede(s) também em mim" - Westcott, Bible Com., in loco entende tratar-se de duplo imperativo; jtuneúeTe tanto pode ser pres. ind. 2 pess. pl., como imperativo pres. 2a pess. pl.; nas ambas vezes esse verbo pode ser traduzido como pres. ind. ou imperativo pres., podendo aparecer: "crede em Deus, crede também em mim"; ou credes em Deus credes também em mim; credes em Deus, crede também em mim; crede em Deus credes também em mim. 17.3 - "E a vida eterna é esta: que te conheçam a ti, o único Deus verdadeiro, e a teu Filho a quem enviaste";
Mt. 11.27 - "Ninguém conhece o Filho senão o Pai; e ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho quiser revelar"; 1 Co. 12.4-6 - "o mesmo Espírito ... o mesmo Senhor [Cristo] ... o mesmo Deus [Pai] concedendo dons espirituais, p.ex., fé: Rm. 10.17 - "a fé vem pelo ouvir e o ouvir pela palavra de Cristo" (alguns documentos em lugar da palavra Cristo registram a palavra Deus); paz: Cl. 3.15 - "seja a paz de Cristo o árbitro dos vossos corações". 2 Ts. 2.16,17 - "Ora o nosso Senhor Jesus Cristo e Deus, nosso Pai console os vossos corações" - dois nomes com o verbo no singular indicam unidade entre Pai e Filho (Lillie). Ef. 5.5 - "Reino de Cristo e de Deus"; Cl. 3.1
"Cristo ... assentado à destra de Deus" = participação na soberania do universo; o divã oriental tinha não só o monarca, mas também o seu filho. Hackett: "Como, ao morrer, o Salvador disse ao Pai, 'Em tuas mão entrego o meu espírito' (Lc. 23.46), do mesmo modo, Estêvão, ao morrer, disse ao Salvador: 'recebe o meu espírito' (At. 7.59)".
Reivindica-se expressamente igualdade com Deus.
Aqui podemos fazer referência ao testemunho de Jesus sobre si mesmo já tratado (verpp. 189, 190) entre as provas do caráter sobrenatural do ensino da Escritura. A igualdade com Deus não é só reivindicada por Jesus para si mesmo, mas é reivindicada para ele pelos apóstolos.
Jo. 5.18 - "dizia que Deus era seu próprio Pai, fazendo-se igual a Deus";
Fp. 2.6 - 'subsistindo em forma de Deus, não julgou como usurpação o ser igual a Deus" = contava a sua igualdade a Deus uma coisa que devesse ser retida à força. Cristo fez e deixou aos seus contemporâneos a impressão de que ele reivindicava ser Deus. O Novo Testamento deixou, sobre a grande maioria dos que o leram, a impressão de que Jesus Cristo reivindica ser Deus.
Se ele não é Deus, é um enganador, ou engana-se a si mesmo e, em qualquer caso, Christus, si non Deus, non bonus.
Mais provas da divindade de Cristo podem encontrar-se na aplicação das seguintes expressões a ele: 'Filho de Deus', 'Imagem de Deus'; nas declarações de sua unidade com Deus; na atribuição da plenitude da divindade a ele.
Mt. 26.63,64 - "Conjuro-te pelo Deus vivo que nos digas se tu és o Cristo, o Filho de Deus. Disse Jesus: Tu o disseste" - é por esse testemunho que Cristo morre. Cl. 1.15 - "imagem do Deus invisível"; Hb. 1.3 - "resplendor da sua glória [do Pai], e a imagem expressa da sua pessoa"; Jo. 10.30 - "Eu e o Pai somos um"; 14.9 - "quem me vê a mim vê o Pai"; 17.11,22 - "para que sejam um, assim como nós" - não eíç, mas èv; não unus, mas unum\ não uma pessoa, mas uma substância. "Unum é o antídoto ariano, sumus da heresia sabeliana". Cl. 2.9 - "nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade"; cf. 1.19- "porque foi do agrado do Pai que toda a plenitude nele habitasse"; (marg.) "para toda a plenitude de Deus habitar nele". Jo. 16.15 - "tudo quanto o Pai tem é meu"; 17.10 - "todas as minhas coisas são tuas, e todas as tuas coisas são minhas".
Meyer, on Jo. 1.30 - "Eu e o Pai somos um" - "Aqui os arianos entendem que se trata de uma simples harmonia ética ensinada nas palavras "somos um" é insatisfatória porque é irrelevante ao exercício do poder. A unidade da essência, embora não contida nas palavras em si mesmas, está, pela necessidade do argumento, pressuposta nelas". Dalman, As Palavras de Jesus: "Em lugar nenhum encontramos Jesus chamando-se Filho de Deus no sentido de sugerir mera relação religiosa e ética com Deus - relação que os outros também tinham e que eram capazes de atingir ou estavam destinados a adquirir". Podemos acrescentar que enquanto no mais humilde sentido eles são muitos 'filhos de Deus', há apenas um 'Filho unigênito'.
Estas provas da divindade de Cristo a partir do Novo Testamento são corroboradas pela experiência cristã.
A experiência cristã reconhece Cristo como um Salvador absolutamente perfeito, revelando perfeitamente a divindade e merecedor de ilimitado louvor e adoração; isto é, praticamente reconhece-o como Deus. Mas a experiência cristã também reconhece que através de Cristo ela tem a Introdução e reconciliação com Deus como alguém distinto de Jesus Cristo, como alguém que estava afastado da alma por causa pecado dela, mas que agora se acha reconciliada através da morte de Jesus. Em outras palavras, enquanto reconhecendo Jesus como Deus, somos compelidos a reconhecer uma distinção entre o Pai e o Filho e através deste chegamos ao Pai.
Apesar de que esta experiência não pode ser considerada como testemunha independente das reivindicações de Jesus, porque ela só testa a verdade que já se tomou conhecida na Bíblia, ainda o irresistível impulso de cada pessoa a quem Cristo salvou de elevar seu redentor ao mais alto lugar, e de curvar-se diante dele no mais modesto louvor, é forte evidência de que só esta interpretação da Escritura que reconhece a divindade absoluta de Cristo pode ser verdadeira. E a consciência da igreja sobre a divindade do Senhor, na verdade, e não simples especulação sobre as relações Pai, Filho e Espírito Santo, que tem compelido a formulação da doutrina escriturística da Trindade. Estas provas da divindade de Cristo a partir do Novo Testamento são corroboradas pela experiência cristã.
A experiência cristã reconhece Cristo como um Salvador absolutamente perfeito, revelando perfeitamente a divindade e merecedor de ilimitado louvor e adoração; isto é, praticamente reconhece-o como Deus. Mas a experiência cristã também reconhece que através de Cristo ela tem a Introdução e reconciliação com Deus como alguém distinto de Jesus Cristo, como alguém que estava afastado da alma por causa pecado dela, mas que agora se acha reconciliada através da morte de Jesus. Em outras palavras, enquanto reconhecendo Jesus como Deus, somos compelidos a reconhecer uma distinção entre o Pai e o Filho e através deste chegamos ao Pai.
Apesar de que esta experiência não pode ser considerada como testemunha independente das reivindicações de Jesus, porque ela só testa a verdade que já se tornou conhecida na Bíblia, ainda o irresistível impulso de cada pessoa a quem Cristo salvou de elevar seu redentor ao mais alto lugar, e de curvar-se diante dele no mais modesto louvor, é forte evidência de que só
esta interpretação da Escritura que reconhece a divindade absoluta de Cristo pode ser verdadeira. É a consciência da igreja sobre a divindade do Senhor, na verdade, e não simples especulação sobre as relações Pai, Filho e Espírito Santo, que tem compelido a formulação da doutrina escriturística da Trindade.
Na carta de Plínio a Trajano, se diz dos cristãos primitivos "quod essent soliti carmen Christo quasi Deo dicere invicem" (que seria um poema dedicado a Cristo de quem se diz ser quase Deus). As orações e hinos da igreja mostram o que se cria que a Escritura ensinava. Conta-se que Dwight Moody teve a primeira convicção da verdade do evangelho ao ouvir as palavras finais de uma oração: "Por amor de Jesus. Amém", quando despertou de um ligeiro cochilo na igreja do Dr. Kirk, em Boston. Estas palavras, sempre quando proferidas implicam a dependência do homem e a divindade de Cristo.
Em Ef. 4.32 a Versão Revisada substitui "em Cristo" por "por amor de Cristo". Esta expressão não se encontra no N.T. na conexão com a oração, apesar de que no A.T., "por amor do meu nome" (SI. 25.11) passa para o N.T. "em nome de Jesus" (Fp. 2.10); cf. SI. 72.15 - "e, continuamente, por ele se fará oração"
= as palavras do hino: "Por ele se fará oração sem fim e bênçãos sem fim coroarão a sua cabeça". Tudo isto é prova de que a idéia de que a oração por amor de Cristo se encontra na Escritura, apesar de que a expressão não aparece.
Uma caricatura esboçada no Palatino, em Roma, datando do século terceiro, representa uma figura humana com a cabeça de um asno, suspensa numa cruz, enquanto um homem se posta em pé diante dela em atitude de adoração. Sob a efígie vê-se a inscrição: "Alexâmenos adora o seu Deus".
Foi Schleiermacher quem primeiro fez este apelo ao testemunho da consciência cristã. William E. Gladstone: "Tudo bem, penso eu e espero-o baseado na divindade do nosso Senhor, centro da esperança dos nossos pobres e norte da nossa raça". E. G. Robinson: "Quando você prega a salvação em Cristo, prega a Trindade". W. G. T. Shedd: "A construção da doutrina da Trindade, parte não da consideração das três pessoas, mas na crença na divindade de uma delas".
Contemplando passagens aparentemente inconsistentes com aquelas ora citadas, nas quais se imputa a Cristo fraqueza e ignorância, limitação e sujeição, devemos lembrar, primeiro, que o Senhor era verdadeiramente homem assim como era verdadeiramente Deus e que tal ignorância e fraqueza podem ser predicados dele como o Deus-homem em quem a divindade e a humanidade se unem; segundo, que a natureza divina em certo sentido limitou-se humilhou-se durante a vida terrena do nosso Salvador e que estas passagens podem descrevê-lo como ele era no seu estado de humilhação mais do que em sua original e presente glória; e terceiro, que há uma ordem de ofício e operação que é consistente com a unidade e igualdade essenciais, mas que permite falar-se do Pai como primeiro e o Filho como segundo. Estas declarações serão melhor elucidadas ao tratar-se da presente doutrina e em subseqüente exame da doutrina da pessoa de Cristo.
Há algumas coisas que Cristo não sabia: Mc. 13.32 - "daquele Dia e hora, ninguém sabe, nem os anjos que estão no céu, nem o Filho, senão o Pai". Ele estava sujeito ao cansaço físico: Jo. 4.6 - "Jesus, pois, cansado do caminho, assentou-se junto da fonte". Houve uma limitação conseqüente da sua carne humana: Fp. 2.7 - "a si mesmo se esvaziou, assumindo a forma de servo, tornando-se em semelhança de homens"; Jo. 14.28 - "o Pai é maior do que eu". Há uma sujeição relativa à ordem do ofício e operação que é consistente com a igualdade da essência e unidade com Deus: 1 Co. 15.28 - "então o próprio Filho também se sujeitará àquele que todas as coisas lhe sujeitou, para que Deus seja tudo em todos". Isto deve ser interpretado em consistência com Jo. 17.5 - "glorifica-me, ó Pai, com a glória que eu tive junto de ti, antes que houvesse mundo" e Fp. 2.6 onde se descreve a sua glória como "forma de Deus" e "igual a Deus".
Mesmo na sua humilhação, Cristo era a Verdade Essencial, e o seu desconhecimento nunca implicou em erro ou ensino falso. O seu desconhecimento podia às vezes tornar o seu ensino incompleto; nunca, em qualquer sentido, falso. Ainda aqui devemos distinguir entre o que ele pretendia ensinar e o que era simplesmente incidental ao seu ensino. Quando ele diz: Moisés "escreveu de mim" (Jo. 5.46) e "Davi, em espírito, lhe chama Senhor" (Mt. 22.43), se o seu propósito era ensinar a autoridade do Pentateuco e a do Salmo 110, devemos considerar que as suas palavras têm autoridade absoluta. Mas é possível que ele apenas pretendesse situar as referidas passagens e, se assim, as suas palavras não podem ser empregadas para tirar conclusões críticas quanto à sua autoridade. Adamson, The Mind of Christ, 136 - "Se ele falou de Moisés ou de Davi foi tão somente para identificar a passagem. A autoridade da antiga dispensação não se apoia no fato de dever-se a Moisés, nem a propriedade do Salmo apoia-se no fato de ter sido proferido por Davi. Não há nenhuma evidência de que a questão da autoridade veio antes dele". Mais precariamente Adamson sugere que "pode ter havido um lapso de memória na menção de Jesus sobre 'Zacarias, filho de Baraquias' (Mt. 23.35), visto que se trata de matéria sem valor espiritual".
Para as afirmações sobre o conhecimento de Jesus, ver Jo. 2.24,25 - "a todos conhecia ...não necessitava de que alguém testificasse do homem, porque ele bem sabia o que havia no homem"; 6.64 - "bem sabia Jesus, desde o princípio, quem eram os que não criam e quem era o que o havia de entregar"; 12.33 - "Dizia isto, significando de que morte havia de morrer"; 21.19- "Disse isso significando com que morte ele [Pedro] havia de glorificar a Deus"; 13.1 - "sabendo que era chegada a sua hora de passar"; Mt. 25.31 - "quando o Filho do Homem vier na sua glória, e todos os santos anjos, com ele, então se assentará no trono da sua glória" = ele sabia que haveria de atuar como o juiz final da raça humana. Outros exemplos citados por Adamson, The Mind in Christ, 24-49: 1. O conhecimento que Jesus tinha de Pedro (Jo. 1.42); 2. o descobrimento de Filipe (1.43); 3. o reconhecimento de Nata- nael (1.47-50); 4. da mulher samaritana (4.17-19,39); 5. a pesca maravilhosa (Lc. 5.6-9; Jo. 21.6); 6. a morte de Lázaro (Jo. 11.14); 7. o jumentinho (Mt. 21.2); 8. do cenáculo (Mc. 14.15); 9. da negação de Pedro (Mt. 26.34); 10. do tipo da sua própria morte (12.33; 18.32); 11. o tipo de morte de Pedro (Jo. 21.19); 12. a queda de Jerusalém (Mt. 24.2).
Por outro lado, há afirmações e implicações do desconhecimento de Jesus: ele não sabia qual era o dia do fim (Mc. 13.32), apesar de que mesmo aqui ele dá indicações da sua superioridade relativa aos anjos; 5.30-34 - "quem tocou nas minhas vestes?" apesar de que saiu virtude dele para curar;
Jo. 11.34 - "Onde o puseram?" apesar de que ele estava em vias de ressuscitar Lázaro; Mc. 11.13 - "Vendo longe uma figueira que tinha folhas, foi ver se nela acharia alguma coisa" = ele não sabia que ela não tinha fruto, ainda que tivesse poder para amaldiçoá-la. Com estas evidências das limitações do conhecimento de Jesus, devemos admitir o juízo de Bacon, Genesis of Genesis, 33 - "Devemos abrir mão de fixar a autoridade de Jesus numa questão de crítica literária"; e Gore, Incarnation, 195 - "Não penso que precisamos admitir que o emprego de uma expressão, da parte de Jesus como 'Moisés escreveu a respeito de mim' leva-nos à autoria mosaica do Pentateuco como um todo".
É inconcebível que uma simples criatura diga: "Deus é maior do que eu", ou que se diga dela como por fim e de modo misterioso tornando-se "súdito de Deus". Neste estado de humilhação, Cristo estava sujeito ao Espírito (At. 1.2 - "depois de ter dado um mandamento, pelo Espírito Santo"; 10.38 - "Deus o ungiu com o Espírito Santo ... porque Deus estava com ele"; Hb. 9.14
"pelo Espírito eterno ofereceu-se imaculado a Deus"), mas no seu estado de exaltação Cristo é o Senhor do Espírito (ícupíou TtvefyicxToç - 2 Co. 3.18 — Meyer), dando o Espírito e através do Espírito. Hb. 2.7, marg. - "Tu o fizeste pouco menor do que os anjos".
O Espírito Santo é reconhecido como Deus
Fala-se dele como Deus.
At. 5.3,4 - "mentisses ao Espírito Santo ... não mentiste aos homens, mas a Deus"; 1 Co. 3.16 - "vós sois o templo de Deus ... o Espírito de Deus habita em vós"; 6.19-0 vosso corpo é o templo do Espírito Santo"; 12.4-6 - "o mesmo Espírito ... o mesmo Senhor ... o mesmo Deus, que opera em vós todas as coisas" - "A divina Trindade é aqui indicada num clímax ascendente de tal modo que passamos do Espírito que concede os dons ao Senhor [Cristo], que é servido por meio deles e, finalmente a Deus, como a primeira causa absoluta e possuidor de todas as forças cristãs opera a inteira soma de todos os dons carismáticos em todos os que são dotados" (Meyer, in loco).
Atributos de Deus. Os atributos de Deus tais como vida, verdade, amor, santidade, eternidade, onipresença, onisciência, onipotência são aplicados a ele.
Vida: Rm. 8.2 - "o Espírito de vida". Verdade: Jo. 16.13 - "Espírito de verdade". Amor: Rm. 15.30 - "O amor do Espírito". Santidade: Ef. 4.30 - "O Espírito Santo de Deus". Eternidade: Hb. 9.14 - "O Espírito eterno". Onipresença:
SI. 139.7 - "Para onde me irei do teu Espírito?" Onisciência: 1 Co. 12.11 - "Mas um só e o mesmo Espírito opera todas essas coisas [incluindo os dons de cura e milagres], repartindo a cada um como quer".
Obras de Deus. Ele faz as obras de Deus tais como criação, regeneração, ressurreição.
Criação: Gn. 1.2 - "O Espírito de Deus pairava (hebr., chocava) sobre a face das águas". Expulsão de demônios: Mt. 12.28 - "Mas, se eu, pelo Espírito de Deus expulso demônios". Convencimento do pecado: Jo. 16.8 - "convencerá o mundo do pecado". Regeneração: Jo. 3.8 - "nascido do Espírito";
Tt. 3.5 - "renovação do Espírito Santo". Ressurreição: Rm. 8.11 - "vivificará o vosso corpo mortal pelo seu Espírito"; 1 Co. 15.45 - "o último Adão, espírito vivificante".
Honra devida a Deus. 1 Co. 3.16 - "vós sois o templo de Deus ... o Espírito de Deus habita em vós" - aquele que habita no templo é objeto de adoração nele.
Associado com Deus. Fórmula do batismo":
Mt. 29-8.19 - "batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo". Se a fórmula batismal é adoração, temos a adoração prestada ao Espírito. Bênção Apostólica: 2 Co. 13.13 - "A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com vós todos". Se a bênção apostólica é oração, temos aqui uma oração ao Espírito. 1 Pe. 1.2 - "Presciência de Deus Pai... santificação do Espírito ... a aspersão do sangue de Cristo".
Sobre Hb. 9.14, Kendrick, Comentary in loco, interpreta: "As ofertas de si mesmo em virtude de um espírito eterno que nele habita e concede ao sacrifício uma eficácia espiritual e eterna. O 'espírito' de que se fala aqui, então não é o 'Espírito Santo'; não é a sua natureza puramente divina; é aquela propensão para a natureza divina com sua pessoalidade humana que forma
o mistério do seu ser, esse 'espírito de santidade' em virtude do qual ele foi declarado 'Filho de Deus com poder', por causa da sua ressurreição dentre os mortos". Hovey acrescenta uma nota ao Comentário de Kendrick, in loco, como segue: "Este adjetivo 'eterno' naturalmente sugere que a palavra 'Espírito' se refere à mais elevada e divina natureza de Cristo. Sua natureza verdadeiramente humana, do seu lado espiritual, na verdade, é eterna quanto ao futuro, mas é também o espírito de cada homem. O único valor superlativo do sacrifício próprio de Cristo parece dever-se ao impulso do lado divino da sua natureza". A expressão 'espírito eterno' significa, então, a sua divindade.
De ambas interpretações preferimos aquela que faz a passagem referir-se ao Espírito Santo e, como apoio, citamos At. 1.2 - "Ele tinha dado mandamentos através do Espírito Santo aos apóstolos"; 10.38 - "Deus o ungiu com o Espírito Santo". Sobre 1 Co. 2.10, Mason, Faith of the Gospel, 63, assinala:
"O Espírito de Deus não acha nada até mesmo em Deus que frustra seu escrutínio. A sua 'busca' não é uma busca do conhecimento ainda além dele.
... Nada a não ser Deus pode sondar as profundezas de Deus".
Como espírito, ele é nada menos que o princípio interior da vida e o espírito do homem é o próprio homem, assim o espírito de Deus deve ser Deus (ver
Co. 2.11 - Meyer). Contudo, a experiência cristã expressa nas orações e hinos na igreja, fornece um argumento para a divindade do Espírito Santo semelhante à da divindade de Jesus Cristo. Quando nossos olhos se abrem para ver Cristo como Salvador, somos compelidos a reconhecer em nós a obra do divino Espírito que tomou as coisas de Cristo e no-las mostrou; e este Espírito divino distinguimos necessariamente tanto do Pai como do Filho. Contudo, a experiência cristã não é uma testemunha da divindade do Espírito Santo original e independente: simplesmente mostra o que a igreja tem sustentado ser a interpretação natural e não forçada das Escrituras e assim confirma o argumento escriturístico já acrescentado.
O Espírito Santo é o próprio Deus pessoalmente presente naquele que crê. E. G. Robinson: "Se 'Espírito de Deus' não mais implica divindade além do que o 'anjo de Deus', por que o Espírito Santo não é chamado somente o anjo ou mensageiro de Deus"? Walker, The Spirit and the Incarnation, 337 - "O Espírito Santo é Deus no seu mais íntimo ser ou essência, princípio de vida tanto do Pai como do Filho; nele Deus tanto Pai como Filho, faz tudo, e nele vem a nós e, em nós, crescentemente através das suas manifestações. Através da habitação e operação do Espírito Santo, Deus, na sua pessoa do Filho encarnou-se plenamente em Cristo". Gould, Am. Com. on 1 Co. 2.11 - "Porque quem dentre os homens conhece as coisas do homem, senão o espírito do homem, que nele está? do mesmo modo ninguém conhece as coisas de Deus a não ser o Espírito de Deus" - "Não se pode levar para muito longe a analogia como se o Espírito de Deus e Deus fossem termos coexis- tentes, como o são os termos correspondentes, substancialmente no homem.
O centro da analogia evidentemente é o conhecimento próprio, e em ambos os casos o contraste se dá entre o espírito dentro e qualquer coisa fora". Andrew Murray, Spirit of Christ, 140 - "Não devemos esperar sempre sentir o poder do Espírito quando ele opera. A Escritura liga poder e fraqueza de um modo maravilhoso, não como coisas que se sucedem umas às outras, mas como coexistentes. 'Estive convosco na fraqueza ... minha pregação esteve em poder' (2 Co. 12.10). Aquele que comanda a natureza deve em primeiro lugar e de modo mais absoluto, obedecer-lhe. ... Queremos receber a posse do Poder, e usá-la. Deus quer o Poder para apossar-se de nós".
Esta prova da divindade do Espírito Santo não é invalidada pelas limitações da suas obra na dispensação do Velho Testamento. Jo. 7.39 - "porque o Espírito Santo ainda não fora dado" - significa somente que o Espírito Santo ainda não podia cumprir o seu ofício peculiar como revelador de Cristo até que se completasse a obra expiatória de Cristo.
Jo. 7.39 deve ser interpretado à luz de outras Escrituras que afirmam a atuação do Espírito Santo sob a velha dispensação (SI. 51.11 - "não retires de mim o teu Espírito Santo") e que descreve o seu ofício peculiar sob a nova dispensação (Jo. 16.14,15 - "ele há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar"). Limitações na maneira da obra do Espírito no A.T. envolvia uma limitação na extensão e também no poder. O Pentecostes foi o fiuxo de uma maré de influência espiritual que até agora tinha sido barrada. A partir daí o Espírito Santo foi o Espírito de Jesus Cristo, recebendo as coisas de Cristo e apresentando-as, aplicando sua obra final aos corações humanos, e tornando-se até agora o Salvador onipresente dos seus seguidores espalhados por toda a parte até o fim dos tempos.
Nas condições da sua humilhação, Cristo era um servo. Toda autoridade no céu e na terra foi-lhe dada só depois da sua ressurreição. Por isso ele não podia mandar o Espírito Santo até que ele ascendeu ao céu. A mãe pode mostrar o seu filho só quando ele está desenvolvido. O Espírito Santo só pôde revelar Cristo quando houve um Cristo completo para ser revelado.
O Espírito Santo só pôde santificar após o exemplo e motivo da santidade serem fornecidos na vida e morte de Cristo. Archer Butler: "O divino Artista não podia apropriadamente descer para copiar antes de ter sido providenciado o original".
Ainda o Espírito Santo é "o Espírito eterno (Hb. 9.14) e ele não só existe, mas também operou nos tempos do A.T. Antes de Cristo "o Espírito Santo ainda não fora dado" (Jo. 7.39), do mesmo modo que antes de Édison ainda não existia a eletricidade. Havia tanta eletricidade no mundo antes de Édison como há agora. Ele somente nos ensinou a sua existência e como utilizá-la. Ainda podemos dizer que, antes de Édison, a eletricidade como meio de iluminação, aquecimento e transporte não existia. Também até o Pentecostes, o Espírito Santo, como revelador de Cristo, '"ainda não fora dado'. Agostinho chama o Pentecostes de dies natalis, ou dia do nascimento, do Espírito Santo; pela mesma razão que chamamos o dia em que Maria gerou o primeiro filho, o dia do nascimento de Jesus Cristo, apesar de que antes que Abraão nascesse, Cristo era. O Espírito tinha estado empenhado na criação e tinha inspirado os profetas, mas, oficialmente, como mediador entre os homens e Cristo, "o Espírito Santo não fora dado". Ele não podia mostrar as coisas de Cristo até que elas estivessem prontas para serem mostradas.
Indicações do Velho Testamento
As passagens que parecem mostrar que mesmo no Velho Testamento há três que, implicitamente são reconhecidos como Deus, podem ser classificados sob quatro tópicos:
Passagens que parecem ensinar um certo tipo de pluralidade em Deus.
a) Emprega-se o substantivo plural 0'n1?^ com verbo no plural - notável emprego quando consideramos que o singular também existia; b) Deus usa pronomes plurais referindo-se a si mesmo; c) Yahweh distingue-se de Yahweh;
í1 atribui-se um Filho a Yahweh; é) distingue-se o Deus do Espírito de Deus; há tríplice atribuição e tríplice bênção.
a) Gn. 20.13 - "Quando Deus me fez [hebr. plural] andar errante da casa do meu pai"; 35.7 - "edificou ali um altar e chamou aquele lugar El-Betel, porquanto Deus ali se lhe revelou [plural]", b) Gn. 1.28 - "Façamos o homem à nossa imagem, conforme a nossa semelhança"; 3.22 - "eis que o homem se tornou como um de nós"; 11.7 - "Eia, desçamos e confundamos ali a sua língua"; Is. 6.8 - "A quem enviarei e quem há de ir por nós?" c) Gn. 19.24 - "Então o Senhor fez chover enxofre e fogo do Senhor desde os céus, sobre Sodoma e Gomorra"; Os. 1.7 - "Mas da casa de Judá me compadecerei e os salvarei pelo Senhor, seu Deus"; cf. 2 Tm. 1.18- "O Senhor lhe conceda que, naquele dia, ache misericórdia diante do Senhor" - apesar de que Ellicott aqui decide contrariamente à referência trinitária. d) SI. 2.7 - "Tu és meu Filho; eu hoje te gerei"; Pv. 30.4 - "Quem estabeleceu todas extremidades da terra"? Qual é o seu nome, e qual é o nome de seu filho, se é que o sabes?"
Gn. 1.1 e 2 - "criou Deus ... o Espírito de Deus pairava (hebr. chocava)";
SI. 33.6 - "Pela palavra do Senhor foram feitos os céus; e todo o exército deles, pelo espírito [sopro] da sua boca"; Is. 48.16 - "o Senhor Yahweh me enviou o seu Espírito"; 63.7,10 - "as benignidades do Senhor... contristaram o seu Espírito Santo", f) Is. 6.3 - o triságio: "Santo, santo, santo"; Nm. 6.24-26
"O Senhor te abençoe e te guarde; o Senhor faça resplandecer o seu rosto sobre ti e tenha misericórdia de ti; o Senhor sobre ti levante o seu rosto e te dê a paz".
Tem-se sugerido que, como Baal era adorado em diferentes lugares sob diferentes nomes, Baalberite, Baal-Hanã, Baal-Peor, Baal-Zebu (Belzebu), e seus sacerdotes poderiam invocar qualquer um destes como possuindo certos atributos personificados de Baal enquanto no seu todo eram chamados com o termo plural 'Baalim', e Elias poderia dizer: "Invocai os vossos deuses", do mesmo modo 'Elohim' pode ser a designação coletiva do Deus que era adorado em diferentes localidades; ver Robertson Smith, Old Testament in the Jewish Church, 229. Mas isto ignora o fato de que Baal é sempre mencionado no singular, nunca no plural, enquanto o plural 'Elohim' é o termo normalmente empregado quando de dirige a Deus. Isto parece mostrar que 'Baalim' é um coletivo, enquanto 'Elohim' não o é. Deste modo, quando Ewald, Lehre von Gott, 2.333, distingue cinco nomes de Deus, correspondendo aos cinco grandes períodos da história de Israel, a saber, o "Onipotente" dos patriarcas, o Yahweh do Concerto, o "Deus dos Exércitos" da Monarquia, o "Santo" do judaísmo, ele ignora o fato de que estas designações não estão limitadas aos tempos a que são atribuídas, apesar de que podem predominantemente terem sido empregadas nos referidos tempos.
O fato de que é usado às vezes em sentido mais estrito como aplicá
vel ao Filho (Sl. 45.6; cf. Hb. 1.8), não impede necessariamente de crer que o termo foi originariamente escolhido como contendo alusão a uma certa pluralidade na natureza divina. Nem basta chamar este plural de simples pluralis
majestaticus; porque é mais fácil derivar esta figura comum do uso divino do que derivar o uso divino desta figura comum - especialmente quando consideramos a constante tendência de Israel para o politeísmo.
SI. 45.6 - "O teu trono, ó Deus é eterno e perpétuo"; cf. Hb. 1.8 - "Ó Deus, o teu trono subsiste pelos séculos dos séculos". Aqui é Deus que chama Cristo de "Deus" ou "Elohim". A palavra Elohim adquiriu aqui a significação de um singular. Houve tempos em que se pensava que o estilo real da fala era um costume de data mais tardia do que a mosaica. Faraó não a emprega.
Em Gn. 41.41 -44, ele diz: "Vês aqui te tenho posto sobre toda a terra do Egito.
... Eu sou Faraó". Porém, mais tarde as investigações parecem provar que o plural para a palavra Deus foi empregado pelos cananeus antes da ocupação hebréia. Faraó é chamado 'meus deuses' ou 'meu deus', indiferentemente.
A palavra 'senhor' encontra-se normalmente no A.T. na forma do plural (cf. Gn. 24.9,51 - "Então, pôs o servo a sua mão debaixo da coxa de Abraão, seu senhor. ... seja a mulher do filho do teu senhor, como tem dito o Senhor"; 39.20 - "E o senhor de José o tomou"; 40.1 - "pecaram o copeiro do rei do Egito e o padeiro contra o seu senhor, o rei do Egito"). O plural dá ao pronunciamento um sentido de terror. Significa magnitude e plenitude.
Este emprego do plural no hebraico antigo a Deus freqüentemente se explica como mero plural de dignidade, = alguém que combina em si muitas razões para a adoração de rÒX: invocar a Deus, temer a Deus,
adorar). Oehler, O. T. Theology, 1.128-130, chama-a de "plural quantitativo", significando grandeza ilimitada. Os hebreus tinham muitas formas de plural nas quais deveriam empregar o singular, como 'céus' em lugar de 'céu', 'águas' em lugar de 'água'. Nós falamos em 'notícias', 'honorários', 'vós' em vez de 'tu'. Mas os Pais da igreja tais como Barnabé, Justino Mártir, Irineu, Teófilo, Epifânio e Teodoreto viam neste plural uma alusão à Trindade e sentimos uma inclinação para segui-los. Se se pluralizam as coisas finitas para expressar a reverência do homem, seria muito mais natural pluralizar o nome de Deus. E o propósito de Deus ao garantir tal pluralização pode ter tido maior alcance e maior inteligência do que a do homem. O Espírito Santo que presidiu o desenvolvimento da revelação bem pode ter dirigido o emprego generalizado do plural e até mesmo a sua adoção no nome Elohim em particular, com vistas a um desdobramento futuro da verdade relativa à Trindade.
Por isso discordamos do ponto de vista de Hill, Genetic Philosophy, 323, 330 - "A religião hebraica, mesmo muito mais tarde que Moisés, como existia na mente popular, estava, segundo os escritos proféticos, muito distante de um real monoteísmo e consistia numa oscilante aceitação da proeminência de um Deus tribal com forte inclinação para um politeísmo genérico. Por isso é impossível supor que qualquer coisa que abordasse o monoteísmo filosófico da teologia moderna pudesse ter sido elaborado ou mesmo aceito pelo homem primitivo. ... 'Não terás outros deuses diante de mim' (Ex. 20.3), o primeiro preceito do monoteísmo hebreu não foi, a princípio, entendido como uma negação da fé politeísta mas somente como uma reivindicação exclusiva da adoração e da obediência". E. G. Robinson diz, em semelhante linha, que podemos explicar as tendências idolátricas dos judeus só baseados na
suposição de que ele tinham noções reservadas de que Deus era simplesmente um deus nacional".
Sobre os pontos de vista tanto de Hill como de Robinson, retrucamos que a primitiva intuição de Deus não é a de muitos, mas a de um só Deus. Paulo nos diz que o politeísmo é um tardio e retrógrado estágio de desenvolvimento devido ao pecado do homem (Rm. 1.19-25). Preferimos a afirmação de McLaren: "O plural Elohim não é uma sobrevivência de um estágio politeísta, mas expressa a natureza divina na multiplicidade das suas plenitudes e perdições, mais do que na unidade abstrata do seu ser" - e, acrescentamos, expressa a natureza divina em sua plenitude essencial, como um complexo de pessoalidades.
Passagens relativas ao Anjo do Senhor.
a) O anjo de Yahweh se identifica com Yahweh; b) ele é identificado por outros com o Yahweh; c) ele aceita a adoração devida somente a Deus. Apesar de que a expressão 'anjo de Yahweh' é às vezes empregada mais tarde nas Escrituras para denotar simplesmente mensageiro humano ou anjo criado, parece no Velho Testamento, dificilmente com mais de uma exceção, designar o Logos preencamado, cujas manifestações em forma angélica ou humana prefiguravam sua vinda final em carne.
Gn. 22.11,16 - "o Anjo do Senhor lhe [a Abraão quando estava para sacrificar Isaque] bradou desde os céus ... Por mim mesmo jurei, diz o Senhor"; 31.11,13 -"E disse-me [ a Jacó] o Anjo de Deus ... Eu sou o Deus de Betei". Gn. 16.9,13 - "Então, lhe disse o Anjo do Senhor ... ela chamou o nome do Senhor, que com ela falava: Tu és Deus que vê"; 48.15,16- "O Deus que me sustentou ... o Anjo que me livrou", c) Ex. 3.2,4,5 - "E o Anjo do Senhor lhe apareceu ... bradou Deus a ele do meio da sarça ... tira os teus sapatos de teus pés"; Jz. 13.20-22 - "o Anjo do Senhor subiu ... Manoá e a sua mulher... caíram em terra sobre o seu rosto ... Manoá disse ... certamente morreremos, porquanto temos visto Deus".
O "anjo do Senhor" parece ser um mensageiro humano em Ageu 1.13 - "Ageu, o embaixador do Senhor"; um anjo criado em Mt. 1.20 - "apareceu-lhe um anjo do Senhor [chamado Gabriel]"; em At. 8.26 - "o anjo do Senhor falou a Filipe" e em 12.7 - "sobreveio [a Pedro] um anjo do Senhor". Mas normalmente, no A.T. o "anjo do Senhor^' é uma teofania uma manifestação do próprio Deus. A única distinção acha-se entre o Senhor em si mesmo e o Senhor numa manifestação. As aparições do "anjo do Senhor" parecem ser manifestações preliminares do Logos divino, como em Gn. 18.2,13 - "três varões estavam em pé junto a ele [Abraão]... e disse o Senhor a Abraão"; Dn. 3.25,28
"o aspecto do quarto é semelhante ao filho dos deuses ... bendito seja o Deus ... que mandou o seu anjo". O "anjo do Senhor" no N.T. não permite que o adorem; o 'anjo do Senhor no A.T. o requer (Ap. 22.8,9 - "Olha, não faças tal"; cf. Ex. 3.5 - "tira os teus sapatos").
Descrições da Sabedoria e Palavra divinas.
A Sabedoria é representada como distinta de Deus e eternamente existente com Deus; b) o Verbo de Deus distingue-se de Deus como o executor da sua vontade desde a eternidade.
a) Pv. 8.1 - "Não clama a sabedoria?" Cf. Mt. 11.19 - "a sabedoria é justificada pelas suas obras"; Lc. 7.35 - "a sabedoria é justificada por todos os seus filhos"; 11.49 - "Por isso, diz também a sabedoria de Deus: Profetas e apóstolos lhes mandarei"; Pv. 8.22,30,31 - "O Senhor me possuiu no princípio de seus caminhos e antes de suas obras mais antigas. ... eu estava com ele e era seu arquiteto; eu era as suas delícias. ... e achando as minhas delícias com os filhos do homens"; cf. 3.19 - "o senhor, com sabedoria, fundou a terra", e Hb. 1.1,2 - "seu Filho ... por quem fez também o mundo".
SI. 107.20 - "Enviou a sua palavra, e os sarou"; 119.89 - "Para sempre, ó Senhor, a tua palavra permanece no céu"; 147.15-18 - "Quem envia o seu mandamento ... manda a sua palavra".
No livro apócrifo intitulado Sabedoria, 7.26,28, a sabedoria é descrita como "reflexo de luz eterna", "espelho nítido da majestade de Deus", e "imagem da sua bondade" - lembrando-nos Hb. 1.3 - "o resplendor da sua glória e a expressão exata do seu ser". E Sabedoria (Sb) 9.9,10, representa-se a sabedoria presente com Deus quando ele fez o mundo e o autor do livro roga para que a sabedoria lhe seja enviada dos santos céus de Deus e do trono da sua glória. Em 1 Ed. 4.35-38 fala-se da verdade, semelhantemente, como um ser pessoal: "Grande é a verdade e mais forte do que todas as coisas. Toda a terra invoca a Verdade, e o céu a abençoa; todas as obras se abalam e tremem diante dela, e com ela não há coisa injusta. Quanto à verdade, ela suporta e é sempre forte; ela vive e conquista eternamente".
Convém reconhecer que em nenhuma destas descrições encontra-se a idéia de pessoalidade claramente desenvolvida. Ainda menos verdade é que o apóstolo João derivou sua doutrina do Logos das interpretações de tais descrições no judeu Filo. A doutrina de João (João 1.1-18) é radicalmente diferente da idéia alexandrina de Filo sobre o Logos. Esta é uma especulação platonizante sobre o princípio mediador entre Deus e o mundo. Filo parece às vezes tender para o reconhecimento da pessoalidade no Logos, apesar de seus escrúpulos monoteístas levarem-no outras vezes a tomar de volta o que ele deu e descrever o Logos ou como o pensamento de Deus ou como sua expressão no mundo. Mas João é o primeiro a apresentar-nos um consistente ponto-de-vista da sua pessoalidade para identificar o Logos com o Messias e distinguir o Verbo do Espírito de Deus.
Dorner, em History of the Doctrine ofthe Person Christ, 1.13-45, e em seu System of Doctrine, 1.348,349, dá o melhor relato da doutrina de Filo sobre o Logos. Ele diz que Filo chama o Logos ápxáyyeXoç, àpxiepeúç, Semepoç Ôeóç
É de duvidar que isto signifique mais que personificação, pois Filo chama o Logos de kóciíoç votitóç (cosmos inteligente). Sem dúvida, como ele faz o Logos uma pessoalidade distinta, ele o faz também um ser subordinado. Ele é acusado de fazer a doutrina da Trindade originar-se da filosofia platônica unindo alexandrina à teologia judaica. Mas o platonismo não tinha Trindade. A verdade é que, através desta doutrina, o cristianismo se firmou contra as falsas idéias pagãs da multiplicidade e imanência de Deus, bem como contra as falsas idéias judaicas da unidade e transcendência de Deus. Nada deve a fontes estranhas.
Não precisamos atribuir ao evangelho de João uma origem mais tardia, a fim de dar conta da sua doutrina do Logos, nem precisamos atribuir uma origem mais tardia aos sinóticos para dar conta da doutrina de um Messias sofredor. Ambas doutrinas eram igualmente desconhecidas de Filo. O Logos de Filo não se torna e nem pode tornar-se homem. Assim diz Dorner. Westcott, em Bible Comentary on John, Introd., xv-xviii, e sobre Jo. 1.1 - "O emprego teológico do termo [no evangelho de João] parece derivar diretamente dos Memra palestinos e não do Logos alexandrino". Ao invés de a doutrina de Filo ser uma pedra de avanço do judaísmo para o cristianismo, foi uma pedra de tropeço. A mesma coisa aconteceu com a doutrina do Messias e a da expiação. Benett e Adeny, Bib. Introd., 340 - "A diferença entre Filo e João pode ser estabelecida da seguinte maneira: O Logos de Filo é a Razão, enquanto o de João é o Verbo; o de Filo é impessoal, enquanto o de João é pessoal; o de Filo não é o Messias, enquanto o de João é o Messias".
(321) Filo viveu de 10 ou 20 AC a, certamente 40 A.D., quando ele foi ao chefe da embaixada judaica em Roma, a fim de convencer o Imperador de abster-se de reivindicar aos judeus a honra divina. Em sua De Opifice Mundi ele diz: "A palavra nada é senão o mundo inteligível". Gore, Incarnation, 69 - "Para Filo, o Logos deve ser traduzido por 'Razão'. Mas nos Targuns, ou antigas paráfrases judaicas do A.T., fala-se constantemente no 'Verbo' de Yahweh (Memra, Devra), como o instrumento eficiente da ação divina, nos casos onde o A.T. fala do próprio Yahweh. 'O Verbo de Deus' viera a ser empregado pessoalmente, quase como um equivalente à manifestação do próprio Deus, ou Deus em ação". George H. Gilbert, em Biblical World, jan 1899.44 - "A filosofia grega é que sugeriu o emprego do termo Logos por João, apesar de que nessa mesma época o conteúdo da palavra era judaico".
Hatch, Hibbert Lectures, 174-208 - "Os estóicos investiram o Logos de pessoalidade. Eles eram monistas e fizeram do Xóyoq e do üXti as formas ativa e passiva do princípio uno. Alguns fizeram de Deus um modo da matéria - natura naturata; outros fizeram da matéria um modo de Deus - natura naturans = o mundo, uma evolução de Deus. As formas platônicas, como múltiplas expressões de um simples Xóyoç, foram expressas por um termo no singular, Logos, ao invés de os Logoi de Deus. A partir deste Logos saíram todas formas da mente ou da razão. Eis o que sustentava Filo: 'A mente é um produto da alma divina e feliz (de Deus), produto não separado dele, porque nada do elemento divino é cortado ou separado, mas apenas estendido'. O Logos de Filo não é apenas uma forma, mas uma força - a energia criadora de Deus - o mais antigo do 'Eu Sou', com todas as forças do mundo visíveis e invisíveis".
Wendt, Teaching of Jesus, 1.53 - "Filo leva a transcendência de Deus às suas conclusões lógicas. A doutrina judaica dos anjos se expandiu em sua doutrina do Logos. Os filósofos alexandrinos depois representaram o cristianismo como o judaísmo espiritualizado. Porém um sistema filosófico dominado pela idéia da transcendência divina nunca poderia ter fornecido um motivo para a obra missionária como o de Paulo. A crença de Filo na transcendência abateu suas esperanças redentora. Inversamente, porém, as esperanças redentoras do judaísmo ortodoxo salvaram-no de alguns erros da transcendência exclusiva". Ver a citação de Siegfried na História do Povo Judeu de Schürer, artigo sobre Filo: "A doutrina de Filo desenvolveu-se a partir da distinção de Deus e a distância do mundo. É dualista. Daí a necessidade de princípios mediadores, alguns menores do que Deus e outros maiores do que a criatura. A significação cósmica de Cristo estabelecia uma ponte sobre o abismo entre o cristianismo e o pensamento grego contemporâneo. O Cristianismo representa um Deus que se revela. Porém uma doutrina do Logos como a de Filo pode revelar menos do que na verdade esconde. Ao invés do Deus encarnado para a nossa salvação, podemos ter simplesmente um princípio mediador entre Deus e o mundo, como no arianismo".
A afirmação anterior é fornecida em substância pelo Prof. Williams Adam Brown. Concordamos com ela, acrescentando a nota de que a filosofia alexandrina deu ao cristianismo, não a substância da sua doutrina, mas apenas a terminologia da sua expressão. O apóstolo João se apegou à verdade atrás da qual Filo tateava e publicou-a só na medida em que ele pôde, ele que ouviu, viu, e manejou "a Palavra da Vida" (1 Jo. 1.1). A doutrina cristã sobre o Logos, antes de qualquer outra coisa, talvez fosse um esforço para expressar como Jesus Cristo era Deus (0eóç), e, contudo, noutro sentido não era Deus (ó 0eóç); vale dizer, não era a divindade total" (citado em Marcus Dods, Expositor's Bible, sobre João 1.1).
Descrições do Messias.
a) Ele é um com Yahweh; b) contudo, em certo sentido, ele é distinto de Yahweh.
a) Is. 9.6 - "um menino nos nasceu, um filho se nos deu ... e o seu nome será Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai da Eternidade, Príncipe da Paz"; Mq. 5.2 - "tu, Belém ... que és pequena ... de ti sairá o que será Senhor em Israel, e cujas origens são desde os tempos antigos, desde os dias da eternidade", b) SI. 45.6,7 - "O teu trono, ó Deus é eterno e perpétuo ... por isso, Deus, teu Deus te ungiu"; Ml. 3.1 - "eu envio o meu anjo, que preparará o caminho diante de mim e, de repente, virá ao seu templo o Senhor, a quem vós buscais, o anjo do concerto, a quem vós desejais". Henderson, em seu Comentário sobre esta passagem, assinala que o Messias aqui é chamado "o Senhor" ou "o Soberano" - título em lugar nenhum dado nesta forma (com artigo) a qualquer um a não ser a Yahweh; que se prediz a seu respeito como vindo ao templo como seu proprietário; e que é identificado como um anjo do concerto, em outra parte mostrado como o próprio Yahweh.
Convém lembrar, considerando isto, assim como outras classes de passagens anteriormente citadas que nenhum escritor judeu antes da vinda de Cristo tinha sido bem sucedido na construção de uma doutrina da Trindade. Só os que lhes trouxeram a luz da revelação do Novo Testamento na verdade mostraram seu real sentido.
Nossa conclusão geral sobre as indicações veterotestamentárias devem, portanto, ser de que, conquanto elas mesmas não fornecem base suficiente para a doutrina da Trindade, contém o seu germe e podem ser empregadas na sua confirmação quando sua verdade é substancialmente provada a partir do Novo Testamento.
A partir do fato de que os judeus unem-se aos maometanos acusando os trinitários de politeísmo, fica evidente que a doutrina da Trindade não é claramente ensinada nas Escrituras Hebraicas. Não nos surpreende que não se desenvolve e é obscuro o ensino do Velho Testamento sobre esta matéria.
A primeira necessidade é que se deve insistir na unidade de Deus. Até que passe o perigo da idolatria, uma clara revelação da Trindade tem sido um embaraço ao progresso religioso. Na tenra idade, a raça de então, deve aprender a unidade de Deus antes de ensinar-se de forma proveitosa a doutrina da Trindade; caso contrário, cairá no triteísmo. Por isso não devemos começar a nossa prova da Trindade com uma referência às passagens do Velho Testamento. Devemos falar destas passagens, na verdade, como fornecendo indicações da doutrina, ao invés de prová-la. Contudo, depois de ter encontrado prova da doutrina no Novo Testamento temos que achar traços dela no Velho que corroboram nossas conclusões. De fato, veremos que os traços da idéia de uma Trindade acham-se não só nas Escrituras hebraicas, mas também em algumas das religiões pagãs. E. G. Robinson: "A doutrina da Trindade subjacente no A.T., sem que os seus escritores o percebam, foi a princípio reconhecida na revelação econômica do cristianismo e enunciada claramente na evolução da doutrina cristã".
ESTES TRÊS SÃO DESCRITOS NA ESCRITURA DE TAL MODO QUE SOMOS COMPELIDOS A CONCEBÊ-LOS COMO PESSOAS DISTINTAS
O Pai e o Filho são pessoas distintas uma da outra
a) Cristo distingue o Pai de si mesmo como 'outro'; b) o Pai e o Filho distinguem-se como o gerador e o gerado; c) o Pai e o Filho distinguem-se como o que envia e o que é enviado.
a) Jo. 5.32.37 - "Há outro que testifica de mim ... o Pai, que me enviou, ele mesmo testificou de mim", b) SI. 2.7 - "Tu és meu Filho; eu hoje te gerei";
Jo. 1.14 - "o unigênito do Pai"; 18 - "o Filho unigênito, que está no seio do Pai"; 3.16 - "seu Filho unigênito". c) Jo. 10.36 - "àquele a quem o Pai santifi- cou e enviou ao mundo, vós dizeis: Blasfemas, porque disse: sou Filho de Deus?" Gl. 4.4 - "vindo a plenitude dos tempos, Deus enviou seu Filho".
O Pai e o Filho são pessoas distintas do Espírito
a) Jesus distingue o Espírito dele mesmo e do Pai; b) o Espírito procede do Pai; c) o Espírito é enviado pelo Pai e pelo Filho.
a) Jo. 14.16,17-"Eu rogarei ao Pai, e ele vos dará outro Consolador, para que fique convosco para sempre, o Espírito da verdade" = aquele cuja obra é revelar e aplicar a verdade, e especialmente tornar manifesto aquele que é a verdade". Jesus tinha sido o Consolador deles. Se ele mesmo era uma pessoa, então o Espírito é uma pessoa, b) Jo. 15.26 - "aquele Espírito de verdade que procede do Pai", c) Jo. 14.26 - "aquele Consolador, o Espírito Santo, que o Pai enviará em meu nome"; 15.26 - 'quando vier o Consolador, que eu da parte do Pai vos hei de enviar"; Gl. 4.6 - Deus enviou aos nossos corações o Espírito de seu Filho". A igreja grega sustenta que só o Espírito procede do Pai; a igreja latina, que o Espírito procede tanto do Pai como do Filho.
A verdadeira fórmula é: O Espírito procede do Pai através ou pelo (não 'e') Filho. Moberly, Atonement and Personality, 195 - "A expressão Filioque é uma defesa valiosa da verdade que o Espírito Santo não é somente a abstrata segunda Pessoa da Trindade, mas, ao invés disso, o Espírito do Cristo encarnado, reproduzindo no coração humano e revelando nele o sentido da verdadeira natureza humana".
O Espírito Santo é uma pessoa
Recebe designação própria de pessoalidade.
a) O pronome masculino èkeívoç, apesar de que 7tvei)"ia é neutro; b) o nome jiapáK^r"Toç que não pode ser traduzido como 'consolo', ou ser tomado como substantivo de qualquer influência abstrata. O Consolador, Instrutor, Protetor. Guia, Advogado deve ser uma pessoa. Isto se evidencia na aplicação de 1 João
a Cristo - "temos um Advogado rcapcuc^riTOv - com o Pai, Jesus Cristo, o justo".
Jo. 16.14 - "Ele (èiceivoç) me glorificará"; em Ef. 1.14 também, alguma das melhores autoridades, incluindo Tischendorf (8a ed.), reza õç, pronome masculino: "o qual é o penhor da nossa herança". Mas em 14.16-18, jtapáKA.TiTOç é seguido dos neutros õ e amo, porque interveio a palavra 7iveá}(ia. Considerações não teológicas, mas gramaticais controlaram o escritor. Ver G. D. Ste- vens, Johannine Theology 189-217, especialmente sobre a distinção entre Cristo e o Espírito Santo. O Espírito Santo não é Cristo; é uma outra pessoa a despeito de Cristo dizer sobre a vinda do Espírito Santo: "virei para vós".
Jo. 16.7 - "se eu não for, o Consolador não virá a vós". A palavra jtcipáKXryroç como aparece em 1 Jo. 2.1, citada acima, é um termo de mais amplo significado que um simples "Consolador". Na verdade, o Espírito Santo é, como já se disse, "o princípio mater da divindade", e "como alguém que a sua mãe consola" assim Deus, através do seu Espírito, consola os seus filhos (Is. 66.13). Mas o Espírito Santo também é um Advogado das reivindicações de Deus na alma, e dos interesses da alma na oração (Rm. 8.26 - "intercede por nós").
Ele consola não só por ser nosso advogado, mas por ser nosso instrutor, protetor, e guia; e todas estas idéias acham-se ligadas à palavra mxpáKXiyuoç no bom emprego da língua grega. Na verdade, a palavra é um adjetivo verbal, significando 'chamado para auxiliar alguém', daí um 'ajudador'; a idéia de encorajamento está incluída assim como a de consolo e defesa.
T. Dwight, em Sunday School Times, sobre Jo. 14.16-0 sentido fundamental da palavra 7tapáK>tr"TOÇ, que é um adjetivo verbal, 'chamado para o auxílio a alguém', e deste modo, quando empregado como substantivo, tem a idéia de 'auxiliador'. Este sentido mais genérico liga-se ao emprego no evangelho de João, enquanto na Epístola (1 Jo. 2.1,2) tem a idéia de Jesus agindo como advogado em nosso lugar diante de Deus como juiz". Deste modo em latim a palavra advocatus significa 'chamado para' - i.e., chamado para ajudar, aconselhar, pleitear. Nesta conexão Jesus diz: "Não vos deixarei órfãos"
(Jo. 14.18). Cumming, Through the Eternal Spirit, 228 - "Como a família órfã, no dia da morte do pai, necessita de um amigo que alivie o seu sentimento de perda através da sua presença, do mesmo modo o Espírito Santo é 'invocado' para conceder o amor e auxílio que os doze estavam perdendo na morte de Jesus". A. A. Hodge, Pop. Lectures, 237 - "O 'cliente' romano, o pobre e dependente apelava para que o seu 'patrono' o ajudasse nas suas necessidades. O patrono pensava, aconselhava, dirigia, apoiava, defendia, supria as necessidades, restabelecia, consolava o seu cliente em todas dificuldades.
O cliente, embora fraco, com um patrono poderoso, era social e politicamente seguro sempre".
Seu nome é mencionado em conexão imediata com as outras pessoas e de tal modo que implicam sua pessoalidade.
à) Em conexão com os cristãos; b) em conexão com Cristo; c) em conexão com o Pai e o Filho. Se o Pai e o Filho são pessoas o Espírito deve também ser pessoa.
At. 15.28 - "pareceu bem ao Espírito Santo e a nós", b) Jo. 16.14- "Ele me glorificará, porque há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar"; cf. 17.4 - "Eu glorifiquei-te na terra", c) Mt. 28.19 - "batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo" 2 Co. 13.13 - "A graça do Senhor Jesus Cristo, e o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo sejam com vós todos"; Jd. 20,21 - "orando no Espírito Santo, guardai-vos no amor de Deus, esperando a misericórdia do nosso Senhor Jesus Cristo". 1 Pe. 1.2 - "eleitos, segundo a presciência de Deus Pai, na santificação do Espírito para a obediência e aspersão do sangue de Jesus Cristo". Contudo, é notável que nestas passagens não há nenhuma obstrução da pessoalidade do Espírito Santo
como se ele desejasse atrair a atenção para si mesmo. O Espírito Santo mostra não a si mesmo, mas Cristo. Como João Batista, ele é somente uma voz e, assim, um exemplo para os pregadores cristãos que "fez capazes de ser ministros ... do Espírito" (2 Co. 3.6). Por isso freqüentemente não se percebe a sua liderança; ele apenas se junta a nós para que infiramos a sua presença a partir de novos e santos exercícios da nossa própria mente; ele continua a operar em nós mesmo quando se ignora a sua presença e os nossos pecados ultrajam a sua pureza.
Ele opera os atos próprios da pessoalidade.
Aquele que sonda, conhece, fala, testifica, revela, convence, manda, luta, move, auxilia, guia, cria, recria, santifica, inspira, intercede, ordena os negócios da igreja, opera milagres, ressuscita os mortos - não pode ser uma simples força, influência, efluxo, ou atributo de Deus, mas deve ser uma pessoa.
Gn. 1.2 - "o Espírito de Deus pairava sobre a face das águas"; 6.3 - "Não contenderá o meu Espírito para sempre com o homem"; Lc. 12.12 - "na mesma hora o Espírito Santo vos ensinará o que convém falar"; Jo. 3.8 - "nascido do Espírito" - Bengel aqui traduz: "O Espírito sopra onde quer e ouves a sua voz" - ver também Gordon, Ministry of the Spirit, 166; "convencerá o mundo do pecado, e da justiça, e do juízo"; At. 2.4 - "o Espírito lhes concedia que falassem"; 8.29 - "o Espírito disse a Filipe: Chega-te"; 10.19,20 - "disse-lhe [a Pedro]: Eis que três varões te buscam ... vai com eles ... porque eu os enviei"; 13.2 - "disse o Espírito Santo: "Apartai-me a Barnabé e a Saulo"; 16.6,7 - "foram impedidos pelo Espírito Santo ... o Espírito de Jesus não lho permitiu"; Rm. 8.11 - 'vivificará também o vosso corpo mortal", por meio do seu Espírito"; 26 - "o Espírito ajuda as nossas fraquezas ... intercede por nós"; 15.19 — pelo poder dos sinais e prodígios, na virtude do Espírito de Deus"; 1 Co. 2.10,11
"o Espírito penetra todas as coisas ... ninguém sabe as coisas de Deus senão o Espírito de Deus"; 12.8-11 - distribui os dons espirituais "a cada um como quer" - aqui Meyer chama a atenção para as palavras "como quer", como prova da pessoalidade do Espírito; 2 Pe. 1.21 - "homens santos de Deus falaram inspirados pelo Espírito Santo"; 1 Pe. 1.2 - "santificação do Espírito". Como uma pessoa pode receber em várias medidas? Respondemos: sendo permitido operar em nosso benefício com vários graus de poder. "Poder não pertence ao impessoal".
Ele é afetado pelos atos dos outros como uma pessoa.
Aquele a quem se pode resistir, contristar, irritar, blasfemar deve ser uma pessoa; pois só uma pessoa pode perceber um insulto e ofender-se. A blasfêmia contra o Espírito Santo não pode ser simplesmente blasfêmia contra uma força ou atributo de Deus porque em cada caso a blasfêmia contra Deus seria um crime menor do que a blasfêmia contra o seu poder. Aquilo contra o que se pode cometer pecado imperdoável deve ser uma pessoa.
Is. 63.10 - "eles foram rebeldes e contristaram o seu Espírito Santo";
Mt. 12.31 - "todo pecado e blasfêmia se perdoará aos homens, mas a blasfêmia contra o espírito não será perdoada"; At. 5.3,4,9 - "mentisses ao Espírito Santo ... não mentiste aos homens, mas a Deus ... Por que é que entre vós concertastes para tentar o Espírito do Senhor?" 7.51 - "vós sempre resistis ao Espírito Santo"; Ef. 4.30 - "Não entristeçais o Espírito Santo de Deus". Satanás não pode ser 'contristado'. O egoísmo não pode ser irritado, mas o amor pode ser contristado. Blasfemar contra o Espírito Santo é como blasfemar contra a própria mãe. As passagens já citadas mostram que o Espírito possui uma natureza emocional. Por isso lemos sobre "o amor do Espírito" (Rm. 15.30). Os gemidos inexprimíveis do cristão na oração intercessora (Rm. 8.26,27) revelam a mente do Espírito e mostram as profundezas infinitas do sentimento que são despertadas no coração de Deus pelos pecados e necessidades dos homens. Os profundos desejos e emoções que só em parte nos são comunicados e que só Deus pode entender são uma prova conclusiva de que o Espírito Santo é uma pessoa. Eles são apenas o transborda- mento da fonte do amor divino em nós ao qual o Espírito Santo nos une.
Como Cristo no jardim "começou a entristecer-se e angustiar-se muito" (Mt. 26.37), se entristece e se perturba com a ignorância, o desprezo, a resistência à sua obra, da parte daqueles que ele está tentando resgatar do pecado e conduzir para a liberdade e gozo da vida cristã. Luthardt em Sunday School Times, 26 de maio de 1888 - "Todo pecado pode ser perdoado - mesmo contra o Filho do homem - exceto o pecado contra o Espírito Santo.
O pecado contra o Filho do homem pode ser perdoado porque ele pode ser falsamente concebido. Porque ele não se parece com aquilo que realmente é. Essência e aparência, verdade e realidade, contradizem-se uma à outra". Por isso Jesus podia orar: "Pai, perdoa-lhes porque eles não sabem o que fazem" (Lc. 23.34). Contudo, o ofício do Espírito Santo é mostrar aos homens a natureza da conduta deles e, pecar contra o Espírito Santo é pecar contra a luz e sem desculpa". Ver A. H. Strong, Christ in Creation, 297-313. Salmond, em Expositor's Greek Testament, sobre Ef. 4.30 - "O que o amor é em nós aponta, na verdade, embora numa forma oscilante, para o que é o amor em Deus. Em nós, porém, o amor, na medida em que é verdadeiro e soberano tem tanto o seu lado iroso como o entristecedor; e assim deve ser com Deus, embora seja difícil para nós pensar que isto esteja excluído".
Ele se manifesta em forma visível distinto do Pai e do Filho embora em conexão direta com atos pessoais operados por eles.
Mt. 3.16,17 - "Sendo Jesus batizado, saiu logo da água, e eis que se lhe abriram os céus, e viu o Espírito de Deus descendo como pomba e vindo sobre ele. E eis que uma voz do céu dizia: Este é o meu Filho amado em quem me comprazo"; Lc. 3.21,22 - "sendo batizado também Jesus, orando ele, o céu se abriu e o Espírito Santo desceu sobre ele em forma corpórea como uma pomba; e ouviu-se uma voz do céu, que dizia: Tu és meu Filho amado; em ti me tenho comprazido". Aqui está a oração de Jesus, a voz de aprovação do Pai, e o Espírito Santo descendo em forma visível para ungir o Filho de Deus para a sua obra. "I ad Jordanem, et videbis Trinitatem".
Tal atribuição de uma subsistência pessoal ao Espírito distinta da do Pai e do Filho não se pode explicar como personificação; pois:
a) Seria interpretar uma prosa sóbria utilizando os cânones da poesia. Tal personificação contraria o gênio da poesia hebraica na qual a própria Sabedoria é mais naturalmente interpretada designando existência pessoal, b) Tal interpretação tomaria uma multidão de passagens tautológicas, sem sentido, ou absurdas, - como se pode ver facilmente substituindo pelo nome Espírito Santo os termos erradamente sustentados como equivalentes; tais como força, ou influência, ou efluxo, ou atributo de Deus. c) É contraditada pelas passagens nas quais o Espírito Santo se distingue dos seus próprios dons.
A Bíblia não é primordialmente um livro de poesia apesar de ter em si poesia. É mais apropriadamente um livro de história e de lei. Ainda que os métodos de alegoria fossem empregados pelos salmistas e pelos profetas, não devemos esperar que eles caraterizem grandemente os evangelho e as epístolas; 1 Co. 3.4 - "O amor é sofredor, é benigno" - é um exemplo raro em que o estilo de Paulo assume a forma de poesia. Contudo, os evangelhos e epístolas é que mais constantemente representam o Espírito Santo como uma pessoa.
At. 10.38 - "Deus ungiu a Jesus de Nazaré com o Espírito Santo e com poder" = ungiu-o com poder e com poder? Rm. 15.13 - "para que abundeis em esperança pelo poder do Espírito Santo" = no poder do poder de Deus?
19 - "pelo poder de sinais e prodígios, no poder do Espírito de Deus" = no poder do poder de Deus? 1 Co. 2.4 - "demonstração do Espírito e do poder"
= demonstração do poder e do poder?
Lc. 1.35 - "Descerá sobre ti o Espírito Santo e o poder do Altíssimo te cobrirá com a sua sombra"; 4.14- "pelo poder do Espírito voltou Jesus para a Galiléia"; 1 Co. 12.4,8,11 - depois de mencionar os dons do Espírito, tais como, sabedoria, conhecimento, fé, curas, milagres, discernimento de espíritos, línguas e interpretação de línguas, tudo isso é atribuído ao Espírito que os concede: "mas um só e o mesmo Espírito opera todas essas coisas, repartindo particularmente a cada um como quer". Não só dando, mas dando discretamente, no exercício de uma vontade independente que só pertence a uma pessoa. Rm. 8.26 - "o mesmo Espírito intercede por nós" - interprete-se, se o Espírito não é uma pessoa distinta do Pai, significando que o Espírito Santo intercede consigo mesmo.
"A pessoalidade do Espírito Santo foi virtualmente rejeitada pelos arianos, assim como também por Schleiermacher e positivamente negada pelos soci- nianos" (E. G. Robinson). Gould, Bib. Theol. N.T., 83,96-"Os Doze representam o Espírito enviado pelo Filho, que foi exaltado para que pudesse enviar este novo poder dos céus. Paulo representa o Espírito trazendo-nos o Cristo.
No Espírito Cristo habita em nós. O Espírito é o Jesus histórico traduzido em termos de Espírito universal. Através do Espírito estamos em Cristo e Cristo em nós. Para Paulo o ser divino que habita é alternadamente Cristo e o Espírito. O Espírito é o princípio encarnado em Jesus explicando a sua preexistência (2 Co. 3.17,18). Jesus é uma encarnação do Espírito de Deus".
Esta aparente identificação do Espírito com Cristo deve ser explicada com base no fato de que a essência divina é comum a ambos e permite que o Pai habite e opere através do Filho e o Filho habite e opere através do Espírito. Não nos deve cegar a igualdade escriturística patente de que há um relacionamento pessoal entre Cristo e o Espírito Santo e a obra realizada por este em que Cristo é o objeto e não o sujeito; Jo. 16.14-"Ele me glorificará porque ele há de receber do que é meu e vo-lo-á de anunciar". O Espírito Santo não é alguma coisa, mas é alguém; não ara, mas Awóç; o alter ego de Cristo, ou o outro eu. Por isso devemos tornar vivida a nossa crença nas orações que fazemos e nos hinos que entoamos como "Jesus lover of my soul" e "Come, Holy Spirit, heavenly Dovel".
ESTA TRIPESSOALIDADE DA NATUREZA DIVINA NÃO É SIMPLESMENTE ECONÔMICA E TEMPORAL, MAS IMANENTE E ETERNA.
Prova da Escritura de que estas distinções de pessoalidade são eternas
Provamos isto a) a partir das passagens que falam da existência do Verbo desde a eternidade com o Pai; b) a partir das passagens que declaram ou implicam a preexistência de Cristo; c) a partir das passagens que implicam intercâmbio entre o Pai e o Filho antes da fundação do mundo; d) a partir das passagens que declaram a criação do mundo por Cristo; e) a partir das passagens que declaram ou implicam a eternidade do Espírito Santo.
Jo. 1.1,2 - "No princípio, era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus. Ele estava no princípio com Deus"; cf. Gn. 1.1 - "No princípio criou Deus os céus e a terra"; Fp. 2.6 - "sendo em forma de Deus ... ser igual a Deus", b) Jo. 8.58 - "Antes que Abraão existisse, eu sou"; 1.18 - "O Filho unigênito, que está no seio do Pai"; Cl. 1.15-17 - "primogênito de toda a criação" ou "antes de toda a criatura ... ele é antes de todas as coisas". Nestas passagens "sou" e "é" indicam um fato eterno; o presente expressa ser permanente. Ap. 22.13,14 - "Eu sou o Alfa e Ômega, o Princípio e o Fim, o Primeiro e o Derradeiro", c) Jo. 17.5 - "glorifica-me tu, ó Pai, junto de ti mesmo, com aquela glória que tinha contigo antes que o mundo existisse"; 24 - "tu me hás amado antes da fundação do mundo", d) Jo. 1.3 - "Todas as coisas foram feitas por ele"; 1 Co. 8.6 - "um só Senhor, Jesus Cristo, pelo qual são todas as coisas"; Cl. 1.16 - "nele foram criadas todas as coisas ... tudo foi criado por ele e para ele". Hb. 1.2 - "por quem fez também o mundo"; 10 - "Tu, Senhor, no princípio fundaste a terra, e os céus são obra de tuas mãos",
Gn. 1.2 - "o Espírito de Deus pairava" - existia antes da criação; SI. 33.6 - "Pela palavra do Senhor foram feitos os céus; e todo o exército deles, pelo espírito (sopro) da sua boca"; Hb. 9.14 - "pelo Espírito eterno".
Com estas passagens diante de nós, devemos discordar da afirmação do Dr. E. G. Robinson: "A respeito da Trindade ontológica não conhecemos absolutamente nada. A Trindade que podemos contemplar é somente revelada, de manifestações econômicas. Podemos supor que o ontológico é subjacente ao econômico". A nosso juízo, a Escritura nos compele a avançar para além disso e a sustentar que há relações pessoais entre Pai, Filho e Espírito Santo, independentemente da criação e do tempo. Há três consciências eternas e três vontades externas na natureza divina. Aqui estabelecemos apenas o fato; a sua explicação e sua reconciliação com a unidade fundamental de Deus será tratada na próxima seção. A seguir, mostraremos que os dois sistemas variantes que ignoram esta tripessoalidade são antibíblicos e estão, ao mesmo tempo, expostos à objeção filosófica.
Erros refutados pelas passagens anteriores
O Sabeliano
Sabélio (da Ptolemaida em Pentápolis, 250) sustentava que Pai, Filho e Espírito Santo são simples desenvolvimentos ou revelações às criaturas, no tempo, de outra forma ocultadas por Deus - desenvolvimentos que, porque as criaturas sempre existirão, não são transitórios, mas que ao mesmo tempo não são eternos a parte ante. Deus unido à criação é Pai; Deus unido a Jesus Cristo é Filho; Deus unido à igreja é Espírito Santo. A Trindade de Sabélio é, portanto, econômica e não imanente - de forma de manifestações, mas não necessária e eterna na natureza divina.
Alguns têm interpretado que Sabélio nega que a Trindade é eterna a pane post, assim como a parte ante e sustenta que, quando o propósito destas manifestações temporárias se cumpre, a Tríade é resolvida em mônada. Este ponto de vista surge em outro que faz as pessoas da Trindade simples nomes para fases mutantes da atividade divina.
A melhor afirmação da doutrina sabeliana, segundo a interpretação a princípio mencionada, é a de Schleiermacher, traduzida com comentários de Moses Stuart, em Biblical Repository, 6.1-16. O Deus imutável reflete-se de um modo diferente a partir do mundo por causa das diferentes formas de recebê-lo. Práxeas de Roma (200), Noeto de Esmirna (230) e Berilo da Arábia (250) defendiam substancialmente os mesmos pontos de vista. Eles eram chamados monarquistas (novfi àp%r\), porque não criam na tríada mas na mônada. Eles eram chamados patripassianos, porque defendiam que, como Cristo é o único Deus em forma humana, este Deus sofre e, por isso, o Pai sofre. Knight, Coloquia Peripatetica, xlii, sugere uma conexão entre sabelia- nismo e emanacionismo.
Horace Bushnell, em seu Godin Christ, 113-115,130 sq., 172-175, e Christ in Theology, 119,120 defendia um ponto de vista semelhante ao de Sabélio - "Pai, Filho e Espírito Santo, incidentais à revelação de Deus, podem e provavelmente são de eternidade a eternidade, tanto quanto Deus pode revelar-se eternamente e, com certeza, se revelará até onde a nossa mente pode conhecê-lo. De fato, a natureza de Deus pode revelar-se, tão verdadeiramente como o sol brilha ou como a mente viva pensa". Ele não nega a Trindade imanente, mas simplesmente diz que nada conhecemos a esse respeito. Ainda ele chama a Trindade de Pessoas na própria essência divina um claro tri- teísmo. Prefere tratar a sua doutrina como "trindade instrumental" a tratá-la como "trindade modal". A diferença entre Bushnell, por um lado, e Sabélio e Schleiermacher, por outro, parece ser a seguinte: Sabélio e Schleiermacher sustentam que Deus se torna três no processo da revelação e os três se tornam meios ou modos da revelação. Pai, Filho e Espírito Santo são apenas nomes aplicados a estes modos da ação divina e não há distinções internas na sua natureza. Isto é modalismo, ou uma Trindade modal. Bushnell fica só com a Trindade da revelação e protesta contra quaisquer raciocínios construtivos a respeito da Trindade imanente. Contudo, mais tarde em seus escritos ele reverte para Atanásio e fala de um Deus eternamente "fazendo-se três".
Lyman Abbott, The Outlook, propõe como ilustração da Trindade, 1. o artista trabalhando nas suas telas; 2. o mesmo homem ensinado os alunos como sofrer; 3. o mesmo homem recebendo os seus amigos em casa. Ele não levou em conta estes tipos de conduta. Não há máscaras (personae), nem ofícios, que ele assume e abandona. Nele há uma tríplice natureza nele: é artista, mestre, amigo. Deus não é simples; é complexo. Eu não o conheço, a não ser depois de conhecer todos estes relacionamentos. Contudo, é evidente que o ponto de vista do Dr. Abbott não fornece base nenhuma para o amor ou para a sociedade dentro da natureza divina. As três pessoas são apenas três aspectos ou atividades sucessivas do único Deus. O General Grant, quando estava na ativa, era apenas uma pessoa, apesar de que ele era pai, Presidente, e comandante em chefe do Exército e da Marinha dos Estados Unidos.
É evidente que esta teoria em qualquer forma que possa ser sustentada está longe de satisfazer as exigências da Escritura. A Escritura fala da segunda pessoa da Trindade como existindo e agindo antes do nascimento de Jesus Cristo e do Espírito Santo como existindo e agindo antes da formação da igreja. Ambos têm uma existência pessoal, eterna no passado assim como no futuro-o que esta teoria expressamente nega.
Uma revelação que não é a auto-revelação de Deus não é honesta. Stuart: Visto que Deus se revela como três, ele deve ser de modo essencial e imanente três a partir da revelação; caso contrário, a revelação não seria verdadeira. Dorner: A Trindade da revelação será uma falsa interpretação se não tiver como retaguarda a Trindade da natureza. A duplicidade chega propriamente à triplicidade ao considerar, não tanto o que envolve a revelação de Deus a nós, como o que a mesma revelação é para ele. A falta de correspondência da doutrina sabeliana para com as Escrituras é clara, se nos lembrarmos de que neste ponto de vista os Três não podem existir ao mesmo tempo;
quando o Pai diz "Tu és o meu Filho amado" (Lc. 3.22), ele simplesmente está falando a si mesmo; quando Cristo envia o Espírito, ele está enviando a si mesmo. Jo. 1.1 - "No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus" - "afasta a noção de que o Verbo se tornou pessoal em primeiro lugar antes da criação, ou na encarnação" (Westcott, Bib. Com., in loco).
Mason, Faith of the Gospel, 50,51 - "Sabélio reivindicava que a unidade tornou uma Trindade através da expansão. A Paternidade começa com o mundo. Deus não é eternamente Pai. Só temos um Deus impessoal, ininteligível que agiu sobre nós e confundiu o nosso entendimento apresentando-se a nós sob três disfarces. Antes da criação não há nenhuma Paternidade, nem mesmo em germe".
Segundo Pfleiderer, Philos. Reügion, 2.269, Orígenes sustentava que a divindade podia ser representada por três círculos concêntricos: o maior, abrangendo o ser por inteiro, é o do Pai; a seguir, o do Filho, que se estende à criação racional; e o menor, o do Espírito que rege todos os homens santos da igreja. King, Reconstruction of Theology, 192,194 - "Afirmar as relações sociais na divindade é asseverar o Triteísmo absoluto. ... O unitarismo dá ênfase à humanidade de Cristo, a fim de preservar a unidade de Deus; o verdadeiro ponto de vista dá ênfase à divindade de Cristo, a fim de preservar a unidade".
L. L. Paine, Evolution of Trinitarianism, 141,287, diz que o Trinitarismo da Nova Inglaterra se carateriza por três coisas: 1. Patripassionismo sabeliano; Cristo é tudo o que há no Pai, e o Espírito Santo é a continuação da vida de Cristo; 2. Consubstancialidade, ou comunidade de essência, entre Deus e o homem; diferentemente do que há entre o ser criado e o não criado que o dualismo platônico sustentava, esta teoria torna a semelhança moral em semelhança essencial; 3. Monismo filosófico, para o qual a matéria é em si mesma a evolução do Espírito. ... Na forma seguinte da doutrina científica da evolução a divinização do homem torna-se uma verdade vital e dela surge a cristologia que, na verdade, remove o Jesus de Nazaré da ordem da divindade absoluta, mas ao mesmo tempo o exalta a um lugar de eminência moral que é seguro e supremo".
Contra o perigo de considerar Cristo como uma manifestação econômica e temporária de Deus, só podemos nos resguardar defendendo a doutrina da Escritura sobre a Trindade imanente. Moberly, Atonement and Personality, 86,165
Não podemos incorrer no perigo sabeliano ao sustentarmos - que aquilo que é revelado dentro da unidade divina não é apenas uma distinção de aspectos ou de nomes, mas uma reciprocidade real do relacionamento mútuo.
Um 'aspecto' não pode contemplar, o outro ou ser amado por ele. ... O sabe- lianismo degrada as pessoas da divindade em aspectos. O calor e a luz da chama não podem separadamente contemplar e estar no amor recíproco".
O Ariano
Ário (de Alexandria; condenado pelo Concilio de Nice, 325) sustentava que o Pai é o único ser divino absolutamente sem começo; o Filho e o Espírito
Santo, através de quem Deus cria e recria, foram criados do nada antes que o mundo fosse; e Cristo foi chamado Deus, porque ele é o seguinte em relação a Deus e dotado por Deus de poder de criar.
Os seguidores de Ário diferiam quanto ao nível preciso e reivindicações de Cristo. Enquanto Socínio sustentava com Ário que a adoração de Cristo era obrigatória, os unitários mais tarde perceberam a impropriedade da adoração mesmo nos mais elevados seres criados e constantemente tendiam para um ponto de vista do Redentor que o considera simplesmente um homem em relação peculiarmente íntima com Deus.
O assim chamado Credo Atanasiano, que o próprio Atanásio nunca escreveu, é com muito mais propriedade designado como Symbolum Quicumque. Também tem sido chamado, embora jocosamente, 'o Credo Anatemasiano'. Contudo, nenhum erro na doutrina pode ser mais perigoso ou digno de condenação do que o de Ário (1 Co. 16.22 - "Se alguém não ama o Senhor Jesus Cristo, seja anátema"; 1 Jo. 2.23 - "Qualquer que nega o Filho também não tem o Pai"; 4.3 - "todo o espírito que não confessa a Jesus não procede de Deus; e este é o espírito do anticristo"). Considera que Cristo é chamado Deus só por cortesia do mesmo modo que o vice-governador recebe o título de Governador. Antes da criação do Filho, o amor de Deus, se pudesse haver amor, seria despendido no próprio Deus. Gwatkin, Studies of Arianism:
"O Cristo ariano é apenas um ídolo pagão, inventado para manter um supremo paganismo num isolamento pagão do mundo. Quanto mais próximo a atenção da divindade do Filho puxa-o para baixo na direção do homem, mais remota se torna a não participada divindade do Pai. Você tem um Être Suprê- me (fr. Ser Supremo) do qual praticamente não há aproximação, o simples um em todos, destituído de pessoalidade".
Gore, Incarnation, 90,91,110, mostra a imensa importância da controvérsia sobre óiioo-oaiov e ónoioúaiov. Carlyle, certa vez, zombou de que "o mundo cristão estivesse cortado em pedaços por causa de um ditongo". Porém, mais tarde, ele passou a ver que o próprio cristianismo estava em perigo e que teria descido ao nível de uma lenda se os arianos tivessem vencido a batalha. Ário não apelou para a Escritura, mas principalmente para a lógica.
Ele defendia que o Filho deve ser mais novo que o seu Pai. Mas estava expondo o princípio do paganismo e da idolatria, que demanda a adoração a uma criatura. Os godos convertiam-se facilmente ao arianismo. Para eles, Cristo era um deus herói, um semideus e mais tarde os godos puderam adorar Cristo e os ídolos pagãos sem parcialidade.
É evidente que a teoria de Ário não satisfaz as exigências da Escritura. Como um Deus criado, cuja existência teve um começo e, portanto, pode ter um fim, feito de uma substância que em certa época não era e, portanto, diferente da do Pai, não é Deus, mas criatura finita. Mas a Escritura fala de Cristo sendo no começo com Deus.
Lutero, fazendo alusão a Jo. 1.1, diz: '"O Verbo era Deus' contraria Ário; 'o Verbo estava com Deus' contraria Sabélio". O Catecismo Racoviano, Qua- es. 183, 184, 211, 236, 237, 245, 246, ensina que Cristo deve ser verdadeiramente adorado e nega-se que sejam cristãos os que se recusam adorá-lo. Davidis foi perseguido e morto na prisão por recusar-se a adorar Cristo; Socínio foi acusado, embora talvez injustamente, de ter causado o aprisionamento dele. O Chanceler Bartolomeu, de Essex, ariano, foi morto queimado em Smithfield, a 13 de mar. de 1613. O Rei Jaime (King James) perguntou-lhe se ele não dirigia suas orações a Cristo. A resposta do chanceler foi que "na verdade ele orava a Cristo nos dias da sua ignorância, mas não nestes últimos sete anos"; o que chocou de tal modo Jaime que afastou-o com um chute". Na fogueira o chanceler ainda recusou-se a retratar-se e assim foi queimado até às cinzas em meio a um grande ajuntamento de pessoas. No mês seguinte, outro ariano chamado Whiteman foi queimado em Burton- on-Trent.
