Teoria Crítica

June 4, 2017 | Autor: André Saramago | Categoria: Critical Theory, International Relations, Teoría Crítica, Relações Internacionais, Enciclopedia
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ENCICLOPÉDIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS



NUNO CANAS MENDES FRANCISCO PEREIRA COUTINHO (ORG.)

ENCICLOPÉDIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS PREFÁCIO PROF. ADRIANO MOREIRA

Título: Enciclopédia das Relações Internacionais © 2014, Nuno Canas Mendes, Francisco Pereira Coutinho (Org.) e Publicações Dom Quixote Todos os direitos reservados Capa: Joana Tordo Imagem da capa: XXXXX Revisão: Eda Lyra Paginação: Leya Impressão e acabamento: CEM 1.ª edição: junho de 2014 Depósito legal n.º: 374 852/14 ISBN: 978-972-XX-XXXX-X Reservados todos os direitos Publicações Dom Quixote Uma editora do Grupo Leya Rua Cidade de Córdova, n.º 2 2610-038 Alfragide – Portugal www.dquixote.pt www.leya.com

TEORIA CRÍTICA

T TEORIA CRÍTICA André Saramago

O conceito de teoria crítica refere-se ao trabalho filosófico e sociológico desenvolvido por autores associados ao Instituto para a Pesquisa Social de Frankfurt, também conhecido como a Escola de Frankfurt. Entre os seus principais colaboradores contam-se nomes como Max Horkheim, Theodor Adorno, Herbert Marcuse, Jürgen Habermas ou Axel Honneth que, desde a fundação do Instituto em 1923, têm procurado desenvolver o que descrevem como uma teoria crítica da sociedade. O termo propriamente dito surge no ensaio de 1937, de Max Horkheim, intitulado Traditional and Critical Theory, onde este procura estabelecer as principais características desta abordagem. Assim, a teoria crítica distingue-se da teoria tradicional pelo facto de estar consciente de que os compromissos ideológicos e normativos do investigador, assim como as influências do seu meio e sociedade, necessariamente moldam a sua investigação sociológica. Enquanto a teoria tradicional recusa a influência de fatores normativos ou pessoais no retrato que procura produzir da realidade social, assumindo-se, portanto, neutra do ponto de vista valorativo, a Teoria Crítica não só reconhece esta influência como a torna expressa e um elemento central da sua construção teórica. Assim, a teoria tradicional, ao procurar apenas produzir um retrato objetivo da sociedade de forma a compreendê-la e explicar, ignora as suas próprias influências valorativas e não questiona a sua própria influência na configuração da realidade social, acabando por, muitas vezes inconscientemente, perpetuar certas configurações sociais ou moldar a sociedade de forma não planeada. A teoria crítica, por outro lado, procura consciencializar esta ligação entre teoria e prática. Assim, procura não só compreender a sociedade, mas também perceber como a teoria sociológica, necessariamente moldada pelos critérios normativos dos investigadores e da sociedade no contexto da qual é produzida, transforma a realidade social ao condicionar a maneira como os seres humanos a compreendem e, consequentemente, com ela interage. A partir deste ponto de vista, a teoria crítica passa a argumentar que, se a teoria sociológica condiciona o real, então, tanto esta como o investigador social devem estar normativamente comprometidos com ideais de libertação e exposição/destruição de formas de dominação na sociedade. A teoria crítica passa então a estar focada na exposição de formas de dominação social e procura informar a transformação emancipatória da sociedade de forma a promover a liberdade humana. 527

