Transformações globais, Modelo Liberal Periférico e educação no Brasil

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Texto para Discussão 007 | 2016 Discussion Paper 007 | 2016

Transformações globais, Modelo Liberal Periférico e educação no Brasil Eduardo Costa Pinto Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro

Reinaldo Gonçalves Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro

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Transformações globais, Modelo Liberal Periférico e educação no Brasil Março, 2016

Eduardo Costa Pinto Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro

Reinaldo Gonçalves Instituto de Economia, Universidade Federal do Rio de Janeiro

IE-UFRJ DISCUSSION PAPER: COSTA PINTO; GONÇALVES, TD 007 - 2016.

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Introdução O objetivo principal desse trabalho é apresentar algumas hipóteses a respeito da relação entre transformações globais, modelo de desenvolvimento, crescimento econômico e educação. Na primeira seção discutem-se as características marcantes do atual sistema internacional, principalmente, a questão da hierarquia de poder, com a ascensão da China, a consolidação do protagonismo dos Estados Unidos e a resignificação do imperialismo. Nessa seção examinam-se, ainda, a subordinação de países em desenvolvimento e a configuração do Modelo Liberal Periférico (MLP). Esse modelo começou a ser adotado no Brasil a partir do início dos anos 1990s. A segunda seção analisa as principais mudanças estruturais fragilizantes que são próprias ao MLP brasileiro. Nessa seção apresentam, ainda, algumas chaves para a compreensão da questão da educação no Brasil no contexto da globalização e do capitalismo dependente que deriva do MLP. A terceira e última seção apresenta uma breve síntese das conclusões.

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1 Transformações globais, hierarquias no sistema internacional e o Modelo Liberal Periférico As relações entre os Estados nacionais são delineadas a partir das constantes disputas por mais poder econômico, político, ideológico, cultural e militar que determinam a posição hierárquica de cada país no sistema internacional capitalista. Sistema este que é caracterizado em sua essência pelo conflito permanente (aberto ou oculto) e pelo equilíbrio instável. Com isso, harmonia, conflito e integração não são fins em si mesmo, mas sim meios para se alcançar objetivos específicos de mais poder (nos diversos campos) para um determinado subconjunto de nações, que buscam manterem-se no topo da hierarquia do sistema a qualquer custo (“quem não sobe cai”) (PINTO e GONCALVES, 2015; GONÇALVES, 2005; PINTO e BALANCO, 2014). A hierarquia é um traço decisivo na composição do sistema internacional tanto em sua origem (paz de Westfália em 1648) como atualmente (no contexto da manutenção do poder dos Estados Unidos, mesmo com a ascensão da China). Isso implica constantes conflitos interestatais e um processo desigual de desenvolvimento capitalista. A depender da posição de um determinado Estado na hierarquia do sistema, ele pode exercer sua soberania, num maior ou menor grau, diante dos outros Estados mediante o uso da força (guerra ou preparação para a guerra), do poder econômico (nas esferas comercial, produtiva, tecnológica, monetária e financeira) e/ou por meio da atuação direta e indireta nos aparelhos hegemônicos internacionais: organizações “multilaterais” (ONU, OECD, FMI, Banco Mundial, OMC etc.), meios de comunicação, cultura e educação de massa atrelados a ordem neoliberal. O posicionamento de “comando” de um determinado país ou de um pequeno grupo de países no sistema internacional capitalista depende da configuração intraestatal das forças produtivas, da divisão do trabalho e do intercâmbio internos. Ou seja, depende do grau de acumulação de capital de cada nação e, consequentemente, do conteúdo e da dinâmica dos setores dominantes (bloco no poder) desse(s) país(es). Marx e Engels (1846, p. 2829), em passagem do livro A ideologia alemã, apontaram claramente esses elementos. Seguindo essa trilha, Hilferding, Bukharin e Lênin avançaram no debate a respeito do caráter hierarquizado do sistema internacional moderno por meio das interconexões da

