Tráfico de drogas e prisão na cidade de Ponta Grossa/PR: Mulheres no cárcere

May 27, 2017 | Autor: Kriztiaw Marciniszek | Categoria: Drugs, Prisão, Sistema Prisional, Trafico De Drogas, Ponta Grossa/PR
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1º SEMINÁRIO DE ESTUDOS EMPÍRICOS EM DIREITO: SEMEANDO LIBERDADES 16 a 18 de Novembro, Ponta Grossa (PR)

TRÁFICO DE DROGAS E PRISÃO NA CIDADE DE PONTA GROSSA/PR: MULHERES NO CÁRCERE

Kriztiãw Marciniszek Santana – SECAL Aknaton Toczek Souza – SECAL; UFPR

Tráfico de drogas e prisão na cidade de Ponta Grossa/PR: Mulheres no cárcere Kriztiaw Marciniszek Santana1 Aknaton Toczek Souza2

Resumo: Realizada uma análise do sistema de justiça criminal e seus operadores na totalidade, não se restringindo somente ao magistrado, mas também aos agentes que realizam a seleção anterior ao processo, que legitimam a distinção do traficante e do usuário de drogas, mediante a coleta de dados empíricos, pretende-se verificar os elementos do processo empregados para esse reconhecimento no decorrer da tramitação da ação criminal. Por consequência da seletiva serventia da Lei 11.343/06 que é aplicada de forma arbitraria em preferidos cidadãos e grupos sociais e étnicos, reflete-se sobre o perfil dos presos por tráfico de drogas do sexo feminino em Ponta Grossa/PR e a fundamentação jurídica que é utilizada para embasar as decisões que prendem os usuários de drogas como também o discurso que estimula a essa política pública de guerra as drogas que se iniciou na década de 70 que adota regimes de repressão e criminalização das substancias psicoativas em questão, estas sendo maconha, crack e cocaína.

Palavras-Chave: Cárcere. Tráfico de Drogas. Mulheres.

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Acadêmico do 5º período do curso de Direito das Faculdades SECAL, monitor do grupo de pesquisa Sociologia do crime: Controle Social, Punição e Segurança Pública, E-mail: [email protected] 2

Doutorando em Sociologia pela Universidade Federal do Paraná (UFPR), Pesquisador do Centro de Estudos em Segurança Pública e Direitos Humanos da Universidade Federal do Paraná (CESPDH). Coordenador do grupo de pesquisa Sociologia do crime: Controle Social, Punição e Segurança Pública. Professor de Criminologia e Direito Penal do curso de Direito das Faculdades SECAL. E-mail: [email protected]

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SUMÁRIO

1. Introdução...................................................................................................................04 2. Controle Social e o Sistema de Justiça Criminal........................................................06 3. Criminalização da marginalidade...............................................................................08 4. “Dessa forma, tratando-se de crack, impõe-se a valoração negativa”........................16 5. Mulheres no cárcere....................................................................................................18 6. Conclusão....................................................................................................................21 7. Referências..................................................................................................................22

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INTRODUÇÃO

Trata-se de uma pesquisa empírica em desenvolvimento realizada pelos autores do trabalho no grupo de pesquisa Sociologia do crime: Controle Social, Punição e Segurança Pública da Faculdade SECAL, que visa analisar o discurso jurídico existente nos processos dos acusados e já presos na cidade de Ponta Grossa pela prática dos crimes tipificados no Art. 333 caput e Art. 354 ambos da Lei 11.343/06, bem como dos operadores do direito, e deste modo sistematizar as informações disponíveis no que se refere as mulheres encarceradas na cidade de Ponta Grossa/PR. Será realizada a análise de algumas falas e discursos empregados no processo e o perfil socioeconômico das presas, onde residem, grau de escolaridade, sua qualificação, se possuem filhos, se exercem algum trabalho formal ou informal, e sua renda. Na comarca de Ponta Grossa encontra-se a Cadeia Pública de Ponta Grossa Hildebrando de Souza – CPHSPG, que possui capacidade para 207 detentos, onde, no recorte utilizado no trabalho do mês de julho de 2016 haviam 733 presos, portanto com 354% presos a mais do que sua capacidade, sendo em questão, 30 mulheres presas pelo delito de tráfico de drogas. Após analisado os trinta processos das acusadas, percebe-se que é recorrente a existência de abordagens dos policiais militares ou civis, em que existe a violação de direitos fundamentais garantidos ao cidadão, tais como a vida privada, a intimidade e a dignidade humana, estes ocorrido por meio de flagrantes que ocorrem no local da residência dos réus, sem investigação prévia da polícia, abordagens baseada em denúncias anônimas, leitura de

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Art. 33. Importar, exportar, remeter, preparar, produzir, fabricar, adquirir, vender, expor à venda, oferecer, ter em depósito, transportar, trazer consigo, guardar, prescrever, ministrar, entregar a consumo ou fornecer drogas, ainda que gratuitamente, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar. Pena - reclusão de 5 (cinco) a 15 (quinze) anos e pagamento de 500 (quinhentos) a 1.500 (mil e quinhentos) dias-multa[...] 4

Art. 35. Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 desta Lei: Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos) dias-multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas do caput deste artigo incorre quem se associa para a prática reiterada do crime definido no art. 36 desta Lei.