TEORIA CRÍTICA

Os investigadores da Escola de Frankfurt constituíam na sua maioria neomarxistas que, comprometidos com o ideal de emancipação humana avançado por Karl Marx, procuravam compreender o falhanço da sua teoria sociológica relativamente ao rumo de desenvolvimento das sociedades capitalistas. Em vez da revolução proletária e libertação antecipadas, o movimento marxista tornou-se ele próprio uma fonte de opressão e dominação nos países que caíram sob a sua influência, enquanto nos países capitalistas a crescente promiscuidade entre Estado e sector privado deu origem a um capitalismo de Estado que não só conteve as contradições da economia capitalista, perpetuando as suas relações de dominação, como, em alguns casos, assumiu a forma de fascismo. Negando que as autoidentificadas ditaduras marxistas fossem de algum modo legítimas representantes do ideal político estabelecido por Marx, a Escola de Frankfurt procurou desenvolver a teoria marxista de forma a incorporar estes desenvolvimentos históricos e a recuperar o seu potencial emancipatório, ao mesmo tempo que a reconhecia insuficiente para, por si só, explicar as transformações ocorridas na modernidade ocidental. A teoria crítica procurou assim constituir-se numa nova teoria sociológica que fosse capaz tanto de identificar os focos de resistência e emancipação no mundo moderno como de explicar as suas formas de opressão e dominação. Para tal, esforçou-se por promover uma síntese entre campos tão diversos como a filosofia, a sociologia, a psicologia, a antropologia, a história, a economia e a ciência política, contando entre as suas principais influências autores como Immanuel Kant, Karl Marx, Sigmund Freud, Max Weber ou Georg Lukacs. Embora, à exceção de Habermas, os autores da teoria crítica não se debrucem particularmente sobre temas internacionais, vários autores na disciplina de relações internacionais têm adotado as suas abordagens e teorias sociológicas. Assim, no trabalho de autores como Andrew Linklater, Ken Booth, Seyla Benhabib, Robert Cox, Richard Wyn Jones ou Kimberley Hutchings pode-se encontrar as temáticas desenvolvidas pela Escola de Frankfurt. Em particular, na tentativa de desenvolver uma teoria sociológica das relações internacionais que, por um lado, seja capaz de identificar relações de opressão e dominação na política mundial e, por outro lado, esteja comprometida com o ideal da transformação emancipatória das relações internacionais de maneira a promover a expansão da liberdade humana. A variedade de abordagens informadas pela teoria crítica é imensa, ao ponto da ligação entre muitas delas e o trabalho da Escola de Frankfurt ser, no mínimo, ténue. Por isso, tornou-se comum em relações internacionais fazer-se uma distinção entre «teoria crítica» para abordagens que sejam diretamente informadas pela Escola de Frankfurt, e «teoria crítica» para abordagens que, embora não informadas pelos trabalhos do Instituto, partilhem o seu compromissao normativo com a transformação emancipatória da realidade internacional e a exposição de relações de domínio e opressão. 528

TEORIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS

BIBLIOGRAFIA

Andrew Linklater, Critical Theory and World Politics: Citizenship, Sovereignty and Humanity, Routledge, 2007, p. 240. Ken Booth, Theory of World Security, Cambridge University Press, 2007, p. 489. Max Horkheim, «Traditional and Critical Theory», Critical Theory: Selected Essay Max Horkheimer, S. Fischer Verlag, Continuum Publishing Company, 1982, pp. 188-243. Robert Cox, «Social Forces, States and World Orders: Beyond International Relations Theory», Millennium: Journal of International Studies, 10, 2, 1981, pp. 126­ ‑155. David Held, Introduction to Critical Theory: Horkheimer to Habermas, University of California Press, Los Angeles, 1980, p. 511.

TEORIA DAS RELAÇÕES INTERNACIONAIS Luís Pereira Coutinho

Num âmbito disciplinar marcado pela pluralidade, senão mesmo pela conflitualidade, não há uma teoria das relações internacionais, mas teorias das relações internacionais. A cada uma dessas teorias corresponde uma conceção da realidade internacional, fundamentalmente caracterizada pela resposta a três questões. A primeira questão é a de saber se a realidade internacional consubstancia inevitavelmente uma anarquia ou se, pelo contrário, lhe corresponde ordem. A segunda questão, não integralmente coincidente, é a de saber se à mesma realidade corresponde facticidade ou, pelo contrário, normatividade. A terceira questão respeita aos fatores determinantes da realidade em causa, se fatores materiais, se fatores culturais ou ideacionais. Quanto à primeira questão, o realismo – teoria dominante das relações internacionais – encara a realidade internacional como uma inescapável anarquia em cujo âmbito os Estados se empenham na prossecução de interesses irredutíveis definíveis em termos de poder e para os quais, nessa medida, a guerra é uma possibilidade permanente (anarquia hobbesiana). Deste modo, o realismo demarca-se distintamente da pretensão idealista de ordenar normativamente a realidade internacional. Em grande medida, de resto, tal linha afirmou-se no século passado sobretudo por oposição à pretensão wilsoniana de conversão das relações interestaduais em relações jurídicas pacíficas salvaguardadas no âmbito de um sistema de segurança coletiva. É o que ressalta na obra de E. H. Carr, Hans Morgenthau ou Raymond Aron. Ressalve-se, no entanto, que encarar a realidade internacional como uma ordem – e não como uma anarquia desordenada – não significa necessariamente pensá-la idealisticamente no plano do dever ser como ordem de paz, 529

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