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dinâmica interna da acumulação e das disputas entre as classes. Configurando a teoria marxista do imperialismo. Nessa linha, Hilferding (1910), Lênin (1916) e Bukharin (1918) afirmaram que os fenômenos da concentração e da centralização do capital estão na origem da transformação da estrutura da acumulação, ocorrida entre o final do século XIX e início do século XX, uma vez que a articulação entre o capital industrial e as instituições bancárias por intermédio das sociedades por ações, configurou uma nova forma de fração de capital: o capital financeiro. Esse capital adotava uma política que articula três objetivos: i) a criação de um território econômico tão vasto quanto possível; ii) a defesa desse território por meio de barreiras aduaneiras; e iii) a transformação desse território em espaço de exploração para monopólios do seu país. O avanço do capital financeiro gerou, progressivamente, a concentração da produção, fenômeno que se expressava por meio da constituição de um reduzido número de grandes associações capitalistas, da separação entre a propriedade das empresas e a direção das mesmas e da socialização máxima da produção dentro da lógica capitalista. Isso gerou uma nova relação entre a dinâmica dos sistemas de monopólios e os conflitos interestatais. A ampliação da área de influência nas regiões econômicas sob domínio do capital financeiro, via exportação de capital, possibilitou a ampliação da escala de produção dos países centrais em espaços nacionais periféricos. Tal dinâmica somente foi possível por meio de forte política expansionista das grandes corporações com o apoio e a intervenção ativa dos Estados nacionais. Intervenção esta que direcionou à aquisição e à manutenção do controle sobre novas áreas econômicas. Ocorreu, então, uma intensificação do conflito entre os maiores Estados capitalistas, pois cada um deles tinha como objetivo ampliar suas áreas de influência e/ou controle de territórios socioeconômicos nas periferias do sistema internacional. O controle e a hierarquia por via das armas e das exportações de capital (que é decorrência da expansão das esferas comercial, produtiva, tecnológica, monetária e financeira do país) continuam sendo característicos marcantes da atual fase do capitalismo como destacaram os teóricos do imperialismo no século passado. No entanto, na fase contemporânea devese levar em conta o papel desempenhado pelo modelo cultural (cinema, TV, mídias, educação, etc.) como importante elemento de dominação e legitimidade (aparelhos hegemônicos no sentido cunhado por Gramsci). As classes dominantes nacionais

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conseguem projetar seu poder no sistema internacional, por meio de seu Estado nacional, dado o grau de soberania que este mesmo Estado desfruta diante de outras nações. Essas formas de dominação devem ser utilizadas para compreender os efeitos das transformações globais recentes, decorrentes da manutenção do poder dos Estados Unidos no sistema internacional num contexto da ascensão da China, sobre as hierarquias do sistema (Pinto e Gonçalves, 2015). Será que a dependência da periferia, especificamente do Brasil, permanece ou conseguimos avançar de forma sistêmica? No contexto da globalização, a hierarquia e o controle do sistema internacional são estruturados, em grande medida, a partir das relações econômicas e políticas entre os Estados Unidos e a China. A globalização, iniciada na década de 1980, é a generalização do modelo neoliberal que tem como características marcantes a liberalização financeira, a abertura comercial e a integração produtiva. A origem desse processo foi a retomada da supremacia norteamericana questionada diante do quadro de crise econômica e redução de poder dos Estados Unidos (EUA) na década de 1970. A partir de 1979, o Estado norte-americano efetivou

importantes

transformações

estruturais

visando

à

recuperação

da

competitividade de seu capital e à sua recolocação no topo hierárquico da economia mundial. Em consequência, cinco eixos foram adotados, segundo Pinto (2011): 1) restauração liberal conservadora apoiada no monetarismo friedmaniano na gestão da política macroeconômica e na visão de mundo hayekiana da competitividade individual; 2) redisciplinamento do mundo do trabalho, realizado mediante ataques aos sindicatos; 3) controle americano do sistema monetário-financeiro internacional; 4) reenquadramento americano dos seus aliados e concorrentes; e 5) aproximação dos EUA com a China comunista como um dos elementos da estratégia americana para contrapor o avanço da URSS. Em linhas gerais, esses novos elementos institucionais quebraram os cânones keynesianos, abrindo espaço para a promoção de nova rota de acumulação e de poder para os capitais norte-americanos por meio do modelo de regulação neoliberal e da ampliação da acumulação com o predomínio das finanças. Assim, houve a aliança entre o Estado norte-americano (Washington), em sua busca de acumulação de poder, e frações do capital estadunidense, sobretudo a bancária-financeira (Wall Street), em sua busca por