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mensagens, verificação do conteúdo do celular e ocorrência que existiu abuso na abordagem como o uso da violência para se obter a confissão e demais provas ilícitas utilizadas em alguns processos criminais relacionados ao tráfico de entorpecentes na cidade de Ponta Grossa/PR. Tendo isso em vista, o trabalho irá realizar uma análise mais profunda em especial de dois processos das acusadas encontrados, visto que possui uma tentativa simbólica de silenciar a acusada, em consequência de sua origem e seu perfil socioeconômico, e o outro processo tratado possui na sentença uma observação entre o crack e o LSD que será abordada pelos autores. A metodologia utilizada consiste na análise da lista de presos disponibilizada pela Vara de Execução Penal de Ponta Grossa, realizando um recorte empírico, verificando os detentos do sexo feminino, e sendo este voltado para a observação dos casos existentes no mês de julho de 2016, e deste modo, analisar o processo cuja decisão judicial de prisão5 foi proferida. Será abordado no primeiro capítulo temáticas como controle social perverso e o sistema de justiça criminal e como atuam através de saberes e através da normatização nas políticas públicas que visam combater as drogas. Logo após, a criminalização e gestão da miséria, como são marginalizadas as populações periféricas de Ponta Grossa e a existência de uma classe denominada como “perigosa” para o poder público e como deve ter combatida através de políticas públicas militarizadas e de higienização. Será feita também uma abordagem sobre as relações que o usuário-traficante de crack experimenta advinda da sociedade e do poder público, bem como as mulheres no cárcere abordada com uma visão geral da américa latina e após, especificando-se no Brasil e por fim em Ponta Grossa, e por fim, discorre-se na conclusão, o que foi feito, o que resta fazer e futuros projetos dos autores. Por se tratar de uma pesquisa com indivíduos que se encontram já em situação precária e com processos que ainda não transitaram em julgado, com o intuito de não reafirmar e punir ainda mais os sujeitos já estigmatizados e marginalizados pela sociedade e preservar a sua identidade, utilizar-se-á somente as iniciais dos nomes quando citados.

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Analisa-se os processos que já possuem sentença condenatória ou ordem de prisão preventiva

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CONTROLE SOCIAL E O SISTEMA DE JUSTIÇA CRIMINAL

Idealmente falando, uma sociedade organizada é aquela na qual os indivíduos se encontram integrados, que possui coesão interna (DURKHEIM, 1973 [1893]) vale dizer, permite que indivíduos pertencentes a diferentes classes sociais (WEBER, 1979; MARX 1978 [1844] e 2011) sintam-se instalados no presente (CASTEL, 1998) na medida em que suas condições de existência permitem que planejem o futuro (SENNET, 1999). Desta maneira, devemos entender como controle social, o conjunto de procedimentos e métodos utilizados na interposição que o Estado realiza para de normatizar e padronizar o comportamento do indivíduo, para que o mesmo pertença a classes sociais determinadas pelo Estado e se ajustem a elas, existem, portanto, dois tipos de controle social, o (i) controle social do tipo normal e o (ii) controle social perverso, assim, as diferentes formas de controle social na sociedade, são efeitos de discursos de verdade que acabam por virarem práticas, técnicas e instrumentos de controle do Estado (SOUZA, 2014). Partindo da ideia que o controle social perverso busca em sua essência punir e reiterar os estigmas das populações periféricas, a prisão vem funcionado como uma política pública que busca eliminar os conflitos que existem na sociedade, não havendo assim, dialogo para efetivamente se solucionar eventuais complicações, com violações de princípios constitucionais e penais, que legitimam a gestão da miséria e o uso exagerado da força policial, gerando assim um controle social baseado no medo e na ignorância, que por sua vez é o embasamento do discurso jurídico punitivista para uma política pública de encarceramento em massa de um corpo social que possui uma ânsia punitivista cega que busca sanções na esfera penal, parecem ter uma paixão, se não, um fetiche6 pela punição de criminosos que não se dão o trabalho de averiguar se os candidatos à punição são ou não, e de fato, criminosos (SPOONER, 1875) que por consequência desse sentimento este se manifesta na sociedade 6

Tema abordado profundamente no artigo “Fetichismo e pena: Reflexões sobre psicanálise no direito penal” que discorre acerca do fetichismo sob o marco da psicanálise de Freud e como esta proposta serve para desmascarar o discurso punitivista da aplicação de sanções pelo Estado na esfera penal, em que o sujeito do discurso punitivista e o fetichista de Freud tem algo em comum: o paradoxo base do fetiche, o fetichista de Freud o faz pelo horror a castração, enquanto que o sujeito do discurso punitivista o faz por fidelidade a ela. Disponível em http://revistaomalestarnodireito.com/art1_v2.html

