(UFPA)EMPIRISMO VS. RACIONALISMO: A DIALÉTICA DIALÓGICA NA FORMAÇÃO DO PENSAMENTO JURÍDICO

May 22, 2017 | Autor: Wellerson Rocha | Categoria: Law, Philosophy Of Law, Right, TGE, Law Academy
Share Embed


Descrição do Produto

UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARÁ – UFPA INSTITUTO DE CIÊNCIAS JURÍDICAS – ICJ FACULDADE DE DIREITO – FaD

WELLERSON ROCHA GOMES GONÇALVES

EMPIRISMO VS. RACIONALISMO: A DIALÉTICA DIALÓGICA NA FORMAÇÃO DO PENSAMENTO JURÍDICO

Belém – PA 2016

WELLERSON ROCHA GOMES GONÇALVES

EMPIRISMO VS. RACIONALISMO: A DIALÉTICA DIALÓGICA NA FORMAÇÃO DO PENSAMENTO JURÍDICO

Paper elaborado para efeitos avaliativos na disciplina Teoria Geral do Estado e Ciência Política (CJ02039), ministrada pelo docente Ricardo Araújo Dib Taxi.

Belém – PA 2016

“O maior remédio que se usa contra um desígnio do inimigo é fazer voluntariamente aquilo que ele prevê que farás à força; pois, ao fazê-lo voluntariamente, faze-o com ordem e com vantagem tua e desvantagem sua; se o fizesses à força, aí estaria tua ruína” (MAQUIAVEL, Nicolau).

“O imperativo do agir é o corpo. Devemos fundar uma ética baseada nas sensações. Não há ação sem substrato físico, o que significa que nenhum comportamento é possível sem que estejamos encarnados. Fora do corpo não há vida. E fora da vida não há sensações” (MEUCCI, Arthur).

RESUMO Este estudo foi desenvolvido com o intuito de abordar a relação ao mesmo tempo que contraditória sendo convergente e dependente destas duas formas de pensar o mundo e a ciência: o empirismo e o racionalismo. O primeiro, pautado nos ideais da razão prática, fazendo uso das experiências e sensações para ratificar suas teorias, a priori. O segundo, faz usufruto dos ideais da razão pura e teórica, racionalizando todos os eventos mundanos para posterior comprovação experimental, ou não. Para tanto, escolheu-se dois teóricos do Estado para serem representantes de cada vertente de pensamento: Nicolau Maquiavel e Thomas Hobbes serão os empiristas; Platão será o racionalista. Abordar-se-á, brevemente, seus contextos históricos e suas teorias de Estado, mais incisivamente. Este trabalho também apresenta uma visão mais subjetiva dos autores, todavia, possui alicerce em teoria de pensadores que escreveram sobre os postulados dos teóricos-base.

Palavras-chaves: Empirismo. Racionalismo. Pensamento jurídico. Maquiavel. Hobbes. Razão teórica. Razão prática. Platão.

ABSTRACT

This study was developed in order to address the relationship while being contradictory convergent and dependent on these two ways of thinking about the world and science: empiricism and rationalism. The first, based on the ideals of practical reason, making use of the experiences and sensations to ratify his theories a priori. The second, is enjoyment of the ideals of pure theoretical reason, rationalizing all worldly events for further experimental evidence, or not. Therefore, we chose two state theory to be representatives of each strand of thought: Niccolo Machiavelli and Thomas Hobbes are empiricists; Plato is the rationalist. It will address briefly its historical contexts and their state of theories, more pointedly. This work also presents a more subjective view of the authors, however, has a alicerçante load thinkers who wrote about the postulates of the theoretical basis.

Keywords: Empiricism. Rationalism. legal thinking. Machiavelli. Hobbes. theoretical reason. practical reason. Plato.

Sumário 1.

INTRODUÇÃO .............................................................................................................................. 7

2.

EMPIRISMO................................................................................................................................... 8 2.1.

NICOLAU MAQUIAVEL ...................................................................................................... 8

2.1.1. 2.2.

THOMAS HOBBES ............................................................................................................. 11

2.2.1. 3.