Era preciso ter coragem, mesmo uma geração mais tarde, para John Milton, em sua Christian Doctrine, declarar-se um elevado ariano. Nesse tratado ele ensina que "o Filho de Deus não existia desde a eternidade, não é contemporâneo ou coexistente ou co-igual com o Pai, mas veio à existência através da vontade de Deus para ser o seu seguinte e o primogênito e bem amado, o Logos ou Verbo através de quem toda a criação teria o seu início". Deste modo Milton considera o Espírito Santo como um ser criado, inferior ao Filho e possivelmente confinado aos céus e à terra. O arianismo de Milton, contudo, é caraterística dos seus escritos mais tardios do que mais antigos.
Quando perguntaram ao Dr. Samuel Clarke se o Pai que tinha criado não podia também destruir o Filho, respondeu que ainda não tinha pensado no assunto. Ralph Waldo Emerson rompeu com a sua igreja e deixou o ministério porque ele não podia celebrar a Ceia do Senhor; isto implicava numa reverência mais profunda para com Jesus do que ele poderia prestar. Escreveu: "Parece-me que, na igreja atual, o Ofício da Comunhão, como é agora celebrado aqui, documenta uma estupidez da raça. Como, meus caros vizinhos, os diáconos, com seus cálices e bandejas teriam se aprumado no seu vigor se a proposição veio a eles para honrar um colega". Contudo o Dr. Leonard Bacon dizia que os unitários "pareciam como se a sua contemplação exclusiva de Jesus Cristo em seu caráter humano como exemplo a imitarmos tivesse operado neles uma excepcional beleza e semelhança viva de Cristo".
Chadwick, Old and New Unitarian Belief, 20, fala do arianismo como exaltando a um grau de indiferença inapreciável de Deus, enquanto Socínio o venerava como um homem miraculosamente dotado e cria num livro infalível. O termo "unitário", reivindica ele, deriva de "uniti", uma sociedade na Transil- vânia, em apoio à tolerância mútua entre calvinistas, romanistas e socinia- nos. Tal nome se aplicava aos que defendiam a unidade divina porque eram os seus mais ativos membros. B. W. Lockhart: "A Trindade garante a cognos- cibilidade de Deus. Ário ensinava que Jesus nunca foi humano nem divino, mas criado num nível de ser entre os dois, essencialmente desconhecido do homem. Um Deus ausente fez de Jesus o seu mensageiro; o próprio Deus não tocou diretamente o mundo em qualquer ponto; desconhecido e desco- nhecível a este. Atanásio, ao contrário, afirmava que Deus não mandou um
mensageiro em Cristo, mas ele mesmo veio, de sorte que, conhecer Cristo é realmente conhecer Deus, que essencialmente se revela nele. Foi ele que deu à igreja a doutrina do Deus imanente, ou Emanuel, o Deus cognoscível e verdadeiramente conhecido pelo homem, porque verdadeiramente está presente". Chapman, Jesus Christ and the Present Age, 14 - "O mundo nunca foi mais adiante do unitarismo do que hoje; podemos acrescentar que o unitaris- mo nunca foi além de si mesmo".
ESTA TRIPESSOALIDADE NÃO É TRITEÍSMO; POIS, CONQUANTO HAJA TRÊS PESSOAS, HÁ APENAS UMA ESSÊNCIA
O termo 'pessoa' só representa aproximadamente a verdade. Apesar de que esta palavra mais aproximadamente do que qualquer outra, expressa a concepção que as Escrituras nos dão da relação entre Pai, Filho e Espírito Santo não é de si mesma empregada nesta conexão na Escritura e empregamo- la em um sentido qualificado, não no sentido comum em que aplicamos a palavra 'pessoa' a Pedro, Paulo e João.
A palavra 'pessoa' é apenas a expressão imperfeita e inadequada de um fato que transcende a nossa experiência e compreensão. Bunyan: "Minhas obscuras e nebulosas palavras apenas conservam a verdade, como armários que guardam o ouro". Três Deuses, limitando-se um ao outro, privariam reciprocamente a divindade um do outro. Enquanto mostramos que a unidade é articulada pelas pessoas, é igualmente importante lembrar que as pessoas são limitadas pela unidade. Para nós a pessoalidade implica separação total de todas as demais. Nele as distinções pessoais devem ser tais como são consistentes com a sua unidade. Este é o mérito da afirmação contida no Symbolum Quicumque (ou o erroneamente chamado Credo de Atanásio):
"O Pai é Deus, o Filho é Deus, o Espírito Santo é Deus; entretanto não há três Deuses, mas um só. De igual modo, o Pai é Senhor, o Filho é Senhor, o Espírito Santo é Senhor; contudo, não há três Senhores, mas um só Senhor. Porque como somos compelidos pela verdade cristã a reconhecer cada pessoa por si mesma como Deus e Senhor, do mesmo modo, pela mesma verdade, somos proibidos de dizer que há três Deuses ou três Senhores". Acrescentamos que a pessoalidade de Deus como um todo é separada e distinta de todas outras e, a respeito disto, há maior analogia com a pessoalidade do homem do que com a do Pai e do Filho.
A igreja de Alexandria no segundo século cantava: "Um só é santo, o Pai;
Um só é santo, o Filho; Um só é santo, o Espírito". Moberly, Atonement and Personality, 154,167,168 - "As três pessoas nem são três Deuses, nem três partes de Deus. Ao invés disso são triplicemente, tripessoalmente Deus.
... A distinção pessoal em Deus é interior e de unidade: Não se trata de uma distinção que qualifica a Unidade, ou usurpa o seu lugar, ou o destrói. Não se trata de uma relação de exclusão mútua, mas de inclusão. Nenhuma pessoa é ou pode ser sem as outras. ... A pessoalidade do supremo e absoluto Ser não pode existir sem a reciprocidade autocontida de relações tais como Vontade e Amor. Porém a reciprocidade não seria real a menos que o sujeito que se torna objeto e o objeto que se torna sujeito fossem em cada lado semelhantemente e ao mesmo tempo pessoais. A unidade que tudo abrange é um modo mais elevado da unidade do que a do simples elemento distintivo.
... Os discípulos não devem ter a presença do Espírito em lugar do Filho, mas ter o Espírito é ter o Filho. Deus pessoal não é uma alternativa limitada para abstrações ilimitadas, tais como lei, santidade, amor, mas plenitude transcendente e inclusiva de todos eles. Os termos Pai e Filho sem dúvida são termos que surgem imediatamente dos fatos temporais da encarnação mais do que as relações eternas do ser divino. Contudo, são metáforas que significam bem mais na esfera espiritual que na material. Deste modo, pecado, juízo, graça, são metáforas. Mas em Jo. 1.1-18 não se emprega a palavra 'Filho', mas 'Verbo'".
A qualificação necessária é que, enquanto três pessoas entre os homens têm só uma unidade específica de natureza ou essência - isto é, têm a mesma espécie de natureza ou essência, - as pessoas da divindade têm uma unidade numérica de natureza ou essência - isto é têm a mesma natureza ou essência. A essência não dividida de Deus pertence igualmente a cada uma das pessoas; Pai, Filho e Espírito Santo, cada um possui toda a substância e todos atributos da divindade. A pluralidade de Deus não é, portanto, pluralidade de essência, mas de distinções hipostáticas ou pessoais. Deus não é três e um, mas três em um. A essência una indivisível tem três modos de subsistência.
Trindade não é um consórcio em que cada membro pode apor a sua assinatura; porque isto é apenas uma unidade de contrato e operação, não de essência. A natureza de Deus não é uma unidade abstrata, mas orgânica. Como um ser vivente, Deus não pode ser uma simples Mônada. A Trindade é o organismo da Divindade. O ser divino uno existe em três modos. A vida da parreira se faz conhecida na vida dos ramos e Cristo emprega esta união entre a parreira e os ramos para ilustrar a união entre o Pai e ele mesmo. (Ver Jo. 15.10 - "Se guardardes os meus mandamentos permanecereis no meu amor; do mesmo modo que eu tenho guardado os mandamentos do meu Pai e permaneço no seu amor"; cf. v. 5 - "eu sou a videira e vós as varas; quem está em mim e eu nele, este dá muito fruto"; 17.22,23 - "para que sejam um, como nós somos um. Eu neles e tu em mim"). Deste modo, no organismo do corpo, o braço tem a sua própria vida diferente da cabeça ou do pé, apesar de que a tem só participando da vida do todo. Ver Dorner, System of Doctrine, 1.450-453 - "A pessoalidade divina é tão presente em cada uma das distinções, que estas, que simplesmente e por si mesmas não seriam pessoais, contudo, participam da pessoalidade divina, cada uma a seu modo. Esta pessoalidade divina é a unidade dos três modos de subsistência que participam dela mesma. Também não é pessoal sem as outras. Em cada uma, a seu modo, está a divindade completa".
O corpo humano não é um organismo simples, mas complexo, uma unidade que abrange um número infinito de organismos subsidiários e dependentes. A vida do corpo manifesta-se na vida do sistema nervoso, da vida do sistema circulatório, e da vida do sistema digestivo. A destruição completa de qualquer um destes sistemas destrói os outros dois. A psicologia do mesmo modo que a fisiologia revela-nos a possibilidade de uma tríplice vida dentro dos limites de um só ser. No homem como indivíduo há às vezes uma dupla ou tripla consciência. Herbert Spencer, Autobiography, 1.459; 2.204 - "Presu- mo que as mentes mais ativas têm, mais ou menos freqüentes experiências de dupla consciência - uma parecendo tomar nota do que a outra está para fazer, e aplaudir ou censurar". Ele menciona um exemplo da sua própria experiência. "Pode ser possível um pensamento bicéfalo, como há uma visão binocular? ... Em tais casos como se se estivesse prosseguindo bem afastado do consciente que parece constituir o meu eu: algum tipo de processo de elaboração de pensamentos coerentes apesar de que uma parte do meu eu seja um originador independente sobre cujas palavras e atos eu não tenha controle algum, e que em grande medida seja consistente; conquanto a outra parte do meu eu seja um espectador ou ouvinte passivo, completamente despreparado para muitas das coisas de que trata a primeira parte e que, contudo, embora inesperada, não seja ilógica". Isto que pode ser mais do que uma consciência na mesma pessoalidade entre os seres humanos deve tornar- nos prudentes ao negar que possa haver três consciências em Deus.
Genericamente a humanidade também é um organismo, e este fato empresta confirmação à afirmação paulina da interdependência orgânica. A sociologia moderna é a doutrina de uma vida constituída pela união de muitos. "Unus homo, nullus homo" é um princípio de ética assim como de sociologia. Ninguém pode ter consciência para consigo mesmo. A vida moral de um resulta da vida moral de todos e há uma interpenetração mútua. Contudo, todos os homens vivem, movem-se e existem em Deus (At. 17.28). Dentro dos limites da consciência universal e divina há uma múltipla consciência finita. Por que, então, pensar que é incrível que na natureza deste Deus uno haja três consciências infinitas? Baldwin, Psichoiogy, 53,54 - "A integração da consciência finita numa abrangente consciência divina pode encontrar uma analogia na integração da consciência subordinada na personalidade unida do homem. No estado hipnótico, as múltiplas consciências podem ser induzidas no mesmo organismo nervoso. Na insanidade há uma consciência secundária em guerra com aquela que normalmente domina". Schurman, Beiiefin God, 26, 161 - "O Espírito infinito pode incluir o finito, como a idéia de um simples organismo abrange dentro de uma só vida uma pluralidade de membros e funções. ... Todas as almas são partes ou funções da eterna vida de Deus, que é acima de todos, e através de todos, e em todos, e em quem vivemos, nos movemos e existimos". Tiraríamos a conclusão de que, como no corpo e na alma do homem tanto individualmente como na raça, existe a diversidade na unidade e uma tríplice consciência e vontade consistentes com uma só essência e nela encontramos a sua perfeição.
Pessoalidade de Deus é mais do que a pessoalidade do Filho e a do Espírito. A pessoalidade de Deus é distinta e separada de todas as outras e é, a este respeito, como a do homem. Por isso Shedd, Dogm. Theol., 1.294, diz: é
melhor falar da pessoalidade da essência do que da sua pessoa; porque a essência não é uma pessoa, mas três. ... A essência divina não pode ser ao mesmo tempo três pessoas e uma pessoa, se a palavra 'pessoa' for empregada numa significação; mas pode ao mesmo tempo ser três pessoas e um só Ser pessoal". Conquanto falamos de um Deus que tem uma pessoalidade na qual há três pessoas, não devemos chamá-la de superpessoalidade, caso se pretenda que este termo sugira que a pessoalidade de Deus é menos que a do homem. A de Deus é inclusiva, ao invés de exclusiva.Com esta qualificação podemos concordar com as palavras de D'Arcy, Idealism and Theology, 93,94,218,230, 236,254 - "A mais profunda verdade das coisas é que se deve conceber Deus como pessoal; mas deve-se crer que a última Unidade, que é a dele, é superpessoal. É uma unidade de pessoas, não uma unidade pessoal. Para nós, pessoalidade é a última forma da unidade. Com ele não é assim. Para ele todas as pessoas vivem se movem e existem. ... Deus é pessoal e superpessoal. Há nele uma unidade transcendente que pode abranger uma multiplicidade pessoal. ... Há em Deus uma unidade superpessoal na qual todas as pessoas são uma - [todas as pessoas humanas e as três divinas].
... A substância é mais do que a qualidade e o sujeito é mais real que a substância. A mais real de todas é a totalidade concreta, o Universal todo inclusivo.
... O que o amor luta para realizar - o domínio da oposição de pessoa para com a pessoa - atinge-se perfeitamente na Unidade divina. ... A pressuposição de que a filosofia está afastada - [de que pessoas têm uma base subjacente de unidade] é idêntica àquela em que se fundamenta a teologia cristã".
Esta unidade de essência explica o fato de que, enquanto Pai, Filho e Espírito Santo, a respeito de sua pessoalidade, são subsistências distintas, há uma intercomunhão de pessoas e uma imanência de uma pessoa divina na outra que permite a obra peculiar atribuir-se, com uma simples limitação, a qualquer uma das outras e a manifestação de uma se reconheça na manifestação de outra. A limitação é simplesmente esta, que, apesar de o Filho ser mandado pelo Pai e o Espírito pelo Pai e pelo Filho, não se pode dizer o contrário, que o Pai é mandado pelo Filho ou pelo Espírito. As representações da Escritura sobre esta intercomunhão impedem-nos de conceber tais distinções chamadas Pai, Filho e Espírito Santo como envolvendo separação entre elas.
Dorner acrescenta que "em um está cada um dos outros". Isto é verdade com a limitação mencionada no texto acima. Qualquer coisa que Cristo faz, pode-se dizer que Deus, o Pai o faz; porque Deus age só em Cristo o Revelador e através dele. Qualquer coisa que o Espírito Santo faz, pode-se dizer que Cristo faz; porque o Espírito Santo é o Espírito de Cristo. O Espírito é o Jesus onipresente; o dito de Bengel é verdadeiro: "Ubi Spiritus, Ibi Christus" (Onde está o Espírito, ali está Cristo). Seguem-se passagens que ilustram esta intercomunhão: Gn. 1.1 "Criou Deus"; cf. Hb. 1.2- "por quem [o Filho] fez também o mundo"; Jo. 5.17,19 - "Meu Pai trabalha até agora e eu trabalho
também. ... o Filho por si mesmo não pode fazer coisa alguma, se o não vir fazer o Pai, porque tudo quanto ele faz, o Filho o faz igualmente"; 14.9 - "quem me vê a mim vê o Pai"; 11 - "eu no Pai e o Pai em mim"; 18 - "não vos deixarei órfãos; voltarei para vós", (através do Espírito); 15.26 - "quando vier o Consolador, que eu da parte do Pai vos hei de enviar, aquele Espírito da verdade"; 17.21 - "para que todos sejam um, como tu, ó Pai, o és em mim, e eu em ti"; 2 Co. 5.19- "Deus estava em Cristo reconciliando"; Tt. 2.10 - "Deus, nosso Salvador"; Hb. 12.23 - "Deus, o juiz de todos"; cf. Jo. 5.22 - "E também o Pai a ninguém julga, mas deu ao Filho todo o juízo"; At. 17.31 - "com justiça há de julgar o mundo por meio do varão que destinou".
É esta intercomunhão, juntamente com a ordem da pessoalidade e operação a ser mencionada mais adiante que explica o emprego ocasional do termo 'Pai' aplicado à divindade toda; como em Ef. 4.6 - "um só Deus e Pai de todos, o qual é sobre todos, e por todos [em Cristo], e em todos [através do Espírito]". Esta intercomunhão também explica a designação de Cristo como "o Espírito", e do Espírito como "o Espírito de Cristo", como em 1 Co. 15.45 - "o último Adão em espírito vivificante"; 2 Co. 3.17 - "Ora, o Senhor é espírito"; Gl. 4.6 - "enviou o Espírito de seu Filho"; Fp. 1.19 - "socorro do Espírito de Jesus Cristo" (ver Alford e Lange sobre 2 Co. 3.17,18). Do mesmo modo Lamb, em Ap. 5.6, "sete pontas e sete olhos, que são os sete Espíritos de Deus enviados a toda a terra" = o Espírito Santo, com suas múltiplas forças, é o Espírito do Cristo onipotente, onisciente e onipresente. Teólogos têm designado esta intercomunhão através dos termos jtepixwpricnç, circuminces- sio, intercommunicatio, circulatio, inexistentia. A palavra o-uaía é empregada para denotar essência, substância, natureza, ser; e as palavras rcpócrco7iov e -únóataaiç, para pessoa, distinção, modo de subsistência. Sobre os empregos mutantes das palavras jipóacojtov e tmóejTaaiç, ver Dorner, Glaubenslehre, 2.321, nota 2.
O Espírito Santo é o alter ego de Cristo, ou outro eu. Quando Jesus se retirou, ocorreu uma mudança da sua presença para a sua onipresença; do poder limitado para o ilimitado; do companheirismo para a morada dentro do crente. Porque Cristo vem ao homem no Espírito Santo, ele fala através dos apóstolos com tanta autoridade como se os seus próprios lábios proferissem as palavras. Cada crente, tendo o Espírito Santo, tem toda a pessoa de Cristo; ver A. J. Gordon, Ministry of the Spirit., Gore, Incarnation, 218 - "As pessoas da Santa Trindade não são indivíduos separáveis. Cada um envolve os outros; a vinda de cada um é a dos outros. Deste modo a vinda do Espírito deve ter envolvido a vinda do Filho. Mas a especialidade do dom do Pentecostes parece ser a vinda do Espírito Santo daquela humanidade do Filho encarnado, que ascendeu e foi glorificada. O Espírito é o doador da vida, mas a vida em que ele opera na igreja é a do Encarnado, a vida de Jesus".
Moberly, , 85 - "Durante séculos e séculos, a unidade essencial de Deus tem sido queimada e marcada na consciência de Israel. Primeiro teve de ser totalmente estabelecida, como elemento básico do pensamento, indispensável inalterável, antes que, para o homem, pudesse começar a revelação da realidade das relações eternas dentro do indivisível ser de Deus. Ao chegar tal revelação, não houve modificação, mas interpretação e iluminação, da unidade proposta de forma absoluta". E. G. Robinson, Christian Theology, 238
Existe uma dificuldade extrema em fazer qualquer afirmação de uma trindade que, por um lado, não se transforme em triteísmo, e por outro, num mero modismo. É muito natural que Calvino fosse acusado de sabelianismo, e John Howe de triteísmo".
AS TRÊS PESSOAS, PAI, FILHO, E ESPÍRITO SANTO, SÃO IGUAIS
Como explicação, note que:
Estes títulos pertencem às Pessoas
O Pai não é Deus como tal; pois Deus não é só Pai, mas Filho e Espírito Santo. O termo 'Pai' designa a distinção hipostática na natureza divina em virtude da qual Deus se relaciona com o Filho e através do Filho e do Espírito Santo com a igreja e com o mundo. Como autor da vida espiritual e da natural do crente, Deus é duplamente seu Pai; mas esta relação que Deus sustenta com as criaturas não é a base do título. Deus é Pai primeiro em virtude da relação que sustenta com o Filho eterno; só quando nos unimos espiritualmente a Jesus Cristo tomamo-nos filhos de Deus.
O Filho não é Deus como tal; pois Deus não é só Filho, mas também Pai e Espírito Santo. 'O Filho' designa a distinção em virtude da qual Deus se relaciona com o Pai, é enviado pelo Pai para redimir o mundo e com o Pai envia o Espírito Santo.
O Espírito Santo não é Deus como tal; pois Deus não é só Espírito Santo, mas também Pai e Filho. 'O Espírito Santo' designa esta distinção em virtude da qual Deus se relaciona com o Pai e com o Filho e é enviado por eles para cumprir a obra de renovar os ímpios e santificar a igreja.
Nenhum destes nomes designa a Mônada como tal. Cada um designa esta distinção pessoal que forma a base eterna e fundamento para uma revelação particular. No sentido de ser o Autor e provedor da vida natural do homem, Deus é Pai de todos. Mas mesmo esta filiação natural é mediada por Jesus Cristo; ver 1 Co. 8.6 - "um só Senhor, Jesus Cristo, pelo qual são todas as coisas, e nós por ele". Contudo, a expressão "Nosso Pai" pode ser empregada como a mais elevada verdade pelo regenerado que de Deus nasceu de novo, unindo-se a Cristo através do Espírito Santo. Ver Gl. 3.26 - "Porque vós sois filhos de Deus, em Jesus Cristo"; 4.4-6 - "Deus enviou seu Filho ... para que recebêssemos a adoção de filhos ... enviou o Espírito do seu Filho aos nossos corações, que clama: Aba, Pai"; Ef. 1.5 - "e nos predestinou para filhos de adoção por Jesus Cristo". O amor de Deus por Cristo é a medida do seu amor por aqueles que são um em Cristo. A natureza humana em Cristo eleva-se à vida e comunhão da Trindade eterna.
A paternidade humana é um reflexo da divina, mas a recíproca não é verdadeira; a divina não é um reflexo da humana; cf. Ef. 3.14,15 - "o Pai, do qual toda a família (rcaipiá) nos céus e na terra toma o nome". Chadwick, Unitaria- nism, 77-83, faz o nome do 'Pai' apenas um símbolo da grande Causa da evolução orgânica, o Autor de todos os seres. Mas podemos retrucar com Streans, Evidence of Christian Experience, 177 - "conhecer Deus fora da esfera da redenção não é conhecê-lo no mais profundo sentido do termo 'Pai'.
Só através do Filho é que o conhecemos: Mt. 11.27 - 'Ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a quem o Filho quiser revelar' ".
Whiton, Gloria Patri, 38 - "Só se pode conhecer o invisível através do visível que provém daquele. Aquele que gera todos ou a Vida Paternal que nos é oculta só pode ser conhecido pelos que foram gerados e os que têm a Vida Filial em que se revela. A bondade e a justiça que habita a eternidade só pode ser conhecida através da bondade e justiça que provém da referida eternidade nos sucessivos nascimentos do tempo. Deus acima do mundo só se faz conhecido através de Deus no mundo. O Pai, Deus transcendente, é revelado através do Filho, Deus imanente". Faber: "Ó maravilhoso e adorável Deus! Não se ouve um só cântico, ou um único som, a não ser em toda a parte e a toda hora, no amor, na sabedoria e na força; o Pai profere o seu dileto Verbo eterno". Podemos interpretar isso como significando que a própria expressão é uma necessidade da natureza de uma Mente infinita. Por isso o Verbo é eterno. Cristo é o espelho do qual brilham sobre nós os raios do invisível Luminar. O Reitor Fairbairn diz: "A teologia não deve estar no seu lado cristocêntrico histórico, mas no seu lado teocêntrico doutrinário".
Salmond, Expositor's Greek Testament, sobre Ef. 1.5 - "Para Paulo, 'adoção' não significa a concessão dos plenos privilégios da família daqueles que originariamente não são filhos e por direito na relação própria dos que são filhos por nascimento. Por isso nunca se afirma em Cristo a oíoSecna, pois só ele é Filho de Deus por natureza. Deste modo Paulo não considera que a nossa filiação está na relação natural dos homens para com Deus como filhos, mas implicando a nova relação da graça, encontrada na relação pactuai com Deus e na obra de Cristo (Gl. 4.5 sq.)''.
Sentido qualificado destes títulos
Como a palavra 'pessoa', os nomes Pai, Filho e Espírito Santo não devem ser confinados às precisas limitações de sentido que requereriam se aplicados aos homens.
As Escrituras ampliam nossas concepções da filiação de Cristo, dando a ele em seu estado preexistente os nomes de Logos, Imagem e Resplendor de Deus. - O termo 'Logos' combina em si duas idéias de pensamento e palavra, de razão e expressão. Enquanto o Logos como pensamento divino ou razão é um com Deus, o Logos como palavra divina ou expressão distingue-se de Deus. Palavras são significados pelos quais os seres pessoais expressam-se ou revelam-se. Porque Jesus Cristo era "o Verbo" antes que houvesse criaturas a quem as revelações pudessem ser feitas, parece que só é necessária a inferência deste título que em Cristo deve ser desde a eternidade expresso e revelado a si mesmo; em outras palavras, que o Logos é o princípio da verdade, ou autoconsciência em Deus. - O termo 'Imagem' sugere as idéias de cópia ou contrapartida. O homem é a imagem de Deus só de um modo relativo e derivado. Cristo é a imagem de Deus de modo absoluto e arquétipo. Como a perfeitâ representação das perfeições do Pai, o Filho parece ser o objeto e princípio do amor em Deus. - O termo 'Resplendor', finalmente, é uma alusão ao sol e su. radiação. Como o resplendor do sol manifesta a natureza do sol, que doutra forma não seria revelado, ainda inseparável do sol e sempre com ele, assim Cristo revela Deus, mas é eternamente um com Deus. Eis aqui um princípio de movimento, da vontade, que parece estabelecer conexão dele mesmo com a santidade, ou pureza autodeclarante da natureza divina.
Smith, Introd. to Edward's Observations on the Trinity. "As relações ontoló- gicas das pessoas da Trindade não são um simples vácuo no pensamento humano". Jo. 1.1 - "No princípio era o Verbo" - significa mais do que "no princípio era o x, o zero". Na verdade Godet diz que o Logos = 'razão' só nos escritos filosóficos, mas nunca nas Escrituras. A isto ele chama de noção hegeliana. Porém tanto Platão quanto Filo tinham feito esta uma significação comum. Sobre o Xóyoc, como = razão + fala ver Lightfoot sobre Cl, 369 - Logos = "Revelador eterno da essência divina". Bushnell: "Espelho da imaginação criadora"; "forma de Deus".
Verbo = 1. Expressão; 2. Expressão definida; 3. Expressão ordenada;
Expressão completa. Nós fazemos o pensamento definido pondo-o em linguagem. Deste modo, a riqueza de idéias de Deus está no Verbo formado num Reino ordenado, um verdadeiro Cosmos; ver Mason, Faith ofthe Gospel,
76. Max Müller: "A palavra é tão somente o pensamento expresso como som de forma audível. Tire o som da palavra e o que resta é somente o seu pensamento". Whiton, Gloria Patri, 72,73 - "O grego via na palavra o permanente pensamento através da forma passageira. O Verbo era Deus e, contudo, finito - finito só quanto à forma, infinito quanto ao que a forma sugere ou expressa. O Verbo deve sugerir alguma forma e qualquer forma é finita. O Verbo é a forma tomada pela Inteligência infinita que transcende a todas formas". Consideramos esta identificação do Verbo com a manifestação finita do Verbo em contradição com Jo. 1.1, onde o Verbo é representado como existindo antes da criação, e em Fp. 2.6, onde o Verbo é representado existindo na forma de Deus antes da sua autolimitação na natureza humana. A Escritura requer de nós que creiamos numa objetivação do próprio Deus na pessoa do Verbo antes de qualquer manifestação finita de Deus ao homem. Cristo existia como Verbo e o Verbo como Deus antes que ele se fizesse carne e antes que o mundo viesse a ser; a saber, o Logos era o princípio eterno da verdade ou a consciência própria na natureza de Deus.
Eis aqui passagens que representam Cristo como a imagem de Deus:
Cl. 1.15 - "o qual é a imagem de Deus invisível"; 2 Co. 4.4 - "Cristo, que é a
imagem (eíkcòv) de Deus"; Hb. 1.3 - "a imagem expressa da sua pessoa (xapaKTfip Tíiç ímoatácecoç amou)"; aqui xctpaKxrip significa 'impressão', 'contrapartida'. Cristo é a imagem perfeita de Deus, como os homens não o são.
Por isso ele tem consciência e vontade. Ele possui todos os atributos e poderes de Deus. A palavra 'imagem' sugere a igualdade perfeita a Deus que o título 'Filho' a princípio parece negar. A imagem viva de Deus que é igual a ele mesmo e que é o objeto do seu amor infinito não pode ser nada menos que pessoal. Como o solteiro nunca pode satisfazer o seu anseio por companheirismo alinhando o quarto com espelhos que apenas fornecem um reflexo sem vida de si mesmo, assim também Deus requer para o seu amor pessoal do mesmo modo um objeto infinito. A Imagem não é precisamente a repetição do original. A marca do selo não é precisamente a reprodução do selo.
As letras no reverso do selo podem ser facilmente ser lidas só quando a impressão está diante de nós. Do mesmo modo Cristo é a interpretação e a revelação do Deus invisível. Como apenas no amor chegamos a conhecer as profundezas do nosso ser, assim também apenas no Filho é que "Deus é amor" (1 Jo. 4.8).
Cristo é citado como o Resplendor de Deus em Hb. 1.3 - "que, sendo o resplendor da sua glória" (à7taÚYac)ia xfjç Só^nç); cf. 2 Co. 4.6 - "resplandeceu em vossos corações, para a iluminação do conhecimento da glória de Deus, na face de Jesus Cristo". Note que o brilho do sol é tão velho quanto o próprio sol e sem ele o sol não seria o que é. Do mesmo modo Cristo é igual e coeterno com o Pai. SI. 84.11 - "o Senhor Deus é um sol". Entretanto, não podemos ver o sol a não ser através da sua luz. Cristo é a luz solar que flui do Sol e que torna este visível. Se há um Sol eterno, deve haver também uma Luz Solar eterna e Cristo deve ser eterno. Westcott sobre Hb. 1.3 - "O emprego do termo intemporal e absoluto co[v, 'sendo' protege contra o pensamento de que a filiação do Senhor não é por natureza, mas por adoção, àjiaúyacua não expressa pessoalidade e xapaKTiip não expressa coexistência. As duas palavras se relacionam exatamente do mesmo modo que ònoo-óaioç e ixovoyevTiç, e como devem ser combinados a fim de dar a plenitude da verdade. A verdade assim expressa sustenta de modo autêntico o que é absolutamente bom. ... Em Cristo distingue-se a essência de Deus; em Cristo se vê a revelação do caráter de Deus".
Os nomes assim dados à segunda pessoa da Trindade, se têm qualquer significação, trazem-no para diante das nossas mentes no aspecto geral de Revelador e sugerem uma relação da doutrina da Trindade com a verdade, amor e santidade, atributos imanentes de Deus. As preposições empregadas para descrever as relações internas da segunda pessoa com a primeira não são preposições de repouso, mas de direção e movimento. A Trindade como organismo da Divindade garante um movimento de vida de Deus, processo em que sempre se objetiva e no Filho anuncia sua plenitude. Cristo representa a ação centrífuga da divindade. Mas deve haver também a ação centrípeta. No Espírito Santo o movimento se completa e a atividade divina e o pensamento retomam para si mesmos. A verdadeira religião, trazendo-nos de volta para Deus, reproduz em nós, dentro de nossos limites, este eterno processo da mente divina. A experiência cristã testemunha que Deus em si mesmo é desconhecido; Cristo é o órgão da revelação externa; o Espírito Santo é o órgão da revelação interna - só ele pode dar-nos a apreensão interior ou entendimento da verdade. É "através do Espírito eterno" que Cristo "se ofereceu sem mácula diante de Deus" e é só através do Espírito Santo que a igreja tem acesso ao Pai, ou as criaturas decaídas podem voltar-se para Deus .
Aqui vemos que Deus é Vida, Vida auto-suficiente, Vida infinita, da qual a vida do universo é apenas um reflexo, um filete da fonte, uma gota no oceano. Visto que Cristo é o único Revelador, o único princípio proveniente de Deus é aquele em quem vem a ser e se mantém unida. Ele é a vida da natureza; toda a beleza natural e grandiosidade, todas as forças moleculares e molares, todas as leis da gravitação e da evolução, operam e manifestam o Cristo onipresente. Ele é a vida da humanidade: os impulsos intelectuais e morais do homem até onde eles são normais e relevantes, devem-se a Cristo; ele é o princípio do progresso e aprimoramento da história. Ele é a Vida da igreja; o único e exclusivo Redentor e cabeça espiritual da raça além de seu Mestre e Senhor.
Toda revelação objetiva de Deus é obra de Cristo. Mas toda a manifestação subjetiva de Deus é obra do Espírito Santo. Como Cristo é o princípio de toda a saída, do mesmo modo o Espírito Santo é o princípio da volta para Deus. Deus levanta as criaturas finitas para si mesmo, sopra nelas o seu espírito ensinando-os a lançar os seus barquinhos na corrente infinita da sua vida. Nossos carros elétricos podem galgar as montanhas em grande velocidade desde que presos aos cabos. A fé é o apoio que nos liga à energia movedora de Deus. "O universo é a ligação de volta", porque o Espírito Santo está sempre transformando a revelação objetiva em subjetiva e dirigindo de um modo consciente ou inconsciente os homens a fim de apropriar o pensamento e o amor e o propósito daquele em quem todas as coisas acham o objetivo e o fim "porque dele, por ele e para ele são todas as coisas" (Rm. 11.36); aqui há uma alusão ao Pai como a fonte, o Filho como um meio, e o Espírito como agente aperfeiçoador e complementador, nas operações de Deus. Mas todos esses processos externos são apenas sinais e reflexos finitos de um processo interno de vida na direção da natureza de Deus.
Meyer sobre Jo. 1.1 - "o Verbo estava com Deus": jtpòç xòv 9eóv não = Ttapà xô ôecò, mas expressa a existência do Logos em Deus com respeito ao intercâmbio. A essência moral desta comunhão essencial é o amor, que exclui qualquer concepção modal. "Marcus Dods, Expositor's Greek Testa- ment, in loco: "Esta preposição implica intercâmbio e, por isso, pessoalidade separada".
Mason, Faith of the Gospel, 62 - "E o Verbo estava com Deus" = o seu rosto não estava fora, como se estivesse apenas revelando, ou esperasse revelar, Deus na criação. O seu rosto estava voltado para o interior. Sua pessoa inteira se dirigia para Deus, movimento correspondendo a movimento,
pensamento a pensamento. ... Nele Deus se revela a si mesmo. Estabeleça um contraste da atitude de Adão após o pecado, com o seu rosto desviado de Deus. Godet, sobre Jo. 1.1 - "npòç tòv 0eóv não só indica pessoalidade, mas movimento. ... A tendência do Logos ad extra apoia-se numa anterior e essencial relação ad intra. Para revelar Deus é preciso conhecê-lo; para projetá-lo exteriormente é preciso mergulhar no seu seio". Compare com Jo. 1.18
"O Filho unigênito, que está no seio do Pai" onde não achamos, èv tco kóAjico, mas eiç tòv kó^todv. Como fjv eiç T-qv itóXiv significa 'foram para a cidade e estavam ali', do mesmo modo o emprego destas preposições indica em Deus movimento assim como repouso. A preposição então deve implicar que o Revelador, que existia no princípio, estava sempre junto a Deus no processo de vida da Trindade, como a perfeita objetivação de si mesmo.
Há em toda a inteligência humana uma triplicidade que aponta para uma vida trinitária em Deus. Podemos distinguir um Wissen (saber), uma Bewusstsein (consciência), uma Selbstbewusstsein (autoconsciência). Na autoconsciência completa há os três elementos: 1. Nós somos nós mesmos;
Nós formamos um Quadro de nós mesmos; 3. Nós reconhecemos este quadro como nós mesmos. O menininho fala de si mesmo na terceira pessoa: "Nenê fez". O objeto vem antes do sujeito; "me" vem antes e em estágio mais avançado vem o eu; "a si mesmo" ainda mantém o seu lugar antes de "ele mesmo". Mas esta dualidade só pertence à inteligência não desenvolvida; é caraterística da criação animal; voltamos para ela nos nossos sonhos; os insanos são vítimas permanentes disso; visto que o pecado é insanidade moral, o pecador não tem nenhuma esperança até que, como o filho pródigo, ele "caia em si"(Lc. 15.17). O insano é mente alienatuse falamos ao médico que se trata de um alienista. A simples dualidade nos dá apenas a noção de separação. A perfeita consciência própria quer no homem quer em Deus requer um terceiro elemento unificador. E em Deus a mediação entre o "eu" e o "tu" deve ser obra de uma Pessoa, e a Pessoa que medeia entre os dois deve ser em qualquer respeito o igual a ambos ou ele não pode adequadamente interpretar um ao outro.
Dogm. Theol., 1.179-189, 276-283 - "É um dos efeitos da convicção através do Espírito Santo a fim de converter a consciência em consciência própria. ... A convicção do pecado é a consciência do eu como autor culpado pelo pecado. A consciência própria é trina enquanto a consciência simples é dúplice. ... um e o mesmo espírito humano subsiste em dois modos ou distinções: sujeito e objeto. ... As três consciências hipostáticas em sua combinação e unidade constituem a consciência de Deus ... como as três pessoas formam uma só essência".
Dorner considera as relações internas da Trindade (System, 1.412 sq.) em três aspectos: 1. Físico. Deus é causa sui. Mas o efeito igual à causa deve ser causativo. Aqui estaria a dualidade, se não fosse o terceiro princípio da unidade. Trinitas dualitatem ad unitatem reducit (A Trindade reduz a dualidade à unidade). 2. Lógico. A consciência própria estabelece o eu sobre o eu. Contudo, o pensador não deve considerar o eu como um dos muitos, e chamar a si mesmo de 'ele', como fazem as crianças; porque então o pensador não seria um aufoconsciente, mas mente alienatus, 'ao lado de si mesmo'. Por isso ele 'cai em si' na terceira pessoa como não acontece com o bruto.
Ético. Deus = direito de querer por si mesmo. Mas o direito derivado de uma vontade arbitrária não será direito. O direito baseado na natureza passiva também não é direito. Direito como um ser = Pai. Direito como vontade = Filho. Sem este último princípio de liberdade, temos uma ética morta, um Deus morto, uma necessidade entronizada. A unidade entre a necessidade e a liberdade é encontrada por Deus, assim como pelo cristão, no Espírito Santo. O Pai = eu; o Filho = me; o Espírito = unidade dos dois. Não deve haver apenas o Sol e a luz solar, mas o olho para contemplar a Luz. William James, em Psichology, distingue o Me, o eu conhecido, do Eu, o eu como conhecedor.
Ebrard, Dogmatik, 1.172, fala do Filho como o movimento centrífugo, enquanto o Espírito Santo é o movimento centrípeto de Deus. Deus, independentemente de Cristo, é o não revelado (Jo. 1.18 - "Deus nunca foi visto por alguém"); Cristo é o órgão da revelação exterior ("O Filho unigênito, que está no seio do Pai, este o fez conhecer"); o Espírito Santo é o órgão da revelação interna (1 Co. 2.10-"Mas Deus no-las revelou pelo Espírito"). Que o Espírito Santo é o princípio de todo o movimento para Deus aparece em Hb. 9.14 - "Cristo, pelo Espírito eterno se ofereceu a si mesmo imaculado a Deus";
Ef. 2.18 - "acesso ao Pai em um mesmo Espírito"; Rm. 8.26 - "o Espírito ajuda as nossas fraquezas ... o Espírito intercede por nós"; Jo. 4.24 - "Deus é espírito, e importa que os que o adoram o adorem em espírito; 16.8-11 - "convencerá o mundo do pecado, da justiça e do juízo". Mason, Faith of the Gospet, 68 - "É o gozo do Filho de receber, sua alegria ao saudar mais aqueles desejos do Pai que mais custam para ele mesmo. O Espírito também tem sua alegria ao tornar conhecido; ao aperfeiçoar a comunhão e conservar vivo o amor eterno que soa incessante desde as profundezas que ele torna o coração do Pai conhecido ao Filho, o coração do Filho ao Pai". Podemos acrescentar que o Espírito Santo é o órgão da revelação interna até mesmo ao Pai e ao Filho.
À luz do que já se disse, podemos entender um pouco mais completamente as diferenças características entre a obra de Cristo e a do Espírito Santo. Podemos resumi-las nas quatro afirmações: primeira: toda saída parece obra de Cristo e todo retomo para Deus obra do Espírito; segundo: Cristo é o órgão da revelação exterior e o Espírito Santo o órgão da revelação interior: terceiro: Cristo é o nosso advogado no céu e o Espírito Santo é o advogado em nossa alma; quarto: na obra de Cristo somos passivos e na obra do Espírito somos ativos. Trataremos da obra de Cristo mais plenamente adiante, quando falarmos dos ofícios de Profeta, Sacerdote e Rei. Tratar-se-á da obra do Espírito Santo quando falarmos da aplicação da redenção na regeneração e santificação. E suficiente dizer aqui que o Espírito Santo é representado nas Escrituras como o autor da vida - na criação, na concepção de Cristo, na regeneração, na ressurreição; e como doador da luz - na inspiração dos escritores da Bíblia, em convencer os pecadores, na iluminação e santificação dos cristãos.
Gn. 1.2 - "O Espírito de Deus pairava"; Lc. 1.35 - a Maria: "Descerá sobre ti o Espírito Santo"; Jo. 3.8 - "nascido do Espírito"; Ez. 37.9,14 - "Vem dos quatro ventos, ó espírito ... Porei em vós o meu Espírito, e vivereis"; Rm. 8.11
"vivificará o vosso corpo mortal pelo seu Espírito". 1 Jo. 2.1 - "um advogado (jcapáKXriTov) para com o Pai, Jesus Cristo, o justo"; Jo. 14.16,17 - "outro Consolador (rcapáKXrvtov), para que fique convosco para sempre, o Espírito da verdade"; Rm. 8.26 - "o Espírito intercede por vós"; 2 Pe. 1.21 - "homens santos de Deus falaram movidos pelo Espírito Santo"; Jo. 16.8 - "convencerá o mundo do pecado"; 13 - "quando vier aquele Espírito da verdade, ele vos guiará em toda a verdade"; Rm. 8.14 - "todos os que são guiados pelo Espírito de Deus, esses são filhos de Deus";
McCosh: As palavras do Espírito são Convicção, Conversão, Santificação, Consolação. Donovan: O Espírito é de convicção, iluminação, reconhecimento do pecado; e de revelação, lembrança, testemunho, santificação, consolação para o Santo. O Espírito ilumina o pecador, como um lampejo ilumina o viajante que tropeça à beira do precipício à noite; ilumina o cristão quando, surgindo o sol, revela uma paisagem que já se encontrava diante dele, mas que estava oculta aos seus olhos até que o grande luminar a tornou visível. "A luz matinal não criou o amável projeto que ela revelou; apenas mostrou o real estado daquilo que as trevas ocultavam". A defesa de Cristo perante o trono é como aquele conselho legal em nossa defesa; a defesa do Espírito Santo no coração é como a mãe que ensina o seu filho a orar por si mesmo.
J. W. A. Stewart: "Sem a obra do Espírito Santo teria sido impossível a redenção, tão impossível como ao combustível aquecer sem acendê-lo, ou o pão não nutriria se não se comesse. Cristo é Deus entrando na história humana, mas, sem o Espírito, o cristianismo só seria história. O Espírito é Deus entrando nos corações humanos. O Espírito Santo vivifica o credo. Cristo é o médico que deixa o remédio e retira-se. O Espírito Santo é o enfermeiro que aplica e administra o remédio e fica com o paciente até que se complete a cura". Matheson, Voices of the Spirit, 78 - "De nada vale existir o espelho no compartimento, se ele está iludindo o seu rosto; os raios solares chegar não podem chegar se o rosto estiver encoberto a eles. O céu está em torno de ti não só na tua infância, mas sempre. Entretanto, não basta haver um lugar preparado para ti; tu deves estar preparado para o lugar. Não basta que a tua luz tenha vindo; tu mesmo deves levantar-te e brilhar. Nenhum brilho externo pode revelar, a não ser que tu mesmo sejas o refletor da sua glória. O Espírito deve pôr-se em ti ou aos teus pés para que tu possas ouvir o que ele te diz (Ez. 2.2)".
O Espírito Santo não revela a sua pessoa, mas a de Cristo. Jo. 16.14 — "Ele me glorificará porque há de receber de mim e vo-lo-á de anunciar". Deste modo devem os servos do Espírito ocultar-se enquanto anunciam Cristo. E. H. Johnson, The Holy Spirit, 40 - "Há alguns anos uma grande locomotiva toda envidraçada apresentou-se por volta do campo. Quando entrou em operação podiam ser vistos o pistão e as válvulas em funcionamento; mas não se via o que as fazia funcionar. Quando o vapor está bem quente, a ponto de se dilatar, é invisível". Do mesmo modo percebemos a presença do Espírito Santo não através de visões ou de vozes, mas através do efeito que ele produz dentro de nós na forma de um novo conhecimento, de um novo amor, e de
uma nova energia das nossas forças. Denney, Studies in Theology, 161 - "Ninguém pode testemunhar de Cristo e de si ao mesmo tempo. Esprit é fatal à unção; ninguém pode dar a impressão de que ele mesmo é inteligente e que Cristo é poderoso para salvar. Só se sente o poder do Espírito Santo quando a testemunha está inconsciente de si e os outros continuam inconscientes dele". Moule, Veni Creator(Vem, ó Criador), 8-"Como dizTERTULiANO, o Espírito Santo é o vigário de Cristo. Na noite que antecedeu à crucificação, o Espírito Santo estava presente na mente de Cristo como uma pessoa".
Gore, Lux Mundi, 318 - "Acusa-se Orígenes de que a sua linguagem parece envolver uma exclusão do Espírito Santo da natureza e uma limitação da sua atividade na igreja. A sua vida toda sem dúvida é dele. E ainda, porque o seu atributo especial é a santidade, só nas naturezas racionais é que são capazes da santidade, que exerce a sua influência especial. Uma inalação especial do Espírito divino dá ao homem a sua própria existência". Ver Gn. 2.7
"O Senhor Deus ... soprou nas suas narinas o fôlego da vida; e o homem se tornou alma vivente"; Jo. 3.8 - "O Espírito sopra onde quer... assim é todo aqueie que é nascido do Espírito". E. H. Johnson, sobre Os Ofícios do Espírito Santo, em S/Ma Sacra, jul., 1892.361-382 - Por que ele é chamado especialmente o Santo, quando o Pai e o Filho também o são, a não ser porque ele produz a santidade, i.e., faz com que a santidade de Deus seja individualmente nossa? Cristo é o princípio do coletivismo; o Espírito Santo, do individualismo. O Espírito Santo apresenta ao homem o Cristo que está nele. Deus acima de todos = Pai; Deus através de todos = Filho; Deus em todos = Espírito Santo (Ef. 4.6)".
A doutrina do Espírito Santo nunca foi desdobrada cientificamente. Nenhum tratado a seu respeito se mostrou comparável à Doutrina do Pecado de Julius Müller, ou à História da Doutrina da Pessoa de Cristo de I. A. Dorner.
No passado, o progresso da doutrina foi marcado por sucessivos estágios. Atanásio tratou da Trindade; Agostinho, do pecado; Anselmo, da expiação; Lutero, da justificação; Wesley, da regeneração; e cada um destes desdobramentos se fez acompanhar de avivamentos religiosos. Estamos no aguardo de uma discussão completa sobre a doutrina do Espírito Santo e cremos que os avivamentos disseminados seguirão o reconhecimento do Agente Todo poderoso neles.
Geração e processos consistentes com a igualdade
Sugere-se em Salmos 2.7 que a geração de Cristo é eterna. "Hoje te gerei" é interpretado mais naturalmente como a declaração de um fato eterno na natureza divina. Nem a encarnação, nem o batismo, nem a transfiguração, nem a ressurreição marcam o começo da filiação de Cristo, ou constituem-no Filho de Deus. Estes são apenas reconhecimentos e manifestações de uma filiação preexistente, inseparável de sua divindade. Ele "nasceu antes de cada criatura" (enquanto nenhuma coisa criada existia - ver Meyer sobre Cl. 1.15) e "pela ressurreição dos mortos" não veio a ser, mas só "declarou ser", "segundo o Espírito de santidade" (= segundo sua natureza divina) "o Filho de Deus
com poder" (ver Philippi e Alford sobre Ro 1.3,4). Sua filiação é única - não aplicável a qualquer criatura ou compartilhada com ela. As Escrituras sugerem, não só uma geração eterna do Filho, mas um eterno procedimento do Espírito.
SI. 2.7 - "Recitarei o decreto: O Senhor me disse: Tu és meu Filho; eu hoje te gerei"; ver Alexander, Com. in loco\ ver também sobre At. 13.33 - "A palavra 'hoje' refere-se à ocasião do decreto; mas isto, como um ato divino, é eterno; e não deve ser uma declaração sobre a Filiação". Filo diz que a palavra "hoje" para Deus significa "sempre". Este ato de gerar de que o salmo fala não é a ressurreição, porque enquanto Paulo em At. 13.33 se refere ao salmo para estabelecer o fato da Filiação de Jesus, o mesmo ocorre com os versos 34,35 relativos a outro salmo, o de número 60, para estabelecer o fato de que este Filho de Deus devia ressurgir dentre os mortos. Jesus é apresentado como o Filho de Deus através da sua encarnação (Hb. 1.5,6 - "quando outra vez introduz no mundo o Primogênito diz: E todos os anjos de Deus o adorem"), do seu batismo (Mt. 3.17 - "Este é o meu Filho amado"), na sua transfiguração (Mt. 17.5 - "Este é o meu Filho dileto"), na sua ressurreição (At. 13.34,35 - "que o ressuscitaria dentre os mortos ... num outro salmo diz: Não permitirás que o teu santo veja corrupção"). Cl. 1.15- "o primogênito de toda a criação" - tipcotótokoç rcácrriç ktícecoç = primogênito antes de toda a criação" (Julius Müller, Textos-prova, 14); ou "primogênito antes de cada criatura, /'.e., gerado e isto antes que cada coisa fosse criada" (Ellicott, Com. in loco). "Aqui" (diz Luthardt, Comp. Dogmatik, 81, sobre Cl. 1.15) se indica uma origem anterior à terrena de Deus - relação interna com a natureza divina". Lightfoot, sobre Cl. 1.15, diz que em Rabbi Bechai Deus é chamado "primogenitus mundí'.
Em Rm. 1.4 (ópiaeév-coç = "manifestado para ser o onipotente Filho de Deus") Ver Comentário de Lange, notas de Schaff nas pp. 56 e 61. Bruce, Apologetics, 404 - "A ressurreição foi a verdadeira introdução de Cristo na plena posse da Filiação divina que lhe pertencia, não só por causa do interior de uma essência espiritual santa, mas também do exterior de uma existência em poder e glória celeste". Allen, Jonathan Edwards, 353,354 - "Calvino aponta para uma geração eterna como uma 'ficção absurda". Mas sustentar a divindade de Cristo simplesmente baseado na suposição de que ela é essencial para que ele faça uma expiação adequada do pecado é envolver a rejeição da sua divindade se é que a doutrina da expiação se torna detestável. ... Tal era o processo do qual, no pensamento do século passado, a doutrina da Trindade estava solapada. Não basear as distinções da essência divina por alguma necessidade imanente eterna é facilitar a negação do que tem sido chamado de Trindade ontológica e, a seguir, não foi difícil ou afastada a rejeição da Trindade econômica".
Se a leitura de Westcott and Hort ó liovoyevfiç 0eóç, "o Deus unigênito", em Jo. 1.18, estiver correta, temos uma nova prova da Filiação eterna de Cristo. Meyer explica èoiuto-d em Rm. 8.3 - "Deus, enviando o seu Filho", como uma alusão à Filiação metafísica. Que esta Filiação é única está claro em Jo. 1.14,18 - "o unigênito do Pai ... o Filho unigênito que está no seio do Pai";
Rm. 8.32 - "seu próprio Filho"; Gl. 4.4 - "enviou seu Filho"; cf. Pv. 8.22-31 - "quando compunha os fundamentos da terra; então eu estava com ele e era seu aluno"; 30.4 - "Quem estabeleceu os fins da terra? Qual é o seu nome e qual é o nome do seu filho, se é que o sabes"? O processo eterno do Espírito parece estar implicado em Jo. 15.26 - "o Espírito de verdade que procede do Pai" - ver Westcott, Bib. Com., in loco] Hb. 9.14 - "o Espírito eterno". Westcott diz aqui que rcapá (não èÇ) mostra que se refere à missão temporal do Espírito Santo não ao processo eterno. Ao mesmo tempo ele sustenta a correspondência temporal com a eterna.
Os termos da Escritura 'geração' e 'procedimento', aplicados ao Filho e ao Espírito Santo são apenas expressões aproximadas da verdade e, através de outras declarações bíblicas, devemos corrigir quaisquer impressões imperfeitas que podemos derivar somente delas. Empregamos estes termos em um sentido especial, que explicitamente estabelecemos e definimos excluindo toda a noção de desigualdade entre as pessoas da Trindade. A geração eterna do Filho que nós sustentamos.
d) Não é criação, mas comunicação do próprio Pai ao seu Filho. Porque os nomes Pai, Filho e Espírito Santo não são aplicáveis à essência divina, mas só se aplicam a suas distinções hipostáticas, elas não implicam nenhuma derivação da essência do Filho a partir da essência do Pai.
O erro dos Pais nicenos é o de explicar a Filiação como derivação da essência. O Pai não pode transmitir a sua essência ao Filho e ainda retê-la.
O Pai não é fons deitatis (fonte da deidade), mas fons trinitatis (fonte da trindade).
Não é começo de existência, mas uma eterna relação com o Pai; nunca há um tempo quando o Filho começou a ser, ou quando o Filho não existiu como Deus com o Pai.
Se tivesse havido um sol eterno, é evidente que haveria também raio solar eterno. Ainda o raio eterno teria procedido do sol. Quando perguntaram a Cirilo se o Filho existia antes da geração, ele respondeu: "A geração do Filho não precede à sua existência, mas ele sempre existiu, e isto por geração".
Não é um ato da vontade do Pai, mas uma necessidade interna da natureza divina, - de modo que o Filho não depende mais do Pai do que o Pai depende do Filho e de modo que, se for consistente com a divindade do Pai, é igualmente consistente com a divindade do Filho.
O sol depende da luz solar do mesmo modo que a luz solar depende do sol; porque sem luz solar o sol não é o verdadeiro sol. Do mesmo modo o Pai depende do Filho assim como o Filho depende do Pai; porque sem o Filho o Pai não seria o verdadeiro Pai. Dizer que asseidade pertence apenas ao Pai é logicamente arianismo e o próprio subordinacionismo, porque implica uma subordinação da essência do Filho para com o Pai. A subordinação essencial seria inconsistente com a igualdade. Ver Thomasius, Christi Person und Werk, 1.115. Palmer, Theol. Definitions, 66, 67, diz que Pai = vida independente; Filho unigênito = vida independente voluntariamente sujeita a limitações; Espírito = conseqüência necessária da existência dos outros dois. ... As palavras e ações pelas quais designamos afeto aos outros são "geradas". A atmosfera da influência inconsciente não é "gerada", mas "procedente".
Não é uma relação de qualquer modo análogo à derivação física, mas um movimento vivo da natureza divina em virtude da qual Pai, Filho e Espírito Santo, conquanto iguais em essência e dignidade, relacionam-se um com o outro em ordem de pessoalidade, ofício e operação e em virtude do que o Pai opera através do Filho e o Pai e o Filho através do Espírito.
A subordinação da pessoa do Filho à do Pai, ou, em outras palavras, uma ordem de pessoalidade, ofício e operação que permite ao Pai ser oficialmente o primeiro, o Filho o segundo e o Espírito o terceiro é perfeitamente consistente com a igualdade. Prioridade não é necessariamente superioridade.
A possibilidade de uma ordem, que ainda não envolve nenhuma desigualdade, pode ser ilustrada na relação entre marido e mulher. No ofício, o marido está em primeiro lugar e a mulher em segundo, mas a alma da mulher é tão digna como a do homem; ver 1 Co. 11.3 - "Cristo é a cabeça de todo o varão, e o varão, a cabeça da mulher; e Deus, a cabeça de Cristo". Sobre Jo. 14.28
"o Pai é maior do que eu" - ver Wescott, Bib. Com., in loco.
Edwards, Observations on the Trinity (editado por Smith), 22 - "No Filho toda a divindade e glória do Pai é como se fosse repetida e duplicada. Tudo no Pai é repetido ou novamente expresso, e plenamente, de sorte que não há nenhuma inferioridade". Edwards, Essay on the Trinity (editado por Fisher), 110-116 - "O Pai é a divindade subsistente na sua maneira excelente, não originada e em grau absolutíssimo, isto é, a divindade na sua existência direta. O Filho é a divindade gerada pelo entendimento de Deus, ou tendo uma Idéia de si mesmo e subsistindo nessa Idéia. O Espírito Santo é a divindade subsistindo nos atos, ou é a essência divina fluente e bafejada no amor infinito de Deus e a satisfação em si mesmo. Eu creio que toda a essência divina subsiste tanto na Idéia divina como no Amor divino e cada um deles é uma pessoa distinta. ... Não encontramos nenhum outro atributo de que na Escritura se diga que eles são Deus, ou que Deus é eles, a não ser Xóyoç e àyájtri, a Razão e o Amor de Deus; Luz não é diferente da Razão. ... O Entendimento pode ser predicado deste Amor. ... O Pai tem Sabedoria ou Razão pelo fato de o Filho estar nele.... O Entendimento está no Espírito Santo porque o Filho está nele". Contudo, o Dr. Edwards A. Park declara que a geração eterna é uma "tolice eterna", e pensa-se que ocultou o não publicado Ensaio sobre a Trindade de Edwards por muitos anos porque ensinava a referida doutrina.
O Novo Testamento não chama Cristo de ó 0eóç, mas de 0eóç. Com toda a franqueza reconhecemos uma subordinação eterna de Cristo ao Pai, mas sustenta-mos ao mesmo tempo que esta subordinação é de ordem, de ofício, e de operação, não o é de essência. "Non de essentia dicitur, sed de ministe- ris" (Não se diz de essência, mas de ministério). E.G. Robinson: "Geração eterna não é necessariamente subordinação e dependência eternas. Parece que até mesmo os mais ortodoxos escritores anglicanos, tais como Pearson e Hooker admitem isto plenamente. A subordinação de Cristo ao Pai não é essencial, mas simplesmente oficial. Whiton, Gloria Patri, 42,96 - "Para os primeiros trinitários a Filiação é, em primeiro lugar, que é da própria natureza de Deus tornar-se expressão visível. Por isso, a seguir, esta expressão exterior de Deus não é outra coisa além de Deus, mas é o próprio Deus, em sua própria expressão tão divino como a divindade oculta. Deste modo responderam ao grito de Filipe: 'mostra-nos o Pai, o que nos basta' (Jo. 14.8) e deste modo confirmaram a declaração de Jesus, garantiram a fé paulina de que Deus nunca se deixou sem testemunha. Com isso eles significavam: 'quem me vê a mim vê o Pai' (Jo. 14.9). ... O Pai é a vida transcendente, a Fonte divina, 'sobre todos'; o Filho é a Vida imanente, a Corrente divina, 'por meio de todos'; o Espírito Santo é a vida individualizada, 'em todos' (Ef. 4.6).
O Espírito Santo tem sido chamado 'o executivo de Deus' ". Whiton aqui está falando da Trindade econômica; porém tudo isto é muito mais verdadeiro no que se refere à Trindade imanente.
Os mesmos princípios sobre os quais interpretamos a declaração da eterna filiação de Cristo se aplicam ao procedimento do Espírito Santo a partir do Pai através do Filho e mostram que isto não é inconsistente com a igual dignidade e glória do Espírito.
Portanto, só formulamos a verdade que se expressa concretamente na Escritura e que é reconhecida em todas as épocas da igreja nos hinos e orações dirigidos ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo, quando declaramos que na natureza do Deus uno há três distinções eternas que são melhor descritas como pessoas e cada uma das quais no objeto próprio e igual da adoração cristã.
Também temos a garantia declarando que, em virtude destas distinções pessoais ou modos de subsistência, Deus existe nas relações, respectivamente, primeiro de Fonte, Origem, Autoridade e nesta relação está o Pai; segundo, de Expressão, Meio, Revelação e nesta relação está o Filho; terceiro, de Apreensão, Execução, Realização e nesta relação está o Espírito Santo.
John Owen, Works, 3.64,92 - "O ofício do Espírito Santo é o de concluir, completar, aperfeiçoar. Ao Pai atribuímos as opera naturae; ao Filho, as opera gratiae procuratae\ ao Espírito, opera gratiae applicatae". Todas as revelações de Deus se operam através do Filho ou de Espírito e este inclui aquele. Kuyper, Work ofthe Holy Spirit, designa os três ofícios respectivamente como de Causa, de Construção, de Consumação; o Pai produz, o Filho dispõe, o
Espírito aperfeiçoa. Allen, Jonathan Edwards, 365-373 - Deus é Vida, Luz, Amor. Como os Pais consideram a Razão tanto em Deus como no homem como pessoal, a onipresente segunda Pessoa da Trindade, do mesmo modo Jonathan Edwards considera o Amor, tanto em Deus como no homem, como pessoal, a onipresente terceira Pessoa da Trindade. Por isso nunca se diz que o Pai ama o Espírito, como se diz que ama o Filho - porque este amor é o Espírito. Menciona-se que o Pai e o Filho amam os homens, mas nunca se diz que o Espírito os ama porque o amor é o Espírito Santo. Mas por que Edwards não podia também sustentar que o Logos ou Razão divina habitava na humanidade de sorte que o homem seria constituído em Cristo e compartilharia com ele na imagem consubstanciai ao Pai? A natureza exterior reflete a luz de Deus e ela contém Cristo; por que não a humanidade universal"?
Moberly, Atonoment and Personality, 136,202, fala de "1. Deus. o Eterno, o Infinito, como ele mesmo; 2. Deus expressa a si mesmo na natureza e nas faculdades do homem - corpo, alma, e espírito - a consumação e a interpretação e a revelação do que a verdadeira humanidade significa e é, na sua própria verdade, na sua relação com Deus; 3. Deus como Espírito da Beleza e Santidade, presentes nas coisas criadas, animadas e inanimadas e constituindo em si a resposta divina para com Deus; constituindo acima de tudo na pessoalidade criada a plena realidade da sua resposta pessoal. Ou ainda:
O que o homem em si mesmo é invisivelmente em si mesmo; 2. sua projeção material exterior ou expressão como corpo; e 3. a resposta de que aquilo que ele é através da sua expressão e operação corporal o faz verdadeiro eco ou expressão de si mesmo". Moberly procura deste modo achar na natureza humana uma analogia com os processos interiores do divino.
VI. INESCRUTÁVEL, EMBORA NÃO AUTOCONTRADITÓRIA, ESTA DOUTRINA FORNECE A CHAVE PARA TODAS AS OUTRAS DOUTRINAS.
O modo desta existência triúna é inescrutável
É inescrutável porque não há nenhuma analogia com ela em nossa experiência finita. Por esta razão, todas as tentativas para representá-la adequadamente são vãs:
A partir das coisas inanimadas - como a fonte, a correnteza e o riacho que corre dela (Atanásio); a nuvem, a chuva e o nevoeiro que caem (Boardman); cor, forma e tamanho (F. H. Robertson); princípios actínicos, luminosos e calóricos no raio de luz (Solar Hieroglyphics, 34).
Lutero: "Quando a lógica faz objeção a esta doutrina que não se enquadra nas suas regras, devemos dizer: 'Mulier taceat in ecclesia'" (A mulher esteja calada na igreja). Lutero chamava a Trindade uma flor, na qual se pode distinguir a forma, a fragrância, e a sua eficácia medicinal. Geer encontra uma
ilustração da Trindade no espaço infinito com as suas três dimensões. Para a analogia da nuvem, chuva, névoa, ver Boardman, A mais Elevada Vida Cristã, Solar Hieroglyphics, 34 (Rev. da Nova Inglaterra, out. 18.74.789) - "A Divindade é uma unidade tripessoal e a luz é uma trindade. Sendo imaterial e homogênea e, deste modo, essencialmente una na natureza, a luz inclui uma pluralidade de constituintes ou, em outras palavras, é essencialmente três na constituição, seus princípios constituintes são: o actínico, o luminífero, e o calorífico; na gloriosa manifestação a luz é uma, criada, constituída, e o emblema ordenado do Deus tripessoal" - de quem se diz que "Deus é luz e nele não há treva nenhuma" (1 Jo. 1.5). Os raios actínicos são por si mesmos invisíveis; só se vêem como manifestos luminíferos; só se sentem como caloríficos.
Joseph Cook: "A luz solar, o arco-íris, o calor - uma radiação solar; Pai, Filho, Espírito Santo, um só Deus. Como o arco-íris, quando desdobrado, mostra o que é a luz, assim Cristo revela a natureza de Deus. Como o arco- íris é a luz revelada, do mesmo modo Cristo o é em Deus, e o Espírito, representado pelo fogo é a vida contínua de Cristo". Ilustrações mais rudes são as de Oon Paul Krüger: o azeite, o pavio, a chama, na lamparina; e Agostinho: a raiz, o tronco e os ramos, todos de uma mesma madeira, na árvore. Na ilustração de Geer, acima, das três dimensões do espaço, não podemos demonstrar que não haja um quarto, além da distância, da amplidão, da espessura, não podemos conceber a sua existência. Como estas três esgotam, até onde sabemos, todos os modos possíveis do ser material, do mesmo modo não podemos conceber uma quarta pessoa em Deus.
A partir da constituição ou processo das nossas mentes - como a unidade psicológica intelecto, sentimento e vontade (substancialmente sustentada por Agostinho); a unidade lógica tese, antítese e síntese (Hegel); a unidade metafísica sujeito, objeto, sujeito-objeto (Melanchton, Olshausen, Shedd).
Agostinho: "Mens meminit sui, intelligit se, diligit se; si hoc cernimus, Trini- tatem cernimus". ... [A mente lembra de si, compreende-se a si mesma, honra-se a si mesma; se percebemos isto, percebemos a Trindade], Existo, tenho consciência, tenho vontade; existo como consciente e quero; estou consciente de existir e de querer; quero existir e ser consciente; e estas três funções, embora distintas, são inseparáveis e formam uma vida, uma mente, uma essência. Calvino chama o ponto de vista de Agostinho de "especulação longe de ser sólida". Mas o próprio Agostinho disse: "Se pedirem que definamos a Trindade, apenas podemos dizer que não é isto ou aquilo" (podemos dizer o que não é). João Damasceno: "tudo o que sabemos da natureza divina é que ela não deve ser conhecida". Com isso, contudo, tanto Agostinho como João Damasceno significam que o modo preciso da existência triúna de Deus não se acha revelado e é inescrutável.
Hegel, Philos. Relig., trad., 3.99,100 - "Deus é, mas ao mesmo tempo é o Outro, o próprio diferenciador, no sentido de que este é o próprio Deus e tem potencialmente em si a natureza divina e que a abolição dessa diferença, desta caraterística de ser o outro, esta volta, este amor, é o Espírito". Hegel
chama Deus de "Idéia absoluta, unidade de Vida e Cognição, a Universal que pensa por si mesma e se reconhece numa Realidade infinita, a partir da qual, com sua caraterística imediata não menos se distingue de si outra vez". A doutrina geral de Hegel é que a mais elevada unidade deve ser achada apenas através do mais completo desenvolvimento e reconciliação do mais profundo e amplo antagonismo. O ser puro é o nada puro; devemos morrer para viver. A Luz é a tese, a Escuridão é a antítese, a Sombra é a síntese, ou união de ambas. A Fé é a tese, a Descrença é a antítese, a Dúvida é a síntese, ou união de ambas. Zweifel (dúvida) vem de Zwei (dois) como a palavra dúvida vem de 8úo (dois). Hegel chamava Napoleão de "ein Weltgeist zu Pfer- de" (um espírito do mundo a cavalo). Ladd, Introd. to Philosophy, 202, fala do monótono tit-tat-too da lógica hegeliana". Ruskin fala dela como "pura, definida, sem sentido". No princípio hegeliano o bem e o mal não podem ser contraditórios entre si; sem o mal não poderia haver o bem. Stirling com propriedade intitulou a sua exposição da filosofia hegeliana de "O Segredo de Hegel", e os seus leitores freqüentemente assinalaram que, se Stirling descobrisse o segredo, ele nunca o tornaria conhecido.
O Lorde Coleridge disse a Robert Browning que ele não podia entender toda a sua poesia. "Bem", respondeu o poeta, "se um leitor do seu calibre entender dez por cento do que eu escrevo, devo dar-me por contente". Quando disseram a Wordsworth que o Sr. Browning tinha se casado com a senho- rita Barrett, ele disse: "É uma boa coisa que os dois se entendam, porque, senão, ninguém os entenderá". Um aluno trouxe a Hegel uma passagem dos escritos deste e pediu-lhe a interpretação. O filósofo a examinou e respondeu: "Quando essa passagem foi escrita, havia duas pessoas que conheciam o seu sentido: Deus e eu mesmo. Agora há apenas um: Deus". Heinrich Heine, falando do efeito do hegelianismo sobre a vida religiosa de Berlin, diz: "Eu poderia acomodar-me ao próprio cristianismo acomodado, filtrado de toda superstição que poderia ter havido nas igrejas e que estava livre da divindade de Cristo, como a sopa de tartaruga sem a tartaruga". Quando os sistemas alemães de filosofia morrerem, os seus fantasmas se levantarão em Oxford. Mas se eu vejo um fantasma sentado numa cadeira, atrevidamente, ele se ofenderá e irá embora.
A mais satisfatória exposição da analogia de sujeito, objeto, sujeito-objeto encontra-se em Shedd, History of Doctrine, 1.365, nota 2. Moberly, Atonement and Personality, 174, tem semelhante analogia: 1. O eu invisível do homem;
a expressão visível dele mesmo num quadro ou poema; 3. a resposta deste quadro ou poema para ele mesmo. Sustenta-se que a analogia da família é melhor porque nenhuma pessoalidade do homem é completa em si mesma; marido, mulher e filhos são necessários para tornar perfeita a unidade. Allen, Jonathan Edwards, 372, diz que, na igreja primitiva a Trindade era a doutrina da razão; na Idade Média era um mistério; no século dezoito era o dogma sem sentido ou irracional; ainda no século dezenove tornou-se a doutrina da razão, verdade essencial à natureza de Deus. Para a caraterização de Allen sobre os estágios na história da doutrina acrescentaríamos que, atualmente, não podemos dizer que é possível uma completa exposição da Trindade. A Trindade é um fato único, cujos aspectos diferentes podem ser ilustrados, enquanto, como um todo, não tem analogia. O máximo que podemos dizer é
que a natureza humana, nos seus processos e poderes, aponta para algo mais elevado que ela mesma e que, em Deus, a Trindade é necessária a de constituir a perfeição do ser que o homem procura como objeto do amor, adoração e serviço.
Nenhuma destas fornece qualquer apropriada analogia da Trindade porque em nenhuma delas se acha o elemento essencial da tripessoalidade. Tais ilustrações podem às vezes ser usadas para desarmar a objeção, mas não fornecem nenhuma explicação para o mistério da Trindade e, a não ser cuidadosamente resguardadas, podem levar a cruel erro.
A Doutrina da Trindade não é autocontraditória
Deveria sê-lo só se declarasse que Deus é três no mesmo sentido numérico em que se diz ser um. Não declaramos isto. Declaramos simplesmente que o mesmo Deus que é um a respeito de sua essência é três em relação às suas distinções internas de tal essência, ou a respeito dos modos de seu ser. Não se pode negar tal possibilidade a não ser admitindo que a mente humana é em todos os respeitos a medida da divina.
O fato de que a escala ascendente da vida é marcada pela crescente diferenciação de faculdade e função deve levar-nos principalmente a esperar no mais elevado de todos os seres uma natureza mais complexa do que a nossa. No homem muitas faculdades se unem em um ser inteligente e, quanto mais inteligente for o homem mais distintas se tornarão tais faculdades umas das outras; até que o intelecto e o sentimento, consciência e vontade admitam uma independência relativa e apareça até mesmo a possibilidade de conflito entre elas. Nada há de irracional ou autocontraditório na doutrina de que em Deus as principais funções são ainda mais notadamente diferenciadas, de modo a torná-las pessoais, enquanto ao mesmo tempo tais pessoalidades se unem pela fé em que cada uma delas e de igual modo manifestam a indivisível essência.
A unidade é tão essencial à Divindade como a triplicidade. O mesmo Deus, em certo sentido é três, noutro é um. Não dizemos que um Deus é três Deuses, nem que uma pessoa é três pessoas, nem que três Deuses são um Deus, mas que há um Deus com três distinções no seu ser. Não nos referimos às faculdades do homem que fornecem qualquer analogia apropriada às pessoas da Divindade; ao invés disso negamos que a natureza humana forneça tal analogia. Intelecto, sentimento e vontade no homem não são pessoalidades distintas. Se fossem pessoalizados poderiam fornecer tal analogia. F. W. Robertson, Sermons, 3.58, fala a respeito de Pai, Filho e Espírito Santo melhor concebidos sob a figura de intelecto, sentimento e vontade pessoalizados. Com isto concordam as palavras de Sócrates, que chamava o pensamento de conversa consigo mesmo.
SI. 86.11 - "une o meu coração ao teu nome" - indica uma complexidade de forças no homem e uma possível desorganização devida ao pecado. Só o temor e o amor de Deus podem reduzir nossas faculdades à ordem e dar-nos paz, pureza e força. Quando William depois de muito tempo de corte propôs um casamento, Maria lhe disse que ela "unanimemente consentia". "Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de toda a tua força, e de todo o teu entendimento" (Lc. 10.27). O homem não pode ter uma vida dual, uma vida dupla, como a de Dr. Jekyll e Sr. Hyde. A vida boa é a unificada. H. H. Bowden: "Teoricamente o desenvolvimento simétrico é o critério completo. Este é o velho conceito grego de vida perfeita. O termo que traduzimos por 'temperança' ou 'autocontrole' é expresso de melhor forma por 'mente integral' ".
Illingworth, Personality Divine and Human, 54-80 - "Nosso senso de pessoalidade culmina com a Doutrina da Trindade. A pessoalidade do homem é essencialmente triúna, porque consiste num sujeito, um objeto, e a relação deles. O que é a potencial triunidade no homem é completa em Deus. ... Nossa própria pessoalidade é triúna, mas é uma triunidade potencial irrea- lizável, incompleta em si mesma e deve ir além de si mesma por inteireza, como por exemplo na família. ... Mas a pessoalidade de Deus nada tem de potencial ou irrealizável a seu respeito. ... Trindade é o modo mais inteligível de conceber Deus como pessoal".
John Caird, Fundamental Ideas of Christianity, 1.59,60 - "As partes de uma pedra são precisamente iguais; as partes de um hábil mecanismo são diferentes umas das outras. Em qual dos dois casos a unidade é mais real - em qual delas há ausência de distinção, ou em qual delas há diferença essencial de forma e função, e cada parte separada tem uma individualidade e atividade própria? As mais elevadas unidades não são simples; são complexas". Gordon, Christ of To-day, 106 - "Todas coisas e todas pessoas são modos de uma consciência infinita. Por isso não é incrível que possa haver três consciências em Deus. Além das múltiplas pessoalidades finitas há três pessoalidades infinitas. Na Divindade o socialismo pode ser a base da sociedade humana.
Os fenômenos da dupla ou mesmo da tripla consciência no mesmo indivíduo confirmam este ponto de vista. Este fato de mais de uma consciência numa criatura finita aponta para a possibilidade de uma tríplice consciência na natureza de Deus. Romanes, Mind and Motion, 102, sugere que o organismo social, se alcança o nível mais elevado da perfeição psíquica, pode ser dotado de pessoalidade e tem algo semelhante a ela - fenômenos do pensamento e conduta que nos compelem a conceber famílias e comunidades e nações como tendo um tipo de personalidade moral que implica responsabilidade e prestação de contas. "O Zeitgeist", diz ele, "é o produto de um tipo de psicologia coletiva, que é algo além da soma de todas as mentes individuais de uma geração". Nós não defendemos que qualquer uma dessas consciências fragmentares ou coletivas alcança a pessoalidade no homem, ao menos na vida presente. Defendemos que elas indicam que é possível uma vida maior e mais complexa do que aquela de que temos experiência comum, e que não há nenhuma contradição necessária na doutrina de que na natureza do Deus perfeito há três distinções pessoais. R. H. Hutton: "Pode-se esperar que uma auto-revelação voluntária revele até mesmo as mais profundas com-
plexidades das relações espirituais na sua natureza e essência eternas do que supomos que existam na nossa humanidade - a simplicidade de uma complexidade harmônica, não a simplicidade da unidade absoluta".
A doutrina da Trindade tem importantes relações com outras doutrinas
É essencial a qualquer apropriado teísmo.
Nem a independência de Deus nem a bênção de Deus podem ser mantidas em bases de unidade absoluta. O antitrinitarismo toma quase necessariamente a criação indispensável à perfeição de Deus, tende a uma crença na eternidade da matéria e, por fim, conduz, como o maometanismo e moderno judaísmo e unitarismo ao Panteísmo. "A um ser solitário é impossível o exercício do amor". Sem a Trindade não podemos sustentar uma unidade viva em Deus.
Brit. And For. Evang. Fteview., jan. 1882.35-63 - "O problema é encontrar um objetivo perfeito, harmônico e adequado, à inteligência perfeita, e a resposta é: 'uma perfeita inteligência'". O autor deste artigo cita James Martineau, o filósofo unitário, como segue: "Há apenas um recurso para completar a necessária objetividade de Deus, a saber, admitir de alguma forma a coexistência da matéria como condição ou meio da atuação ou manifestação divina. Falhando a prova [da origem absoluta da matéria] restam-nos a causa divina, e a condição material de toda a natureza, na presença eterna e sua relação, como o objeto supremo e o objeto rudimentar". Ver também Martineau, Study, 1.405 - "Ao negar que seja possível uma pluralidade de existências próprias, refiro-me apenas às causas da mencionada existência própria. Existência própria que não de modo nenhum deve ser excluída, até onde podemos ver, por uma existência própria que é uma causa; ora, ela é requerida até mes mo para o exercício da sua causalidade". Vemos aqui que o unitarismo de Martineau logicamente conduz ao dualismo. Mas a bem-aventurança de Deus, baseada neste princípio, requer não simplesmente um universo eterno, porque nada fornece objeto menos adequado a uma mente infinita. Um Deus que se limita necessariamente ao universo, que não é ele mesmo, existe eternamente, não é infinito, independente ou livre. A única saída para esta dificuldade é negar a autoconsciência e autodeterminação de Deus ou, em outras palavras, a mudança do nosso teísmo para o dualismo, e o nosso dualismo para o panteísmo.
E. H. Johnson, Biblia Sacra, jul., 1892.379, cita da Oxenham's Catholic Doctrine of the Atonement, 108,109 - "Há quarenta anos James Martineau escreveu a Macdonald: 'Nem a minha preferência intelectual nem a minha admiração moral caminha com os heróis, seitas e produções unitários, de qualquer época. Ebionitas, Arianos, Socinianos parecem-me todos desfavoravelmente em contraste com os seus opositores em apresentar, no seu todo, um tipo de pensamento menos digno do gênio do cristianismo'. Em seu jornal
intitulado Um Meio da Controvérsia Unitária, Martineau diz que o unitário adora o Pai; o trinitário, o Filho: 'Mas o Filho em um credo é o Pai em outro. ... Os dois credos concordam naquilo que constitui a seiva e o cerne de ambos. O Pai é Deus em sua essência original. Mas Deus manifesta-se no Filho' O Dr. Johnson acrescenta: "Deste modo Martineau, após uma vida inteira de serviço prestado ao púlpito e ao magistério unitário, publicamente aceita como verdade a substância daquilo que, em comum com a igreja, ele achou proveitoso e diz aos unitários que eles e nós adoramos o Filho porque tudo o que sabemos acha-se revelado na atuação do Filho". Após ter chegado aos oitenta, Martineau saiu do grupo unitário embora nunca se tivesse ligado a qualquer igreja trinitária.
C. Minton, em Princeton Rev., 1903.655-659, citou alguns dos mais significativos pronunciamentos, tais como: "A grande força da doutrina ortodoxa está, sem dúvida, no apelo que ela faz ao 'senso de pecado' interior - o triste peso cujo fardo oprime toda a alma séria. A grande fraqueza do unitaris- mo tem sido a sua insensibilidade quanto à tristeza permanente da consciência humana. Mas o remédio ortodoxo, sem dúvida, é o mais terrível de todos os equívocos, a saber, livrar-se do fardo, lançando-o sobre Cristo, ou permitindo-lhe que o leve. ... Da minha parte, eu mesmo busquei a literatura para o meu sustento e inspiração da Fé, Esperança e Amor que é quase o produto das versões ortodoxas da religião cristã. Os hinos dos Wesley, as orações dos Amigos, as Meditações da Lei e Tauler têm uma força despertadora e eleva- dora que dificilmente eu sinto nos bons livros das nossas estantes unitárias. ... Contudo, eu posso me apropriar menos, ou até recusar intelectualmente qualquer artigo carateristicamente trinitário sobre o esquema da salvação".
Whiton, Gloria Patri, 23-26, procura harmonizar as duas formas da crença afirmando que "tanto os trinitários quanto os unitários consideram a natureza humana essencialmente una com a divina. Os Pais nicenos edificaram melhor que sabiam quando declararam Cristo homoousios com o Pai. Afirmamos a mesma coisa a respeito da humanidade". Mas aqui Whiton vai além do que a Escritura garante. De ninguém a não ser o Filho unigênito se pode dizer que é antes que Abraão nascesse e que nele habita corporalmente toda a plenitude da divindade (Jo. 8.57; Cl. 2.9).