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riqueza. Essa aliança foi facilitada pela convergência de interesses entre esta fração e a busca do Estado norte-americano pelo restabelecimento da “ordem”, mantendo o seu projeto imperialista (SEABROKE, 2001). Outro elemento característico da globalização foi a integração produtiva em escala mundial em curso desde o início dos anos 1980, que é fruto da configuração de novas formas de gestão do trabalho, de padrões de automação informatizada (modularização) e de organização industrial. Esse processo ganhou uma generalização na década de 2000, sobretudo nos países em desenvolvimento da Ásia, tendo a China como eixo articulador. Isso permitiu a China avançar degraus da hierarquia do sistema internacional. Não há dúvida que a evolução da economia chinesa tem, cada vez mais, impactado no desempenho da economia mundial, sobretudo no que diz respeito ao aumento dos preços das commodities e à estabilização/redução dos preços das manufaturas. A China hoje assumiu posição de destaque, principalmente nas esferas produtiva e comercial das relações econômicas internacionais. Entretanto, a economia chinesa não substituiu os Estados Unidos como locomotiva da economia mundial. Os Estados Unidos são protagônicos na indústria de transformação, têm a moeda de curso internacional e mercado doméstico com significativo poder aquisitivo. Na realidade, o que se verifica é uma crescente interdependência entre a economia chinesa – comandada por um capitalismo de estado chinês – e a economia norte-americana – direcionada por um capitalismo liberal/financeiro. Hoje esses dois países são os principais atores da economia mundial (PINTO e GONÇALVES, 2015). No plano militar e cultural os Estados Unidos mantêm uma enorme dianteira em relação ao poder chinês. Quarenta e dois por cento das despesas militares do mundo são realizadas pelos americanos. Isso reforça o papel de centralidade desempenhado pelos americanos (segmentos dominantes) no sistema internacional. Esses elementos configuram uma nova fase do imperialismo em que os Estados Unidos continuam exercerem forte capacidade de influenciar de forma direta e indireta as principais instituições supranacionais (FMI, BM, ONU, OTAN, OMC, etc.). Portanto, tais instituições reforçam novos processos de integração do capital nos mais diversos espaços mundiais. Os Estados Unidos também exercem influências culturais/ideológica por meio da disseminação da ideia de economia de mercado, da democracia pluralista

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norte-americana e dos valores culturais consumistas. Para tanto, utiliza as agências “supranacionais” e a mídia global (televisão, cinema, etc.) sob seu controle. Assim, “a cultura mundial americana – a cultura McWord” tem como objetivo central construir “uma sociedade universal de consumo que não seria composta nem por tribos nem por cidadãos, todos maus clientes potenciais, mas somente por essa nova raça de homens e mulheres que são consumidores” (BARBER, 2003, p. 41). A Music Television (MTV), a McDonald’s, a Disneylândia e Hollywood funcionam, antes de tudo, como ícones da cultura norte-americana, “cavalos de Tróia dos Estados Unidos imiscuindo-se nas culturas das outras nações” (Ibidem, p.42). É o soft power do hegemon. No campo econômico, a dominação estadunidense é originária do seu domínio do comércio internacional e dos mercados financeiros e, também, da função exercida por sua moeda, uma vez que o dólar americano funciona como unidade de conta, meio de troca e reserva de valor no sistema econômico internacional. O manejo do comércio internacional e dos mercados financeiros – que tem nos títulos da dívida pública dos EUA os ativos líquidos de última instância na economia mundial - permite aos Estados Unidos incorrerem, constantemente, em déficits externos em conta corrente sem desestabilizar o dólar como moeda internacional. Tais déficits funcionam como uma bomba de sucção da poupança mundial, possibilitando expansões da economia doméstica estadunidense, em função dos seus níveis negativos atuais de poupança interna. O mundo, principalmente a Ásia, financia o padrão consumista da sociedade norte-americana. Nesse contexto, a China não representou ou representa um contrapondo à economia americana nem muito menos a ordem neoliberal. A estratégia chinesa não é mudar a ordem, mas sim integrarse de forma vantajosa, buscando galgar de forma controlada e gradual posições hierárquicas mais elevadas do sistema. Com isso, a ordem neoliberal permanece predominante (com graus e intensidades diferenciadas) nos países centrais e periféricos – mesmo depois da crise internacional de 2008 –, influenciando as hierarquias do sistema internacional. Na periferia (América Latina, África, Ásia e países do leste-europeu) a ideias neoliberais avançaram no final da década de 1980 e foram sistematizadas

no chamado “Consenso de Washington”, em

1989. Integrantes do Instituto de Economia Internacional de Washington, do Banco Mundial, do Banco Internacional de Desenvolvimento e do Fundo Monetário Internacional, representantes dos EUA, países da América Latina, Central e Caribe se

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reuniram com o objetivo de sistematizar as regras de comportamento para as economias dos diversos continentes, sobretudo nos países periféricos. A grande maioria dos países da periferia abraçou ou foi levado – em virtude de seus constrangimentos externos: crises das dívidas externas, etc. –, se bem que seletivamente e com diferentes graus de intensidade, aos ajustes estruturais neoliberais. Esses ajustes consistem, sinteticamente, em abertura comercial e financeira, liberalização financeira, liberalização dos preços e salários, liberalização do regime de investimentos, reforma tributária, privatizações, reforma da seguridade social e reformas trabalhistas. Portanto, na visão conservadora e dominante, o excessivo intervencionismo estatal e os déficits fiscais são os principais empecilhos para os países periféricos adentrarem numa nova fase de prosperidade. Desse modo, a estabilidade monetária, o equilíbrio fiscal, a competitividade internacional, e as reformas institucionais seriam os elementos para a modernização da periferia que nunca chegou. O que se observou foi o aumento da dependência da periferia e do Brasil.