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através de violência e preconceito em relação ao usuário de drogas, a população carcerária e periférica. Pensar o controle social como técnica/instrumento de poder, implica considerar que o controle social é resultado de um discurso de verdade que parte do Estado, por meio de seus empreendedores morais que propagam esses saberem e discursos de verdade, que por sua vez propõem práticas, técnicas e é instrumentalizado através de políticas públicas. Quanto as políticas públicas relacionadas à prisão, como a política antidrogas, o sistema de direito e campo jurídico são as instituições e saberes que propagam e divulgam com maior eficiência as verdades trabalhadas pelo Estado, que por serem resultado de uma rede de interações, perpassada por outros discursos de verdade, que mesmo sendo diferentes mantêm uma regularidade em relação ao seu objeto. Assim as drogas e as relações sociais que permeiam esse objeto, são classificadas por diversos saberes – medicina, psicologia, pedagogia, religião – onde os discursos de verdade acabaram por ser recepcionados no saber/poder jurídico, como desvio, deste modo, rotulando e estigmatizando as populações que são o objeto dessas políticas públicas exercidas pelo controle social perverso (SOUZA, 2014). Esta relação de poder/saber jurídico, também pode ser equiparado a chave jurídico/médica que é acionada para pensar as relações que a política de drogas trata visto que se trata mais uma vez da gestão de ciências e de uma mistura de áreas de conhecimento – biologia, psicologia, medicina e antropologia do século XIX e XX com traços evolucionistas e que servem de alicerce do discurso de verdade utilizado que se traduz no regramento da vida e é utilizada também com concepções morais e frequentemente racistas. (MORAES; SOUZA). O controle social exercido através da prisão é controlado pelo sistema de justiça criminal que é composto por um rol – dentre eles a OAB, MP e Judiciário – imenso de instituições, que utilizam uma normatividade formalizada – o direito – para dar cabo desse exercício (SOUZA,2014), logo, extrai-se que o clima generalizado de medo e de insegurança que envolve o cidadão dos grandes centros urbanos, estão associadas à marginalidade, tanto na concepção da população urbana, quanto nas análises diretas ou indiretas que informam o conteúdo de políticas públicas (COELHO, 1978). O sistema de justiça criminal é o maior responsável pelo desempenho do controle social através de políticas públicas de violência, repressão e criminalização, que incentivam o encarceramento em massa que atuam de forma institucionalizada através de entidades – como polícia militar e civil, exército, guarda municipal e o próprio judiciário – que possuem 7

legitimidade para o uso dessa violência estatal, que estruturam a relação de classe, de gênero e raça (SOUZA, 2014). Deste modo, a política de segurança pública realizada através do sistema de justiça criminal é orientada pelo controle social perverso, que além de excluir o conflito e reproduzir preconceitos e estigmas existentes na sociedade, serve como mantenedora de interesses das classes hegemônicas, gerando um ciclo vicioso de criminalização da marginalidade e marginalização da criminalidade (COELHO, 2005; SOUZA, 2014).

CRIMINALIZAÇÃO DA MARGINALIDADE

Percebe-se que a política pública de drogas possui como principal resultado indesejado (ou desejado) /efeito colateral, a criminalização das populações marginalizadas tendo em vista que são a população que mais compõem a massa carcerária. Ocorre que, a mera opção de adotar o termo “marginalidade” já sugere conotações teóricas, normativas ou ideológicas. O referente empírico dos termos é geralmente o mesmo: a população marginal é aquela constituída pelos que se encontram em situação de desemprego, subemprego ou pobreza. (COELHO, 1978) em concordância com Edmundo Campos Coelho, a despeito destas dificuldades adicionais, o que parece certo é que quaisquer que sejam os indicadores utilizados na pesquisa de objetos como por exemplo prisão e drogas, a correlação entre desemprego, subemprego e pobreza será alta. O perfil da população carcerária feminina de Ponta Grossa, no mês de recorte, compreende diferentes aspectos, que permitem uma visualização de suas situações de vulnerabilidade social pois se vê presente o prevalecimento de determinados perfis de mulheres no sistema prisional que possuem (i) baixa escolaridade, (ii) são solteiras, (iii) possuem um ou mais filhos, (iv) possuem trabalho informal ou (v) estão desempregadas (vi) casos recorrentes de flagrante na residência da acusada e (vii) violação da privacidade e vida intima, estes dados portanto revelam as tendências de encarceramento de mulheres no país, e reforça o já conhecido perfil da população prisional geral, e em especial do tráfico de drogas.

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Portanto, agora irá se abordar a distribuição espacial dos endereços de residência das presas que estão estabelecidas na comarca de Ponta Grosa/PR(14), visto que existem também presas

com

seus

domicílios

em

Curitiba/PR(2),

Castro/PR(3),

Jaguariaíva/PR(1),

Rebouças/PR(1), Telêmaco Borba/PR(1) e Guairá/PR (1), ressaltando que em alguns casos a denunciada possui mais de um endereço, constando portanto, um endereço nos autos de interrogatório, um no cadastro do Projudi e outro endereço distinto no depoimento ou autos de interrogatórios, qualificação e vida pregressa.

Notadamente as zonas periféricas são as que contribuem para a composição da massa presidiária na cidade de Ponta Grossa/PR, logo, seguindo o ensinamento de Edmundo Campos Coelho, o clima generalizado de medo e de insegurança que envolve o cidadão dos centros urbanos, estão associadas à marginalidade. As mulheres presas pelo delito de tráfico, realizam tarefas por vezes chamado de “micro trafico”, por se tratar de quantidades ínfimas da droga e que não possuem grande importância, porém, o seu exercício representa uma atividade de grande risco, e no entanto, por se tratar de quantidades como no processos de 9 acusadas, que portavam menos de 150 9