O unitarismo tem demonstrado repetidamente sua insuficiência lógica através deste "facilis descensus Averno", este lapso entre o teísmo e o panteísmo. Na Nova Inglaterra o alto arianismo de Channing degenerou-se no panteísmo meio alado de Theodore Parker e no totalmente alado de Ralph Wando Emerson. O moderno judaísmo é panteísta quanto à sua filosofia e também o era a filosofia arábica do maometismo. Sente-se que a simples pessoalidade é insuficiente para a concepção de perfeição absoluta da mente. Nós evitamos pensar num Deus eternamente só. "Refugiamo-nos no termo 'divindade'. Os literatos encontram consolo falando em 'deuses'". Tweten (traduzido em Biblia Sacra, 3.502) - "Pode haver no politeísmo um elemento de verdade, apesar de desfigurado e mal entendido. João Damasceno orgulhava-se de que a Trindade cristã estava a meio caminho entre o monoteísmo abstrato dos judeus e o politeísmo idólatra dos Gregos". Tweten, citado por Shedd, Dogm. Theology, 1.255 - "Existe um 7tXiípcona em Deus. A Trindade não contradiz a unidade, mas só a solidão que é inconsistente com a plenitude e bem-aventu- rança vivas atribuídas a Deus na Escritura e que Deus possui em si mesmo independentemente do finito". O próprio Shedd assinala: "A tentativa do deís- ta e do sociniano de construir a doutrina da unidade divina é um erro, porque deixa de construir a doutrina da pessoalidade divina. Por implicação ela questiona que Deus tenha conhecimento de si próprio como simplesmente um sujeito, sem objeto; sem as distinções que, contemplando, o sujeito envolve o objeto contemplado e a percepção da identidade de ambos".
Mason, Faith of the Gospel, 75 - "Deus não é uma unidade estéril e imóvel". Bispo Phillips Brooks: "O unitarismo tem a noção de Deus como isolado e individual como é possível torná-la e está morrendo em sua fraca deidade". O unitarismo não é a doutrina de um Deus - porque o trinitarismo também sustenta isto; ao invés disto é a unipessoalidade de um Deus. A natureza divina demanda ou um Cristo eterno ou uma criação eterna. O Dr. Calthorp, unitário, de Siracusa, por isso, consistentemente declara que "Natureza e Deus são a mesma coisa". É a velha adoração de Baal e Astarote - a deificação da força e do prazer. Porque "Natureza" inclui tudo - todos impulsos tanto maus como bons. Quando o homem descobre a gravidade, ele não descobre Deus, mas apenas uma das manifestações dele.
Gordon, Christh ofTo-day, 112 - "A suprema divindade de Cristo é apenas a expressão soberana da história humana da grande diferença de identidade que percorre o universo inteiro e que tem a sua sede no coração de Deus". Até mesmo James Freeman Clarke, em sua Ortodoxia, em Thruths and Errors, 436, admite que "existe uma verdade essencial oculta na idéia da Trindade. Enquanto a doutrina da igreja, em cada forma que assumiu, deixou de satisfazer o intelecto humano, o coração dos homens apegou-se à substância contida em todos eles". William Adams Brown: "Se, por natureza, Deus é amor, ele deve também por natureza ser social. Paternidade e Filiação nele devem ser imanentes. Nele removem-se as limitações da pessoalidade finita". Mas o Dr. Brown erroneamente acrescenta: "Estão abertos nesta doutrina não os mistérios do ser de Deus, como ele é em si, mas como ele se revela". Do mesmo modo P. S. Moxom: "Não sei como é possível atribuir qualquer qualidade moral a uma pessoa que é absolutamente alheia a relações com outras pessoas. Se se concebesse Deus como um solitário no universo, ele não poderia ser caraterizado como justo". Mas o Dr. Moxom erroneamente pensa que essas pessoalidades morais devem ser exteriores a Deus. Sustentamos que a justiça, como o amor, requer só pluralidade de pessoas dentro da Divindade.
W. L. Walker, Christian Theism, 317, cita o Dr. Paul Carus, Primer of Philosophy, 101 - "Não podemos conceber Deus sem atribuir-lhe trindade. Uma unidade absoluta seria uma inexistência. Pensar em Deus como real e ativo envolve uma antítese que pode ser formulada como Deus e o Mundo, ou natura naturans e natura naturata, ou de alguma outra forma. Esta antítese já implica a concepção de trindade. Quando pensamos em Deus, não só como aquele que é eterno e imutável na existência, mas também como aquilo que muda, desenvolve-se, e evolui não podemos escapar ao resultado e devemos nos encaminhar para a idéia de um Deus triúno. A concepção de um Deus-homem, de um Salvador, e de um Deus revelado na evolução apresenta a antítese do Deus Pai e do Deus Filho e a própria concepção deste relacio-
namento implica Deus Espírito Santo, que procede de ambos". A confissão de uma Trindade econômica é racional apenas no que implica uma trindade imanente e eterna.
É essencial a qualquer apropriada revelação.
Se não houver Trindade, Cristo não é Deus e não pode conhecer ou revelar perfeitamente Deus. O cristianismo não mais é a revelação una, total e final, porém só um dos muitos sistemas conflitantes e competitivos, dos quais cada um tem sua parcela de verdade, mas também sua parcela de erro. Assim também com o Espírito Santo. "Como Deus só pode ser revelado através de Deus assim também pode-se apropriar dele só através de Deus. Se o Espírito Santo não for Deus, então o amor e a autocomunicação de Deus à alma humana não são uma realidade". Em outras palavras, sem a doutrina da Trindade retomaremos à mera religião natural e ao deísmo do Deus distante, - e, por fim, muda-se em panteísmo da forma já mencionada.
Martensen, Dogmatics, 104: Thomasius, Chrísti Person und Werk, 156.
Se Cristo não é Deus, ele não pode conhecer perfeitamente a si mesmo, e o testemunho de si mesmo não tem nenhuma autoridade independente.
Na oração o crente tem evidência prática da Trindade e pode perceber o valor da doutrina; porque ele vem a Deus Pai, em nome de Cristo, e ensina como orar corretamente através do Espírito Santo. Ver Rm. 8.27 - "Ele examina os corações [i.e., Deus] sabe qual é a intenção do Espírito; e é ele que segundo Deus intercede pelos santos". Ver também, Godet sobre Jo. 1.18 - "Deus nunca foi visto por alguém. O Filho unigênito, que está no seio do Pai, este o fez conhecer"; note aqui a relação entre o &v e è^eyriaa-to. Napoleão I:
"O cristianismo diz com simplicidade: 'Ninguém viu Deus a não ser Deus'".
Jo. 16.15 - "Tudo quanto o Pai tem é meu; por isso vos disse que há de receber do que é meu e vo-lo há de anunciar"; aqui Cristo reivindica para si tudo que pertence a Deus e declara que o Espírito Santo o revelará. Só o Espírito divino pode fazer isso do mesmo modo que só o Cristo divino pode impedir a mão não presunçosa de tomar tudo o que pertence ao Pai.
O agnóstico estará perfeitamente correto em suas conclusões, se não houver Cristo, se não houver meio de comunicação, se não houver princípio de revelação na Divindade. Só o Filho revelou o Pai. Até mesmo Royce, em seu Spirít of Modem Philosophy, fala da existência da influência de um eu infinito, ou Logos, ou Mente do Mundo, de que todas as mentes individuais são partes ou pedacinhos e de cuja escolha sem fim participamos. Alguns desses princípios na natureza divina devem ser assumidos se o cristianismo é a revelação completa e suficiente da vontade de Deus ao homem. O ponto de vista unitário considera a religião de Cristo como apenas "uma das atuais obras da humanidade um momento evanescente no avanço incessante da raça. Por outro lado, o cristão considera Cristo como o único revelador de Deus, o único Deus com quem temos que ver, a autoridade final em religião, a fonte de toda a verdade e o juiz da humanidade. "O céu e a terra passarão, mas as minhas palavras não hão de passar" (Mt. 24.35). A ressurreição dos justos e dos injustos será a sua obra (Jo. 5.28), e a retribuição futura será "a ira do Cordeiro" (Ap. 6.16). Visto que Deus nunca pensa, diz ou faz qualquer coisa, a não ser através de Cristo e, visto que Cristo faz a sua obra no coração humano só através da obra do Espírito Santo, podemos concluir que a doutrina da Trindade é essencial a qualquer revelação apropriada.
É essencial a qualquer redenção apropriada.
Se Deus for absoluta e simplesmente um, não pode haver nenhuma mediação ou expiação porque o abismo entre Deus e a mais exaltada criatura é infinito. Cristo não pode aproximar-nos de Deus mais do que ele mesmo. Só alguém que é Deus pode reconciliar-nos com Deus. Assim, também, só alguém que é Deus pode purificar nossas almas. Um Deus que é só unidade, mas em quem não há pluralidade, pode ser nosso juiz, mas, até onde podemos ver, não pode ser nosso salvador ou santificador.
"Deus é o caminho para ele mesmo". "Nada de humano sustenta diante de Deus e nada a não ser Deus pode satisfazer Deus". Por isso, o melhor método de se argumentar com os unitários é despertar o senso de pecado; porque a alma que tem qualquer convicção apropriada dos seus pecados sente que só um Redentor infinito pode salvá-la. Por outro lado, a pouca avaliação do pecado está logicamente em conexão com um baixo ponto de vista da dignidade de Cristo. Twesten, traduzido em Biblia Sacra, 3.510 - "Parece não ser um mero acidente que o pelagianismo, quando logicamente levado a efeito, como por exemplo entre os socinianos, sempre conduziu ao unitaris- mo". Na ordem reversa, também, é manifesto que a rejeição da deidade de Cristo deve tender a tornar mais superficiais os pontos de vista do pecado e da culpa e do castigo de que Cristo veio salvá-los e, com isso, matar o sentimento religioso e cortar as ligações de todo o esforço evangelizante e missionário (Jo. 12.44; Hb. 10.26). Ver Arthur, sobre a Divindade do nosso Senhor a respeito da sua obra da Expiação, em Present Day Tracts, 6. ns 35; Ellis, citado por Watson, Theol. Inst., 23; Gunsaulus, Transfig. of the Christ, 13 - "Temos tentado ver Deus à luz da natureza, enquanto ele diz: 'Na tua luz veremos a luz' (SI. 36.9)". Devemos ver a natureza à luz de Cristo. Só se alcança a vida eterna através do conhecimento de Deus em Cristo (Jo. 16.9). Conseqüentemente, aceitar Cristo é aceitar Deus; rejeitar Cristo é dar as costas para Deus: Jo. 12.44 - "Quem crê em mim crê não em mim, mas naquele que me enviou"; Hb. 10.26,29 - "não resta mais sacrifício pelos pecados. ... [para aquele] que pisar o Filho de Deus".
No centro de Midlothian [SE da Escócia], Jeanie Deans vai a Londres para assegurar o perdão da sua irmã. Com as vestes de camponesa, ela não pode dirigir-se ao rei porque ele não a receberá. Dirige-se a um mordomo escocês em Londres; através dele, ao Duque de Argyle; através dele, à Rainha; através da Rainha, ela recebe o perdão do Rei, que ela nunca vê. Esta era a intervenção medieval. Mas agora vamos diretamente a Cristo e isto nos basta, porque ele mesmo é Deus (The Outlook). Uma ocasião um homem foi à cela de um assassino convicto, a pedido de sua mulher e pediu que ele confessasse o seu crime e aceitasse a Cristo, mas ele se recusou. O falso clérigo era o governador, com o perdão que se propunha a dar caso o assassino, caso se arrependesse. A. H. Strong, Christ in Creation, 86 - "Eu ouvi dizer que, durante a nossa Guerra Civil, um oficial fanfarrão, bêbado, blasfemo insultou e quase atirou do estaleiro de Alexandria um homem inofensivo em trajes civis; mas ouvi dizer que o mesmo oficial voltou-se pálido, caiu de joelhos e pediu misericórdia enquanto o homem exigiu a sua espada, deu-lhe voz de prisão e deu-se a conhecer como General Grant. Podemos abusar e rejeitar o Senhor Jesus Cristo e fantasiar que ignoramos as suas reivindicações e desobedecer as suas ordens com impunidade; mas a coisa parece mais séria quando por fim achamos que aquele de quem abusamos e rejeitamos outro não é senão o Deus vivo diante de cuja barra de tribunal nós nos encontramos".
Henry B. Smith no começo da vida tinha influência unitária e forte preconceito contra a doutrina evangélica, especialmente a da depravação e da divindade de Cristo. No ano da conclusão do curso superior ele se converteu. Cyrus Hamlin diz: "Considero a conversão de Smith como o acontecimento mais notável da minha época na Faculdade". As dúvidas sobre a depravação desvaneceram-se quando, de relance, ele olhou para o seu próprio coração; as dúvidas a respeito da divindade de Cristo não resistiram diante da sua confissão: "De uma coisa estou seguro: Necessito de um Salvador infinito".
Eis aqui a força última da doutrina trinitária. Quando o Espírito Santo convence o homem do pecado, e o põe frente a frente com a ultrajada santidade e com o amor de Deus, ele é movido a clamar das profundezas da sua alma: "Ninguém, a não ser o Salvador infinito, jamais pode salvar-me"! Só em um Cristo divino - que por nós suportou a Cruz, e em nós através do seu Espírito
pode a alma convencida encontrar paz e descanso. Deste modo todo o avivamento da verdadeira religião dá novo impulso à doutrina da Trindade. Henry B. Smith escreveu no fim da sua vida: "Quando a doutrina da Trindade foi abandonada, outros artigos de fé tais como a expiação e a regeneração, quase sempre se seguiram, por necessidade lógica, como quando se tira o fio de um colar de gemas, estas se desprendem".
É essencial a qualquer modelo apropriado de vida humana.
Se não há Trindade imanente na natureza divina, então a paternidade em Deus teve um começo e pode ter um fim; A filiação, contudo, não mais é perfeição, porém imperfeição, ordenada com um propósito temporário. Mas se a doação paternal e o recebimento filial são eternos em Deus, então a lei do amor requer de nós conformidade com Deus em ambos estes respeitos como a mais elevada dignidade de nosso ser.
Ver Hutton, Essays, 1.232 - "A Trindade nos fala de algo da natureza absoluta e essencial de Deus; não somente o que ele é para nós, mas o que ele é em si mesmo. Se Cristo é o eterno Filho do Pai, Deus é na verdade e na
essência o Pai; a natureza social, o surgimento do amor é a própria essência do Ser eterno; a comunicação da vida, a reciprocidade de afeto vai aiém do tempo, pertence ao próprio ser de Deus. A idéia unitária de um Deus solitário afeta profundamente a nossa concepção de Deus e a reduz a uma simples força e identifica Deus com a causa e pensamento abstratos. O amor baseia- se na força, não a força no amor. O Pai surge no gênio onisciente e onipotente do universo". Portanto, 1 Jo. 2.23 - "Qualquer que nega o Filho também não tem o Pai". D'Arcy, Idealism and Theology, 204 - "Se Deus for simplesmente uma grande pessoa então temos que pensar nele como esperando até que o processo todo da criação se tenha completado antes que o seu amor possa encontrar um objeto ao qual se entregue. Nesse caso, o seu amor pertence, não à sua íntima essência, mas à relação com as suas criaturas. As palavras 'Deus é amor' (1 Jo. 4.8) tornam-se um exagero retórico, ao invés de expressão de uma verdade acerca da natureza divina".
Hutton, Essays, 1.239 - "Precisamos também da inspiração e auxílio de uma perfeita vontade filial. Não podemos conceber o Pai participando dessa atitude dependente do espírito que é a nossa principal necessidade espiritual. É a perfeição do Pai que origina - a do Filho recebe. Necessitamos de simpatia e auxílio nesta vida receptiva; daí o auxílio do verdadeiro Filho. A humildade, o sacrifício próprio, a submissão, são celestes, eternos, divinos". A vida filial de Cristo é a raiz de toda a vida filial em nós. Ver Gl. 2.19,20
"não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim; e a vida que eu vivo na carne vivo-a na fé que está no Filho de Deus, que me amou e deu a sua vida por mim". Thomas Erskine de Linlathen, The Spiritual Order, 233 - "Não existe nada de degradante nesta dependência porque participamos dela com o Filho eterno". Gore, Incarnation, 162 - "Deus pode limitar-se através das condições da humanidade, porque, em si, Deus contém eternamente o protótipo do sacrifício próprio e limitação própria humanos, porque Deus é amor".
Sobre as trindades pagãs, ver Bib. Repository, 6.116; Christlieb, Mod. Doubt and Christian Belief, 266,267 - "Lao-tsé, 600 a.C., diz: 'Tao, o princípio inteligente de todos os seres, é por natureza um; o primeiro gerou o segundo; ambos geraram o terceiro; estes três fizeram todas as coisas' ". A Tríada egípcia de Abidos era Osíris, sua mulher ísis, e seu Filho Hórus. Mas estes não eram pessoas de verdade; porque não só o Filho procedia do Pai, mas o Pai procedia do Filho; a trindade egípcia era panteísta quanto ao sentido. Ver Renouf, Hibbert Lectures, 29; Rawlinson, i, 46,47. A Trindade dos Vedas era Diaus, Indra, Agni. Seria derivada das três dimensões do espaço? Ou da família - pai, mãe, filho? O homem cria Deus à sua imagem e vê a vida familiar em Deus?
A Trimúrti brâmane, ou Trindade, cujos membros são Brama, Vishnu, Shiva
fonte, sustento, fim - é a personificação do todo panteístico, que habita de igual modo nos bons e nos maus, em deus e no homem. Os três são representados pelas três letras místicas da sílaba Om, ou Aum, e, em Elefanta, através da imagem de três cabeças e um corpo. Os lugares dos três são revezados. Williams: "Nas três pessoas apresenta-se um só Deus; cada uma em primeiro lugar, cada uma em último, nenhuma sozinha; de Shiva, Vishnu, Brama, cada uma pode ser Primeira, segunda, terceira entre as três benditas". Há dez encarnações de Vishnu para a salvação dos homens nos vários tempos de necessidade; e um espírito que temporariamente investe-se de qualidades da matéria reduz-se à sua essência original no fim do eon (Kalpa). Esta é apenas uma forma grosseira do sabelianismo, ou de uma Trindade modal. Segundo Renouf não é mais antiga do que 1400 A.D. O budismo, em tempos mais tardios tinha a sua Tríada. O primeiro princípio, Buda, ou Inteligência, associado com o princípio da matéria, Darma, ou Lei, através da influência combinadora de Sanga, ou ordem, princípio mediador.
A trindade grega compunha-se de Zeus, Atena e Apoio. Apoio ou Lixos (Xóyoq) profere as decisões de Zeus. "Estes três ultrapassam os outros deuses no caráter moral e no cuidado providencial sobre o universo. Eles mantêm tão estreitos e caros relacionamentos recíprocos de que se pode dizer que 'concordam em um' ". Contudo, a trindade grega, enquanto nos apresenta três pessoas, não nos apresenta unidade de essência. É um sistema de triteísmo. Plotino, 300 A.D. apresenta-nos uma trindade filosófica em seu to év, ó votiç, li v"n)XTi.
Watts, New Apologetic, 195 - As trindades pagãs são "fragmentos residuais do conhecimento perdido de Deus, não estágios diferentes num processo de evolução teológica, mas evidência de uma degradação moral e espiritual". John Caird, Fund. Ideas of Christianity, 92 - "Nos Vedas as várias divindades individuais não estão separadas por dura e rápida distinção recíproca. Elas apenas são nomes para um todo indivisível de que a divindade particular invocada num determinado tempo é o tipo ou representação. Há um reconhecimento latente de uma unidade sob toda a multiplicidade dos objetos de adoração. Nunca se emprega o elemento pessoal ou antropomórfico como na mitologia grega e romana. A pessoalidade atribuída a Mitra ou a Varuna ou a Indra ou Agni dificilmente é mais real do que o nosso moderno céu sorridente, ou a nossa ciosa brisa ou lamentoso e taciturno incansável mar. 'Há apenas um', dizem eles, 'embora os poetas o chamem por diferentes nomes'. O céu de total alcance, a poderosa natureza é a realidade atrás de cada uma destas manifestações parciais. O elemento panteístico implícito na fase védica da religião hindu torna-se explícita no bramanismo e, em particular, nos assim chamados sistemas hindus de filosofia e nos seus poemas épicos. Eles procuram encontrar no fluxo e variedade das coisas a permanente essência subjacente. Isto é Brama. Deste modo Espinosa procurava repousar na substância eterna e queria ver as coisas "sob a forma da eternidade'. Todas as coisas e seres são formas de um todo, da substância infinita que chamamos Deus".
O agrupamento das religiões pagãs segundo uma trindade em Deus, juntamente com a sua incapacidade de construir o seu esquema, são evidências de uma vontade racional na natureza humana que só a doutrina cristã é capaz de fornecer. Este poder de satisfação das mais íntimas necessidades do crente é prova desta verdade. Encerramos este nosso assunto com as palavras de Jeremy Taylor: "Aquele que intenta falar do mistério da Trindade e o faz por palavras e nomes de invenção humana, falando de essência e existências, hipóstases e pessoalidades, prioridade na igualdade, e unidade na pluralidade, pode entreter-se e construir um tabernáculo na sua cabeça, e conversar algo - não sabe o quê; mas o homem renovado, que sente o poder do Pai, para quem o Filho se faz sabedoria, santificação e redenção em cujo coração o amor do Espírito de Deus é derramado - tal homem, embora nada entenda do ininteligível, verdadeiramente entende a doutrina cristã da Trindade".
Capítulo III OS DECRETOS DE DEUS
DEFINIÇÃO DE DECRETOS
Decretos são o plano eterno pelo qual Deus tomou certos todos os eventos do universo, passados, presentes e futuros.
Os decretos são muitos somente para a nossa compreensão finita; em sua própria natureza eles são apenas um plano que abrange não só os efeitos, mas também as causas; não só os fins a serem assegurados, mas também os meios necessários para assegurá-los.
Rm 8.28 - "chamados por seu decreto" - os muitos decretos para a salvação de muitos indivíduos são representados como formando apenas um propósito de Deus. Ef. 1.11 - "predestinados conforme o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade" - note ainda que a palavra propósito está no singular. Ef. 3.11 - "segundo o eterno propósito que fez em Cristo Jesus, nosso Senhor". Este propósito ou plano de Deus inclui tanto os meios como os fins, oração e resposta, trabalho e fruto. Provérbio tirolês: "Deus tem seu Plano para cada homem". Cada homem, do mesmo modo que Jean Paul, é "der Einzige" - o único. Há um simples plano que abrange todas as coisas; "empregamos a palavra 'decreto' quando pensamos na sua participação" (Pepper). Ver Hodge, Outlines of Theology, 1a ed., 165, 2- ed., 200 - "Na verdade não há evento isolado: a determinação de um envolve a determinação de toda a concatenação das causas e efeitos que constituem o universo". Prefere-se a palavra "plano" à palavra "decretos", porque aquela exclui as idéias 1) de pluralidade, 2) de visão curta, 3) de arbitrariedade, 4) de compulsão.
Os decretos, como ato eterno de uma vontade infinitamente perfeita, apesar de ter relações lógicas uns com os outros, não têm nenhuma relação cronológica. Portanto, eles não são resultado de deliberação em qualquer sentido que implique visão curta ou hesitação.
Logicamente, no decreto de Deus, o sol precede o seu brilho, e o decreto de criar o pai precede o decreto de que haverá um filho. Deus decreta o
homem antes de decretar os atos deste; decreta a criação do homem antes de decretar a existência deste. Entretanto, não há sucessão cronológica.
A palavra "conselho" em Ef. 1.11 - "o conselho da sua vontade" - não significa deliberação, mas sabedoria.
Porque a vontade na qual os decretos têm sua origem é livre, os decretos não são simplesmente exercício instintivo ou necessário da inteligência ou vontade divina como supõe o panteísmo.
É próprio da perfeição de Deus que ele tenha um plano, e o melhor possível. Nisto não há nenhuma necessidade, mas apenas a certeza de que a sabedoria infinita age sabiamente. Deus não é os seus decretos; eles não são idênticos à sua essência; eles não fluem do seu ser do mesmo modo necessário em que o Filho eterno procede do Pai eterno. Em Deus existe a vontade livre, que age com certeza infinita, embora não coagido por uma necessidade. Chamar o decreto de salvação necessária é negar a graça, e fazer de Deus um ser não livre.
Os decretos têm referência às coisas exteriores a Deus. Deus não decreta ser santo, nem existir como três pessoas em uma essência.
Os decretos são a preparação para os eventos externos - o alcance de algumas coisas e atos dentro de um plano. Eles não incluem os processos e operações dentro da divindade que não têm nenhuma relação com o universo.
Os decretos primeiramente dizem respeito aos atos do próprio Deus, na Criação, na Providência e na graça; em segundo lugar, aos atos das criaturas livres, que ele prevê resultarão delas.
"Apesar de negarmos a afirmação de Whedon, de que o plano divino abrange apenas as ações divinas", admitimos que o plano de Deus refere-se primordialmente às suas próprias ações, e que os atos pecaminosos dos homens, em particular, não são objetos de um decreto de que Deus os executará eficientemente, mas de que Deus permitirá aos homens que, no exercício da sua livre vontade, as executem.
O decreto de agir não é agir. Os decretos são exercício interior e manifestação dos atributos divinos e não devem ser confundidos com a Criação, a Providência e a Redenção que consistem na execução dos decretos.
Os decretos são a primeira operação dos atributos, e a primeira manifestação da pessoalidade de que temos qualquer conhecimento dentro da divindade. Eles pressupõem os atos essenciais ou movimentos dentro da natureza
divina que chamamos geração ou procedimento. Conseqüentemente, envolvem a execução dos decretos que denominamos Criação, Providência e Redenção, mas que não devem ser confundidos com qualquer um deles.
Portanto, os decretos não se dirigem às criaturas; não são da natureza da lei estatuída; e nem impõe coação ou obrigação à vontade dos homens.
Deste modo, ordenar o universo a cuja ação os homens vão dar prosseguimento é coisa bem diferente de declarar, ordenar ou mandar que eles façam. "Nossos atos concordam com os decretos, mas não necessariamente; podemos agir de outra forma e freqüentemente o fazemos" (Park). O francês que caiu na água e gritou: "Eu vou me afogar; que ninguém venha ajudar- me!" estava naturalmente consentindo em afogar-se; se ele tivesse dito:
"Eu vou me afogar; ninguém quer ajudar-mel", talvez tivesse chamado alguma pessoa amigável para auxiliá-lo.
Todos os atos humanos, quer maus quer bons, entram no plano divino, e assim são objetos dos decretos de Deus, apesar de que a verdadeira atuação de Deus com relação ao mal é apenas permissiva.
Nenhum decreto de Deus reza: "Pecarás". Porque 1) nenhum decreto é dirigido a você', 2) nenhum decreto sobre você diz: você fará, 3) Deus não pode fazer pecar, ou decretar fazê-lo. Ele somente decreta criar, e ele mesmo agir, de tal modo que você queira, de sua livre escolha, cometer o pecado. Deus determina sobre os seus atos prever qual será o resultado dos atos livres das suas criaturas e, deste modo, determina os resultados. Este decreto permissivo é tão somente o decreto de Deus a respeito do pecado. O próprio homem é capaz de produzir o pecado. Por si mesmo ele é incapaz de produzir a santidade. Na produção da santidade devem concorrer duas forças: a vontade de Deus e a do homem; a de Deus deve agir em primeiro lugar.
Por isso, o decreto do bem não é simplesmente permissivo, como no caso do mal. No caso daquele, o decreto de Deus é o de produzir os agentes positivos na sua execução, tais como as circunstâncias, os motivos, as influências do Espírito. Mas, no caso do mal, os decretos de Deus são apenas as disposições para que o homem aja como lhe apraz; Deus apenas prevê o resultado.
Não se deve confundir o agente permissivo com o condicional, nem o decreto permissivo com o condicional. Deus preordenou o pecado indiretamente. A máquina não é construída para a fricção, mas a despeito dela.
Na parábola de Mt. 13.24-30, pergunta-se: "Por que tem, então, joio?" Não se responde dizendo: "Eu decretei o joio", mas: "O inimigo é quem fez isso". Contudo, devemos fazer uma exceção ao Diretor Fairbairn, Place of Christ in Theology, 456, ao dizer: "Deus não permite que haja o pecado; em sua essência, ele é a transgressão da lei divina e a única atitude de Deus para com o pecado é a de oposição. O pecado ocorre porque o homem contraditou e resistiu a vontade de Deus". Aqui a verdade da oposição divina ao pecado se evidencia tão nitidamente como se nega o decreto do pecado em qualquer
sentido. Sustentamos que Deus decreta o pecado no sentido do alcance no plano das transgressões previstas do homem, enquanto ao mesmo tempo sustentamos que estas transgressões previstas são atribuídas totalmente ao homem e não a Deus.
Enquanto o plano total com relação às criaturas é chamado predestinação, ou preordenação, seu propósito de agir de tal modo que alguns crerão e serão salvos chama-se eleição e seu propósito de agir de tal modo que alguns se recusarão a crer e se perderão é chamado reprovação. Discutiremos eleição e reprovação em capítulo posterior como parte da aplicação da Redenção.
Os decretos de Deus podem ser divididos em: relativos à natureza, e aos seres morais. A estes chamamos preordenação, ou predestinação; e destes decretos sobre os seres morais há dois tipos: o decreto da eleição e o da reprovação; ver doutrina da Eleição.
PROVA DA DOUTRINA DOS DECRETOS
Da Escritura
As Escrituras declaram que todas as coisas estão incluídas nos decretos divinos.
Elas declaram que se decretam as coisas e eventos especiais; como, por exemplo, a) a estabilidade do universo físico; b) as circunstâncias externas das nações; c) a duração da vida humana; d) o modo da nossa morte; e) os atos livres do homem tanto bons como maus. C. Elas declaram que Deus decretou
a salvação dos crentes; b) O estabelecimento do reino de Cristo; c) a obra de Cristo e de seu povo em seu estabelecimento.
Is. 14.26,27 - "Este é o conselho que foi determinado sobre toda esta terra; e esta é a mão que está estendida sobre todas as nações. Porque o Senhor dos Exércitos o determinou ... E a sua mão estendida está; quem, pois, a fará voltar atrás?" 46.10,11 - "que anuncio o fim desde o começo e, desde a antigüidade, as coisas que ainda não sucederam; que digo: O meu conselho será firme, e farei toda a minha vontade ... porque assim disse e assim acontecerá; eu o determinei e também o farei". Dn. 4.35 - "segundo a sua vontade, ele opera com o exército do céu e os moradores da terra; e não há quem possa estorvar a sua mão e lhe diga: Que fazes?" Ef. 1.11 - "o propósito daquele que faz todas as coisas, segundo o conselho da sua vontade".
(a) SI. 119.89-91 - "Para sempre, ó Senhor, a tua palavra permanece no céu. A tua fidelidade estende-se de geração a geração; tu firmaste a terra,
e firme permanece. Conforme tudo o que ordenaste, tudo se mantém até hoje; porque todas as coisas te obedecem". (b) At. 17.26 - "e de um fez toda a geração dos homens para habitar sobre toda a face da terra, determinando os tempos já dantes ordenados e os limites da sua habitação"; cf. Zc. 6.1 - "quatro carros que saíram dentre dois montes, e estes eram montes de metal" = seriam os decretos dos quais procedem os desígnios providenciais de Deus?
Jó 14.5 - "Visto que os seus dias estão determinados, contigo está o número dos seus meses; e tu puseste limites, e não passará além deles".
Jo. 21.19 - "E disse isso, significando com que morte havia ele de glorificar a Deus ". (e) Atos bons: Is. 44.28 - "Quem diz de Ciro: Ele é o meu pastor, e cumprirá tudo o que me apraz; dizendo também a Jerusalém: Sê edificada; e ao templo: Funda-te"; Ef. 2.10 - "Porque somos feitura sua, criados em Cristo para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas". Atos maus: Gn. 50.20 - "vós bem intentastes mal contra mim, porém Deus o tornou em bem, para fazer como se vê neste dia, para conservar em vida um povo grande"; 1 Re. 12.15 - "O rei, pois, não deu ouvidos ao povo, porque esta revolta vinha do Senhor 24 - "eu é que fiz esta obra"; Lc. 22.22
"E, na verdade, o Filho do Homem vai, segundo o que está determinado; mas ai daquele homem por quem é traído"! At. 2.23 - "este, que vos foi entregue pelo determinado conselho e presciência de Deus, tomando-o vós, o cru- cificastes e matastes pelas mãos de injustos"; 4.27,28 - "verdadeiramente, contra o teu santo Filho Jesus, que tu ungiste, se ajuntaram, não só Herodes, mas Pôncio Pilatos, com os gentios e os povos de Israel, para fazerem tudo o que a tua mão e o teu conselho tinham anteriormente determinado que se havia de fazer"; Rm. 9.17 - "Porque a Escritura diz a Faraó: Para isto mesmo te levantei, para em ti mostrar o teu poder"; 1 Pe. 2.8 - "para aqueles que tropeçam na palavra, sendo desobedientes; para o que também foram destinados"; Ap. 17.17 - "Porque Deus tem posto em seu coração que cumpram o seu intento, e tenham uma mesma idéia, e que dêem à besta o seu reino até que se cumpram as palavras".
(a)1 Co. 2.7 - "a sabedoria de Deus, oculta em mistério, a qual Deus ordenou antes dos séculos para a nossa glória"; Ef. 3.10,11 - "a multiforme sabedoria de Deus, segundo o eterno propósito que fez em Cristo Jesus, nosso Senhor". Ef. 1 é um peã em louvor aos decretos de Deus. (b) O maior de todos os decretos é o que se refere à dádiva de Cristo ao mundo. SI. 2.7,8
"Recitarei o decreto: ... eu te darei as nações por herança"; cf. v. 6 - "eu, porém, constituí o meu Rei sobre o meu monte Sião"; 1 Co. 15.25 - "Porque convém que ele reine até que haja posto a todos os inimigos debaixo de seus pés", (c) Devemos fazer deste o nosso decreto; a vontade de Deus deve ser executada através da nossa vontade. Fp. 2.12,13 - "operai a vossa salvação com temor e tremor; porque é Deus que opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade"; Ap. 5.1,7 - "E vi na destra do que estava sentado sobre o trono um livro escrito por dentro e por fora, selado com sete selos ... E [o Cordeiro] veio e tomou o livro da destra do que estava assentado no trono"; 9 - "Digno és de tomar o livro e de abrir os seus selos" = Só Cristo tem a onisciência para conhecer, e a onipotência para executar os decretos divinos. Quando João chora porque não há ninguém no céu ou na terra para soltar os selos e ler o livro dos decretos de Deus, o Leão da tribo de
Judá aparece para abri-lo. Só Cristo conduz o curso da história rumo ao seu fim indicado.
Da Razão
A partir da presciência divina
Presciência implica fixidez e fixidez implica decreto. - Desde a eternidade Deus previu todos os eventos do universo como fixos e certos. Tal fixidez e certeza não podiam ter tido sua base quer no destino cego ou nas variáveis vontades dos homens visto que nenhum destes tinha sua existência. Não podia ter tido sua base em coisa alguma fora da mente divina, pois na eternidade nada existia além da mente divina. Mas para esta fixidez deve ter havido uma causa; se algo no futuro era fixo alguma coisa deveria tê-lo fixado. Esta fixidez podia ter tido sua base só no plano e propósito de Deus. Por fim, se Deus previu o futuro como certo, deve ter sido porque havia algo nele que o tomou certo; ou, em outras palavras, porque ele o decretara.
Por isso objetamos a afirmação de E. G. Robinson, Christian Theology, 74
"O conhecimento de Deus e os propósitos de Deus, sendo ambos eternos, não se pode conceber como a base recíproca nem serem atribuídos à exclusão de um deles como causa das coisas, mas como correlatos e eternos, devem ser quantidades coiguais do pensamento". Retrucamos que, conquanto o decreto não preceda cronologicamente, logicamente ele precede a presciência. A presciência não é formada de eventos possíveis, mas daquilo que, sem nenhuma dúvida vai ser um evento. A certeza dos eventos futuros, que Deus antecipadamente conhece pode ter sido a base só do seu decreto, visto que só ele existia para ser a base e explicação desta certeza. Os eventos só foram fixados porque Deus os fixou. Shedd, Dogm. Theol., 1.397 - "Um evento deve tornar-se certo, antes de ser conhecido como um evento certo". Turre- tin, Inst. Theol., loc. 3, quaes. 12,18 - "Praecipuum fundamentum scientiae divinae circa futura contingentia est decretum solum". (Só o decreto é o principal fundamento da ciência divina sobre as contingências futuras.)
Decretar a criação implica decretar os resultados previstos da criação.
Para enfrentar a objeção de que Deus poderia ter previsto os eventos do universo, não porque ele decretara cada um, mas só porque ele decretara criar o universo e instituir suas leis, poderemos colocar o argumento de outra forma. Na eternidade não podia ter havido nenhuma causa da existência futura do universo, afora o próprio Deus porque não existia nenhum ser além do próprio Deus. Na eternidade Deus previu que a criação do mundo e a instituição de suas leis tomaria certa sua verdadeira história nos mais insignificantes pormenores. Mas Deus decretou criar e instituir estas leis. Em assim decretando, ele necessariamente decretou tudo ou que haveria de vir. Por fim, Deus previu os futuros eventos do universo como certos porque ele decretara criar; mas esta determinação de criar envolvia também a determinação de todos os verdadeiros resultados de tal criação; ou, em outras palavras, Deus decretou aqueles resultados.
E. G. Robinson, 84 - "Pode-se inferir a existência dos decretos divinos a partir da existência da lei natural". Lei = certeza = vontade de Deus. Os positivistas externam grande desprezo pela doutrina do propósito eterno de Deus embora eles nos confiem a férrea necessidade das forças físicas e das leis naturais. O Dr. Robinson também assinala que os decretos estão "implicados nas profecias. Não podemos conceber que todos eventos devem ter convergido para o grande evento - a morte de Cristo - sem a intercessão de um propósito eterno". E. H. Johnson, Outline Syst. Theol., 2- ed., 251, nota - "A razão é confrontada pelo paradoxo de que os decretos divinos são ao mesmo tempo absolutos e condicionais; a solução do paradoxo é que Deus, de um modo absoluto, decretou um sistema condicional - contudo, um sistema cujas obras ele conhece previamente". A rude pedra não cortada e a estátua em que foi transformada estão ambas incluídas no plano do escultor.
Nenhum evento não decretado pode ser previsto. - Admitimos que Deus decreta em primeiro lugar e diretamente seus atos da criação, providência e graça; mas sustentamos que isto envolve também em segundo lugar e indiretamente o decreto dos atos das criaturas livres que ele prevê resultarem deles. Não há, portanto, em Deus, uma coisa tal como scientia media, ou conhecimento de um evento que ocorrerá apesar de não entrar no plano divino; pois dizer que Deus prevê um evento não decretado é dizer que ele vê como futuro um evento que é simplesmente impossível; ou, em outras palavras, que ele vê um evento não como ele é.
Reconhecemos só dois tipos de conhecimento: 1) O dos possíveis não decretados e 2) o conhecimento antecipado dos reais decretados. Scientia media é um suposto conhecimento intermediário entre os dois, a saber 3) conhecimento antecipado dos reais decretados. Ver mais explicações abaixo. Negamos a existência deste terceiro tipo de conhecimento. Sustentamos que o pecado é decretado no sentido da determinação da parte de Deus sobre um sistema cuja previsão existia de tornar-se certo. O pecado do homem pode ser previsto, embora Deus não seja a sua causa imediata. Deus conhece as possibilidades, sem, afinal de contas, tê-las decretado. Mas Deus não pode prever as coisas reais a não ser que, por seu decreto, as tenha tornado certas no futuro. Ele não pode prever aquilo que não há para ser previsto. Royce, World and Individual, 2.374, sustenta que Deus tem, não a presciência, mas o conhecimento eterno, das coisas temporais. Porém retrucamos que prever como um ser moral vai agir não é mais impossível do que saber como um ser moral estando em dadas circunstâncias iria agir.
Só o conhecimento do que é decretado é presciência. - O conhecimento de um plano como ideal ou possível pode preceder o decreto; mas o conhecimento de um plano como real ou fixo deve seguir o decreto. Só este conhecimento é apropriadamente presciência. Deus, portanto prevê a criação, as causas, as leis, os eventos, as conseqüências; isto é, porque ele abarcou todos estes em seu plano. A negação dos decretos logicamente envolve a negação do presciência de Deus sobre as ações humanas livres; e a isto na verdade são conduzidos os socinianos e alguns arminianos.
Um exemplo arminiano desta negação encontra-se em McCabe, Foreknow- ledge of God, and Divine Nescience of Future Contigencies a Necessity.
Per contra ver notas sobre a presciência de Deus, neste compêndio, págs. 283-286 (O atributo da onisciência). Pepper: "A volição divina fica logicamente entre duas divisões e tipos de conhecimento divino". Deus conheceu as ações livres do homem como possíveis, antes de decretá-las; conheceu-as como futuras, porque ele as decretou. Logicamente, embora não cronologicamente, o decreto vem antes da presciência. Quando eu digo, "eu sei o que eu vou fazer", é evidente que já determinei e que o meu conhecimento não precede a determinação, mas segue-a e baseia-se nela. Por isso não é correto dizer que os decretos são presciência. Ele conhece antecipadamente aquilo que ele decretou e o conhece antecipadamente porque ele o decretou. Seus decretos são eternos e nada que é eterno pode ser objeto de presciência. G. F. Wright, em Bibiia Sacra, 1877.723 - "O conhecimento de Deus abrangeu os pormenores e incidentes de cada plano possível. A escolha de um plano fez do seu conhecimento determinado uma presciência".
Por isso há dois tipos de conhecimento: 1) conhecimento do que pode ser
do possível (scientia simplicis intelligentiae); 2) Conhecimento do que é, e deve ser, porque Deus o decretou (scientia visionis). Entre estes dois, Molina, jesuíta espanhol, erroneamente pensava que houvesse 3) um conhecimento médio das coisas que deveriam ser, apesar de que Deus não as tinha decretado (scientia media). Naturalmente que este seria um conhecimento que Deus derivou, não de si mesmo, mas das criaturas! Ver Dick, Theology, 1.351.
A. S. Carman: "É difícil ver como o conhecimento de Deus pode ter sua causa a partir da eternidade por algo que não existe até um ponto definido do tempo". Se se disser que aquilo que deve ser será, "na natureza das coisas", respondemos que a "natureza das coisas não existe independentemente de Deus e que a base da certeza objetiva assim como da subjetiva que corresponde a ela, só se encontra no próprio Deus.
Mas o decreto de Deus criar, quando ele prevê que ocorrerão alguns atos livres dos homens, é o decreto daqueles atos livres, apenas no sentido em que empregamos a palavra decretar como se acha deste modo, a saber, alguns ou abrangendo em seu plano. Nenhum arminiano que crê na presciência de Deus sobre os atos livres tem boa razão para negar os decretos de
Deus explicados deste modo. Sem dúvida Deus não sabia antecipadamente que Adão existiria e o pecado, quer Deus determinasse criá-lo, quer não. Então a onisciência se torna conhecimento antecipado só sob a condição do decreto de Deus. O fato de a presciência de Deus sobre os atos livres é intuitiva não afeta esta conclusão. Admitimos que, conquanto o homem possa predizer os atos livres só pelo fato de ser racional (/'.e., na direção do motivo previamente dominante), Deus pode predizer a ação livre seja ela racional, ou não. Mas nem mesmo Deus pode predizer o que não está certo de acontecer. Deus tem uma presciência intuitiva dos atos livres no homem por causa da condição do seu próprio decreto de criar; e este decreto de criar, na previsão de tudo aquilo que se seguirá é o decreto do que se segue.
A partir da sabedoria divina
É parte da sabedoria divina prosseguir em cada empreitada segundo um plano. Quanto maior a empreitada, mais necessário é o plano. A sabedoria, contudo, mostra-se em uma cuidadosa provisão de todas as possíveis circunstâncias e emergências que podem surgir na execução de seu plano. O fato de que muitas de tais circunstâncias e emergências não são contempladas e não são providas nos planos dos homens deve-se apenas às limitações da sabedoria humana. Portanto, pertence à sabedoria infinita não só ter um plano, mas abrangê-lo todo, até nos mínimos pormenores no plano do universo.
Nenhuma arquiteto tentaria edificar uma catedral de Colônia sem um plano; ao contrário, se possível, faria um desenho de cada pedra. O grande pintor não faz um estudo da sua tela à medida em que ele vai pintando; o seu plano surge desde o começo; as preparações para os últimos efeitos fizeram- se a partir do início. Do mesmo modo, na obra de Deus, cada pormenor é previsto e tomadas as devidas providências; o pecado e Cristo entraram no plano original do universo. Raymond, Syst. Theol., 2.156, diz que esta atitude implica que Deus não pode governar o mundo sem que todas as coisas sejam reduzidas a fórmulas mecânicas; e isto não pode ser verdade, em razão de que o governo de Deus não trata de coisas, mas de pessoas. Replicamos que o sábio estadista não governa coisas, mas pessoas, contudo na exata proporção da sua sabedoria e dirige a sua administração conforme um plano preconcebido. Deus poderia governar o universo abrangendo todas as coisas, até as mínimas ações humanas, em seu plano, mas a sua sabedoria não o faria.
A partir da imutabilidade divina
O que Deus faz sempre propôs fazê-lo. Porque com ele não há aumento de conhecimento ou poder como acontece com os seres finitos, segue-se que aquilo que sob dadas circunstâncias ele permite ou faz, ele deve ter eternamente decretado fazer ou permitir. Supor que Deus tem uma multidão de planos e que ele muda seu plano de acordo com as exigências da situação é fazê-lo infinitamente dependente das variadas vontades das suas criaturas e negar-lhe um elemento necessário à perfeição, a saber, a imutabilidade.
Deus tem sido imerecidamente comparado a um jogador de xadrez, que dá um xeque-mate no seu adversário qualquer que seja o lance deste (George Harris). Do mesmo modo se diz que Napoleão tinha numerosos planos antes de cada batalha e mudou de um para o outro à medida que a sorte demandava. Com Deus não é assim. Jó 23.13 - "se ele está contra alguém, quem o desviará"? Tg. 1.17 - "Pai das luzes, em quem não há mudança, nem sombra de variação". Contraste com este trecho a afirmação de McCabe, Foreknowledge of God, 62 - "Este novo fator, a liberdade do homem semelhante à de Deus, é capaz de contrapor-se, e em inúmeros exemplos o faz, a vontade divina, e compele o grande Eu Sou a modificar suas ações, seus propósitos e seus planos, no tratamento para com indivíduos e comunidades".
A partir da benevolência divina
Os eventos do universo, se não determinados pelos decretos divinos, devem ser determinados ou por acaso ou pelas vontades das criaturas. Contraria qualquer apropriada concepção da benevolência divina supor que Deus permite o curso da natureza e da história e os fins a que ambos se movem e são determinados por miríades dos seres que sentem por qualquer outra força ou vontade além da sua própria. Tanto a razão como a revelação, portanto, compelem-nos a aceitar a doutrina da Confissão de Westminster de que "Deus, desde toda a eternidade, pelo mais justo e santo conselho da sua própria vontade, livre e imutavelmente ordenou o que quer que venha a ocorrer".
N o seria benévolo da parte de Deus tirar do seu poder aquilo que é tão essencial à felicidade do universo. Tyler, Memoir and Lectures, 231-243 - "A negação dos decretos envolve a negação dos atributos essenciais de Deus, tais como a onipotência, a onisciência, a benevolência; apresenta-o como um ser desapontado e infeliz; implica em negação da sua providência universal; conduz a uma negação da maior parte do nosso próprio dever de submissão; enfraquece as obrigações de gratidão". Damos graças a Deus pelas bênçãos que nos vêm através dos livres atos dos outros; porém, se Deus não tiver proposto tais bênçãos, devemos a nossa gratidão, não a Deus, mas aos outros. Dr. A. J. Gordon diz com propriedade que um universo sem decretos seria tão irracional e aterrador como um trem expresso sem farol ou maquinista sem nenhuma certeza de que, no momento seguinte pudesse mergulhar no abismo. E mesmo Martineau, Study, 2.108, apesar de negar a presciência de Deus a respeito dos atos livres do homem, é compelido a dizer: "Não se pode deixar por conta da simples natureza criada jogar incondicionalmente com leme, ou mesmo um simples mundo e dirigi-lo de modo descontrolado para o céu ou para os recifes; deve-se obter alguma segurança evitando alguma falta dentro dos limites toleráveis".
OBJEÇÕES À DOUTRINA DOS DECRETOS
Que eles são inconsistentes com a livre atuação do homem
A isto respondemos que:
A objeção confunde os decretos com a sua execução. Os decretos são, como a presciência, um ato eterno da natureza divina e não são mais inconsistentes com a livre atuação do que a presciência. Mesmo a presciência dos eventos implica que tais eventos são fixos. Se esta fixidez absoluta e a presciência não são inconsistentes com a atuação livre, muito menos aquilo que é mais afastado da ação do homem, a saber, a causa oculta da fixidez e presciência - os decretos de Deus - pode ser inconsistente com a atuação livre do homem. Se algo for inconsistente com a atuação livre do homem, deve ser, não os decretos de Deus, mas a execução dos decretos na criação e providência.
Sobre esta objeção, ver Forbes, Predestination and Free Will, 3 - "Todas as coisas são predestinadas por Deus, tanto as boas como as más, não pré- necessitadas, isto é, de um modo causai preordenado por ele - a não ser que façamos Deus o autor do pecado. Deste modo a predestinação não é uma palavra indiferente mesmo quando trata do autor da origem de qualquer coisa: Deus como o originador do bem, mas a criatura, do mal. Por isso predestinação significa que Deus incluiu em seu plano a respeito do mundo cada ato, bom ou mau, de cada criatura. Ele predestinou alguns atos de modo causai, outros de modo permissivo. Convém distinguir a certeza do cumprimento de todos os propósitos de Deus da necessidade deles". Isto simplesmente significa que o decreto de Deus não é a causa de qualquer ato ou evento.
Os decretos de Deus podem ser executados pela eficiência causai das suas criaturas ou pela sua própria eficiência. Em cada caso é, quando ocorre, a execução, e não o decreto, que é inconsistente com a liberdade humana.
A objeção se apoia numa falsa teoria da livre atuação - a saber, que esta implica indeterminação ou incerteza; em outras palavras, que a livre atuação não coexiste com a certeza como os resultados de seu exercício. Mas é a necessidade, não a certeza, que é inconsistente com a atuação livre. Esta é o poder de autodeterminação em vista dos motivos ou o poder de o homem
escolher entre os motivos e b) dirigir sua subseqüente atividade conforme o motivo escolhido. Os motivos nunca são uma causa, mas só uma ocasião; eles influem, mas nunca coagem; e o homem é a causa e nisto é que está a liberdade. Mas também é verdade que o homem nunca se acha em estado de indetermi- nação; nunca age sem um motivo, ou contrariamente aos motivos; há sempre uma razão por que ele age e nisto se acha sua racionalidade. Ora, até onde o homem age segundo o anterior espírito dominante - ver (b) acima - podemos, conhecendo seu motivo, predizer sua ação e nossa certeza sobre o que será a ação de modo nenhum afeta a liberdade do homem. Podemos mesmo fazer os motivos apoiarem-se em outros, a influência do que prevemos, os que agem sobre eles podem agir em perfeita liberdade. Mas se o homem, influenciado pelo homem, pode ainda ser livre, então, influenciado pelos motivos divinamente previstos, pode ainda ser livre e os decretos divinos, que simplesmente certificam as ações do homem podem também ser perfeitamente consistentes com a sua liberdade.
Não devemos admitir que os fins decretados só podem ser assegurados por compulsão. Os propósitos eternos não necessitam a causa eficiente do proponente. A liberdade pode ser o próprio meio para cumprir o propósito.
E. G. Robinson, Christian Theology, 74 - "A certeza absoluta dos eventos, que é tudo que a onisciência determina a respeito deles, não é idêntica à necessidade deles". John Milton, Christian Doctrine: "Com toda a certeza os eventos futuros que Deus previu acontecerão, mas não por necessidade. Sem dúvida eles acontecerão, porque a presciência divina não se enganará; mas não acontecem necessariamente, porque a presciência não tem nenhuma influência no objeto conhecido antecipadamente, até mesmo porque é uma ação intransitiva".
Há, contudo, uma classe menor de ações humanas através das quais se muda o caráter, mais do que se expressa, na qual o homem age segundo um motivo diferente daquele que anteriormente o dominou - ver (a) acima. Deus também conhece antecipadamente tais ações apesar de que não podem ser preditas pelo homem. A liberdade do homem nelas seria inconsistente com os decretos de Deus se a certeza anterior de sua ocorrência fosse, não certeza, mas necessidade; ou, em outras palavras, se os decretos de Deus fossem em todos os casos eficazes para produzir os atos de suas criaturas. Mas não é este o caso. Os decretos de Deus podem ser executados pela livre causa do homem tão facilmente como pela de Deus; e decreto desta livre causa no que se refere à criação do universo de que ele prevê que esta causa será uma parte, de modo nenhum interfere na liberdade da referida causa, porém mais do que isso assegura-a e a estabelece. Porém o escrúpulo da consciência e a testemunha da consciência de que Deus decreta não se executam impondo coação sobre as vontades livres do homem.
O agricultor que, depois de ouvir um sermão sobre os decretos de Deus, rumou para o caminho do despenhadeiro, ao invés do caminho seguro para a sua casa e, conseqüentemente quebrou a carreta, concluiu antes do fim da viagem que, de qualquer forma, tinha sido predestinado a ser um tolo e que tinha cumprido a sua vocação e eleição certas. Ladd, Philosophy of Conduct, 146,187, mostra que a vontade é livre, em primeiro lugar, através da consciência da capacidade do homem, e em segundo lugar, através da consciência da atribuição da culpabilidade do homem. Por natureza, ele é potencialmente autodeterminante; de fato, ele freqüentemente se toma autodeterminante.
Allen, Religious Progress, 110 - "A futura igreja deve abranger a soberania de Deus e a liberdade da vontade; a depravação total e a divindade da natureza humana; a unidade de Deus e as distinções na Divindade; o gnosti- cismo e o agnosticismo; a humanidade de Cristo e a sua divindade encarnada; o individualismo e a solidariedade; a razão e a fé; a ciência e a teologia; o milagre e a uniformidade da lei; a cultura e a piedade; a autoridade da Bíblia como a palavra de Deus com a absoluta liberdade da crítica bíblica; o dom da administração como no episcopado histórico e o dom da profecia como a mais elevada sanção da comissão ministerial; a sucessão apostólica, mas também a direta e imediata vocação que só conhece a sucessão do Espírito Santo". Sem concordarmos com estas últimas cláusulas podemos recomendar o espírito abrangente do pronunciamento especialmente sobre a perturbadora questão da soberania divina com a liberdade humana.
Ajudaria-nos, estimando a força desta objeção pelo notar os quatro sentidos nos quais o termo 'liberdade' pode ser udado. Pode ser usado como equivalente a 1) liberdade física, ou ausência de constrangimento exterior;
liberdade formal, ou um estado de indeterminação moral; 3) liberdade moral ou autodeterminação do ponto de vista dos motivos; 4) e liberdade real ou abilidade de se conformar ao padrão divido. Nós não nos relacionamos com o primeiro destes pontos, porque todo o acordo que o decreto estabelece não leva ao constrangimento exterior do homem. A liberdade no segundo sentido não tem existência, porque todos os homens têm caráter. A livre atuação, ou a liberdade no terceiro sentido manifestou-se ser consistente com os decretos. A liberdade no quarto sentido ou a liberdade real é um dom especial de Deus e não deve ser confundido com a livre atuação. A objeção mencionada acima se estabelece completamente na segunda dessas definições da livre atuação. Provou-se ser falso e esta objeção cai por terra.
Ritschl, Justification and Reconciliation, 133-188, dá uma boa definição deste quarto tipo de liberdade: "Liberdade é a autodeterminação através de ideais universais. Limitar os nossos fins aos da família ou do país é um refinado egoísmo. Liberdade é autodeterminação através do amor universal para com o ser humano ou através do reino de Deus. Porém o homem livre deve então depender de Deus em tudo, porque o reino de Deus é uma revelação de Deus". John Caird, Fund. Ideas of the Christianity, 1.133 - "Sendo deter-
minados por Deus somos autodeterminados; /'.e., determinados por coisa alguma além de nós mesmos, mas pelo nosso mais nobre e mais verdadeiro eu. A vida universal vive em nós. A consciência eterna torna-se nossa; porque 'quem está em amor está em Deus, e Deus, nele'" (1 Jo. 4.16).
Moberly, Atonement and Personality, 226 - "Livre vontade não é independência da criatura, mas, ao invés disso é a sua auto-realização em perfeita dependência. Liberdade é identidade própria com a bondade. Tanto a bondade quanto a liberdade estão, em sua perfeição, em Deus. Na criatura, bondade não é a distinção da bondade de Deus, mas a correspondência com ela. Na criatura, a liberdade corresponde à identidade própria com Deus com a bondade. É realizar-se e achar a si mesmo, seu verdadeiro eu, em Cristo, de modo que o amor de Deus em nós se torne uma resposta divina adequada a Deus, por verdadeiramente espelhá-lo". G. S. Lee, The Shadow Christ, 32 - "Os Dez Mandamentos não podem ser cantados. Os israelitas cantavam sobre o Senhor e sobre o que ele havia feito, mas não o que ele determinou que fosse feito, razão por que eles nunca cantaram-no. A concepção do dever que não pode ser cantada, mas lamentada, até que ela aprenda a cantar. Esta é a história dos hebreus".
"Há uma liberdade, não cantada pelos poetas e não louvada pelos senadores, que os monarcas não podem admitir nem todas as potências da terra e do inferno confederados afastam; uma liberdade contra a perseguição, contra a fraude, contra as opressões, contra as prisões, não têm poder para impor; qualquer que a saboreia nunca mais poderá ser escravizado. 'É a liberdade do coração comprada com o sangue que ele deu à humanidade e com o mesmo sinal selou". Robert Herrick: "Os muros de pedra não formam uma prisão, nem as barras de ferro uma cela; as mentes inocentes e tranqüilas têm isto como eremitério. Se no meu amor tenho liberdade, e na minha alma sou livre, só os anjos nas alturas gozam tal liberdade".
Uma discussão mais completa sobre a Vontade encontra-se no estudo da Antropologia, Vol. II. Por enquanto basta dizer aqui que as objeções arminia- nas sobre os decretos surgem quase totalmente do conceito errôneo de liberdade quanto ao poder decisório da vontade, em qualquer caso, contra o seu próprio caráter e todos os motivos apresentados em seu apoio. Mais adiante veremos que isto é praticamente uma negação de que o homem tem um caráter, ou de que a vontade através das suas ações certas ou erradas assim como o intelecto e o sentimento, uma inclinação permanente ou predisposição para o bem ou para o mal. Isto significa estender o poder de escolha contrária, o qual pertence à esfera da volição transitória sobre todos estados permanentes do intelecto, do sentimento e da vontade que recebem o nome de caráter moral e dizer que podemos mudar diretamente através de uma simples volição que, de fato, só podemos mudar por um processo e recursos indiretos. Contudo, mesmo este ponto de vista exagerado de liberdade parece não excluir os decretos de Deus, ou evitar uma reconciliação prática dos pontos de vista arminianos e calvinistas, até onde os arminianos admitem a presciência de Deus relativa aos atos humanos livres, e os calvinistas admitem que o decreto de Deus relativo a estes atos não significa necessariamente que Deus os produzirá de uma forma eficiente.
Por isso sustentamos a certeza da ação humana e deste modo nos associamos aos arminianos. Não podemos com Whedon (On The Will), e Hazard (Man a Creative First Cause), atribuir à vontade a liberdade de indiferença, ou o poder de agir sem motivo. Juntamente com Calderwood, Moral Philosophy, 183, sustentamos que a ação sem motivo, ou ato da pura vontade, é desconhecida da consciência (ver, ainda uma afirmação inconsistente de Calderwood na p. 188 da mesma obra). Todo ato humano futuro não será executado com um motivo, mas, sem dúvida, será mais uma coisa do que outra. Qualquer que seja o método da presciência de Deus, e o que quer que derive dos motivos quer seja intuitivo, tal presciência pressupõe o decreto de Deus criar e, deste modo, pressupõe a execução de alguns dos atos livres que se seguem à criação.
Mas esta certeza não significa necessidade. Ao harmonizar os decretos de Deus com a liberdade humana, não devemos ir ao outro extremo, e reduzir a liberdade humana ao mero determinismo, ou ao poder de o agente proceder a partir do seu caráter em circunstâncias determinadas pelo seu ambiente. Ação humana não é simplesmente a expressão de sentimentos anteriores dominantes; doutra forma nem Satanás, nem Adão poderiam ter caído, nem o cristão jamais pecaria. Por isso compartilhamos com Jonathan Edwards e seu Tratado sobre a Liberdade da Vontade, assim também com Edwards, o moço (Works, 1.420), Alexander (Moral Science, 107) e Charles Hodge (Syst. Theology, 2.278), que seguiram todos Jonathan Edwards, ao identificar a sensibilidade com a vontade, ao considerar os sentimentos como causa das volições e falar da conexão entre o motivo e a ação como necessários. Contrariamente, sustentamos que a sensibilidade e a vontade são duas forças distintas, que os sentimentos são ocasiões, mas nunca causa das volições e que, conquanto os motivos possam persuadir, eles nunca coagem a vontade. O poder de tomar uma outra decisão reside na vontade, ainda que nunca seja exercida. Juntamente com o puritano Charnock (Attributes, 1.448450), dizemos que "o homem tem poder para agir de outra forma que não seja a que Deus sabe antecipadamente o que ele vai fazer". Então, visto que os decretos de Deus não se executam por compulsão sobre a vontade humana, eles não são inconsistentes com a vontade livre do homem.
Que eles afastam todo o motivo do exercício humano
Quanto a isto respondemos que:
à) Eles não podem influir assim os homens porque não se dirigem aos homens, não são a regra da ação humana e se tornam conhecidos só depois do evento. Esta objeção é, portanto, desculpa para indolência e desobediência.
Os homens raramente apresentam essa desculpa em qualquer empreendimento em que a sua esperança e interesse estejam em jogo. É principalmente em matéria de religião que os homens empregam os decretos divinos para defender-se da sua preguiça ou inércia. Os passageiros do navio marítimo não negar a sua capacidade de andar do estibordo para o bombordo, na
certeza de que eles estão sendo levados ao destino por forças além do seu controle. Tal certeza seria ainda mais irracional no caso da inércia dos passageiros, como no caso de incêndio, que pudesse resultar na destruição do navio.
A objeção confunde os decretos de Deus com o destino. Porém deve-se observar que o destino não é inteligente enquanto os decretos são estruturados por um Deus pessoal na sabedoria infinita; o destino não se distingue da causa material e não deixa lugar para a liberdade humana enquanto os decretos excluem toda a noção de necessidade física; o destino não abrange nenhuma idéia ou fim moral enquanto os decretos fazem estas controlarem o universo.
North Brístish Rev., abr., 1870 - "O determinismo e a predestinação surgem de premissas que estão em regiões perfeitamente separadas do pensamento. O predestinacionista é obrigado por sua teologia a admitir a existência de uma vontade livre em Deus e, de fato, ele a admite no diabo. Mas a consideração final que estabelece uma grande lacuna entre o determinista e o predestinacionista é que este afirma a realidade da noção vulgar da deserção moral. Mesmo que ele não fosse obrigado por sua interpretação da Escritura a afirmar isto, ele o seria para aceitar a doutrina da reprovação eterna".
Hawthorne expressa a sua crença na liberdade humana quando diz que o próprio destino freqüentemente tem piorado na tentativa de afastá-lo do jantar. Benjamin Franklin, em sua Autobiografy, cita a desculpa do índio para embebedar-se: ''O Grande Espírito fez todas as coisas para algum uso e qualquer que seja o uso para o que elas foram feitas, para isso elas foram postas.
O Grande Espírito fez o rum para que os índios se embebedem e assim deve ser". Marta, em Isabel Carnaby desculpa-se por ter quebrado os pratos, dizendo: "Parece que tinha que ser assim. É o cantinho fino que no tempo certo se voltará e outra vez e quebrará". Um professor do Seminário: "Você já viu alguém morrer antes do Tempo"? O estudante: "Eu nunca soube de um caso desses". Os decretos de Deus, considerados como um plano de alcance total da parte de Deus, tem lugar na liberdade humana.
A objeção ignora a relação lógica entre o decreto do fim e o decreto dos meios que o asseguram. Os decretos de Deus não só garantem o fim a ser obtido, mas garantem a ação livre do homem anterior a ela. Todo o conflito entre os decretos e o exercício humano deve, portanto, ser aparente e não real. Porque o escrúpulo da consciência assegura-nos que a livre atuação deve existir pelo decreto divino; e apesar de que podemos ignorar o método através do qual executam-se os decretos, não temos nenhum direito de duvidar ou dos decretos ou da liberdade. Deve-se sustentar que eles são consistentes até que se prove que um deles é enganoso.
O homem que leva um vaso de peixe dourado não impede que o peixe se mova com desenvoltura dentro do vaso. O trilho duplo da estrada de ferro permite que o trem em formidável aproximação deslize sem colidir consigo mesmo. O nosso globo nos leva consigo, enquanto corre em torno do sol, apesar de que fazemos as nossas tarefas normais sem interrupção. Os dois movimentos que, à primeira vista, parecem inconsistentes entre si, na verdade são partes de um todo. O plano de Deus e o esforço do homem estão igualmente em harmonia. Myers, Human Personality 1.272, fala no "movimento molecular em meio à calma molar".
Dr. Duryea: "O caminho da vida tem duas cercas. Uma é arminiana, que nos livra do fatalismo; a outra é a calvinista, que nos livra do pelagianismo. Alguns bons irmãos gostam de andar sobre as cercas. Mas deste modo é difícil alguém conservar o equilíbrio. E é desnecessário porque há um lugar cheio de cercas. Quanto a mim, prefiro andar na estrada". A afirmação de Archibald Alexander é ainda melhor: "O calvinismo é o mais amplo dos sistemas. Ele considera a soberania divina e a vontade humana como dois lados de um teto que se liga a uma cumeeira além das nuvens. O calvinismo aceita ambas verdades. O sistema que nega um dos dois tem apenas metade do teto cobrindo a sua cabeça".
Spurgeon, Autobiography, 1.176, e The Best Bread, 109 - "O sistema de verdade revelada na Escritura não é simplesmente uma linha reta, mas duas, e ninguém jamais tem o direito de ver o evangelho enquanto não sabe olhar as duas linhas de uma só vez. ... Estes dois fatos [a soberania divina e a liberdade humana] são linhas paralelas; não posso uni-las, mas não se pode fazer cruzar uma com a outra". John A. Broadus: "Não se pode ver os dois lados de um edifício ao mesmo tempo; se se vai do outro lado, vêem-se dois lados diferentes, mas o primeiro está oculto. Isto é uma verdade se se está no solo. Mas se se sobe ao telhado ou num balão, pode-se ver que há dois lados e os dois juntos. Do mesmo modo a nossa mente infinita pode apossar-se da soberania e da liberdade de modo alternado, mas não simultâneo. Deus, do alto, pode ver ambos e, do céu também podemos ser capazes de olhar para baixo e ver".
Porque os decretos estabelecem conexão entre os meios e os fins e os fins são decretados só como resultado dos meios, estimulam esforço ao invés de desestimulá-lo. A crença no plano de Deus de que o sucesso compensará as lutas estimulará o corajoso e o perseverante esforço. Com base no próprio decreto de Deus a Escritura incentiva-nos ao uso diligente dos meios.
Deus decretou a colheita só como resultado do trabalho de semeadura e ceifa do homem; Deus decreta a riqueza do homem que trabalha e poupa; deste modo decretam-se as respostas à oração, e a salvação à fé. Compare a declaração de Paulo sobre o propósito de Deus (At. 27.22,24 - "não se perderá a vida de nenhum de vós ... Deus te deu todos quantos navegam contigo") advertindo o centurião e soldados que utilizem os recursos de segurança (v. 31 - "Se estes não ficarem no navio, não podereis salvar-vos").
Ver também Fp. 2.12,13 - "operai a vossa salvação com temor e com tremor, porque é Deus quem opera em vós tanto o querer como o efetuar segundo a sua boa vontade"; Ef. 2.10 - "somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas";
Dt. 29.29 - "As coisas encobertas são para o Senhor, nosso Deus, porém as reveladas são para nós e para os nossos filhos, para sempre, para cumprirmos as palavras desta lei".
SI. 59.10 [58.11] - "Deus meu, a misericórdia dele se antecipará" [Traduzida em Português segundo a Vulgata Latina pelo Pe. Antônio Ferreira de Figueiredo; Ed. aprovada 1842] antecipará, ou virá antes de mim; Is. 65.24 - "antes que eles clamem, eu responderei; estando eles ainda falando, eu os ouvirei"; SI. 23.2 - "Guia-me"; Jo. 10.3 - "chama pelo nome às suas ovelhas e as traz para fora". Estes textos descrevem a graça preveniente na oração, na conversão, e na obra cristã. Platão chama a razão e a sensibilidade de um casal de má parceria de que sempre um se adiantava em relação ao outro. Decretos e liberdade parecem ser de má parceria, mas não o são. Mesmo Jonathan Edwards, de teoria determinista da vontade, em seu sermão sobre a Pressão no Reino insiste no emprego dos meios e apela para os homens como se tivessem o poder de escolher entre os motivos do eu e os de Deus.
A soberania de Deus e a liberdade humana assemelham-se aos pólos positivo e negativo do magneto; eles são inseparáveis um do outro e são ambos elementos indispensáveis na atração do evangelho.
Pedro Damião, o grande monge-cardeal, diz que, no seu entendimento, o pecado mais duro de desarraigar é a disposição para o riso. A homenagem tributada ao ascetismo é a mesma tributada ao conquistador. Mas nem todas conquistas merecem homenagem. Temos aqui as melhores palavras de Lutero: "Se o nosso Deus pode fazer um grande lúcio (tipo de peixe) e o bom vinho do Reno, eu bem posso ter a ventura de comer e beber. Tu podes gozar de cada prazer no mundo que não é pecado; o teu Deus não te proíbe, mas ao invés disso o quer. E agrada ao querido Deus sempre que te regozijas e ris desde o fundo do coração". Mas a nossa liberdade tem limite. Marta Baker Dunn: "Pescando peixes miúdos, um homem atrai com um peixinho vivo e o lança na água. O peixinho parece estar nadando feliz à vontade, mas, no momento em que ele tenta sair do seu caminho planejado, percebe que há um anzol no seu dorso. É o que achamos quando tentamos nadar contra a correnteza dos decretos de Deus".
Que eles fazem Deus o autor do pecado
Sobre isto respondemos:
Eles fazem Deus não o autor do pecado, mas o autor dos seres livres que são os autores do pecado. Deus não decreta eficazmente operar os maus desejos ou escolhas nos homens. Ele só decreta o pecado no sentido de criar e preservar os que hão de pecar; em outras palavras ele decreta preservar as vontades humanas que, ao escolherem seus cursos, serão maus e farão o mal. Em tudo isso o homem atribui o pecado a si mesmo e não a Deus, e Deus detesta, denuncia e pune o pecado.
Os irmãos de José não eram menos maus pelo fato de que Deus pretendia fazer a conduta deles resultar num bem (Gn. 50.20). O Papa Leão X e suas indulgências causaram a Reforma, mas, nem por isso, ele foi menos culpado. Os senhores de escravos não teriam sido mais desculpáveis, mesmo que tivessem sido capazes de provar que a raça negra foi amaldiçoada na pessoa de Canaã (Gn. 9.25 - "Maldito seja Canaã; servo dos servos seja aos seus irmãos"). Fitch, em Christian Spectator, 3.601 - "Pode haver e há um propósito de Deus que não é eficiente. Ele abrange os atos voluntários dos seres morais sem criá-los pela eficácia divina".
Mt. 26.24 - "Em verdade o Filho do Homem vai, mas ai daquele homem por quem o Filho do Homem é traído! Bom seria para esse homem se não houvera nascido. Estava previsto que Cristo haveria de sofrer, mas isso não faz os homens agentes menos livres, nem diminui a culpa da sua traição e injustiça. Robert G. Ingersoll perguntou: "Por que Deus criou o diabo?" Respondemos que Deus não o criou. Deus fez um espírito livre e santo que abusou da sua liberdade, e que criou o pecado, e se fez diabo.
Pfleiderer, Phiios. Reiigion, 1.299 - "Tem sido feita referência ao mal 1. como um princípio extra-divino - a uns ou muitos espíritos maus, ou ao destino, ou à matéria - de qualquer modo a um princípio que limita o poder divino; 2. a uma falta ou defeito na divindade, ou à sua sabedoria imperfeita, ou à sua bondade imperfeita; 3. à culpabilidade humana, ou a uma imperfeição universal da natureza humana, ou transgressões particulares dos primeiros homens". Destas explicações, a terceira é a única verdadeira: a primeira é irracional; a segunda é blasfema. Contudo esta segunda é a explicação de Omar Khayyám, Rubáiyat, estrofes 80, 81 - Ó Tu, que fizeste com armadilha e com alçapão estabeleceste a estrada na qual hei de peregrinar, não queres com o predestinado rondar o Enmesh e depois atribuir a minha culpa ao pecado. Ó Tu, que fizeste o homem da mais mesquinha terra e com o Paraíso imaginaste a serpente: Porque todo o pecado juntamente com o rosto do homem está preteja- do - dá o perdão ao homem - e o toma"! E igualmente David Harum diz: "Se fiz algo de que deva entristecer, quero ser perdoado".
O decreto de permitir o pecado não é, portanto eficiente, mas permissivo, ou o decreto de permitir, distinto de um decreto de produzir pela eficácia do próprio pecador. Nenhuma dificuldade atribui a tal decreto permitir o pecado, que não atribua à verdadeira permissão dele. Mas Deus, na verdade, permite o pecado e para ele é correto permiti-lo. Deve, portanto ser correto para ele decretar permiti-lo. Se a santidade e sabedoria de Deus e o poder não são impugnados pela verdadeira existência do mal moral, eles não são impugnados pelo decreto original de que o pecado deve existir.
Jonathan Edwards, Works, 2.100 - "O sol não é a causa da escuridão que se segue ao ocaso, mas apenas a sua ocasião. 254 - "Se a expressão autor do pecado quer dizer pecador, o agente, ou produtor do pecado, ou aquele que pratica mal - será um vitupério e uma blasfêmia supor que Deus seja o agente do pecado. ... Mas se autor do pecado quer dizer o permissor ou não
embaraçador do pecado e, ao mesmo tempo, o que dispõe do estado dos acontecimentos de tal modo para fins e propósitos sábios, santos e mais excelentes, tal pecado, se permitido e não obstado, certamente ocorrer, não nego que Deus é o autor do pecado; não é vitupério para o Altíssimo ser, portanto, o autor do pecado". Sobre a objeção de que a doutrina dos decretos atribui a Deus duas vontades, e que ele preordenou o que ele proibiu, ver Bennet Tyler, Memoir and Lectures, 250-252 - "Um governante pode proibira traição; mas a sua ordem não o obriga a empregar toda a força para impedir a desobediência. Ele pode promover o bem do seu reino para impedir que se cometa a traição e o traidor seja punido conforme a lei. O Fato de que, em vista deste resultado ele escolhe não impedir a traição, não implica qualquer contradição ou oposição à vontade do monarca".
Um editor ímpio desculpou o seu vício no jornalismo, dizendo que ele não se envergonhava de descrever qualquer coisa que a Providência tinha permitido que acontecesse. Mas a palavra "permitido" tem aqui uma implicação de causa. Neste sentido concordamos com as palavras de Jonathan Edwards:
"O Ser divino não é autor do pecado, mas tão somente dispõe as coisas de modo tal que sem dúvida resultarão nele". Estas são as palavras encontradas no tratado sobre o Pecado Original. Neste Ensaio sobre a Liberdade da Vontade ele acrescenta uma doutrina da causa a qual devemos repudiar:
"A essência da virtude e do vício existente na disposição do coração e manifesta nos atos da vontade não está na sua Causa, mas na sua Natureza". Respondemos que o pecado não poderia ser condenado na sua natureza, se o homem não fosse a sua causa, mas Deus.
Robert Browning, Mihrab Shah: "Por que razão qualquer mal acontece ao homem - desde a dor da carne até a agonia da alma - Já que a misericórdia total de Deus concorre com a onipotência? Por que permite o mal para si mesmo, isto é, o pecado do homem, considerado como tal? Imagine um mundo livre de toda a dor, com um habitante próprio; purificado do mal em pensamento, palavras e obras; não seria bom? E por que é diferente"? Fairbairn responde a pergunta da seguinte maneira, em Modern Theology, 456 - "Uma vez que se pretende que se vença o mal permitindo-o; mas se houvesse obstáculo à sua aniquilação, então a vitória coincidiria com o mal que compeliu o Criador a refazer os seus passos. E recuar o seu impedimento para um outro estágio, se a possibilidade do mal tivesse embaraçado a ação criadora de Deus, então seria como que vencida pela sua própria sombra. Mas, por que ele criou um ser capaz de pecar? Do mesmo modo que ele criou-o capaz de obedecer. A capacidade de fazer o bem implica na capacidade de fazer o mal. A máquina não pode obedecer nem desobedecer, e a criatura que não tem a dupla capacidade só pode ser uma máquina, não um filho. Pode-se alcançar a perfeição moral, mas não criar-se; Deus pode criar um ser capaz de ação moral, mas não um ser com todos os frutos da referida ação armazenada dentro dele".
A dificuldade consiste em que na substância prende-se igualmente a todos os sistemas teístas - a questão porque se permite o mal moral sob o governo de um Deus infinitamente santo, sábio, poderoso e bom. Este problema
é, para as nossas forças finitas, incapaz de plena solução e deve permanece: em elevado grau envolto em mistério. Com relação a ele podemos dizer: Negativamente, - que Deus não permite o mal moral porque ele não é inalteradamente oposto ao pecado; nem porque o mal moral não fosse previsto e independesse de sua vontade; nem porque ele não pudesse impedi-lo em um sistema moral. Tanto a observação quanto a experiência que atestam múltiplos exemplos de libertação do pecado sem violação das leis do ser humano, proxbem-nos de limitar o poder de Deus.
Positivamente, - parecemos constrangidos a dizer que Deus permite o mal moral apesar de ser contrário à sua natureza e ainda o incidente de um sistema adaptado ao seu propósito da auto-revelação; ainda mais, porque é sua sábia e soberana vontade instituir e manter este sistema de que o mal moral é um incidente mais do que deter sua auto-revelação ou revelar-se através de outro sistema em que o mal moral seja continuamente evitado pelo exercício do poder divino.
Há quatro perguntas que, nem a Escritura, nem a razão nos capacitam a resolver completamente e que podemos com segurança dizer que só o altíssimo conhecimento do estágio futuro fornecerão respostas. São elas: Primeira: Como pode um Deus santo permitir o mal moral? Segunda: Como um ser criado puro pode cair? Terceira: Como podemos ser responsáveis pela depravação inata? Quarta: Como, com justiça, poderia Cristo sofrer? Vamos enfrentar a primeira pergunta. Uma teodicéia completa (0eóç, Deus e ôikti, justiça) seria uma vindicação da justiça de Deus, permitindo o mal natural e moral que existe no seu governo. Conquanto uma teodicéia completa está além das nossas forças, lançamos alguma luz sobre a permissão, da parte de Deus, do mal moral, considerando: 1) que a liberdade da vontade é necessária à virtude: 2) que, mais do que o homem, Deus sofre com o pecado; 3) que, com a permissão do pecado, Deus providenciou uma redenção; e 4) que Deus, em benefício do bem, terá domínio sobre todo o mal.
É possível que os anjos eleitos pertençam a um sistema moral em que se evite o pecado através de motivos repressivos. Não podemos negar que Deus impede o pecado em um sistema moral. Mas é de duvidar muito que Deus impeça o pecado num sistema moral melhor. É indispensável a mais perfeita liberdade para que se alcance a mais elevada virtude. Spurgeon: "Não poderia ter havido nenhum governo moral sem a permissão do pecado. Deus poderia ter criado marionetes, mas elas não teriam virtude". Behrends: "Se os seres morais fossem incapazes de perversão, o homem teria tido toda a virtude do planeta; isto é, nenhuma virtude". Então permitiu-se o pecado só porque ele poderia ser dominado em favor de um bem que é maior. Acrescentamos que este maior bem não é somente a mais elevada nobreza e virtude da criatura, mas também a revelação do Criador. Para o pecado, porém, no universo, não se entenderiam a justiça de Deus assim como a sua misericórdia.
G. Robinson: "Deus não poderia ter revelado o seu caráter tão perfeitamente sem o mal moral como o faz com este".
Robert Browning, Christimas Eve, diz-nos que era plano de Deus fazer o homem à sua imagem: "Criar o homem e depois deixá-lo capaz, como diz a sua palavra, de entristecê-lo; mas também capaz de glorificá-lo, como nunca uma máquina poderia fazer, que ora e adora, consciente da sua capacidade de qualquer coisa além de adorar e orar, naturalmente faz uma coisa perfeita". Upton, Hibbert Lectures, 268-270, 324, sustenta que o pecado e a iniqüidade são um mal absoluto, mas um mal permitido porque o seu cancelamento seria também o da possibilidade de atingir o mais elevado bem espiritual ao mesmo tempo de Deus e do homem.
C. G. Finney, Skeletons of a Course of Theological Studies, 26,27 - "A bondade infinita, o conhecimento e o poder apenas implicam que, se se fizesse um universo, seria melhor que fosse o mais natural possível". Dizer que Deus não pode ser o autor do universo em que há tanto mal, diz ele, "supõe que um universo melhor, sobre tudo, seria uma possibilidade natural. Isto supõe que o universo dos seres morais poderia, sob um governo moral administrado da melhor e mais sábia maneira seria completamente isento de pecado; mas tal ponto de vista carece de prova, o que nunca vai acontecer. ... O melhor universo possível não pode ser o melhor universo. Aplique-se a máxima legal 'O réu deve gozar do benefício da dúvida, na proporção do reconhecido caráter da sua reputação'. Indica-se tão claramente a benevolência de Deus, que podemos crer nela onde não podemos vê-la".
Segundo o ponto de vista do Dr. Taylor, Deus não tem um controle completo sobre o universo moral; os agentes morais podem praticar erros sob toda a possível influência que os evite; Deus prefere, consideradas todas as coisas, que as suas criaturas sejam santas e felizes e tudo faz para o sejam; a existência do pecado em seu todo não existe para melhor; o pecado existe porque Deus não pode impedi-lo num sistema moral; a bem-aventurança de Deus, na verdade, não é prejudicada pela desobediência das suas criaturas. Para a crítica destes pontos de vista ver Tyler, Letters on the New Haven Theology, 120,219. Tyler argumenta que a eleição e a não eleição implicam o poder de Deus para impedir o pecado; que permitir não é só submeter-se a alguma coisa que ele possivelmente não pode impedir. Acrescentamos que, de fato, Deus preservou os santos anjos e há "homens justos" que foram "aperfeiçoados" (Hb. 12.23) sem violar as leis da atuação moral. Inferimos que Deus poderia deste modo ter preservado Adão. A história da igreja induz a crer que não há nenhum pecador tão obstinado que tenha um coração impossível de ser renovado por Deus; mesmo um Saulo pode tornar-se um Paulo. Por isso não nos atrevemos a atribuir limites ao poder de Deus. Enquanto o Dr. Taylor insiste em que Deus não pode evitar o pecado em um sistema moral, isto é, em qualquer sistema moral, entende-se que o Dr. Park sustenta o ponto de vista grandemente preferível de que Deus não pode evitar o pecado no melhor sistema moral. Flint, Chrisfs Kingdom upon Earth, 59 - "A alternativa é, não o mal ou nenhum mal, mas o mal ou o impedimento do mal".