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2 Modelo Liberal Periférico no Brasil: crescimento e educação A medida que se cristalizava a nova ordem/governança internacional neoliberal – pautada, no campo econômico, pelo monetarismo friedmaniano e, no campo político, pela visão hayekiana de competitividade individual e pela ideia de Estado gendarme – ganhava força o grupo dos segmentos dominantes brasileiros, sob a égide da fração bancáriafinanceira, que advogavam a adoção do modelo de desenvolvimento neoliberal (FILGUEIRAS, 2000; PINTO, 2010). Ao longo da década de 1990, o processo de liberalização produtiva, comercial e financeira e as mudanças nos modos de intervenção do Estado, iniciadas no Governo Collor e consolidadas nos Governos FHC, Lula e Dilma conformaram no Brasil o projeto neoliberal. Esse projeto reforça o bloco no poder do capitalismo brasileiro em suas relações dependentes com o capital internacional – expresso no Modelo Liberal Periférico (MLP). O MLP representa um novo padrão de acumulação e produção capitalista em que se configuram profundas modificações tanto nas relações capital-trabalho quanto nas relações intercapitalistas. Neste padrão, verificou-se a redução do poder das forças sociais atreladas ao trabalho, o que, por sua vez, ampliou ainda mais a superexploração do trabalho, que é uma característica marcante do capitalismo periférico (CARCANHOLO, FILGUEIRAS e PINTO, 2009). A superexploração do trabalho é marcante em formações sociais em que o padrão de acumulação é estruturado, sobretudo, “na maior exploração do trabalhador e não no desenvolvimento de sua capacidade produtiva” (MARINI, 2000, p. 125). O Modelo Liberal Periférico (MLP), possui como eixos estratégicos: i) liberalização comercial, produtiva e financeira; ii) mudanças na forma de intervenção estatal por meio da privatização, reformas da previdência social e desregulamentação dos mercados (notadamente o mercado financeiro e o mercado de trabalho); iii) dominância da fração bancária-financeira na dinâmica macroeconômica tanto no que diz respeito às formulações/regime e resultados da política macroeconômica como no que se refere à acumulação e distribuição do excedente econômico entre capital e trabalho e entre frações capitalistas; e (iv) aumento da dependência e, consequentemente, da vulnerabilidade externa estrutural que reduz o potencial de crescimento, amplia a instabilidade

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macroeconômica e tem graves efeitos sobre questões estruturais (emprego, qualificação da mão de obra, educação, etc.). No que se refere às questões estruturais, o MLP significa transformações fragilizantes que impõem restrições ao desempenho econômico de longo prazo. Essas restrições implicam tanto instabilidade quanto fraco desempenho macroeconômico (GONÇALVES, 2013). O MLP caracteriza-se por desequilíbrios estruturais fragilizantes. A evidência é conclusiva em relação ao Brasil no século XXI (GONÇALVES, 2013, cap. 4). Os principais desequilíbrios são: (1) estrutura de produção: deslocamento na direção do setor primário, desindustrialização e dessubstituição de importações; (2) padrão de comércio exterior: reprimarização das exportações (especialização regressiva); (3) progresso técnico: dependência tecnológica e aumento do gap tecnológico;(4) origem da propriedade (desnacionalização); (5) produtividade e competitividade internacional: ganhos no setor primário e perdas nos setores secundário e terciário; (6) vulnerabilidade externa estrutural: passivo externo crescente; (7) concentração do capital; e (8) política econômica (dominação financeira). Esses desequilíbrios determinam tendências na evolução das estruturas, condutas e desempenhos no campo econômico. Essas tendências, por seu turno, têm efeitos diretos e indiretos sobre o mercado de trabalho (desemprego estrutural, precarização, informalização, trabalho autônomo e baixos salários) e a educação (quantidade, qualidade e estabilidade dos investimentos). Vejamos, então, os principais efeitos com o objetivo de levantar algumas hipóteses em relação à educação referenciadas ao Brasil. O deslocamento da estrutura de produção na direção do setor primário (commodities) provoca, na fase ascendente do ciclo internacional dos preços das commodities, os processos de desindustrialização e dessubstituição de importações. Trata-se, na realidade, da regressão ao Modelo Centro-Periferia. Na tradição do pensamento cepalista esse modelo implica desemprego estrutural, deterioração dos termos de troca e desequilíbrio externo e, consequentemente, subdesenvolvimento (PREBISCH, 1949). O MLP significa a “volta ao passado” via reprimarização produtiva; ou seja, uma “repaginada” no capitalismo dependente. No século XXI o locus de acumulação de capital e inovação no Brasil é o agronegócio, a pecuária e a mineração (inclusive, petróleo). No século XXI o MLP é o contraponto à