gramas de maconha, apesar de descrito no Art.33 §4 da Lei 11.343/2006 que nos casos de consumir ou fornecer drogas, a pena pode ser reduzida de um sexto a dois terços, quando o agente for primário, tenha bons antecedentes e não se dedique a atividades criminosas nem integre organização criminosa, e ainda, se tratando do Art.44 do Código Penal que, penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de direito, sendo portando verificando o caso concreto, cabível a substituição da pena privativa de liberdade por restritivas de direito, porém, se tratando das mulheres tanto da América Latina em geral7, como na comarca de Ponta Grossa, estão presas com sentenças excessivamente longas, quando não em prisão provisória ou preventiva, deste modo perpetuando o círculo vicioso de pobreza e marginalidade, e, percebe-se então que na realidade, o processo todo consiste na avaliação social dos indivíduos em várias categorias socioeconômicas, e na subsequente atribuição de status a estes indivíduos ou classes de indivíduos (COELHO, 1978). Este tratamento das populações periféricas, junto com políticas públicas que se baseiam no medo e na ignorância, principalmente, medo e sensação de insegurança esta propagada por meio de empreendedores morais frequentemente vinculados a alguma mídia que tão bem cumprem a sua função, geram na sociedade uma visão de que o outro é o problema, o criminoso, o perigoso.

“[..] Eles – os perigosos – perdem a capacidade de voz, não são ouvidos, são classificados como inimigos sociais, problemas que eles, os operadores, tem que lidar diariamente, e para tal utilizam um processo legal mecanizado, em provas produzidas quase que exclusivamente pela polícia, onde a palavra da defesa é insignificante[...] Assim que o suspeito passa a possuir o rótulo de

perigo à ordem pública, fundamento de sua prisão preventiva, a condenação vem como o caminho mais certo, impedido apenas por uma prova robusta de sua inocência, o que é ainda mais difícil uma vez que a palavra das testemunhas de acusação – policiais – possui a força da verdade. (SOUZA, 2014)

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Mulheres, políticas de drogas e encarceramento, Um guia para a reforma em políticas na América Latina e no Caribe disponível em http://ittc.org.br/wp-content/uploads/2016/10/Guia-Mulheres-politica-de-drogas-eencarceramento.pdf Acesso 28 de out. 2016

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Assim, está presente também nos processos a canonização do discurso policial, que mesmo quando violado princípios que a Constituição federal positivou em seu Art. 5º, inciso X X - São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação;

O Artigo 11 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, mais conhecido como Pacto São José da Costa Rica, em 1969 também já protegia estes direitos: Artigo 11 - Proteção da honra e da dignidade 1. Toda pessoa tem direito ao respeito da sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade. 2. Ninguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, em sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação. 3. Toda pessoa tem direito à proteção da lei contra tais ingerências ou tais ofensas

Tema também já tratado na Declaração dos Direitos Humanos de 1948 aprovada na assembleia geral da ONU: Artigo 12° Ninguém sofrerá intromissões arbitrárias na sua vida privada, na sua família, no seu domicílio ou na sua correspondência, nem ataques à sua honra e reputação. Contra tais intromissões ou ataques toda a pessoa tem direito a proteção da lei.

Portanto, com atitudes que confrontam direitos constitucionais, pactos internacionais e afrontando a Declaração dos Direitos Humanos existem casos em que a polícia viola esses direitos garantidos ao cidadão, vasculhando em seu celular mensagens, ligações e aplicativos que trocam mensagens entre particulares. 11

Seguindo o Art.5º, inciso XII, é inviolável o sigilo da correspondência, isto pois conforme José Laércio Araújo, ao receber a carta, o destinatário transforma-se no proprietário da missiva, mas nem por isso pode divulgar seu teor ao bel prazer8 pois deve proteger a imagem da pessoa que a encaminhou mensagem. Caso seja divulgado esta mensagem particular, o sujeito é passível de detenção de um a seis meses ou multa, conforme Art. 153 do Código Penal Art. 153 - Divulgar alguém, sem justa causa, conteúdo de documento particular ou de correspondência confidencial, de que é destinatário ou detentor, e cuja divulgação possa produzir dano a outrem: Pena - detenção, de um a seis meses, ou multa.

Como a correspondência se trata de uma mensagem entre dois particulares, sendo vedada compartilhar o seu teor sem autorização, o mesmo ocorre com as mensagens eletrônicas, tendo em vista que o conteúdo da mensagem interessa tão somente ao seu recebedor intentado, a inviolabilidade deste direito já foi descrita na Constituição de 1988 pelo legislador e independentemente do avanço e utilização da tecnologia, continua sendo um direito constitucional. A constatação à qual se chega é que se faz irrelevante qual o tipo de correspondência para que haja a garantia da inviolabilidade tutelada pela Constituição Federal. Logo, seja ela entregue a partir da transmissão de dados ou não, o que importa é que a construção do teor continua a prescindir da manifestação da vontade, no sentido de se querer o conteúdo, bem como de encaminhá-lo ao destinatário escolhido, e, principalmente, de divulgá-lo a terceiros.9 Tendo em vista, estes operadores do direito – policiais militares em sua maioria e também policiais civis- que realizam o flagrante, possuem o peso do Estado em sua palavra, e sempre é detida como verdadeira, mesmo quando este agente do Estado comete abusos de poder e até

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ARAÚJO, José Laércio, Intimidade, vida privada e Direito Penal. P.91

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FERREIRA, Rosânea Elizabeth; FILHO, Cláudio Gastão da Rosa.A ilegalidade da violação do conteúdo das mensagens de celular. Disponível em http://www.gastaofilho.com.br/webfiles/pdf/A%20ilegalidade%20da%20violacao%20do%20conteudo%20das%20mensagens%20de%20celular.pdf Acesso em 31 out. 2016

