Terror e Contradição

August 12, 2017 | Autor: Marta Moreno | Categoria: War on Terror
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O Estado Islâmico e o Ocidente: um jogo de contrários absolutos.

O vídeo do piloto jordaniano sendo queimado vivo por militantes do Estado Islâmico (Isis) e, mais recentemente, a decapitação de 21 cristãos coptas egípcios na Líbia, chocou o mundo, inclusive o islâmico. O horror foi tamanho que fez com que os vídeos parecessem montagens produzidas por homens encapuzados parecendo habitar um mundo, física e imaginariamente, remoto do Ocidente.
O Ocidente não se reconhece no Isis e nem o contrário. Como colocado pelo presidente Obama, o Isis é o "puro mal". A organização, que pretende reeditar a ideia de um Califado em pleno século XXI, é tida como o avesso do Ocidente e parece fazer de tudo para conferir crédito à declaração de Obama, uma vez que não mede esforços para produzir o terror e chacoalhar as audiências ocidentais. E o faz evocando o resgate de um Islã não contaminado pelos valores ocidentais. O sonho de reviver um passado mítico por parte do Isis perde de vista, contudo, que o grupo se vale de modernas tecnologias sob a forma de armas sofisticadas de fabricação norte-americana, e da Internet, utilizada para conferir publicidade aos seus atos e tentar arregimentar adeptos para suas causas antiocidentais.
Esse jogo de contrários absolutos, do bem contra o mal, da civilização contra a barbárie, tem uma longa trajetória no pensamento ocidental. No clássico "Orientalismo", Edward Said ilumina o processo de construção do Oriental por parte daqueles que se representam como ocidentais. O Isis, passa a ocupar esse lugar historicamente imputado aos orientais, mas também aos canibais e piratas: o da irracionalidade e da desumanidade. O Ocidente, por contraposição, continua se produzindo como o espaço do progresso, da razão e da humanidade, pronto para salvar, se preciso coercitivamente, os não-ocidentais de seus costumes bárbaros. 
Todavia, a busca por uma identidade pura só se faz possível por meio do sepultamento dos complexos entrelaçamentos da história, que resultaram numa hibridização de culturas, e que mesclaram, de modo irreversível, os destinos da humanidade. Esse jogo de purificação, contudo, não é privilégio do Isis, já que o nosso próprio Estado nacional se construiu a partir do ideal de um Estado homogêneo, pouco afeito ao reconhecimento da diferença no âmbito das suas fronteiras, vide o caso contemporâneo da França onde as mulheres são proibidas de utilizar o véu nos seus locais de trabalho e estudo.
A representação histórica do Ocidente sobre os povos não-ocidentais como um todo bárbaro, vem tornando o Ocidente prisioneiro da sua própria retórica. Afinal, paira sempre a dúvida se, de fato, ele aprendeu a discriminar os fiéis islâmicos da sua minoria radicalizada. Por outro lado, ao banalizar a barbárie entre os não-ocidentais, o Ocidente se vê diante de um impasse: como qualificar o Isis, a não ser por superlativos, como o mais bárbaro entre os bárbaros?


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