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experiência de industrialização substitutiva de importações no período 1930-80. Nesse período desenvolvimentista a economia brasileira tem a sua “era dourada” com elevadas taxas de crescimento econômico, mudanças estruturais e modernização. O MLP, que deslancha no Brasil em meados dos anos 1990, tem resultados medíocres pelos padrões históricos brasileiros e pelos padrões internacionais. Para ilustrar, a taxa média de crescimento da renda brasileira é 4,4% no período republicano (1889-2014), 6,5% na Era Desenvolvimentista (1930-79) e 3,0% na Era Liberal Periférica (1995-2014) (PINTO e GONÇALVES, 2015, Tabela 1). O setor primário tem heterogeneidade estrutural visto que há, de um lado, um setor atrasado com baixa produtividade (por exemplo, produção agrícola na pequena e média propriedade) e, de outro, um setor moderno com alta produtividade (agronegócio). O primeiro atende, principalmente, ao mercado interno enquanto o segundo tem forte orientação exportadora. A alta produtividade do agronegócio e da mineração permite maior remuneração dos fatores de produção. No que se refere ao trabalho, o setor primário-exportador exerce força centrípeta já que paga salários mais elevados para a mão de obra de maior qualificação. Em consequência, o setor primário tem “efeito absorção” da mão de obra qualificada. Na realidade, nas fases ascendentes da economia mundial, marcadas pelo aumento dos preços das commodities, as empresas exportadoras do setor primário ”sugam” fatores de produção da indústria e do setor de serviços mais avançados tecnologicamente. O maior custo da mão de obra qualificada e dos insumos aumenta do custo de produção dos segmentos da indústria de transformação que têm potencial para competir internacionalmente, seja via exportação, seja pela competição com produtos importados. O resultado é a perda de competitividade da indústria de transformação e dos serviços tecnologicamente avançados e comercializados internacionalmente. No contexto da globalização comercial (liberalização), a perda de competitividade internacional causa desindustrialização e dessubstituição de importações que, por seu turno, implicam menor crescimento econômico e, portanto, menor investimento em educação. Visto que a produtividade do setor primário-exportador é elevada, a sua capacidade de absorção de mão de obra qualificada é limitada. Ocorre que a desindustrialização reduz as oportunidades de emprego da mão de obra qualificada. Em consequência, países em desenvolvimento enfrentam o problema de má alocação de recursos humanos: o setor

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primário absorve trabalhadores qualificados em atividades que não exigem o nível de qualificação elevado que eles obtiveram na sua formação técnica e educacional. Há no plano individual um “efeito frustração” e no plano social um “efeito desperdício”. No primeiro caso, há a compensação de remuneração mais elevada; porém, no segundo caso resta o custo social. Um exemplo ilustrativo: uma jovem engenheira, altamente qualificada, formada pelo Instituto Militar de Engenharia trabalha em uma empresa de petróleo. Em pouco tempo obtém cargo de gerência e passa a ganhar 2, 3 ou 4 vezes o que ganharia caso estivesse trabalhando em uma empresa da indústria mecânica. A empresa da indústria não pode pagar o salário da empresa de petróleo porque ficaria com custos não competitivos. Do ponto de vista individual a estratégia é consistente com o objetivo de maximização de rendimentos pessoais. Entretanto, essa atividade de gerência pode ser perfeitamente exercida por outra trabalhadora cujo investimento público em educação (por exemplo, curso de administração) foi uma fração do custo de formação da engenheira. Portanto, há um desperdício – má alocação –, ou seja, custo social. Há, ainda, o fenômeno da “fuga de cérebros”. Sem empregabilidade no setor primárioexportador e frente à ausência de oportunidades de ocupação adequada ao seu nível de proficiência em outros setores, profissionais altamente qualificados optam por emigrar. Na fase descendente do ciclo internacional dos preços das commodities a reprimarização do padrão de comércio exterior – crescente especialização em commodities – repercute no padrão de crescimento econômico, na alocação da mão de obra e na educação. Nessa fase descendente, a questão da deterioração dos termos de troca implica perda de renda. Trata-se, aqui, do Modelo de Crescimento Empobrecedor (BHAGWATI, 1958). Segundo esse modelo, o deslocamento da estrutura de produção na direção do setor primárioexportador aumenta a quantidade produzida de commodities. Se o país em questão for grande produtor internacional, o aumento da sua oferta implica queda do preço internacional. Se o país for pequeno produtor e, ao mesmo tempo, outros países aumentam a produção, há elevação da oferta internacional. A concorrência no mercado internacional de commodities ocorre via preço e não qualidade. A variável-chave é a baixa elasticidadepreço das commodities no mercado internacional. Ou seja, o menor preço causa o aumento menos do que proporcional da quantidade exportada e, portanto, há queda da renda decorrente da exportação. Dado que os preços de produtos manufaturados e serviços importados não se alteram, há deterioração dos termos de troca. A maior abertura da

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economia via exportação de commodities gera menor renda, apesar de haver crescimento da quantidade produzida, em decorrência da queda dos preços internacionais das commodities exportadas.