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mesmo remetesse a violência e o magistrado não pronuncia quanto a este fato, conforme ocorrido em processo da acusada S.A.B.M, que transcrevesse: “A ré Solange Aparecida de Matos, quando interrogada, também nega a prática do delito. Não sabe da existência da droga na casa; a polícia não a encontrou cortando a droga. Foi agredida pela polícia, sendo obrigada a confessar. ”

Estes acontecimentos somente são tolerados pois possuem como pano de fundo o medo e a urgência de confinar a classe perigosa em nome de um bem comum, “em outras palavras, na atualidade o medo produz expectativas e demandas de segurança contra e não com os outros – levando a polícia a funcionar como verdadeiro dispositivo de confinamento” (MACHADO DA SILVA, 2008), e a assim, a sabida truculência e arbitrariedade que poderiam fragilizar a palavra do policial nesses flagrantes rotineiros são o custo necessário para o afastamento das classes perigosas e proteção da sociedade. “[...] a truculência (além da corrupção) policial se relaciona com a delegação das camadas mais abastadas para que a corporação realize, a qualquer custo e sem controle público, o esperado afastamento das “novas classes perigosas” (MACHADO DA SILVA, 2008; SOUZA 2014), ou seja, para que possamos prender e punir o criminoso tudo é permitido, até mesmo o uso de tortura e demais abusos do Estado, conforme vemos acima, e esta cruzada que todos os atos de justificam em defesa da segurança pública, são permitidos pois, estes atos, estas atitudes que fogem da regra imposta, para combater algo que não tem violência, tão pouco vítima, só podem ser praticados somente mediante uma circunstância: O Estado de exceção. Esta imagem do perigoso é comumente associada a um criminoso ardiloso, que espalham o mal e a imoralidade pela sociedade, acabando com a juventude, fazendo com que os jovens se tornem, prostitutas, assaltantes, que devem ser contidos, para proteger a sociedade (SOUZA, 2014) este criminoso que nasceu com o mal incrustado em si, tido como inimigo da ordem, que deve ser contido e combatido a todo custo. Todavia, um processo judicial em que se tem por ideia possuir um magistrado que é uma parte neutra na demanda, não poderia ser em tese um local onde existe a concepção que o outro não tem poder de fala, porém, não é o que se percebe, inclusive, entende-se que o inquérito policial ou o boletim de ocorrência é uma verdade a ser alcançada, e não, um fato a ser investigado, conforme transcrevesse uma parte da sentença do processo da acusada S.A.B.M 13

“[...] Márcio confessa ser a droga de sua propriedade, buscando isentar sua esposa de responsabilidade pelo delito. Solange, por óbvio, nega a traficância. A prova dos autos serve a demonstrar pouco críveis as versões apresentadas pelos executados. [...]”

Percebe-se claramente uma tentativa de silenciar a acusada, como se fosse óbvio que fosse negar, porém de nada adianta, pois é claro para a subjetividade do magistrado que sua classe – perigosa – realiza este delito diariamente e quando pego, logicamente a nega, pois é esperado esta atitude dela. Nota-se,

portanto,

uma

clara

manutenção

de

interesses

nestas

relações

(extra)processuais, pois o magistrado tem ciência dos abusos, inclusive na referida sentença fala sobre, e mesmo assim as toleram pois entendem que a partir do momento que é realizado o flagrante se torna prova válida, está documentada e a droga de fato foi encontrada lá10. Percebe-se que a maioria das presas por tráfico em Ponta Grossa (18/30) estavam no momento do flagrante em posse de maconha, e como, o Brasil em contramão da tendência mundial de descriminalização, regulação e comércio das substancias psicoativas, e em especial da maconha, foram autuadas pelos Artigos 33 caput e Artigo 3511 ambos da Lei 11.343/06, sendo então condenadas por tráfico de drogas e associação para o tráfico, e,

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“ Claro eu tenho policiais que depois eu fico sabendo que ele usou de violência. Mas ele não usou de violência para fazer o flagrante. O cara é pego no comercio, pego entregando a droga, usa de violência às vezes depois de encontrar a droga. O cara dá um safanão bem dado: “e ai você vai entregar quem tá vendendo”. Ele não podia ter feito isso, ele sabe que não podia. Agora é aqui para frente, mas daqui para trás a prova é válida, ele fez o flagrante, eu tenho documentado, a droga foi encontrada lá (Promotor de Justiça 3). ” Dissertação Perigo a ordem pública: um estudo sobre controle social perverso e segregação, onde é realizado entrevista com juízos promotores e estagiários do fórum da comarca de ponta grossa, p. 121. 11

Art. 35. Associarem-se duas ou mais pessoas para o fim de praticar, reiteradamente ou não, qualquer dos crimes previstos nos arts. 33, caput e § 1o, e 34 desta Lei: Pena - reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e pagamento de 700 (setecentos) a 1.200 (mil e duzentos) dias-multa. Parágrafo único. Nas mesmas penas do caput deste artigo incorre quem se associa para a prática reiterada do crime definido no art. 36 desta Lei.