Mas mesmo admitindo que o sistema moral atual é o melhor e que em tal sistema o mal não pode ser evitado em consistência com a sabedoria e bondade de Deus fica ainda a questão de como o decreto do início de tal sistema pode consistir com o atributo fundamental de Deus, que é a santidade. Deste
insolúvel mistério podemos dizer com o Dr. John Brown, em Spare Hours, 273, diz a respeito da Teodicéia Novíssima de Arthur H. Hallam: "Como era de se esperar, permanece a tremenda questão onde ele a encontrou. O seu brilhante amor e gênio lançam um brilho aqui e ali na obscuridade, mas é tão breve como o relâmpago na noite escura como fuligem de chaminé - as queixadas da escuridão devoram-na - tal segredo pertence a Deus. Através das profundas e deslumbrantes trevas e do seu abismo de densas nuvens, 'tudo trevas, trevas, irrecuperáveis trevas', nenhum raio, por decidido que seja, jamais tem ou terá vindo; sobre a sua face as suas próprias trevas devem chocar até somente aquele para quem trevas e luz são a mesma coisa, para quem a noite brilha como o dia, diz: 'Haja luz'!"
Contudo, devemos ter em mente que o decreto da redenção é tão antigo como o da apostasia. A provisão da salvação em Cristo mostra a que grande custo para Deus permitiu-se a queda da raça em Adão. Aquele que ordenou o pecado também ordenou a expiação do pecado e um meio de livrar-se dele. Shedd, Theol. Dogm., 1.388 - "A permissão para pecar teve um custo maior para Deus do que o tem para o homem. Homem algum jamais suportou sacrifício algum ou sofrimento por causa do pecado como o Deus encarnado suportou. Isto mostra que Deus não está agindo como egoísta ao permiti-lo".
VI. NOTAS FINAIS
Empregos práticos da doutrina dos decretos
à) Inspira humildade pela representação dos insondáveis conselhos e absoluta soberania de Deus. b) Ensina confiança naquele que sabiamente ordenou nosso nascimento, nossa morte e circunstâncias mesmo nas mínimas particularidades e fez todas as coisas colaborarem no triunfo do seu reino e para o bem dos que o amam; c) Mostra aos inimigos de Deus que, como foram previstos os seus pecados e proveu-se um plano de Deus, assim eles nunca podem, enquanto permanecerem nos seus pecados, esperar escapar da pena decretada e ameaçada, d) Estimula o pecador a valorizar-se nos meios graciosos indicados, se ele for contado entre o número daqueles para quem Deus decretou a salvação.
Esta doutrina é um daqueles ensinos avançados da Escritura que, para a sua compreensão, requer uma mente madura e uma profunda experiência.
No início da vida cristã não se percebe o valor ou mesmo a verdade desta doutrina, mas, com o passar dos anos, ela se tornará um esteio sobre o qual se tem apoio. Nos tempos de aflição, calúnia, e perseguição a igreja tem encontrado seu consolo nos decretos e nas profecias em que eles se acham publicados. Só baseados nos decretos é que podemos crer que "todas as coisas concorrem para o bem" (Rm. 8.28) e orar "seja feita a tua vontade" (Mt. 6.10).
É uma evidência marcante da verdade da doutrina que mesmo os arminianos oram e cantam como os calvinistas. O arminiano Charles Wesley escreve: "Ele quer que eu seja santo - O que pode resistir a sua vontade?
O conselho da sua graça dentro de mim, sem dúvida ele cumprirá". Na teoria arminiana, não há lugar para a oração a Deus visando ao abrandamento dos corações endurecidos; a oração deve dirigir-se ao pecador; para a referida teoria, não é a vontade de Deus, mas a do pecador que encaminha a salvação. E apesar de que a doutrina dos decretos, que, à primeira vista parece desestimular o esforço, ela é o maior, aliás, o único incentivo eficaz ao esforço. Por esta razão, os calvinistas têm sido os mais firmes defensores da liberdade civil. Os que sem reservas mais se submetem à soberania de Deus são os que mais estão libertos do temor do homem. Não foi o arminiano Wesley, mas o calvinista Whitefield que originou o grande movimento religioso de que nasceu a igreja metodista, e o ministério de Spurgeon foi tão frutífero no trabalho das conversões como o de Finney.
O calvinismo logicamente requer a separação entre a igreja e o estado; embora Calvino não veja isto, o calvinista Roger Williams o vê. Logicamente o calvinismo requer uma forma republicana de governo; Calvino introduziu os leigos no governo da igreja e o mesmo princípio requer a liberdade civil como correlata. O calvinismo sustenta o individualismo e a responsabilidade direta do indivíduo para com Deus. Nos países baixos, na Escócia, na Inglaterra, na América, o calvinismo influiu poderosamente no desenvolvimento da liberdade civil. Ranke: "João Calvino foi virtualmente o fundador da América". Motley: "Para os calvinistas mais do que para qualquer outra classe de pessoas, são a causa da liberdade política da Holanda, da Inglaterra e da América".
O verdadeiro método da pregação da doutrina
Devemos evitar mais cuidadosamente o exagero ou a declaração desnecessariamente detestável, b) Devemos dar ênfase ao fato de que os decretos não se baseiam na vontade arbitrária, mas na sabedoria infinita, c) Devemos esclarecer que qualquer coisa que Deus faz ou quer fazer desde a eternidade ele se propôs fazer, d) Devemos ilustrar a doutrina até onde possível com exemplos de plenitude e ampla visão nos planos humanos das grandes empreitadas. e) Então podemos fazer ampla aplicação da verdade ao estímulo do cristão e à admoestação do não crente.
Como ilustração da previsão, veja-se o exemplo de Luís Napoleão, planejando o Canal de Suez e declarando a sua política como imperador, muito antes de subir ao trono da França. Sobre o tratamento prático dos decretos na pregação, ver Bushnell, Sermão sobre A Vida de cada Homem como um Plano de Deus, em Sermons for the New Life', Neemias Adams, Evenings with the Doctrines, 243; Spurgeon's Sermon on Os. 44.3 - "Porquanto te agradas- te deles". Robert Browning, Rabi Ben Esra\ "Envelhece em minha companhia! Melhor ainda é, pelo resto da vida estar com aquele que, no princípio nos deu a vida; Contempla todas as coisas, mas não te atemorizes'!"
Shakespeare, King Lear, 1.2 - "Eis o excelente janotismo do mundo que, quando envoltos na fortuna (sempre a superfluidade do nosso comportamento), acusamos o sol, a lua e as estrelas de serem culpados da nossa derrocada, como se fôssemos vilões por necessidade, tolos por compulsão e todo mal que nos ocorre se deve à confiança em Deus; extraordinária fuga do homem que deita a sua disposição à culpa de uma estrela"! Bom é Tudo que Bem Acaba: "Nossos remédios, que atribuímos ao céu, sempre estão dentro de nós; o destino celeste dá-nos o livre escopo; só deixam para trás os nossos leves desígnios quando somos obtusos". Júlio César: "Por vezes os homens são senhores dos seus destinos; a falha, caro Bruto, não está nas nossas estrelas, mas em nós mesmos, em nós, que somos subordinados."
Capítulo IV
AS OBRAS DE DEUS; OU A EXECUÇÃO DOS DECRETOS
SEÇÃO I - CRIAÇÃO
DEFINIÇÃO DE CRIAÇÃO
Criação é o ato livre do Deus trino pelo qual, no princípio, para sua glória, ele fez, sem o uso de matéria preexistente, todo o universo visível e invisível.
Criação designa origem através de um Deus transcendental e pessoal. Em si mesma, ela mesma não é Deus. O universo se relaciona com Deus como as nossas volições se relacionam conosco. Elas não são a nossa pessoa. Nós somos maiores que elas. A criação não é a simples idéia de Deus, ou mesmo o plano de Deus, mas a idéia exteriorizada, o plano executado; em outras palavras, implica um exercício não só do intelecto, mas também da vontade que não é instintiva e inconsciente, mas pessoal e livre. Tal exercício da vontade parece envolver, não o autodesenvolvimento, mas a autolimitação da parte de Deus; a transformação da energia em força e o começo do tempo com suas sucessões finitas. Mas qualquer que seja a relação da criação com o tempo, ela faz o universo totalmente dependente de Deus, como seu originador.
H. Johnson, em Andover Rev., Março 1891 e What is Reality, 285 - "Criação é origem com desígnio .... O homem nunca podia ter pensado em Deus como o criador do mundo sem que primeiro o tivesse conhecido como tal". Concordamos com a doutrina de Hazard de que o homem é a primeira causa criativa. Cria idéias e volições sem o emprego de matéria preexistente.
Ele também, indiretamente, através dessas idéias e volições, cria modificações cerebrais. Como Johnson mostra, tal criação prescinde de mãos, mas é elaborada, seletiva e progressiva. Schopenhauer: "A matéria nada mais é do que causa; seu verdadeiro ser é sua ação".
Prof. C. L. Herrick, Denison Quaterly, 1896: 248, e Psychological Review?, Março, 1899, defende o que chamamos dinamismo, que ele considera como única alternativa, para um dualismo materialista que situa no devido lugar a matéria e Deus acima e distinto dela. Ele defende que o predicativo da
realidade só pode ser aplicado à energia. Falar de energia dentro de algo é introduzir um conceito inteiramente incôngruo, pois ela continua nossa hospede ad infinitum. "A força", diz ele, "é energia sob resistência, ou energia autolimitada, pois todas partes do universo derivam da energia. Manifestando-se sob formas autocondicionantes, ou diferenciais, a energia é a força. A mudança da energia pura em força é a criação - introdução à resistência. A complicação progressiva de tal interferência é a evolução - forma de solução ordenada da energia. Substância é energia pura espontânea. A substância de Deus é a sua energia - o infinito e inesgotável estoque de espontaneidade que forma o seu ser. A forma que a autolimitação imprime sobre a substância, revelando-a na força, não é Deus, porque não mais possui os atributos de espontaneidade e universalidade apesar de que a força emana de Deus. Quando falamos de energia autolimitada simplesmente indicamos que a espontaneidade é inteligente. A soma dos atos de Deus é o seu ser. Não há nenhuma causa posterior ou extranea, que o estimula. Devemos reconhecer na fonte o que surge como resultado. Podemos falar de uma substância absoluta, mas não infinita, ou imutável. O universo é tão somente a expressão parcial de um Deus infinito".
Nosso ponto de vista sobre a criação aproxima-se tanto do de Lotze que condensam aqui as Dez afirmações de Broeke sobre a sua filosofia; "As coisas são as leis concretas da ação. Se a idéia do ser deve incluir a permanência bem como a atividade, devemos dizer que só a verdadeiramente pessoal o é. Tudo mais é fluxo e progresso. Só podemos interpretar a ontologia partindo da pessoalidade. A possibilidade da interação requer a dependência da multiplicidade mutuamente relativa do sistema sobre Aquele que é todo inclu- sivo e coordenativo. O finito é o modo ou fenômeno daquele que é O Ser. As coisas são apenas modos da energia do Ser. As personalidades auto- consciencientes são criadas, situadas e dependentes do Ser, de um modo diferente que a mente perceptiva interpreta como casual. A interação real só é possível entre o Infinito e o finito criado, isto é, pessoas autoconscientes. O finito não é parte do Infinito, nem esgota parcialmente a substância do Infinito. O Ser, por um ato de liberdade, situa os muitos e os muitos têm sua base e unidade na Vontade e no Pensamento do Ser. Tanto o finito como o Infinito são livres e inteligentes.
"Espaço não é uma realidade extramental, sui generis, nem uma ordem de relações entre as realidades, mas uma forma de aparência dinâmica, cuja base é a mudança fixa ordenada na realidade. Assim, o tempo é a forma de mudança, a interpretação subjetiva da intemporalidade embora sucessiva na realidade. Sendo Deus a base do processo terreno, ele o é no tempo. Naquilo em que transcende o processo terreno na personalidade autoconsciente, ele não é temporal. O movimento também é a interpretação subjetiva das mudanças das coisas, que são determinadas pelas exigências do sistema terreno e do propósito realizado nele. A verdade não é o atomismo, mas o dinamismo. Os fenômenos físicos referem-se à atividade do Infinito, dada a um caráter substantivo porque pensamos sob a forma de substância e atributo. O mecanismo é compatível com a teleologia. O mecanismo é universal e necessário a todo o sistema. Entretanto é limitado pelo propósito e pelo possível aparecimento de qualquer nova lei, força ou ato de liberdade."
"A alma não é uma função de atividades materiais, mas uma realidade verdadeira. O sistema é tal que pode admitir novos fatores e a alma é um desses possíveis novos fatores. A alma é criada como realidade substancial em contraste com outros elementos do sistema que são apenas manifestações fenomenais daquele que é a realidade. A relação entre a alma e o corpo é a interação entre a alma e o universo, e o corpo é a parte do universo que está em estreita relação com a alma (versus Bradley, que sustenta que 'o corpo e a alma são igualmente estruturas fenomenais e nenhuma delas tem qualquer direito ao fato de que é possuído pelo outro'). O pensamento é o conhecimento da realidade. Devemos supor um ajuste entre o sujeito e o objeto. A suposição baseia-se no postulado da perfeita moralidade de Deus". Para Lotze, então, a única criação real é a das personalidades finitas, - e a matéria outra coisa não é senão um modo da atividade divina."
Para mais explicação da nossa definição devemos assinalar que:
Criação não é "produção do nada", como se o "nada" fosse uma substância da qual se pudesse formar "algo".
Não consideramos a doutrina da Criação ligada à expressão "criação a partir do nada" surgindo e caindo com ela. A expressão é filosófica e para ela não temos garantia bíblica; é passível de objeção por indicar que o "nada" pode ser objeto de pensamento e fonte do ser. O germe da verdade que pretende levar em si pode ser melhor compreendido na expressão "sem o emprego de matéria preexistente".
Criação não é moldagem de matéria preexistente, nem emanação da substância da Divindade, mas fazer existir aquilo que uma vez não existia, quer em forma quer em substância.
Não há nada de divino na criação a não ser a origem da substância.
A feitura compete também à criatura. Gassendi disse para Descartes, que a criação de Deus, se ele é o autor das formas, mas não das substâncias, é tão somente como o alfaiate que veste o homem com a roupa que é dele. Mas a substância não é necessariamente material. Ao invés disso, devemos concebê-la segundo a analogia das nossas próprias idéias e volições e manifestações do espírito. A criação não é apenas o espírito de Deus, nem mesmo o plano de Deus, mas a exteriorização daquele pensamento e a execução daquele plano. A Natureza é "uma grande folha da parte de Deus, caída do céu" e "nada contendo de comum ou impuro"; mas a matéria não é uma parte de Deus, assim como nossas idéias e volições não são parte de nós mesmos.
A natureza é manifestação parcial de Deus, mas não exaure a pessoa de Deus.
Criação não é um processo instintivo ou necessário da natureza divina, mas um ato livre de uma vontade racional, exercido com uma finalidade definida e suficiente.
Em gênero, a criação é diferente do eterno processo da natureza divina em virtude do qual falamos da geração e do procedimento. O Filho é gerado pelo Pai e é da mesma essência; o mundo é criado sem matéria preexistente; é diferente de Deus e feito por Deus. A geração é um ato necessário; a criação é um ato da livre graça de Deus. A geração é eterna, intemporal; a criação está no tempo, ou com o tempo.
Studia Biblica, 4.148 - Criação é a limitação voluntária que Deus impôs a si mesmo. ... Só pode ser considerada como uma criação de espíritos livres.
... É uma forma de o poder onipotente submeter-se à limitação. Criação não é desenvolvimento de Deus, mas sua circunscrição. ... O mundo não é a expressão de Deus, ou a emanação de Deus, mas sua autolimitação.
Criação é o ato do Deus trino no sentido de que todas as pessoas da Trindade, não criadas, têm parte na sua realização - o Pai como causa origina- dora, o Filho como causa mediadora e o Espírito como causa realizadora.
Ao tratarmos da Trindade e da divindade de Cristo como elementos dessa doutrina, provou-se que toda a atividade criadora de Deus é exercida através de Cristo. Podemos aqui fazer referências a textos anteriormente considerados, a saber: Jo. 1.3,4 - "Todas as coisas foram feitas por intermédio dele e, sem ele, nada do que foi feito se fez. A vida estava nele..." I Co. 8.6 - "um Senhor, Jesus Cristo, através de quem são todas as coisas". Cl. 1,16 - "Todas as coisas foram criadas através dele e para ele". Hb. 1,10 - "Tu, Senhor, no começo lançaste o fundamento da terra e os céus são obras das tuas mãos".
A obra do Espírito Santo parece ser a de completar, aperfeiçoar. Para entender isto, basta apenas lembrar que o Espírito Santo consuma o nosso conhecimento e amor cristão e que ele também é o princípio da nossa própria consciência, unindo sujeito e objeto em um sujeito-objeto. Se se concebe a matéria como manifestação do espírito, segundo a filosofia idealista, então o Espírito Santo pode ser considerado como agente aperfeiçoador e realizador na exteriorização das idéias divinas. Conquanto todas as coisas são feitas através do Verbo, o Espírito Santo é o autor da vida, da ordem e do adorno.
A criação não é simples manufatura; é ato espiritual.
John Caird, Fundamental Ideas of Christianity, 1.120 - "A criação do mundo não pode dever-se a um ser exterior. O poder pressupõe um objeto sobre o qual é exercido. 129 - Na própria natureza de Deus há uma razão por que ele deve revelar-se e comunicar-se, um mundo de existências finitas, ou cumprir e realizar-se no ser e vida da natureza e do homem. Sua natureza não seria o que é se esse mundo não existisse; sem ela faltaria algo na comple- mentação do ser divino. 144 - Mesmo com relação ao pensamento humano ou inteligência é a mente ou espírito que cria o mundo. Não se trata de mundo pronto o qual podemos ver; ao perceber o mundo, fazemo-lo. 152-154 - Fazemos progresso quando deixamos de pensar os nossos pensamentos e fazemos a média da Inteligência universal". Conquanto aceitemos a interpretação idealística da criação de, discordamos da sua indicação de que a criação é uma necessidade de Deus. O ser trinitário de Deus o faz suficiente em si mesmo, ainda que não houvesse criação. Contudo, as próprias relações
trinitárias lançam luz sobre o método da criação, visto que nos esclarecem a ordem de toda a atividade divina.
PROVA DA DOUTRINA DA CRIAÇÃO
A criação é uma verdade da qual a mera ciência ou a razão não podem assegurar-nos completamente. A ciência física pode observar e registrar mudanças, mas nada conhece sobre as origens. A razão não pode absolutamente desaprovar a eternidade da matéria. Para a prova da doutrina da criação, portanto, confiamos totalmente na Escritura. A Escritura suplementa a ciência e toma sua explicação do universo completa.
Drummond em sua Natural Law in the Spiritual World, defende o ponto de vista de que os átomos, como "artigos manufaturados", e a dissipação da energia, provam a criação do visível a partir do invisível. Mas Sir Charles Lyell diz-nos: "A Geologia é a autobiografia da terra; mas, como todas autobiografias, não remonta ao início". Hopkins, Yale Lectures, sobre Pontos de Vista Bíblicos a Respeito do Homem: "A priori nada há contra a eternidade da matéria". Wardlaw, Syst. Theol., 265 - Não podemos formar qualquer concepção distinta da criação a partir do nada. A sua própria idéia nunca podia ter vindo à mente humana se não tivesse sido tradicionalmente transmitida como parte da revelação aos pais da raça".
O filósofo alemão Hartmann retrocede aos elementos originais do universo e diz que a ciência permanece petrificada ante a questão da sua origem como diante da cabeça da Medusa. Porém, diante de problemas, diz Dorner, o dever da ciência não é a petrificação, mas a solução. Isto é verdade peculiarmente se a ciência é, como pensa Hartmann, uma explicação completa do universo. Porque a ciência, por seu próprio reconhecimento, não fornece nenhuma explicação sobre a origem das coisas, a revelação da Escritura a respeito da criação vai ao encontro de uma demanda da razão humana acrescentando um fato sem o qual a ciência seria sempre destituída da mais elevada unidade e racionalidade.
E. H. Johnson, Andover Review, Nov. 1891, 502 sg, assinala que a evolução pode reduzir-se a elementos cada vez mais simples, a matéria imóvel sem nenhuma qualidade que não seja o ser. Ora, torne-a mais simples, desves- tindo-a da existência, e chegar-se-á à necessidade de um Criador. É impossível um infinito número de estágios. Não existe número infinito. Em algum lugar existe um começo. Admitimos com o Dr. Johnson que a única alternativa para a criação é o dualismo materialista, ou a matéria eterna que é o produto da mente e vontade divinas. A respeito das teorias do dualismo e da criação a partir da eternidade discutiremos daqui para frente.
Declarações diretas da Escritura
Gênesis 1.1 - "No princípio criou Deus o céu e a terra". Tem-se objetado a isso que o verbo K13 não denota necessariamente a produção sem o uso de matéria preexistente (ver Gn. 1.27 - "criou Deus o homem à sua imagem": cf 2.7 - "formou o Senhor o homem do pó da terra"; também Sl. 51.10-"Cria em mim um coração puro").
"Nos dois primeiros capítulos de Gênesis emprega-se K13 1) para denotar a criação do universo; 2) para a criação dos grandes monstros (1.21); 3) para a criação do homem (1.27). Em todo lugar lemos que Deus faz a partir de uma substância já criada, o firmamento (1.7), o sol, a lua e as estrelas (1.16), o irracional (1.25); ou a formação dos animais do campo produzidos da terra (2.19); ou, por fim, a feitura da mulher a partir da costela do homem (2.22) - citada no Bib. Com. 1.3. Guyot, Creation, 30 - Portanto, reserva-se bará para assinalar a primeira introdução de cada uma das três esferas da existência - o mundo da matéria, o mundo da vida e o mundo espiritual representado pelo homem".
Em resposta admitimos que o argumento para a criação absoluta derivado da palavra não é inteiramente conclusivo. Outras considerações em conexão com o sentido desta palavra, contudo, parecem tomar esta interpretação de Gênesis 1.1a mais plausível. Passamos a mencionar algumas destas considerações.
Conquanto reconheçamos que o verbo K"Q "não denota necessária ou invariavelmente produção sem o uso de matéria preexistente, sustentamos ainda que significa a produção de um efeito para o qual nenhum antecedente natural existia antes e que só pode ser o resultado da atuação divina". Por esta razão, usa-se a espécie no Kal somente para Deus e nunca vem acompanhado de um acusativo indicando matéria.
O caso acusativo, indicando matéria, nunca vem depois de bará nas passagens indicadas em razão de que está ausente todo o pensamento sobre a matéria. Esta citação é de Green, Hebrew Chrestomathy, 67. Porém E. F. Robinson, Christian Theology, 88, assinala: Se a Escritura ensina a origem absoluta da matéria - cuja criação provém do nada, é questão aberta. ... Não se fornece nenhuma evidência decisiva da palavra hebraica barâ'.
O Prof. W. J. Beecher, em S. S. Times, 23 de dezembro de 1893, 807, oferece uma afirmação moderada e erudita dos fatos - "Criar é gerar divinamente. ... A Criação no sentido bíblico não exclui a utilização de matéria preexistente; porque o homem foi tomado da terra (Gn. 2.7) e a mulher, da costela do homem (2.22). Comumente Deus traz à existência coisas através da operação de causas secundárias. Porém é possível, pensamos, desviar a atenção das causas secundárias e pensar em qualquer coisa simplesmente originada de Deus, independentemente das causas secundárias. Pensar em tal coisa é pensar na criação. A Bíblia fala em Israel como criado, da prometida prosperidade de Jerusalém como criada, dos Amonitas e do rei de Tiro como criados, de pessoas em qualquer época da história como criadas (Is. 43.1-15; Ez. 21.30; 28.13,15; SI. 102.18; Ec 12.1; Ml. 2.10). Pensa-se nos milagres e nos últimos princípios das causas secundárias como atos necessariamente criadores; segundo o propósito que se tem em mente pode-se pensar em todas outras origens das coisas, ou como criadas ou como efetuadas por causas secundárias".
No relato da criação, N"Q parece distinguir-se de ntoy "fazer" com ou sem o uso de matéria já preexistente (mtüU1? N13, "criado através da feitura" ou "fazer através da criação", em 2.3; e UWI, do firmamento em 1.7) e de IS', "formar" de tal matéria (ver KIT-!, sobre o homem como um ser espiritual, em 1.27; mas "lin, a respeito do homem considerado como um ser físico, em 2.7).
Conant, Genesis, 1; Bib. Com., 1,37 - " 'criado para fazer' (em Gn. 2.3) = criado do nada para que ele pudesse formular disso todas obras registradas nos seis dias". Contra estes textos, devemos colocar outros em que não aparece nenhuma distinção precisa destas palavras a respeito de uma ou de outra Bara é usada em Gn. 1.1, Asah em Gn. 2.4 a respeito da criação dos céus e da terra. A respeito da terra usa-se tanto yatzar como asah em Is. 45.18. Com relação ao homem, em Gn. 1.27 encontramos bará; em Gn. 1.26 e 9.6 temos asah; e em Gn. 2.7 yatzar. Em Is. 43.7 encontram-se todos os três no mesmo verso: "... e o tenho bará para a minha glória e o tenho yatzar e o tenho asah'. Em Is. 45.12 "asah a terra e bará o homem ..." Mas em Gn. 1.1 lemos "Deus bará a terra" e em 9.6 "asah o homem". Is. 44.2 "O Senhor que te asah (/'.e. o homem) e te yatzaimas em Gn. 1.27 Deus "bará o homem". Em Gn. 5.2 "masculino e feminino os bará". Em Gn. 2.22 "da costela ele asah uma mulher"; em Gn. 2.7 "yatzai" o homem i.e. bará o masculino e o feminino, embora asah a mulher e yatzar o homem, asah nem sempre é usado para transformar. SI. 51.10-"bará em mim um coração puro";
Is. 41.19 - "a faia, o olmeiro e o álamo" na natureza - bará, Is. 65.18 - Deus "bará para Jerusalém alegria e para o seu povo gozo".
O contexto mostra que o sentido aqui é de fazer sem o uso de matéria preexistente. Porque a terra em sua condição rude, informe, caótica ainda é chamada "terra" no verso 2, a palavra K13 no verso 1 não pode referir-se a qualquer dimensão ou moldagem dos elementos, mas deve significar chamá- las a ser.
Oehler, Theol. ofO. T., 1,177 - "berashith, 'no princípio'a criação divina é fixada como o começo absoluto, não como obra realizada em algo que já existia". O v. 2 não pode ser o começo de uma história porque começa com a palavra 'e'. Delitzsch fala da expressão 'a terra era sem forma e vazia': a partir disto é evidente que o estado vazio e informe da terra não foi não criado e sem começo. ... "É evidente que 'o céu e a terra' como Deus os criou no princípio não eram o universo bem ordenado, mas o mundo em sua forma elementar".
A palavra X"I3 pode ter tido uma outra significação original de "cortar", "formar" e que retém este sentido na conjugação piei, não necessita prejuízo à conclusão a que se chega porque termos expressivos dos processos mais espirituais derivam de raízes sensoriais. Se X"Q não significa criação absoluta não há na língua hebraica nenhuma palavra que expresse esta idéia.
é) Mas esta idéia de produção sem o uso de matéria preexistente inquestionavelmente ocorreu entre os hebreus. As mais tardias Escrituras mostram que ela havia se tomado natural à mente hebraica. A posse desta idéia pelos hebreus, conquanto não seja achada de modo algum, ou obscura e ambiguamente expressa nos livros sagrados dos pagãos, pode ser melhor explicada supondo que ela derivava desta antiga revelação em Gênesis.
E. H. Johnson, Outline of Syst. Theol., 94 - "Rm 4.17 dá-nos conta de que a fé de Abraão, a quem Deus prometera um filho, ligava-se ao fato de que Deus chama à existência as coisas que não são! Isto pode ser aceito como a interpretação de Paulo sobre o primeiro verso da Bíblia". É possível que o pagão tivesse ocasionais lampejos desta verdade apesar de que não com tanta clareza como a que Israel possuía. Talvez possamos dizer que, mais tarde, através das perversões, os cultos à natureza, algo da revelação original sobre a criação absoluta brilhasse, tão debilmente como o primeiro escrito de um palimpsesto que aparece através do subseqüente junto ao qual foi apagado. Se a doutrina da criação absoluta se encontra entre os pagãos, é grandemente rasurada e confusa. Nenhum dos livros pagãos a ensina como as Sagradas Escrituras dos hebreus. Contudo, fica a impressão de que sem esta "ênfase do Espírito Santo o desatento mundo ter-se-ia perdido".
Bib. Com. 1,31 - "Talvez nenhuma outra língua antiga, por mais refinada e filosófica que fosse, poderia ter distinguido com tanta clareza os diferentes atos daquele que fez todas as coisas [como o hebreu fez com as quatro diferentes palavras], e isso porque toda a filosofia pagã avaliava a matéria como não criada, mas eterna". Prof. E. D. Burton: "O Bramanismo e a religião original, de que o Zoroastrianismo é uma reforma, eram divisões orientais e ocidentais de uma religião ariana positiva e, provavelmente monoteísta. Os Vedas, que representam o Bramanismo, deixam uma pergunta sobre a origem do mundo: se de Deus pela emanação, ou feitura de material eternamente existente. Mais tarde o Bramanismo veio a ser panteísta e o Budismo, uma Reforma do Bramanismo, ateísta".
Inclinamo-nos ainda a sustentar que nenhuma nação antiga, além dos hebreus, conheceu a doutrina da criação absoluta. Recentes investigações, contudo, tornam isto um tanto mais duvidoso do que outrora podia ser. Sayce, Hilbert Lectures, 142,143, vê a criação entre os antigos babilônios. Em sua obra Religions of Ancient Egypt and Babylonia, 372-397, diz: "Os elementos da cosmologia hebraica são todos babilônicos; mesmo a palavra criadora em si era uma concepção babilônica; mas o espírito que inspira a cosmologia é a antítese daquele que inspirou a cosmologia da Babilônia. Entre o politeísmo da Babilônia e o monoteísmo de Israel há uma lacuna que não pode ser preenchida. Logo que temos um monoteísmo claro, vem a criação absoluta como corolário. Com a corrupção da idéia monoteísta, a criação deu lugar à transformação panteísta".
Outros têm defendido agora que o Zoroastrianismo, os Vedas e a religião dos antigos egípcios tinham a idéia da criação absoluta. Hino védico no Rig Veda, 10.9, citado por J. F. Clarke, Ten Great Religions 2.205 - "Originaria- mente este universo era uma só alma; nada mais existia, quer ativo, quer inativo. Pensava ele: 'criarei mundos'; e assim criou vários mundos: a terra, a luz, o ser mortal, as águas". Renouf, Hibbert Lectures, 216-222, fala de um papiro sobre a escada do Museu Britânico que reza: "O grande Deus, Senhor do céu e da terra, que fez todas as coisas que são ... o onipotente Deus, auto- existente, que fez o céu e a terra;... o céu ainda não era criado, não criada era a terra; tu ajuntaste a terra... aquele que fez todas as coisas, mas não foi feito".
Porém a religião egípcia, mais tarde, em seu desenvolvimento, assim como o Bramanismo, era panteísta e é possível que todas as expressões que temos citado devem ser interpretadas não como indicação de uma crença na criação a partir do nada, mas como afirmação da emanação, ou como a divindade assumindo novas formas e modos de existência.
Hebreus 11.3 - "Pela fé entendemos que os mundos foram formados pela palavra de Deus, de modo que o que se vê não foi feito do que aparece" = o mundo não foi feito da matéria perceptível aos sentidos e preexistente, mas pelo fiat direto da onipotência (ver Alford e Lünemann, Meyer's Com. In loco).
Compare 2 Macabeus 7.28 - èí; oúk õvicúv È7toÍT"aEv autá ó ©eóç. A Vulgata traduz isto como "quia ex nihilo fecit illa Deus", e é da Vulgata que surge a expressão "criar a partir do nada". Hedge, Ways of the Spirit, assinala que a Sabedoria 11.17 contém èÇ àiiópcpou üX/riç e interpreta isto como o èE, ow õvtcov de 2 Macabeus e nega que isto se refere à criação a partir do nada. Porém convém lembrar que mais tarde foram compostos escritos apócrifos sob a influência da filosofia platônica; que a passagem na Sabedoria pode ser uma interpretação racionalista do que se acha em Macabeus; e que, ainda que fosse independente não deveríamos admitir a harmonia do ponto de vista nos apócrifos. 2 Macabeus 7.28 deve fixar-se como testemunho da crença judaica na criação sem matéria preexistente, - crença que não pode levar a nenhuma outra fonte que não sejam as Escrituras do A.T. Comp. Ex. 34.10-"Farei maravilhas tais como não têm sido feitas (criadas) em toda a terra"; Nm. 16.30 "se
o Senhor fizer (criar uma criatura) uma nova coisa"; Is. 4.5 - "O Senhor criará ... nuvem e fumaça"; 41.20 - "o Santo de Israel fez (criou) isso"; 45.7,8 - "Formo a luz, crio as trevas"; 57.19 - "Crio o fruto dos lábios"; 65.17 - "Crio novos céus e nova terra"; Jr. 31.22 - "O Senhor criou uma nova coisa".
Rm. 4.17 - "Deus, que vivifica os mortos e chama as coisas que não são como se fossem"; 1 Co. 1.28 - "[Deus escolheu] as coisas que não são para aniquilar as que são"; 2 Co. 4.6 - "Deus, que disse, a luz brilhará nas trevas"
= criou a luz sem matéria preexistente, porque as trevas não são matéria;
Cl. 1.16,17- "Nele todas as coisas foram criadas .... e ele é antes de todas as coisas". Assim também SI. 33.9 - "Falou e logo se fez"; 148.5 - "Mandou e foram criados"; Filo, Criação do Mundo, caps. 1-7 e A Vida de Moisés, livro 3, cap. 36 - "Ele produziu a mais perfeita obra, o Cosmos, do não existente (xox>
I^t) õvtoç) para ser (eiç tò eivai)". E. H. Johnson, Sys. Theol., 94 - "Não temos razão alguma para crer que a mente hebraica tinha a idéia da criação a partir de matéria invisível. Mas a criação a partir da matéria visível acha-se negada expressamente em Hb. 11.3. Este texto, portanto, eqüivale a uma afirmação de que o universo foi feito sem a utilização de qualquer matéria preexistente".
Evidência indireta da Escritura
A duração passada do mundo é limitada; b) antes que o mundo começasse a ser cada pessoa da divindade já existia; c) a origem do universo é atribuída a Deus e a cada uma das pessoas da divindade. Estas representações da Escritura não são apenas mais consistentes com o ponto de vista de que o universo foi criado por Deus sem o uso de matéria preexistente, mas são inexplicáveis sob qualquer das outras hipóteses.
Mc. 13.19 - "desde o princípio da criação, que Deus criou, até agora";
Jo. 17.5 - "antes que mundo existisse"; Ef. 1,4 - "antes da fundação do mundo". b) SI. 90.2 - "antes que os montes nascessem, ou que tu formasses a terra e o mundo, sim, de eternidade a eternidade tu és Deus". Pv. 8.23 - "Desde a eternidade fui estabelecida; desde o princípio, antes do começo da terra"; Jo. 1.1 - "No princípio era o Verbo"; Cl. 1.17- "Ele é antes de todas as coisas"; Hb. 9.14 - "o Espírito eterno" (ver Comentário de Tholuck in loco),
Ef. 3.9 - "Deus, que tudo criou". Rm. 11.36 - "dele são todas as coisas".
Co. 8.6 - "um só Deus, o Pai, de quem são todas as coisas"... Jo. 1.3 - "Todas as coisas foram feitas por intermédio dele". Hb. 1.2 - "através de quem também fez os mundos". Gn. 1.2 - "e o Espírito de Deus se movia sobre a face das águas".
Destas passagens podemos inferir que 1) todas as coisas dependem absolutamente de Deus; 2) Deus exerce o controle supremo sobre todas as coisas; 3) Deus é o único ser infinito; 4) só Deus é eterno; 5) não há nenhuma substância a partir da qual Deus cria; 6) as coisas não procedem de Deus por emanação necessária; o universo tem sua fonte e origem na vontade transcendente de Deus.
III. Teorias que se opõem à Criação
Dualismo
Há duas formas de dualismo:
A que sustenta dois princípios auto-existentes: Deus e a matéria. Estes são distintos e coetemos. A matéria, contudo, é uma substância inconsciente.
negativa e imperfeita, e está subordinada a Deus e se toma instrumento da vontade dele. Este é o princípio subjacente dos gnósticos alexandrinos. É essencialmente uma tentativa de combinar com Cristo a concepção platônica ou aristotélica do Í5^r". Deste modo pensava-se contar com a existência do mal e escapar à dificuldade de imaginar uma produção sem o uso de matéria prée- xistente. Basílides (que floresceu em 125) e Valentino (falecido em 160), representantes deste ponto de vista, sofreram a influência da filosofia hindu e seu dualismo quase não difere do panteísmo. Semelhante ponto de vista tem sido sustentado modernamente por John Stuart Mill e talvez por Frederick W. Robertson.
O dualismo procura mostrar como o Uno se torna múltiplo, como o Absoluto dá surgimento ao relativo, como o bem pode coexistir com o mal. A üXri de Platão parece nada significar senão espaço vazio, do qual o não ser, ou simplesmente a existência negativa impede a plena realização das idéias divinas. Aristóteles considerava a üXti como uma causa mais positiva da imperfeição, - é como se fosse a matéria dura que embaraça o escultor na expressão do seu pensamento. O verdadeiro problema tanto para Platão como para Aristóteles é explicar a passagem da existência puramente espiritual para a que é fenomenal e imperfeita, do absoluto e ilimitado para aquilo que existe no espaço e no tempo. Em vez de ser considerado criado, o finito é como se tivesse existência eterna, limitando todas manifestações divinas.
A üÀri, por ser simples abstração, torna-se fonte positiva ou negativa do mal.
Os judeus de Alexandria, sob a influência da cultura helenista, procuraram fazer este dualismo explicar a doutrina da criação.
Basílides e Valentino, contudo, estavam também sob a influência de um filósofo panteísta trazida do remoto Oriente - a filosofia do budismo, que ensina que a fonte original de todos é um inominável Ser, destituído de todas as qualidades e, assim, não se distingue do Nada. Deste Ser, que é o não-ser, procedem todas as coisas existentes. Aristóteles e Hegel semelhantemente ensinam que o Ser puro é igual ao Nada. Mas, como o objetivo dos filósofos alexandrinos era mostrar como algo podia ser originado, eles foram obrigados a conceber o Nada primitivo como capaz de tal origem. Contudo, eles, na falta de qualquer concepção de criação absoluta, foram compelidos a conceber a matéria que podia ser formada. Por isso, o vazio, o Abismo toma lugar na natureza. Se se disser que eles não concebiam o Vazio ou o Abismo como substância, respondemos que eles lhe deram tanto existência substancial como deram a primeira Causa das coisas, que, apesar de suas descrições negativas envolviam a Vontade e o Desígnio. E embora eles não atribuam a esta substância secundária uma influência positiva para o mal, eles vêem o inconsciente empecilho de todo o bem.
Principal Tulloch, Enciclopédia Britânica, 10.704 - "Na Gnose alexandrina ... a correnteza do ser em seu fluxo sempre externo entra em contato com a matéria morta que, deste modo, recebe animação e se torna uma fonte viva do mal". Windelband, Hist. Philosophy, 129,144,239 - "Com Valentino, lado a lado com a divindade derramada na Pleroma da Plenitude das formas espiri-
tuais, aparece o Vazio, igualmente original e a partir da eternidade; ao lado da Forma aparece a matéria; ao lado do bem aparece o mal". Mansel, Gnostic Heresis, 139 - "A teoria platônica da matéria inerte, semi-existente ... foi adotada pela gnose do Egito ... 187 - Valentino não se contenta, como Platão, ... em admitir como germe do mundo natural a matéria informe existente desde a eternidade. ... A teoria inteira pode ser descrita, na linguagem alegórica, como o desenvolvimento da hipótese panteísta que Basílides adotara em seu esboço". A. H. Newman, Ch. History, chama a filosofia de Basílides de "fundamentalmente panteísta". "Valentino", diz ele, "não se preocupava tanto em insistir na original não existência de Deus e de tudo". Respondemos que, mesmo para Basílides, o ser não existente é dotado de poder; e este poder nada realiza enquanto não entre em contato com as coisas não existentes e, a partir delas, modele a semente do mundo. As coisas não existentes são tão substanciais como o Modelador e implicam tanto objetividade como limitação.
Lightfoot, Com. on Colossians, 76-113, traçou uma conexão entre a doutrina gnóstica, a mais antiga heresia colossense e o ainda mais antigo ensino dos essênios da Palestina. Todos estes se caraterizavam 1) pelo espírito de casta ou exclusividade intelectual; 2) pelos dogmas peculiares quanto à criação e quanto ao mal; 3) pelo ascetismo prático. A matéria é má e faz separação entre o homem e Deus; por isso os seres intermediavam entre o homem e Deus como objetos de adoração; também, por isso, a mortificação do corpo como um meio de purificar o homem do pecado. O antídoto de Paulo para ambos os erros era simplesmente a pessoa de Cristo, o verdadeiro e único mediador e santificador.
Harnack, Hist. Dogma., 1.128 - "A maioria dos empreendimentos gnósti- cos podem ser vistos como tentativas de transformar o cristianismo em teoso- fia. ... No gnosticismo o espírito helênico desejava fazer-se mestre do cristianismo ou, mais corretamente, das comunidades cristãs". ... 232 - Harnack representa uma das doutrinas filosóficas fundamentais do gnosticismo, a do cosmos como mistura da matéria com centelhas divinas que surgiram de uma descida destas para aquela [gnosticismo alexandrino], ou, como diz alguém, de perverso, ou simplesmente permitiram o empreendimento de um espírito subordinado [gnosticismo sírio]. Podemos comparar o saduceu hebreu com o epicurista grego; o fariseu com o estóico; o essênio com o pitagórico. Os fariseus exageravam a idéia da transcendência de Deus. Os anjos elevem estar entre Deus e o mundo. Os gnósticos intermediários eram a realização lógica. Só as obras exteriores de obediência eram válidas. Em lugar disto, Cristo pregou uma religião a partir do coração. Wendt, Teaching of Jesus, 1.52 - "A rejeição dos sacrifícios de animais e conseqüente abstinência da adoração no templo da parte dos essênios, que parecem estar em desarmonia com o resto da sua obediência legal explica-se melhor como conseqüência da idéia de que a oferta de sangue de animal a Deus era derrogatória ao seu caráter transcendental. Por isso, interpretavam a ordem do Velho Testamento alegoricamente".
Lyman Abbott: "O oriental sonha; o grego define; o hebreu age. Todas estas influências se encontram e interferem em Alexandria. As emoções são mediações entre o Deus absoluto, incognoscível, de alcance total e o Deus
pessoal, revelado santo na Escritura. O Ascetismo é um resultado: a matéria não é divina, pelo que está livre disso. A licença é outro resultado: a matéria é não divina, pelo que a desconsidera - não há doença e não há pecado - é a moderna doutrina da Ciência Cristã". Kelney, Christian Doctrine, 1.360-373; 2.354, concebe a glória divina como ambiente material eterno de Deus de que o universo é formado.
O autor de "O Universo Invisível" (p. 17) erroneamente chama J. Stuart Mill de maniqueu. Entretanto, Mill nega a crença na pessoalidade deste princípio que existe e limita Deus; ver seus Posthumous Essays on Religion, 176195. F. H. Robertson, Lectures on Genesis 4-6 - "Antes a criação do mundo tudo era caos ... mas, com a criação, a ordem começou ... Deus não parou de criar, pois a criação continua a cada dia. A natureza é Deus em operação.
Só após surpreendentes mudanças, como na primavera, dizemos figurada- mente, 'Deus descansa'".
Com relação a este ponto de vista notamos que:
A máxima ex nihilo nihilfit, na qual se apóia, é verdadeira naquilo que afirma que nenhum evento ocorre sem causa. É falsa, se significa que nada jamais pode ser feito sem matéria preexistente. Portanto, a máxima é aplicável só ao reino das causas secundárias e não impede a força criativa da grande primeira Causa. A doutrina da criação não dispensa a causa; por outro lado, atribui ao universo uma causa suficiente em Deus.
Lucrécio: "Nihil posse criari de nihilo, neque quod gentium est ad nihil revocari". Pérsio: "Gigni De nihilo, in nihilum nil posse reverteri". Martensen, Dogmatics, 135 - "O nada, de que Deus cria o mundo, é a possibilidade eterna do que ele quer que sejam as fontes de todas as realidades do mundo". Lewes, Problems of Life and Mind, 2.292 - "Por isso, quando se argumenta que nem se deve pensar na criação de alguma coisa a partir do nada e, por isso, peremptoriamente deve ser rejeitado, o argumento parece-me defeituoso. O processo merece a atenção do nosso pensamento, embora seja imaginável e concebível, mas não provável". Lipsius, Dogmatik, 288, assinala que a teoria do dualismo é tão difícil como a da criação absoluta. Ela pensa em um ponto no tempo quando Deus começa a moldar a matéria preexistente e não pode apresentar nenhuma razão por que Deus não o fez antes, visto que sempre deve ter havido nele um impulso para a referida moldagem.
Apesar de que a criação sem o uso de matéria preexistente é inconcebível, no sentido de ser irretratável à imaginação, contudo, a eternidade da matéria é igualmente inconcebível. Para a criação sem matéria preexistente, contudo, achamos remotas analogias na nossa própria criação de idéias e vontades, fato tão inexplicável como o de Deus causar substâncias novas.
Mivart, Lessons from Nature, 371,372 - Em certo sentido temos um auxílio para o pensamento da criação absoluta em nossa vontade livre, que, origi-
nando e determinando de modo tão absoluto possamos tomá-la com um tipo do ato criativo". Falamos de 'faculdade criadora' do poeta ou do artista. Não podemos tornar reais os produtos da nossa imaginação como Deus pode fazer com as dele. Mas, se o pensamento fosse apenas substância, a analogia seria completa. Shedd, Dogm. Theol., 1.467 - "Nossos pensamentos e volições são criados ex nihilo no sentido de que um pensamento não se opera a partir de outro, nem uma volição a partir de outra". Deste modo, a substância criada pode ser apenas a mente e a vontade de Deus em exercício, automaticamente na matéria, livremente no caso dos seres livres.
Beddoes: "Tenho um pouco do Fiat em minha alma e posso criar o meu mundozinho". Mark Hopkins: "O homem é uma imagem de Deus como criador. ... Pode propositadamente criar, ou fazer existir, futuro que só teria existido para ele". E. C. Stedman, Nature of Poetry, 233 - "Assim como o Poeta, o artista é criativo; ele se torna participe da imaginação divina e poder e até mesmo da responsabilidade divina". Wordsworth chama o poeta de "sereno criador das coisas imortais". A imaginação, diz ele, é tão somente outro nome para "o mais claro discernimento, amplitude da mente e a razão na sua mais exaltada manifestação". Se somos 'deuses' (SI. 82.6), essa parte do Infinito que está incorporada em nós deve participar de uma limitada extensão do poder de criar". Veitch, Knowing and Being, 289 - "A vontade, expressão da personalidade, tanto originando soluções como moldando matéria existente na forma, é a mais próxima abordagem no pensamento que podemos fazer da criação divina".
Criação não é apenas o pensamento de Deus; é também a vontade dele - pensamento é a expressão, razão exteriorizada. Vontade é criação a partir do nada no sentido de que não há o emprego de matéria preexistente. No exercício da imaginação criativa da parte do homem, existe a vontade assim como o intelecto. Royce, Studies of Good and Evil, 256, assinala que pode haver o elemento original 1) no estilo ou forma da nossa obra; 2) na seleção dos objetos que imitamos; 3) na invenção das novas combinações da matéria. O estilo, a combinação da matéria, então, abrangem os métodos da nossa originalidade. Nossas novas combinações da natureza como expressão da mente e vontade divinas aproximam mais a criação e a nossa compreensão do que o velho conceito do mundo como substância capaz de existir independente de Deus. Hudson, Law of Psychic Phenomena, 294, defende o pensamento de que temos poder para criar fantasmas visíveis ou pensamentos incorporados que podem subjetivamente ser percebidos pelos outros. Ver também de Hudson, Scientific Demonstration of Future Life, 153. Ele define o gênio como o resultado da ação sincrônica das faculdades subjetiva e objetiva. Jesus de Nazaré, em seu julgamento, foi um maravilhoso psíquico. Percepção intuitiva e razão objetiva estavam com ele sempre em ascendência. Seus milagres eram falsamente interpretados como fenômenos psíquicos. Jesus nunca reivindicou que as suas obras eram o lado exterior da lei natural. Todo homem tem o mesmo poder intuitivo, embora em diferentes graus.
Podemos acrescentar que, quando o homem gera uma criança, dá existência substancial a um outro ser. O ato de Cristo criar o homem pode ser como o ato do Pai gerá-lo. Behrends: "A relação entre Deus e o universo é mais íntima e orgânica que a relação entre um artista e a sua obra. A figura do
mármore independe do escultor no momento em que se completou. Ela continua, mesmo depois da morte dele. Mas o universo desapareceria com o afastamento da presença e atuação de Deus. Se eu tivesse de empregar qualquer figura seria a da geração. A imanência de Deus é o segredo da permanência e uniformidade da natureza. A criação é primordialmente um ato espiritual. O universo não é o que vemos e tateamos. O universo real é um império de energias, uma hierarquia de forças correlatas cuja realidade e cuja unidade estão arraigadas na vontade racional de um Deus perpetuamente ativo na preservação. Mas não há nenhuma identidade de substância, nem qualquer divisão da substância divina.
Bowne, Theory of Thought and Knowledge, 36 - "Concebe-se uma mente que cria de modo integral seus objetos somente pela sua própria atividade e sem a dependência de qualquer coisa a não ser ela mesma. Tal é a nossa concepção da relação do Criador com os seus objetos. Mas não é este o caso em ligeira extensão. A nossa vida mental começa e chegamos gradualmente ao conhecimento das coisas e de nós mesmos. Em certo sentido, apresentam-se os nossos objetos; i.e. não temos objetos à vontade ou as suas propriedades variam ao nosso bel-prazer. Neste sentido somos passivos quanto ao conhecimento e nenhum idealismo pode afastar este fato. Entretanto, em certo sentido, nossos objetos são nossos produtos; pois um objeto existente torna- se objeto para nós só quando pensamos nele e assim fazemo-lo nosso. Neste sentido, o conhecimento é um processo ativo e não uma recepção passiva da informação pronta vinda de fora". Clarke, Selfand the Father, 38 - Somos nós humilhados por termos dados para que a nossa imaginação opere? por sermos incapazes de criar a matéria? Não o somos a menos que seja vergonhoso assemelharmo-nos ao Criador". A causa é tão misteriosa como a criação. Balzac convivia com suas personagens como se fossem seres reais.
É antifilosófico postular duas substâncias eternas quando uma Causa auto-existente de todas as coisas explicará os fatos, d) Contradiz nossa noção fundamental de Deus como soberano absoluto supor a existência de qualquer outra substância que independe da vontade dele. e) Esta substância com que Deus deve necessariamente operar, porque é, segundo esta teoria, inerentemente má, não só limita o poder de Deus, mas destrói sua bênção, f) Esta teoria não responde seu propósito de explicar o mal moral, a não ser que só se admita que o espírito é matéria, - caso em que o dualismo dá lugar ao mate- rialismo.
Martensen, Dogmatics, 121 - Deus se torna simplesmente um demiurgo, se a natureza existe antes do espírito. Só pode ter poder para completar esse espírito aquele que, em perfeito sentido, é capaz de começar a obra da criação". Se Deus não cria, ele não deve utilizar a matéria que ele acha e a sua obra com a matéria prima deve ser uma perpétua tristeza. Tal limitação no poder da divindade parece a John Stuart Mill a melhor explicação para as imperfeições existentes no universo.
A outra forma de dualismo é:
A que sustenta a existência eterna de dois espíritos antagônicos, um mau e o outro bom. Neste ponto de vista a matéria não é substância negativa e imperfeita que, contudo, tem existência própria, mas é obra ou instrumento de uma inteligência pessoal positivamente maligna, que combate contra todo o bem. Este é o ponto de vista dos maniqueus. O maniqueísmo compõe-se de cristianismo e da doutrina persa das duas inteligências eternas e opostas. Zoroastro, contudo, faz com que a matéria seja pura e que a criação do bem venha a ser. Parece que Mani considera a matéria como escrava do espírito mau, ou sua absoluta criação.
A velha história das viagens de Mani, na Grécia, é totalmente equívoca. Guericke, Church History, 1.185-187, sustenta que o maniqueísmo não contém nenhuma mistura da filosofia platônica, não tem nenhuma conexão com o judaísmo e, como seita, não veio de relações diretas com Igreja Católica. Harmoch, Wegweiser, 22, chama o Maniqueísmo de um composto de Gnosti- cismo e zoroastrianismo. Herzog, Encyclopâdie, art. Mani und Manichâer(Mani e os Maniqueus), considera o Maniqueísmo como o fruto, o clímax e a plenitude do Gnosticismo. O Gnosticismo é uma heresia na igreja; o Maniqueísmo, como o neoplatonismo, é uma anti-igreja. J. P. Langue: "Estas teorias opostas representam várias concepções pagãs do mundo, que, como palimpsestos, apresentam-se através do Cristianismo". Isaac Taylor fala do "criador dos carnívoros"; e alguns cristãos modernos poeticamente consideram Satanás como um segundo deus e igual a ele.
Monier Williams, no século XIX, janeiro 1881: 155-177 - Ahura Mazda foi o criador do universo. A matéria foi criada por ele e não se identifica com ele, e nem era sua emanação. Na natureza divina havia dois opostos, mas não opondo princípios ou forças, chamados "gêmeos" - um construtivo, o outro destrutivo; um benéfico, o outro maléfico. Zoroastro chamava estes "gêmeos" também pelo nome de "espíritos" e declarava que "um destes dois espíritos criou a realidade, o outro a irrealidade". Williams diz que estes dois princípios só se conflitam no nome. Só havia antagonismo entre o bem resultante e o mal produzido pelo agente livre, o homem.
Podemos acrescentar que, mais tarde, esta personificação de princípios na divindade parece ter-se tornado uma crença definida nos dois espíritos pessoais opostos e que Mani, Manes, ou os maniqueus adotaram um tipo de zoroastrianismo, acrescentando alguns elementos cristãos. Hagenbach, History of Doctrine, 1.470 - A doutrina dos maniqueus é de que a criação é obra de Satanás. A. H. Newman, Church History, 1.194-"O Maniqueísmo é o Gnosticismo, com seus elementos cristãos reduzidos ao mínimo, e o Zoroastrianismo, babilônico antigo e outros elementos orientais elevados ao máximo.
O Maniqueísmo é o dualismo oriental com nomes cristãos, raramente retendo um traço do seu significado próprio. O que há de mais fundamental no Maniqueísmo é o dualismo absoluto. O reino da luz e o reino das trevas, com seus governantes, opõem-se eternamente um ao outro".
Deste ponto de vista podemos apenas dizer que se refuta d) com todos os argumentos da unidade, onipotência, soberania e bênção de Deus; b) com as representações escriturísticas do príncipe do mal como criatura de Deus e sujeito ao controle de Deus.
Passagens da Escritura que mostram Satanás como criatura de Deus ou sujeito a ele são as seguintes: Cl. 1.16 - "Porque nele foram criadas todas as coisas que há no céu e na terra, visíveis e invisíveis, sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades; tudo foi criado por ele e para ele", cf. Ef. 6.12 - "porque não temos que lutar contra carne e sangue, mas contra os principados, contra as potestades, contra os príncipes das trevas deste século, contra as hostes espirituais da maldade, nos lugares celestiais". 2 Pe. 2.4 - "porque, se Deus não perdoou aos anjos que pecaram, mas, havendo-os lançado no inferno, os entregou às cadeias da escuridão, ficando reservados para o juízo"; Ap. 20.2 - "Ele prendeu o dragão, a antiga serpente que é o diabo e satanás"; 10 - "e o Diabo, que os enganava, foi lançado no lago de fogo e enxofre".
A mais estreita analogia com o dualismo maniqueu acha-se no conceito popular de Diabo, mantido pela igreja medieval romana. Resta a pergunta se ele era considerado como um rival ou como um servo de Deus. Matheson, Messages of Old Religions, diz que o zoroastrianismo reconhece um elemento obstrutivo na natureza do próprio Deus. A moral iníqua é uma realidade e há o elemento de verdade no zoroastrianismo. Porém não há nenhuma reconciliação nem há evidência de que todas as coisas cooperam para o bem. E. H. Johnson: "Esta teoria estabelece a matéria como um tipo de divindade um ídolo insensível dotado do verdadeiro atributo divino da existência própria. Entretanto, podemos apenas reconhecer um Deus . Promover a matéria a uma coisa eterna, independente do Onisciente, mas sempre ao lado dele é a mais revolucionária de todas as teorias". Tennyson, Unpublished Poem (Life
314) - "Pobre de mim! pois que em volta de nós aqui há como se algum deus menor tivesse feito o mundo, mas não tivesse força para moldá-lo, como se ele ainda não fosse o altíssimo, contemplado do além e entrar nele e torná-lo belo?
E. G. Robinson: "O mal não é eterno; se fosse, estaríamos tributando nosso respeito a ele. ... Há muito de Maniqueísmo na piedade moderna. Influenciamos a alma através do corpo. Daí o sacramentalismo e a penitência.
O puritanismo é o Maniqueísmo teológico. Cristo recomendou o jejum porque este pertencia à sua época. O Cristianismo veio do Judaísmo. O eclesialismo vem em grande parte da reprodução do que Cristo fez. O cristianismo não é perfuntório em suas práticas. Devemos jejuar só quando houver boa razão para isso". L. H. Mills, New World, março, 1805.51, sugere que o farisaísmo pode ser a mesma coisa que o farseísmo, que é outra forma do parseísmo.
O pensamento dele é de que a ressurreição, a imortalidade, o Paraíso, Satanás, o Juízo, o Inferno, vieram de fontes persas e gradualmente evadiram para a simplicidade dos saduceus. Pfleiderer, Philos. Religion, 1.206 - "Segundo a lenda persa, o primeiro casal humano era boa criatura, Espírito totalmente sábio, Ahura, que soprou neles o seu próprio ar. Porém, logo os
homens primitivos deixaram-se seduzir pelo hostil Espírito Angromainiu na mentira e idolatria, pelo que os espíritos maus adquiriram força sobre eles e sobre a terra e espoliaram a criatura boa".
Disselhoff, Die klassische Poesie und die gõttliche Offenbarung, 13-25 - "O Gathas de Zoroastro são os primeiros poemas da humanidade. Neles o homem se levanta para afirmar sua superioridade com relação à natureza e afirmar a espiritualidade de Deus. Deus não se identifica com a natureza.
Os deuses impessoais da natureza são ídolos vãos e causa da corrupção. Seus adoradores são servos da falsidade. Ahura-Mazda (sábio-vivo) é uma personalidade moral e espiritual. Arimã é igualmente eterno, mas não igualmente poderoso. O bem não tem vitória completa sobre o mal. Admite-se o dualismo e perde-se a unidade. O conflito entre os tipos de fé leva à separação. Enquanto uma parte da raça permanece nas montanhas iranianas para sustentar a liberdade e a independência da natureza, a outra vai para o sudeste, às exuberantes margens do Ganges, servir às forças da natureza.
O Oriente defende a unidade como o Ocidente a dualidade. Contudo, Zoroastro, nos Gathas, é quase deificado; e sua religião, que começa concedendo predominância ao Espírito bom, termina solapando a adoração à natureza".
Emanação
Esta teoria sustenta que o universo é a mesma substância de Deus e produto de sucessivas evoluções do seu ser. Este é o ponto de vista dos gnósticos sírios. Seu sistema foi uma tentativa de interpretar o cristianismo nas formas da Teosofia oriental. Swedenborg, no século passado, ensinou semelhante doutrina.
A esta teoria objetamos nas seguintes bases: a) Nega virtualmente a infinitude e a transcendência de Deus, - aplicando a ele um princípio de evolução, desenvolvimento e progresso que pertence apenas ao finito e imperfeito.
Contradiz a santidade divina, - porque o homem, que por esta teoria é a substância de Deus, contudo, nunca é moralmente mau. c) Conduz logicamente ao panteísmo, - porque a reivindicação de que a pessoalidade humana é apenas ilusória não pode ser sustentada sem também abrir mão da crença na pessoalidade de Deus.
Saturnino de Antioquia, Bardesana de Edessa, Taciano da Assíria, Marcião de Sinope, todos do segundo século, representavam este ponto de vista. Blunt, Dict. of Doct. and Hist. Theology, art. Emanação: "A operação divina estava simbolizada na imagem dos raios de luz provindos do sol, tanto mais intensos quanto mais próximos da substância luminosa do corpo de que fazem parte, mas decrescem em intensidade na medida em que recuam da fonte até, finalmente, desaparecerem nas trevas. Assim o resplendor espiritual da Mente Suprema formou um mundo do espírito, cuja intensidade varia inversamente à distância de sua fonte até a distância em que desaparece na matéria.
Por isso há uma cadeia de eons sempre expansivos que são crescentes atenuações de sua substância e o conjunto que constitui a sua plenitude, i.e. a revelação plena de seu ser oculto". Emanação, de e, e manare, fluir para frente. Guericke, Church History, 1.160 - "muitas chamas de uma luz. ... o contrário direto da doutrina da criação a partir do nada". Neander, Church History, 1.372-374. A doutrina da emanação é nitidamente materialista. Ao contrário disto, sustentamos que o universo é expressão de Deus, porém não é emanação dele.
Sobre a diferença entre a emanação oriental e a geração eterna, ver Shedd, Dogm. Theoi., 1.470 e History Doctrine 1.11-13,318 nota -"1. O que é eternamente gerado não é finito, mas infinito; é uma pessoa divina e eterna que não é o mundo ou qualquer porção dele. Nos esquemas orientais, a emanação é um modo de relatar a origem do finito. Porém a geração eterna ainda deixa o finito ser originado. A geração do Filho é a geração de uma pessoa infinita que, mais tarde cria o universo finito de nihilo. 2. A geração eterna tem como resultado uma subsistência ou hipóstase pessoal totalmente distinta do mundo; mas a emanação relativa à divindade só produz uma energia impessoal ou, na melhor das hipóteses, personificada, ou efluência que é uma das forças ou princípios da natureza - uma simples anima mundi'. As verdades das quais a emanação é perversão e caricatura são, portanto, a geração do Filho e o processo do Espírito.
ReitorTulloch, Encyc. Brit., 10.704-"Todos os Gnósticos concordam em considerar que este mundo não proveio imediatamente do Supremo Ser. ... O Supremo Ser é considerado totalmente inconcebível e indescritível - insondável Abismo (Valentino) - inominável (Basílides). Desta fonte transcendente brota, por emanação, a existência em uma série de forças espirituais. ... A passagem do mundo espiritual mais elevado para o material é, por um lado, apreendido como simples degenerescência contínua da Fonte da Vida, terminando no reino das trevas e morte - chegando ao caos que circunda o reino da luz. Por outro lado, a passagem é apreendida em uma forma dualís- tica mais precisa como uma invasão positiva do reino da luz por um auto- existente reino das trevas. Com o Gnosticismo adota um ou outro destes modos de explicar a existência do mundo presente, cabem duas divisões que, a partir de seus lugares de origem, recebem os respectivos nomes de gnose alexandrino ou sírio. Uma, como vimos, apresenta um tipo de especulação mais ocidental, a outra mais oriental. O elemento dualista, em um caso, raramente aparece sob a noção panteísta e apresenta semelhança com a uVp platônica, simples necessidade vazia. No outro caso, o elemento dualista é claro e proeminente, correspondendo à doutrina zoroastriana do princípio ativo do mal e do bem - do reino de Arimã e do de Ormuz. Na gnose síria ... aparece em primeiro lugar um princípio hostil do mal em colisão com o bem".
Convém lembrar que o dualismo é uma tentativa de substituir a doutrina da criação absoluta pela teoria de que a matéria e o mal se devem a algo negativo ou positivo fora de Deus. O dualismo é uma teoria de origens, não de resultados. Tendo isto em mente, podemos chamar os gnósticos alexandrinos de dualistas enquanto consideramos a emanação como o ensino cara- terístico dos gnósticos sírios. Estes fazem a natureza ser apenas um eflu- xo de Deus e o mal somente uma forma degenerada do bem. Se os sírios sustentam que a palavra independe de Deus, tal independência é concebida mais tarde somente como resultado ou produto, não como um fato original. Alguns, como Saturnino e Bardesana, tendem para a doutrina do Maniqueísmo, outros, como Taciano e Marcião, para o dualismo egípcio; mas todos sustentam a emanação para explicar filosoficamente o que as Escrituras chamam Criação. Estas notas servem como qualificação e crítica às opiniões que citamos a seguir.
Sheldon, Ch. Hist., 1.206 - "Os sírios, em geral, eram mais dualistas que os alexandrinos. Alguns, após acomodarem-se ao panteísmo hindu, consideravam o reino material como a região do vazio e da ilusão, o vago oposto ao Pleroma, o do mundo da realidade e plenitude espirituais; outros atribuem uma natureza mais positiva à matéria e consideram-na capaz de uma agressividade cruel mesmo independente de qualquer vivificação das vantagens da vida nos altos céus". Mansel, Gnostic Heresies, 139 - Como de Saturnino, se diz de Bardesana que combina a doutrina da malignidade da matéria com a de um princípio ativo do mal; e estabelece conexão destas duas teorias geralmente antagônicas, sustentando que a matéria inerte é coeterna com Deus, enquanto Satanás, como princípio ativo do mal, foi produzido a partir da matéria (ou, segundo outra declaração, coeterna com ela) e atua em conjunto com ela. 142 - A caraterística usualmente selecionada como da gnose síria é a doutrina do dualismo; isto significa a suposição da existência de dois princípios ativos e independentes; um do bem, o outro do mal. Esta suposição é distintamente sustentada por Saturnino e Bardesana ... em contraposição à teoria platônica da matéria inerte auto-existente, adotada pela gnose do Egito. Tal princípio encontra seu desenvolvimento lógico, no século seguinte, no Maniqueísmo; este conduz, quase com igual certeza, ao Panteísmo".
A. H. Newman, Ch. History, 1.192-"Marcião não especula quanto à origem do mal. O demiurgo e seu reino são aparentemente considerados como se existissem desde a eternidade. Ele também considera a matéria intrinseca- mente má e pratica rígido ascetismo". Mansel, Gnostic Heresies, 210 - "Com a maioria dos gnósticos, Marcião não considera o Demiurgo um ser derivado e dependente, cuja imperfeição se deve ao fato de distar da mais elevada Causa; nem ainda, conforme a doutrina persa, admite um eterno princípio de pura malignidade. Seu segundo princípio independe do primeiro e é seu coe- terno; contudo, opõe-se a ele, não como o mal ao bem, mas como a imperfeição à perfeição, ou, como se expressa Marcião, como um ser justo com relação a um bom. 218-0 não reconhecimento de qualquer princípio do puro mal. Só há três princípios: O Supremo Deus, o Demiurgo, e a Matéria eterna, estes dois imperfeitos, porém não necessariamente maus. Parece que alguns dos marcionitas acrescentaram um espírito mau como um quarto princípio. ... Marcião é o menos gnóstico de todos. ... 31 - Pode-se ver a influência hindu no Egito, a persa na Síria.... 32-0 Gnosticismo deve muito de sua forma filosófica e tendências ao Platonismo, modificado pelo Judaísmo. Ao dualismo da religião persa deve ao menos uma forma de suas especulações sobre a origem e remédio para o mal e muitos pormenores de sua doutrina das emanações. Ao Budismo da índia, modificado ainda provavelmente pelo Platonismo, creditam-se as doutrinas do antagonismo entre o espírito e a matéria e a irrealidade da existência derivada (o germe do Docetismo
Gnóstico) e, ao menos em parte, a teoria que considera o universo como uma série de emanações sucessivas a partir da Unidade absoluta".
A emanação sustenta que alguma substância procede da natureza de Deus e que ele formou a referida substância no universo. Mas, afinal de contas, a matéria não é composta de substância. É tão somente a atividade de Deus. Orígenes sustentava que, etimologicamente, vi/upí denota um ser que, separado de Deus, a fonte central de luz e calor, resfria-se em seu amor ao bem, mas ainda tem a possibilidade de retornar à sua origem espiritual. Pfleiderer, Philosophy of Religion, 2.271, assim descreve o ponto de vista de Orígenes: "Como o nosso corpo, embora constituído de muitos membros, ainda é um organismo conservado junto por uma alma, assim deve-se pensar no universo como um imenso ser vivo que se mantém junto através de uma alma, força e Logos de Deus". Palmer, Theol. Definition, 63, nota - "O mal do emanacio- nismo se vê na história do Gnosticismo. Emanação é uma parte da essência divina considerada separada dela e emitida como independente. Não tendo nenhum limite perpétuo de conexão com o divino, ou mergulha para a degradação, como pensa Basílides, ou se torna ativamente hostil ao divino, como criam os ofitas. ... De igual modo os deístas de época posterior vieram a considerar as leis da natureza como tendo existência independente i.e. como emanações".
John Milton, Christian Doctrine, sustenta este ponto de vista. A matéria é um efluxo do próprio Deus e não é intrinsecamente má e incapaz de aniquila- ção. A existência finita é uma emanação da substância de Deus e este perdeu o seu domínio sobre as porções vivas ou centros de existência finita que ele dotou de vontade livre de modo que estes seres independentes podem originar ações moralmente não refreáveis por ele mesmo. Esta doutrina da vontade livre isenta Milton da culpa de Panteísmo. Lotze, Philos. Religion, xlviii, li, distingue criação de emanação, dizendo que a criação necessita de uma vontade divina, enquanto a emanação flui como conseqüência natural do ser divino. O motivo de Deus na Criação é o amor que o impulsiona a comunicar sua santidade a outros seres. Deus cria espíritos infinitos individuais e, conseqüentemente, permite que o pensamento, que a princípio é dele, se torne o pensamento destes outros espíritos. A criação do mundo consiste nesta transferência do seu pensamento pela vontade. F. W. Farrar, sobre Hb. 1.2 ('A quem constituiu herdeiro de tudo, por quem também fez o mundo') - "A palavra Eon foi empregada pelos gnósticos para descrever as várias emanações pelas quais eles tentavam de uma vez ampliar e estabelecer uma ponte sobre o abismo entre o humano e o divino. Acima dessa lacuna João lançou a arca da Encarnação quando escreveu 'e o Verbo se fez carne' (Jo. 1.14)".
Upton, Hibbert Lectures, cap. 2 - "Na própria feitura das almas originadas da sua própria essência e substância e na falta da sua causalidade para que todos os homens sejam livres, Deus já morre para que eles vivam. Deus se afasta das nossas vontades para tornar possível a livre escolha e até a oposição a si mesmo. O individualismo admite o dualismo, mas não uma divisão completa. Nosso dualismo sustenta ainda o estabelecimento de conexões subterrâneas da vida entre os seres humanos, entre o homem e a natureza, entre o homem e Deus. Até mesmo a criação física é, em seu cerne, ética:
cada coisa depende das outras e deve servi-las ou perder a sua própria vida e beleza. O ramo deve permanecer na videira, ou seca e é cortado e queimado" (275).
Swedenborg defendia a emanação - ver Divine Love and Wisdom, 283, 303, 305 - Cada um que pensa a partir da razão clara vê que o universo não é criado do nada.... Todas as coisas foram criadas a partir de uma substância como somente Deus é uma substância em si mesma e, portanto, o esse real, é evidente que a existência das coisas não tem sua origem em nenhuma outra fonte. ... Contudo, o universo criado não é Deus porque Deus não está no espaço e no tempo. ... Há uma criação do Universo, e de todas as coisas nele, pela mediação contínua do primeiro. ... Nas substâncias e matéria em que consiste a terra nada há de divino em si mesmas, porém são desprovidas de tudo o que é divino em si mesmas. ... Ainda, pela continuação a partir da substância da soma espiritual traz aquilo que há no divino". O suedenborguis- mo é "o materialismo aprofundado e confirmado no seu interior". Este sistema remete à Oração Dominical, que diz: "assim na terra como no céu". Ele não gostava de algumas seitas e achava que todos os pertencentes a elas estavam nos infernos, condenados ao castigo eterno. A verdade não é emanação materialista, como imaginava Swedenborg, mas energia divina no espaço e no tempo. O universo é o sistema de Deus em relativa autolimitação da matéria à mente. Teve um começo e foi Deus quem o instituiu. É uma manifestação finita e parcial do Espírito infinito. A matéria é uma expressão do espírito, mas não emanação dele, algo mais do que são nossos pensamentos e volições. Os espíritos finitos, por outro lado, são diferenciações no ser do próprio Deus, e assim não são emanações.
Napoleão perguntou a Goethe o que é matéria. "Esprit gelé- espírito gelado" é a resposta que Schelling queria que Goethe tivesse dado. Mas a matéria nem é espírito, nem ambos são simples efluxos da substância de Deus. Requer-se uma divina instituição deles (citação de Dorner, System of Doctrine, 240). Schlegel igualmente chama a arquitetura de uma "música gelada" e outro escritor chama a música de "arquitetura dissolvida". Há um automatis- mo psíquico, como diz Ladd, em sua Philosophy of Mind, 169; e Hegel chama a natureza de "cadáver do entendimento - espírito em alienação de si mesmo". Mas o espírito é o Adão cuja natureza é Eva; e o homem diz para a natureza: "Esta é osso dos meus ossos e carne da minha carne" como Adão em Gn. 2.23.
Criação a partir da eternidade
Esta teoria considera a criação como um ato de Deus na eternidade passada. Foi proposta por Orígenes e sustentada recentemente por Martensen, Martineau, John Caird, Knight e Pfleiderer. A necessidade de supor essa criação a partir da eternidade tem sido argumentada a partir da onipotência, da independência da categoria de tempo, da imutabilidade e do amor de Deus. Consideraremos estes argumentos em sua ordem.
Orígenes sustenta que Deus é desde a eternidade o criador do mundo dos espíritos. Martensen, em sua Dogmatics, 114 favorece as máximas: "Sem o mundo, Deus não é Deus. ... Deus criou o mundo para satisfazer as suas necessidades. ... Ele só pode constituir-se o Pai dos espíritos". Tristezas de Werterde Goethe: "O vôo do pássaro acima da minha cabeça inspirou-me o desejo de ser transportado para as plagas das memoráveis águas e lá sorver os prazeres da vida, provenientes da global espuma do infinito". Robert Browning, Rabi Ben Ezra, 31 - "Mas agora eu, como outrora, careço de ti, ó Deus, que moldas o homem E daí, nem mesmo quando o torvelinho ameaça,
Eu, no rodopio da vida abundante em cores e formas, em vertiginosa escravi- zação - iludo o meu fim, para saciar a minha sede". Mas o criador considera isto como dependência e escravidão do seu próprio mundo.
Pitágoras sustentava que as substâncias e leis da natureza são eternas. Martineau, Study of Religion, 1.144; 2.250, parece fazer a criação do mundo um processo eterno, concebendo-o como uma autodivisão da divindade em quem, de alguma forma, o mundo sempre esteve contido (Schurman, Beliefin God, 140). Knight, Studies in Philos. and Lit., 94, cita de Caim de Byron - "Sente-se ele em seu grande e solitário trono, Criando mundos, para fazer a eternidade menos pesada à sua imensa existência e impartilhável solidão. ...
Ele, infeliz em sua elevação incansável e feliz ainda deve criar e recriar". Byron põe estas palavras na boca de Lúcifer. Contudo, Knight em seus Essays in Philosophy, 143,147, considera o universo um perene efeito de uma causa eterna. O Dualismo, pensa ele, está envolto na própria noção de uma busca a Deus.
W. N. Clarke, Christian Theology, 117 - "Deus é a fonte do universo. Quer por produção imediata em algum ponto no tempo de maneira que, depois de existir sozinho, eis que, por seu ato, veio o universo, ou por sua produção perpétua, a partir do seu próprio ser espiritual, de modo que a existência eterna sempre se fez acompanhar de um universo em algum estágio do ser, Deus fez com que o universo viesse a existir. ... Qualquer método pelo qual o Deus independente produza o universo que sem ele não poderia ter tido existência alguma, concorda com os ensinos da Escritura. Muitos acham filosoficamente mais fácil Deus, desde a eternidade, produzir a criação a partir de si mesmo de modo que nunca houve tempo em que não existiu um universo em algum estágio da existência, do que pensar em uma criação instantânea de todas as coisas existentes quando nada houvera a não ser Deus. A Teologia é compelida a decidir entre estes dois pontos de vista porque cremos que Deus é um espírito livre maior que o universo". Discordamos da conclusão do Dr. Clarke e sustentamos que a Escritura requer de nós que remetamos o universo a um começo, enquanto a razão se satisfaz com este ponto de vista mais do que a teoria da criação a partir da eternidade.
d) A onipotência de Deus não necessita a criação a partir da eternidade. Onipotência não implica necessariamente a verdadeira criação; implica só o poder de criar. Contudo, na natureza da causa, a criação é uma coisa começada. A criação a partir da eternidade é uma contradição de termos e o que é autocontraditório não é objeto de poder.
O argumento se apóia em uma falsa concepção de eternidade considerando-a como um prolongamento do tempo num passado infinito. Em nossa discussão sobre a eternidade, já vimos, como um atributo de Deus, que ela não é um tempo sem fim, ou um tempo sem começo, mas superioridade com relação à lei do tempo. Visto que a eternidade não é mais passada do que presente, a idéia de criação a partir da eternidade é irracional. Devemos distinguir criação na eternidade passada (= Deus e o mundo coeternos, embora Deus causa o mundo do mesmo modo em que gera o Filho) da criação contínua (que é uma explicação da preservação, mas não da criação). Esta e não aquela que Rothe sustenta (sob a doutrina da preservação, 415,416/ ap. vol. 2 pg. 7). Birks, Difficultes ofBelief, 81,82 - Não há criação a partir da eternidade porque a eternidade passada, na verdade, não pode focalizar mais do que podemos atingir sobre os limites de uma eternidade vindoura. Não havia tempo nenhum antes da criação porque não havia nenhuma sucessão".
Birks, Scripture Doctrine of Creation, 78-105 - "O primeiro verso de Gênesis exclui cinco falsidades especulativas: 1. que nada há a não ser a matéria não criada; 2. que não há Deus independentemente de suas criaturas; 3. que a criação é uma série de atos sem um começo; 4. que não há universo real;
5. que nada pode ser conhecido de Deus ou da origem das coisas". Veitch, Knowing and Being, 22 - As idéias sobre a criação e energia não têm sentido e substituem a concepção ou ficção de um mundo de relacionamento eterno ou bilateral não do que tem sido, mas do que sempre é. É outra forma da filosofia da gangorra. Só o Eu eterno é, se o múltiplo eterno for; o múltiplo eterno é se o Eu eterno for. Um, sendo o outro, é ou faz-se um; o outro, sendo um, é ou faz-se o outro. Isto pode chamar-se unidade; ao invés disso, ele é, se é que podemos inventar um termo adequado à nova e maravilhosa concepção, uma duidade (de dois, ou binidade) original e não gerada".
A independência de Deus relativa ao tempo não necessita a criação a partir da eternidade. Porque Deus é livre da lei do tempo não se segue que a criação seja livre de tal lei. É verdade que não se concebe nenhuma criação eterna porque isto envolve um número infinito. O tempo deve ter tido um começo e, porque o universo e o tempo coexistem, a criação não pode ter sido desde a eternidade.
Jd. 25 - "Por todos os séculos" - implica que o tempo teve um começo e Ef. 1.4 - "Antes da fundação do mundo" - implica que a própria criação teve um começo. É a criação infinita? Não, diz Dorner, Doctrine (Glaubenslehre), 1.459 porque para uma criação perfeita a unidade é tão necessária como a multiplicidade. O universo é um organismo e não pode haver nenhum organismo sem um número definido de partes. Por semelhante razão, Dorner, System Doctrine, 2.28, nega que o universo possa ser eterno. Admitindo, por um lado, que o mundo, apesar de eterno pudesse depender de Deus e logo o plano se desenvolvesse, não poderia haver nenhuma razão para que a execução fosse adiada, apesar de que, por outro lado a absoluta infinitude é imperfeita e não se concebe ou é possível nenhum universo com número ilimitado de partes. Assim Julius Müller, Doctrine of Sin, 1.220-225 - "Aquilo que tem um alvo ou um fim deve ter um começo; na teleologia a história implica criação".
Lotze, Philos. Religion, 74 - "O mundo, com relação à existência, assim como seu conteúdo, depende totalmente da vontade de Deus e não é simplesmente o involuntário desenvolvimento dele.... A palavra 'criação' não deve ser empregada para designar uma obra de Deus assim como a dependência absoluta do mundo com relação a ele". Assim Schurman, Belief in God, 146,156,225 - "Criação é a dependência eterna do mundo com relação a Deus. ... A natureza é a exteriorização do espírito. ... As coisas naturais existem somente como modos da atividade divina; elas não têm existência alguma em si mesmas". Sobre este ponto de vista de que Deus é a base, não o criador do mundo, ver Hovey, Studies in Ethics and Religion, 25-56 - "A criação não é mais um mistério do que a ação causai" em que tanto Lotze como Schurman crêem. Negar que o poder divino tem capacidade para originar o verdadeiro ser - poder acrescentar à soma total da existência - bem se assemelha a dizer que tal poder é finito". Ninguém pode provar que "a essência do espírito é revelar-se", ou que ele deve fazer isto através de um organismo ou exteriorização. A sucessão eterna de mudanças na natureza não é mais compreensível do que um Deus criador e que o universo tem origem no tempo.
A imutabilidade de Deus não necessita a criação a partir da eternidade. Sua imutabilidade requer, não uma criação eterna, mas tão somente um plano eterno da criação. O princípio oposto nos compeliria a negar a possibilidade dos milagres, da encarnação e da regeneração. Como a criação, estes seriam eternos.