Portanto, o ganho de produtividade é transferido para o

consumidor no exterior na forma de redução de preço. O resultado é a crise econômica ou o menor crescimento econômico do país exportador de commodities. Instabilidade e crise afetam investimentos em capital fixo e em educação. A situação de desequilíbrio da estrutura de produção se agrava mesmo na situação em que não há deterioração dos termos de troca. Esse é o caso conhecido como Modelo da Doença Holandesa (CORDEN e NEARY, 1982). Nesse modelo o aumento do preço das commodities implica não somente inflação de custo como também apreciação cambial. A apreciação cambial reduz ainda mais a competitividade internacional dos produtores domésticos na indústria de transformação e nos serviços tecnologicamente avançados e comercializados internacionalmente. O resultado é maior desindustrialização e fragilização da estrutura produtiva e, portanto, menor potencial de crescimento econômico. A crise do setor primário exportador gera desemprego de mão de obra qualificada que não encontra oportunidades nos outros setores da economia que usam intensivamente esse tipo de mão de obra. Isso ocorre porque na fase ascendente dos preços internacionais das commodities, houve desindustrialização e fragilização do setor de serviços comercializados internacionalmente. Por exemplo, no período de crise econômica, a empresa de mineração demite um geólogo altamente qualificado que não encontra oportunidades de trabalho adequado. Há, então, em países em desenvolvimento o desemprego estrutural da mão de obra qualificada (fator escasso). Por exemplo, não é incomum encontrarmos taxistas nas grandes cidades brasileiras que têm curso superior (engenharia florestal; agronomia; etc.). No que se refere à mão de obra de baixa qualificação, tendo em vista a capacidade restrita de absorção do setor primário moderno, há o deslocamento (força centrífuga) desse tipo de mão de obra para o setor terciário atrasado ou pouco dinâmico tecnologicamente. Os resultados são conhecidos: baixos salários; precarização; trabalho autônomo e autoexploração; e informalização.

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A relação entre reprimarização e crescimento econômico é complexa visto que depende da influência de variáveis como cultura, institucionalidade e políticas (AREZKI e VAN DER PLOEG, 2007; GYLFASON, 2008). O mesmo acontece no que se refere à relação entre educação e crescimento econômico. Ademais, há o problema da causação reversa: variáveis (quantidade e, principalmente, qualidade) relacionadas à educação influenciam a taxa de crescimento econômico, e taxas de crescimento econômico e rendas também influenciam as variáveis educacionais (HANUSHEK, 2013, p. 210). Por um lado, é verdade que países com taxas mais elevadas de crescimento econômico e com níveis mais elevados de renda podem investir mais na educação, inclusive, na dimensão qualitativa. Por outro, também é verdade que países com crises econômicas recorrentes (volatilidade da taxa de crescimento) e fraco crescimento da renda tendem a investir menos em educação, tanto na quantidade quanto na qualidade. Portanto, o baixo crescimento econômico e a volatilidade da taxa de crescimento econômico são determinantes dos investimentos, inclusive, em educação. Para ilustrar esse argumento, cabe mencionar os cortes orçamentários derivados da crise das finanças públicas brasileiras no Brasil no Governo Dilma. Não há dúvida que há inúmeros determinantes econômicos, sociais, políticos, institucionais e éticos da crise sistêmica no Brasil durante o governo Dilma (PINTO, 2015). Entretanto, é evidente que a queda dos preços internacionais das commodities exportadas pelo Brasil tem impacto significativo e negativo impacto sobre a taxa de crescimento econômico e sobre as finanças públicas. Para não se estender em exemplos, pode-se mencionar o caso da crise orçamentária da Universidade Federal do Rio de Janeiro, cuja receita orçamentária em 2016 será menor do que em 2011. Cortes e contingenciamentos orçamentários afetam significativamente a quantidade e a qualidade os serviços prestados pela UFRJ. 1 A educação também é afetada negativamente no caso dos estados e municípios que dependem dos royalties do petróleo. Em alguns municípios do estado do Rio de Janeiro os cortes de gastos em educação em 2016 são consequência da queda do preço

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Por exemplo, cortes nas despesas com serviços terceirizados e interrupção da formação de professores da educação básica. Boletim da ADUFRJ, Ano 1, No. 8, 8 de dezembro de 2015.