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verificando o caso específico, em que as filhas mais novas das acusadas viviam, obviamente, na mesma residência que a mãe, também lhes é imputada o delito de corrupção de menores. Portanto, a proibição das drogas possui vários aspectos, entre eles a violência do mercado ilegal regulado pela força e pela violência, porém, este serviço ilegal que é prestado para o usuário, é feito de certa forma destemida e simbólica, pois a pessoa que o faz põem tudo a perder em detrimento do vício – problemático ou não – de outro sujeito que está tão somente exercendo e efetivando seu direito constitucional de autonomia, intimidade, autolesão, vida privada e etc. Esta imagem visceral de criminalidade, perigo e ameaças as quais os usuários e traficante de drogas, que também por vezes possui um tom racista, são associados devido a propagação da ideia de que, com o perigo do contagio moral, o crime começou a ser definido pela raça. Começou a se atender então o vício e a dependência de drogas com uma questão criminal e não uma questão de saúde, e assim, se militarizou esta política pública que então junta o problema da desigualdade econômica, da segregação racial e dos abusos de drogas e tipifica estas condutas na forma da guerra as drogas tão alvoroçada pelos Estados Unidos, surge então o famoso inimigo público número um: as drogas. El militarismo puede definirse como un conjunto de valores, actitudes y acciones basadas en la centralidad de la violencia armada y la fuerza como forma de disuasión, eliminación y castigo contra lo que se presenta o percebe como enemigo o amenaza a la existencia misma de un orden social (FEBRER, B.C)

Ainda sobre vícios e a venda dessas substancias, se a utilização de qualquer coisa que seja for virtuosa e legal, então a sua venda, será virtuosa e legal. Se utilização for viciosa, então a sua venda, em vista desse uso, também será. Se a utilização for criminosa, então a sua venda, em vista desse uso, será criminosa também. O vendedor é, no pior dos casos, apenas um cúmplice da utilização dada ao artigo vendido, seja essa utilização virtuosa, viciosa ou criminosa. Quando a utilização é criminosa, o vendedor é um cúmplice do crime, e pode ser punido enquanto tal. Mas quando a utilização é apenas ligada ao vício, o vendedor é apenas cúmplice do vício, e não pode ser punido (SPOONER, 1875).

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“DESSA FORMA, TRATANDO-SE DE CRACK, IMPÕE-SE A VALORAÇÃO NEGATIVA”

Realizada a leitura do processo da acusada E.R.S, vemos que se trata de um caso diferenciado uma vez que o juiz competente impõe valoração negativa e faz uma comparação com o LSD que somente reitera os estigmas e rotulações dos usuários de crack, vejamos

“A natureza da droga (crack), em razão do elevado poder destrutivo, justifica a majoração da pena base com fundamento no art.42 da Lei 11.343/2006. Do contrário, haverá violação ao princípio da isonomia, ao se conferir o mesmo tratamento jurídico aos traficantes que comercializam drogas com menor potencial lesivo à saúde, como LSD, vejamos: “ O LSD não é considerado substancia que causa dependência. Em estudos com animais, por exemplo, as cobaias não passam a usá-lo compulsivamente. Apesar de a droga causar intolerância quando é usada em dias consecutivos, com a interrupção do uso crônico, a tolerância vai embora aos poucos, e a sensibilidade à droga volta depois de algumas semanas sem consumi-la. A droga não causa, no entanto, síndrome de abstinência” (ARAUJO, Tarso. Almanaque das drogas. São Paulo: Leya, 2012, p.308). Dessa forma, tratando-se de crack, impõe-se a valoração negativa. ”

Quando a acusada possuem alguma relação com o crack, somado aos fatores (i)pobreza (ii) ausência ou baixa escolaridade e (iii) residências periféricas, fica evidente a representação de um perigo social projetado pelos magistrado e que precisa ser gerida através da prisão e de práticas militarizadas, e assim, com a demonização de categorias ou sujeitos – usuários de crack por exemplo –, que impulsionada pela mídia e outros setores sociais que passam a considerá-los como problema social, e a solução para esse problema têm como primeiro recurso a resposta penal (SOUZA, 2014).

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No caso dos usuários de crack, a situação é ainda pior, pois aqueles que são foco das políticas públicas, do saber/poder, das verdades, das reportagens jornalísticas e factoides, quase sempre estão relacionados a outras situações estigmatizantes, relacionadas à posição marginal que ocupam na sociedade: aspectos como pobreza, situação de rua, ausência de emprego formal e baixa escolaridade. Assim essas pessoas passam a ser vistas como um problema a ser resolvido. Passam a ser vistas como um perigo a “ordem pública. (SOUZA, 2014)

Portanto, quando relacionado ao crack, o usuário ou traficante está propenso a um julgamento moral do agente que considera o crack como sendo um dos piores problemas sociais da sociedade brasileira, sobretudo quando o consumo se espalha por todas as classes sociais, deste modo nota-se o controle social por meio de políticas públicas sanitaristas e de higienização urbana pela segregação dos sujeitos considerados inadequados perante o padrão moral da sociedade (SOUZA,2014). Deste modo fica claro as ações e concepções morais voltadas para a eliminação contra o inimigo social que deve ser combatido e nome da ordem pública, ainda, discorre Febrer acerca desta militarização e gestão pública:

[…] el militarismo no sirve solo para hacer guerra sino también para hacer dinero. Así, la relación entre militarismo y élites económicas, es un aspecto que afecta profundamente también a la disponibilidad y gestión de recursos públicos y al empleo de los recursos para unas u otras políticas públicas