Fazemos distinção entre idéia e plano, entre plano e execução. Boa parte do plano de Deus ainda não foi executada. É tão fácil conceber o começo de sua execução como o seu prosseguimento. Mas o seu começo relativo ao plano de Deus é a criação. A vontade ativa é um elemento da criação.
A vontade de Deus nem sempre é ativa. Ele espera "a plenitude dos tempos" antes de enviar seu Filho. Como podemos fazer um retrospecto da vida terrena de Cristo no começo, também podemos fazê-lo com o universo no começo. Os que defendem a criação a partir da eternidade geralmente interpretam Gn. 1.1 - "No princípio criou Deus os céus e a terra" e Jo. 1.1 - "No princípio era o Verbo" significando igualmente "na eternidade". Mas nenhum destes textos tem tal sentido. Em cada um somos levados ao começo da criação e afirma-se que Deus é o autor e que o Verbo já era.
O amor de Deus não necessita a criação a partir da eternidade. Criação é finita e não pode fornecer a satisfação perfeita ao amor infinito de Deus. Contudo, Deus tem desde a eternidade um objeto de amor infinitamente superior a qualquer possível criação na pessoa de seu Filho.
Visto que todas as coisas são criadas em Cristo, o Verbo eterno, Razão e poder de Deus, este pode "reconciliar consigo todas as coisas" em Cristo (Cl. 1.20). Atanásio chamava Deus de kiiotiiç, oúç texvuriç - criador, não artesão. Com isso ele queria dizer que Deus é imanente, não o Deus do deísmo. Porém no momento em que concebemos Deus revelando-se em Cristo, a idéia da criação como satisfação eterna do seu amor desaparece. Deus pode ter um plano sem executá-lo. O decreto pode preceder à criação. As idéias do universo podem existir na mente divina antes de serem realizadas pela vontade de Deus. Há propósitos de salvação em Cristo que antedatam o mundo ("Como também nos elegeu nele antes da fundação do mundo"... Ef. 1.4). Uma vez aceita firmemente, a doutrina da Trindade capacita-nos a ver a falácia de tais pontos de vista como o de Pfleiderer, Philos. Religion, 1.286 - "Não se deve pensar no começo e no fim da criação de Deus. Isso eqüivaleria a supor uma mudança na criação e descanso de Deus, que igualaria o ser divino ao curso mutável da vida humana. Nem se pode conceber o que teria impedido Deus de criar o mundo até o começo da criação. ... Dizemos, com Scotus Erigena, que o criar divino é igualmente eterna como o ser de Deus".
A criação a partir da eternidade, ainda é inconsistente com a independência e pessoalidade divina. Porque o poder e o amor de Deus são infinitos uma criação que os satisfizesse deve ser infinita em extensão como eterna na duração passada - em outras palavras, uma criação igual a Deus. Mas um Deus assim dependente da criação exterior nem é livre nem soberano. Um Deus que existe em relações necessárias com o universo, se é diferente em substância do universo, deve ser o Deus do dualismo; se é da mesma substância, deve ser o Deus do Panteísmo.
Gore, Incarnation, 136,137 - "A teologia cristã é a harmonia do panteísmo com o deísmo.... Participa de todas as riquezas inerentes ao lado moral sem fazer Deus depender do mundo, como o mundo depende de Deus. Por outro lado, o cristianismo converte o deísmo inteligível em um teísmo racional. Ele pode explicar como Deus, no tempo, tornou-se o criador porque sabe como a criação tem seu análogo eterno na natureza não criada; a natureza de Deus deve eternamente produzir, comunicar-se, viver". Em outras palavras, pode explicar como Deus vive eternamente, independente, auto-suficiente, porque ele é trino. Criação a partir da eternidade é o desenvolvimento natural e lógico das tendências unitárias na teologia. Forma um todo com o monismo estóico de que lemos em Hatch, Hibbert Lectures, 177 - "O monismo estóico concebia o mundo como uma auto-evolução de Deus. A idéia de um começo não entra necessariamente em tal concepção. Ela consiste na idéia de um processo eterno de diferenciação. O que é sempre foi sob formas mudadas e mutáveis. A teoria é mais cosmológica do que cosmogônica. Ela explica o mundo ao invés de dar conta de sua origem".
Geração espontânea
Esta teoria sustenta que a criação é apenas o nome de um processo natural ainda em andamento; a matéria tem em si o poder, sob condições apropriadas, de empreender novas funções e de desenvolver formas orgânicas. Sustentam este ponto de vista Owen e Bastian. Objetamos que
É pura hipótese, não verificada, mas contrária a todos os fatos conhecidos. Nenhum exemplo digno de crédito da produção de formas vivas a partir da matéria inorgânica ainda foi acrescentado. Até onde a ciência pode atualmente ensinar-nos, a lei da natureza é "omne vivum e vivo" ou "ex ovo".
Owen, Comparative Anatomy of the Vertebrates, 3.814-818 - sobre Mono- genia e Taumatogenia; citado em Argile, Reign Law, 281 - "Não discernimos nenhuma evidência de pausa ou intromissão na criação ou aparecimento de novas plantas ou animais".
Em favor da máxima de Redi, "omne vivum e vivo" Enciclopédia Britânica, art. Biologia, 689 - "Atualmente não há nenhuma sombra de fidedigna evidência direta de que a biogênese ocorre ou tem ocorrido dentro do período durante o qual se registra a existência da terra". Flint, Physiology of Man, 1.263-265 - Como o único verdadeiro ponto de vista filosófico de tratar a questão, admitimos, com quase todos os escritores modernos de Fisiologia, que não existe a geração espontânea, - e que não se entende o modo exato da produção dos mínimos infusórios na escala da vida". Sobre a Filosofia da Religião ver A. H. Strong, Philosophy and Religion, 39-57.
Se tais exemplos pudessem ser autênticos, nada provaria como uma doutrina apropriada da criação; pois ainda existiria uma impossibilidade de contar com tais propriedades vivificantes da matéria a não ser com base no ponto de vista escriturístico de um inventor e originador da matéria e suas leis. Em resumo, a evolução implica numa involução anterior; se é que algo vem da matéria, tal coisa deve ter sido posta nela.
Sully: "Toda a doutrina da Evolução deve admitir algum arranjo inicial definido que se supõe conter as possibilidades da ordem que achamos estar desenvolvidas e nenhuma outra possibilidade". Bixty, Crisis of Morais, 258 - Se não se pode crer em nenhum fiat criador a partir do nada, menos ainda é capaz de executar tal contradição". Como podemos obter moralidade só a partir de um ser moral, também só podemos obter vitalidade a partir de um germe vital. Martineau, Seat of Autority, 14 - "Ao chocar por muito tempo um ovo que a seguir não se torna em nada, você pode incubar qualquer universo real ou possível. Não há evidência de que isto é mero ardil de imaginação, ocultando os roubos de causa, perpetrando aos poucos e formando a pilha a partir do armazenamento de grão a grão?".
A galinha precede os ovos. As formas orgânicas perfeitas antecedem a todas as células vivas quer animais, quer vegetais. "Omnis cellula e cellula, sed primaria cellula ex organismo". Deus criou primeiro a árvore e sua semente estava nela quando a criou (Gn. 1.12 ... "árvore frutífera cuja semente está nela"). O protoplasma não é o próton, mas o dêuteron; os elementos antecedem-lhe. Não é verdade que o homem não foi feito, mas que apenas se desenvolveu como pensa Topsy; Royce, Spirit ofModern Philosophy, 273 - "A Evolução é a tentativa de compreender o mundo da experiência nos termos dos postulados idealísticos fundamentais: 1) sem idéias não há realidade; 2) a ordem racional requer um Ser racional que a introduza; 1) sob o nosso eu inconsciente deve haver um Eu infinito: A pergunta é: O mundo tem um sentido? Basta que se faça referência às idéias do mecanismo. A evolução, da nebulosa ao homem, é tão somente o desdobramento da vida do Eu divino".
Esta teoria, portanto, se verdadeira, só suplementa a doutrina da criação original, absoluta, imediata com outra doutrina da criação mediata e derivada ou do desenvolvimento da matéria ou força originada no princípio. Tal desenvolvimento, contudo, não pode proceder a qualquer fim valioso sem a orientação da inteligência que o iniciou. Embora as Escrituras não sancionem a doutrina da geração espontânea, reconhecem processos de desenvolvimento que suplementam o fiat divino que no princípio fez os elementos virem a ser.
Existe uma coisa que se chama vontade livre e esta não corre numa raia como a vontade determinista. Se há vontade livre no homem, então há muito mais vontade livre em Deus e a vontade de Deus não corre numa raia. Deus não está limitado por lei ou à lei. Sabedoria não implica monotonia ou uniformidade. Deus pode fazer uma coisa que nunca se repete. Circunstâncias nunca se assemelham duas vezes. Eis a base não só da criação, incluindo o milagre, a encarnação, a ressurreição, a regeneração, a redenção. Apesar de que a vontade em Deus e no homem é quase sempre automática e age segundo a lei, a força dos novos começos, da ação criativa, reside na vontade que sempre é livre e a vontade livre principalmente faz Deus ser Deus e o homem ser homem. Sem isso a vida seria dura, pois seria apenas a vida do irracional. Todo o esquema da evolução que ignora tal liberdade de Deus é panteísta em suas tendências, pois praticamente nega tanto a transcendência de Deus como a sua pessoalidade.
Leibnitz declina de aceitar a teoria de Newton sobre a gravitação porque lhe parece substituir as forças de Deus pelas forças naturais. Atualmente muitos ainda se recusam a aceitar a teoria darwiniana da Evolução porque lhes parece substituir as forças de Deus pelas forças naturais. Mas a lei é apenas um método; ela pressupõe um legislador e um agente. A Gravitação e a Evolução apenas são operações habituais de Deus. Se se provasse ser verdadeira a geração espontânea, esta seria apenas um modo de Deus originar a vida. E.G. Robinson, Christian Theology, 91 - "A geração espontânea não excluiria a idéia de uma vontade criadora operando através da lei natural e causas secundárias.... A física nada sabe a respeito do começo da vida.... Compete falar dos processos da ciência da natureza e contra os seus ensinos relativos não há necessidade de que a teologia se ponha em hostilidade. ... Ainda que o homem derivasse dos animais inferiores, isto não provaria que Deus não criou e ordenou as forças utilizadas. Pode ser que Deus tenha dotado a vida animal de um poder plasmável".
Ward, Naturalism and Agnosticism, 1.180 - "É muito mais verdadeiro dizer que o universo é vida do que dizer que é um mecanismo. ... Nunca podemos chegar a Deus por um simples mecanismo.... Eu argumentaria com Leibnitz que a passividade absoluta, ou inércia, não é uma realidade, mas um limite. 269 - O senhor Spencer admite que é impossível interpretar o espírito em termos de matéria. 302 - A seleção natural sem os fatores teleológicos não se coaduna com o relato da evolução biológica e tais fatores teleológicos implicam algo psíquico dotado de sentidos e vontade, /'.e., Life and Mind. 130-135
O empenho é mais importante que a cognição. 149-151 - As coisas e eventos precedem o espaço e o tempo. 252-257 - A nossa assimilação da natureza é a congratulação do espírito pelo espírito. 259-267 - Ou a natureza é por si mesma inteligente, ou há inteligência além da natureza. 274-276 - As aparências não escondem a realidade. 274 - A verdade não é Deus e mecanismo, mas só Deus; não o mecanismo. 283 - O Naturalismo e o Agnosticismo, a despeito deles mesmos, levam-nos ao mundo do Monismo Espiritualista". Newman Smith, Christian Ethics, 36 - A geração espontânea é uma ficção na ética, assim como na Psicologia e na Biologia. O moral não pode derivar do amoral, nem ainda o consciente do inconsciente, ou a vida das rochas azóicas".
O RELATO MOSAICO DA CRIAÇÃO
Sua dupla natureza-, unindo as idéias de criação e de desenvolvimento.
Declaração da criação. - A narrativa mosaica evita o erro de fazer o universo eterno ou resultado de um processo eterno. A cosmogonia de Gênesis, diferentemente das cosmogonias do paganismo, é prefaciada pelo ato originador de Deus e é suplementada por sucessivas manifestações do poder criativo na introdução da vida do bruto e do ser humano.
Toda adoração da natureza, quer tome a forma do Panteísmo antigo, quer do materialismo moderno, contempla o universo apenas como um nascimento ou crescimento. Este ponto de vista tem um fundo de verdade ao considerar as forças naturais como tendo existência real. É falso ao considerar que estas forças não necessitam de um originador ou sustentador. Hesíodo pensava que no princípio a matéria era informe. Gênesis não começa assim. Deus não é demiurgo, laborando sobre a matéria eterna. Deus antedata a matéria. Ele é o criador da matéria no princípio (Gn. 1.1 bará) e subseqüentemente criou a vida animal (Gn. 1.21 - "e criou Deus" - novamente barâ).
Muitas afirmações sobre a doutrina da Evolução erram, considerando-a como um processo eterno ou auto-originado. Mas o processo requer um originador e as forças requerem um sustentador. Cada passo implica incremento
de energia e o processo na direção de um fim racional implica inteligência e previsão no poder governante. Schurman diz com precisão que o darwinismo explica a sobrevivência do mais apto, mas não pode explicar a sua chegada. Schurman, Agnosticism e Religion, 34 - "Um caos primitivo de pó estelar mantém no seu ventre não só o cosmos que enche o espaço, não só as criaturas vivas que gera, mas também o intelecto que o interpreta, a vontade que o confronta e a consciência que o transfigura, mas sem dúvida tem Deus como centro, como um universo mecanicamente organizado e periodicamente ajustado deve tê-lo na circunferência.... Não há nenhum antagonismo real entre a criação e a evolução. 59 - Causalidade natural é a expressão de uma Mente sobrenatural na natureza e o homem - um ser ao mesmo tempo de sensibilidade e de atividade própria racional e moral - é sinal e exemplo sempre presente do intercâmbio do natural com o sobrenatural na parte da existência universal mais próxima e melhor conhecida por nós".
Seebohm, citado por J. J. Murphy, Nat. Selection and Spirit. Freedom, 76 - Quando admitimos que o argumento de Darwin em favor da teoria da Evolução prova sua verdade, duvidamos de que a relação natural possa ser em qualquer sentido a causa da origem das espécies. Provavelmente ela exerceu um papel importante na história da evolução; seu papel tem sido o de aumentar a rapidez com que o processo de desenvolvimento prosseguiu. É provável que de si mesmo fosse incapaz de originar as espécies; a mecânica através a qual estas vêm-se desenvolvendo independe completamente da seleção natural e pode ter produzido todos os resultados a que chamamos evolução das espécies sem seu auxílio; apesar de que o seu processo teria sido lento se não tivesse havido a luta da vida para aumentar sua marcha". New World, junho, 1896, 237-262, artigo de Howison sobre os limites da Evolução encontra-os 1) na realidade numenal; 2) na quebra entre o inorgânico e o orgânico; 3) na quebra entre a gênese fisiológica e lógica; 4) na incapacidade de explicar o grande fato sobre o qual seu movimento se apóia; 5) na consciência própria a priori que é o ser essencial e a verdade pessoal da mente.
A Evolução, segundo Herbert Spencer, é "uma integração da matéria e concomitante dissipação do movimento durante o qual a matéria passa de uma indefinida homogeneidade incoerente para uma coerente homogeneidade definida e durante a qual o movimento retido passa para uma transferência paralela". D. W. Simon critica esta definição como defeituosa "porque 1) omite toda a menção tanto à energia como às suas diferenciações e 2) porque introduz na definição do processo um dos seus fenômenos, a saber, o movimento. De fato, tanto a energia e a força como a lei são subseqüente e ilicitamente introduzidas como fatores distintos do processo: portanto, eles devem ter achado reconhecimento na definição e descrição". Mark Hopkins, Life, 189 - "Qual a necessidade de Deus? Acaso não temos força uniforme em todas as coisas, e não continuam todas as coisas como eram desde o princípio da criação, como se tivessem sido assim desde o começo? Não temos nós o to ticcv, o Todo universal, a alma do universo, operando em si mesmo a partir da inconsciência, através das moléculas e larvas e camun- dongos e marmotas e macacos até chegar ao clímax no homem"?
Reconhecido o desenvolvimento. - O relato mosaico representa a ordem atual das coisas como resultado não simplesmente da criação original, mas também do subseqüente arranjo e desenvolvimento. Descreve-se a formação da matéria inorgânica e o uso desta matéria na providência das condições da existência organizada. Descreve-se a vida como reproduzindo-se depois de sua introdução segundo as suas leis e em virtude de sua energia interior.
Martensen erroneamente afirma que "o judaísmo representa o mundo exclusivamente como criatura não como natura como k-cíoiç não como cp-facriç". Isto não é verdade. A criação é representada como a produção, não de alguma coisa morta, mas viva e capaz de autodesenvolvimento. A criação lança os alicerces da cosmogonia. Não há apenas a moldagem e organização de matéria que o ato criativo original fez existir (Gn. 1.2,4,6,7,9,16,17;
2.2,6,7,8 - o Espírito pairando (chocando), a separação luz e trevas, águas e águas; aparecimento da terra seca; estabelecimento do sol, lua estrelas; a rega com a névoa; a formação do corpo do homem; a plantação do jardim), mas há também a dádiva e emprego de forças produtivas das coisas e seres criados (Gn. 1.12,22,24,28 - a terra produziu erva; as árvores deram frutos nos quais havia semente; a terra produziu criaturas vivas; o homem recebeu ordem para ser frutífero e multiplicar-se).
Atualmente a tendência entre os cientistas é considerar toda a história da vida no planeta como resultado da Evolução, excluindo a criação tanto no começo da história como ao longo do seu curso. Sobre o progresso e, a partir do oróipo (gr. õpoç = montanha+hippos=cavalo > cavalo montês), o menor membro dos eqüinos, animal de quatro artelhos, até o anquitério com três, seguido do hipário até, por fim, chegar ao nosso cavalo comum, ver Huxley.
Ele argumenta que, se um animal complicado como o cavalo surgiu de uma modificação de uma forma inferior e menos especializada, não há razão para pensar que outros animais surgiram de modo diferente. Clarence King, Address At. Yaie Coilege, 1877, considera a Geologia americana como um ensino da doutrina de uma súbita, embora natural, modificação das espécies. "Quando explode a modificação catastrófica nas eras da uniformidade e soam aos ouvidos de cada de cada ser vivo as palavras: 'Muda ou morre!', a plasticidade torna-se o único princípio de ação". A natureza continuou aos saltos e correspondendo aos saltos da geologia, achamos os da biologia.
Admitimos a probabilidade de que a grande maioria do que chamamos espécies surgiu de alguns de tais procedimentos. Se a ciência considera certo que todas espécies de criaturas vivas presentes derivaram por descendência natural de uns poucos germes originais e que estes eram uma evolução de forças inorgânicas e naturais, não devemos, evidentemente, considerar o relato mosaico como inverídico. A única coisa que se nos pede é que revisemos nossa interpretação da palavra bará em Gn. 1.21,27 e que lhe demos o sentido da criação mediata, ou criação via lei. Gn. 1.11 - "produza a terra relva"; 20 - "produzam as águas abundantemente criaturas viventes que se movem"; 2.7 - "o Senhor formou o homem do pó"; 9 - "da terra o Senhor fez crescer toda árvore"; cf. Mc. 4.28 - canoiiáTri yn Kap7io(popeí - "a terra produz
fruto automaticamente" parece quase favorecer tal sentido. Goethe, Sprüche in Reimen - "Não, tal Deus não receberá minha adoração, esse Deus que põe o mundo ao léu da sorte do seu dedo, essa coisa eterna; Deus deve habitá-la".
Todo o crescimento de uma árvore ocorre num período de quatro a seis semanas em maio, junho, julho. O crescimento da fibra entre a casca resulta do tronco não porque recebe uma nova força vinda de fora, mas porque desperta da vida interior. O ambiente muda e começa o crescimento. Podemos até mesmo falar em uma transcendência imanente de Deus - vitalidade inesgotável que às vezes faz grandes movimentos progressivos. É o que os antigos tentavam expressar quando diziam que as árvores eram habitadas por dríadas e gemiam e, quando machucadas, sangravam. A vida de Deus está em tudo. Na Evolução não podemos dizer, com LeConte, que a mais elevada forma de energia "deriva da inferior". O que podemos dizer é que tanto as elevadas como as inferiores dependem constantemente de estar sob a vontade de Deus. A inferior é tão somente a preparação de Deus para a sua mais elevada manifestação.
Mesmo Haeckel, Hist.Creation, 1.38, pode dizer que, na narrativa mosaica, "duas grandes e fundamentais idéias vêm ao nosso encontro - a da separação, ou diferenciação, e a do desenvolvimento progressivo ou aperfeiçoamento. Podemos tributar nossa justa e sincera admiração ao grande discernimento do legislador judaico à natureza e sua simples e natural hipótese da criação sem descobrir nela a revelação divina". Henry Drummond, cujo primeiro livro, Nature Law in the Spirit World, nos seus últimos dias sentiu pender para uma direção determinista e materialista, mas veio a crer em "uma lei espiritual num mundo natural". Sua obra Ascensão do Homem considera a evolução e a lei apenas como métodos de uma divindade presente. O darwi- nismo, a princípio parecia mostrar que a história passada da vida sobre o planeta era de carnificina impiedosa e cruel. A sobrevivência do mais capaz tinha como lado oposto a destruição de miríades. A Natureza era "vermelha nos dentes e tinha garras como o abutre". Mas outro pensamento tem mostrado que este ponto de vista sombrio resulta de uma indução parcial dos fatos. A vida paleontológica não era só uma luta pela vida, mas pela vida dos outros. O começo do altruísmo deve ser visto no instinto de reprodução e no cuidado com a descendência. Na cova dos leões e na toca dos tigres e a cada águia mãe alimentando o filhote há um sacrifício de si mesmo que se reflete ferozmente na subordinação dos interesses pessoais do homem em benefício dos interesses dos outros.
O Dr. George Harris, em sua Moral Evolution, acrescentou à doutrina de Drummond outra consideração de que a luta pela vida de alguém tem seu lado moral assim como a luta pela vida dos outros. O instinto de preservação de si mesmo é o começo do direito, da retidão, da justiça e da lei terrena. Cada criatura deve-o a Deus a fim de preservar o seu próprio ser. Assim podemos encontrar um reflexo da moralidade mesmo no afã predatório e exterminador das eras geológicas. O Deus imanente sempre esteve preparando o caminho para o direito, para a dignidade, para a liberdade do ser humano. B. P. Bowne, no Independent, 19 de abril de 1900 - O sistema de Copérnico aturdiu o homem por algum tempo e apoiou-se no sistema ptole-
mentares. O primeiro capítulo de Gênesis descreve a criação do homem como a coroa da obra geral de Deus. A segunda descreve a criação do homem com maior especificidade como começo da história humana.
Canon Rawlinson, em Aids to Faith, 275, compara o relato mosaico com a cosmogonia de Beroso, o caldeu. Pfleiderer, Philos. of Religion, 1.267-272, dá uma relato das teorias pagãs sobre as origens do universo. Anaxágoras foi o primeiro a representar a primeira matéria caótica formada através da compreensão ordenada (vofiç) de Deus e Aristóteles por essa razão o chamou "o primeiro sóbrio entre muitos ébrios". Schurman, Belief in God, 138 - "Nestas cosmogonias o mundo e os deuses crescem juntos; a cosmogonia é ao mesmo tempo teogonia". E. G. Robinson: "Os escritores da Bíblia criam e pretendiam afirmar que o mundo foi feito literalmente em três dias. Mas, baseado no princípio de que Deus pode significar mais do que eles significaram, a doutrina dos períodos pode não ser inconsistente com o relato deles".
A interpretação muito literal afastaria a narrativa de toda a comparação com as conclusões da ciência, pondo a história das eras geológicas em Gênesis 1.1,2 e fazendo o restante do capítulo 1a um relato da adequação da terra, ou alguma porção dela, limitada e seis dias de vinte e quatro horas cada. A este ponto de vista objetamos que não há na narrativa mosaica nenhuma indicação de tão grande intervalo entre o primeiro e o segundo versos; que não há nenhuma indicação de tal pausa na história geológica entre as eras de preparação e o presente; e que há indicações no registro mosaico de que a palavra "dia" não é empregada no sentido literal; enquanto as outras Escrituras inquestionavelmente empregam-na para designar um período de duração indefinida (Gn. 1.5 - "A luz Deus chamou dia" - um dia antes que houvesse sol; v. 8 - "Foi a tarde, a manhã e o dia segundo"; 2.2 - "Deus descansou no sétimo dia"; cf. 4.7-10 - o dia de descanso de Deus parece continuar e seu povo é exortado a entrar nele; Gn. 2.4 - "o dia em que o Senhor fez o céu e a terra" - "dia" aqui abrange sete dias; cf. Is. 7.12 - "o dia do Senhor dos Exércitos"; Zc. 14.7 - "será um dia que é conhecido do Senhor; nem dia nem noite será"; 2 Pe. 3.8 - "um dia é para o Senhor como mil anos e mil anos como um dia").
A interpretação muito científica encontraria na narrativa uma minuciosa e precisa correspondência ao registro geológico. Não se deve esperar isto, mesmo porque é estranho ao propósito da revelação ensinar ciência. Apesar de que se pode assinalar um acordo geral entre as narrativas mosaica e geológica é um embaraço desnecessário sermos compelidos a achar em cada pormenor daquela uma precisa afirmação de algum fato científico. Com muito mais probabilidade afirmamos que é
A interpretação figurativa sumária. Antes de explicar isto em pormenores, apresentamos como premissa que a finalidade deste ou de qualquer outro esquema futuro não é harmonizar Gênesis e a geologia. Tal posicionamento de todas questões envolvidas pressupõe não só uma perfeita ciência do universo físico, mas também uma perfeita ciência da hermenêutica. Isto basta, se quisermos oferecer soluções tentativas que representam o estado presente do pensamento sobre a matéria. Lembrando, então, que tal esquema de harmonização pode desenvolver-se rapidamente sem o preconceito para com a narrativa da Escritura, apresentamos, a seguir, um relato aproximado das coincidências entre os registros mosaicos e os geológicos. O esquema dado aqui é uma combinação das conclusões de Dana e Guyot e admite a verdade substancial da hipótese nebular. É interessante observar que Agostinho, que nada conhecia da ciência moderna, tivesse chegado, por simples estudo do texto, a alguns dos mesmos resultados. Ver Confissões, 12.8 - Primeiro Deus criou uma matéria caótica que se seguiu ao nada. Esta matéria caótica, amorfa, foi, subseqüentemente, ordenada nos seis dias seguintes"; De Genes, ad Lit., 4.27 - "A duração desses dias não deve ser determinada pela duração dos nossos dias da semana. Em ambos os casos há uma série e é o que basta". A seguir, apresentamos o esquema:
Se originariamente na condição de um fluido gasoso, a terra deve ter sido vazia e sem forma como descreve Gn. 1.2. Contudo, a terra ainda não está aqui separada da névoa em condensação e a sua condição fluida é indicada pelo termo "águas".
O começo da atividade da matéria manifestar-se-ia na produção da luz porque esta resulta da atividade molecular. Isto corresponde à afirmação do v. 3. Como resultado da condensação, a névoa se torna luminosa e o processo das trevas para a luz é descrito da seguinte maneira: "foi a tarde, a manhã, o dia primeiro". Aqui temos o dia sem termos o sol - caraterística na narrativa bem consistente com dois fatos da ciência: primeiro, que a nebulosa seria materialmente de si mesma luminosa e, a seguir, que a própria terra, que chegou à presente forma antes do sol, seria, quando emitida, uma massa de si mesma luminosa e derretida. Portanto, o dia seria contínuo, sem noite.
O desenvolvimento da terra em uma esfera independente e sem separação do fluido em torno de si corresponde à divisão das "águas sob o firmamento das águas sobre o firmamento" no v. 7. Aqui a palavra "águas" é empregada para designar a "matéria primordial cósmica", (Guyot, Creation, 35-37) ou à massa fundida da terra unida ao sol, do qual a terra foi lançada. O termo "águas" é o melhor que a língua hebraica tem para expressar a idéia de massa fluida. O Salmo 148 parece ter este sentido quando fala das "águas que estão acima nos céus" (v. 4) - águas que se distinguem dos "abismos" abaixo (v. 7) e de "vapor" (v. 8) acima.
A produção das caraterísticas físicas da terra pela condensação dos vapores que envolviam a esfera ígnea e o conseqüente delineamento dos continentes e oceanos é descrito a seguir no v. 9 como o ajuntamento das águas em um lugar e o aparecimento da terra seca.
A expressão da idéia da vida nas plantas inferiores porque é em gênero e efeito a criação do reino vegetal, é descrita a seguir no v. 11, como produzindo a existência das formas caraterísticas desse reino. Isto antecede a toda a menção da vida animal porque o reino vegetal é a base natural do animal. Se se dissesse que os nossos mais antigos fósseis são animais, responderíamos que as mais antigas formas vegetais, as algas facilmente se dissolviam e facilmente podiam desaparecer; que o grafite é o minério de ferro macio, parecendo inferior a qualquer animal remanescente, são o resultado de qualquer vegetação anterior; tais formas animais, quando e onde quer que existam devem subsistir aos vegetais e pressupô-los. A era eolítica necessariamente deve preceder à eozóica. Se se disser que as árvores frutíferas não foram criadas no terceiro dia, respondemos: porque a criação do reino vegetal foi descrita em um instante e não se deve fazer nenhuma menção subseqüente, o momento é certo para introduzir isto e mencionar suas principais caraterísticas.
Os vapores que até então têm envolvido o planeta agora desanuviam- se como antes da introdução da vida em suas mais elevadas formas animais. O conseqüente aparecimento da luz solar é descrito nos v. 16 e 17 como a feitura do sol, da lua e das estrelas e o trato delas como luminares da terra. Compare Gn. 9.13 - "O meu arco tenho posto na nuvem". O arco-íris existia antes na natureza, mas agora é indicado para servir a um propósito peculiar, assim também o sol, a lua e as estrelas, que antes foram indicados como luzes visíveis para a terra, e isto porque a terra não tinha mais era luz e a luz do sol, lutando através das nuvens que envolvem a terra não bastava para as mais elevadas formas de vida que haveriam de vir.
A apresentação de quatro grandes tipos do reino animal (radiados [como a medusa], moluscos, articulados, vertebrados), que caraterizam o estágio seguinte do progresso geológico, está representada nos versos 20 e 21 como a criação dos animais inferiores - os que formam cardumes nas águas, as espécies da terra que rastejam e as que voam. Huxley, em seus Discursos Americanos, contrapõe-se a esta atribuição da origem dos pássaros no quinto dia e declara que os animais terrestres existem nos extratos mais baixos que qualquer forma de pássaros - os pássaros aparecem só na era oolítica, ou nova pedra arenosa. Mas respondemos que o quinto dia é dedicado às produções marinhas, enquanto as terrestres pertencem ao sexto. Os pássaros, segundo a mais tardia ciência, são produções marinhas, não terrestres. Eles se originaram dos sáurios e eram, a princípio, lagartos voadores. Havendo apenas uma menção às produções marinhas, todas, incluindo pássaros, povoam o quinto dia. Assim o Gênesis antecipa a mais tardia ciência.
A introdução dos mamíferos - espécies vivíparas que são eminentes acima de todos os vertebrados por uma qualidade profética de um elevado propósito moral, os novos mamam - é indicado nos v. 24 e 25 do gado e predadores ao sexto dia.
O homem, um ser de caraterísticas morais e intelectuais e o primeiro em quem a unidade do grande desígnio tem plena expressão, forma tanto no registro mosaico como no geológico o último passo no progresso da criação (v. 26-31). Com o Prof. Dana podemos dizer que "na sucessão podemos observar não simplesmente uma ordem de eventos como aquela deduzida da ciência; há um sistema na ordenação e na profecia de longo alcance a que a filosofia não podia ter alcançado, contudo, podia ter instruído".
Prof. John Taylor: "O homem não é somente um ser mortal, mas moral. Se ele mergulha abaixo de seu plano de vida, deixa de trilhar o assinalado para ele por todo o seu desenvolvimento passado. Para o progresso, o mais alto vertebrado teve de subordinar tudo ao desenvolvimento mental. Para tornar-se humano, houve necessidade de desenvolver a inteligência racional. Para tornar-se mais elevado, o homem atual deve subordinar tudo ao desenvolvimento mental. Eis a grande lei do desenvolvimento animal e humano claramente revelado na seqüência das funções físicas e psíquicas". W. E. Gladstone, em S. S. Times, 26 de abril de 1890, chama os dias mosaicos de "capítulos da história da criação". Ele se recusa a chamá-los épocas ou
períodos porque não são de igual duração e, às vezes, parciais. Mas defende a correspondência geral da narrativa mosaica às mais tardias conclusões da ciência e assinala: "Qualquer homem cujo labor e dever por várias vintenas de anos tem incluído como ponto central o estudo dos meios de tornar-se inteligível à massa está em muito melhor posição para julgar quais seriam as formas e métodos de falar adequados ao escritor mosaico, do que o mais perfeito hebraísta, o mais consumado físico devotado à ciência como tal".
O FIM DE DEUS NA CRIAÇÃO
A sabedoria infinita deve, ao criar, propor a si mesma os mais abrangentes e mais valiosos fins; o fim mais digno de Deus e o mais frutífero no bem. Só à luz do fim proposto podemos apropriadamente ajuizar a obra de Deus, ou o caráter de Deus revelado através dela.
Parece que a Escritura deve dar-nos resposta para a pergunta: Por que Deus criou? O grande Arquiteto pode melhor falar do seu próprio desígnio. Ambrósio: "A quem darei maior crédito sobre Deus do que o próprio Deus?" George A. Gordon, New Epoch for Faith, 15 - Deus é necessariamente o ser dos fins. A teleologia é a trama e solução da humanidade; também deve sê-lo da divindade. A ciência da evolução tem-se empenhado neste ponto de vista.
A ciência natural é apenas um fraco disfarce da ignorância quando não implica em propósito cósmico. O movimento da vida a partir do inferior para o superior é um movimento sobre os fins. A vontade é o último motivo do universo e a vontade é a faculdade dos fins. No momento em que se conclui que Deus é toma-se certo que ele é o ser dos fins. O universo vive do desejo e do movimento. Fundamentalmente é ao todo uma expressão da vontade. Segue-se que o fim último de Deus na história humana deve ser digno dele mesmo.
Ao determinar este fim, voltamo-nos primeiro para:
O testemunho da Escritura
Este pode ser resumido em quatro afirmativas. Deus acha seu fim d) em si mesmo; b) em sua própria vontade e prazer; c) em sua própria glória; ã) em tornar conhecido seu poder, sua sabedoria e seu santo nome. Todas estas afirmativas podem ser combinadas no seguinte, a saber, que o supremo fim de Deus na criação não é nada fora de si mesmo, mas é a sua própria glória - na revelação da perfeição infinita do seu próprio ser, nas criaturas e através delas.
Rm. 11.36 - "Para ele são todas as coisas". Cl. 1.16- 'Todas as coisas foram criadas ... para ele (Cristo)"; compare Is. 48.11 - "por amor de mim, por amor de mim o farei... e minha glória não darei a outrem"; e 1 Co. 15.28 "... se sujeitou aquele que todas as coisas lhe sujeitou para que Deus seja tudo em todos".
Ef. 1.5,6,9 - "e nos predestinou ... segundo o beneplácito da sua vontade para o louvor e glória da sua graça ... mistério de sua vontade ... segundo o beneplácito que propusera em si mesmo"; Ap. 4.11 - "tu criaste todas as coisas e por tua vontade são e foram criadas".
Is. 43.7 - "... que criei para a minha glória".
SI. 143.11 - "por amor da tua justiça tira a minha alma da angústia";
Ez. 36.22 - "Não é por vosso respeito que faço isto, mas pelo meu santo nome"; 39.7 - "farei conhecido meu santo nome". Rm. 9.17 - a Faraó: "para isto mesmo te levantei, para em ti mostrar o meu poder e para que o meu nome seja anunciado em toda a terra". 22,23 - "riquezas da sua glória" tornada conhecida nos vasos da ira e nos vasos da misericórdia; Ef. 3.9,10 - "criou todas as coisas; para que a multiforme sabedoria de Deus através da igreja seja conhecida dos principados e potestades nos céus".
Porque a santidade é o atributo fundamental em Deus, fazer-se a si mesmo, o seu próprio prazer, sua glória, sua manifestação, para ser o seu fim na criação, deve achar o seu principal fim na sua santidade, seu sustento, expressão e comunicação. Fazer seu principal fim, contudo, não é excluir alguns dos fins subordinados tais como a revelação de sua sabedoria, poder, amor e conseqüente felicidade das inúmeras criaturas a quem se faz a sua revelação.
É a glória de Deus que o faz glorioso. Não é algo exterior como o louvor e a estima do homem, mas algo interior como a dignidade e o valor de seus próprios atributos. Para um nobre o louvor é bem insípido a não ser que ele esteja cônscio em si mesmo de algo que o justifique. Devemos ser como Deus para ter o respeito de si mesmo. Bem disse Pitágoras: "O fim do homem é ser como Deus" Assim Deus deve olhar para dentro de si e achar a sua honra e seu fim em si mesmo. Schurman, Belief n God, 214-216- "Deus glo- rifica a si mesmo ao comunicar-se. O objetivo do amor é o exercício da santidade. A auto-afirmação condiciona a autocomunicação.
E. G. Robinson, Christian Theology, 94,196 - "A lei e o evangelho são apenas dois lados de um objeto, a altíssima glória de Deus no altíssimo bem do homem. ... Não há demérito em Deus fazer de si mesmo o seu principal fim: a) Tanto é indigno como criminoso um ser finito fazer-se o seu próprio fim porque é um fim que pode ser alcançado degradando-se e fazendo os outros errarem; mas b) para um Criador infinito não fazer-se o seu próprio fim seria desonrar-se a si mesmo e levar ao erro as suas criaturas, porque portanto
ele deve agir sem um fim, o que é irracional, ou partir de um fim que é impossível sem levar suas criaturas ao erro, porque d) o mais elevado bem- estar de suas criaturas e conseqüentemente a sua felicidade é impossível a não ser através da subordinação e conformidade da vontade deles com a do seu rei infinitamente perfeito e e) sem este altíssimo bem-estar e felicidade de suas criaturas o fim do próprio Deus em si torna-se impossível pois ele só é glorificado quando seu caráter se reflete em suas criaturas inteligentes e por elas é reconhecido". A criação nada pode acrescentar à riqueza essencial ou dignidade de Deus. Se o fim fosse exterior a ele mesmo, torná-lo-ia dependente e servo. Os antigos teólogos, portanto, falam da "glória declarativa" de Deus e da sua "glória essencial" como resultado da obediência e salvação do homem.
O testemunho da razão
Que a sua glória, no sentido já mencionado, é o supremo fim de Deus na criação, é evidente a partir das seguintes considerações:
A própria glória de Deus é o único fim verdadeira e perfeitamente atingido no universo. A sabedoria e a onipotência não podem escolher um fim que seja destinado para sempre a não ser atingido; pois "o que ele desejar isso fará" (Jó 23.13). O supremo fim de Deus não pode ser a felicidade das criaturas porque muitas são miseráveis aqui e o serão para sempre. O supremo fim de Deus não pode ser a santidade das criaturas pois muitas são impuras e o serão para sempre. Mas, conquanto nem a santidade nem a felicidade das criaturas é verdadeira e perfeitamente atingida, a glória de Deus se faz conhecida e o será tanto nos salvos como nos perdidos. Este, então, deve ser o supremo fim de Deus na criação.
Esta doutrina nos ensina que ninguém pode frustrar o plano de Deus. Deus receberá glória de cada vida humana. O homem pode glorificar Deus voluntariamente através do amor e obediência, mas, se não fizer isso, será coagido a glorificá-lo pela sua rejeição e castigo. Melhor será que o ferro fundido livremente corresponda ao molde preparado pelo grande Determina- dor do que ser o duro e frio ferro que deve ser malhado para receber a forma. Cleantes, citado por Sêneca: "Ducunt volentem fata, nolentem trahunt". W. C. Wilkinson, Epic of Saul, 271 - "Mas alguns são instrumentos e outros ministros de Deus, que opera sua santa vontade para com todos". Cristo batiza "no Espírito Santo e no fogo" (Mt. 3.11). Alexander Mc. Laren: "Há dois fogos; devemos nos libertar de um, ou de outro. Ou alegremente aceitamos o fogo purificador do Espírito Santo, que queima o nosso pecado, ou teremos de enfrentar o punidor que nos queima juntamente com o pecado. Ser purificado por um, ou ser consumido por outro é uma escolha que está diante de nós". Hare, A missão do Consolador em João 16.8 mostra que o Espírito Santo, ou convence os que se submetem à sua influência, ou convence os que resistem
a palavra èkéyxco tem esse duplo sentido.
A glória de Deus é intrinsecamente o fim mais valioso. O bem das criaturas é de insignificante importância comparado com este. A sabedoria dita que o maior interesse deve ter precedência sobre o menor. Porque Deus não pode escolher maior fim, ele deve escolher a si mesmo como o seu fim.
Mas isto significa escolher sua santidade e sua glória na manifestação da referida santidade.
Is. 40.15,16 - "Eis que as nações são como a gota de um balde e como o pó miúdo das balanças"; como a gota que caiu sem ser percebida, como o fino pó das balanças que o comerciante nem nota no peso, assim são todos os milhões tanto da terra como do céu diante de Deus. Ele criou e pode, num instante, destruir. O universo é apenas uma gota de orvalho na franja da sua veste. É mais importante que Deus seja glorificado do que o universo seja feliz. Como em Hb. 6.13 - "visto que não podia jurar por um outro maior, jurou por si mesmo" - aqui pode-mos dizer: Porque ele não podia escolher outro fim maior quando criou, escolheu a si mesmo. Jurar por si mesmo é jurar por sua santidade [SI 89.35 - "uma vez jurei por minha santidade (não mentirei a Davi")]. Inferimos que encontrar seu fim em si mesmo é achar esse fim na santidade dele.
A vara ou a pedra não existem para si mesmas, porém para algum conhe- ci-mento. Em parte a alma do homem existe para si mesma. Mas ela está consciente de que num sentido mais importante ela existe para Deus. Diz-se que "o pensamento moderno louva e serve a criatura mais do que o Criador; na verdade, parece que o principal fim do Criador é glorificar o homem e agradá-lo sempre". Prof. Clifford: "O reino de Deus é obsoleto; o reino do homem chegou". Tudo isto é a insanidade do pecado. Per contra, ver. Allen, Jonathan Edwards, 329,330 - "Duas coisas são claras na doutrina de Edwards: 1s, que Deus não pode amar algo mais do que a si mesmo; ele é tão grande e tão preponderante todo o seu ser que o que fica de fora dificilmente merece consideração; 2-, Deus ama a sua criatura a ponto de se infundir nela: a plenitude de sua própria essência transborda no mundo exterior e o que ele ama nos seres criados é a essência concedida a eles". Acrescentaríamos que Edwards não diz que eles são a essência de Deus.
Sua própria glória é o único fim que se harmoniza com a independência e a soberania de Deus. Cada ser depende de quem quer que seja ou de qualquer coisa que ele faça o seu fim último. Se algo na criatura é o fim último de Deus, ele depende da criatura. Mas porque Deus depende só de si mesmo, ele acha em si mesmo o seu fim.
Criar não é aumentar a bênção em Deus, mas revelá-la. Não há nenhuma necessidade ou deficiência que a criação supre. Todas as criaturas que derivam dele nada podem acrescentar-lhe. Toda a nossa adoração é apenas uma retribuição do que lhe pertence. Ele nos dá atenção por amor de si e não porque os nossos pequenos regatos de louvor acrescentam algo à sua oceânica plenitude de regozijo. Por amor a si mesmo e não por causa da nossa miséria ou das nossas orações ele nos redime e exalta. Fazer do nosso prazer e bem-estar o seu último fim seria abdicar do seu trono. Portanto, ele criou só por amor a si e por amor à sua glória. Por essa razão o London Spectator responde: "A glória de Deus é o esplendor de uma manifestação,
não o intrínseco esplendor manifesto. Contudo, o esplendor de uma manifestação consiste no efeito desta naqueles a quem é dada. Preciosamente porque a manifestação da bondade de Deus pode ser útil a nós e não a ele, tal manifestação nos beneficia, não a ele. Por ela recebemos tudo - ele nada, exceto que se sente gratificado com o que ele deseja conceder-nos". Nesta última cláusula encontramos o nosso reconhecimento da fraqueza na teoria de que o fim supremo de Deus é o bem de suas criaturas. O que na verdade Deus recebe é a plenitude do seu plano, a realização da sua vontade, a manifestação de si mesmo. O grande pintor ama a sua tela menos do que o seu ideal. Ele pinta para expressar-se a si mesmo. Deus ama cada alma que ele criou, porém ainda mais a expressão das suas próprias perfeições. Tais próprias perfeições são o fim divino. Robert Browning, Paracelsus, 54 - "Deus é o poeta perfeito. Aquele que realiza suas próprias perfeições".
O amor de Deus o faz um ser auto-expressivo. A auto-expressão é um impulso inato nas suas criaturas. Todo o gênio participa desta caraterística de Deus. O pecado substitui o transbordamento pela ocultação e interrompe a autocomunicação que faria o bem de cada um o bem de todos. Nem mesmo o pecado pode impedi-lo completamente. O ímpio é impelido a confessar. Pela lei natural revelar-se-ão, no juízo, os segredos de todos os corações. A regeneração restaura a liberdade e o regozijo da auto-revelação. Cristianismo e confissão de Cristo são inseparáveis. O pregador é tão somente um cristão mais avançado neste privilégio divino. Necessitamos de falar. A oração é a mais completa expressão individual e a presença de Deus é o único lugar da expressão perfeitamente livre.
No reino das coisas seculares, o grande poeta mais se aproxima da realização deste privilégio do cristão. Nenhum grande poeta jamais escreveu sua melhor obra por dinheiro, ou por fama, ou mesmo por fazer o bem. Hawthorne era mal-humorado e só parcialmente sincero quando dizia que nunca escrevera uma página a não ser em troca de pagamento. A esperança de pagamento pode ter posto a pena em ação, mas só o amor pela sua obra o podia ter feito. Motley com mais verdade declara que todas coisas perdem o sentido quando o escritor começa a considerar o que vai receber. Mas Hawthorne necessitava do dinheiro para viver enquanto Motley tinha um pai rico e um tio para sustentá-lo. O grande escritor certamente absorve-se em sua obra. Para ele, necessidade e liberdade combinam-se. Ele canta como os pássaros, sem intenção dogmática. Contudo, ele é grande em proporção quando tem o coração moral e religioso. "Arma virumque cano" (eu canto as armas e o varão) é a única vez que a Eneida emprega a primeira pessoa embora toda ela seja uma revelação de Virgílio. Pouco sabemos da vida de Shakespeare, mas muito de seu gênio.
Nada se acrescenta à árvore quando produz flores e frutos; sozinha ela reve-la sua natureza íntima. Mas devemos distinguir no homem sua verdadeira natureza da falsa. O verdadeiro tesouro sobre o qual o grande poeta se realiza não são as suas peculiaridades privadas, mas a permanentemente universal. Logfellow: "Ele é o maior artista do lápis ou da pena, que segue a natureza. Nunca o homem, como artista ou artesão, perseguindo suas fantasias, pode tocar o coração ou prazer humano ou satisfazer nossas mais nobres necessidades". Tennyson, depois de observar a vida subaquática de
um riacho exclamou: "Que imaginação Deus tem!" Caird, Philos. Religion, 245 - "O mundo das inteligências finitas, embora diferente de Deus, ainda em sua natureza ideal está unido a ele. Aquilo que Deus cria e pelo que ele revela os tesouros ocultos da sua sabedoria e amor não é estranho à sua própria vida infinita, mas está unido a ela. Ao conhecer as mentes que o conhecem, na entrega total dos corações que o amam, não há nenhum paradoxo em afirmar que ele conhece e ama a si mesmo".
Sua própria glória é um fim que abrange e assegura, como fim subordinado, cada interesse do universo. Os interesses do universo estão ligados aos interesses de Deus. Não há nenhuma santidade ou felicidade para as criaturas a não ser na absoluta soberania de Deus e reconhecimento como tal. Não é, portanto, o egoísmo, mas a benevolência que faz Deus e a sua própria glória o fim supremo da criação. Não se trata de vangloria e ao expressar seu ideal, isto é, ao expressar-se a si mesmo, na criação ele comunica à sua criatura o supremo bem possível.
Esta expressão de si mesmo não é egoísmo, mas benevolência. Como o verdadeiro poeta se esquece de si mesmo na sua obra, assim Deus não se manifesta em conseqüência do que pode fazer por ela. Mas na manifestação de si mesmo Deus envolve todo o bem em favor de suas criaturas. Somos constrangidos a amar-nos a nós mesmos bem como a nossos interesses na mesma proporção do valor dos referidos interesses. O monarca de um reino ou o general de um exército devem ter cuidado com a sua própria vida porque a sua morte pode causar a perda de milhares de vidas de soldados ou de súditos. Da mesma maneira Deus é o cerne do grande sistema. Só sendo tributários do coração podem os membros ser supridos das correntes da santidade e felicidade. Portanto, só um ser no universo está certo de viver por si mesmo. O homem não vive em proveito de si mesmo, porque há um fim mais elevado. Porém, para Deus, não há mais elevado fim do que ele mesmo. "Espera-se que só um ser no universo não tem o dever de submissão.
O homem deve estar sujeito às 'autoridades superiores' (Rm. 13.1). Mas não há nenhuma autoridade superior a Deus". Ver Park, Discourses, 181-209.
Eis o lema de Bismarck: "Ohne Kaiser, kein Reich" - "Sem imperador não há império". Isto se aplica a Deus como o lema de Von Moltke: "Erst wãgen, dann wagen" - "primeiro o peso (ponderação), depois a ousadia" - aplica-se ao homem. Edwards, Works, 2.215 - "O erário público é mais importante que o interesse particular. É natural e próprio que Deus valha infinitamente mais que suas criaturas". Shakespeare, Hamlet, 3.3 - "Se um simples particular está obrigado a defender a sua vida com toda força e vigor de seu talento, muito mais estará aquele em cujo bem-estar se estriba e apóia a existência das multidões. Quando sucumbe o monarca, a majestade real não morre só, mas, como um vórtice, arrasta consigo tudo quanto o rodeia. É como se fosse uma formidável roda, fixa no cume de altíssima montanha e a cujos raios estivessem sujeitas e aderidas dez mil peças menores que, ao serem derrubadas, arrastam consigo todos esses fracos ornatos, os quais, como séquito mesquinho, acompanham-na em sua impetuosa ruína. Basta que o rei suspire para que todo o reino gema".
A glória de Deus é o fim que num correto sistema moral se propõe às criaturas. Este deve, portanto, ser o fim que aquele a cuja imagem elas foram feitas propõe para si mesmo. Aquele que constitui o centro e o fim de todas as criaturas deve achar seu centro e fim em si mesmo. Este princípio de filosofia moral e a conclusão tirada dele são tanto explícita quanto implicitamente ensinados na Escritura.
O começo de toda religião é a escolha da finalidade para Deus como também a nossa - o abrir mão da nossa preferência da felicidade e o entrar para uma vida dedicada a Deus. Do fato de que a busca da santidade não só é bem sucedida em si mesma, mas traz felicidade como conseqüência fica claro que a felicidade não é a base da obrigação moral. Arcebispo Leighton, Obras, 695 - "Um maravilhoso exemplo de sabedoria e bondade é que Deus estabeleceu conexão da sua própria glória com a nossa felicidade, de tal modo que não podemos propriamente querer uma, mas que a outra se segue naturalmente e a nossa felicidade, por fim, encontra solução na sua eterna glória".
A verdadeira fonte de consolo na aflição, da força no labor, do estímulo na oração é que a vontade de Deus garante o fim para o qual ele criou, i.e., a sua glória e que o seu fim é o nosso. Ver SI. 25.11 - "Por amor do teu nome... perdoa a minha iniqüidade, pois é grande". 115.1 - "Não a nós, Senhor, não a nós, mas ao teu nome dá glória"; Mt. 6.33 - "Mas buscai primeiro o reino de Deus e a sua justiça e todas essas coisas vos serão acrescentadas"; 1 Co. 10.31
"Portanto, quer comais, quer bebais, ou façais outra coisa, fazei tudo para a glória de Deus"; 1 Pe. 2.9 - "vós sois a raça eleita ... para que possais mostrar as excelências daquele que vos chamou das trevas para a sua maravilhosa luz"; 4.11 - falando, ministrando "para que em tudo Deus seja glorificado através de Jesus Cristo a quem pertence a glória e o poder para todo o sempre. Amém".
É nosso dever fazer o máximo por nós mesmos por amor a Deus. Jr. 45.5 - "E procuras tu grandezas? não as busques". Mas em lugar nenhum se proíbe que busquemos grandes coisas para Deus. Devemos "procurar com zelo os melhores dons" (1 Co. 12.31). A auto-realização como a auto-expressão é próprio da humanidade. Kant; "O homem, e com ele toda criatura racional, é um fim em si mesmo". Mas esta busca do seu próprio bem deve subordinar- se ao mais alto motivo: a glória de Deus. A diferença entre o regenerado e o não regenerado consiste totalmente no motivo. Este vive para o eu, aquele para Deus. O jovem que no Yale College começou a aprender suas lições para Deus ao invés de aprendê-las para si mesmo, deixando sua salvação nas mãos de Cristo bem ilustra o fato. Deus requer a auto-renúncia, tomando a cruz e seguindo a Cristo porque a primeira necessidade do pecador é mudar seu centro. Ser autocentrado é ser selvagem. A luta pela vida dos outros é melhor. Há, porém algo ainda mais elevado. A dignidade da vida depende do objeto que fixamos no lugar do eu. Siga a Cristo, faça Deus ser o centro da sua vida, - e assim você atingirá o melhor; ver Colestock, Changing Viewpoint, 113-123.
George G. Gordon, The New Epoch for Faith, 11-13 - "O último ponto de vista do universo é o religioso. É digno, por fim, do supremo Ser. Eis a nota de valor permanente no grande ensaio de Edwards sobre o Fim da Criação.
O valor final da criação é o seu valor para Deus.... O homem vive na sociedade e através dela - eis a verdade que Aristóteles ensina - mas ele não vê que a sociedade só atinge seu fim em Deus e através dele. Hovey, Studies, 65
"Manifestar a glória e a perfeição de Deus é, portanto, o principal fim da nossa existência. Viver de tal maneira que a vida dele se reflita na nossa; que o seu caráter reapareça, embora de modo frágil; que reconheçamos e declaremos a atividade e o amor dele é fazer aquilo para o que nós fomos criados.
E assim, exigindo que nós o glorifiquemos, Deus simplesmente requer que façamos o absolutamente justo e ao mesmo tempo indispensável ao nosso mais elevado bem-estar. Qualquer objetivo inferior não pode ter sido posto diante de nós, sem tornar-nos contentes com um caráter diferente do Bem Primeiro e do bem-estar.
RELAÇÃO DA DOUTRINA DA CRIAÇÃO COM AS OUTRAS DOUTRINAS
Com a santidade e a benevolência de Deus
Como obra de Deus, a criação manifesta a necessidade dos atributos morais dele. Mas a existência do mal físico e moral no universo parece à primeira vista impugnar tais atributos e contradizer a declaração da Escritura de que a obra da mão de Deus era "muito boa" (Gn. 1.31). Esta dificuldade pode em grande parte ser removida ao considerar que:
A princípio, o mundo era bom em dois sentidos: primeiro, como livre do mal moral, - o pecado foi um acréscimo posterior, obra não de Deus, mas dos espíritos criados; segundo, adaptado a fins benéficos, - por exemplo, a revelação da perfeição de Deus e a provação e felicidade das criaturas inteligentes e obedientes.
A dor física e imperfeição, até onde existiam antes da introdução do mal moral devem ser consideradas: primeiro como partes côngruas de um sistema em que o pecado foi previsto como um incidente; e segundo, constituindo, em parte, o meio da disciplina futura e redenção para os decaídos.
Os coprólitos dos sáurios contêm as escamas e os ossos dos peixes que eles devoraram. Rm. 8.20-22 - "Porque a criação está sujeita à vaidade, não por sua própria vontade, mas por causa daquele que a sujeitou, na esperança de que a criação será libertada da servidão da corrupção para a liberdade da glória dos filhos de Deus . Porque sabemos que toda a criação (irracional)
geme e está com dores de parto até agora; 23 - nosso corpo mortal como parte da natureza, participa do mesmo gemido. 2 Co. 4.17 - "nossa leve e momentânea tribulação, produz para nós um peso eterno de glória mui excelente". Bowne, Philosophy of Theism, 224-240 - "Como explicar o nosso universo um tanto desgastado? O pessimismo admite que a sabedoria perfeita é compatível com a obra perfeita e que sabemos que o universo é verdadeiramente indigno e insignificante". John Stuart Mill, Essays of Religion, 29, traz uma terrível sentença da natureza, tempestades, relâmpagos, terremotos, peste, ruína e morte. Entretanto, o cristianismo considera-os devidos ao homem, não a Deus; como incidentes do pecado; como gemidos da criação clamando por livramento e liberdade. O corpo humano, como parte da natureza, aguarda a adoção, e a ressurreição do corpo deve acompanhar a renovação do mundo.
Darwin julgava que no mundo da natureza e do homem em sua totalidade "prevalece decididamente a felicidade". Wallace, Dan/vinism, 36-40 - "Os animais gozam toda a felicidade de que são capazes". Drummond, Ascent ofMan, 203 sgs. - "Na luta pela vida não há ira - só fome". Martineau, Study, 1.330 - "A dissipação da vida é tão somente a exuberância da natureza". Newman Smith, Place of Death in Evolution, 44-56 - "A morte somente sepulta a dissipação inútil. A morte entrou por causa da vida". Estes pronunciamentos, contudo, diminuem a importância da maldade no mundo e ignoram o ensino escriturístico sobre a conexão entre a morte e o pecado. Um mundo futuro no qual o pecado e a morte não entram mostra que o mundo presente é anormal e que a moralidade é a única cura para a mortalidade. As imperfeições do universo não podem ser explicadas alegando que elas dão ensejo à luta e à virtude. Só podemos explicar a mortalidade pela imoralidade e esta não da parte de Deus, mas do homem. Fairbairn: "O sofrimento é o protesto de Deus contra o pecado".
A teoria de Wallace a respeito da sobrevivência do mais adequado foi sugerida pela pródiga destruição da natureza. Tennyson: "Das cinqüenta sementes que ela freqüentemente traz apenas uma vinga". William James: "Nossos cães estão dentro da vida humana, mas não pertencem a ela. O cão, sob a faca da vivissecção, não é capaz de entender o propósito do seu sofrimento. Para ele só há dor. Do mesmo modo podemos estar embebidos numa mesma atmosfera espiritual, uma dimensão do seu ser para cuja apreensão não temos no momento nenhum órgão presente. Se conhecêssemos o propósito da nossa vida, tudo o que em nós é heróico concordaria religiosamente". Mason, Faith of the Gospel, 72 - "O amor está preparado para assumir medidas mais profundas e firmes do que a benevolência, que, por sua natureza, é algo de pouca profundidade". Os Lagos de Killamy, na Irlanda, mostram que paraíso poderia ser o mundo se a guerra não o tivesse desolado e se o homem adequadamente cuidasse dele. O nosso senso moral não pode justificar o mal na criação a não ser sob a hipótese de que este tem alguma causa e razão para a má conduta do homem.
Este não é um mundo perfeito. Não era perfeito mesmo quando originariamente constituído. Sua imperfeição se deve ao pecado. Deus o fez com referência à queda, - o estágio ordenado para o grande drama do pecado e da redenção que devia legitimar-se nela. Aceitamos a idéia de Bushnell sobre as
"conseqüências antecipadoras", e ilustraria com a construção de uma sala hospitalar enquanto nenhum membro da família está doente, e com a salvação dos patriarcas através de um Cristo que ainda estava para vir. Se os antigos vertebrados da história geológica forem tipos do homem e preparação para a sua vinda, então a dor e a morte entre os mesmos vertebrados podem de igual modo ter sido um tipo do pecado do homem e sua resultante miséria. Se o pecado não tivesse sido um incidente previsto e prevenido, o mundo poderia ter sido um paraíso. Ele só se tornará um paraíso quando se completar a obra redentora de Cristo. Kreibig, Versõhnung, 369 - "A morte de Cristo se fez acompanhar de assustadoras ocorrências no mundo exterior para mostrar que os efeitos do seu sacrifício atingiram até mesmo a natureza". Perowne menciona o SI. 96.10 - "Ele firmou o mundo para que não se abale" - para referir-se à restauração da criação dos seres inanimados; cf.
Hb. 12.27 - "E esta palavra: Ainda uma vez, mostra a mudança das coisas móveis, como as coisas feitas, para que as imóveis permaneçam"; Ap. 21.1,5
"Novo céu nova terra ... eis que faço novas todas as coisas".
Tem-se feito muita zombaria sobre esta doutrina das conseqüências antecipadoras. James D. Dana: "É engraçado que o pecado de Adão teria matado os trilobitas! O bacamarte deve ter dado, no tempo, um coice de tão tremenda forma que golpearia os pobres inocentes!" Contudo cada apólice de seguro, cada tomada de um guarda-chuva, cada compra de alianças de casamento é uma conseqüência antecipadora. Negar que Deus fez o mundo ser o que é em vista dos eventos que ocorrem nele é atribuir-lhe menos sabedoria que aos nossos semelhantes. A mais racional explicação do mal físico no universo acha-se em Rm. 8.20,21 - "a criação está sujeita à vaidade ... por aquele que a sujeitou" - i.e. pelo pecado do primeiro homem - "na esperança de que a própria criação também será libertada".
Martineau, Types, 2.151 - "Que sentido tem a Piedade em um mundo onde o sofrimento não tivesse razão de ser?" Hicks, Critique of Design Arguments, 386 - "A própria maldade do mundo convence-nos de que Deus é bom".
As palavras de Sir Henry Taylor: "A dor no homem tem a elevada missão de malhar e abanar o trigo; nos brutos isto é doloroso" têm como resposta:
O bruto é tão somente um apêndice do homem e, como a natureza inanimada, ele sofre desde a queda do homem - sofre não totalmente em vão, pois mesmo nos brutos a dor serve para ilustrar a influência maligna do pecado e sugerir motivos para resisti-lo. Pascal - "Qualquer que seja o preço que a virtude possa ter é muito barato". A dor e a imperfeição do mundo são a severidade de Deus sobre o pecador e a sua advertência para com ele.
Com sabedoria e livre vontade de Deus
Nenhum plano qualquer que seja duma criação finita pode expressar plenamente a perfeição infinita de Deus. Contudo, porque Deus é imutável deve sempre ter tido um plano para o universo; porque ele é perfeito deve ter tido o melhor plano possível. Como sábio ele não pode escolher um plano menos bom ao invés de um mais bom. Como racional não pode fazer uma escolha simplesmente arbitrária entre planos igualmente bons. Não há aqui nenhuma necessidade, mas só a certeza de que a sabedoria infinita agirá sabiamente. Como nenhuma coação vinda de fora, assim também nenhuma necessidade vinda de dentro leva Deus a criar o verdadeiro universo. A criação tanto é sábia como livre.
Como Deus é racional e sábio, o fato de ter ele um plano sobre o universo deve ser melhor do que não ter o plano que deveria ser. Mas houve tempo em que o universo não era; contudo, sem o universo Deus era bendito e suficiente a si mesmo. Além disso, porque Deus é tanto racional como sábio, sua real criação não pode ser pior possível nem arbitrariamente escolhida entre duas ou mais igualmente boas. Consideradas todas as coisas deve ser a melhor possível. Não somos pessimistas; somos otimistas.
Mas discordamos de que a forma de otimismo que considera o mal como indispensável condição do bem e o pecado como produto direto da vontade de Deus. Sustentamos que outra forma de otimismo que considera o pecado como naturalmente destrutivo, mas praticado, a despeito de si mesmo, por uma providência direta superior contribua para o mais elevado bem.
Janet, em sua obra Final Causes, 429 sgs. e 490-503, reivindica que o otimismo sujeita Deus ao destino. Já tivemos a ocasião de mostrar que esta objeção equivoca a certeza, que é consistente com a liberdade e a necessidade, que é inconsistente com a liberdade. A doutrina oposta atribui arbitrariedade irracional a Deus. Estamos certos ao dizer que o universo atualmente existente, considerado como uma realização parcial do plano de desenvolvimento da parte de Deus, é o melhor possível neste ponto particular do tempo, - em resumo, que tudo é para melhor, - ver Rm. 8.28 - "Todas as coisas colaboram para o bem dos que amam a Deus; 1 Co. 3.21
"tudo é vosso".
Baird, Elohim Revealed, 397-419 especialmente 405 - A sabedoria cujos recursos tem sido de tal modo despendidos que não pode igualar suas realizações é uma capacidade finita e não uma profundeza ilimitada do Deus infinito". Entretanto respondemos que a sabedoria que não faz o melhor não é sabedoria. O limite não está no poder abstrato de Deus, mas nos seus outros atributos como a verdade, o amor e a santidade. Por isso Deus pode dizer em Is. 5.4 - "que mais podia fazer à minha vinha que eu não lhe tenha feito?"
A perfeita antítese a um otimismo ético encontra-se no pessimismo amoral e ateísta de Schopenhauer (Die Welt ais Wille und Vorstelung- O Mundo como Vontade e Representação) e Hartmann (Philosophie des Unbewussten
Filosofia do Inconsciente). "A vida toda se resume em esforço e o esforço é doloroso; portanto, vida é dor". Mas podíamos retorquir: A vida é ativa e a ação sempre se faz acompanhar de prazer; portanto vida é prazer. O pessimismo é natural em uma mente amargada pelo desapontamento e esquecimento de Deus: Ec 2.11 - "e eis que tudo era vaidade e aflição de espírito"; ou "tudo era vaidade e correr atrás do vento". Homero: "Nada há mais miserável que o homem". Sêneca louva a morte como a melhor invenção da natureza. Entretanto deixou-se a Schopenhauer e a Hartmann definir a vontade como anseio insatisfeito, considerar a vida como em si como enorme erro e a raça humana como a única medida de salvação permanente, ato coeso e universal de suicídio.
G. H. Beard, Andover Rev., 1892-Schopenhauer profere uma verdade do Novo Testamento: a completa desilusão da auto-indulgência. A vida dominada pelos desejos e dedicada tão somente à aquisição é um pêndulo oscilante entre a dor e o tédio". Bowne, Philos. of Theism, 124 - Para Schopenhauer a base do mundo é a pura vontade sem o intelecto ou a personalidade. Mas a pura vontade não é nada". Royce, Spirit of Mod. Philos., 253-260 - Schopenhauer uniu o pensamento de Kant 'A mais íntima de todas as coisas é uma', com o discernimento hindu, 'A vida de todas estas coisas, que és tu'. Para ele a música mostra melhor o que é a vontade: apaixonada, batalhadora, vagante, incansável, sempre voltada para si, cheia de anseios, vigor, majestade, capricho. Schopenhauer condena o suicídio individual e aconselha a resignação.
O que eu sempre desejo, entretanto nunca adquiro plenamente, leva Hegel à concepção do espírito absolutamente ativo e triunfante. Schopenhauer vê nisso a prova da natureza totalmente má das coisas. Assim enquanto Hegel é otimista, Schopenhauer é pessimista".
Winwood Reade, The Martyrdom of Man, pretende descrever a história humana. O. W. Holmes diz que o Peregrino de Bunyan representa o universo como uma armadilha que apanha a maioria dos vermes humanos que têm diante de si a isca". Strauss: "Se os profetas do pessimismo provam que o melhor que o homem devia fazer é nunca ter vivido, provam com isso que a melhor coisa que eles deviam ter feito é nunca ter profetizado". Hawthorne, Note-book-. É curioso imaginar que lamentações e descontentamentos seriam estimulados, se algumas das assim chamadas calamidades dos seres humanos fossem abolidas, - como, por exemplo, a morte".
Com Cristo como revelador de Deus
Porque Cristo é o revelador de Deus na criação assim como na redenção o remédio para o pessimismo é 1) o reconhecimento da transcendência de Deus
atualmente o universo não expressa plenamente o seu poder, sua santidade ou seu amor, e a natureza é um esquema da evolução progressiva que compreendemos imperfeitamente e na qual há muito a seguir; 2) o reconhecimento do pecado como um ato livre da criatura que causou toda a tristeza e dor de modo que Deus não é no sentido adequado o seu autor; 3) o reconhecimento de Cristo por nós na cruz e de Cristo em nós pelo seu Espírito revelando a duradoura tristeza e sofrimento do coração de Deus por causa da transgressão humana e manifesta no amor auto-sacrificial para libertar os homens dos múltiplos males nos quais os pecados os envolveram; e 4) o reconhecimento da provação presente e do juízo futuro de modo que se faz a provisão removendo o escândalo ora sobre o governo divino e justificando os caminhos de Deus para o homem.
A cruz de Cristo é a prova de que Deus sofre mais do que o homem por causa do pecado humano e o juízo de Cristo mostrará que o ímpio não será sempre próspero. Só em Cristo achamos a chave do atro problema da história e a garantia do progresso humano. Rm. 3.25 - "o qual Deus propôs para propiciação pela fé no seu sangue para demonstrar a sua justiça pela remissão dos pecados dantes cometidos, sob a paciência de Deus". 8.32 - "Aquele que nem mesmo poupou seu próprio Filho, antes, o entregou por todos nós, como não nos dará também com ele todas as coisas"? Hb. 2.8,9 - "não vemos que todas as coisas lhe estejam sujeitas... vemos, porém, Jesus... coroado de glória e de honra"; At. 17.31 - "tem determinado um dia em que julgará a terra com justiça por meio do varão que destinou".
G. A. Gordon, New Epoch of Faith, 199 - "Huxley chama o livro de Jó o clássico do pessimismo". O Deão Swift, sobre os seus próprios sucessivos aniversários natalícios costumava ler o terceiro capítulo de Jó que começa com o terrível "Pereça o dia em que nasci" (3.3). Mas a predestinação e a eleição não são arbitrárias. A sabedoria escolheu o melhor plano possível: ordenou a salvação de todos os que sabiamente podiam ter sido salvos, permitiu o menor mal que a sabedoria pode permitir. Ap. 4.11 - "Criaste todas as coisas e por tua vontade são e foram criadas". Mason, Faith ofthe Gospel, 79
Todas as coisas estavam presentes na mente de Deus por causa da sua vontade e, quando lhe aprouve, deu-lhas". Pfleiderer, Grundriss, 36, advoga o idealismo realista. O Cristianismo, diz ele, não é otimismo abstrato, pois reconhece o mal do verdadeiro e considera o conflito como tarefa da história do mundo; não é pessimismo, pois não considera o mal como invencível, mas o bem como o fim e a força do mundo.
Jones, Ftobert Browning, 109, 311 - "O Panteísmo otimista afirma que todas as coisas são boas; o otimismo cristão afirma que todas as coisas cooperam para o bem. Reverie, Asoiando: 'Era desde a primeira força - eu sei'. A vida me esclareceu que devo lutar, mas por pontos de vista definidos, o amor é tão claro que se pode ver'. Aventura de Balaustion: 'Alegria seja contigo, Auxiliador do mundo! Suponho que este é o autêntico sinal e selo do divinal que se torna cada vez mais alegre até atingir a alegria das flores, explode em ira a ponto de sofrer pela humanidade e recomeçar a tristeza'. Browning, empenhava-se em achar Deus no homem e ainda deixar livre o ser humano. Sua fé otimista buscava a reconciliação com a moralidade. Ele detestava a doutrina de que os males do mundo se devem simplesmente à arbitrária soberania e satirizava esta doutrina no monólogo de Caliban em Stebos: 'Não amando, não odiando, só escolhendo'. Pippa Passos: 'Deus está no céu - Tudo está certo com o mundo'. Mas como isto é consistente com a culpa do pecador? Browning não diz. O amor exige distinção entre Deus e o homem. Saul: 'Tudo é amor, mas tudo é lei'. Carlyle forma marcante contraste com Browning. Carlyle era pessimista. Ele renunciaria a felicidade pelo dever e, como um meio para alcançar esse fim, supriria não só a conversa sem valor, mas até o próprio pensamento. Estava iniciada a batalha embora em uma causa estranha. A causa de Deus não é nossa. O dever é tão grande ameaça como o do escravo. A lei moral não é uma revelação benéfica que reconcilia Deus com o homem. Tudo é medo e não há amor". Carlyle levou Emerson pelas favelas de Londres à meia-noite e perguntou-lhe: E agora, você crê no Diabo"? Porém Emerson respondeu: "estou cada vez mais convencido da grandeza e bondade do povo inglês".
Henry Ward Beecher, quando interrogado se valia a pena viver, respondeu que dependia muito do fígado (há um trocadilho em Inglês: to live = viver; liver = fígado). Otimismo e pessimismo são em grande parte assunto de digestão. O Presidente Marc Hopkins perguntou a um brilhante estudante se ele não cria que este é o melhor sistema possível. Quando o estudante respondeu pela negativa, o presidente perguntou-lhe como poderia melhorar isso. Ele respondeu: "Eu mataria todos os percevejos, pulgas e faria crescerem ao Norte laranjeiras e bananeiras mais adiante". Uma senhora picada por mosquito perguntou se seria próprio falar de criaturas como "insetozinhos depravados". Disseram-lhe que isto seria impróprio porque a depravação sempre implica um anterior estado de inocência, enquanto o mosquito sempre foi mau como é agora. Dr. Lyman Beacher, contudo, parece ter sustentado o ponto de vista contrário. Quando ele capturou o mosquito que o picou, esmagando o inseto, disse: "Ora veja! Vou mostrar a você que existe um Deus em Israel". Ele identificou o mosquito com todo o mal que existe no mundo. Allen, Religious Progress, 22 - "Wordsworth tinha ainda esperança, apesar de que a Revolução Francesa o tinha oprimido. Macaulay, depois de ler a História dos Papas de Ranke, negou todo o progresso religioso".
Pfleiderer, Philos. Religion, 1.301, 302 - Os gregos da época de Homero tinham um ingênuo e jovial otimismo. Mas mudaram o seu ponto de vista para o pessimismo. Tal mudança foi causada pela crescente contemplação da desordem moral do mundo". Butcher sustenta que a grande diferença entre gregos e hebreus é que aqueles não tinham esperança ou ideal de progresso. A. H. Bradford, Age of Faith, 74-102 - "Os poetas voluptuosos são pessimistas porque o prazer sensual passa rapidamente e deixa atrás de si lassi- dão e enervação. O pessimismo é a base do estoicismo. É inevitável onde não há fé em Deus e numa vida futura. A vida de uma semente enterrada não inspira, a não ser na previsão de sol, flores e frutos". Bradley, Appearance and Reality, xiv, resume o ponto de vista otimista da seguinte maneira: "O mundo é o melhor dos mundos possíveis e tudo que ele contém é um mal necessário". Ele devia acrescentar que a dor é a exceção e a livre vontade finita é a causa da perturbação. A dor torna-se o meio de desenvolver o caráter e, cumprido o seu propósito, ela passa.
Jackson, James Martineau, 390 - "Tudo está bem, diz um pregador americano, porque, se há algo que não vai bem, é bom que não vá bem. É bom que a ira e a falsidade não vão bem, que a malícia e a inveja e a crueldade não vão bem. Que espera o mundo, ou que confiança se tem em Deus, se não estivessem bem? Viver se translitera mal, só quando a lemos de modo errado". James Russel Lowell, Letters, 2.51 - "Quanto mais eu aprendo ... mais cresce a minha confiança no bom senso geral e intenções honestas. ... Os sinais dos tempos deixam de alarmar e parecem tão naturais como para uma mãe a dentição do seu sétimo bebê. Grande é o meu consolo em Deus. Acho que às vezes ele se alegra conosco e gosta de nós como um todo e não nos deixaria numa caixa de jogo tão descuidadamente, a não ser que conhecesse a estrutura do seu universo como uma prova de fogo".
Compare todo o pessimismo desesperançado de Omar Khayyam, fíubaiyat, estrofe 99 - "Ah Amor! poderíamos você e eu com ele conspirar para nos apegarmos a este inteiro esquema de coisas se não pudéssemos destroçar - e então remodelá-lo o mais próximo do modelo do coração?" Royce, Studies of Goodand Evil, 14, discutindo o problema de Jó, sugere a seguinte solução: "Quando você sofre, os seus sofrimentos são os sofrimentos de Deus, não a sua obra externa, nem a sua pena externa, nem o fruto da sua negligência, mas exatamente o seu próprio ai pessoal. Em você o próprio Deus sofre, precisamente como você e tem a mesma preocupação em vencer este pesar". F. H. Johnson, What is Reality?, 349, 505 - "O ideal cristão não é sustentável, se admitimos que Deus pode tão facilmente desenvolve sua criação sem conflito. ... A felicidade é apenas um dos fins dele; a solução do caráter moral é outra". A. E. Waffle, Uses of Moral Evil: "1) Auxilia o desenvolvimento do caráter santo através da oposição; 2) fornece oportunidade para ministrar; 3) torna conhecidos a nós os principais atributos de Deus; 4) realça as bênçãos do céu".
Com a Providência e a Redenção
O cristianismo é essencialmente um esquema de amor e poder sobrenaturais. Concebe Deus acima do mundo assim como nele; capaz de manifestar o próprio Deus e manifestá-lo verdadeiramente por meios desconhecidos da simples natureza.
Mas esta absoluta soberania e transcendência, que se manifestam na providência e na redenção, são inseparáveis do ato da criação. Se o mundo for eterno, como Deus, deve ser um efluxo da substância de Deus e deve ser absolutamente igual a Deus. Só uma adequada doutrina da criação pode garantir a distinção absoluta de Deus relativamente ao mundo e a soberania de Deus sobre o mundo.
A alternativa lógica da criação é, portanto, um sistema de panteísmo, no qual Deus é uma força impessoal e necessária. Daí os ditos panteístas de Fichte: "A suposição de uma criação é o erro fundamental de toda a falsa metafísica e falsa teologia"; de Hegel: "Deus evolui o mundo de si mesmo para trazê-lo de volta outra vez a si mesmo no Espírito"; e de Strauss: "A Trindade e a criação, vistas especulativamente, são uma coisa só e tem o mesmo nome, - só que uma é vista de um modo absoluto e a outra empiri- camente".
Starret, Studies, 155,156 - Hegel sustentava que é próprio da natureza de Deus criar. A criação é o posicionamento de Deus com relação a um outro que não um outro. A criação é dele, pertence ao seu ser ou essência. Isto envolve o finito como objeto autoposicionado e sua auto-revelação. É necessário Deus criar. O amor, diz Hegel, é tão somente outra expressão do Deus eternamente Trino. O amor deve criar e amar o outro. Mas, amando este outro, Deus apenas está amando a si mesmo". Já mostramos em nossa discussão sobre a teoria da criação a partir da eternidade, a insuficiência da criação para satisfazer tanto o amor como o poder de Deus. Uma doutrina apropriada da Trindade considera a hipótese de uma criação eterna desnecessária e irracional. Tal hipótese é de tendência panteísta. Luthardt, Com- pendium der Dogmatik, 97 - "O dualismo podia ser chamado de alternativa lógica da criação, mas pelo fato de que sua noção de dois deuses é autocontraditória e conduz ao rebaixamento da idéia de Deus, de tal modo que o impessoal deus do panteísmo toma o seu lugar". Dorner, System of Doctrine, 2.11 - "O mundo não pode ser refém da necessidade a fim de satisfazer, ou a falta, ou a grande plenitude em Deus. ... A doutrina da criação absoluta evita confundir Deus com o mundo. A declaração de que o Espírito pairava (hebr. chocava) sobre os elementos amorfos e a vida se desenvolveu sob a operação contínua das leis e presença de Deus, evita a separação de Deus com relação ao mundo. Evitam-se assim panteísmo e deísmo". Ver Kant e Spinoza contrastados em Shedd, Dogm Theol.,1.468,469. O incomum tratamento completo da doutrina da criação neste capítulo deve-se à convicção de que a doutrina constitui um antídoto à maioria das falsas filosofias da nossa época.
Com a observância do Sábado
A partir deste ponto de vista observamos, contudo, a importância e o valor do Sábado como ato comemorativo da criação de Deus e assim a personalidade, a soberania e a transcendência de Deus.
O Sábado é obrigação perpétua como um memorial da atividade criadora indicado por Deus. Sua exigência antedata o Decálogo e forma uma parte da lei moral. Feita na criação, aplica-se ao homem como homem, em qualquer lugar e sempre em seu estado presente.
Gn. 2.3 - "E abençoou Deus o dia sétimo, e o santificou; porque nele descansou de toda a sua obra que Deus criara e fizera". Nosso descanso deve ser uma representação miniatural do descanso de Deus. Como Deus trabalhou seis dias divinos e descansou um dia divino, assim devemos nós, em imitação a ele trabalhar seis dias humanos e descansar um dia humano.
No Velho Testamento há indicações de uma observância do dia de sábado antes da legislação mosaica. Gn. 4.3 - "E aconteceu, ao cabo de dias, que Caim trouxe do fruto da terra uma oferta ao Senhor"; 8.10,12 - Noé por duas vezes aguardou sete dias antes de enviar a pomba da arca; 29.27,28 - "cumpre a semana"; cf. Jz. 14.12 - "os sete dias da festa"; Ex. 16.5 - a porção dobrada do maná prometida no sexto dia, para que não se ajuntasse no sábado [cf. vv. 20,30). Esta divisão de dias em semanas é melhor explicada pela instituição original do sábado na criação do homem. Moisés fala no quarto mandamento como já conhecido e observado: Ex. 20.8 - "Lembra-te do dia do sábado para santificá-lo".
O sábado é reconhecido nos relatos Assírios da Criação. Professor Sayce: "Sete era um número sagrado originado dos semitas desde os antecessores acádios. De sete em sete eram os nós mágicos das feiticeiras; o corpo do doente devia ser ungido sete vezes na purificação com óleo. Como o sábado de descanso caía no sétimo dia, assim os planetas, como demônios mensageiros de Anu, eram sete e os deuses de número sete recebiam uma honra especial". Mas agora a descoberta de uma tábua do calendário na Mesopotâ- mia mostra-nos a semana de sete dias e o sábado em plena preponderância na antiga Babilônia muito antes dos dias de Moisés. Nessa tábua o sétimo, o décimo quarto, o vigésimo primeiro e o vigésimo oitavo dias eram chamados sábados, palavra empregada por Moisés seguida da expressão: 'dia de descanso'. As restrições são tão rígidas na tábua como lei de Moisés. Esta instituição deve ter remontado ao período acádico, anterior aos dias de Abraão.