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internacional do petróleo e, consequentemente, da receita tributária associada aos royalties do petróleo.2 O MLP implica crescente dependência tecnológica tendo em vista a incapacidade do setor primário de ter efeitos de transbordamento significativos. Por exemplo, no caso do agronegócio, há vazamento de renda com a compra de sementes (transgênicos), produtos intermediários (herbicidas etc.) e bens de capital (tratores, colheitadeiras etc.). De modo geral, em países em desenvolvimento esses produtos são importados ou produzidos localmente por subsidiárias de empresas estrangeiras. Ou seja, o transbordamento tecnológico, via atividades locais de pesquisa e desenvolvimento tecnológico, é restrito. No caso da indústria do petróleo deve ser mencionada a política de conteúdo nacional que objetiva criar relações entre os investimentos das empresas de petróleo e os fornecedores locais com o objetivo de gerar renda e fortalecer o sistema nacional de inovações (construção naval, equipamentos, serviços etc.). Entretanto, dada a volatilidade do preço do petróleo, na fase descendente do ciclo de preços internacionais, a pressão dos custos tende a provocar o afrouxamento, quando não o abandono dessa política.3 A desnacionalização também é uma característica do MLP que afeta o crescimento econômico e a educação, principalmente, o segmento de ciência e tecnologia. Por exemplo, na mineração os elos das empresas estrangeiras com a economia nacional (fornecedores de insumos e equipamentos) são pequenos já que empresas transnacionais têm forte propensão a usar fornecedores estrangeiros (UNCTAD, 2010, p. 114). Da mesma forma que os elos para trás (backward linkages), os forward linkages também são restritos. Países exploram, produzem e exportam minerais e, no entanto, não têm um setor

Ver a matéria do jornalista Bruno Rosa: “Gastos sociais são o maior alvo dos cortes”. Essa matéria cobre os municípios de Campos, Macaé, Rio das Ostras e Quissamã no estado do Rio de Janeiro. O Globo, 28 de fevereiro de 2016, p. 8. 3 Para ilustrar, a empresa Sete Brasil foi criada em 2010 e tem 28 contratos com a Petrobras para o afretamento de sondas para a exploração de petróleo na área do pré-sal. A Sete Brasil financia a produção nacional dessas sondas (www.ri.setebr.com). Porém, indícios de corrupção e a crise na Petrobras provocaram grave crise. A informação em 6 de janeiro de 2016: “Petrobrás quer reduzir para seis o número de sondas da Sete brasil” (Estado de São Paulo: www.economia.estadão.com.br). 2

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de metalurgia com elevado valor agregado. No caso do petróleo, países exportadores de óleo cru têm gargalos no setor de refino e são levados a importar derivados. 4 As perdas de competitividade internacional da indústria de transformação e do setor de serviços comercializados internacionalmente reduzem o potencial de crescimento econômico e, portanto, a disponibilidade de recursos para investimento em educação. Ademais, a menor competitividade internacional aumenta a vulnerabilidade externa do país na esfera comercial já que crises internacionais longas e profundas são acompanhadas, invariavelmente, de “guerra comercial” e “guerra cambial”. A primeira significa o aumento do protecionismo e, portanto, maiores barreiras de acesso ao mercado internacional. A segunda provoca a corrida por desvalorizações cambiais para estimular o ajuste das contas externas e o aumento da competitividade internacional. Em consequência, o acirramento da concorrência no mercado internacional impacta negativamente na capacidade de geração de renda e ajuste externo dos países que adotam o MLP. O resultado são trajetórias de instabilidade e crise que repercutem na evolução dos investimentos públicos, inclusive, em educação. A vulnerabilidade externa não ocorre somente na esfera comercial (reprimarização das exportações), produtiva (desnacionalização) e tecnológica (atraso e dependência). Na realidade, em alguns países o principal fator desestabilizador é a vulnerabilidade externa na esfera financeira. Essa vulnerabilidade expressa a posição de investimento internacional negativa; ou seja, passivo externo maior do que ativo externo. O principal item do ativo externo é a reserva internacional administrada pelo Banco Central. O passivo externo é composto, principalmente, do estoque dos ativos reais de propriedade de estrangeiros (fábricas, fazendas, etc.), ativos financeiros (títulos públicos, ações, títulos privados etc.) e empréstimos e financiamentos. Esses dois últimos compõem a dívida externa denominada em moeda estrangeira. Elevado passivo externo financeiro líquido (passivo financeiro menos reservas internacionais) é uma fonte de desestabilização macroeconômica. Assim, por exemplo, crises ou mudanças nos sistemas monetário e financeiro internacionais podem causar

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Em 2014 o Brasil teve superávite de US$ 500 milhões na balança comercial de petróleo (óleo cru) e déficit de US$ 10,2 bilhões na balança comercial de derivados de petróleo; ou seja, a conta petróleo foi deficitária em quase US$ 10 bilhões. (www.anp. gov.br/?dw=8475).