O crack funciona como uma dobra no sistema de politicas públicas, mesclando com a noção deum cidadão que não possui seus direitos civis, ou seja, além das condições de ser marginal, existe a dobra do crack que torna ainda pior, ou ainda mais contaminante moralmente o sujeito. Reflexo diretamente relacionado com as campanhas antidrogas e com a política pública de drogas que age seletivamente. O tráfico de drogas é um ato simbólico, ou seja, ainda que a conduta seja objetiva, todavia, o sentido da ação é dado, construído, no processo interacional, ou seja, o que vem a ser traficante, bem como a gravidade dessa figura simbólica é diretamente relacionada com os estereótipos apontados pela guerra às drogas. Assim, diante de um duplo processo de estigmatização, a figura do traficante/usuário de crack é agravada uma vez que agora, essa substância é representada como um elemento de morte

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social, e mais, pior ainda, de mortos-vivos sociais. Assim seguramente as implicações oriundas do tráfico de drogas por crack é ampliada.

MULHERES NO CÁRCERE

É de saber público que o sistema carcerário não possui estrutura para comportar os seus detentos, e possuem falhas vergonhosas no que se trata da estrutura física das penitenciarias e presídios, contando com instalações superlotadas, com péssimas condições de ventilação, iluminação, higiene e outros problemas relacionado a condições humanas não são incomuns em se tratando do sistema prisional, em Ponta Grossa esta realidade e a mesma do restante do Brasil, se não da América Latina e do mundo, visto que, conforme abordado na introdução, a obtenção do nome dos presos na Cadeia Pública de Ponta Grossa Hildebrando de Souza – CPHSPG, o mesmo possui capacidade para 207 detentos, onde, no recorte utilizado no trabalho do mês de julho de 2016 haviam 733 presos, portanto com 354% presos a mais do que sua capacidade desta forma também na comarca pesquisava, o sistema prisional carece de atenção e de estrutura para a permanência digna sem violação de direitos dos sujeitos neste local, o que parece utópico ao autor a palavra prisão, estrutura e permanência digna sem violação de direitos na mesma frase Se tratando da América latina em geral, a maioria das mulheres privadas de liberdade vivenciaram experiências de discriminação ou violência antes de seu encarceramento, para entender e lidar com a condição dessas mulheres é necessário considerar as pessoas que delas dependem, que não são somente filhas e filhos, mas também outras pessoas menores de 18 anos e idosos da família e da comunidade sob seus cuidados, deve-se levar em conta as devastadoras consequências do encarceramento dessas mulheres e seu impacto nas famílias e comunidades a ela relacionadas12.

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Mulheres, políticas de drogas e encarceramento, Um guia para a reforma em políticas na América Latina e no Caribe disponível em http://ittc.org.br/wp-content/uploads/2016/10/Guia-Mulheres-politica-de-drogas-eencarceramento.pdf Acesso 28 de out. 2016

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O Brasil conta com uma população de 579.7811 pessoas custodiadas no Sistema Penitenciário, sendo 37.380 mulheres e 542.401 homens. No período de 2000 a 2014 o aumento da população feminina foi de 567,4%

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, em Ponta Grossa, no mês de recorte,

existem 733 presos, sendo 51 mulheres e 682 homens, vale destaque que na lista fornecida, no quadrante que consta crime cometido, algumas pessoas possuem descrito somente “flagrante”, não se tratando do que, e pasme, várias pessoas estão com a lacuna em branco, não descrito o crime cometido ou alguma explicação referente a isto. Na Argentina, Brasil, Costa Rica e Peru mais de 60% da população carcerária feminina está privada de liberdade por delitos relacionados com drogas14, e especificamente em Ponta Grossa, 30 das 51 detentas, estão presas pelo delito de tráfico de drogas, ou seja, 58,82% da população carcerária feminina de Ponta Grossa está presa por tráfico, inclusive, em outra pesquisa15 realizada pelos autores constatou-se que existem 4 casos de roubo e 5 de furto, restando então presas por flagrantes, que a lista não se aprofunda, somente se descobre do que foi o flagrante aso procurado o nome da pessoa no Projudi em todas as varas criminais e de execução da comarca que expediu a ordem de prisão, os homicídios e execuções da pena, como a lista se refere. Se tratando ainda da América Latina, as mulheres em submetidas ao cárcere são jovens, têm filhos, são as responsáveis pela provisão do sustento familiar, possuem baixa escolaridade, são oriundas de extratos sociais desfavorecidos economicamente e exerciam atividades de trabalho informal em período anterior ao aprisionamento. Em torno de 68% dessas mulheres possuem vinculação penal por envolvimento com o tráfico de drogas não relacionado às maiores redes de organizações criminosas16. Em Ponta Grossa, as acusadas por

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Dados obtidos através do Levantamento nacional de informações penitenciarias Infopen mulheres – junho de 2014, disponível em: http://www.justica.gov.br/noticias/estudo-traca-perfil-da-populacao-penitenciariafeminina-no-brasil/relatorio-infopen-mulheres.pdf 14

Mujeres y encarcelamiento por delitos de drogas, CEDD, novembro de 2015 Disponível em http://www.drogasyderecho.org/publicaciones/pub-priv/Luciana_v08.pdf Acesso em 28 de out. 2016 15

GÊNERO FEMININO NA CADEIA PÚBLICA DE PONTA GROSSA HILDEBRANDO DE SOUZA: PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA E A CONDIÇÃO DE POBREZA NOS CASOS DE FURTO E ROUBO apresentado no I Simpósio Internacional Interdisciplinar em Ciências Sociais Aplicadas, disponível dos anais do evento http://degecop.wixsite.com/simposio/edicao-atual 16 Mujeres y encarcelamiento por delitos de drogas, CEDD, novembro de 2015 Disponível em http://www.drogasyderecho.org/publicaciones/pub-priv/Luciana_v08.pdf Acesso em 28 de out. 2016 . p.5.