Em uma das descobertas recentes este dia é chamado 'o dia de descanso para o coração', mas dos deuses; por causa da propiciação oferecida nesse dia, seu coração se punha em repouso.
S. S. Times, Jan. 1892, artigo do Dr. Jensen, da Universidade de Estrasburgo, sobre a Semana Bíblica e Babilônica: Subattu na Babilônia significa dia de propiciação, implicando propósito religioso. A narrativa babilônica do dilúvio implica uma semana de sete dias e o arco-íris continuou por seis dias desaparecendo no sétimo; outro período de sete dias entre o t rmino da tempestade e o desembarque de Noé, a pomba, a andorinha e o corvo enviados outra vez no sétimo dia. Os sábados são chamados dias de descanso para o coração, dias de cessação de trabalho". Hutton, Essays, 2.229 - "Porque na mente de Deus há uma fonte de eterno repouso assim como de energia criadora, somos levados a respeitar a lei do descanso do mesmo modo que a lei do trabalho". Na verdade, podemos questionar se esta doutrina do descanso de Deus não refuta por si mesma a teoria da criação eterna contínua e necessária.
Nem o Nosso Senhor nem seus apóstolos ab-rogaram o Sábado do Decálogo. A nova dispensação afastou as prescrições mosaicas quanto ao método de guardar o Sábado, mas ao mesmo tempo declara que sua observância é de origem divina e é uma necessidade da natureza humana.
Nem tudo na lei mosaica foi ab-rogado em Cristo. A adoração e a reverência, a consideração pela vida, pela pureza e pela propriedade ainda continuam obrigatórias. Cristo não pregou na cruz todos mandamentos do Decálogo. Jesus não se defendeu da culpa da quebra do sábado dizendo que o sábado foi ab-rogado mas fixando a sua verdadeira idéia quanto à necessidade humana fundamental de cumpri-lo. Mc. 2.27 - "O sábado foi feito [por Deus] por causa do homem e não o homem por causa do sábado". As restrições puritanas não são essenciais ao sábado, nem mesmo correspondem mais tarde aos métodos da observância do Velho Testamento. O sábado judaico assemelhava-se mais ao Dia de Ações de Graças na Nova Inglaterra do que ao seu Dia de Jejum. Ne. 8.12,18 - "Então todo o povo se foi a comer, e a beber, e a enviar porções e a fazer grandes festas ... e celebravam a
solenidade da festa sete dias e, no oitavo dia, a festa do encerramento, segundo o rito" - parece que inclui o sábado como dia de alegria.
Orígenes, Homilia 23sobre Números (Migne, II. 358): "Deixando, portanto, as observâncias judaicas do sábado, vejamos em que devem elas consistir.
No sábado, nenhuma de todas as ações do mundo deve ser feita". Cristo anda pela seara, cura o paralítico, ceia com um fariseu, tudo no sábado. John Milton em sua Christian Doct., é extremamente anti-sabatista, sustentando que o Decálogo foi abolido com a lei mosaica. O seu pensamento é que não é certo se "o dia do Senhor" era semanal ou anual. Na mente dele, a observância do sábado é matéria não de autoridade, mas de conveniência. Arcebispo Paley: "Na minha opinião, Paulo considerava o sábado como um tipo de ritual judaico, e não obrigatório para os cristãos. A cessação do trabalho nesse dia além do tempo de assistir ao culto público não se insinua em qualquer parte do Novo Testamento. A noção que Jesus e seus apóstolos tinham da guarda do sábado judaico, só mudando do sétimo para o primeiro prevalece sem razão suficiente".
Segundo Guizot, Calvino se agradava tanto com um jogo praticado em Genebra no domingo que não só assistia, mas adiava seu sermão de modo que a sua congregação pudesse assistir. Quando John Knox visitou Calvino achou-o jogando uma partida de boliche no domingo. Martinho Lutero dizia: "Conserve santo o dia por causa do seu uso tanto físico como espiritual. Mas se em qualquer lugar o dia for santificado simplesmente por causa do dia, se se praticar qualquer observância com base judaica, então ordeno que trabalhem nele, de modo a fazer algo que reprove este abuso no espírito e liberdade cristãos". Porém os escritores mais liberais e mesmo os mais radicais reconhecem os empregos econômicos e patrióticos do sábado. R. W. Emerson diz que a sua observância é "o cerne da nossa civilização". Charles Sum- mer: "Se perpetuarmos a nossa República, devemos santificá-la assim como fortificá-la e fazê-la ao mesmo tempo templo e cidadela". Oliver Wendel Holmes: "Aquele que ordenou o sábado amou os pobres". Na Pensilvânia trazem das minas cada domingo as mulas que estiveram trabalhando durante a semana toda na escuridão, - para que não fiquem cegas. Assim a vista espiritual do homem desaparecerá se não subirem semanalmente para a luz de Deus.
O Sábado obriga-nos a separar um sétimo do nosso tempo para o descanso e adoração. Não impõe a simultânea observância de uma porção de tempo fixo a todo o mundo, nem isso seria possível. O exemplo de Cristo e a sanção apostólica transferiram o Sábado do sétimo dia para o primeiro em razão de que este é o dia da ressurreição de Cristo e o dia quando a criação espiritual de Deus tornou-se completa em Cristo.
O homem em diferentes longitudes não pode observar simultaneamente nenhuma porção exata do tempo absoluto. Em Berlin o dia começa seis horas antes de em Nova Iorque, de modo que uma quarta parte do que é domingo em Berlin ainda será sábado em Nova Iorque. Cruzando os 180
graus de longitude do Ocidente ao Oriente ganhamos um dia e o sabatista do sétimo dia que circunavega o globo pode retornar ao ponto de partida observando o mesmo sábado que os seus companheiros cristãos. A. S. Carman, Examiner, 4 de janeiro de 1894, afirma que Hb. 4.5-9 faz referência à mudança do sétimo dia para o primeiro nas alusões a "um repouso de sábado" que "resta" e a um "outro dia" tomando o lugar do dia original de repouso. O Ensino dos Doze Apóstolos: "No dia do Senhor ajuntai-vos, e rendei graças e parti o pão".
A mudança do sétimo dia para o primeiro parece dever-se ã ressurreição de Cristo no "primeiro dia da semana (Mt. 28.1), ao seu encontro com os discípulos naquele dia e no domingo seguinte (Jo. 20.26) e ao derramamento do Espírito no domingo de Pentecostes sete semanas depois. Assim pelo próprio exemplo de Cristo e pela sanção dos apóstolos o primeiro dia tornou- se "o dia do Senhor" (Ap. 1.10) no qual os crentes se reúnem regularmente em cada semana com o seu Senhor (At. 20.7 - "no primeiro dia da semana, quando nos reuníamos para partir o pão") e traziam as contribuições para beneficência (1 Co. 1,2 - "sobre a oferta que se levanta em favor dos santos ... no primeiro dia da semana, separai conforme a prosperidade, para que não se levantem coletas quando eu chegar"). Eusébio, Com. sobre o SI. 92 (Migre V. 1191, C): "Portanto as coisas [regulamentos levíticos] tendo já sido rejeitadas, o Logos através da Nova Aliança transferiu e mudou a festa do sábado para o dia do nascer do sol... o dia do Senhor... sábado santo e espiritual".
Justino Mártir, Primeira Apologia: "No dia chamado domingo, todos os que moram na cidade ou no campo reúnem-se em um lugar e lêem-se as memórias dos apóstolos ou os escritos dos profetas. ... O domingo é o dia em que todos nós realizamos a assembléia comum porque é o primeiro dia em que Deus fez o mundo e o Nosso Salvador Jesus no mesmo dia ressuscitou dos mortos. Porque ele foi crucificado no dia anterior, que é o de Saturno (sábado); e no dia posterior ao de Saturno, que é o dia do Sol (domingo), tendo aparecido aos apóstolos e discípulos, ensinou-lhes estas coisas que apresentamos para vossa consideração". Isto parece indicar que, entre a ressurreição e a ascensão, Jesus deu a ordem a respeito da observância do primeiro dia da semana. Ele foi "recebido em cima" só depois que tinha dado o mandamento através do Espírito aos apóstolos que ele escolheu" (At. 1.2).
Então o sábado cristão é o dia da ressurreição de Cristo. O sábado judaico comemorava só o começo do mundo; o sábado cristão comemora também a nova criação do mundo em Cristo em que a obra de Deus na humanidade pela primeira vez torna-se completa. C. H. M. sobre Gn. 2: "Se eu celebro o sétimo dia ele me marca como um homem terreno do mesmo modo em que o dia claramente é o descanso da terra - repouso da criação; se inteligentemente eu celebro o primeiro dia da semana, sou marcado como um homem celeste, crendo na nova criação em Cristo". (Gl. 4 10,11) - "Observais dias, e meses, e estações e anos. Receio de vós que eu haja trabalhado em vão para convosco". Cl. 2.16,17 - "Ninguém vos julgue pelo comer, ou pelo beber, ou pelo dia de festa, ou lua nova, ou dia de sábado; que são a sombra das coisas futuras; mas o corpo é de Cristo".
Seção II - PRESERVAÇÃO I. DEFINIÇÃO DE PRESERVAÇÃO
É a atuação contínua pela qual Deus conserva existentes as coisas que ele criou, bem como as propriedades e forças de que as dotou. Como na doutrina da criação tentamos explicar a existência do universo, assim na doutrina da Preservação tentamos explicar sua continuação.
Como explicação assinalamos:
à) Preservação não é criação, pois a preservação pressupõe a criação. O que se preserva deve existir e isto pelo ato criador de Deus.
Preservação não é simples negação da ação ou impedimento de destruição da parte de Deus. É uma atuação positiva pela qual, a cada momento, ele sustenta as pessoas e dá forças ao universo.
Preservação implica um concurso natural de Deus em todas operações da matéria e da mente. Apesar de que os seres pessoais existem e de que a vontade de Deus não é a única força, ainda é verdade que, sem seu concurso, nenhuma pessoa e nenhuma força podem continuar a existir ou a agir.
Dorner, System of Doctrine, 2.40-42 - "Criação e preservação não podem ser a mesma coisa, pois, nesse caso, o homem seria apenas um produto das forças naturais supervisionadas por Deus; porquanto o homem está acima da natureza e não se explica a partir desta. A natureza não é o todo do universo, mas tão somente a base dele. ... O descanso de Deus não é a cessação de atividade, mas um novo exercício do poder". E Deus não é a "alma do universo". Esta expressão é panteísta e implica que Deus é tão somente o agente.
É uma coisa maravilhosa que a vida física continua. O bombeamento do sangue através do coração, quer durmamos, quer estejamos acordados, requer dispêndio de energia bem maior do que podemos avaliar. O músculo do coração nunca descansa a não ser entre as batidas. Todo o sangue do corpo passa pelo coração em cada meio minuto. A pressão do coração é maior do que a do punho. Os dois ventrículos do coração sustentam em média dez onças ou 5/8 de uma libra e este total é bombeado em cada batida.
Em setenta e duas por minuto, i.e. 2.700 libras por hora, e 64.000 onças ou 32,4 toneladas por dia. Enciclopédia Britânica, 11.554 - "O coração realiza cerca de 1/5 de todo o trabalho mecânico do corpo - o equivalente ao levantamento do seu próprio peso 13.000 pés (± 4.333 m) por hora. Só descansa em curtos momentos como se a sua ação fosse contínua. Deve ser necessariamente o mais antigo sofredor de qualquer improvidência quanto à nutrição e a este respeito a emoção mental é tão poderosa causa da bancarrota constitucional como o mais violento exercício muscular".
Antes da época da guilhotina na França, quando o criminoso era executado sentado em uma cadeira e decapitado ao golpe de uma afiada espada, um observador declarou que o sangue jorrava para cima a vários pés. Ainda esta grande força é tão ruidosamente exercida pelo coração, na maioria dos casos, que disso não temos consciência. A força em operação é o poder de Deus e a esse exercício do poder damos o nome de preservação. Crane, Religion of To-morrow, 130 - "Não ganhamos o pão porque Deus instituiu algumas leis para o crescimento do trigo ou para a ação de assar, deixando que as leis corram por si mesmas. Porém Deus, pessoalmente presente no trigo, o faz crescer e na massa o torna pão. Ele não faz a gravitação ou a coesão, mas elas são fases da sua ação presente. O Espírito é a realidade, a matéria e a lei são os modos da expressão dela. Assim, na redenção não é por operação de algum plano perfeito que Deus salva. Ele é o Deus imanente e todos os seus benefícios são apenas fases da sua pessoa e influência imediata".
Prova da Doutrina da Preservação
Da Escritura
Em numerosas passagens da Escritura a preservação distingue-se da criação. Apesar de que Deus descansou da obra da criação e estabeleceu uma ordem das forças naturais, declara-se que uma atividade divina especial e contínua se exerce no sustento do universo e de suas forças. Ademais, declara-se que esta atividade divina é a de Cristo; como ele é o agente mediador na criação, assim também o é na preservação.
Ne. 9.6 - "Só tu és Senhor, tu fizeste o céu, o céu dos céus e todo o seu exército, a terra e tudo quanto nela há, os mares e tudo quanto neles há e tu os guardas a todos"; Jó 7.20 - "Tu, ó vigia [rodapé > 'preservador'] dos homens!"; SI. 36.6 - "Tu, Senhor, preservas os homens e os animais";
SI. 104.29,30 - "tira-lhes a respiração, morrem e voltam ao próprio pó. Envias o teu Espírito e são criados e renovas a face da terra". Ver Perrowne sobre o SI. 104 - "Um salmo para o Deus que está na natureza e com ela para o próprio bem". Humboldt, Cosmos, 2.413 - "O SI. 104 apresenta uma imagem do cosmos inteiro". At. 17.28 - "nele vivemos, nos movemos e existimos";
Cl. 1.17- "nele subsistem todas as coisas"; Hb. 1.2,3- "sustentando todas as coisas pela palavra do seu poder"; Jo. 5.17- "meu Pai trabalha até agora e eu trabalho" - refere-se mais naturalmente à preservação, visto que a obra da criação já estava encerrada; cp. Gn. 2.2 - "no sétimo dia terminou Deus a sua obra que tinha feito e descansou no sétimo dia de toda obra que tinha feito". Deus é o sustentador de toda a vida física; ver SI. 66.8,9 - "Bendizei, povos, ao nosso Deus ... que sustenta com vida a nossa alma". Deus é também o sustentador da vida espiritual; ver 1 Tm. 6.13 - "Mando-te diante de Deus, que todas as coisas vivifica (Çcooyovo-úvtoç xà róv-ra) = o grande Preservador capacita-nos a persistir em nossa carreira cristã. Mt. 4.4 - "Nem só de pão viverá o homem, mas de toda a palavra que procede da boca de Deus" apesar de originariamente referir-se à alimentação física é igualmente verdadeiro sobre o sustento espiritual. No SI. 104.26 - "Ali passam os navios". Dawson,
Mod. Ideas of Evolution, é de parecer que não se faz referência às obras do homem, mas às de Deus como no paralelismo: "e o leviatã" indicaria "e os navios flutuantes como o náutilus que é um 'naviozinho' O SI. 104 é um longo hino ao poder preservador de Deus, que conserva vivas todas as criaturas, tanto pequenas como grandes.
Da Razão
Podemos argumentar a atuação preservadora de Deus com as seguintes considerações:
A matéria e a mente não são auto-existentes. Porque elas não têm a causa do seu ser em si mesmas sua continuação bem como sua origem podem dever-se a um poder superior.
Dorner, Glaubenslehre: "Se o mundo fosse auto-existente, seria um Deus e nenhuma religião seria possível. O mundo é receptivo a novas criações; mas estas, uma vez introduzidas, estão sujeitas, como as demais, à lei da preservação" - i.e. dependem da existência contínua de Deus.
Força implica em uma vontade da qual é a expressão direta ou indireta. Conhecemos a força somente através do exercício da nossa vontade. Porque a vontade é a causa única da qual temos conhecimento direto as causas secundárias na natureza são consideradas apenas como obras secundárias, regulares e automáticas da grande primeira Causa.
Martineau, Essays, 1.63,265 e Study, 1.244 - "As causas secundárias na natureza têm a mesma relação com a Causa Primária como o movimento automático dos músculos ao darem passos para a primeira decisão da vontade que iniciou a caminhada". Freqüentemente se objeta que não podemos identificar força e vontade porque, em muitos casos, o esforço da nossa von- \aàe é vráTuVrteTO por taYta àa torça nervosa e muscular. Mas isto só prova que a força não pode ser identificada com a vontade humana, e não que não possa ser identificada com a divina. Para a vontade divina não falta força alguma; em Deus vontade e força são a mesma coisa.
Adotamos, portanto, ponto de vista de Maine de Biran, de que a causa pertence só ao espírito. Porter, Human Intellect, 582-588, faz a seguinte objeção a este ponto de vista: "Isto implica, primeiro, que a concepção de uma causa material é autocontraditória. Mas a mente reconhece em si mesma energias espirituais que não são voluntárias; porque derivamos da vontade a nossa noção de causa, não se segue que a relação causai sempre envolve vontade; seguir-se-ia que o universo, até onde não é inteligente é impossível. Em segundo lugar, implica que há apenas um agente no universo e que os simples fenômenos da matéria e da mente são apenas manifestações de uma simples força - a do Criador". Respondemos a este raciocínio afirmando que nenhuma coisa morta pode agir e que aquilo que chamamos
energias espirituais involuntárias são, na verdade, atividades inconscientes ou esquecidas da vontade.
A partir do nosso atual ponto de vista criticaríamos, também, Hodge, Syste- matic Theology, 1.596 - "Porque temos a nossa idéia de força a partir da mente, não se segue que es... seja a única força. O fato de que a mente é uma causa não prova que a eletricidade não o possa ser. Se a matéria é força e nada mais que força, então a matéria não é nada e o mundo exterior é tão somente Deus. Apesar de tal argumento, o homem crerá que o mundo exterior é uma realidade - que a matéria é, e que ela é a causa dos efeitos que atribuímos à sua atuação". New Englander, set. 1883, 552 - "Nos tempos primitivos o homem empregava as causas secundárias, i.e., máquinas bem pequenas para cumprirem seus propósitos. Seu modo comum de ação era o uso direto das mãos ou da voz, e atribuía naturalmente aos deuses o mesmo método de que ele se valia. O próprio uso das causas secundárias conduziu o homem a mais elevadas concepções da ação divina". Dorner: "Se a palavra não tivesse nenhuma dependência, não refletiria Deus, nem a criação teria qualquer sentido". Mas tal independência não é absoluta. Apesar de que o homem vive, move-se e existe em Deus (At. 17.28), qualquer coisa material ou espiritual que tenha vindo a ser, só tem vida em Cristo (Jo. 1.3,4 "Todas as coisas foram feitas por intermédio dele e sem ele nada do que foi feito se fez. Nele estava a vida [rodapé >nada se fez. O que se fez era a vida nele.< RSV).
A Preservação é a vontade contínua de Deus. Bowne, Introdução à Psicologia, 305, fala de um tipo de vontade ao atacado. Agostinho: "Dei voluntas est rerum natura". Reitor Fairbairn: "A natureza é espírito". Tennyson, The Ancient Sage: "A força é das alturas". Lord Gifford, citado em Max Müller, Anthropological Religion, 392 - "A alma humana nem deriva de si mesma, nem subsiste por si mesma. Desvaneceria se não tivesse substância, e sua substância é Deus". Upton, Hibbert Lectures, 284,285 - A matéria é simplesmente o espírito em sua mais baixa forma de manifestação. A Causa absoluta deve ser o Eu mais profundo que achamos no cerne da nossa consciência própria. Através da autodiferenciação Deus cria tanto a matéria como a mente".
A soberania de Deus requer uma crença na sua atuação preservadora especial; porque esta soberania não seria absoluta se algo ocorresse ou existisse independente de sua vontade.
James Martineau, Seat ofAuthority, 29,30 - "Toda força cósmica é vontade.
... Esta identificação da natureza com a vontade de Deus seria panteísta só se mudássemos e identificássemos Deus com nada mais que a vida do universo. Porém nós não negamos a transcendência. As forças naturais são a vontade de Deus, mas esta é mais do que aquelas. Ele não eqüivale a tudo, mas à sua Mente diretiva. Deus não é a fúria do animal selvagem, nem o pecado do homem. Há coisas e seres que lhe são objetivos. ... Ele põe a sua força naquilo que é o outro ser além dele, e afasta-se do seu outro emprego através da antecipação do empenho relativo a um fim. Entretanto, ele é a fonte contínua e suprimento de força do sistema".
As forças naturais são as volições genéricas de Deus. Porém as vontades humanas, com seu poder alternativo, são o resultado da autolimitação de Deus, até mais do que o é a natureza, pois as vontades humanas nem sempre obedecem à vontade divina; podem até opor-se a ela. Na vontade está o Infinito, não só como imanente, mas também como transcendente e, no caso do pecado, tanto opondo-se ao pecador como punindo-o. Esta contínua vontade de Deus tem sua analogia em nossa vontade subconsciente. J. M. Whiton, no Am. Jour. Theol., 1901.320 - "Quando andamos, a nossa própria vontade desenvolve uma volição separada para cada passo, mas depende da ação automática dos centros nervosos inferiores, que ela não só movimenta como mantém a sua operação. Assim a Vontade divina não opera em inúmeros atos isolados da volição". A. R. Walllace: "O universo inteiro não só depende da vontade das inteligências mais elevadas, ou de uma suprema Inteligência, mas, na verdade, é umas e a outra. ... A livre vontade do homem é apenas uma artéria maior na corrente controladora da Vontade universal, cujo fluxo de duração evolutiva constitui a auto-revelação do Infinito". Esta declaração de Wallace une a vontade finita de forma muito mais completa à vontade de Deus. Isto é verdade com relação à natureza e com todos os santos, mas não é verdade a respeito do ímpio. Sem dúvida Deus mantém a existência deles, mas o mesmo Deus se opõe à sua conduta. A preservação deixa lugar para a liberdade humana, para a responsabilidade, para o pecado e para a culpa.
Portanto, todas as forças naturais e todos os seres pessoais testemunham que a vontade de Deus originou estes e aquelas que ele sustenta continuamente. O universo físico, na verdade, em nenhum sentido independe de Deus, pois suas forças são apenas a vontade constante de Deus e suas leis são apenas os hábitos de Deus. Só na vontade livre dos seres inteligentes Deus separou de si qualquer porção da força e a fez capaz de contradizer a sua santa vontade. Mas mesmo aos agentes livres Deus não deixa de dar apoio. A doutrina da preservação, portanto, mantém uma base média entre dois extremos. Ela sustenta que os seres pessoais finitos têm existência real e independência relativa. Por outro lado, sustenta que estas pessoas retêm o seu ser e forças só quando sustentadas por Deus.
Deus é a alma, mas não a soma, das coisas. O cristianismo defende a transcendência de Deus bem como a sua imanência. A imanência sozinha é o aprisionamento de Deus como a transcendência sozinha é o seu banimento. Gore, Encarnação, 136 sgs - A teologia cristã é a harmonia do panteísmo com o deísmo". Sustenta a transcendência e desse modo tem todo o bem do panteísmo sem suas limitações. Sustenta a imanência e desse modo tem todo o bem do deísmo sem a sua incapacidade de mostrar como Deus poderia ser bendito sem a criação. Diman, Theistic Argument, 367 - "A teoria dinâmica da natureza como um organismo plasmável permeado por um sistema de forças que unem por fim em uma Força suprema harmoniza-se mais com o espírito e ensino do Evangelho do que com as concepções mecânicas que prevaleciam há um século e que insistiam em ver a natureza como uma complicada máquina feita por um grande Artífice que está totalmente separado dela". A doutrina da preservação apresenta um Deus tanto na natureza como além dela. Conforme se considera um ou outro elemento, temos o erro do Deísmo, ou o da Criação contínua - teorias que ora passamos a considerar.
TEORIAS QUE VIRTUALMENTE NEGAM A DOUTRINA DA PRESERVAÇÃO
Deísmo
Este ponto de vista representa o universo como um mecanismo auto-sus- tentado do qual Deus afastou-se tão logo o criou e que o abandonou a um processo de auto-desenvolvimento. Defenderam-no nos séculos dezessete e dezoito os ingleses Herbert, Collins, Tindal e Bolingbroke.
Lord Herbert of Cherbury foi um dos primeiros a sistematizar o deísmo. Seu Livro De Veritateio\ publicado em 1624. Ele argumenta contra a probabilidade da revelação da vontade de Deus a apenas uma parte da terra. A isto ele chama de "religião particular". Contudo, buscou e, segundo o seu próprio relato, recebeu uma revelação do céu estimulando a publicação de sua obra que se opunha à revelação. "Pediu um sinal" e veio a resposta através de "um alto embora bondoso ruído vindo dos céus". Teve a vaidade de pensar que o seu livro era de tal importância à causa da verdade como à exortação à declaração da vontade divina, quando os interesses da metade da humanidade não garantiam nenhuma revelação; o que Deus não faria por uma nação, faria por um indivíduo. O Deísmo é o exagero da verdade sobre a transcendência de Deus. Melanchthon ilustra com o fabricante de navios: "Ut faber discedit a navi exstructa et relinquit eam nautis". Deus é o criador, não o guardador, do vigia. Em Sartor Resartus, Carlyle faz Teufelsdrõckh falar de "um Deus ausente, sempre sentado ocioso desde o primeiro Sábado fora do universo, e vendo-o vagar".
"O Deísmo dava ênfase à inviolabilidade da lei natural e defendia um ponto de vista mecânico do mundo (Ten Broeke). O seu Deus é um tipo de Brama hindu, "tão ocioso como a pintura de um navio na de um oceano" - mero ser apático e imóvel. Bruce, Apologetics, 115-131 - "Deus fez o mundo tão bom no princípio que o melhor que podia fazer é deixá-lo. É inadmissível a oração.
O Deísmo implica um ponto de vista pelagiano da natureza humana. A morte nos redime separando-nos do corpo. Há uma imortalidade natural, mas não há ressurreição. Lord Herbert de Cherbury, irmão do poeta George Herbert de Bemerton representa o nascimento do Deísmo; Lord Bolingbroke seu declínio. Blount atacava a Pessoa divina do fundador da fé; Collins sua base na profecia; Woolston sua comprovação miraculosa; Toland sua literatura canônica. Tyndal apoiava-se em uma base mais geral e procurava mostrar que era desnecessário buscar uma revelação especial, impossível de ser comprovada, e a religião da natureza é suficiente e superior a todas religiões de instituição positiva".
A este ponto de vista objetamos:
Apóia-se em uma falsa analogia. - O homem é capaz de construir um relógio que se move por si mesmo tão somente porque ele emprega forças preexistentes tais como a gravidade, a elasticidade, a coesão. Mas em uma teoria que assemelha o universo a uma máquina tais forças são aquelas com as quais as próprias coisas contam.
O Deísmo considera o universo como um "movimento perpétuo". Os pontos de vista modernos da dissipação da energia têm servido para desacreditá-lo. A vontade é a única explicação das forças da natureza. Mas segundo o deísmo, Deus constrói uma casa, fecha-se do lado de fora, tranca a porta e amarra suas próprias mãos para estar certo de nunca usar a chave. John Caird, Fund. Ideas of Christianity, 114-138 - "Uma mente feita, uma natureza espiritual criada por uma onipotência exterior é uma noção impossível e autocontraditória. ... O inventor humano ou o artista trata da matéria preparada para a sua mão. O deísmo reduz Deus a uma personalidade antropomórfica finita, do mesmo modo que o panteísmo anula o mundo finito ou absorve-o no Infinito". Por isso Spinoza, o panteísta, foi o grande opositor do deísmo do século XVI.
É um sistema de antropomorfismo, conquanto professa excluir o antro- pomorfismo. - Porque o sustento de todas as coisas envolveria uma multiplicidade de cuidados minúsculos se o homem fosse o agente, concebe o sustento do universo como que envolvendo tais pesos no caso de Deus. Assim poupa a dignidade de Deus negando virtualmente sua onipresença, sua onisciência e sua onipotência.
A infinitude de Deus torna em fontes de prazer tudo o que seria preocupação para o homem. Para a inexaurível plenitude de Deus sobre a vida não há ônus que envolva o sustento do universo que ele criou. Contudo, porque Deus é observador perpétuo podemos alterar o verso do poeta e dizer: "Não há flor que nasça para enrubescer o invisível e destruir sua doçura no ar deserto". Deus não expõe seus filhos tão logo eles nascem. Eles não são apenas prole; eles também vivem, movem-se e existem nele e são participantes da natureza divina. Gordon, Chirst of To day, 200 "A pior pessoa em toda a história é algo para Deus, ainda que seja nada para o mundo".
Ela não pode ser sustentada sem negar toda a interferência providencial na história da criação e na subseqüente história do mundo. - Mas a introdução da vida, a criação do homem, a encarnação, a regeneração, a comunhão das criaturas inteligentes com um Deus presente e as interposições de Deus na história secular são fatos.
Portanto, o deísmo tende para o ateísmo. Upton, Hibbert Lectures, 287 - "O defeito de deísmo é que, do lado humano, trata todos os homens como indivíduos isolados, esquecendo-se da natureza divina imanente que os interrelaciona e, até certo, ponto os unifica; e que, do lado divino, separa de
Deus os homens e toma a relação entre eles puramente exterior". Ruskin:
"A mente divina é tão visível em sua plena energia operacional em cada plataforma inferior e na moldagem da pedra como o levantamento das colunas do céu e a fixação dos alicerces da terra; e para mente perceptiva correta manifestam-se a mesma majestade, o mesmo poder, a mesma unidade e a mesma perfeição no lançamento do barro como na disseminação das nuvens, na moldagem do pó como no acender a estrela diurna".
Criação contínua
Este ponto de vista considera o universo de momento a momento o resultado de uma nova criação. Sustentam-no os teólogos Edwards, Hopkins e
Emmons e, mais recentemente, na Alemanha, Rothe.
Edwards, Works, 2.486-490, cita e defende a afirmação do Dr. Taylor: "Deus é a origem de todo o ser e a causa única de todos efeitos naturais".
O próprio Edwards diz: "A manutenção que Deus faz da substância criada ou a causa da existência desta em cada momento sucessivo é o equivalente a uma produção imediata a partir do nada a cada momento". Ele argumenta que a existência passada de uma coisa não pode ser a causa da sua existência presente porque uma coisa não pode agir no tempo e lugar onde não está. "Isto eqüivale a dizer que Deus não pode produzir um efeito que dure por um momento além do exercício direto do seu poder criador. Parece que o que o homem pode fazer Deus não pode" (A. S. Carman). Hopkins, Works, 1.161-167 -A preservação "é, na realidade, a criação contínua". Emmons, Works, 4.363389, esp. 381 - "Porque todos os homens são agentes dependentes, todos os seus movimentos, exercícios ou ações devem ter origem em uma eficácia divina". 2.683 - Há apenas uma verdadeira e satisfatória resposta à pergunta que tem agitado por séculos: 'De onde veio o mal?' ei-la: Veio da primeira grande Causa de todas as coisas. ... É consistente com a retidão moral da Divindade produzir exercícios pecaminosos ou santos nas mentes dos homens.
Ele desenvolve uma influência positiva que faz os poderes morais agirem, em cada circunstância da sua conduta como lhe apraz". Portanto, Deus cria todas as volições da alma, quando opera com sua força onipotente todas as mudanças do mundo material. Rothe defende também este ponto de vista.
Na mente dele a expressão exterior é necessária para Deus. Sua máxima é: "Kein Gott, ohne Welt" - "Sem Deus não há mundo".
O elemento de verdade na criação contínua é o fato de admitir que toda força é vontade. Seu erro é sustentar que toda força é vontade divina, e esta no exercício direto. Mas a vontade humana é tanto uma força como a vontade divina e as forças da natureza não são obras primárias e imediatas de Deus, mas secundárias e automáticas. Estas notas podem capacitar-nos a avaliar o contexto de verdade nas seguintes afirmações que necessitam importante qualificação e limitação. Bowne, Philosophy of Theism, 202, compara o universo à nota musical que só existe na condição de ser incessantemente reproduzida. Herbert Spencer diz que "as idéias são como as cordas e cadências produzidas pelo piano, que sucessivamente desaparecem quando as outras são produzidas". Maudsley, Physiology of Mind, cita esta passagem, mas, bem pertinente, pergunta: "O que pensar do executante, no caso do piano e no caso do cérebro, respectivamente? No cérebro, onde se acha o equivalente às concepções harmônicas na mente do executante?" Prof. Fitzgerald: "Toda natureza é pensamento vivo - a linguagem de Alguém em quem vivemos, nos movemos e existimos". Dr. Oliver Lodge, na Associação Britânica em 1891: "A barreira entre a matéria e a mente pode desaparecer como tem acontecido tantas vezes".
A isto objetamos nas seguintes bases:
Contradiz o testemunho da consciência de que a atividade regular e executiva não é a simples repetição de uma decisão inicial, mas o exercício da vontade inteiramente diferente em gênero.
Ladd, em sua Philosophy of Mind, 144, indica o erro na criação contínua da seguinte maneira: "Todo o mundo das coisas momentaneamente se extingue e é substituído por um mundo semelhante de realidades verdadeiramente novas". As palavras do poeta seriam então literalmente verdadeiras: "Cada nova e vigorosa criação, Divina improvisação, Do coração de Deus procede". Seth, Hegelianism e Personality, 60, diz isto a Fichte, "o mundo foi perpetuamente recriado em cada espírito finito, - e a revelação à inteligência é o único sentido admissível do termo assaz abusado, criação".
A. L. Moore, Science and the Faith, 184,185 - "A teoria da intervenção ocasional implica, como correlata, a teoria da ausência comum. ... Para os cristãos os fatos da natureza são atos de Deus. A religião relaciona estes fatos com a autoria divina; a ciência os relaciona com partes de uma ordem visível reciprocamente. A religião não fala desta interrelação; a ciência não fala da sua relação com Deus".
A criação contínua é uma teoria errônea porque aplica às vontades humanas um princípio que é verdadeiro só com relação à natureza irracional e que só em parte é verdadeiro. Sei que eu não sou Deus em ação. A minha vontade é prova de que toda força é vontade divina. Mesmo no ponto de vista monístico, contudo, podemos falar de causas secundárias na natureza, visto que a ação regular e habitual de Deus é uma coisa secundária e subseqüente, enquanto seu ato de iniciação e organização é primária. Nem o universo, nem qualquer parte dele deve ser identificado com Deus, nem mesmo os meus pensamentos e atos devem ser identificados comigo. Martineau, Nineteenth Century, abril, 1895.559 - "O que é a natureza senão a promessa hipotecada de Deus e causalidade habitual? E o que é o espírito senão a província de sua livre causalidade correspondendo às necessidades e afeições de seus filhos livres? ... Deus não é um arquiteto aposentado que, de quando em quando pode ser chamado para fazer reparos. A natureza não é por si mesma ativa e a atuação de Deus não é intromissão". Wiliiam Watson, Poems, 88 - "Se a natureza for um fantasma, como tu dizes, Uma esplêndida ficção e um sonho prodigioso, Não me apressarei a alcançar o real e verdadeiro, Mais do que contentar-me com os mundos que só aparentam".
Exagera o poder de Deus só sacrificando a sua verdade, seu amor e sua santidade; - pois se as personalidades finitas não são o que parecem - a saber, existências objetivas - impugna-se a veracidade de Deus: se a alma humana não tem nenhuma liberdade e vida real, o amor de Deus não tem nenhuma autocomunicação com as criaturas; se a vontade de Deus é a única força no universo, não se pode mais declarar a santidade de Deus, pois deve-se considerar a vontade divina nesse caso como autora do pecado humano.
Com base neste ponto de vista a identidade pessoal é inexplicável. Edwards baseia a identidade no decreto arbitrário de Deus. Portanto, Deus pode decretar, fazer a posteridade de Adão unida ao seu primeiro pai e responsável pelo seu pecado. A teoria da criação contínua de Edwards, na verdade, foi vista como uma explicação do problema da origem do pecado original. A união dos atos e exercícios com Adão divinamente indicada foi considerada suficiente sem a união substancial ou geração natural da parte dele para explicar o fato de que nascemos corruptos e culpados. Este ponto de vista teria sido impossível se Edwards não tivesse sido um idealista praticando muito mais de atos e exercícios e muito menos de substância.
É difícil explicar a origem do idealismo de Jonathan Edwards. Às vezes tem-se atribuído à leitura de Berkeley. Dr. Samuel Johnson, mais tarde Presidente do King's College na cidade de Nova Iorque, amigo pessoal do Bispo Berkeley e ardente seguidor do seu ensino, foi tutor no Yale College enquanto Edwards estava em Weathersfield e Johnson permanecia em New Haven, e estava entre os desafetos de Johnson como tutor. Contudo, Edwards, em Original Sin, 479, parece fazer referência à filosofia de Berkeley quando diz:
"O curso da natureza é demonstrado por recentes desenvolvimentos na filosofia, na verdade ... nada além da ordem estabelecida e operação do Autor da natureza". O Presidente McCracken, Philos. Ver., jan., 1892.26-42, sustenta que a Clavis Universalis de Arthur Collier é a fonte do idealismo de Edwards. É mais provável que seu idealismo fosse resultante de seu próprio pensamento independente, talvez ocasionado por simples sugestões a partir de Locke, Newton, Cudworth e Norris, cujos escritos ele conhecia.
Em que consistia este idealismo integral de Edwards pode-se depreender do Discurso de Noah Porter sobre o Bispo George Berkeley, 71 e citações no Joun. Spec. Philos., outubro 1883.401-420 - "Nada mais a não ser o fato de que tem um ser próprio além do que os espíritos e os corpos são apenas a sombra do ser. ... Vendo que o cérebro apenas existe mentalmente, reconheço que falo de modo inadequado quando digo que a alma apenas concentra no cérebro as suas operações. Pois, falando ainda mais estritamente e de modo mais abstrato, ele é apenas a conexão da alma com estas e os modos de suas próprias idéias ou os atos mentais da divindade, que vê que o cérebro existe só na idéia. ... O que, na verdade, é a substância de todos os corpos é a idéia infinitamente exata e precisa e perfeitamente estável na mente de Deus, juntamente com sua vontade estável que a mesma será gradualmente comunicada a nós e a outras mentes conforme certos métodos e leis fixos e estabelecidos; ou, em linguagem um tanto diferente, a idéia divina infinitamente exata e precisa, com uma vontade responsável, perfeitamente exata, precisa e estável relativa às comunicações correspondentes às mentes criadas e os efeitos sobre tais mentes".
Como o deísmo tende para o ateísmo assim a doutrina da criação contínua tende para o panteísmo. - Argumentando que, porque derivamos nossa noção de força da ação da nossa vontade, portanto, toda a força deve ser vontade e a vontade divina compele a vontade humana a unir-se a esta toda abrangente vontade de Deus. A mente e a matéria de igual modo tomam-se fenômenos de uma força que têm os atributos de ambas; e com a existência distinta e personalidade da alma humana, perdemos a existência distinta e personalidade de Deus assim como a liberdade e responsabilidade do homem.
Lotze tenta escapar das causas materiais e ainda defender as causas secundárias dando a entender que tais causas secundárias podem ser espíritos. Porém, mesmo podendo ver como pode existir um tipo de espírito no irracional e no vegetal, é difícil ver como o que chamamos de matéria insensata pode ter espírito. Deve ser um tipo bem peculiar de espírito - e tal caso não ajudaria o nosso raciocínio. Com base nesta teoria, o corpo de um cão necessita de ser muito mais dotado que a sua alma. James Seth, Phiios. Rev., jan. 1894.73 - "Este princípio de unidade é uma verdadeira cova de leões; todos os rastos apontam para a mesma dire ão. Ou se trata de uma árida unidade - Um anula muitos; ou é tão somente o Todo; a totalidade existencial desunificada". Bem assinala Dorner que "preservar não é fazer a criatura existir, mas é conceder-lhe poderes e conservar a sua atividade".
NOTAS SOBRE A PARCERIA DIVINA
A eficácia divina interpenetra à do homem sem destruí-la ou absorvê-la. O influxo da energia sustentadora de Deus é tal que os homens retêm suas faculdades e poderes. Deus não opera tudo, mas em todos.
Preservação é, pois, o meio caminho entre os dois erros: a negação da causa primária (deísmo ou ateísmo) e a negação das causas secundárias (criação contínua ou panteísmo). 1 Co. 12.6 - "Há diversidade de operações, mas é o mesmo Deus que opera tudo em todos", cf. Ef. 1.23 - "que é o seu corpo, a plenitude daquele que cumpre tudo em todos". A ação de Deus não é adio in distans, ou ação onde ele não está. Em lugar disso é ação nos agentes livres e através deles, no caso dos seres inteligentes e morais, conquanto dependa de sua própria vontade contínua no caso da natureza.
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opera através destas causas secundárias humanas, mas não as substitui. Não podemos ver a linha entre as duas - a ação das causas primárias e a das secundárias; embora ambas sejam reais cada uma é distinta da outra apesar
de que o método da participação de Deus é inescrutável. Como a pena e a mão produzem juntas a escrita, assim a obra de Deus faz as forças naturais operarem com ele. O crescimento natural indicado nas palavras "cuja semente esteja nela" (Gn. 1.11) tem sua contrapartida no crescimento espiritual contido nas palavras "a sua semente permanece nele" (1 Jo. 3.9). Paulo se considera um agente reprodutor nas mãos de Deus: ele gerou filhos no evangelho: "eu, pelo evangelho, vos gerei" (1 Co. 4.15); o Novo Testamento fala desta ação de gerar como uma obra de Deus: "Bendito seja Deus ... que ... nos regenerou..." (1 Pe. 1.3). Recebemos a ordem de operar a nossa salvação com temor e tremor apoiados no fato de que é Deus quem opera em nós tanto o querer como o efetuar (Fp. 2.12,13).
Apesar de que Deus preserva a mente e o corpo na obra deles, devemos lembrar sempre que Deus concorre com os atos maus de suas criaturas somente quando são atos naturais e não quando são um mal.
Na santa ação Deus concede as forças naturais e através da sua palavra e Espírito influencia a alma no uso correto de tais forças. Porém na ação má Deus somente concede as forças naturais; a má direção destas forças é causada só pelo homem. Jr. 44.4 - "Ora, não façais esta coisa abominável que aborreço"; Hc. 1.13 - "Tu és tão puro de olhos, que não podes ver o mal e a opressão não podes contemplar; por que, pois, olhas para os que procedem aleivosamente e te calas quando o ímpio devora aquele que é mais justo do que ele?" Tg. 1.13,14 - "Ninguém, sendo tentado, diga: de Deus sou tentado; porque Deus não pode ser tentado pelo mal e a ninguém tenta. Mas cada um é tentado, quando atraído e engodado pela sua própria concupiscência". Aarão desculpou-se por ter feito um ídolo egípcio, dizendo que o fogo o tinha feito; ele pediu ouro ao povo; "eles me deram, e lancei-o no fogo, e saiu este bezerro" (Ex. 32.24). Aarão omite um importante ponto - sua atuação pessoal em tudo. Do mesmo modo lançamos na natureza e em Deus a culpa dos nossos pecados. Pyn disse de Strafford que Deus lhe dera grandes talentos de que o Diabo fizera aplicação. Porém, é mais correto dizer que é o próprio ímpio que se vale dos poderes que Deus deu. Nós somos os carros elétricos para os quais Deus fornece a energia motriz, mas nós, os condutores, é que lhe damos a direção. Nós somos órgãos; mas o vento ou sopro do órgão é de Deus; entretanto, cabe a nós dedilhar as teclas. Visto que o fabricante do órgão também está presente em cada momento como seu preservador, o vergonhoso abuso do seu instrumento e a terrível música executada são um contínuo pesar e sofrimento da sua alma. Porque é Cristo que sustenta todas as coisas pela palavra do seu poder, a preservação envolve o seu sofrimento e esta é a expiação cujo clímax e demonstração se vêem na cruz do Calvário (Hb. 1.3).
SEÇÃO III - PROVIDÊNCIA
DEFINIÇÃO DE PROVIDÊNCIA
É a atuação contínua de Deus pela qual ele faz todos os eventos do universo físico e moral cumprirem o desígnio para o qual ele o criou.
Como a criação explica a existência do universo e como a Preservação explica sua continuação, assim a Providência explica sua evolução e progresso. Em explicação note:
A Providência não deve ser tomada simplesmente no sentido de prever. É prever também ou é uma atuação positiva em conexão com todos os eventos da história.
Deve-se distinguir providência de preservação. Enquanto a preservação é a manutenção da existência e dos poderes das coisas criadas, providência é um verdadeiro cuidado e controle delas.
Porque o plano original de Deus é todo abrangente a providência que executa o plano também o é abarcando em seu escopo coisas pequenas e grandes e exercendo cuidado sobre indivíduos assim como sobre classes.
Com relação aos atos bons dos homens, a providência abrange todas as influências naturais da hereditariedade e do meio que preparam o homem para a operação da palavra de Deus e do Espírito e que constituem motivos para a obediência.
Com relação aos atos maus dos homens, a providência nunca é causa eficiente do pecado, obstante, permissiva, diretiva e determinativa.
Porque Cristo é o único revelador de Deus e o mediador de toda a atividade divina a providência deve ser considerada a obra de Cristo; ver 1 Co. 8.6
"um só Senhor, Jesus Cristo, por quem são todas as coisas"; c/João 5.17 - "meu Pai trabalha até agora e eu trabalho também".
Os alemães têm em seu vocabulário a palavra Fürsehung, providência e a palavra Vorsehung, previsão, visão antecipada. A nossa palavra 'providência' abrange ambos os sentidos destas palavras.
Providência é a atenção de Deus concentrada em toda a parte. Seu cuidado é tanto microscópico como telescópico. Robert Browning, Pippa Passos, ad finem: "Todo o trabalho é o mesmo para com Deus - Para com Deus, cujas marionetes, de melhor ou pior forma, somos nós: não há último nem primeiro". Canon Farrar: "Em um capítulo do Alcorão acha-se a história de como Gabriel, quando aguardado junto aos portais de ouro, foi enviado por Deus à terra para fazer duas coisas. Uma era impedir Salomão do pecado de esquecer a hora de orar em exultação por seus cavalos reais; a outra ajudar, na subida do Ararat, uma formiguinha amarela, que se tornara cada vez mais cansada no trabalho de levar alimento para o seu olheiro e que, sem o auxílio, pereceria na chuva. Para Gabriel aquela ordem parecia tão real como a outra porque a ordem partia de Deus. 'Silenciosamente ele partiu da Presença e impediu que o rei pecasse. E ajudou a formiguinha a entrar'. 'Nada é demasiado elevado ou humilhante; demasiado fraco ou poderoso, desde que seja da vontade de Deus"'. Um pregador começou o seu sermão sobre Mt. 10.30 - "Até os cabelos da vossa cabeça estão todos contados" - dizendo: "Porque alguns de vós, meus ouvintes, não credes que até mesmo as vossas cabeças estão contadas!"
Os problemas do tratamento providencial de Deus só são inteligíveis quando consideramos que Cristo é o revelador de Deus e que o seu sofrimento pelo pecado abre-nos o coração de Deus. A história toda é a manifestação progressiva da santidade e do amor de Cristo e na cruz temos a chave que destrava o segredo do universo. Focalizando a cruz, cremos que o Amor dirige tudo e que "todas as coisas colaboram para o bem daqueles que amam a Deus" (Rm. 8.28).
PROVA DA DOUTRINA DA PROVIDÊNCIA
Prova escriturística
A Escritura testemunha
Um governo geral providencial e controle a) sobre o universo todo;
sobre o mundo físico; c) sobre a criação irracional; d) sobre os negócios das nações; e) sobre o nascimento e destino da vida do homem;/) sobre os sucessos exteriores e derrotas na vida dos homens; g) sobre as coisas aparentemente acidentais ou insignificantes; h) na proteção dos justos; i) no suprimento das necessidades do povo de Deus;/) nas respostas às orações; k) na exposição e punição dos ímpios.
SI. 103.19 - "O seu reino domina sobre tudo"; Dn. 4.35 - "segundo a sua vontade ele opera com o exército do céu e os moradores da terra";
Ef. 1.11 - "faz todas as coisas segundo o conselho da sua vontade".
Jó 37.5,10 - "Deus troveja. ... pelo assopro de Deus se dá a geada";
SI. 104.14 - "Faz crescer a erva para os animais"; 135.6,7 - "Tudo o que o Senhor quis, ele fez, nos céus e na terra, nos mares e em todos os abismos.
... vapores.... relâmpagos.... ventos"; Mt. 5.45 - "faz que o seu sol se levante.
... e a chuva desça"; SI. 104.16 - "Satisfazem-se as árvores do Senhor = são plantadas e guardadas por Deus de modo tão cuidadoso como os que estão sob o cultivo humano; cf. Mt. 6.30 - "se assim o Senhor veste a erva do campo".
SI. 104.21,28 - "os leõezinhos bramam ... de Deus buscam o seu sustento ... dando-lho tu, eles recolhem"; Mt. 6.26 - "as aves dos céus, vosso Pai celestial as alimenta"; 10.29 - "dois pardais ... nenhum deles cairá em terra sem a vontade de vosso Pai".
Jó 12.23 - "Multiplica os povos e os faz perecer; dispersa as nações e de novo as conduz"; SI. 22.28 - "o reino é do Senhor, e ele domina entre as nações"; 66.7 - "Ele domina eternamente pelo seu poder; os seus olhos estão sobre as nações"; At. 17.26 - "de um fez toda a geração dos homens para habitar sobre toda a face da terra, determinando os tempos já dantes ordenados e os limites da sua habitação".
1 Sm. 16.1 - "enche o teu vaso de azeite e vem; enviar-te-ei a Jessé, o belemita; porque dentre os seus filhos me tenho provido de um rei"; SI. 139.16
"Os teus olhos viram o meu corpo ainda informe, e no teu livro todas estas coisas foram escritas"; Is. 45.5 - "eu te cingirei, ainda que tu não me conheças"; Jr. 1.5 - "Antes que eu te formasse no ventre, eu te conheci ... eu te santifiquei... e te dei por profeta"; Gl. 1.15,16 - "aprouve a Deus, que desde o ventre de minha mãe me separou e me chamou pela sua graça, revelar seu Filho em mim para que o pregas-se entre os gentios".
SI. 75.6,7 - "nem do Oriente, nem do Ocidente, nem do deserto vem a exaltação. Mas Deus é o juiz; a um abate e a outro exalta"; Lc. 1.52 - "depôs dos tronos os poderosos e elevou os humildes".
Pv. 16.33 - "A sorte se lança no regaço, mas do Senhor procede toda a sua disposição"; Mt. 10.30 - "até mesmo os cabelos da vossa cabeça estão todos contados".
SI. 4.8 - "Em paz também me deitarei e dormirei, porque só tu, Senhor, me fazes habitar em segurança"; 5.12 - "circundá-lo-ás da tua benevolência como de escudo"; 63.8 - "a tua destra me sustenta"; 121.3 - "aquele que te guarda não tosquenejará"; Rm. 8.28 - "todas as coisas contribuem juntamente para o bem dos que amam a Deus".
í) Gn. 22.8,14 - "Deus proverá para si o cordeiro ... Yahweh jiré (o Senhor proverá)"; Dt. 8.3 - "o homem não viverá só de pão, mas de tudo o que sai da boca do Senhor viverá o homem"; Fp. 4.19 - "O meu Deus suprirá todas as vossas necessidades".
D SI. 68.10 - "tu, ó Deus, proveste o pobre da tua bondade"; Is. 64.4 - "nem com os olhos se viu um Deus além de ti, que trabalhe para aquele que nele espera"; Mt. 6.8 - "vosso Pai sabe o que vos é necessário antes de vós lho pedirdes"; 32.,33 - "todas essas coisas vos serão acrescentadas".
k) SI. 7.12,13 - "Se o homem se não converter, Deus afiará a sua espada; já tem armado o seu arco e está aparelhado; e já preparou para ele armas mortais; e porá em ação as suas setas inflamadas"; 11.6 - "Sobre os ímpios fará chover laços, fogo, enxofre e vento tempestuoso; eis a porção do seu copo".
Recentes estudos de fisiografia confirmam notavelmente as afirmações da Escritura a respeito da providência de Deus. Nos estágios antigos do seu desenvolvimento o homem vivia quase totalmente sujeito à natureza, e o ambiente era o fator determinante no seu progresso. Aqui está o elemento de verdade no ponto de vista de Buckle. Mas ele ignorava o fato de que, à medida que a civilização avançava, as idéias, pelo menos esporadicamente, exerciam um papel de maior destaque no ambiente. O Desfiladeiro das Termópilas não pode ser explicado pelo clima. Em estágios mais tardios do desenvolvimento humano, a natureza, em grande parte está sujeita ao homem e o ambiente conta relativamente pouco. "Não haverá Alpes"! diz Napoleão.
Charles Kingsley: "O espírito da tragédia antiga era o homem vencido pelas circunstâncias". Contudo, muitas caraterísticas nacionais podem ser atribuídas a circunstâncias físicas e, quando é este o caso, elas se devem à providência de Deus. A necessidade que o homem tem de água fresca o leva aos rios; daí a localização original de Londres. O comércio requer portos marítimos; daí a localização de Nova Iorque. A necessidade de defesa leva o homem aos abrigos e às montanhas; daí a localização de Jerusalém, Atenas, Roma, Edimburgo. Estes lugares de defesa tornaram-se também lugares de adoração e de apelo para Deus.
Goldwin Smith, em suas Lectures and Essays, sustenta que as caraterísticas nacionais não são congênitas, mas resultam do ambiente. A grandeza de Roma e a da Inglaterra deveram-se à sua posição. Os romanos deveram o seu sucesso ao fato de serem, a princípio, menos afeitos à guerra do que os seus vizinhos. Eles eram comerciantes no centro da costa marítima e tiveram de depender da disciplina para enfrentar os saqueadores nas montanhas que os cercavam. Só quando se lançaram à conquista de outras terras a ascendência no espírito militar tornou-se completa e, a partir de então, o espírito militar trouxe o despotismo como a sua pena natural. Em contato com as variadas raças, Roma foi induzida à fundação de colônias. Adotou e assimilou as nações conquistadas e, govemando-as, aprendeu a organização e a lei. A regra era parcere subjetis, como também debellare superbos. Semelhantemente Goldwin Smith sustenta que a grandeza da Inglaterra deveu-se à sua localização. Por ser uma ilha, somente sendo uma raça ousada e empreendedora poderia estabelecer-se. A migração marítima reforçou a liberdade. A localização insular livrou-a da invasão. Contudo, o isolamento tornou-a arrogante e confiante em si mesma. Tornou-se um natural centro de comércio. Há uma firmeza no progresso político que teria sido impossível no continente. Contudo, a sua consolidação foi tardia, porque a Grã Bretanha compreende diversas ilhas. A Escócia era a mais liberal; a Irlanda estava fadada à sujeição.
Isaac Taylor, Spirit of Hebrew Poetry, tem um valioso capítulo sobre a Palestina como o teatro providencial da revelação divina. Pequena terra, mas um exemplo para todas terras e uma estrada que liga as maiores da antigüidade, ela foi preparada por Deus para receber e comunicar a sua verdade. A Geografia Histórica da Terra Santa de George Adam Smith é um repertório de informações sobre o assunto. Stanley, Life and Letters, 1.270-271, trata da paisagem e da história da Grécia. Shaler, interpretation of Nature, vê tal diferença entre a curiosidade grega e a investigação das causas, por um lado e, por outro a indiferença dos romanos para com a explicação científica dos fatos, que não pode pensar nos romanos e nos gregos como povos cognatos. Ele crê que a Itália foi, a princípio povoada pelos etruscos, raça semítica da África, e que os romanos descendiam deles. Os romanos tinham tão pouco do espírito naturalista como os hebreus. Os judeus e os romanos originaram e propagaram o cristianismo, mas não tinham nenhum interesse em ciências.
Sobre a preparação do arranjo de Deus no que tange às condições físicas da vida nacional, podem ser encontradas marcantes sugestões em Shaler, Nature and Man in America. Um exemplo da colonização da Baía de Massa- chusetts entre 1689 e 1639, única década em que podiam ser encontrados
homens como John Winthrop e a única em que eles verdadeiramente emigraram da Inglaterra. Depois de 1639 muita coisa tinha de ser feita na terra e, com Carlos II, o espírito que animou os peregrinos já não mais existia na Inglaterra. Os colonizadores edificaram o melhor que puderam, pois, apesar de que eles buscavam um lugar para adorar a Deus, não tinham a mínima idéia de transmitir esta mesma liberdade religiosa a outros. R. E. Thompson,
The Hand of God in American, sustenta que a República Americana por muito tempo ter-se-ia despedaçado por causa do seu peso e dimensão se a invenção do navio a vapor em 1807, da locomotiva em 1829, do telégrafo em 1837, do telefone em 1877, não delimitassem as partes remotas do país. Uma mulher inventou a colheitadeira, combinando a ação de um conjunto de tesouras de corte. Isto aconteceu em 1835. Só em 1855 é que a competição da fazenda do Imperador em Compeiègne deu supremacia à colheitadeira. Sem ela a agricultura teria sido impossível durante a nossa guerra civil, quando os nossos homens estavam no campo e as mulheres e os meninos tinham que ajuntar a safra.
Um governo e controle extensivo às ações livres dos homens - ci) aos atos livres dos homens em geral; b) aos atos pecaminosos dos homens também.
Ex. 12.36 - "O Senhor deu graça ao seu povo em os olhos dos egípcios, e estes emprestavam-lhes, e eles despojavam os egípcios"; "o Senhor me tinha posto em tuas mãos (Saul a Davi); SI. 33.14,15 - "da sua morada contempla todos os moradores da terra. Ele é que forma o coração de todos eles" (i.e., de igual modo tanto um como o outro); Pv. 16.1 - "Do homem são as preparações do coração, mas do Senhor, a resposta da boca"; 19.21 - "Muitos propósitos há no coração do homem, mas o conselho do Senhor permanecerá"; 20.24 - "Os passos do homem são dirigidos pelo Senhor; o homem, pois, como entenderá o seu caminho?" 21.1 - "Como ribeiros de águas, assim é o coração do rei na mão do Senhor; a tudo quanto quer o inclina" (i.e., tão facilmente como os riachos dos campos do oriente, voltam-se ao mínimo movimento da mão ou do pé do agricultor); Jr. 10.23 - "Eu sei, ó Senhor, que não é do homem o seu caminho, nem do homem que caminha, o dirigir os seus passos"; Fp. 2.13 - "é Deus quem opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo a sua boa vontade"; Ef. 2.10 - "somos feitura sua, criados em Cristo Jesus para as boas obras, as quais Deus preparou para que andássemos nelas"; Tg. 4.13-15 - "Se o Senhor quiser, e se vivermos, faremos isto ou aquilo".
2 Sm. 16.10 - "se o Senhor lhe (a Simei) disse: Amaldiçoa a Davi"; 24.1
"a ira do Senhor se tornou a acender contra Israel, e ele incitou a Davi contra eles, dizendo: Vai numera a Israel e a Judá"; Rm. 11.32 - "Deus encerrou a todos debaixo da desobediência, para com todos usar de misericórdia";
2 Ts. 2.11,12 - "Deus lhes enviará a operação do erro, para que creiam a mentira, para que sejam julgados todos os que não creram a verdade; antes tiveram prazer na iniqüidade".
Henry Ward Beecher: "Parece não haver nenhuma ordem nos movimentos das abelhas do enxame, mas o favo mostra que há um plano entre todas elas". John Hunter comparava o seu próprio cérebro com um enxame em que há um grande zumbido e aparente desordem embora sob tudo isto instala-se uma perfeita ordem. "Quando as abelhas reúnem blocos de doces em tempo de necessidade, mas são colonizadas pela superior inteligência do homem para atender os seus próprios propósitos do mesmo modo os homens planejam e trabalham dirigidos pela sabedoria infinita para a sua glória". Dr. Deems: Grande é o mundo no tempo e nas vagas, é Deus quem o guia; não se apressa. Feliz é o homem que faz o melhor que pode e não se preocupa com o resto".
A Escritura descreve a providência de Deus com relação aos atos maus dos homens em quatro tipos:
Obstante, - Deus, pela sua providência, obsta o pecado que se cometeria. Deve-se considerar o fato de obstar o pecado como matéria não de obrigação, mas de graça.
Gn. 20.6 Sobre Abimeleque: "eu te tenho impedido de pecar contra mim"; 31.24 - "Veio, porém, Deus a Labão, o aramameu, em sonhos, de noite, e disse-lhe: Guarda-te, que não fales a Jacó nem bem nem mal"; SI. 19.13 - "Também da soberba guarda o teu servo, para que não se assenhoreie de mim"; Os 2.6 - "Eis que cercarei o teu caminho com espinhos; e levantarei uma parede de sebe para que ela não ache as suas veredas" - aqui os "espinhos" e a "parede" podem representar os impedimentos e sofrimentos pelos quais Deus misericordiosamente reprime a fatal perseguição do pecado. Pais, governo, igreja, tradições, costumes, leis, idade, doença, morte são influências impeditivas. Às vezes o homem se acha à beira do precipício do pecado e uma forte tentação o impulsiona para o salto fatal. De repente todos nervos se relaxam, todo o desejo do mal se vai e ele recua do precipício no qual estava em vias de lançar-se. Deus interferiu através da voz da consciência e do Espírito. Isto também faz parte da sua providência impeditiva. Aos sessenta anos, é oito vezes menos provável que o homem cometa crimes do que com vinte e cinco. A paixão acalmou; o medo da punição aumentou. Quando perguntaram ao gerente de uma grande loja de departamentos o que podia impedir de absorver todo o negócio da cidade, respondeu: "A morte!" Sem dúvida a morte limita as agregações da propriedade, e assim constitui um recurso empregado por Deus para o exercício da providência impeditiva.
Na vida de John G. Paton, a chuva mandada por Deus impediu que os nativos o assassinassem e lhe saqueassem os bens.
Permissivo, - Deus permite que os homens acalentem o pecado e manifestem as disposições más dos seus corações. A providência permissiva de Deus é simplesmente o ato negativo de conter os obstáculos no caminho do pecador, ao invés de obstar seu pecado através do exercício do poder divino.
Não implica nenhuma ignorância, passividade, ou indulgência, mas consiste em detestar o pecado e determinar sua punição.
2 Cr. 32.31 - "Deus o desamparou [Ezequias], para tentá-lo, para saber tudo o que havia no seu coração"; cf. Dt. 8.2 - "para te humilhar, para te tentar, para saber o que estava no teu coração"; SI. 17.13,14 - "livra a minha alma do ímpio, pela tua espada; dos homens com atua mão, Senhor"; 81.12,13 "pelo que eu o entreguei aos desejos do seu coração, e andaram segundo os seus próprios conselhos. Ah! Se o meu povo me tivesse ouvido! Se Israel andasse nos meus caminhos!"; Is. 53.4,10 - "Verdadeiramente, ele tomou sobre si as nossas enfermidades ... Todavia agradou ao Senhor moê-lo";
Os. 4.17 - "Efraim está entregue aos ídolos; deixa-o"; At. 14.16 - "o qual, nos tempos passados, deixou andar todos os povos em seus próprios caminhos"; Rm. 1.24,28 - "Deus os entregou às concupiscências do seu coração, à imundícia ... Deus os entregou a um sentimento perverso para fazerem coisas que não convêm"; 3.25 - "para mostrar a sua justiça, pela remissão dos pecados dantes cometidos, sob a paciência de Deus"; Para o tópico da providência permissiva pode-se fazer referência a 1 Sm. 18.10 - "o mau espírito da parte de Deus se apoderou de Saul". Como os escritores hebreus viam nas causas secundárias a operação da grande primeira Causa e diziam: "O Deus da glória troveja" (SI. 29.3), assim, porque mesmo os atos dos ímpios entram no plano de Deus, os escritores hebreus às vezes representavam Deus como fazendo o que simplesmente permite que os espíritos finitos façam.
Em 2 Sm. 24.1 Deus demove Davi de numerar Israel, mas em 1 Cr. 21.1 a mesma coisa se refere a Satanás. Contudo, a providência de Deus nestes casos pode ser tanto diretiva como permissiva.
Tennvson, The Higher Pantheism: "Deus é lei, diz o sábio; e regozijemo- nos, ó alma, porque ele troveja pela lei; o trovão ainda é a sua voz". Fisher, Natures and Method of Revelation, 56 - "A clara separação da eficácia de Deus vinda do seu ato permissivo reservava-se para um dia posterior. Toda a ênfase estava no Velho Testamento depositada no soberano poder de Deus". Coleridge em suas Confissões de um Espírito Inquiridor, carta II, fala sobre "o hábito, universal entre os doutores hebreus, de referirem todas as coisas excelentes ou extraordinárias à grande primeira Causa sem mencionar as causas próximas e instrumentais - marcante ilustração do que se pode encontrar comparando as narrativas dos mesmos eventos nos Salmos e nos livros históricos. ... A distinção entre o providencial e o miraculoso não entraram em suas formas de pensamento - de qualquer modo, em sua forma de expressar seus pensamentos". A mulher que tinha sido caluniada rebelou-se quando se disse que Deus o tinha permitido para o seu bem; ela sustentava que Satanás tinha inspirado seu acusador; ela precisava aprender que Deus tinha permitido a obra de Satanás.
Diretivo, - Deus dirige os atos maus para fins que, os que os cometem, não prevêem e nem pretendem. Quando o mal está no coração e na vontade, Deus ordena seu fluxo em uma direção e não em outra de modo que seu curso
pode ser melhor controlado e não resulte em prejuízo. A isso às vezes dá-se o nome de providência dominante.
Gn. 50.20 - "Vós bem intentastes mal contra mim, porém Deus o tornou em bem, para fazer como se vê neste dia, para conservar em vida um povo grande"; SI. 76.10 - "Porque a cólera do homem redundará em teu louvor, e o restante da cólera, tu o restringirás"; = pôr como ornamento - veste-te a ti mesmo para a tua própria glória; Is. 10.5 - "Ai da Assíria, a vara da minha ira! Porque a minha indignação é como o bordão nas suas mãos"; Jo. 13.27 - "O que fazes faze-o depressa"; = faze de um modo particular o que, na verdade está sendo feito (Westcott, Bib. Com. in loco)', At. 4.27,28 - "contra o teu santo Filho Jesus, que tu ungiste, se ajuntaram, não só Herodes, mas Pôncio Pilatos com os gentios e os povos de Israel para fazerem tudo o que a tua mão e o teu conselho tinham anteriormente determinado que se havia de fazer".
Sobre este tópico da providência diretiva convém fazer referência às passagens a respeito de Faraó em Ex. 4.21 - "endurecerei o seu coração para que não deixe ir o povo"; 8.15 - "agravou o seu coração" - i.e. o próprio Faraó endureceu o seu coração. Aqui a atuação controladora de Deus não interferiu na liberdade de Faraó ou coagiu-o a pecar; mas, no julgamento da sua crueldade e impiedade anteriormente existentes, Deus retirou as suas restrições externas que estavam com aquele pecador nos seus limites e o pôs em circunstâncias que o teriam influenciado a agir corretamente num pensamento direcionado para o bem, mas que Deus previu conduziria a uma disposição como a de Faraó para uma maldição peculiar à impiedade que, na verdade ele estava perseguindo.
Então, Deus endureceu o coração de Faraó, em primeiro lugar, permitindo que ele endurecesse o seu próprio coração; Deus é o autor do pecado de Faraó só no sentido de que ele é o autor de um ser livre que é o responsável direto pelo seu pecado; em segundo lugar, dando-lhe meios de esclarecimento, as próprias oportunidades são pervertidas por ele em ocasiões de mais virulenta iniqüidade e a resistência ao bem torna o resultado um mal maior; em terceiro lugar, abandonado judicialmente, Faraó, quando se torna manifesto que ele não faria a vontade de Deus tornando assim moralmente certo, embora não necessário, que ele fizesse o mal; e em quarto lugar, dirigindo as circunstâncias de Faraó para que o pecado dele se manifestasse mais de uma forma do que de outra. O pecado é como a lava de um vulcão, que, sem dúvida, efluirá, mas cujo curso Deus dirige montanha abaixo de sorte a causar o menor dano. A gravitação para baixo se deve à vontade má do homem; a direção para este lado ou para aquele deve-se à providência de Deus.
Ver Rm. 9.17,18 - "Para isto mesmo te levantei, para em ti mostrar o meu poder e para que o meu nome seja anunciado em toda a terra. Logo, pois, compadece-se de quem quer e endurece a quem quer". Portanto, as próprias paixões que estimulam o homem a rebelar-se contra Deus são completamente subservientes aos seus propósitos.
Deus endurece o coração de Faraó só depois de infligidas as primeiras pragas. Faraó já tinha endurecido o seu próprio coração. Deus não endurece
o coração do homem que não o tinha endurecido antes. Crane, Religion of To-morrow, 140 - "Nunca se diz que Deus endureceu o coração de um homem bom, ou de alguém que anda em retidão. Deus sempre aqueles que se inclinam para o mal. Faraó endurece o seu coração antes de Deus endurecê-lo. A natureza dos seres humanos deve endurecer quando resiste às influências amenizadoras". O Vigia, 5 de dezembro de 1901.11 - "Deus decretou a Faraó o que Faraó escolhera por si mesmo. A persistência na inclinação em certas direções e volições desperta dentro do corpo e da alma forças que não estão sob o controle da vontade e que induzem o homem ao caminho que ele escolheu. Com o passar do tempo a natureza endurece o coração do homem para fazer o mal".
Determinativo, - Deus determina os limites alcançados pelas más paixões de suas criaturas e a medida dos seus efeitos. Porque o mal moral é um germe capaz de indefinida expansão a determinação de Deus sobre a medida de seu desenvolvimento não altera seu caráter ou envolve cumplicidade de Deus na vontade pervertida que o embalou.
Jó 1.12 - "E o Senhor disse a Satanás: eis que tudo quanto tem está na tua mão; somente contra ele não estendas a tua mão"; SI. 124.2 - "Se não fora o Senhor, que esteve ao nosso lado, quando os homens se levantaram contra nós, eles, então, nos teriam engolido vivos"; 1 Co. 10.13 - "não vos deixará tentar acima do que podeis; antes, com a tentação dará também o escape para que a possais suportar"; 2 Ts. 2.7 - "Porque o mistério da injustiça opera; somente há um que, agora, resiste até que do meio seja tirado";
Ap. 20.2,3 - "Ele prendeu o dragão, a antiga serpente, que é o diabo e Satanás, e amarrou-o por mil anos".
Pepper, Outlines of Syst. Theol., 76 - A união da vontade de Deus com a do homem é "tal que, enquanto em um ponto de vista tudo pode ser atribuído a Deus, em outro tudo pode ser atribuído à criatura. Mas, como Deus e a criatura unem-se em operação, sem dúvida conhece-se e é cognoscível só por Deus. Fornece-se uma obscura analogia na união da alma com o corpo no homem. A mão retém suas próprias leis físicas, contudo obedece à vontade humana. Esta teoria reconhece a veracidade em seu testemunho da liberdade pessoal e ainda a plenitude do controle de Deus tanto sobre o mal como sobre o bem. Os seres livres são governados, mas como livres em sua liberdade. A liberdade não é sacrificada em benefício do controle. Os dois coexistem, cada um em sua integridade. Qualquer doutrina que não permite isto falseia a Escritura e destrói a religião".
Prova racional
Argumentos a priori dos atributos divinos, d) Da imutabilidade de Deus. Este certifica que Deus executará seu eterno plano do universo e a história deste. Mas a execução deste plano não envolve só a criação e a preservação, mas também a providência, b) Da benevolência de Deus. Isto torna certo que ele cuidará do universo inteligente que ele criou. O que valeu a pena criar também vale a pena cuidar. E este cuidar é a providência, c) Da justiça de Deus. Como fonte da lei moral, Deus deve assegurar a vindicação da lei administrando justiça no universo e punindo os rebeldes. E esta administração da justiça é providência.
Sobre as idéias da providência, ver Cícero, De Natura Deorum, 11.30, onde Balbus fala da existência dos deuses como "quo concesso, confitendum est eorum consilio mundum administrari". Epicteto, sec. 41-0 principal e mais importante dever na religião é ter a mente com noções justas e convenientes dos deuses - crer que há tão supremos seres e que eles governam e dispõem de todos os negócios do mundo com uma providência justa e boa". Marco Antonino: "Se não há deuses, ou se eles não se preocupam com os negócios humanos, por que eu desejaria viver num mundo sem deuses e sem providência? Mas não há dúvida de que há deuses e que eles se preocupam com os negócios humanos". Ver Biblia Sacra, 16.374. Contudo, como veremos, muitos dos escritores pagãos criam numa providência geral ao invés de numa particular.
(426) Sobre o argumento da providência derivado da benevolência de Deus, ver Appleton, Works. 146 - "É a indolência mais consistente com a majestade de Deus do que deve ser a ação? A felicidade das criaturas é um bem. Será que honra a Deus dizer que ele é indiferente àquilo que ele sabe que é bom e valioso? Ainda que o mundo tivesse vindo a existir sem a sua atuação, seria próprio do caráter moral de Deus dar alguma atenção a criaturas tão numerosas e tão suscetíveis ao prazer e à dor especialmente quando ele exercesse tão grande e favorável influência sobre as suas condições morais". Jo. 5.17 - "Meu Pai trabalha até agora, e eu trabalho também" - aplica-se tanto à providência como à preservação.
A complexidade da ordem providencial de Deus pode ser ilustrada pela explicação de Tyndall sobre o fato de que a tranqüilidade emocional não se desenvolve na periferia das aldeias inglesas.: 1. Nas aldeias inglesas os cães correm soltos. 2. Em lugares onde os cães correm soltos, os gatos devem ficar em casa. 3. Nos lugares onde os gatos ficam em casa, há abundância de ratos nos campos. 4. Nos lugares onde há abundância de ratos no campo, destroem-se os ninhos de mamangava. 5. Nos lugares onde se destroem os ninhos de mamangava, não há fertilização do pólen. Por isso, nos lugares onde os cães vivem soltos, não se desenvolve a tranqüilidade emocional.
Argumentos a posteriori a partir dos fatos da natureza e da história.
O destino exterior dos indivíduos e nações não está inteiramente nas mãos deles, mas em muitos respeitos reconhecidamente está ao dispor de uma força superior, b) A observada ordem moral do mundo, apesar de imperfeita, não pode ser compreendida sem o reconhecimento de uma providência divina. Retira-se o estímulo ao vício e recompensa-se a virtude além da força da
simples natureza. Deve haver uma mente e uma vontade governante que outras não são senão as de Deus.
O berço dos indivíduos e das nações, as forças naturais de que eles são dotados, as oportunidades e imunidade que eles gozam, estão além do seu próprio controle. O destino do homem no tempo e na eternidade pode ser praticamente decidido pelo nascimento num lar cristão, ao invés de num apartamento em Cinco Pontas, ou num craal dos hotentotes. O progresso depende grandemente da "variedade do ambiente (H. Spencer). Mas esta variedade ambiental independe em grande parte dos nossos esforços.
"Há uma divindade que molda os nossos fins, a dureza os talha como queremos". Aqui Shakespeare expõe a consciência humana. "O homem propõe e Deus dispõe", tornou-se um provérbio. A experiência ensina que o sucesso e a derrota não se devem totalmente a nós. Freqüentemente o homem trabalha e perde; consulta e nada produz; peleja e se quebra". Nem sempre a providência está do lado dos mais pesados batalhões. Não são as armas que decidem o destino do mundo, mas as idéias - como Xerxes encontrou as Termópilas, e Napoleão Waterloo. Os grandes movimentos via de regra começam sem ter consciência da sua grandeza. Cf. Is. 42.16 - "guiarei os cegos por um caminho que nunca conheceram"; 1 Co. 5.37,38 - "semeias o simples grão ... mas Deus dá-lhe o corpo como quer".
A obra retorna ao operador, e o caráter molda o destino. Isto é verdade ao longo da corrida. A eternidade há de mostrar o quanto é veraz essa máxima. Mas neste tempo numerosas exceções são suficientes para permitir que se torne possível a prova moral. Se o castigo sempre se seguisse ao mal, a justiça teria uma força compulsiva sobre a vontade e seria impossível a mais elevada virtude. Os amigos de Jó o acusaram de agir com base neste princípio. Os filhos hebreus negam esta verdade quando dizem: "E, se não", - mesmo que Deus não nos livre - "não serviremos a teus deuses, nem adoraremos a estátua de ouro, que levantas-te" (Dn. 3.18).
Martineau, Seath of Authoríty, 298 - "Através de alguma falsa direção ou fraqueza, grande parte dos maiores agentes da história deixaram de alcançar o seu próprio ideal, embora tenham executado maiores e mais benéficas revoluções; as conquistas de Alexandre, do Império Romano, das Cruzadas, das perseguições eclesiásticas, do ascetismo monástico, do zelo missionário do cristianismo, têm desempenhado um papel momentoso no drama do mundo, embora seja uma parte surpreendente a cada um deles. Tudo isto mostra a presença controladora de uma Razão e de uma Vontade transcendental e divina". Kidd, Social Evolution, 99, declara que o progresso da raça ocorreu apenas sob condições que não tiveram a sanção da razão de grande parte dos indivíduos que se lhes submeteram. Ele conclui que uma religião racional é cientificamente impossível e que a função da religião é prover a sanção grandemente racional do progresso social. Preferimos dizer que a providência propulsiona a raça mesmo contra a sua vontade.
James Russel Lowell, Letters, 2.51, sugere que o calmo controle que Deus exerce sobre as forças do universo tanto físicas como mentais devem garantir-nos confiança em tempos quando o mal parece iminente: "Quantas vezes
tenho visto as máquinas a fogo da igreja e do estado retinindo e movendo-se para sair - falso alarme! E quando os céus carregam-se de nuvens, que brilho podem lançar as palhoças em fogo!"
TEORIAS OPOSTAS À DOUTRINA DA PROVIDÊNCIA
Fatalismo
Sustenta a certeza, mas nega a liberdade de autodeterminação humana, substituindo a providência pelo destino.
A este ponto de vista objetamos que a) contradiz o consciente que testifica que somos livres; b) exalta o poder divino com prejuízo da verdade, da sabedoria, da santidade, do amor de Deus; c) destrói toda a evidência da personalidade e liberdade de Deus; d) faz praticamente da necessidade o único Deus e deixa os imperativos da nossa natureza moral sem validade presente ou vindi- cação futura.
Freqüentemente têm-se chamado os maometanos de fatalistas, e o efeito prático dos ensinos do Corão sobre as massas contribuem para isso. O mao- metano comum não tem médico ou remédio porque tudo acontece como Deus já havia predito. Contudo, Smith, em Maomé e o maometanismo (ing.), nega que o fatalismo seja essencial ao sistema. Islão = "submissão", e o particípio Muçuln = submetido, submisso", i.e., a Deus. Provérbio turco: "Não se pode escapar ao que está previamente escrito". O maometano pensa que o atributo dominante de Deus é a grandeza ao invés de ser a justiça, a força ao invés de ser a pureza. Deus não é o Deus e Pai de nosso Senhor Jesus Cristo, mas a personificação da vontade arbitrária. Porém há no sistema uma ausência do sacerdotalismo, um zelo pela honra de Deus, uma fraternidade dos fiéis, uma reverência por aquilo que é considerado a palavra de Deus e uma audaciosa e habitual devoção dos seus seguidores à sua fé.
Stanley, Life and Letters, 1.489, refere-se à tradição muçulmana que há no Egito como o destino do Islão que requer ao menos deve ser superado pelo cristianismo. F. W. Sanders "nega que o Corão seja peculiarmente sensual. As religiões cristã e judaica", diz ele, "também têm seu paraíso. O Corão faz isto a sua recompensa, mas não o ideal de conduta; 'A graça do teu Senhor - é a grandiosa bênção'. A ênfase do Corão está na vida correta.
O Corão não ensina a propagação da religião pela força. Ele declara que não deve haver coação em assuntos religiosos. A prática de converter através da espada distingue-se do ensino de Maomé, como a Inquisição e o tráfico de escravos do cristianismo não provam que Jesus os ensinava. O Corão não instituiu a poligamia. Ele encontrou uma ilimitada poligamia, o divórcio e o infanticídio. Este último é proibido; os dois primeiros restringem-se e são amenizados, como também Moisés encontrou a poligamia, mas permitiu-a com restrições. O Corão não é hostil ao ensino secular. O ensino floresceu sob os califados de Bagdá e Espanha. Quando os maometanos opõem-se ao ensino,
fazem-no sem a autoridade do Corão. A Igreja Católica Romana se opôs às escolas, mas não atribuímos isto ao evangelho".
Os calvinistas defendem a liberdade, visto que a vontade do homem acha a mais elevada liberdade só na submissão a Deus. O islão também cultiva a submissão não do amor, mas do temor. A diferença essencial entre o maome- tismo e o cristianismo encontra-se na revelação que este dá do amor de Deus em Cristo - revelação que assegura dos livres agentes de submissão do amor.
Casualismo
Transfere a liberdade da mente para a natureza como o fatalismo transfere a fixidez da natureza para a mente. Assim troca a providência pelo acaso. Sobre este ponto de vista assinalamos:
Se o acaso for o único nome para a ignorância humana, para o fato de que há ocorrências triviais na vida que não têm nenhum sentido ou relação conosco, - podemos reconhecer isto e ainda sustentar que a providência põe em ordem cada assim chamado acaso para propósitos que estão além do nosso conhecimento. O acaso, neste sentido, é coincidência providencial que não podemos entender e com a qual não precisamos nos preocupar.
Nem todas oportunidades são de igual importância. O encontro casual de um estranho na rua não precisa trazer a providência de Deus diante de mim, embora eu saiba que Deus a ponha em ordem. Contudo, eu posso conceber tal encontro como oportunidade de entabular uma conversa religiosa e uma conversa com o estranho. Quando estamos preparados para isso, vemos muitas oportunidades que agora não têm sentido para nós do mesmo modo que o ouro no leito do rio para os índios da Califórnia. Eu seria ingrato se fugisse de um instantâneo relâmpago, e não agradecesse a Deus; contudo, a palavra do Dr. Arnold de que cada menino na fase escolar deve pôr o chapéu para a glória de Deus e com elevado propósito moral, parece mórbido. Há um lugar certo para o emprego de arbitrariedades. Não devemos nos afligir nem à igreja de Deus exigindo minúcias farisaicas. A vida é muito breve para debatermos questões sobre qual sapato devemos calçar primeiro. "Ame a Deus e faça o que ele quer que façamos", diz Agostinho; isto é, ame a Deus e age com base nesse amor de um modo simples e natural. Ser livre no trabalho que você presta, embora você sempre deve estar vigilante sobre as indicações da vontade de Deus".