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reajustes de portfólios de investimento em escala global em detrimento de países com elevados passivos (alto risco). O resultado são crises cambiais que agravam ou geram crises financeiras e crises fiscais. Para ilustrar, governos adotam a política de sustentação de determinados níveis de taxas de câmbio o que, invariavelmente, prejudica as finanças públicas. Governos procuram, ainda, ajustar as contas externas por meio de políticas macroeconômicas restritivas. Em ambos os casos (degradação das finanças públicas e recessão) há o comprometimento de recursos para investimento em educação. A concentração de capital é outra característica do MLP que afeta a capacidade e a qualidade dos investimentos. Concentração de capital implica concentração do poder econômico e, portanto, concentração do poder político. O resultado é que setores e grupos dominantes ̶ no caso do Brasil: agronegócio, mineração, pecuária, empreiteiras e bancos ̶ têm condutas de rent seeking (busca de renda). O conceito de rent seeking associa lucros anormais ou rendimentos extraordinários com a obtenção de privilégios. No caso de empresas, a busca de renda pode derivar, por exemplo, de uma concessão ou um monopólio natural. No caso de indivíduos (burocratas, políticos, etc.) a busca de renda deriva da posição ocupada pelo indivíduo, principalmente, dentro do aparelho de estado. A conduta de busca de renda pode ser um jogo de soma positiva, nula ou negativa. Essa conduta também pode ser lícita ou ilícita (improbidade administrativa, corrupção etc.). De modo geral, a conduta de busca de renda implica vazamento de renda para o exterior e, portanto, menor capacidade de investimento, inclusive, em educação. No caso de atividades ilícitas há, por meio de mecanismos de lavagem de dinheiro e evasão, o agravamento do “ralo” de recursos para o exterior. Na medida em que atividades de busca de renda envolvem ilícitos penais, há o risco de degradação das instituições, má alocação de recursos e desperdício. Nesse caso, a instabilidade macroeconômica própria ao MLP potencializa crises políticas, sociais e institucionais; ou seja; crises sistêmicas. 5 O resultado é, sem dúvida alguma, a trajetória de instabilidade e crise que afeta negativamente os investimentos em educação.

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A operação Lava-jato é exemplo da busca de renda via atos ilícitos e envolve partidos, empreiteiras, empresários, burocratas, assalariados e políticos. Alguns autores argumentam que essa operação agrava a crise econômica. Pinto et al (2016).

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Por fim, o MLP caracteriza-se pela dominação financeira. Trata-se da subordinação das estratégias e políticas econômicas aos interesses do sistema bancário-financeiro. O abuso do poder econômico por parte dos bancos afeta negativamente a capacidade dos indivíduos investirem em educação. O viés restritivo da política monetária fragiliza as finanças públicas com o elevado peso do serviço da dívida. O resultado é a menor disponibilidade de recursos para investimento em educação.

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Conclusões

Na periferia (América Latina, África etc.) as ideias neoliberais avançaram a partir dos anos 1990s e se consolidaram no século XXI. O Brasil adota o Modelo Liberal Periférico que implica mudanças estruturais fragilizantes, com destaque para a vulnerabilidade externa estrutural, a desindustrialização e a especialização regressiva — avanço do setor primário-exportador (agronegócio, pecuária e mineração, inclusive, produção de petróleo). O MLP tem graves consequências como o menor crescimento da renda e a maior instabilidade da economia. O resultado são trajetórias de instabilidade e crise que repercutem negativamente na evolução dos investimentos públicos, inclusive, em educação. Na fase ascendente do ciclo de preços internacionais das commodities, o setor primárioexportador “suga” fatores de produção da indústria e do setor de serviços mais avançados tecnologicamente. Esse fenômeno implica um efeito ”desperdício” ou “má alocação de recursos” no conjunto da economia. Na fase descendente do ciclo de preços internacionais, a especialização regressiva e o padrão de inserção passiva no sistema econômico internacional geram crises econômicas (particularmente, crise fiscal) e trajetórias de instabilidade que afetam negativamente os investimentos em educação. Os cortes nos investimentos em educação geram impacto negativo tanto na quantidade como na qualidade da educação. Esse impacto não se limita a uma determinada conjuntura desfavorável já que as descontinuidades na formação educacional criam um efeito backlog (acúmulo de deficiências e atrasos) no longo prazo. Em consequência da trajetória de instabilidade do MLP, na fase ascendente da economia mundial, a melhora dos indicadores de “quantidade de educação” (anos de escolaridade, taxa de alfabetização, etc.) não é acompanhada por melhoras proporcionais na qualidade da educação. Assim, no longo prazo e descontando-se o efeito cíclico, o MLP pode até mesmo apresentar resultados positivos de quantidade, porém a qualidade da formação educacional é deficiente.

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