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tráfico possuem idade de 19 a 59 anos, sendo 12 com idade entre 19 e 29, 9 de idade entre 30 a 39, 4 de idade entre 40 a 49 e duas de idade de 50 a 59 anos. No tocante da escolaridade, 13, possuem ensino fundamental incompleto, 1 fundamental completo, 1 somente foi alfabetizada, 2 com o ensino médio incompleto, 1com o ensino médio completo, e 4 processos não verificados a escolaridade decorrente não constar nos autos de interrogatório, qualificação e vida pregressa, ou no Projudi e decorrer do processo, portanto 56% das detentas não possuem escolaridade até o ensino médio completo, não sendo verificado também, presas com ensino técnico ou superior. Das 30 acusadas, 10 são ponta-grossenses, portanto 33% são oriundas da comarca pesquisada, sendo ainda todas do Paraná. Esta alta representatividade se relaciona aos crimes relacionados ao tráfico de drogas, que por sua vez fazem as mulheres se tornarem objeto de incidência das políticas públicas criminais. Referindo-se a ao total das mulheres presas na América Latina, o que possuem em comum é a ausência de antecedentes, a condição de chefes de família em lares monoparentais, a baixa escolaridade formal, a dificuldade de acesso a empregos formais e a condição de arrimo familiar17. A maioria dessas mulheres realiza serviços de transporte de drogas seja para o seu companheiro, como também se percebeu na análise dos processos da comarca de Ponta Grossa/PR, o fazem para os seus filhos e/ou companheiros, visto que essa relação pode ser facilitada pela construção de vínculos sentimentais decorrentes de estereótipos de gênero e de relações desiguais de poder entre homens e mulheres18sendo que não exercem atividades de gerência do tráfico Existem 1.070 unidades masculinas, o que configura um percentual de 75%. Nas outras destinações, há o indicativo de 238 estabelecimentos mistos (17%) e 103

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MULHERES E TRÁFICO DE DROGAS: UMA SENTENÇA TRIPLA – PARTE I, Disponível em http://ittc.org.br/mulheres-e-trafico-de-drogas-uma-sentenca-tripla-parte-i/ acesso em 28 out.2016 18

Mulheres, políticas de drogas e encarceramento, Um guia para a reforma em políticas na América Latina e no Caribe, p.9.

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estabelecimentos femininos (7%), significando, assim, que a maior parte das mulheres estão em estruturas mistas19. Segundo dados do World Female Imprisonment List, relatório produzido pelo Institute for Criminal Policy Research da Birkbeck, University of London, existem mais de 700.000 mulheres presas em estabelecimentos penais ao redor do mundo e estima-se que esse número seja maior, visto que o citado relatório não teve acesso aos dados de sete países. Em números absolutos, o Brasil tinha em 2014 a quinta maior população de mulheres encarceradas do mundo, ficando atrás dos Estados Unidos (205.400 mulheres presas), China (103.766), Rússia (53.304) e Tailândia (44.751), sendo que, relacionado ao tráfico de drogas 25% dos homens respondem por esse delito, e, para as mulheres essa proporção chega a 68%. Nos processos analisados, percebe-se também, que em algumas situações de flagrantes realizado na residência das acusadas, o seu companheiro, assumia que a droga lhe pertencia e que sua companheira não tinha conhecimento de que realizava pequenos comércios, mas do mesmo jeito, a acusada é condenada por tráfico de drogas e associação para o tráfico, existindo também um caso em que fora realizado o flagrante pelo agente penitenciário durante revista para visitação no presídio

CONCLUSÃO

Foi realizado uma pesquisa que procurou sistematizar o perfil socioeconômico das presas da cidade dos autores, assim realizando um passo inicial na pesquisa desenvolvida pelos mesmo, que é voltada ao tema drogas, prisão e políticas públicas e as relações existentes entre estes institutos. Ainda futuramente realizar-se-á uma pesquisa mais profunda analisando as teses de defesa apresentadas por seus advogados constituídos e/ou pela Defensoria Pública Do Estado Do Paraná.

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Dados obtidos através do Levantamento nacional de informações penitenciarias Infopen mulheres – junho de 2014, disponível em: http://www.justica.gov.br/noticias/estudo-traca-perfil-da-populacao-penitenciariafeminina-no-brasil/relatorio-infopen-mulheres.pdf

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Notadamente na comarca de Ponta Grossa/PR o perfil das detentas é marcada pela presença de baixa escolaridade, quando não somente alfabetizados ou que possuem o ensino fundamental incompleto, com trabalho precário informal, em sua grande maioria possuem filhos e são solteiras, possuem idades variadas e uma baixa renda informal que raramente ultrapassa os mil reais. Portanto, em vista do recorte teórico utilizado, após analisado os processos criminais, conclui-se que, o trabalho ou a ausência dele, sendo o mesmo formal ou informal, a renda, o grau de escolaridade, e a localização de suas residências, são fatores determinantes para o processo criminal e a sua eventual condenação ou absolvição.

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