Se o acaso for tomado no sentido de total ausência de todas conexões causais nos fenômenos da matéria e da mente, - opomos a esta noção o fato de que o juízo causai é formado segundo a lei fundamental e necessária do pensamento humano e nenhuma ciência ou conhecimento é possível sem a suposição da sua validade.
Em Lc. 10.31, nosso Salvador diz: "ocasionalmente, descia pelo mesmo caminho um certo sacerdote". Janet: "Acaso não é uma causa, mas uma coincidência de causas". Bowne, Theory of Though and Knowledge, 197 - "Acaso não significa falta de causa, mas a coincidência de um evento de uma série de causas mutuamente independentes. Deste modo, fala-se de um encontro fortuito entre duas pessoas como uma oportunidade casual quando o movimento de nenhuma delas implica a outra. A antítese da casualidade é o propósito"
Se o acaso for usado no sentido de causa sem desígnio, - é evidentemente insuficiente explicar as seqüências regulares e uniformes da natureza ou do progresso moral da raça humana. Estas coisas mostram uma mente superintendente e designativo - em outras palavras, uma providência. Porque a razão não exige apenas uma causa, mas uma causa suficiente para a ordem do mundo físico e moral, o casualismo deve ser rejeitado.
Perguntaram ao observador do sinal de rádio como estava o clima em Rochester. "Clima?" respondeu; "em Rochester não há condições climáticas; só há condições atmosféricas!" Do mesmo modo Chauncey Wright falava dos altos e baixos dos negócios humanos somente como "condições atmosféricas cósmicas". Mas a nossa intuição de desígnio compele-nos a ver a mente e o propósito no indivíduo e na história nacional bem como no universo físico.
O mesmo argumento que prova a existência de Deus prova também a existência de uma providência.
Teoria de uma providência simplesmente geral
Muitos que reconhecem o controle de Deus sobre os movimentos dos planetas e os destinos das nações negam qualquer arranjo divino nos eventos particulares. A maior parte dos argumentos contra o deísmo é igualmente válida contra a teoria de uma providência simplesmente geral. Este ponto de vista é, na verdade, a única forma do deísmo, que sustenta que Deus não se afastou totalmente do universo, mas que sua atividade nele se limita à manutenção das leis gerais.
Este parece ter sido o ponto de vista da maior parte dos filósofos pagãos. Cícero: "Magna dii curant; parva negligunt (Os deuses cuidam das grandes causas; negligenciam as pequenas)". "Até mesmo nos reinos entre os homens", diz ele, "os reis não se perturbam com coisas insignificantes". Fullerton, Con- ceptious of the Infinite, 9 - "Plutarco pensava que não podia haver uma infinidade de mundos; é possível que a providência não se encarregasse de tantas coisas. 'O infinito perturbador e ilimitado não pode ser captado por nenhuma consciência". Os antigos cretenses faziam de Jove uma imagem sem ouvidos, porque diziam eles: "É uma vergonha crer que Deus ouça a conversa dos homens". Do mesmo modo, Jerônimo, o Pai da igreja, pensava ser absurdo que Deus devia saber quantos mosquitos e baratas há no mundo. Paráfrase de texto de David Harum: "Basta um número razoável de galãs para uma jovem; eles evitam que ela duvide que é uma moça".
Em acréscimo aos argumentos supracitados, podemos afirmar contra esta teoria que:
O controle geral sobre o curso da natureza e da história é impossível sem o controle sobre as mínimas particularidades que afetam o curso da natureza e da história. Incidentes tão superficiais que quase escapam à observação quando da sua ocorrência freqüentemente determinam todo o futuro de uma vida humana e através dessa vida os destinos de um império todo e de uma era inteira.
"Nada começou grande". "Tome cuidado com o centavo e os reais cuidarão de si mesmos". "Cuidar da corrente é cuidar dos seus elos". Exemplos disso são as insônias do rei Assuero (Et 6.1), e a aparente casualidade que levou à leitura do registro do serviço de Mardoqueu e até à salvação dos judeus na Pérsia; a teia da aranha tecida na entrada da caverna em que Maomé se refugiara, que deste modo enganou os perseguidores para que ele continuassem numa busca inútil, deixando ao mundo a religião e o império dos maometanos; a pregação de Pedro o Eremita, que ocasionou a primeira Cruzada; o fortuito tiro de um arqueiro que feriu o olho direito de Haroldo o último dos reis legitimamente inglês, ganhou a batalha de Hastings em favor de Guilherme, o Conquistador, e garantiu o trono da Inglaterra para os nor- mandos; a revoada de pombos para o sudoeste, que mudou o curso de Colombo, até agora rumo a Virgínia, para as índias Ocidentais, e desta forma impediu o domínio espanhol sobre a América do Norte; a tempestade que dispersou a Armada Espanhola (vera Invencível Armada) e salvou a Inglaterra do Papado, e a tempestade que dispersou a frota francesa reunida para conquistar a Nova Inglaterra - esta última no dia de jejum e oração indicado pelos puritanos a fim de evitar a calamidade; a colonização da Nova Inglaterra pelos puritanos, em vez de ser pelos jesuítas franceses; a ordem do Concilio impedindo Cromwell e seus amigos de viajar para a América; a ausência dos aprisionadores do major André, que o levaram a fazer uma pergunta imprópria ao invés de mostrar o seu passaporte e que salvou a causa americana; o começo do frio inusitadamente antecipado, que frustrou os planos de Napoleão e destruiu o seu exército na Rússia; o tiro fatal no Forte de Sumter, que precipitou a guerra de secessão e resultou na abolição da escravatura na América do Norte. A natureza tem ligação com a história; a brisa muda o curso do projétil; o verme perfura a prancha do navio. Deus cuida do mínimo, ou ele não cuida do máximo.
"As grandes portas oscilam em pequenas dobradiças". O latido do cão determinou a F. W. Robertson que se tornasse um pregador em vez de um soldado. Robert Browning, o Sr. Sludge, o médium: "Achamos que as grandes coisas são feitas de pequenas e as pequenas se tornam menores até que, finalmente, Deus aparece atrás de todas elas". E. G. Robinson: "Não podemos supor que só um pequeno esboço tenha estado na mente de Deus enquanto a complementação deixa de ser feita de alguma outra forma.
O geral inclui o específico". Dr. Lloyd, um dos professores de Oxford, disse a Pusey: "Eu gostaria de que você aprendesse algo a respeito dos críticos alemães". "No espírito obediente daqueles tempos", escreve Pusey, "eu me pus de pronto a aprender alemão, e fui para Gõttingen, a fim de estudar a língua e a teologia. Minha vida mudou com a sugestão do Dr. Lloyd".
Goldwin Smith: "Se uma bala tivesse entrado no cérebro de Cromwell ou de Guilherme III em sua primeira batalha, ou se Gustavo não tivesse caído em Lützen, parece que o curso da história teria mudado. Até mesmo o curso da ciência mudaria se não tivesse havido um Newton ou um Darwin". A anexação da Córsega à França deu-a a Napoleão, e à Europa um conquistador. Martineau, Seat of Autority, 101 - "Se o mosteiro de Erfurt tivesse delegado outro que não fosse o jovem Lutero em sua peregrinação à paganizada Roma, ou se Leão X mandasse um agente menos escandaloso que Tetzel em sua negociação com a Alemanha, as sementes da Reforma teriam caído à beira do caminho onde não havia profundidade no solo, e a revolta ocidental da mente humana podia ter tomado outro rumo e outra forma".
O amor de Deus que assiste um cuidado geral o universo deve também assistir com um cuidado particular os mínimos eventos que afetam a felicidade de suas criaturas. Cabe ao amor de Deus nada considerar insignificante ou indigno de nota o que tem que ver com os interesses do objeto de seu sentimento. Pode-se esperar, portanto, que o amor infinito dê providência a todos até as mínimas coisas da criação. Sem a crença neste cuidado particular o homem não pode crer no cuidado geral de Deus. A fé em uma providência particular é indispensável ao próprio sistema da religião prática; pois os homens não adorarão ou reconhecerão um Deus que não tenha relação direta com eles.
Os cuidados do homem com o seu próprio corpo envolve cuidado com os seus membros de menor importância. Conhece-se a dedicação daquele que ama através das mínimas preocupações para com o ser amado. Assim todos os negócios são de interesse de Deus. Pope, Essay of Man: "Toda a natureza é apenas arte para ti; Toda a eventualidade, a direção que tu não podes ver; Toda a discórdia, a harmonia não entendida; Todo o mal parcial, o bem universal". Se se fizesse a colheita e se perdesse sem a atuação de Deus; se a chuva ou o sol podem agir de igual sorte, varrendo os resultados dos anos e Deus não der uma mãozinha; se o vento e a tempestade naufragarem o navio e afogarem os nossos mais queridos amigos e Deus não cuidar de nós ou das nossas perdas, então toda possibilidade da confiança geral em Deus também desaparecerá.
Mostra-se o cuidado de Deus nas mínimas coisas assim como nas maiores. No Getsêmani Cristo diz: "Deixai ir estes, para se cumprir a palavra que tinha dito: Dos que me deste nenhum deles perdi" (Jo. 18.8,9). É o mesmo espírito de sua oração com a finalidade de interceder: "Tenho guardado aqueles que tu me deste, e nenhum deles se perdeu, senão o filho da perdição"
(Jo. 17.12). Cristo se entrega a si mesmo como prisioneiro para que os seus discípulos possam ir livremente, assim como ele nos redime da maldição da lei fazendo-se maldição por nós (Gl. 3.13). O orvalho é moldado pela mesma lei que envolve os planetas em esferas. O Gal. Grant dizia que nunca, a não ser uma só vez, buscou um lugar para si mesmo e nesse lugar ele se encontrava em relativa falha; ele tinha sido um instrumento nas mãos de Deus para cumprir os seus propósitos independentemente de qualquer plano ou pensamento, ou sua própria esperança.
No seu caminho pelo tenebroso continente à procura de Davi Livingstone, Henry M. Stanley escreveu no Scribner de junho de 1890: "Oprimido na mais tenebrosa hora, confesso humildemente que sem o auxílio de Deus achava- me desamparado; fiz um voto na solidão da floresta que eu confessaria o seu auxílio diante de todos os homens. Como que um silêncio mortal envolveu- me; era meia-noite; estava debilitado pela doença, prostrado na fadiga e abatido de ansiedade por causa dos meus companheiros pretos e brancos, cujo fado era um mistério. Na angústia física e mental roguei a Deus que me devolvesse o meu povo. Nove horas mais tarde eu exultava com extasiante alegria. Via plenamente a bandeira carmesim crescente e sob as suas ondu- lantes faldas, eis a coluna da retaguarda a muito perdida. ... Os meus próprios desígnios foram constantemente frustrados por infelizes circunstâncias. Empenhei-me em tornar o meu curso o mais reto possível, mas havia uma incalculável influência no leme. ... Tenho estado consciente da realização de que a produção de cada esforço estava nas minhas mãos. ... Parece que a divindade nos cercou durante a peregrinação impelindo-nos para onde ela queria, efetuando a sua própria vontade, mas guiando-nos constantemente e protegendo-nos". Ele se recusa a crer que se trata do resultado da 'sorte', e encerra com uma doxologia que esperaríamos de Livingstone, mas não dele: "Graças te dou ó Deus, para todo o sempre"!
Em tempos de perigo pessoal e de notáveis conjunturas de negócios públicos, os homens indistintamente atribuem a Deus um controle dos eventos que ocorrem em torno deles. As orações que em tais espantosas emergências brotam dos lábios dos homens são provas de que Deus está presente e ativo nos assuntos humanos. Este testemunho da nossa constituição mental deve ser considerado virtualmente como o testemunho daquele que estruturou esta constituição.
Nenhum avanço da ciência pode livrar-nos desta convicção, visto que ela vem de uma fonte mais profunda que a simples razão. A intuição do desígnio é despertada pela conexão dos eventos da nossa vida diária tanto quanto pelas adaptações que vemos na natureza. SI. 107.23-28 - "Os que descem ao mar em navios ... sobem aos céus, descem aos abismos ... e esvai-se toda a sua sabedoria. Então, clamam ao Senhor na sua tribulação". Uma estreita fuga da morte mostra-nos um Deus e Libertador presente. Temos um exemplo no general sentindo a terra inteira, manifesta na imprensa assim como no púlpito, na explosão da nossa rebelião e subseqüente Proclamação da Emancipação do Presidente.
"Est deus in nobis; agitante calescimos illo" (Há um deus em nós; enquanto ele opera somos aquecidos). Contrastando a ignorância de Nansen a respeito de Deus em sua peregrinação polar com a invocação de Deus que o Dr. Jacob Chamberlain fez na sua dificuldade na índia, ver Missionary Review, maio, 1898. S. S. Times, 4 de mar. de 1893 - "Benjamin Franklin tornou-se deísta aos quinze anos. Antes da Guerra Revolucionária ele era apenas um negociante astuto e dinâmico. Tinha um espírito público; fez uma feliz descoberta científica. Mas as palavras de Poor Richard expressam a sua mente naquela época. Os perigos e ansiedades da grande guerra deram-lhe um discernimento mais profundo. Ele e outros caíram em si 'com uma corda no pescoço'. Quando ele à Convenção Constitucional de 1787, propôs que as sessões diárias fossem abertas com oração porque as experiências da guerra mostraram-lhe que 'Na verdade Deus dirige os negócios dos homens'.
Na discussão sobre a cunhagem de moeda americana, Franklin propôs que não se estampasse nelas 'Centavo Economizado é Centavo ganho', ou qualquer outra peça de prudência internacional, mas 'O Temor do Senhor é o Princípio da Sabedoria'.
A experiência cristã confirma as declarações da Escritura de que Deus realiza os eventos particulares relativos especialmente ao bem e ao mal do indivíduo. Tais eventos ocorrem às vezes em conexão tão direta com as orações cristãs que não sobra nenhuma dúvida sobre a disposição providencial deles. A possibilidade de tal atuação divina nos eventos naturais não pode ser questionada por alguém que, como o cristão, teve a experiência das maiores maravilhas da regeneração e do relacionamento diário com Deus e que crê na realidade da criação, da encarnação e dos milagres.
A providência abre o caminho para a conversão do homem, por vezes através da sua transformação parcial, às vezes através da súbita morte de uma pessoa próxima. É o que ocorreu com Lutero e com Judson. O cristão aprende que a mesma Providência que o conduz antes da conversão, depois dela preocupa-se em dirigir os seus passos e suprir as suas necessidades. Daniel Defoe: "Tenho sido alimentado mais por milagre do que Elias quando os anjos foram os seus provedores". No SI. 32, Davi celebra não só a misericórdia perdoadora de Deus, mas a sua subseqüente direção providencial: "sob as minhas vistas, te darei conselho" (v. 8). Pode-se objetar que freqüentemente enganamo-nos quanto ao sentido dos acontecimentos. Replicamos que, do mesmo modo que na natureza, também na providência, somos compelidos a crer, não que conhecemos os desígnios, mas que há um desígnio.
Por exemplo, o afogamento de Shelley e a oração de Jacob Knapp para que o seu antagonista fosse acometido de surdez. O fato de Lyman Beecher atribuir a queima da igreja unitária ao juízo de Deus sobre a falsa doutrina foi invalidada pouco mais tarde pelo incêndio da igreja dele (de Beecher).
Jó 23.10-"Ele sabe o meu caminho", ou "o caminho que está comigo", i.e., meu mais íntimo caminho, vida e caráter: "Prove-me, e sairei como o ouro".
Co. 10.4 - "e a pedra era Cristo" = Cristo era a fonte sempre presente do seu refrigério e vida, tanto física quanto espiritual. A providência de Deus é totalmente exercida através de Cristo. 2 Co. 2.14 - "E graças a Deus, que sempre nos faz triunfar em Cristo". Paulo se gloria, não em conquistar, mas em ser conquistado. Que Cristo triunfe, não Paulo. Grande Rei da graça: que o meu coração seja dominado; serei conduzido também ao triunfo; cativo voluntário do meu Senhor; para que a própria conquista seja da sua palavra". Por isso Paulo chama-se a si mesmo de "prisioneiro de Cristo Jesus" (Ef. 3.1). Foi Cristo que o encerrou por dois anos em Cesaréia e, depois, dois anos em Roma.
IV. RELAÇÕES DA DOUTRINA DA PROVIDÊNCIA
Com os milagres e com as obras da graça
A providência particular é a atuação de Deus naquilo que nos parece assunto de menor importância na natureza e na vida humana. A providência especial é apenas um exemplo da providência particular de Deus especialmente relativa a nós ou que causa impressão peculiar em nós. É especial, não no que respeita os recursos de que Deus se vale, mas o efeito que produz sobre nós. Na providência especial temos só uma manifestação mais impressionante do controle universal de Deus.
Os milagres e obras da graça como a regeneração não devem ser considerados pertencentes a diferente ordem de coisas a partir de providências especiais de Deus. Eles também, como as providências especiais, podem ter conexões naturais e antecedentes, apesar de que eles sugerem mais prontamente sua autoria divina. A natureza e Deus não são mutuamente exclusivas, - a natureza é mais um método de operação de Deus. Porque a natureza é somente a manifestação de Deus, a providência especial, o milagre e a regeneração simplesmente são diferentes graus da natureza extraordinária. Algumas das maravilhas da Escritura, tais como a destruição do exército de Senaqueribe e a divisão do Mar Vermelho, as pragas do Egito, as codomizes e a pesca maravilhosa podem ser contadas como exagero das forças naturais, enquanto, ao mesmo tempo, são operações da obra maravilhosa de Deus.
A queda da neve de um teto é um exemplo da providência comum (ou particular). Mas se ela matar alguém, ela se torna uma providência especial para a pessoa que foi morta e para outros que por essa causa aprendem a lição da insegurança da vida. Deste modo a provisão do carvão para o combustível nas eras geológicas pode ser considerada por diferentes pessoas ou à luz de uma providência geral ou especial. Em todas operações da natureza
e em todos eventos da vida apresenta-se a providência de Deus. Ela se torna especial quando manifestamente sugere algum cuidado de Deus para conosco ou algum dever nosso para com Deus. Savage, Life beyond Death, 285 - "A vida de Mary A. Livermore foi salva durante as suas viagens no Oeste ao ouvir e imediatamente obedecer ao que lhe parecia uma voz. Ela não sabe de onde veio; mas saltou, à ordem da voz de um lado do carro para o outro e, na mesma hora, o lado onde ela estava sentada foi esmagado e totalmente destruído". Semelhantemente, a vida do Dr. Oncken foi salva num acidente ferroviário em Norwalk.
Trench chama de "milagres providenciais" as maravilhas bíblicas que podem ser explicadas pela atuação de leis naturais (ver Trench, Miracles,
19). Mosley, também (Miracles, 117-120) chama tais maravilhas de milagres e providenciais especiais por causa da sua predição da palavra de Deus que as acompanha. Ele diz que, com efeito, a diferença entre os milagres e as providências especiais é que esta fornece alguma garantia, enquanto aquela, a garantia completa, por crer que são operadas por Deus. Ele chama a providência especial de "milagres invisíveis". O Bp. de Southampton, Place of Miracles, 12,13 - "A arte de Bezalel ao construir o tabernáculo e os planos de generais tais como Moisés e Josué, Gideão, Baraque e Davi, no Velho Testamento, são atribuídos à inspiração direta de Deus. Um pequeno escritor religioso os teria atribuído à instintiva habilidade militar. Não há o envolvimento necessário de nenhum milagre quando, ao tratar-se do sistema cerimonial, se diz: 'Falou o Senhor a Moisés' (Nm. 5.1). Deus está presente em toda a parte na história de Israel, mas os milagres são assinaladamente raros". Preferimos dizer que a linha divisória entre o natural e o sobrenatural, entre a providência especial e o milagre é arbitrária e que o mesmo evento pode freqüentemente ser considerado como providência especial ou como milagre conforme o modo como encaramos o ponto de vista da relação com outros eventos ou da sua relação com Deus.
E. G. Robinson: "Se o Vesúvio despedisse cinzas e lava e um forte vento os espalhasse dir-se-ia que choveu fogo e enxofre, como em Sodoma e Gomorra". Há abundante evidência de ação vulcânica na região do Mar Morto. Ver artigo sobre Preparação Física de Israel na Palestina, de G. Frederick Wright, em Bibiia Sacra, abr., 1901.364. Os três grandes milagres - a destruição de Sodoma e Gomorra, a divisão das águas do Jordão, a queda dos muros de Jericó - são descritos como efeito da erupção vulcânica, elevação do leito do rio em uma das barrancas e o terremoto sob os muros. O lodo de sal lançado pode ter envolvido a mulher de Ló e feito dela "uma estátua de sal" (Gn. 19.26). De igual modo, algumas da curas de Jesus, como, por exemplo, as operadas nos paralíticos e epiléticos, podem ter uma explicação natural, apesar de que elas mostram que Cristo é o Senhor absoluto da natureza.
Com a oração e a resposta
O que já se disse a respeito da conexão de Deus com a natureza sugere a pergunta: Como pode Deus responder a oração consistentemente com a fixi- dez da lei natural?
Tyndall (ver referência acima), embora repelindo a acusação de negar que Deus pode responder a oração de todos, ainda nega que ele possa respondê-la sem um milagre. Ele diz expressamente que "sem perturbar a lei natural perfeitamente séria como a parada de um eclipse, ou a rolagem do São Lourenço nas Cataratas de Niágara, nenhum ato de humildade individual ou nacional poderia trazer chuva do céu ou mudar o curso do sol para nós". Como resposta, replicamos:
Negativamente, a verdadeira solução não deve encontrar-se:
Fazendo o único efeito da oração ser uma influência reflexa do pedinte.
Oração pressupõe um Deus que ouve e responde. Não deve ser feita a não ser que se creia que cumpre os resultados objetivos e subjetivos.
Conforme o primeiro ponto de vista mencionado acima, a oração é uma simples ginástica espiritual - um esforço para levantarmo-nos do solo atando a nós as correias das botinas. David Hume disse corretamente, depois de ouvir um sermão do Dr. Leechman: "Não podemos utilizar nenhuma expressão ou pensamento nas nossas orações e súplicas que não impliquem a influência de tais orações". O homem orará a um Deus que é surdo-mudo? Soará ao vento o marinheiro ao gurupés apenas para melhorar a sua voz? Horace Bushnell chamava este mau emprego da oração um simples "exercício de sino surdo". O Barão de Münchhausen saiu de um charco na China atando-se à cauda de um suíno.
Hyde, God's Education of Man, 154,155-"A oração não e o ato reflexo da minha vontade sobre ela, mas a comunhão de duas vontades em que o finito entra em conexão com o Infinito e, como o trole, se vale do seu propósito e força". Harnack, Wesen des Christenhums (A Existência do Cristão), 42, parece seguir Schleiermacher numa irracional limitação da oração às petições gerais que só recebem respostas subjetivas. Ele nos diz que "Jesus ensinou a Oração Dominical aos seus discípulos em resposta a um pedido de orientação sobre como orar. Entretanto, em vão buscamos nela requisitos de dádivas especiais de graça, ou bens particulares, muito embora elas sejam espirituais. O nome, a vontade, o Reino de Deus - são os objetos da prece". Harnack esquece que o mesmo Cristo também disse: "tudo o que pedirdes, orando, crendo, recebereis e tê-lo-eis" (Mc. 11.24).
Nem sustentando que Deus responde a oração simplesmente por meios espirituais, tais como a ação do Espírito Santo sobre o espírito do homem.
O reino do espírito não está menos sujeito à lei do que o reino da matéria. A Escritura e a experiência, contudo, igualmente testemunham que em resposta à oração os eventos ocorrem no mundo exterior o que não ocorreria se a oração não tivesse sido feita.
Segundo esta teoria, Deus alimentou o faminto Elias, não com uma mensagem distinta do céu, mas dando uma disposição compassiva para com a viúva de Zarefate (ou Sarepta) de sorte que ela foi movida a ajudar o profeta. 1 Re. 17.9 - "eis que eu ordenei ali a uma mulher viúva que te sustente". Mas Deus também podia sustentar Elias enviando os corvos e o anjo (1 Re. 17.4; 19.15) e o derramamento da chuva que se seguiu à oração de Elias (1 Re. 18.42-45) não pode ser explicado como um fenômeno espiritual subjetivo. Diman, Theistic Argument, 268 - "Nossos atlas mapeiam não só a sólida praia, mas as correntes aéreas do oceano e consultamos os matutinos para certificar sobre a formação de tempestades nos declives das Montanhas Rochosas". Mas a lei governa tanto no reino do espírito como no da natureza.
O Governador Rice em Washington se sentiu movido a enviar dinheiro para uma família faminta em Nova Iorque e garantir-lhe o emprego. Apesar de que ele não tinha nenhuma informação sobre a necessidade, a família se ajoelhou em oração pedindo socorro precisamente antes de vir o auxílio.
Nem sustentando que Deus suspende ou interrompe a ordem da natureza em resposta a cada oração. - Este ponto de vista não leva em conta que as leis naturais têm existência objetiva e revelam a ordem do ser divino. Assim a onipotência pode suspender a lei natural, mas a sabedoria, até onde podemos perceber, não o faz.
A terceira teoria bem podia ser defendida por aqueles que só vêem na natureza a vontade totalmente operada por Deus. Mas as propriedades e forças da matéria são revelações da vontade divina e a vontade humana só tem independência relativa no universo. Desejar que Deus responda todas as nossas orações é desejar a onipotência sem a onisciência. Portanto, toda a verdadeira oração expressa uma petição: "Seja feita a tua vontade" (Mt. 6.10).
E. G. Robinson: "É muito comum orar e muitas orações são destituídas desta qualidade. O homem tem necessidade de orar em voz alta mesmo em particular para obter benefício. Um dos principais benefícios da liturgia inglesa é que o ministro não se destaca. O protestantismo faz com que você trabalhe; no romanismo a igreja faz tudo por você".
ã) Nem considerando a oração como uma força física, ligada em cada caso à sua resposta, como na física a causa está ligada ao seu efeito. - A oração não é uma força agindo diretamente na natureza; caso contrário não haveria nenhuma discrição quanto à sua resposta. Ela pode cumprir os resultados na natureza, só como influência de Deus.
Educamos os nossos filhos de dois modos: em primeiro lugar, ensinando-os a fazer por si mesmos o que eles podem fazer; e em segundo lugar, estimulando-os a buscar auxílio em assuntos além de suas forças. Deus nos educa assim: em primeiro lugar, através de uma lei impessoal e, em segundo lugar, através da dependência pessoal. Ele tanto nos ensina a trabalhar como a pedir. Note a completa falta de sabedoria dos cientistas modernos que se submetem ao ensino da lei impessoal, pondo de parte o mais elevado e
melhor ensino que depende da pessoalidade" (Hopkins, Sermon on the Prayer- gauge, 16).
Parece mais de acordo tanto com a Escritura quanto com a razão dizer que:
Deus pode responder a oração mesmo quando tal resposta envolve mudanças nas seqüências da natureza;
Pelas novas combinações das leis naturais em regiões afastadas da nossa observação de modo que são produzidos os efeitos que, se estas mesmas forças fossem deixadas ao seu destino, nunca teriam cumprido. Como o homem combina as leis da atração química e da combustão para detonar a arma de fogo e explodir a rocha, assim Deus pode combinar as leis da natureza para efetuar as respostas à oração. Em tudo isto não há nenhuma suspensão ou violação da lei, mas o uso de uma lei que desconhecemos.
Hopkins, Sermon on the Prayer-gauge: "A natureza é uniforme em seus processos, mas não em seus resultados. Você diz que a água não pode correr montanha acima? Pode e faz. Sempre que o homem constrói uma barragem a água sobe acima das montanhas em volta até alcançar o topo da barragem. O homem pode fazer uma faísca elétrica cumprir a sua ordem; porque Deus não pode usar um raio de eletricidade? Não somos escravos das leis, mas estas é que são. Elas cumprem as nossas ordens da melhor maneira porque são uniformes. E as nossas servas não são senhoras de Deus". Kendall Brooks: "O senhor de um instrumento musical pode variar sem limite a combinação de sons e as melodias que tais combinações podem reproduzir. As leis do instrumento não se mudam, mas a firmeza imutável produz uma infinita variedade de sons. É necessário que eles sejam imutáveis para garantir o resultado desejado. Assim a natureza, que exerce a capacidade do Mestre divino, é governada por imutáveis leis; mas, por estas leis, ele produz uma infinita variedade de resultados".
Hodge, Popular Lectures, 45, 99 - "O sistema de leis naturais é muito mais flexível nas mãos de Deus do que nas nossas. Atuamos externamente em causas secundárias; Deus age nelas internamente. Agimos sobre elas em apenas uns poucos pontos isolados; Deus age em cada ponto do sistema ao mesmo tempo. A natureza toda pode plasmar-se de tal modo à sua vontade como o ar nos órgãos do grande cantor que o articula em uma expressão adequada a cada pensamento e paixão da sua alma que se eleva". Upton, Hibbert Lectures, 155 - "Se todos os elementos químicos do nosso sistema solar preexistissem na névoa cósmica incandescente, pode não ter havido tempo quando bem subitamente as atrações entre estes elementos vencessem o grau de força calórica que os mantêm separados e a corrida dos elementos na união química deve ter sido consumada com inconcebível rapidez.
O uniformitarismo não é universal".
Shaler, Interpretation ofNature, cap. 2 - Através de um pequeno aumento da força centrífuga a órbita elíptica se muda em uma parábola e o planeta se torna em um cometa. Através de uma pequena redução na temperatura, a água se torna sólida e perde muitos dos seus poderes. Assim ocorrem resultados inesperados e surpresas tão revolucionárias como se uma Força Suprema imediatamente interviesse". William James, Address before Soc. For Psych. Research: "O pensamento transferência pode envolver um ponto crítico, como os psicólogos chamam, que passa só quando algumas condições psíquicas se realizam e de outra forma não se alcançariam - como uma grande conflagração romperá em certa temperatura abaixo da qual nenhuma conflagração, qualquer que seja, grande ou pequena, pode ocorrer". Tennyson, Life,
1.324 - "Orar é como abrir uma comporta entre o grande oceano e os nossos pequenos canais, quando o grande mar se une e flui com sua onda toda".
Porque a oração não é nada mais e nada menos do que um apelo a um Deus pessoal e presente, cuja concessão ou recusa da bênção requerida crê-se que é determinada pela própria oração, devemos concluir que esta deve mover Deus, ou, em outras palavras, induzi-lo a exercer da sua parte uma volição imperativa.
Chalmers, Works, 2.314 e 7.234 elabora o ponto de vista de que, em resposta à oração, Deus combina as forças naturais. Ver Diman, Theistic Argument, 111 - "Quando se concebem as leis não como simples, mas como uma combinação, ao invés de serem imutáveis em sua operação, são agentes de incessante mudança. Os fenômenos são governados não por forças invariáveis, mas por infindas combinações variantes de invariáveis forças''.
Janet, Final Causes, 219 - "Acendo um fogo na minha fornalha. Só interfiro para produzir e combinar os diferentes agentes cuja ação natural importa na produção do efeito que eu necessito; mas dado o primeiro passo todos os fenômenos que constituem a combustão engendram um outro de conformidade com as suas leis, sem uma nova intervenção do agente; assim um observador que estudasse a série destes fenômenos, sem perceber a primeira mão que preparara tudo, não poderia de apoiar-se à mão, em qualquer ato especial, embora haja um plano e uma combinação preconcebidos".
Hopkins, Sermon on Prayer-gauge: O homem, espalhando cal no campo pode fazer o cereal crescer mais abundantemente; acendendo grandes fogueiras e pondo fogo em canhão, pode provocar chuva; seguramente Deus, em resposta à oração, pode fazer tanto quanto o homem faz. Lewes diz que o caráter fundamental de toda a filosofia teológica é a concepção dos fenômenos como sujeitos à volição sobrenatural e, conseqüentemente, de modo tão eminente como irregularmente variável. Esta noção, diz ele, é refutada, em primeiro lugar, pela previsão exata e racional dos fenômenos e, em segundo lugar, pela possibilidade de modificarmos estes fenômenos de modo a promover a nossa própria vantagem. Mas, em resposta, perguntamos: se nós podemos modificá-los, e Deus, não pode? Mas, para que isto não pareça implicar mutabilidade de Deus ou inconsistência na natureza, em acréscimo, assinalamos que:
Deus pode predispor as leis do universo material e os eventos da história de tal modo que, conquanto a resposta à oração seja uma expressão da vontade dele, é atendida através da operação de agentes naturais perfeitamente de acordo com o princípio geral de que os resultados, tanto temporais como espirituais, devem ser alcançados pelas criaturas inteligentes através do uso de recursos apropriados e designados.
J. P. Cooke, Credentials of Science, 194 - "O tear de Jacquard por si mesmo teceria uma fabricação perfeitamente uniforme; os cartões perfurados determinam uma seleção de linhas e, através de uma combinação de variadas condições tão complexas que o observador não pode seguir seus intricados trabalhos, aparece o predeterminado padrão". E. G. Robinson: "A mais formidável objeção a esta teoria é o aparente semblante que empresta à doutrina necessitária. Mas se ele pressupõe que se levaram em conta as ações livres, não se pode facilmente mostrar que isto é falso". O bispo a quem se pediu através do seu curado que sancionasse as orações pedindo chuva era excessivamente cético quando respondeu: "Consulte primeiro o barômetro". Phillips Brooks: "Orar não é conquistar a relutância de Deus, mas sustentar a voluntariedade de Deus", seco o lugar onde o auditório tinha-se reunido e, no dia seguinte, as chuvas desceram sobre a terra onde no dia anterior não tinham caído.
Os peregrinos de Plymouth, em alguma parte em 1628, oravam pedindo chuva. Reuniram-se às 9 da manhã e continuaram a orar durante 8 ou 9 horas seguidas. Enquanto estavam reunidos ajuntaram-se nuvens e, na manhã seguinte começou a cair chuva que, com alguns intervalos, durou catorze dias. John Easter foi há muitos anos evangelista em Virgínia. Estava sendo realizada uma reunião ao ar livre. Milhares de pessoas participaram quando nuvens de pesada tempestade começaram a formar-se. Não havia abrigo para que as multidões se protegessem. A chuva já tinha atingido os campos quando John Easter bradou: "Tenham calma, irmãos, enquanto eu invoco a Deus para que pare a tempestade até que o evangelho seja pregado a esta multidão"! Então ele se ajoelhou e orou para que o auditório pudesse passar sem a chuva e que depois que eles tivessem ido pudessem ter refrescantes chuvas. Eis que as nuvens se foram como tinham chegado e passaram do lado da multidão e depois fecharam outra vez deixando seco o lugar onde o auditório tinha-se reunido e, no dia seguinte as chuvas desceram sobre o campo onde ela não havia caído no dia anterior.
Porque Deus é imanente na natureza, uma resposta à oração, ocorrendo através da intervenção da lei natural, pode ser uma revelação tão real do cuidado pessoal de Deus como se as leis da natureza fossem suspensas e Deus interviesse através do exercício de seu poder criativo. Oração e resposta, apesar de terem a volição imediata de Deus como seu limite de conexão podem ainda alcançar providência no plano original do universo.
O universo não existe para si mesmo, mas para fins morais e para seres morais, para revelar Deus e facilitar o intercâmbio entre Deus e as criaturas
inteligentes. Bispo Berkeley: "O universo é a incessante conversa de Deus com as suas criaturas". O universo sem dúvida se presta a fins morais - o dissuasão ao vício e a recompensa à virtude; por que não a fins espirituais também? Quando nos lembramos de que não existe nenhuma oração verdadeira que Deus não inspire; que a verdadeira oração é uma parte do plano do universo unido a todo o restante e que recebeu provisões no começo; que Deus está na natureza e na mente supervisionando todos os seus movimentos, tornando cumprida a sua vontade e revelando o seu cuidado pessoal; que Deus pode ajustar as forças da natureza umas às outras muito mais habilmente do que o homem quando produz os efeitos que a natureza por si nunca pôde cumprir; que Deus não está confinado à natureza ou às forças dela, mas é capaz de operar por sua obra criativa e vontade onipotente, onde não bastam outros meios, - não precisamos ter medo algum ou de que a lei natural barrará as respostas divinas à oração, ou que estas respostas causarão um choque ou uma dissonância no sistema do universo.
Matheson, Messages of the Old Religions, 321,322 - A poesia hebraica nunca trata a natureza exterior por nossa causa. O olho nunca repousa na beleza por ela mesma. Os céus são a obra das mãos de Deus, a terra é o escabelo dos pés de Deus, os ventos são os ministros de Deus, as estrelas são o exército de Deus, o trovão é a voz de Deus. O que chamamos natureza o judeu chama Deus". Srta. Heloise E. Hersey: "Platão, no Fedro, expõe em um esplêndido mito os meios pelos quais os deuses se refrigeram. Uma vez por ano, em um exército poderoso, eles conduzem as carruagens até o mais alto cume do céu. Daí eles podem contemplar as maravilhas e os segredos do universo; e avivados pela vista da grande planície da verdade, voltam refeitos e se alegram com a visão celestial. Arcebispo Trench, Poems, 134 - "Senhor, que mudança dentro de nós uma breve hora passada na tua presença prevalecerá para tornar - o que as cargas pesadas dos nossos peitos levam que ressequido solo se refresca como se chovesse! Ajoelhamo-nos e tudo em torno de nós parece humilhar-se; levantamo-nos todos distantes ou próximos avança em um esboço ensolarado, bravo e claro; Como fracos ajoelhamo-nos e levantamo-nos cheios de poder! Por isso, por que cometeremos este erro ou outros - para não sermos sempre fortes; para estarmos sempre sobrecarregados de cuidados; para sermos fracos e apáticos, ansiosos ou perturbados quando conosco em oração e a alegria e a força e a coragem estão em ti?
Ao perguntar-se se a relação entre a oração e sua providencial resposta pode ser testada cientificamente, respondemos que pode como um filho obediente pode testar o amor do pai.
Há uma prova geral na experiência passada do cristão e na história passada da igreja.
SI. 116.1-8 - "Amo ao Senhor porque ele ouviu a minha voz e a minha súplica". Lutero ora pela morte de Melanchton, e ele recupera. George Müller confia na oração e constrói seus grandes orfanatos. Charles H. Spurgeon:
"Se há algum fato que pode ser provado é que Deus ouve a oração. Se há
qualquer declaração científica capaz de comprovação matemática, esta é uma".
A linguagem do Sr. Spurgeon é retórica: ele simplesmente quer dizer que a resposta de Deus ã oração remove toda dúvida. Adoniram Judson: "Eu nunca estive profundamente interessado em qualquer objeto, nunca orei sincera e fervorosamente por alguma coisa, mas ela veio; às vezes - não importa a distancia do dia - de algum modo, de alguma forma, provavelmente a última coisa que eu poderia ter divisado - veio. E ainda sempre tenho tido a minha fé tão pequena! Que Deus me perdoe e embora ele condescenda em usar-me como seu instrumento, apaga o pecado da incredulidade do meu coração!"
Na condescendência para com a cegueira humana, Deus pode às vezes submeter a um teste formal de sua fidelidade e poder, - como no caso de Elias e os sacerdotes de Baal.
Is. 7.10-13 - Acaz é repreendido por não pedir um sinal, - em Acaz ele indica descrença. 1 Re. 18.36-38 - Disse Elias: "manifeste-se hoje que tu és Deus em Israel ... então caiu fogo do Senhor e consumiu o holocausto". Romaine fala de "um ano famoso pela descrença". Mt. 21.21,22 - "mas se até a este monte disserdes: Ergue-te e precipita-te no mar, assim será feito.
E tudo o que pedirdes na oração, crendo, o recebereis". "Impossível?" diz Napoleão; "então se fará!" Arthur Hallam, citado em Tennyson, Life, 1.44 - "Sobre a oração, você me pergunta como distinguir as operações de Deus em mim a partir dos movimentos em meu coração. Por que você os distinguiria, ou como você sabe que há distinção? É Deus menor porque ele age através de leis gerais quando trata dos elementos comuns da natureza?" "Preste atenção na oração para ver o que sucederá. Meninos traquinas que batem a uma porta por travessura, não ficam esperando que alguém a abra; mas o homem que tem um assunto a tratar bate e bate até obter resposta".
Martineau, Seat of Authority, 102,103 - "Deus não somente está além da natureza, - ele está nela. Na natureza e na mente devemos encontrar a ação do seu poder. Não há necessidade alguma de que ele seja um terceiro fator bem acima da natureza e da vida do homem". Hartley Coleridge: "Não tenhas medo de orar, - orar é um direito. Se não podes orar com esperança, mas oras, embora a esperança seja fraca, ou adoeça por causa da demora:
Ora na escuridão, se não há luz. Longo é o tempo, distante da vista humana, quando a guerra e a discórdia na terra cessarem; Se desejares o bem, pede- o ao céu, embora não esperes vê-lo; Ora buscando a perfeição, apesar de que o fermento impede ao espírito que chegue a alcançá-la aqui na terra; Mas se por qualquer circunstância não tens coragem de orar, ora, então a Deus pedindo que afaste tal indisposição".
Quando já foi dada a prova suficiente para convencer o cândido inquiridor, não pode haver consistência com a majestade divina continuar a impor um teste por simples curiosidade ou ceticismo, - como no caso dos judeus que pediam um sinal do céu.
Mt. 12.39 - "Uma geração má e adúltera pede um sinal, porém não se lhe dará outro sinal, senão o do profeta Jonas". A oração padrão de Tyndall garantiria um conflito de orações. Porque a nossa vida presente é uma provação moral, a demora na resposta às nossas orações e mesmo a negação de coisas específicas que nós pedimos pode apenas ser sinal da fidelidade e amor de Deus. George Müller: "Eu mesmo tenho apresentado alguns pedidos diante de Deus por dezessete anos e seis meses e até hoje não passei um só dia sem orar por eles; contudo, a resposta completa não ocorreu até agora. Mas eu espero; confiadamente espero". A oração de Cristo, "passa de mim este cálice" (Mt. 26.39), e a de Paulo para que pudesse passar o seu "espinho na carne" (2 Co. 12.7,8), não foram respondidas no sentido preciso do que se pediu. As nossas orações são respondidas da forma que esperamos. A oração de Cristo não foi respondida com a remoção literal do cálice, porque bebê-lo era realmente a glória dele; e a de Paulo não foi respondida pela a remoção literal do espinho porque este era necessário ao seu aperfeiçoamento. Tanto no caso de Jesus como no de Paulo, havia interesses maiores a serem consultados do que a libertação do sofrimento.
Porque a vontade de Deus é a ligação entre a oração e a resposta não pode haver uma demonstração física de sua eficácia em qualquer caso proposto. Os testes físicos não têm aplicação às coisas em que a vontade livre entra como elemento constitutivo. Mas há testes morais e estes são tão científicos como os físicos.
Diman, Theistic Argument, 576, faz referência à negação de Goldwin Smith de que qualquer método científico pode ser aplicado à história porque faria o homem um elo necessário em uma cadeia de causa e efeito e assim negaria sua vontade livre. Mas Diman diz que isto não é mais impossível que o desenvolvimento do acordo individual relativo a uma lei fixa de crescimento, enquanto ainda a vontade livre é assiduamente respeitada. Froude diz que a história não é ciência porque nenhuma ciência poderia predizer o Maometa- nismo ou o Budismo; e Goldwin Smith diz que "a predição é a coroa de toda ciência". Mas Diman assinala; "a geometria, a geologia, a fisiologia são ciências, apesar de que elas não predizem". Buckle pôs a história em condição de desprezo afirmando que ela poderia ser analisada e mencionada somente com relação às leis e forças intelectuais. Contra tudo isto replicamos que pode haver testes científicos que não são físicos e nem mesmo intelectuais, porém somente morais. Tal teste Deus determina que o seu povo use em Ml. 3.10 - "Trazei os vossos dízimos à casa do Senhor... e depois fazei prova de mim, diz o Senhor dos Exércitos, se eu não vos abrir as janelas do céu e não derramar sobre vós uma bênção tal que dela vos venha maior abastan- ça". Tal oração é um reflexo das palavras de Cristo - um fragmento do seu ensino transformado em súplica (Jo. 15.7) Tal oração inteira é ainda a obra do Espírito de Deus (Rm. 8.26,27). É, portanto a certeza de uma resposta.
Mas o teste da oração proposto por Tyndall não se aplica à coisa a ser testada por ela. Hopkins, Prayer and tha Prayer-gauge, 22 sgs. - "Não podemos medir o trigo pela jarda ou o peso de um discurso com um par de balanças.
... A sabedoria de Deus pôde ver que não é o melhor para os que pedem nem para os objeta-vos da sua petição aceitar o pedido. Portanto, os crentes não puderam, sem autorização divina especial, descansar a sua fé nos resultados de tal teste. ... Por que podemos nós pedir grandes mudanças na natureza? Pela mesma razão que uma criança bem informada não pede a lua como um brinquedo. ... A oração tem duas limitações. Em primeiro lugar, a não ser por direção especial de Deus, não pode-mos pedir um milagre, pela mesma razão que uma criança não pediria a seu pai que queimasse a casa abaixo.
A natureza é a casa em que vivemos. Em segundo lugar, não podemos pedir qualquer coisa sob as leis da natureza que se contraponha ao objetivo de tais leis. Qualquer coisa que pudermos fazer por nós mesmos sob estas leis, Deus espera que façamos. Se a criança está com frio, deixe-a aproximar-se do fogo, - não peça a seu pai que a carregue".
A Sociologia de Herbert Spencer é apenas física social. Ele nega a liberdade e declara que qualquer que afixar D.V. (Deo Volente = se Deus quiser) ao anúncio da Conferência do Mildmay é incapaz de entender de sociologia.
A previsão exclui a vontade divina ou a humana. Mas o Sr. Spencer insinua que os males da seleção natural podem ser modificados pela seleção natural.
O que é isto senão a interferência da vontade? E se o homem tem a capacidade de interferir, Deus não pode fazer o mesmo? Até a criança sábia não espera que o pai dê tudo o que ela pede. Nem o pai que ama o filho lhe dá como brinquedo uma navalha, ou o enche de doces prejudiciais à saúde somente porque o filho deseja tais coisas. Se um operador de navio me desse a permissão para mover a alavanca que põe o mecanismo todo em movimento, eu abriria mão do meu poder e preferiria deixar a responsabilidade com ele a menos que antes ele me sugerisse e me apresentasse o processo de funcionamento. Assim o Espírito Santo "ajuda nossas fraquezas; porque não sabemos o que havemos de pedir como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós com gemidos inexprimíveis" (Rm. 8.26). E não devemos falar em "submeter" à perfeita Sabedoria, ou em resignar-se ao perfeito Amor. Shakespeare, Antônio e Cleópatra, 2.1 - "O que eles (deuses) negam adiar eles não negam.... Nós, ignorantes de nós mesmos, pedimos com freqüência nossos próprios malefícios que as sábias forças nos negam para o nosso próprio bem; assim encontramos proveito em deixar de receber nossos rogos".
Com a atividade cristã
Aqui a verdade está entre os dois extremos do quietismo e do naturalismo.
Em oposição ã falsa abnegação da razão humana e da vontade que o quietismo demanda, sustentamos que Deus nos guia, não através do contínuo milagre, mas por sua natural providência e energia das nossas faculdades através de seu Espírito, de modo que racional e livremente fazemos a nossa própria obra e operamos a nossa própria salvação.
Upham, Interior Life, 356, define o quietismo como "a cessação de pensamentos vagantes e imaginações discursivas, sobra dos desejos e afeições
irregulares e perfeita submissão da vontade". Seus defensores, contudo, têm freqüentemente falado disto como um abandono da nossa vontade e razão e a absorção total destas pela sabedoria e vontade de Deus. Esta fraseologia é equívoca e tem sabor de uma incorporação panteísta do homem em Deus. Dorner: O quietismo faz de Deus um monarca sem súditos vivos". Alguns quietistas ingleses, como os maometanos, não usarão os médicos em caso de doença. Eles citam 2 Cr. 16.12,13 - Asa "não buscou ao Senhor, mas os médicos. E Asa dormiu com seus pais". Eles se esquecem de que os médicos citados em Crônicas eram, provavelmente, os necromantes pagãos. Cromwell aos seus Ironsides (homens de atitude férrea): "Confiai em Deus, e conservai a vossa pólvora seca!"
A providência não exclui, ao contrário, implica a operação da lei natural pela qual entendemos o meio regular da atuação de Deus. Não abre espaço para desculpa do sarcasmo do Medium Sr. Sludge de Robert Browning, 223 - "Poupai o vosso precioso eu daquilo que acontece aos trinta e três que a providência esqueceu". Schurman, Belief in God, 213 - Os templos estão repletos de ofertas votivas dos que só escaparam do afogamento". Bentham costumava dizer, quando algo particularmente aparente não ocorria como catástrofe natural. Deus se revela na lei natural. Os médicos e os remédios são os métodos dele, do mesmo modo que a concessão de fé e coragem ao paciente. Os que defendem a cura pela fé devem prover pela fé para que nenhum crente morra. Com os milagres apostólicos deve caminhar a inspiração segundo a declaração de Edward Irving. "Todo homem é tão ocioso como admitem as circunstâncias". Lançamos sobre os ombros da Providência os fardos cujo transporte é de nossa competência. "Operai a vossa salvação com temor e tremor; pois é Deus quem opera em vós tanto o querer como o efetuar, segundo o seu beneplácito" (Fp. 2.12,13).
A oração sem o uso dos meios é um insulto a Deus. "Se Deus decretou que você deve viver, para que comer ou beber"? Pode um homem que está se afogando recusar-se a nadar, ou deixar de agarrar-se à corda que lhe é lançada e ainda pedir a Deus que o salve porque ele tem fé? "Amarre o seu camelo", diz Maomé, "e confie-o a Deus". Frederick Douglas costumava dizer que, quando escravo, freqüentemente orava por liberdade, mas sua oração nunca foi respondida até que ele orou com os seus pés - e saiu correndo. Whitney, integrity of Christian Science, 68 - "A existência do dínamo na casa de força não torna desnecessário o cabo do trole, nem o motor secundário, nem a aplicação da força do condutor. O verdadeiro quietismo é descansar no Senhor após ter feito a nossa parte". SI. 37.7 - "Descansa no Senhor e espera nele"; Is. 57.2 - "Ele entrará em paz; descansarão nas suas camas os que houveram andado na sua retidão". Ian MacLaren, Cure of Souls, 147 - "A religião tem três lugares de permanência: na razão, que é a teologia; na consciência, que é a ética; no coração, que é o quietismo".
George Müller, escrevendo sobre a certeza da vontade de Deus, diz: No começo eu procuro ter meu coração em tal estado que não tenha vontade por si mesmo com relação a um dado assunto. Nove décimos das atividades são vencidos quando os nossos corações estão prontos para fazer a vontade do Senhor, qualquer que seja. Feito isto, não deixo de sentir o resultado ou a sua simples impressão. Se ajo desta forma, eu me exponho a um grande
engano. Busco a vontade do Espírito de Deus através do seu Verbo, ou em conexão com ele. O Espírito e o Verbo devem estar em sintonia. Se olho para o Espírito sem o Verbo, abro espaço também para grandes enganos. Afinal de contas, se o Espírito Santo nos guia, ele o faz de acordo com as Escrituras e nunca as contraria. A seguir, leva em conta as circunstâncias providenciais. Com freqüência, estas indicam claramente a vontade de Deus em conexão com o Verbo e o Espírito. Peço a Deus em oração que me revele a vontade correta. Através da oração a Deus, do estudo da Palavra e da reflexão entro em deliberado juízo sobre o meu melhor conhecimento e habilidade e, se a minha mente estiver em paz, eu continuo".
Não devemos confundir piedade racionai com falso entusiasmo. Ver Isaac Taylor, Natural History of Enthusiasm. "O que se exige de nós não é quietude (em Inglês quiescence), mas aquiescência". Como Deus alimenta "as aves do céu" (Mt. 6.26) não com gotas de comida nas suas bocas, mas estimulando-as a buscar o alimento por si mesmas, assim Deus provê às suas criaturas racionais dando-lhes um senso comum santificado e levando-as para usá-lo.
No verdadeiro sentido o cristianismo nos dá mais desejo do que nunca.
O Espírito Santo emancipa a vontade, estabelece-a sobre os objetivos apropriados, e enche-a de nova energia. Portanto, não devemos nos render passivamente a tudo o que professa ser uma sugestão divina; 1 Jo. 4.1 - "não creiais em todo espírito, mas provai se os espíritos são de Deus". O teste é a palavra de Deus revelada: Is. 8.20 - "À lei e ao testemunho! Se eles não falarem segundo és-ta palavra, nunca verão a alva".
Em oposição ao naturalismo, sustentamos que Deus está continuamente perto do espírito humano por sua operação providencial e esta se ajusta à natureza e necessidades do cristão quanto ao fornecimento de instrução relativa ao dever, à disciplina do caráter religioso e do auxílio e conforto necessários nas provações.
Na interpretação das providências de Deus, como na da Escritura, dependemos do Espírito Santo. A obra do Espírito é, sem dúvida, em grande parte uma aplicação da verdade da Escritura às circunstâncias presentes. Embora nunca nos permitimos agir cega ou irracionalmente, mas costumamos ponderar a evidência com relação ao dever, devemos esperar, como dom do Espírito, um entendimento das circunstâncias - fino sentido dos propósitos providenciais com relação a nós, o que fará curso claro para nós, apesar de que nem sempre somos capazes de explicá-lo aos outros.
O crente pode ter uma divina orientação contínua. Diferente do infiel e incrédulo de quem se diz no SI. 106.13, "não esperam o seu conselho", o verdadeiro crente tem a sabedoria do alto. SI. 32.8 - "Instruir-te-ei e ensinar- te-ei o caminho que deves seguir"; Pv. 3.6 - "Reconhece-o em todos os teus caminhos e ele endireitará as tuas veredas"; Fp. 1.9 - "E peço isto: que o vosso amor aumente mais e mais em ciência e em todo o conhecimento" (criaGiiaei = discernimento espiritual); Tg. 1.5 - "se algum de vós tem falta de
sabedoria, peça-a a Deus, que a todos dá liberalmente e não o lança em rosto"; Jo. 15.15 - "Já vos não chamarei servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor, mas tenho-vos chamado amigos"; Cl. 1.9,10 - "que sejais cheios do conhecimento da sua vontade em toda a sabedoria e inteligência espiritual para que possais andar dignamente diante do Senhor, agradando-lhe em tudo".
O Espírito de Deus torna tanto a Providência como a Bíblia um elemento pessoal para nós. O Deus vivo nos fala a partir de cada página da natureza, assim como da Bíblia. Tholuck: "Quanto mais reconhecemos em cada ocorrência diária a secreta inspiração de Deus, guiando-nos e controlando-nos, mais tudo o que aos outros parece um aspecto comum e diário nos provará ser um sinal e uma obra maravilhosa". Hutton, Essays. "Animais que são cegos escravos do impulso levados por forças interiores, têm, por assim dizer, poucas válvulas na sua constituição moral para entrar na orientação divina. Mas as mentes vivificadas em cada palavra de Deus dão constante oportunidade de interferir nas sugestões que podem alterar o curso da sua vida. Quanto mais elevada é a mente, mais desliza para a região do controle providencial. Deus transforma o bem através do mais frágil sopro do pensamento". Assim, o hino cristão "Guia-me, grande Yahweh!" compara a direção que Deus exerce sobre o crente com a de Israel através da coluna de fogo e da nuvem; e Paulo, em seu calabouço chama-se a si mesmo "prisioneiro de Jesus Cristo" (Ef. 3.1). A aflição é a disciplina da providência de Deus. Provérbio grego: "Aquele que não leva surra não recebe educação".
Abraão "saiu sem saber para onde ia" (Hb. 11.8). Não conhecia o lugar do seu destino, a não ser depois de chegar a Canaã. Como um filho, ele pôs a sua mão na mão do seu Pai invisível, para ser conduzido ao lugar que ele não conhecia. Freqüentemente somos guiados sem discernimento disso. Is. 42.16
"Guiarei os cegos por um caminho que nunca conheceram; fá-los-ei caminhar por veredas que não conheceram". Assim agimos mais sabiamente do que nós mesmos entendemos e depois olhamos para trás com espanto para ver o que fomos capazes de cumprir. Emerson: "Mesmo vindo de Deus por si não podia libertar-se; ele construiu melhor do que sabia". Provérbio chinês: "O bom Deus nunca fere com as duas mãos". O tato é um tipo de automatis- mo psíquico" (Ladd). Há um tato cristão que raramente é uma falha porque aquele que o possui "é guiado pelo Espírito de Deus" (Rm. 8.14). Contudo, devemos sempre fazer concessões como Cromwell costumava dizer, "em favor da possibilidade de errar".
Quando os amigos de Lutero escreveram desesperançados sobre as negociações na Dieta de Worms, de Coburgo ele respondeu que estivera olhando para o alto ao céu noturno, recoberto de estrelas como lantejoulas e não tinha visto nenhuma coluna sustentando-as. E mesmo assim elas não caiam. Deus não precisa de nenhuma escora para as suas estrelas e planetas. Ele não as suspende em nada. Assim, na obra da providência de Deus, o invisível é a escora do visível. Henry Drummond, Life, 127 - "Processos para encontrar a vontade de Deus: 1. Orar. 2. Pensar. 3. Conversar com sábios, mas não considerar como final a decisão deles. 4. Acautelar-se quanto à tendência da sua vontade, mas não ter muito medo dela (Deus nunca opõe necessariamente a natureza e predileções do homem. É um erro pensar que
a vontade dele está sempre em linha de desacordo). 5. Enquanto isso, faça o que se segue (porque fazer a vontade de Deus nas pequenas coisas é o melhor preparo rumo ao conhecimento dela sobre as grandes coisas).
6. Quando há necessidade de decisão e ação, siga à frente. 7. Nunca reconsidere a decisão uma vez executada. 8. É provável que você nunca descubra, mesmo mais tarde, talvez muito mais tarde que, afinal de contas, você foi dirigido".
Amiel lamentava que tudo havia sido deixado sob a sua responsabilidade e declarava: "Este é o pensamento que me desgosta sobre o governo da minha vida. Para obter a verdadeira paz, o homem precisa sentir-se dirigido, perdoado e sustentado por uma Força suprema, a fim de sentir-se no caminho certo, no lugar em que Deus quer que ele esteja, - em harmonia com Deus e com o universo. Tal fé fortalece e acalma. Eu não a tenho. Tudo me parece arbitrário e fortuito". Muito melhor é a fé que sentia Wordsworth, Excursion, livro 4.581 - "Só existe um apoio adequado às calamidades da vida moral: uma firme crença em que o processo do nosso destino, conquanto triste e perturbado, é ordenado por um Ser de infinita benevolência e poder, cujos propósitos eternos abrangem todos acidentes, convertendo-os em bem". Sra. Browning, De profundis, estrofe xxiii - Enquanto prosseguem meus dias, "louvo-te; enquanto os meus dias prosseguem, amo-te! Em meio a trevas e fome, em meio a fogo e gelo, de mãos vazias e tesouro perdido, graças te dou enquanto prosseguem meus dias!"
4. Com os maus atos dos agentes livres
Devemos aqui distinguir entre a atuação natural e a atuação moral de Deus, ou entre os atos da providência permissiva e os atos da causa eficiente. Sempre devemos lembrar que Deus nem opera o mal, nem faz as suas criaturas operá-lo. A culpa de todo o pecado é a vontade própria e a perversidade da criatura; declarar Deus o seu autor é a maior das blasfêmias.
Bispo Wordsworth: "Deus prevê as más ações, mas nunca as forçá'. Deus não causa o pecado, assim como o cavaleiro em um ginete que coxeia causa a sua coxeadura". Nem se pode dizer que Satanás é o autor do pecado do homem. As forças do homem são dele. Não é Satanás, mas o próprio homem que faz aplicação errada das suas forças. Ele não é a causa, mas a ocasião do pecado que está na ira; a causa está na vontade má que produz a sua persuasão.
Porém, conquanto o homem forma sua má decisão independentemente de Deus, por sua atuação natural, ele ordena o método em que este mal interior se expressará, limitando-o no tempo, no lugar e na medida, ou dirigindo- o para o fim que a sua sabedoria e o amor (não a intenção do homem) estabeleceram. Em tudo isto, contudo, Deus só permite que o pecado se desenvolva segundo a sua própria natureza, de modo que possa ser conhecido, detestado e, se possível, vencido e renegado.
Philippi, Glaubenslehre, 2.272-284 - "A traição de Judas opera a reconciliação do mundo, e a apostasia de Israel a salvação dos gentios. ... Deus abranda o caminho do pecador e lhe dá a oportunidade da insurreição contra o mal como o sábio médico que traz para a superfície do corpo a doença que o tem devasta interiormente, para que possa ser curado, se possível, através de recursos brandos, ou, se não, com a faca".
O cristianismo levanta-se apesar de, ou melhor, em conseqüência da oposição, como uma pipa contra o vento. Quando Cristo usou a espada de que ele se cingiu, como usou Ciro e o Assírio, quebrou-a e lançou-a fora. Ele transtorna o mundo que ele mesmo ordenou. Vale-se de cada membro da sociedade como a locomotiva usa cada dente da engrenagem. Os sofrimentos dos mártires aumentam em número a igreja; o culto das relíquias estimula as Cruzadas; o culto dos santos leva a peças de milagres e ao drama moderno; o culto de imagens auxilia a moderna arte; o monasticismo, o escolasticismo, o papado, e mesmo a crítica cética e destrutiva levantam defensores da fé. Shakespeare, Ricardo III, 5.1 - "Assim ele força a espada dos ímpios a tornarem seus próprios pontos contra os peitos dos seus senhores"; Hamlet,
1.2 - "Os atos criminosos aparecerão aos olhos dos homens, muito embora estejam sepultados no mais profundo solo" vol. I Abril p. 214; Macbeth, 1.7 - "A justiça, com a mão eqüitativo, apresenta a nossos próprios lábios os ingredientes do cálice que nós mesmos empeçonhamos" (idem p. 133).
O imperador da Alemanha foi a Paris incógnito e voltou, pensando que ninguém tinha notado a sua ausência. Mas a cada passo, indo e vindo, ele estava rodeado de detetives que viam que nenhum mal se aproximava dele.
A andorinha repetidas vezes se dirigia para uma mariposa, mas havia uma vidraça entre ambos e nenhuma das duas o sabia. Charles Dickens pôs o queixo de encontro ao vidro da redoma da cobra, mas não pôde evitar de sobressaltar-se quando a cobra o atacou. Tácito, Annales, 14.5 - "Noctem sideribus illustrem, quasi convincendum ad scelus, dii praebuere" - "os deuses concederam uma noite brilhante de estrelas, como se tivessem o propósito de provar um crime". Ver F. A. Noble, Our Redemption, 59-76, sobre o registro de si mesmo e a revelação dos seus próprios pecados com a citação do discurso de Daniel Webster no caso de Knapp em Salém: "Convém confessar. Confessar-se-á. Não há nenhum refúgio da confissão a não ser o suicídio e o suicídio é confissão".
Nos casos da persistente iniqüidade, a providência de Deus ainda compele o pecador a cumprir o desígnio para o qual ele e todas coisas foram criadas, a saber, a manifestação da santidade de Deus. Apesar de lutar contra o plano de Deus, pela sua própria resistência, deve servir o dito plano. O pecado se faz o próprio detentor, juiz, atormentador dele. Seu caráter e sentença tornam-se uma advertência para os outros. Recusando glorificar Deus na sua salvação, ele o glorifica na destruição.
Is. 10.5,7 - "Ai da Assíria, a vara da minha ira! Porque a minha indignação é como o bordão nas minhas mãos.... ainda que ele não cuide assim". Charles
Kingsley, Two Years Ago: "Ele [Treludra] é uma daquelas naturezas básicas que o fato só açoita em grande fúria, - a Faraó, cujo coração o próprio Senhor só pode endurecer" - aqui acrescentaríamos a qualificação: 'em consistência com os limites que ele estabeleceu para a operação da sua graça'. A ordem de Faraó para destruir as crianças israelitas (Ex. 1.16) tornou-se o meio de pôr Moisés sob a proteção real, de treiná-lo para a obra futura e, por fim, resgatar toda a nação cujos filhos Faraó procurou destruir. Assim, do bem Deus extrai o mal. Emerson: Minha vontade se cumprirá, Pois à luz do dia como nas trevas O raio tem olhos para ver o seu caminho de volta ao para a minha terra".
Cl 2.15 - "despojando os principados e potestades" - as hostes dos espíritos maus como enxames sobre ele em seu ocaso final - "os expôs publicamente e deles triunfou em si mesmo" i.e. na cruz, tornando assim o mal que eles praticaram em um bem. Royce, Spirit of Modern Philosophy, 443, - O Amor, andando à procura do mal absoluto, é como a lâmpada elétrica na pesquisa de uma sombra; quando o amor chega, a sombra desaparece". Porém isto não significa que todas as coisas são boas, mas que "todas as coisas cooperam para o bem" (Rm. 8.28). - Deus, encaminhando para o bem aquilo que em si mesmo é mau. John Wesley: "Deus sepulta o seu obreiro, mas continua a sua obra". Sermão sobre "Os Equívocos do Diabo": Satanás pensava que podia vencer Cristo no deserto, no jardim e na cruz. Ele triunfou quando lançou Paulo na prisão. Mas a cruz foi para Cristo um levantamento que atrairia todos a ele (Jo. 12.32), e o aprisionamento de Paulo forneceu suas epístolas ao Novo Testamento.
"Uma das maravilhas do amor divino é que mesmo as nossas máculas e pecados Deus tomará quando verdadeiramente nos arrependemos e as entregamos nas suas mãos e de algum modo transformam-se em bênçãos.
Um amigo certa vez mostrou a Ruskin um lenço caro no qual havia uma mancha de tinta. 'Nada se pode fazer com isso', disse o amigo pensando que o lenço perdera o valor e agora estava estragado. Ruskin levou-o consigo e, depois de um certo tempo, devolveu-o ao amigo. De uma forma hábil e artística ele fez um esplêndido desenho com tinta da índia, usando o borrão como sua base. Ao invés de danificado, o lenço se tornou muito mais belo e precioso. Assim Deus faz os borrões e manchas nas nossas vidas, os nossos defeitos quando os cometemos a ele e, por sua maravilhosa graça, transforma-os em marcas de beleza. O aflitivo pecado de Davi não só foi perdoado, mas tornou-se um poder transformador na sua vida. A dolorosa queda de Pedro tornou-se um passo acima pelo perdão do Senhor e seu gentil tratamento". Assim "os homens podem levantar-se pisando as pedras do seu eu rumo às coisas mais elevadas" (Tennyson, In Memoriam, I).
SEÇÃO IV - OS ANJOS BONS E OS MAUS
Como ministros da providência divina há uma classe de seres finitos, de maior inteligência e poder do que o homem em seu estado presente, alguns dos quais servem positivamente ao propósito de Deus através da santidade e
execução voluntária de sua vontade, alguns negativamente, dando ao universo exemplos de rebelião derrotada e punida e ilustrando a graça distinta de Deus na salvação do homem.
As sutilezas dos escolásticos que embaraçaram esta doutrina na Idade Média e as representações exageradas do poder dos espíritos maus que então prevaleciam, conduziram, por reação natural, a uma indevida depreciação da matéria em tempos mais recentes.
Para as discussões escolásticas ver Tomás de Aquino, Summa (ed. Migne), 1.833-993. Os escolásticos debatiam questões tais como quantos anjos podem ao mesmo tempo ficar na ponta de uma agulha (relação dos anjos com o espaço); se um anjo pode estar em dois lugares ao mesmo tempo; qual é o intervalo entre a criação dos anjos e a sua queda; se o pecado de um anjo causou o pecado dos demais; se os que retiveram a integridade são tantos quantos os que caíram; se a nossa atmosfera é o lugar da punição dos anjos decaídos; se os anjos da guarda têm a sua incumbência a partir do batismo, ou desde o nascimento, ou enquanto a criança está no ventre materno; mesmo os excrementos dos anjos são objeto de discussão, pois se há "comida de anjos" (SI. 78.25) e se os anjos comiam (Gn. 18.8), argumentava-se que devemos seguir as conseqüências lógicas.
Dante considera a criação dos anjos simultânea à do universo em toda a extensão. "Ele considera que a queda dos anjos rebeldes ocorreu dentro de vinte segundos após a criação e se originou no orgulho que fez Lúcifer não querer esperar o tempo prefixado pelo seu Criador para iluminá-lo com o seu perfeito conhecimento" - Ver Rossetti, Sombra de Dante, 14,15. Diferentemente de Dante, Milton põe a criação dos anjos em eras antes da criação do homem. Ele nos conta que o primeiro nome de Satanás no céu já se perdeu.
As sublimes associações com que Milton cerca o adversário diminui nossa aversão do maligno. Satanás foi chamado o herói do Paraíso Perdido. A representação de Dante é muito mais verdadeira com relação à Escritura. Mas não devemos chegar ao extremo de dar designações ridículas ao Diabo. Isto indica e causa ceticismo quanto à sua existência.
No período medieval a mente do homem estava carregada do terror do espírito do mal. Pensava-se que era possível vender a alma a Satanás através de um pacto escrito com sangue. Goethe representa Mefistófeles dizendo a Fausto: "Para o teu serviço aqui eu concordo que tu me mandes Correr sem parar ao teu chamado; Quando bem distante tu me achares, Então farás tanto por mim". As catedrais cultivavam e perpetuavam esta superstição através de figuras de demônios malignos que arreganham os dentes das gárgulas dos seus tetos e dos capitéis das suas colunas e a pregação popular exaltava Satanás ao nível de um deus rival - mais temido que o verdadeiro Deus vivo. Satanás era pintado como tendo chifres e cascos - imagem de sensual e bestial - que levou Cuvier a considerar que o adversário não podia devorar porque os chifres e cascos não indicavam um carnívoro mas um quadrúpede ruminante.
Mas certamente é possível que uma escala ascendente das inteligências criadas não atinjam o ponto mais alto no homem. Como a distância entre o homem e as formas inferiores de vida preenchem-se com inumeráveis gradações do ser, é possível que também entre o homem e Deus existam criaturas de inteligência mais elevada que a do homem. Esta possibilidade se transforma em certeza através das declarações expressas da Escritura. A doutrina está entrelaçada com os livros da revelação mais tardios assim como com os mais antigos.
Quenstedt (Theology, 1.629) considera a existência dos anjos como os prováveis antecedentes porque não há lacuna na criação; a natureza não procede persaltum (aos saltos). Assim temos 1) seres puramente corpóreos, como as pedras; 2) seres em parte corpóreos e em parte espirituais como o homem 3) seres inteiramente espirituais como os anjos. Godet, em seus Biblical Studies ofthe O. T., 1-29, sugere outra série de gradações. Assim como temos 1) os vegetais = espécie sem individualidade; 2) os animais = individualidade limitada à espécie; e 3) o homem = espécie dotada de individualidade: também podemos esperar 4) os anjos = individualidade sem espécie.
Se as almas vivem após a morte, sem dúvida há uma classe de espíritos desencarnados. Não é impossível que Deus tenha criado espíritos sem corpos. E. G. Robinson, Christian Theology, 110 - "A existência de deidades inferiores em todas as mitologias pagãs e a disposição universal do homem para crer em seres superiores a si e inferiores ao Deus supremo é um argumento pressuposto em favor da sua existência". Locke: "Para mim é provável que haja mais espécies acima de criaturas inteligentes do que sensíveis e materiais abaixo de nós, porque em todo o mundo visível e corpóreo não vemos lacunas e brechas". Foster, Christian Life and Theology, 193 - "Certamente pode-se crer na existência dos anjos com base no testemunho de alguém que defende ter vindo do mundo celeste se se pode crer no ornitorrinco com base no testemunho dos viajantes". Tennyson, Two Voices: "Esta verdade dentro da tua mente recita, Que um ilimitado universo É melhor, ou pior ilimitado. Pensais vós que este mundo de esperanças Não poderia achar-se mais imponente do que seus pares Em mais de cem milhões de esferas?"
A doutrina dos anjos fornece uma barreira contra a falsa concepção de que este mundo inclui o universo espiritual inteiro. A terra é apenas uma parte de um organismo maior. Como o cristianismo uniu judeus e gentios, daqui em diante harmonizará a nossa ordem de criação assim como outras: Cl. 2.10 - "que é a cabeça de todo o principado e potestade" = Cristo é a cabeça dos anjos assim como dos homens; Ef. 1.10 — "congregar todas as coisas em Cristo, tanto as que estão nos céus como as que estão na terra".
I. AFIRMAÇÕES E SUGESTÕES DA ESCRITURA
Quanto à natureza e atributos dos anjos
Eles são seres criados.
SI. 148.2-5 - "Louvai-o todos os seus anjos. ... pois mandou e logo foram criados"; Cl. 1.16 - "Porque nele foram criadas todas as coisas. ... sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potestades". cf. 1 Pe. 3.22
"anjos, e autoridades e potestades". Deus é o único ser não criado e eterno. Isto está implicado em 1 Tm. 6.16 - "aquele que tem, ele só, a imortalidade".
São seres incorpóreos.
Em Hb. 1.14, onde uma só palavra é empregada para designar os anjos, eles são descritos como "espíritos" - "não são todos eles espíritos ministra- dores?" Os homens, com sua dupla natureza, material e imaterial, não poderiam ser designados como "espíritos". Parece estar implicado em Ef. 6.12 - "porque não temos que lutar contra carne e sangue, mas contra ... as hostes espirituais da maldade nos lugares celestiais" que a sua caraterística de "espíritos" impede-nos de considerar os anjos como tendo um organismo corpó- reo; cf. Ef. 1.3 "bênçãos espirituais nos lugares celestiais"; 2.6 "e nos fez assentar nos lugares celestiais. Em Gn. 6.2 "filhos de Deus = não anjos, mas descendentes de Sete e adoradores do verdadeiro Deus. Em SI. 78.25, "o pão dos anjos" (Revista e Atualizada do Brasil) = maná vindo do céu, onde habitam os anjos; melhor, contudo, é o texto da Revista e Corrigida: "pão dos poderosos" - provavelmente significando anjos, apesar de que a palavra "poderosos" em parte alguma é aplicada a eles; possivelmente = "pão dos príncipes ou dos nobres", i.e. o mais refinado e mais delicado pão. Mt. 22.30
"nem casam, nem são dados em casamento, mas serão como os anjos no céu" - e Lc. 20.36 "nem podem morrer, pois são iguais aos anjos" - implicam só que os anjos não têm distinção de sexo. Os santos devem ser como os anjos, não que sejam incorpóreos, mas que não mantêm união sexual como aqui.
Não existe "alma de anjos", como "almas dos homens" (Ap. 18.13) e podemos inferir que os anjos não têm corpos nos quais as almas possam morar; ver Elementos Essenciais da Natureza Humana. Nevius, Demon-Possession, 258 atribui aos espíritos maus um instinto ou anseio de possuir um corpo mesmo que seja o de um animal inferior: "Assim na Escritura são representados espíritos vagando em busca de repouso em corpos e pedindo permissão para entrar nos porcos" (Mt. 12.43; 8.31). Portanto, os anjos, visto que não têm corpos, não conhecem nada sobre crescimento, idade, ou morte. Martensen, Christian Dogmatics, 133 - "Precisamente porque os anjos não são almas, mas apenas espíritos é que eles não podem possuir a mesma essência rica que o homem, cuja alma é o ponto de união em que se encontram o espírito e a natureza".
São agentes pessoais - isto é, inteligentes e voluntários.
Sm. 14.20 - "sábio, conforme a sabedoria de um anjo de Deus"; Lc. 4.34
"bem sei que és o Santo de Deus"; 2 Tm. 2.26 "laços do diabo, em cuja vontade estão presos"; Ap. 22.9 - "Olha, não faças tal" = exercício da vontade; Ap. 12.12 - "o diabo desceu a vós e tem grande ira" = propósito mau.
Possuem inteligência e poder sobre-humanos que têm seus limites fixados.
Mt. 24.36 - "do dia e da hora ninguém sabe, nem os anjos do céu" = o conhecimento deles, embora sobre-humano, é finito. 1 Pe. 1.12 - "para as quais coisas os anjos bem desejam atentar"; SI. 103.20 - "anjos ... magníficos em poder"; 2 Ts. 1.7 - "com os anjos do seu poder"; 2 Pe. 2.11 - "enquanto os anjos, sendo maiores (que os homens) em força e poder; Ap. 20.2,10 - "prendeu o dragão ... e amarrou-o ... foi lançado no lago de fogo". Comp. SI. 72.18
"Deus ... só ele faz maravilhas" = só Deus pode fazer milagres. Comparados com Deus os anjos são imperfeitos (Jó 4.18; 15.15; 25.5).
Poder, mais do que beleza e inteligência, é a sua característica marcante. Eles são "principados e potestades" (Cl. 1.16). Assombram os que os contemplam (Mt. 28.4). O rolar da pedra sobre o sepulcro exigia força. Uma roda de granito com oito pés de diâmetro (2,54 m) e um pé (0,33 m) de espessura, rolando em um sulco, pesaria mais de quatro toneladas. Mason, Faith of the Gospel, 86 - "O poder espiritual e a incandescente indignação no rosto de Estêvão lembrava ao Sinédrio uma visão angelical". Mesmo em seu terno ministrar eles eram fortes (Lc. 22.43 - "E apareceu-lhe um anjo do céu, que o confortava" cf. Dn. 10.19 - "Anima-te, anima-te! E falando ele comigo, esforcei-me e disse: Fala, Senhor, porque me confortaste). Em 1 Tm. 6.15 "Rei dos reis e Senhor dos senhores" - as palavras "reis" e "senhores" (fSaaiXe-uóvicov e KDpie-uóvxcov) podem referir-se aos anjos. Especialmente no caso dos espíritos maus, o poder parece a principal coisa na mente, i.e. "o príncipe deste mundo", "o homem forte armado", "a potestade das trevas", "os príncipes das trevas deste mundo", "o grande dragão", "todo o poder do inimigo", "dar-te-ei todas estas coisas", "livra-nos do maligno".
é) Distinguem-se dos homens em ordem de inteligência e são mais antigos que eles.
Os anjos são distintos dos homens. 1 Co. 6.3 - "havemos de julgar os anjos"; Hb. 1.14 "Não são, porventura, todos eles espíritos ministradores enviados para servir a favor daqueles que hão de herdar a salvação?" Eles não são espíritos humanos glorificados; ver Hb. 2.16 - "Porque, na verdade, ele não tomou os anjos, mas tomou a descendência de Abraão"; também 12.22,23, onde as inumeráveis hostes de anjos" distinguem-se da "igreja dos primogênitos" e dos "espíritos dos justos aperfeiçoados". Em Ap. 22.9 - "Eu sou um conservo teu" sugere semelhança com os homens, não na natureza, mas no serviço e subordinação a Deus, o objeto próprio da adoração. Sunday School Times, 15 de mar. de 1902.146 - Fala-se dos anjos como maiores em força e poder do que o homem, mas de que se pode dizer a respeito de muitos animais inferiores ou mesmo do redemoinho e do fogo. Nunca se fala dos anjos como uma ordem superior de seres espirituais. Nós devemos "julgar os anjos" (1 Co. 6.3) e os inferiores não devem julgar os superiores".
Os anjos são uma ordem de inteligência mais antiga que o homem. Os Pais tornaram a criação dos anjos simultânea à formação do ser dos elementos,
talvez baseando sua opinião no apócrifo Eclesiástico 18.1 - "Aquele que vive eternamente criou todas as coisas juntas". Em Jó 38.7, o paralelismo hebraico faz "as estrelas da manhã" = "filhos de Deus", de modo que se fala dos anjos como presentes em certos estágios da obra criativa de Deus. A menção da "serpente" em Gn. 3.1 implica que a queda de Satanás se deu antes da queda do homem. Podemos inferir que a criação dos anjos ocorreu antes da criação do homem - o inferior antes do superior. Em Gn. 2.1 "todo o seu exército", que Deus tinha criado pode-se pretender a inclusão dos anjos.
O homem foi a coroa da criação, criado depois dos anjos. Mason, Faith of the Gospel, 81 - "Talvez os anjos tivessem sido criados antes do elemento material dos céus e terra - substrato espiritual sobre o qual as coisas materiais foram plantadas, criação preparatória para receber o que se seguiria.
Na visão de Jacó eles sobem e descem; seu lugar natural é o mundo aqui embaixo".
Não se pode explicar a constante representação dos anjos como seres pessoais na Escritura como personificação do bem e do mal em acomodação às superstições judaicas sem opor-se a muitas passagens narrativas de sentido óbvio; implicando da parte de Cristo, ou dissimulação, ou ignorância quanto a um ponto importante da doutrina; e a crença na inspiração do Velho Testamento a partir da qual estes pontos de vista judaicos da crença angelical derivavam.
Jesus se acomodou à crença popular com respeito ao menos ao "seio de Abraão" (Lc. 16.22) e confessou sua ignorância sobre o tempo do fim (Mc. 13.32); i/erRusH Rhees, Life of Jesus of Nazareth, 245-248. Mas naquele caso seus ouvintes provavelmente tenham entendido que falasse figurada e retorica- mente, enquanto neste não havia nenhum falso ensino, mas só limitação do conhecimento sobre a verdade. Nosso Senhor não hesitou em contradizer a crença farisaica sobre a eficácia das cerimônias e a negação da ressurreição e vida futura segundo a crença dos saduceus. A doutrina dos anjos tinha mais forte apoio na mente popular do que estes erros dos fariseus e saduceus.
O fato de que Jesus não corrigiu ou negou a crença geral, mas ele mesmo a expressou e confirmou implica que a crença era racional e escriturística. Sobre uma das melhores declarações do argumento, ver Broadus, Com. on Mt. eus 8.28 (1- vol., p. 265, ed. em português).
Ef. 3.10 - "a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e potestades nos céus" - exclui a hipótese de que os anjos são apenas concepções abstratas do bem ou do mal. Falamos de pessoas no mundo da lua, como lunáticas só quando sabemos que ninguém supõe que creiamos que a lua exerce poder enlouquecedor. Mas os contemporâneos de Cristo supunham mesmo que ele cresse nos espíritos angélicos bons e maus.
Se esta crença era um erro, de modo algum era prejudicial e a benevolência assim como a veracidade de Cristo tê-lo-iam levado a corrigi-la. Assim também, se Paulo tivesse sabido que não havia tais seres como os anjos, ele não teria honestamente contendido com os colossenses, proibindo-os de adorá-los (Cl. 2.18), mas teria negado a sua existência, como negou a existência dos deuses pagãos (1 Co. 8.4).
Theodore Parker dizia que havia muita evidência de que Jesus cria em um diabo pessoal. Harnack, Wesen des Christenthums (A Pessoa [ou caráter] do Cristão), 35 - "Não há dúvida de que Jesus compartilhava com seus contemporâneos a representação de dois reinos: o de Deus e o do diabo" Wendt, Teaching of Jesus, 1.164 - Jesus "faz Satanás aparecer como o tentador imediato. Sinto-me bem longe de pensar que ele age assim por simples linguagem figurada. Não há dúvida de que Jesus aceitava as idéias contemporâneas quanto à existência real de Satanás e, concordemente, nos casos particulares de doença, ele supõe uma tentação satânica real". Maurice, Theological Essays, 32,34 - "O reconhecimento de um espírito mau é cara- terística do cristianismo". H. B. Smith, 261 - "Parece que o poder de Satanás no mundo chega ao ponto culminante no tempo de Cristo, e diminui daí em diante".
A mesma nota se aplica ao ponto de vista que considera Satanás tão somente como um termo coletivo para todos os seres maus, quer humanos, quer sobre-humanos. As representações bíblicas da ira progressiva do grande adversário, desde o primeiro assalto à virtude humana em Gênesis até a derrota no Apocalipse, somam-se ao já mencionado testemunho de Cristo, com o fim de impedir quaisquer outras conclusões que não sejam esta, de que há um ser pessoal de grande força, que pratica a oposição organizada ao governo divino.
Crane, The Religion of To-morrow, 299 sgs. - "Dizemos bem 'diabo pessoal', porque não há nenhum diabo que não seja pessoalidade". Não podemos negar a pessoalidade de Satanás a não ser que sejamos compelidos a negar a existência dos anjos bons, a pessoalidade do Espírito Santo e a pessoalidade de Deus Pai, - podemos até acrescentar a pessoalidade da alma humana. Nigel Penruddock em "Endymion" do Lord Beaconsfield diz: "Dá-me um só argumento contra a sua (de Satanás) pessoalidade, que não se aplica à pessoalidade de Deus". Um dos mais ingênuos artifícios de Satanás é persuadir o homem de que ele não existe. A seguir vem o artifício de substituir a crença em um diabo pessoal pela crença em um espírito mau impessoal.
Tal substituição achamos em Pfleiderer, Philosophy of Religion, 1.311 - "A idéia do diabo foi um expediente bem aceito para a necessidade da reflexão religiosa avançada, a fim de excluir Deus da relação com o maligno e com a maldade do mundo". Pfleiderer fala-nos que o otimismo primitivo dos hebreus, como o dos gregos, deu lugar nos últimos tempos ao pessimismo e desespero. Mas os hebreus ainda tinham esperança na libertação através do Messias e um apocalíptico reino do bem.
Sobre o ponto de vista de que Satanás é simplesmente um termo coletivo designando os seres maus, ver Bushnell, Nature and the Supernatural, 134137. Bushnell, ao sustentar que o mal moral deve ser uma "condição privativa" necessária de todos os seres como tais, crê que "todos os anjos bons
passaram por uma queda e foram auxiliados, do mesmo modo que o será o redimido da humanidade". "Anjos eleitos" (1 Tm. 5.21) então seriam os salvos após a queda, não os salvos da queda; e "Satanás" seria, não anome particular de uma pessoa, mas todos ou o total das mentes e forças más.
Quanto ao seu número e organização
Eles são uma grande multidão.
Dt. 33.2 - "O Senhor ... veio com dez milhares de santos"; SI. 68.17 - "Os carros de Deus são vinte milhares, milhares de milhares"; Ap. 5.11- "Ouvi uma voz de muitos anjos ... e era o número deles milhões de milhões e milhares de milhares". Anselmo pensava que o número dos anjos perdidos era completado pelo número dos homens eleitos. Savage, A Vida após a Morte, 61 - Os fariseus sustentavam noções exageradas do número de espíritos angélicos. Eles "diziam que, se o homem lançasse uma pedra sobre o seu ombro ou jogasse fora um caco de cerâmica, deveria pedir perdão a qualquer espírito que ele possivelmente pudesse acertar". Na época de W. H. H. Murray dizia-se que era perigoso no Adirondack atirar com arma de fogo, - poderia ferir um homem.
Constituem-se um grupo distinto de uma raça.
Mt. 22.30 - "não casam, nem são dados em casamento, mas serão como os anjos no céu"; Lc. 20.36 - "já não podem mais morrer, pois são iguais aos anjos e são filhos de Deus". Nós somos chamados "filhos dos homens", mas os anjos nunca são chamados "filhos dos anjos", mas só "filhos de Deus". Eles não se desenvolvem a partir de uma estirpe e tal natureza comum não os une como acontece com a raça humana. Não há entre eles um caráter ou uma história comum. Cada um foi criado separadamente e cada anjo apóstata caiu por si mesmo. A humanidade toda caiu de uma vez em seu primeiro pai. Corte uma árvore e você cortará os seus galhos. Mas os anjos eram árvores separadas. Alguns caíram no pecado e alguns permaneceram santos. Ver Godet, Bib. Studies O.T., 1 -29. Talvez esta seja uma razão por que foi providenciada uma salvação para os homens decaídos, mas não para os anjos decaídos. Cristo pôde juntar-se à humanidade tomando a natureza comum a todos. Não havia natureza comum dos anjos a qual ele pudesse tomar. Ver Hb. 2.16 - "ele não tomou os anjos". Os anjos são filhos de Deus, não tendo pais terrenos e não tendo pai que não fosse o divino. Ef. 3.14,15 - "o Pai, do qual toda família (em uma das versões em Inglês = "father-hood" = paternidade) nos céus e na terra leva o nome", - não "every family", como na Revised Version, pois não há famílias entre os anjos. A tradução no rodapé "paternidade" é melhor do que "família". Todas as itcapuxí provém de na-cfip. Dodge, Christian Theology 172 - "A ligação entre os anjos é tão somente mental e moral. Eles nada podem receber em herança, nada através da vida doméstica e familiar, nada através de uma sociedade unida pelos laços de
sangue.... Não pertencendo somente a um mundo, mas a dois, a alma humana tem em si as fontes da mais profunda e mais ampla experiência que os anjos.... Deus mais se aproxima do homem do que dos anjos". Newman Smith, Through Science to Faith, 191 - "A espécie morreu na ressurreição da vida do homem; o homem como indivíduo continua a viver. O sexo não será mais necessário para a vida; não se casarão, mas os homens e mulheres, os filhos vindos do casamento serão como os anjos. Como na consumação, através da morte da espécie humana, ganhar-se-á a imortalidade dos indivíduos".
Eles são de vários níveis e dons.
Cl. 1.16 - "sejam tronos, sejam dominações, sejam principados, sejam potesta- des"; 1 Ts. 4.16 - "voz de arcanjo"; Jd. 9- "o arcanjo Miguel". Miguel (= quem é como Deus?) é o único expressamente chamado arcanjo na Escritura, apesar de que Milton chamou Gabriel (= o herói de Deus) de arcanjo. Na Escritura, Miguel parece o mensageiro da lei e do julgamento; Gabriel, o mensageiro da misericórdia e da promessa. O fato de que a Escritura tem apenas um arcanjo é prova de que a sua doutrina dos anjos não deriva, como às vezes se tem afirmado, de fontes babilônicas ou persas; pois nelas achamos sete arcanjos ao invés de um. Contudo, achamos o espírito mau entronizado como deus, enquanto na Escritura ele é representado como tremendo escravo.
Wendt, Teaching of Jesus, 1.51 - "A devota e confiante percepção da aproximação de Deus que se expressa em tantos belos pronunciamentos do salmista, talvez mais tarde seja suplantada pela crença nos anjos no judaísmo, o que é bem análogo à supersticiosa crença da parte da Igreja Romana a respeito dos santos. É bem significativo que, no tempo de Jesus, os judeus não mais concebiam a promulgação da lei no Sinai, que era o fundamento de toda a sua religião, como revelação imediata de Yahweh a Moisés a não ser a instituída pela mediação dos anjos (At. 7.38,53; Gl. 3.19; Hb. 2.2; Josefo, Ant., 15.5,3).
Eles têm uma organização.
Sm. 1.11 - "Senhor dos Exércitos"; 1 Re. 22.19-"Vi o Senhor assentado sobre o seu trono e todo o seu exército estava junto a ele à sua mão direita e à sua esquerda"; Mt. 26.53 - "doze legiões de anjos" - sugere a organização do exército romano; 25.41 - "o diabo e os seus anjos"; Ef. 2.2 - "o príncipe das potestades do ar"; Ap. 2.13 -"trono de Satanás" (não "sentado"); 16.10 - "trono da besta" - "uma paródia infernal do reino celeste" (Trench). A expressão "exército do céu", em Dt. 4.19; 17.3; At. 7.42, provavelmente = estrelas; mas em Gn. 32.2, "o exército de Deus" = anjos, pois, quando Jacó viu os anjos, ele disse: "este é o exército de Deus". Em geral, as expressões "Deus dos exércitos", "Senhor dos exércitos" parecem significar "Deus dos anjos", "Senhor dos anjos"; comp. 2 Cr. 18.18; Lc. 2.13; Ap. 19.14-"os exércitos que estão no céu". Contudo, em Ne. 9.6 e SI. 33.6 a palavra "exército" parece incluir tanto os anjos como as estrelas.
Satanás é "o macaco de Deus". Ele tem um trono. Ele é o "príncipe do mundo" (Jo. 14.30; 16.11), "o príncipe das forças do ar" (Ef. 2.2). Há um cosmos e uma ordem do bem, apesar de que Cristo é mais forte do que o forte homem armado (Lc. 11.21) e governa até mesmo sobre Satanás. A primeira menção de Satanás está na Queda do homem em Gn. 3.1-15; a segunda, em Lv. 16.8, onde se diz que um dos dois bodes, no dia da expiação, é "para Azazel", ou Satanás; a terceira onde Satanás induziu Davi a enumerar Israel (1 Cr. 21.1); a quarta no livro de Jó 1.6-12; a quinta em Zc. 3.1-3, onde Satanás apresenta- se como adversário do sumo sacerdote Josué, mas o Senhor dirige-se a Satanás e o repreende. O pensamento de Cheyne, Com. on Isaiah, vol. 1, p. 11, é de que as estrelas eram chamadas os exércitos de Deus, indicando que eram criaturas animadas. Ultimamente a crença nos anjos lançou no cenário a crença de que as estrelas são seres animados; contudo, os anjos tinham conexão estreita com as estrelas. Marlowe, Tamburlaine, diz: "A lua, os planetas e a luz dos meteoros, Estes anjos de armadura de cristal combatiam um combate de dúvida".
Consideramos os 'querubins' de Gênesis, de Êxodo e de Ezequiel, - com os serafins de Isaías e as 'criaturas vivas' do livro de Apocalipse devem ser identificadas, - a mais provável interpretação é a que os considera, não como verdadeiros seres de nível mais elevado que o homem, mas como aparências simbólicas que pretendiam representar a humanidade redimida dotada de todas as perfeições perdidas na queda e que se fizeram lugar de habitação de Deus.
Alguns defendem que os querubins são símbolos dos atributos divinos, ou do governo de Deus sobre a natureza. Entretanto, qualquer que seja a verdade deste ponto de vista, pode incluir-se na doutrina fixada acima. Na verdade os querubins são símbolos da natureza permeada de energia divina e subordinada aos propósitos divinos, mas só são símbolos da natureza porque são símbolos do homem em sua dupla capacidade de imagem de Deus e sacerdote da natureza. Porque tem um corpo, o homem é parte da natureza; porque tem alma, emerge da natureza e lhe dá voz. Através do homem, a natureza, de outra forma cega e morta, é capaz de apreciar e expressar a glória do Criador.
A doutrina dos querubins abrange os seguintes pontos: 1. Os querubins não são seres pessoais, mas figuras artificiais, temporárias, simbólicas.
2. Conquanto não sejam existências pessoais, são símbolo da existência pessoal - símbolos não das perfeições divinas ou angélicas, mas da natureza humana (Ex. 1.5 - "tinham a semelhança de um homem"; Ap. 5.9 - "com o teu sangue compraste para Deus". 3. São emblemas da natureza humana, não em seu estágio presente de desenvolvimento, mas possuídos de todas as suas perfeições originais; por esta razão as mais perfeitas formas animais - a coragem real do leão, o paciente trabalho do boi, a elevada perspicácia da águia - combinam-se com a do homem (Ez. 1 e 10; Ap. 4.6-8). Estas formas querubínicas representam, não simplesmente as perfeições materiais e terrenas, mas a natureza humana espiritualizada e santificada. São "criaturas vivas" e a sua vida é santa e obediente à vontade divina (Ez. 1.12 - "para
onde o Espírito havia de ir, iam"). 5. Simbolizam uma natureza humana exaltada ao lugar de habitação de Deus. Por isso as cortinas interiores do tabernáculo eram entretecidas com figuras de querubins e a glória de Deus se manifestava no propiciatório entre os querubins (Ex. 37.6-9). Enquanto a espada flamejante nos portais do Éden era símbolo da justiça, os querubins eram símbolos da misericórdia - guardando o "caminho da árvore da vida" para o homem, até pelo sacrifício e renovação que o Paraíso reconquistaria (Gn. 3.24).
Em corroboração com este ponto de vista geral, note que os anjos e querubins nunca andam juntos; e que, nas visões finais do livro de Apocalipse, estas formas simbólicas não mais são vistas. Quando a humanidade redimida tiver entrado no céu, as figuras que tipificavam aquela humanidade, tendo servido o seu propósito, finalmente desaparecerão. "Os leões alados, as águias e os touros, que guardam as entradas do palácio de Nínive, são adoradores e não divindades". Ultimamente tem sido mostrado que o touro alado era chamado "Kerub" quase em tempo tão remoto como o de Moisés. A palavra aparece em sua forma hebraica 500 anos antes que os judeus tivessem qualquer contato com o domínio persa. Os judeus não a derivaram de qualquer raça ariana. Ela pertencia à sua própria língua.
A forma variável dos querubins parece provar que eles são aparições simbólicas e não seres reais. Pode-se encontrar um paralelo na literatura clássica. Em Horácio, Carmina, 3.11,15, Cérbero tem três cabeças; em 2.13,34, tem um cento. Breal, Semantics, sugere que as três cabeças podem ser três cabeças de cães, enquanto as cem cabeças podem ser cabeças de cobras. Mas Cérbero também é representado na Grécia como tendo só uma cabeça. Cérbero deve, portanto, ser um símbolo e não uma criatura existente. H. W. Congdon de Wyoming, N. Y., sustentava, contudo, que os querubins são símbolos da vida de Deus no universo como um todo. Ez. 28.14-19 - "querubim ungido para proteger" = o poder do rei de Tiro era de tal modo penetrante em todo o seu domínio, sua soberania tão absoluta e os seus decretos tão prontamente obedecidos, que o seu reinado assemelhava-se ao governo divino sobre o mundo. O Senhor Congdon considerava os querubins como uma prova do monismo.
Quanto ao seu caráter moral
Foram criados santos.
Gn. 1.31 - "Deus viu tudo quanto tinha feito, e eis que era muito bom"; Jd. 6 - "anjos que não guardavam o seu principado" - àpx^v aqui parece significar o seu começo no caráter santo e não o seu senhorio e domínio original.
Foram provados.
Inferimos isto de 1 Tm. 5.21 - "os anjos eleitos"; cf. 1 Pe. 1.1,2-"eleitos ... para a obediência". Parece seguir-se que houve um período de provação, durante o qual a obediência ou desobediência deles determinou o seu desti-
no futuro. Mason, Faith ofthe Gospel, 106-108 - "Gn. 3.14- 'Porquanto fizeste isto maldita serás' - na sentença contra a serpente parece implicar que o dia da graça de Satanás terminou quando seduziu o homem. Daí em diante foi levado a viver no pó, para triunfar só no pecado auferindo a subsistência do homem, para possuir o corpo ou a alma, para tentar os bons".
Alguns preservaram sua integridade.
SI. 89.7 - "a assembléia dos santos"; Mc. 8.38 - "os santos anjos". Shakes- peare, Macbeth, 4.3 - "Os anjos ainda têm brilho, embora o mais brilhante caiu".
Alguns caíram do estado de inocência.
Jo. 8.44 - "Ele foi homicida desde o princípio e não se firmou na verdade porque não há verdade nele"; 2 Pe. 2.4 - "anjos quando pecaram"; Jd. 6 - "anjos que não guardaram o seu principado, mas deixaram sua própria habitação". Shakespeare, Henrique VIII, 3.2 - "Cromwell, eu te determino que faças voar para longe a tua ambição; Por esse pecado caíram os anjos; como, então, o homem, Imagem do Criador, espera lucrar com isso? ... Quão desgraçado é o homem que depende dos favores dos príncipes! ... Quando ele cai, cai como Lúcifer, nunca recobra a esperança".
Os bons confirmam-se na bondade.
Mt. 6.10- "Seja feita a tua vontade assim na terra como no céu"; 18.10 — "Os anjos no céu sempre contemplam a face de meu Pai, que está no céu'';
Co. 11.14 - "um anjo de luz".
Os maus confirmam-se na maldade.
Mt. 13.19 - "o maligno"; 1 Jo. 5.18,19 - "o maligno não lhe toca ... o mundo todo jaz no maligno"; cf. Jo. 8.44 - "Vós tendes por pai ao diabo ... quando ele profere mentira, fala do que lhe é próprio, porque é mentiroso e pai da mentira"; Mt. 6.13 - "livra-nos do maligno".
Destas afirmações escriturísticas inferimos que todas as criaturas livres passam por um período de provação; que tal provação não envolve necessariamente uma queda; que é possível um desenvolvimento dos seres morais sem pecado. Outros trechos da Escritura parecem indicar que a revelação de Deus em Cristo é objeto de interesse e de admiração para outras ordens de inteligência que não sejam a humana; que em Cristo eles estão mais próximos de Deus e de nós; em resumo, que eles se confirmam em sua integridade na cruz. Ver 1 Pe. 1.12 - "para as quais coisas os anjos desejam bem atentar"; Ef. 3.10 - "para que, agora, pela igreja, a multiforme sabedoria de Deus seja conhecida dos principados e potestades nos céus"; Cl. 1.20 - "por
meio dele reconciliasse consigo todas as coisas, tanto as que estão na terra com as que estão nos céus"; Ef. 1.10- "tornar a congregar em Cristo todas as coisas, na dispensação da plenitude dos tempos, tanto as que estão nos céus como as que estão na terra" = "a unificação do universo todo em Cristo como o centro divino ... O grande sistema é uma harpa cujas cordas todas estão afinadas a não ser uma, e essa corda dissonante desafina toda a harpa.
O universo inteiro sentirá a influência e será reduzido a harmonia quando essa corda, o mundo em que vivemos, for afinada pela mão do amor e misericórdia" - citação livre de Leitch, God's Giory in the Heavens, 327-330.
Não é impossível que Deus esteja usando esta terra como uma chocadei- ra para povoar o universo. Mark Hopkins, Life, 317 - "Enquanto finalmente estiver reunida e preservada, como Paulo diz, uma santa igreja e cada homem aperfeiçoado e a igreja imaculada ... haverá outras formas de perfeição em outros departamentos do universo. E quando o grande dia da restituição vier e Deus vindicar o seu governo, pode ser visto entrando de outros departamentos do universo um grande desfile de formas angelicais, grandes legiões brancas de Sírios, vindas de Arcturos e das câmaras do Sul em volta do trono de Deus em torno de cujo centro gira o universo".
Quanto às suas funções
Funções dos anjos bons.
Eles estão na presença de Deus e o adoram.
SI. 29.1,2 - "Dai ao Senhor, ó filhos dos poderosos, dai ao Senhor glória e força. Dai ao Senhor a glória devida ao seu nome; adorai ao Senhor na beleza da sua santidade" - Perowne: "Pensa-se no céu como um grande templo, e todos os adoradores vestidos com vestes sacerdotais". SI. 89.7 - "Deus deve ser em extremo tremendo na assembléia dos santos", i.e. anjos - Perowne; "Os anjos são chamados uma assembléia ou congregação, do mesmo modo que a igreja acima, que, como a igreja abaixo, adora e louva a Deus". Mt. 18.10 - "Os seus anjos nos céus sempre vêem a face de meu Pai, que está nos céus". Parece que, em alusão a este texto, Dante representa os santos habitando na presença de Deus e ao mesmo tempo prestando humilde serviço aos seus companheiros homens aqui na terra. Em perfeita proporção com a sua aproximação de Deus e com a luz que dele recebem, está a influência que são capazes de exercer sobre os outros.
Regozijam-se nas obras de Deus.
Jó 38.7 - "todos os filhos de Deus rejubilavam"; Lc. 15.10 - "há alegria diante dos anjos de Deus por um pecador que se arrepende"; cf. 2 Tm. 2.25 - "se porventura Deus lhes dará arrependimento". Dante representa os anjos que estão mais perto de Deus, a infinita fonte da vida, como avançando sempre para a fonte da juventude, de sorte que os anjos mais velhos são os mais novos.
Executam a vontade de Deus, - operando na natureza.
SI. 103.20 - "Anjos seus, ... que cumpris as suas ordens, obedecendo à voz da sua palavra"; 104.4 - "faz dos ventos seus mensageiros (anjos), dos seus ministros, um fogo abrasador", i.e. relâmpagos. Ver Alford sobre Hb. 1.7
"Aqui a ordem das palavras hebraicas (no SI. 104.4) não é a mesma dos versos anteriores (yerespecialmente o v. 3), onde temos: 'que fez das nuvens
o seu carro'. Para esta transposição aqueles que insistem em que a passagem significa 'ele fez dos ventos seus mensageiros' não podem apresentar nenhuma razão".
Farrar sobre Hb. 1.7 - 'de seus anjos faz ventos": "Os rabinos freqüentemente se referem ao fato de que Deus faz os anjos assumirem qualquer forma que lhe agrade, quer de homem (Gn. 18.2) ou de mulher (Zc. 5.9 - "duas mulheres; havia vento em suas asas"), ou vento, ou chama (Ex. 3.2 - "anjo do Senhor em chama de fogo"; 2 Re. 6.17). Mas essa forma inatingível e fugidia da existência que é a glória dos anjos seria de inferioridade com relação ao seu Filho. Ele não podia revestir-se, como os que dependem da vontade de Deus, com roupas fugidias de fenômenos materiais". John Henry Newman, em sua Apology, vê um anjo em cada flor. Mason, Faith of the Gospel, 82 - "Orígenes não pensava que uma folha de grama nem uma mosca existisse sem seu anjo. Ap. 14.18 - um anjo 'que tinha poder sobre o fogo'; Jo. 5.4 - fonte intermitente sob o controle de um anjo; Mt. 28.2 - a descida do anjo causou um terremoto na manhã da ressurreição de Cristo; Lc. 13.11 - o controle de doenças é atribuído a anjos".
dirigindo os negócios das nações.
Dn 10.12,13,21 - "Eu vim por causa das tuas palavras. Mas o príncipe do reino da Pérsia se pôs defronte de mim ... Miguel, um dos primeiros príncipes, veio para ajudar-me ... Miguel, vosso príncipe"; 11.1 - "Eu, pois, no primeiro ano de Dario, medo, levantei-me para o animar e fortalecer"; 12.1 - "E, naquele tempo, se levantará Miguel, o grande príncipe que se levanta pelos filhos do teu povo". Mason, Faith of the Gospel, 87, sugere a questão "se o espírito da época" ou "o caráter nacional" em qualquer caso particular pode dever-se aos "principados" invisíveis aos quais vivem submissos. Sem dúvida Paulo reconhece em Ef. 2.2 "o príncipe das potestades do ar,... o espírito que opera nos filhos da desobediência". Será que os anjos bons não são responsáveis pela influência nos assuntos nacionais a fim de combater os maus e auxiliar os bons?
é) velando pelos interesses das igrejas em particular.
Co. 11.10- "Portanto, a mulher deve ter sobre a cabeça sinal de poderio [i.e., um véu], por causa dos anjos" - que cuidam da igreja e tem cuidado da ordem dela. Matheson, Spiritual Development of St. Paul, 242 - "A cobertura do homem é o poderio da mulher. O poder dela é de ministrar e isto é que faz a aliança com alguém maior do que o homem - o anjo. O cristianismo é uma força feminina. O judaísmo tinha considerado a mulher só como um instrumento para um fim - a multiplicação da raça. Portanto o judaísmo a tinha degradado. Paulo a restaura à sua original e igual dignidade. Cl. 2.18 - "Ninguém vos domine a seu bel-prazer, com pretexto de humildade e culto dos anjos" - falso culto que seria natural se os anjos estivessem presentes para cuidar das reuniões dos santos. 1 Tm. 5.21 - "Conjuro-te, diante de Deus, e do Senhor Jesus Cristo, e dos anjos eleitos, que guardes estas coisas" - os deveres públicos do ministro cristão.
Alford considera "os anjos das sete igrejas" (Ap. 1.20) como seres sobrehumanos indicados para representar e guardar as igrejas e isso nas seguintes bases: 1) que a palavra é empregada em outro lugar no livro de Apocalipse só neste sentido; e 2) que nada no livro se dirige a um mestre individualmente, mas a alguém que reflete o aspecto e a sorte da igreja como nenhuma pessoa o poderia. Contudo, preferimos considerar "os anjos das sete igrejas" como significando apenas os pastores das sete igrejas. A palavra "anjo" significa tão somente "mensageiro", e pode ser usada para indicar seres humanos assim como sobre-humanos - ver Ag. 1.13 - "Ageu, o embaixador do Senhor"
literalmente "o anjo do Senhor". O emprego da palavra neste sentido figurado não seria incôngruo com relação ao caráter místico do livro de Apocalipse (ver Biblia Sacra, 12.339). John Lightfoot, Heb. And Talmund. Exerc, 2.90, diz que "anjo" era um termo designativo de oficial ou ancião de uma sinagoga. Segundo a igreja de Irving, os "anjos" constituem uma classe de oficiais.
assistindo e protegendo cada um dos crentes individualmente.
Re. 19.5 - "um anjo o tocou e lhe disse [a Elias]: Levanta-te e come"; SI. 91.11,12 - "Aos seus anjos dará ordem a teu respeito para te guardarem em todos os teus caminhos. Eles te sustentarão nas suas mãos para que não tropeces com teu pé em pedra"; Dn. 6.22 - "O meu Deus enviou o seu anjo e fechou a boca dos leões para que não me fizessem dano"; Mt. 4.11 - "chegaram os anjos e o serviram" - Jesus foi o tipo de todos os crentes; 18.10 - "Não desprezeis algum destes pequeninos porque eu vos digo que os seus anjos nos céus sempre vêem a face de meu Pai"; compare v. 6 - "um destes pequeninos que crêem em mim"; ver Meyer, Comen. in loco, que considera estas passagens como prova da doutrina dos anjos da guarda. Lc. 16.22 - "o mendigo morreu e ... foi levado pelos anjos para o seio de Abraão"; Hb. 1.14 — "Não são todos eles espíritos ministradores enviados para servir a favor daqueles que hão de herdar a salvação?" Compare At. 12.15- "E diziam: é o seu anjo" - de Pedro que estava batendo à porta; ver Hackett, Com. in loco: a afirmação "expressa uma crença popular prevalecente entre os judeus de que nem se afirma nem se nega". Shakespeare, Henrique IV, 2- parte, 2.2 - "Para o moço - há um anjo bom em volta dele". Per contra ver Broadus, Com. on Mat. 18.10 - "simplesmente se diz em relação aos crentes como uma classe, que há anjos, que são 'seus anjos'; mas não há nada aqui, ou em outro lugar que mostre que um anjo tenha o encargo pessoal de um crente".
punindo os inimigos de Deus.
Re. 19.35 - "Sucedeu, pois, que, naquela mesma noite, saiu o anjo do Senhor e feriu no arraial dos assírios cento e oitenta e cinco mil deles";
At. 12.23 - "e, no mesmo instante, feriu-o o anjo do Senhor porque não deu glória a Deus e, comido pelos bichos, expirou".
Uma pesquisa do testemunho geral da Escritura quanto às funções dos anjos bons conduz-nos às seguintes conclusões:
Primeira, - que os anjos bons não devem ser considerados como agentes mediadores da providência regular e comum, mas como ministros da sua providência especial nos assuntos da sua igreja. Ele 'faz dos seus anjos vento' e 'chama de fogo', não em seu processo ordinário, mas em conexão com a ostentação especial do seu poder e para os fins morais (Dt. 33.2; At. 7.53; Gl. 3.19; Hb. 2.2). A intervenção deles é aparentemente ocasional e excepcional - não por opção deles, mas só no que lhes é permitido ou ordenado por Deus. Por isso não devemos conceber os anjos como intermediando entre nós e Deus, nem devemos, sem a revelação especial do fato, atribuir-lhes em qualquer caso particular os efeitos que as Escrituras geralmente atribuem à providência divina. Como os milagres, portanto, as aparições angélicas geralmente marcam a entrada de Deus em novas épocas nos desdobramentos dos planos dele. Por isso lemos sobre os anjos na conclusão da criação (Jó 38.7); na doação da lei (Gl. 3.19); no nascimento de Cristo (Lc. 2.13); nas duas tentações no deserto e no Getsêmani (Mt. 4.11, Lc. 22.43); na ressurreição (Mt. 28.2); na ascensão (At. 1.10); no juízo final (Mt. 25.31).
A substância destas notas pode encontrar-se em Hodge, Systematic Theo- logy, 1.637-645. Milton conta-nos que "Milhões de criaturas espirituais andam pela terra invisível, tanto quando acordamos como quando dormimos".
Se isto é verdade ou não é questão de interesse por que tais seres angélicos que se relacionam com assuntos humanos no presente não são vistos pelos homens. A admoestação de Paulo contra o "culto dos anjos" (Cl. 2.18) parece sugerir a razão. Se os homens não se abstêm de cultuar os seus semelhantes, quando estes têm sido sacerdotes ou mediadores das comunicações divinas, o perigo da idolatria seria muito maior se entrássemos em contato mais estreito e constante com os anjos; ver Ap. 22.8,9 - "prostrei-me aos pés do anjo que mas mostrava para o adorar. E disse-me: Olha, não faças tal".
O fato de que não vemos anjos nos nossos dias não nos torna mais céticos quanto à sua existência como o fato de que nos nossos dias não vemos milagres o que nos faria duvidarmos da sua realidade no Novo Testamento. Como se permitia que os espíritos maus trabalhassem mais ativamente quando a cristandade começou a apelar para os homens, assim os anjos bons também com freqüência foram reconhecidos como executando os propósitos divinos. Nevius, Demon-Possession, 278, entende que os espíritos maus ainda estão trabalhando onde a cristandade entra em conflito com o paganismo e que eles se afastam para o cenário à medida que o cristianismo triunfa. Isto pode ser verdade a respeito dos anjos bons. Caso contrário poderíamos correr o perigo de superestimar sua grandeza e autoridade. O Padre Taylor estava certo quando disse: "As pessoas são melhores do que os anjos". Não adianta cantar: "Eu quero ser um anjo". Nós nunca o seremos. Vítor Hugo estava errado quando dizia: "Eu sou o girino de um arcanjo". John Smith não é um anjo e nunca o será. Mas ele pode ser bem maior do que um anjo porque Cristo não tomou a natureza dos anjos, mas a do homem (Hb. 2.16).
Como ficou indicado acima, não há razão alguma para crer que mesmo a presença invisível dos anjos é uma constante. O sonho de Doddrige de que os antigos eram impedidos pela interposição angélica parece incorporar uma verdade essencial. Nós acrescentamos as passagens mencionadas no texto:
Jó 38.7 - "Quando as estrelas da alva juntas cantavam alegremente e todos os filhos de Deus rejubilavam? Dt. 33.2 - "O Senhor veio de Sinai... ele veio com dez mil santos: à sua direita havia para eles o fogo da lei"; Gl. 3.19 - "[A lei] foi ordenada ... por meio dos anjos, pela mão de um mediador"; Hb. 2.2
"a palavra falada por meio de anjos"; At. 7.53 - "vós recebestes a lei por ordenação dos anjos"; Lc. 2.13 -"e, no mesmo instante, apareceu com o anjo uma multidão dos exércitos celestiais"; Mt. 4.11 - "então o diabo o deixou; e eis que chegaram os anjos e o serviam"; Lc. 22.43 - "E apareceu-lhe um anjo do céu, que o confortava; Mt. 28.2 - "um anjo do Senhor, descendo do céu, chegou, removendo a pedra, e sentou-se sobre ela"; At. 1.10 - "E, estando com os olhos fitos no céu, enquanto ele subia, eis que junto deles se puseram dois varões vestidos de branco"; Mt. 25.31 - "E, quando o Filho do Homem vier na sua glória, e todos os santos anjos, com ele, então se assentará no trono da sua glória".
Segunda, - que o poder deles, por natureza dependentes e derivados, é exercido segundo as leis do mundo espiritual e natural. Eles não podem, como Deus, criar, operar milagres, agir sem meios, sondar os corações. Diferentemente do Espírito Santo, que pode diretamente influir a mente humana, eles podem influir os homens só em meios análogos àqueles pelos quais os homens influenciam-se uns aos outros. Como os anjos maus podem tentar os homens para o pecado, assim também é provável que os anjos bons possam atrair para a santidade.
Recentes pesquisas psíquicas desvendam quase ilimitadas possibilidades de influir outras mentes por sugestão. Fracos fenômenos físicos, como o odor da violeta ou a vista de uma pétala de rosa em um livro, pode desencadear o pensamento que muda todo o curso da vida. Uma palavra ou um olhar têm grande poder sobre nós. Fisher, Nature and Method of Revelation, 276 - "Os fatos do hipnotismo ilustram a possibilidade de uma mente cair em estranha servidão a um outro". Se um outro homem é capaz de influir-nos poderosamente, é perfeitamente possível que os espíritos não sujeitos às limitações da carne possam influir-nos ainda mais.
Binet, em suas Alterações da Personalidade, diz que experimentos sobre pacientes histéricas produziram em sua mente a convicção de que, nelas ao menos, "existe uma pluralidade de pessoas ... Quase com certeza estabelecemos que em tais pacientes, ao lado da personalidade principal, há uma secundária, desconhecida pela primeira, que vê, ouve, reflete, raciocina e age"; ver Andover Review, abril, 1800.422. Hudson, Law Psychic Phenomena, 81-143, defende que temos duas mentes: a objetiva e consciente e a subjetiva e inconsciente. Esta opera automaticamente sobre a sugestão da objetiva ou de outras. Em vista dos fatos mencionados por Binet e Hudson, defendemos que a influência dos espíritos angélicos não é mais incrível que a da sugestão dos homens vivos. Não há necessidade alguma de atribuir os fenômenos do hipnotismo a espíritos dos mortos. Nossa natureza humana é maior e mais suscetível à influência espiritual do que comumente cremos.
Na verdade, estes fenômenos psíquicos provêem-nos da corroboração do nosso Monismo Ético, pois, se em um ser humano pode haver duas ou mais consciências, então no Deus uno não pode haver só três pessoalidades infinitas, mas também muitas finitas.
Funções dos anjos maus.
Eles se opõem a Deus e lutam para derrotar a vontade dele. Isto se acha implícito nos nomes aplicados ao chefe deles. A palavra "Satã" significa "adversário" - primeiro de Deus e em segundo lugar dos homens; o termo "diabo" significa "caluniador" - de Deus para os homens e dos homens para Deus. Indica também a descrição do "homem do pecado" como "aquele que se opõe e se levanta contra tudo o que se chama Deus".
Jó 1.6 - Satanás aparece entre "os filhos de Deus"; Zc. 3.1 - "o sumo sacerdote Josué ... e Satanás estava à sua direita para se lhe opor"; Mt. 13.39
"O inimigo que o semeou é o diabo"; 1 Pe. 5.8 - "o diabo, vosso adversário". Satanás calunia Deus para os homens em Gn. 3.1,4 - "É assim que Deus disse? ... "certamente não morrereis"; calunia o homem para Deus em Jó 1.9,11
"Jó teme a Deus debalde? ... Estende a tua mão e toca-lhe em tudo quanto tem e verás se não blasfema de ti na tua face!"; 2.4,5 - "pele por pele e tudo quanto o homem tem dará pela sua vida. Estende, porém, a tua mão e toca- lhe nos ossos e na carne e verás se não blasfema de ti na tua face!" Ap. 12.10
"o acusador de nossos irmãos é derribado, o qual diante do nosso Deus os acusava de dia e de noite".
Note como em oposição ao espírito mau que acusa Deus ao homem e o homem a Deus, está o Éspírito Santo, o Advogado, que pleiteia a causa de Deus com o homem e a do homem com Deus: Jo. 16.8 - "quando ele vier, convencerá o mundo do pecado, e da justiça e do juízo"; Rm. 8.26 - "e da mesma maneira o Espírito ajuda as nossas fraquezas porque não sabemos o que havemos de pedir como convém, mas o mesmo Espírito intercede por nós com gemidos inexprimíveis ". É por isso que Balaão diz: Nm. 23.21:
"Não viu iniqüidade em Israel, nem contemplou maldade em Jacó"; e o Senhor diz a Satanás quando resiste a Josué: "O Senhor te repreende, ó Satanás, sim, o Senhor, que escolheu Jerusalém, te repreende" (Zc. 3.2). "Assim ele se põe entre o seu povo e toda a língua que os acusa" (C.H.M.). Para a descrição do "homem do pecado" ver 2 Ts. 2.3,4 - "o qual se opõe"; cf. v. 9 "cuja vinda é sob a eficácia de Satanás".
Sobre o "homem do pecado", ver Wm. Arnold Stevens, in Baptist Quaterly Review, julho, 1889: 328-360. Como em Dn. 11.36, o grande inimigo da fé, "se levantará e se engrandecerá sobre todo deus" é o rei sírio Antíoco Epifanes, que é assim descrito por Paulo como o ímpio em 2 Ts. 2.3,4 "o corrupto e ímpio judaísmo da era apostólica". Este só teve sua sede no templo de Deus. Seria sentenciado à destruição quando viria o Senhor na queda de Jerusalém. Mas este cumprimento não exclui um futuro e final cumprimento da profecia.
Contrastes entre o Espírito Santo e o espírito do mal: 1. A pomba e a serpente; 2. o pai da mentira e o Espírito da verdade; 3. homens possuídos pelos espíritos mudos e homens que proferem maravilhas em diversas línguas; 4. homicida desde o princípio e o Espírito doador da vida, que regenera a alma e desperta os nossos corpos mortais; 5. o adversário e o Ajudador;
6. o acusador e o Advogado; 7. a ciranda de Satanás e o seleção da parte do Senhor; 8. a inteligência organizadora e a maldade do ímpio e a combinação do Espírito Santo entre as forças da matéria e a mente edificadora do reino de Deus; 9. o homem forte totalmente armado e um mais forte do que ele; 10. o maligno que só faz o mal e o Santo que é o autor da santidade no coração do homem. A oposição dos anjos maus no começo e daí em diante desde a queda pode ser a razão por que eles são capazes de se redimir.
Eles estorvam o bem-estar temporal e eterno do homem, - por vezes exercendo o controle sobre os fenômenos naturais, porém mais comumente sujeitando a alma humana à tentação. As Escrituras também reconhecem a posse do homem, quer física, quer espiritual, pelos demônios.
O controle dos fenômenos naturais é atribuído aos espíritos maus em Jó1.12,16,19e2.7 - "tudo está em tuas mãos" - e Satanás emprega o relâmpago, o redemoinho, a doença, para os seus propósitos; Lc. 13.11,16 - "uma mulher que tinha um espírito de enfermidade ... a qual há dezoito anos Satanás mantinha presa"; 2 Co. 12.7 - "um espinho na carne, a saber, um mensageiro de Satanás (àyye^oç Xa-cavâ)1, para me esbofetear"; 1 Ts. 2.18 - "nós bem quisemos, uma outra vez, ir ter convosco, mas Satanás no-lo impediu";
Hb. 2.14 - "o que tinha o império da morte, isto é, o diabo". A tentação é atribuída aos espíritos maus em Gn. 3.1 e sgs. - "Ora, a serpente era a mais astuta"; cf. Ap. 20.2 - "a antiga serpente, que é o diabo e Satanás"; Mt. 4.3 - "chegando-se a ele o tentador"; Jo. 13.27 - "após o bocado, entrou nele Satanás"; At. 5.3 - "por que encheu Satanás o teu coração para que mentisses ao Espírito Santo?" Ef. 2.2 - "espírito que agora opera nos filhos da desobediência"; 1 Ts. 3.5 - "temendo que o tentador vos tentasse"; 1 Pe. 5.8 - "o diabo, vosso adversário, anda em derredor, bramando como leão, buscando a quem possa tragar".
Nos tempos de Cristo, uma crença popular sem dúvida exagerava a influência dos espíritos maus. Savage, Life after Death, 113 - "Enquanto Deus estava a certa distância, os demônios estavam bem próximos. O ar em torno da terra ficava cheio destes espíritos maus tentadores. Eles causavam o naufrágio dos navios e a repentina morte na terra; causavam ferrugem no cereal; feriam e sopravam nas tempestades; tomavam posse dos corpos e das almas dos homens. Faziam aliança e hipotecavam as almas dos homens". Se algum bom término se conseguiu a despeito deles, sentiam que o seu trabalho deve perverter-se no fim e no fim encontrar meios para o mal". No Fausto de Goethe, Margaret detecta o mal em Mefistófeles: "Vós vedes que ele não tem simpatia por nenhuma alma. Está escrito no seu rosto - ele nunca amou ... Sempre que ele se aproxima, eu não posso orar". Mefistófeles se descreve como "Ein Theil von jener Kraft Die státs das Bõse will und státs das Guteschafft" - "Parte desse poder não entendido que sempre quer o mal e sempre opera o bem"
através da reinante providência de Deus. "O diabo profere suas orações negativas". "Ele tenta aprender a língua basca, mas tem de parar depois de aprender três palavras em dois anos". Walter Scott conta que um aparecimento de enxofre na Escócia foi considerado como devido a uma imersão compulsória de Satanás nesse lugar.
As tentações de Satanás são representadas tanto negativas como positivas,
ele retira a semente lançada e semeia o joio. Ele controla muitos dos espíritos subordinados; há só um diabo, mas muitos anjos e demônios e através da atuação deles Satanás pode cumprir seus propósitos.
A atuação negativa de Satanás apresenta-se em Mc. 4.15 - "tendo eles ouvido, vem logo Satanás e tira a palavra que foi semeada no coração deles"; a atuação positiva dele em Mt. 13.38,39 "o joio são os filhos do maligno; e o inimigo que o semeou é o diabo". Um diabo, mas muitos anjos; ver Mt. 25.41
"o diabo e os seus anjos"; Mc. 5.9 - "respondeu-lhe, dizendo: o meu nome é Legião porque somos muitos"; Ef. 2.2 - "o príncipe das potestades do ar"; 6.12 - "principados ... potestades ...príncipe das trevas deste século ... hostes espirituais da maldade". Não sabemos qual é o modo de acesso de Satanás à mente humana. Talvez movendo o nosso organismo físico, ele produz sutis sinais de pensamento e desejos. Certamente ele tem o poder de apresentar de modo cativante os objetos do apetite e ambição egoística como ele fez com Cristo no deserto (Mt. 4.3,6,9), e apelar para o nosso amor à independência, dizendo-nos, como aos nossos primeiros pais - "sereis como Deus" (Gn. 3.5).
C. C. Everett, Essays Theol. and Lit., 186-218, sobre o Diabo: "Se os poderes sobrenaturais só se mantivessem distantes e não interferissem nos processos naturais do mundo, não haveria nenhuma doença, nem morte, nem tristeza ... Isto mostra uma fé real, apesar de que talvez inconsciente da bondade e fidedignidade da natureza. Eis aqui o germe de uma religião positiva, apesar de que, quando esta aparece, pode adotar a forma de supernaturalis- mo". Se Satanás não existisse, então as tentações de Cristo viriam de dentro e mostrariam uma predisposição para o mal da parte dele mesmo.
A possessão se distingue da doença corporal ou da mental apesar de que tal doença freqüentemente acompanha a possessão ou resulta dela.
Os demônios falam nas pessoas possessas com conhecimento sobrenatural e Cristo os domina. Jesus reconhece a atuação satânica em tais casos de possessão e regozija-se de expelir os demônios como sinal da queda de Satanás. Estes fatos tornam impossível interpretar as narrativas da possessão demoníaca como descrições populares de condições físicas ou mentais.
Parece que a possessão ou é física, como no caso dos endemoninhados gerasenos (Mc. 5.2-4), ou espiritual, como no caso da "jovem que tinha o espírito de adivinhação" (At. 16.16), cujo corpo não parece ter sido afetado. Distingue-se da enfermidade física: ver Mt. 17.15,18 - "lunático ... o demônio saiu dele; e, desde aquela hora, o menino sarou"; Mc. 9.25 - "espírito mudo e surdo"; 3.11,12 - "os espíritos imundos ... clamavam, dizendo: Tu és o Filho de Deus. E ele os ameaçava muito, para que não o manifestassem"; Lc. 8.30,31
"E perguntou-lhe Jesus, dizendo: Qual é o teu nome? E ele disse: Legião; porque tinham entrado nele muitos demônios. E rogavam-lhe que não os mandasse para o abismo"; 10.17,18 — "E voltaram os setenta com alegria, dizendo: Senhor, pelo teu nome até os demônios se nos sujeitam. E disse-lhes: Eu via Satanás, como um raio, cair do céu".
Estas descrições de intercâmbio pessoal entre Cristo e os demônios não podem ser interpretadas como metáfora. "Na tentação de Cristo e na possessão dos porcos, não podia haver lugar para a imaginação. Cristo está acima das suas alucinações. Os brutos abaixo delas". Farrar (Life of Christ, 1.337341 e 2 excurso vii), conquanto admita que a existência e atuação dos anjos bons, dá, de modo bem inconsistente, uma interpretação metafórica dos relatos escriturísticos sobre os anjos maus. Encontramos evidência corroborativa da doutrina bíblica no domínio que um homem iníquo freqüentemente exerce sobre os outros; na opinião de alguns médicos modernos que tratam dos insanos, alguns fenômenos, na experiência dos seus pacientes, são melhor explicados supondo uma sujeição da vontade a uma força estranha; finalmente, na influência do Espírito Santo sobre o coração humano. 1/erTRENCH, Miracles, 125-136; Dicionário Bíblico de Smith, 1.586 - "A possessão se distingue da simples tentação pela completa ou incompleta perda da razão ou poder da vontade do sofredor; suas ações, palavras e quase seus pensamentos são governados pelo espírito mau, até que a sua personalidade pareça destruída, ou ao menos reprimida na produção da consciência de uma dupla vontade dentro dele como em um sonho. Nas comuns investidas e nas tentações de Satanás, a própria vontade realiza-se conscientemente e, em conseqüência, assume gradualmente, sem a aparente perda da ação, as caraterísticas da natureza satânica. Solicita-se, argumenta-se e persuade-se contra o empenho da graça, mas não se rende".
T. H. Wright, The Finger of God, argumenta que Jesus, em sua menção aos demoníacos, acomodou-se às crenças da sua época. Fisher, Nature and Method of Revelation, 274, na referência de Weiss a Meyer sobre Mt. 4.24, apresenta o argumento de Meyer contra a possessão demoníaca, da seguinte maneira: 1. a ausência de referências à possessão demoníaca no Velho Testamento e o fato de que os assim chamados endemoninhados eram curados pelos exorcistas; 2. que nenhum caso claro de possessão ocorre atual-
mente; 3. que não há nenhuma notícia de possessão demoníaca no Evangelho de João, apesar de que a vitória contra Satanás faz parte da obra do Messias e se diz que Satanás entra na mente humana e assume o seu controle (Jo. 13.27); 4. e que os assim chamados endemoninhados não são, como seria de esperar, de temperamento diabólico e cheios de sentimentos malignos para com Cristo. Harnack, Wesen des Christenthums, 38 - "A crença popular na possessão demoníaca deu forma às concepções dos que tinham enfermidades nervosas, de modo que eles se expressavam em linguagem própria só daqueles que realmente eram possessos. Jesus não é um adepto da Ciência Cristã; ele chama doença de doença e saúde de saúde; mas considera toda a doença como prova e efeito da operação do maligno".
Sobre Mc. 1.21-34, ver Maclaren, em Sunday School Times, 23 de jan de 1904 - "Alguns dizem que esse endemoninhado era epilético. É possível; mas se a epilepsia não é o resultado da possessão, como se justifica a forma da violenta aversão contra Jesus? E o que há na epilepsia que dá o discernimento do caráter dele e o propósito da sua missão?" A expulsão que Jesus faz dos demônios, expelindo-os através de uma palavra, é a caraterística maravilhosa do nosso Senhor. Nevius, Demon-Possession, 240 - "Pode a possessão demoníaca ser apenas uma forma diferente de hipnotismo mais avançada? ... É possível que estes espíritos maus estejam familiarizados com o nosso sistema nervoso e capazes de atuar sobre eles e influenciar a humanidade segundo as leis físicas e psicológicas.... O transe hipnótico pode ocorrer através da energia da força de vontade, atuação do espírito sobre o espírito, sem o emprego de órgãos físicos". Nevius cita F. W. A. Myers, Fortnightly Rev., nov, 1885 - "Segundo o meu ponto de vista, tem-se conseguido tal descoberta como a telepatia, ou a transferência do pensamento e sensações de mente para mente sem a atuação de órgãos do sentido".
Contudo, a despeito deles mesmos, executam os planos de Deus punindo os ímpios, flagelando os bons e ilustrando a natureza e destino do mal moral.
Castigo do ímpio: SI. 78.49 - "Lançou contra eles o furor da sua ira: cólera, indignação e calamidade, legião de anjos portadores de males"; 1 Re. 22.23
"Eis que o Senhor pôs o espírito da mentira na boca de todos estes teus profetas e o Senhor falou mal contra ti". Em Lc. 22.31, a ciranda de Satanás realiza a intenção oposta à do joeireiro e a mesma coisa que a triagem do Mestre (Maclaren).
Castigar os bons: Jó caps. 1 e 2; 1 Co. 5.5 - "seja entregue a Satanás para a destruição da carne para que o espírito seja salvo no Dia do Senhor Jesus"; cf. 1 Tm. 1.20-"Himeneu e Alexandre, os quais entreguei a Satanás, para que aprendam a não blasfemar". Tal entrega a Satanás para a destruição da carne parece envolver quatro coisas: 1) exclusão da igreja; 2) a autoridade de infligir a doença ou morte do corpo; 3) a perda de toda a proteção da parte dos anjos bons, que ministram só aos santos; 4) a sujeição aos esbofeteamentos e tormentos do grande acusador. Gould, no Am. Com. on 1 Co. 5.5, considera "a entrega a Satanás" simplesmente pôr o homem fora da
igreja através da exclusão. Só isto eqüivale a bani-lo para "o mundo" do qual Satanás é o governante.
Os espíritos maus ilustram a natureza e o destino do mal moral: ver Mt. 8.29 - "vieste atormentar-nos antes do tempo?" 25.41 - "fogo eterno preparado para o diabo e os seus anjos"; 2 Ts. 2.8 - "então será revelado o iníquo"; Tg. 2.19-"os demônios também crêem e estremecem"; Ap. 12.9,12
"o diabo e Satanás, que engana todo o mundo ... o diabo desceu a vós e tem grande ira, sabendo que já tem pouco tempo"; 20.10 - "lançado no lago de fogo ... e de dia e de noite serão atormentados para todo o sempre".
Interessante é a questão se a Escritura reconhece qualquer conexão especial dos espíritos maus com os sistemas de idolatria, feitiçaria e espiritismo que sobrecarregam o mundo. 1 Co. 10.20 - "as coisas que os gentios sacrificam, sacrificam-nas aos demônios e não a Deus"; 2 Ts. 2.9 - "a eficácia de Satanás com todo o poder, e sinais, e prodígios de mentira" - parecem favorecer a resposta afirmativa. Mas 1 Co. 8.4 - "quanto ao comer das coisas sacrificadas aos ídolos, sabemos que o ídolo não é nada no mundo" - parece favorecer a resposta negativa. Esta última pode, contudo, significar que "os seres que os ídolos são destinados a representar não têm existência alguma embora demonstra-se depois (10.20) que há outros seres em conexão com o falso culto" (Ann. Par. Bible, in loco). "O paganismo é o reino do diabo" (Meyer), e enquanto os pagãos pensam sacrificar a Júpiter ou a Vênus, na verdade estão "sacrificando aos demônios", e assim estão promovendo os planos de um espírito maligno que usa estas formas de falsa religião como meio de escravizar as almas deles. De igual modo, a rede de influências que apóiam o papado, o espiritismo, a descrença moderna, é de difícil explicação a não ser que creiamos em uma inteligência sobre-humana que organiza estas forças contra Deus. Nestas, assim como nas religiões pagãs, há fatos inexplicáveis apoiados em princípios simplesmente naturais de doença e alucinação.
Nevius, Demon-Possession, 294 - "Paulo ensina que os deuses mencionados sob diferentes nomes são imaginários e inexistentes; mas atrás deles e em conexão com eles, há demônios que se valem da idolatria para afastar
o homem de Deus; e é a estes que os pagãos inconscientemente prestam obediência e serviço. ... É mais razoável crer que os sofrimentos do povo iludido foram causados pelo diabo, não pelas assim chamadas feiticeiras. Substituamos "artifícios diabólicos" por "feitiçaria" ... Se as cortes em Salem procedessem na conjectura bíblica de que o testemunho dos que estão sob o controle dos espíritos maus, neste caso, seriam falsas, uma coisa como a tragédia de Salem nunca teria sido conhecida".
Uma pesquisa do testemunho da Escritura com respeito às funções dos espíritos maus conduz-nos às seguintes conclusões gerais:
Primeira, - o poder dos espíritos maus sobre os homens não independe da vontade humana. Não se pode exercer este poder sem pelo menos o consentimento da vontade humana e pode-se enfrentá-lo e livrar-se dele através da oração e fé em Deus.
Lc. 22.31,40 - "Satanás vos pediu para cirandar como trigo ... orai para que não entreis em tentação"; Ef. 6.11 - "Revesti-vos de toda a armadura de Deus para que possais estar firmes contra as astutas ciladas do diabo"; 16 - "o escudo da fé com o qual podereis apagar todos os dardos inflamados do maligno"; Tg. 4.7 - "resisti ao diabo e ele fugirá de vós"; 1 Pe. 5.9 - "ao qual resisti firmes na fé". O carvão já está no coração humano em forma de inclinação corrompida; Satanás só ateia o fogo. A dupla fonte do pecado é ilustrada em Atos 5.3,4 - "Por que encheu Satanás o teu coração? ... Por que formas- te este desígnio no teu coração?" Ter-se-ia resistido o impulso satânico e "depois de vendido" sugere que ainda estava "no poder dele mesmo" como estava a terra que ele tinha vendido (Maclaren).
A alma é um castelo em que o rei dos espíritos maus não pode entrar sem permissão. Bispo Wordsworth: "O diabo pode tentar-nos a cair, mas não pode fazer-nos cair; ele pode persuadir-nos a lançarmo-nos abaixo, mas ele não pode lançar-nos". E. G. Robinson: "Cabe a nós deixar que o diabo tenha o controle sobre nós. Despachamos sobre os ombros do diabo muitos dos erros que cometemos assim como Adão teve a petulância de dizer a Deus que a mulher é que cometeu o erro". Tanto Deus como Satanás estão à porta e batem, mas nem o céu nem o inferno podem entrar a não ser que queiramos. "Não podemos impedir que os pássaros sobrevoem nossas cabeças, mas podemos impedi-los de fazer ninhos nos nossos cabelos". Mt. 12.43-45
"quando o espírito imundo tem saído do homem" - sugere que o homem que se livra de um vício, mas não ocupa sua mente com coisas melhores está em condições de ser nova vítima de possessão, "sete outros espíritos piores do que ele" implica que alguns demônios são mais ímpios que outros e assim mais duros de serem expelidos (Mc. 9.29). Os judeus tinham expelido a idolatria, mas outros piores pecados tinham se apossado deles.
Hudson, Law of Psychic Phenomena, 129 - "Os que se submetem à hipnose não podem ser controlados de modo a fazer o que ele sabe que está errado a não ser que ele voluntariamente consinta". A. S. Hart: "A não ser que alguém queira ser hipnotizado ninguém pode exercer-lhe sua influência. Quanto mais inteligente se é, mais suscetível. O hipnotismo requer do sujeito dois terços da obra, enquanto o instrutor exerce só um terço - ao contar o que o sujeito faz. Não é uma influência inerente, nem um dom; mas pode ser aprendido por qualquer que lê. É impossível compelir uma pessoa a praticar o erro conquanto sob influência, pois o paciente retém uma consciência da diferença entre o certo e o errado".
Hòffding, Outilines Psychology, 330-335 - "Algumas pessoas tem o poder de, intencionalmente, invocar alucinações; mas freqüentemente ocorre-lhes como ao Zauberlehrling (O Aprendiz de Magia, ou Aprendiz de Feiticeiro), em que os fantasmas ganham poder sobre eles e não serão novamente dispersos. O Pescador de Goethe - 'Ela quase o derrubou e quase o afundou' - repete a dualidade no segundo termo; pois afundar é deixar que alguém se afunde". Manton, the Puritan: "Um estranho não pode afastar um cão do rebanho, mas o Pastor pode fazê-lo com uma palavra; assim o Senhor pode facilmente repreender Satanás quando o acha mais violento". Spurgeon, o moderno puritano, assinala o que se disse acima: "Ó senhor, quando sou afligido pelo meu grande inimigo, afasta-o, rogo-te! Deixa-me ouvir uma voz
dizendo: 'O Senhor te repreende, ó Satanás, sim, o Senhor, que escolheu Jerusalém, te repreendei' (Zc. 3.2). Porque tu me elegeste, repreende-o, rogo- te, e livra-me da 'força do cão'! (SI. 22.20)".
Segunda, - o poder deles é limitado pela vontade de Deus, tanto no tempo como no espaço. Os espíritos maus nem são onipotentes, nem oniscientes, nem onipresentes. Devemos atribuir a doença e a calamidade natural à atuação deles só quando isto for matéria de revelação especial. Como os espíritos maus se opõem a Deus, este os compele a servir aos propósitos dele. O poder de fazerem o mal dura apenas um lapso e o juízo final e o castigo vindicarão a permissão que Deus lhes concedeu de praticarem o mal.
Co. 10.13 - "fiel é Deus, que vos não deixará tentar acima do que podeis; antes com a tentação dará o escape, para que a possais suportar";
Jd. 6 - "Os anjos que não guardaram o seu principado, mas deixaram a sua própria habitação, reservou na escuridão e em prisões eternas até o juízo daquele grande Dia".
Lutero viu Satanás mais perto do homem do que o seu paletó, ou sua camisa, ou até mesmo a sua pele. Em todos os infortúnios ele via a obra do diabo. Havia uma conflagração na cidade? Olhando mais de perto, você pode ver um demônio soprando a chama. Ele atribuía a peste e a tempestade a Satanás. Tudo isto eram resquícios dos exageros medievais do poder de Satanás. Naquela época, supunha-se que os homens pudessem fazer pactos com o maligno, através dos quais o poder sobrenatural se adquiria com o preço da perdição final (ver Fausto de Goethe).
A Escritura não fornece garantia para tais representações. Parece que se permitiu uma atividade especial de Satanás na tentação e na possessão durante o ministério do nosso Salvador, para que o poder de Cristo viesse a ser demonstrado. Através da sua morte Jesus "aniquilou o que detinha o império da morte, isto é, o diabo" (Hb. 2.14) "E, despojando os principados e potestades, os expôs publicamente e deles triunfou em si mesmo (Rev. e At. do Brasil) na cruz" (Cl. 2.15). 1 Jo. 3.8 - "Para isto, o Filho de Deus se manifestou: para desfazer as obras do diabo". Os espíritos maus agora existem e agem só sob sofrimento. McLeod, Temptation of ourLord, 24 - "A força de Satanás é limitada: 1) pelo fato de que ele é uma criatura; 2) por causa da providência de Deus; 3) por causa da sua própria iniqüidade".
Genung, Epic of the Inner Life, 136 - "Não tendo nem princípio fixo em si mesmo, nem conexão com a fonte da ordem exterior, Satanás não tem capacidade profética. Ele pode apelar para o acaso, mas não pode prever. Assim Mefistófeles insolentemente gaba-se de que ele pode desviar Fausto: 'Quanto você quer apostar? Há ainda uma oportunidade de ganhá-lo, Desde que você se entregue ao meu caminho para instruí-lo!' E em Jó 1.11; 2.5, Satanás desafia: 'verás se ele não blasfema de ti na tua face"'. William Ashmore:
"É Satanás onipresente? Não, mas é muito sagaz. É ele limitado? Sim, mas com corda muito frouxa". Na história persa, Deus espalhou a semente.
O diabo enterrou-a e mandou a chuva apodrecê-la. Mas logo ela surgiu e o deserto floriu como a rosa.
OBJEÇÕES À DOUTRINA DOS ANJOS
À doutrina dos anjos em geral
Objeta-se:
Que se opõe ao ponto de vista científico modemo do mundo como sistema de forças e leis definidas. - Respondemos que, qualquer que seja a verdade que possa haver neste ponto de vista moderno não exclui o papel da atuação livre divina ou humana. Portanto, não exclui a possibilidade da atuação angélica.
Ladd, Philosophy of Knowledge, 332 - "É mais fácil crer nos anjos do que no éter; em Deus do que nos átomos; e na história do seu reino como uma auto-revelação divina do que no processo de evolução puramente mecânica dos físicos e biólogos".
Que se opõe a doutrina moderna do espaço infinito acima e abaixo de nós - espaço povoado de mundos. Com a aceitação da velha concepção do firmamento, como um limite separando este mundo das regiões além, sustenta-se que devemos abandonar toda a crença em um céu dos anjos. - Respondemos que as noções do universo infinito, do céu como um lugar definido e dos espíritos como confinados a um lugar fixo não têm garantia certa quer na razão, quer na Escritura. Nada conhecemos dos modos de existência de espíritos puros.
O que conhecemos do universo é certamente finito. Parece que os anjos são seres incorpóreos e, como tais, livres de todas as leis da matéria e do espaço. O céu e o inferno são essencialmente condições correspondentes ao caráter - em que o corpo e as circunstâncias da alma expressam e refletem seu estado interior. A coisa principal em que se deve insistir é, portanto, o estado; o lugar é somente incidental. A declaração de Cristo a respeito daquele que "pode fazer perecer no inferno a alma e o corpo (Mt. 10.28) fornece alguma razão para crer que o inferno é também um lugar.
Não nos é revelado onde estão o céu e o inferno. Mas não é necessário supor que estão em alguma parte remota do universo; por nada sabermos, eles podem estar pouco atrás de nós, de modo que, se os nossos olhos estivessem abertos, como os do servo do profeta (2 Re. 6.17), nós mesmos os veríamos. Baseados em Ef. 2.2 - "príncipe das potestades do ar" e 3.10 - "principados e potestades nos céus" - alguns têm atribuído à atmosfera da terra a habitação dos espíritos angélicos, tanto bons como maus. Mas as expressões "ar" e "lugares celestiais" podem simplesmente ser designações metafóricas do seu método espiritual de existência.
A filosofia idealista, que considera o tempo e o espaço não como condicio- nantes do pensamento de Deus, mas tão somente como formas subjetivas do nosso pensar humano, possivelmente pode fornecer algum subsídio na consideração deste problema. Se a preocupação é apenas a expressão da mente e da vontade de Deus, sem existência independente da sua inteligência e vontade, a questão de lugar deixa de ter significação. Nesse caso o céu é tão somente o estado em que Deus se manifesta na sua graça e o inferno é o estado em que um ser moral se encontra em oposição a Deus e Deus em oposição a ele. Cristo pode manifestar-se aos seus seguidores em toda a parte da terra e a todos habitantes do céu ao mesmo tempo (Jo. 14.21; Mt. 28.20;
Ap. 1.7). De igual modo, os anjos, seres puramente espirituais, podem independer das leis de espaço e de tempo sem se limitar a qualquer local fixo.
Preferimos, portanto, deixar sem decisão o assunto lugar e aceitar a existência e operação tanto dos anjos bons como dos maus como matéria de fé, sem professar o entendimento das suas relações com o espaço.
À doutrina dos anjos maus em particular
Objeta-se que:
A idéia da queda dos anjos é auto contraditória porque uma queda determinada pelo orgulho pressupõe orgulho - isto é, uma queda antes da queda. - Respondemos que a objeção confunde a ocasião do pecado com o pecado em si. O motivo externo da desobediência não é a desobediência. A queda ocorreu só quando a livre vontade escolheu o motivo exterior. Só quando egoisti- camente se adotou o motivo da independência, o inocente desejo do conhecimento e do poder se tomaram orgulho e pecado. Como uma vontade má poderia originar-se nos espíritos criados é um problema insolúvel. Nossa fé na santidade de Deus, contudo, compele-nos a atribuir a origem desta vontade má, não ao Criador, mas à criatura.
Não pode haver nenhuma propensão pecaminosa antes que haja pecado.
A razão do primeiro pecado não pode ser o próprio pecado. Isto seria torná-lo um desenvolvimento necessário; negar a santidade de Deus, o Criador; deixar a base do teísmo em favor do panteísmo.
É irracional supor que Satanás teria sido capaz de mudar sua natureza toda através de um simples ato, de modo que, desde então, só desejasse o mal.
Respondemos, porém, que as circunstâncias de tal decisão nos são desconhecidas; conquanto o poder dos atos simples de mudar permanentemente o caráter é matéria de observação entre os homens.
Um exemplo do efeito sobre o caráter e a vida do simples ato de falsidade ou sonegação. O primeiro frasco de bebida intoxicante e a primeira operação sugestiva de impureza estabelece freqüentemente traços nervosos no cérebro e associações mentais irreversíveis dominantes em toda a vida. "Semeia um ato e colherá um hábito; semeia um hábito e colherá um caráter; semeia um caráter e colherá um destino". O que é verdade a respeito do homem também pode sê-lo a respeito dos anjos.
É impossível que tão sábio ser entre na desesperançada rebelião. - Respondemos que nenhuma soma do simples conhecimento garante a ação moral correta. Se os homens gratificam a presente paixão, apesar de seu conhecimento de que o pecado envolve a miséria presente e a perdição futura, não é impossível que Satanás possa ter feito o mesmo.
Scherer, Essays on Engiish Literature, 139, apresenta a seguinte objeção: "A idéia de Satanás é contraditória; porque se opõe ao conhecimento de Deus e ainda tenta rivalizar contra ele". Entretanto, devemos lembrar que o entendimento é servo da vontade e é por ela obscurecido. Muitos homens inteligentes deixam de ver de que depende a sua paz. É a própria loucura do pecado que persiste na iniqüidade mesmo quando vê e teme a aproximação do juízo de Deus. Jonathan Edwards: "Embora o diabo seja muito sagaz e sutil, ainda ele é um dos maiores tolos e cabeças duras do mundo como são os mais sutis iníquos. O pecado é de tal natureza que, estranhamente, envaidece e torna estulta a mente". Uma das peças de Ben Johnson tem este título:
"O Diabo é um Asno".
Schleiermacher, Die Chrístliche Glaube, 1.210, argumenta que a iniqüidade contínua deve ter enfraquecido o entendimento de Satanás de sorte que ele não pode mais ser temido. E acrescenta: "Nada mais fácil do que contender contra o maligno emotivo". Por outro lado, parece que, na Escritura, há evidência de uma ira progressiva e uma atividade devastadora no caso do maligno, a começar em Gênesis, culminando no Apocalipse. Com esta crescente maldade há também abundante evidência da sua ignorância. Podemos exemplificar os equívocos do diabo ao representar erroneamente 1. Deus ao homem (Gn. 3.1 - "É assim que Deus disse?"). 2. O homem ao próprio homem (3.4 - "Certamente não morrereis"). 3. O homem a Deus (Jó 1.9 - "Porventura Jó teme a Deus em vão?"). 4. Deus a ele mesmo (Mt. 4.3 - "Se tu és Filho de Deus"). 5. Ele mesmo ao homem (2 Co. 11.14 - "Satanás se transfigura em anjo de luz"). 6. Ele mesmo a si mesmo (Ap. 12.12 - "o diabo desceu a vós e tem grande ira" - pensando que podia opor-se a Deus com sucesso ou destruir o homem).
Criar e manter espíritos que sabemos virão a ser maus e farão o mal é inconsistente com a benevolência de Deus. - Respondemos que não é mais inconsistente com a benevolência de Deus do que a criação e preservação dos homens cuja ação Deus dirige para o avanço dos seus propósitos e cuja iniqüidade finalmente ele traz à luz e pune.
A sedução do puro pelo impuro, a chantagem, a escravização e a guerra, tudo isso tem sido permitido entre os homens. Não é mais inconsistente com a benevolência de Deus permiti-los entre os espíritos angélicos. Caroline Fox conta de Emerson e Carlyle que este certa feita conduziu seu amigo, sereno filósofo, pelas abominações das ruas de Londres à meia-noite, perguntando- lhe com humor terrível, freqüentemente, em cada um dos poucos passos:
"E agora? Você crê no diabo?" Emerson respondeu que, quanto mais ele via o povo inglês, mais e melhor pensava neles. Talvez porque, com tais abismos abaixo deles, podiam, não obstante, alcançar tais altitudes da civilização. Até mesmo o vício e a miséria, canalizados para o bem, e o destino dos anjos maus podem tornar-se uma advertência para o universo.
é) A noção de organização dos espíritos maus é autocontraditória porque a natureza do mal é separar e dividir. - Respondemos que tal organização dos espíritos maus não é mais impossível do que a organização dos homens ímpios com o propósito de ampliar os seus fins egoísticos. A aversão comum a Deus pode constituir um princípio de união entre eles como entre os homens.
Os ímpios são bem sucedidos em seus planos só quando de alguma forma aderem ao bem. Mesmo uma súcia de roubadores deve ter leis e há um tipo de "honra entre os ladrões". De outra forma o mundo seria um pandemônio e a sociedade seria o que Hobbes chamava: "bellum omnium contra omnes (guerra de todos contra todos)". Ver Whitehouse, art. sobre Satanás, no Hastings' Bible Dict.: "Algumas personalidades são centros ganglionados de um sistema nervoso, encarnação da má influência. A Bíblia ensina que Satanás é o seu centro".
Entretanto, o poder organizador de Satanás tem suas limitações. Nevius, Demon-Possession, 270 - "Satanás não é onisciente e não é certo que todos os demônios estão sob o seu inteiro controle. A falta de vigilância da parte do diabo e a ambição dos seus anjos podem obstruir e adiar a execução dos seus planos do mesmo modo que entre os homens". Um parlamentar inglês consolava-se, dizendo: "Se as pulgas tivessem todas a mesma mente, elas nos poriam fora da cama". Platão, Lisis, 214 - "Os bons são iguais uns aos outros, e amigos uns dos outros, e os maus nunca formam unidade uns com os outros ou consigo mesmos; porque eles são apaixonados e incansáveis, e qualquer variação e inimizade provavelmente formam união ou harmonia com outra coisa qualquer".
A doutrina é moralmente perniciosa porque transfere a culpa do pecado humano ao ser ou seres que tentam os homens a isso. - Respondemos que nem a consciência, nem a Escritura permitem que a tentação seja uma desculpa para o pecado ou considera Satanás como tendo poder para coagir a vontade humana. A objeção, contudo, contradiz nossa observação, - pois só onde se reconhece a existência pessoal de Satanás reconhece-se o pecado em sua verdadeira natureza.
O caráter diabólico do pecado torna-se mais culposo e detestável. A imoralidade está, não na perseverança, mas na negação da doutrina. O abandono da doutrina de Satanás está em conexão com a frouxidão na administração da justiça criminal. A pena vem a ser considerada somente como dissuasiva e reformatória.
A doutrina degrada o homem, representando-o como instrumento e escravo de Satanás. - Respondemos que, na verdade, ela mostra que seu verdadeiro estado acha-se degradado, mas apenas como resultado da exaltação da nossa idéia de sua dignidade e de sua possível glória em Cristo. O fato de que se sugeriu o pecado do homem vir de fora e não de dentro pode ser uma circunstância mitigadora que toma possível sua redenção.
Ao invés disso ela põe um estigma sobre a natureza humana, dizendo que ela não é decaída - que sua condição presente é o seu estado original e normal. Nem se deve atribuir ao homem uma dignidade que ele não possui se em conseqüência disso privamo-lo da dignidade que ele pode possuir. O pecado de Satanás é, em essência, o pecado contra o Espírito Santo para o qual não pode haver o "Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem" (Lc. 23.34), porque ele escolheu o mal com a mala gaudia mentis (maus prazeres da mente), ou a mais nítida intuição de que isto é mau. Se o diabo não existe, então o próprio homem é o diabo. Tem-se dito que Voltaire, sem crer em um diabo, o via em toda a parte - até mesmo onde ele não estava. O cristão do Peregrino de Bunyan, recebe o consolo quando acha que as sugestões blasfemas que lhe vieram no vale escuro eram o inimigo que o perseguia. Se toda a tentação viesse de dentro, o nosso caso pareceria desesperador. Mas, se "um inimigo é quem fez isso" (Mt. 13.28), então há esperança. E, então, podemos aceitar a máxima: "Nullus diabolus, nullus Redemptor (Se não há diabo, não há Redentor". Os unitários não têm nenhum Capitão da Salvação e não têm nenhum Adversário contra quem contenderiam.
EMPREGOS PRÁTICOS DA DOUTRINA DOS ANJOS
Emprego da doutrina dos anjos bons
Ela nos dá um novo senso da grandeza dos recursos divinos e da graça de Deus na nossa criação ao pensar na multidão das inteligências não decaídas que executaram os propósitos divinos antes que o homem aparecesse.
Fortalece nossa fé no cuidado providencial de Deus ao saber que se delega aos espíritos de tão alto nível ministrar às criaturas que estão envolvidas com as tentações e conscientes do pecado.
Ensina-nos a humildade, porque seres de tanto maior conhecimento e poder que os nossos alegremente executam, anônimos, estes trabalhos em favor daqueles cuja única reivindicação é a de serem filhos do mesmo Pai.
Ajuda-nos na luta contra o pecado a aprender que estes mensageiros de Deus estão perto para assinalar o nosso erro se caímos e sustentar-nos se resistimos à tentação.
é) Amplia nossas concepções da dignidade do nosso ser e das ilimitadas possibilidades da nossa futura existência para lembrar estas formas de típica inocência e amor que louvam e servem a Deus incessantemente no céu.
Exemplo de aparição de anjos na vida de Jacó em Betei (Gn. 28.12 - Conversão de Jacó?) e em Maanaim (Gn. 32.1,2 - dois acampamentos, de anjos, à direita e à esquerda; cf. SI. 34.7 - "O anjo do Senhor acampa-se ao redor dos que o temem, e os livra"); assim também, o Anjo que, em Peniel, lutou com Jacó ao entrar na terra prometida (Gn. 32.24; cf. Os. 12.3,4 - "no vigor da sua idade, lutou com Deus; lutou com o anjo e prevaleceu"), e ''o anjo me livrou de todo o mal" (Gn. 48.16) ao qual Jacó se refere no leito da morte. Edmund Spenser, The Faerie Queene (A Rainha das Fadas): "E há preocupação no céu? e há amor nos espíritos celestiais para com as criaturas abaixo para que possa compadecer-se delas no seu mau comportamento? Há; caso contrário haveria muito mais homens desvalidos do que animais. Mas ah! quanta graça do altíssimo Deus que ama de tal modo as suas criaturas e abrange todas as suas obras com misericórdia, que benditos anjos ele manda para um lado e para outro para servir ao ímpio, para servir o seu inimigo ímpio! Quão freqüentemente as suas salvas de prata partem e vêm socorrer- nos, socorrer o necessitado! Com que freqüência as suas asas douradas cortam os imensos céus como arautos voadores enfrentando sórdidos inimigos a fim de, militantes, auxiliar-nos! Lutam por nós; estão em vigília, na devida guarda e os brilhantes esquadrões rodeiam os nossos pés; e tudo por amor, nada por recompensa. Por que o Deus celeste teria tanta consideração para com os homens?"
Isto nos mostra que o pecado não é mera limitação, a fim de ver inteligências que mantiveram sua integridade. Shakespeare, Henrique VIII, 2.2 - "Ele aconselha o divórcio - uma perda daquela que pendurou vinte anos em torno do seu pescoço e mesmo assim não perdeu o seu brilho; daquela que o ama com a excelência com que os anjos amam os homens; daquela que ao desabar o maior golpe da fortuna, bendirá o rei". Medida por Medida, 2.2 - "Ó homem, ó homem orgulhoso, apresenta fantásticos artifícios perante os altos céus, e faz chorar os anjos".
Empregos da doutrina dos anjos maus
Ela ilustra a real natureza do pecado e a profundidade da ruína a que ele pode levar a alma a refletir a condição moral presente e eterna miserabilidade a que estes espíritos, tão altamente dotados, chegaram por sua rebelião contra Deus.
Inspira um temor salutar e aversão das primeiras abordagens do mal vindas de dentro ou de fora para lembrar que estes podem ser os avanços cobertos de um ser pessoal e maligno que procura derrotar nossa virtude e envolver-nos em nossa própria apostasia e destruição.
Envolve-nos em Cristo como o único Ser que é capaz de livrar-nos e a outros do inimigo de todos os bons.
Ela nos ensina que a nossa salvação é inteiramente de graça porque não se providenciou nenhuma expiação e nenhuma renovação para tão grande multidão de espíritos rebeldes - a simples justiça teve seu curso e nenhum merecimento se interpôs ou salvou.
Philippi em sua Glaubenslehre (Doutrina), 3.151-284, sugere as seguintes relações da doutrina de Satanás com a do pecado: 1. Porque Satanás é um anjo decaído, que outrora foi puro, o mal não é auto-existente ou necessário.
O pecado não pertence à substância que Deus criou, mas é um acréscimo posterior. 2. Porque Satanás é uma criatura essencialmente espiritual, não pode ter sua origem na natureza simplesmente sensorial, ou simplesmente uma natureza física. 3. Porque Satanás não é uma criatura fraca e de pobres dotes, o pecado não é um resultado necessário da fraqueza ou limitação.
Porque Satanás está confirmado no mal, o pecado não é necessariamente transitório ou ato remediável da vontade. 5. Porque em Satanás o pecado não termina, não se trata de um passo desenvolvido pela criatura, ou um estágio do progresso para algo mais elevado e melhor.
"Eles nunca submergem tão fundo, Eles nunca sobem tão alto; eles nunca conhecem tais profundezas do sofrimento, Tais alturas da majestade. O Salvador não une a sua natureza à deles; Porque eles não derramam o sangue divino, nem soltam um só gemido". Se não lhes foi provida redenção alguma, pode ser porque: 1. o pecado teve origem com eles; 2. o pecado que eles cometeram é "pecado eterno" (cf. Mc. 3.29); 3. eles pecaram com nítida inteligência e mais completo conhecimento do que nós (cf. Lc. 23.34); 4. seu ser incorpóreo agravou o seu pecado e assimilou-o ao nosso pecado contra o Espírito Santo (cf. Mt. 12.31,32); 5. este ser incorpóreo não deu nenhuma oportunidade para Cristo objetivar sua graça e visivelmente juntar-se a ele (cf. Hb. 2.16); 6. a persistência deles no mal apesar do crescente conhecimento do caráter de Deus apresentado na história humana, resultou em endurecimento do coração que não é suscetível de salvação.
Contudo, os anjos foram criados em Cristo (Cl. 1.16); consistem nele (v. 17); Cristo deve sofrer por causa dos pecados deles; Deus os salvaria, se consis- tentemente ele pudesse. O Dr. G. W. Samson sustentava que o Logos tornou- se um anjo antes de tornar-se homem e isto explica suas aparições como "o anjo do Senhor" no Velho Testamento (Gn. 22.11). Não se afirma que todos anjos decaídos serão eternamente atormentados (Ap. 14.10). Em termos igualmente fortes (Mt. 25.41; Ap. 20.10) declara-se a existência de um lugar de castigo eterno para os maus, mas não cremos que todos homens irão para lá apesar de que todos homens são maus. O silêncio da Escritura sobre uma provisão de salvação para os anjos decaídos não é prova de que não haverá tal provisão. 2 Pe. 2.4 mostra que os anjos maus não receberam o juízo final, mas estão em estado temporário de existência e tal estado final ainda está
por ser revelado. Se Deus ainda não proveu, pode ele não prover-lhes a redenção e os "anjos eleitos" (1 Tm. 5.21) talvez sejam os que Deus predestinou para estarem na futura provação e serem salvos, enquanto os que persistem em sua rebeldia serão consignados ao lago de fogo e enxofre (Ap. 20.10)?
O guardador de uma jovem tigre deu uns tapinhas de carinho na cabeça dela e ela lambeu as mãos dele. Mas quando ela se tornou mais velha agarrou a sua mão com os dentes e começou a morder. Ele puxou a mão em cortes. Aprendeu a não acariciar um tigre. Aprendamos a não acariciar Satanás. Não "ignoremos os seus ardis" (2 Co. 2.11). Não é bom pesadas armas de fogo no canto da chaminé. "Os que têm medo da ader (tipo de víbora) não se aproximarão do seu sibilado". Talmage: "Ó Senhor, ajuda-nos a ouvir o chocalho da cascavel antes de sentirmos os seus ferrões", lan Maclaren, Cure of Souls, 215-0 pastor treme por causa de uma alma, "quando vê o destruidor rondando como um predador venenoso no ar e quer que ela esteja sob as asas de Cristo".
Thomas K. Beecher: "Suponha que eu more na Broadway, onde o povo se levanta sempre em diferentes direções. Deixaria eu portas e janelas abertas, e diria à multidão de estranhos: Entrem pelas minhas portas, atravessem o meu salão, penetrem a sala de visitas, sintam-se em casa na minha sala de jantar, subam aos meus aposentos? Não! Fecharia as janelas, trancaria as portas, passaria a chave contra os intrusos e as abriria só para mim e para os meus e para aqueles que tenho por companheiros. Contudo, aqui vemos tolos e tolas estendendo seus braços e dizendo aos espíritos do vasto abismo: 'Entrem e tomem posse de mim. Escrevam com as minhas mãos, pensem com o meu cérebro, falem com os meus lábios, andem com os meus pés, usem-me como um meio para o que quiserem'. Deus respeita a santidade do espírito do homem. Até mesmo Cristo se põe à porta e bate. Espírito Santo, enche-me de modo que não haja lugar para nenhum outro". (Ap. 3.20; Ef. 5.18).


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