SUA CONTRIBUIÇÃO À FORMAÇÃO DO PENSAMENTO JURÍDICO ............... 12

RACIONALISMO ........................................................................................................................ 15 3.2.

4.

SUA CONTRIBUIÇÃO À FORMAÇÃO DO PENSAMENTO JURÍDICO ............... 10

PLATÃO ............................................................................................................................... 15

3.2.1.

CONTEXTO HISTÓRICO ........................................................................................... 15

3.2.2.

RELEVÂNCIAS AO PENSAMENTO JURÍDICO ..................................................... 16

SABER TEÓRICO E SABER PRÁTICO .................................................................................... 18

5. REFLEXÃO ACERCA DOS PENSAMENTOS DE HOBBES E MAQUIAVEL COM BASE NA TEORIA DE ARISTÓTELES........................................................................................................ 19 6.

A INTERDEPENDÊNCIA ENTRE EMPIRISMO E RACIONALISMO ................................... 20

7.

UM CASO HIPOTÉTICO ............................................................................................................ 22 7.1. VISÃO RACIONALISTA ......................................................................................................... 22 7.2. VISÃO EMPIRISTA.................................................................................................................. 22

8.

CONCLUSÃO .............................................................................................................................. 24

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS .................................................................................................. 25

7

EMPIRISMO VS. RACIONALISMO: A DIALÉTICA DIALÓGICA NA FORMAÇÃO DO PENSAMENTO JURÍDICO1 Wellerson Rocha2

1. INTRODUÇÃO Este paper tem por finalidade gerar nota conceitual para avaliação da disciplina Teoria Geral do Estado e Ciência Política (CJ02039), contida na grade curricular do primeiro bloco do curso de Bacharelado em Direito da Universidade Federal do Pará. Este trabalho abordará uma dicotomia usual de duas formas de pensar jurídico: o empirismo e o racionalismo. Ademais, cabe explicar o título deste paper. Chamou-se de “dialética dialógica” para a relação intrínseca-extrínseca dos dois conceitos abordados no decorrer do excerto. Porquanto, esta relação de interdependência será melhor abordada no tópico 6 (seis) do mesmo trabalho. O empirismo possui suas raízes nas doutrinas aristotélicas. Sem dúvida, um ícone da filosofia, usa-se de sua teoria para calcificar a ideia de necessidade da experiência para se fundar uma teoria. Para dar encalço jurídico ao conceito, faz se uso das teorias de Estado de Nicolau Maquiavel e Thomas Hobbes, pensadores que viveram no período do renascimento, mas em épocas diferentes. O racionalismo possui suas raízes nas ciências exatas e seculares, logo, pode-se dizer que um dos primeiros racionalistas foi Pitágoras. Para dar teor jurídico-filosófico ao excerto faz-se uso da teoria de Platão rente ao estado e a sociedade. Este vê na educação o thelos (fim) do Estado, pois, com a educação consegue-se chegar a racionalidade e posterior gestão justa do Estado. Este trabalho também conta com um caso hipotético, no qual fora aplicado as duas visões abordadas neste. Outrossim, faz-se necessário afirmar de imediato que este é apenas uma percepção do tema, cabendo haver outras, tangentes ou não aos conceitos empregados. 1

Trabalho acadêmico desenvolvido para prestar auxílio a comunidade com suas informações de relevância, bem como, para avaliação acadêmica e geração de conceito na disciplina Teoria Geral do Estado e Ciência Política. 2 Discente do curso de bacharelado em Direito da Universidade Federal do Pará – vespertino – cujo possui número de matrícula 201606140178

8

2. EMPIRISMO Na filosofia, empirismo foi uma teoria do conhecimento que afirma que o conhecimento vem apenas, ou principalmente, a partir da experiência sensorial.3 Pautados em uma visão mais utilitarista das coisas, o empirismo prima pela realização fenomênica da tese apresentada, podendo assim apreender os acertos e as falhas de suas teorias. Uma das teorias mais conhecidas desta vertente do modo de pensar é a que elenca dois modelos concatenados e consequentes - modo indutivo e dedutivo - os quais vão dar origem a uma teoria epistemológica denominada indutivismo, a qual será abordada posteriormente no trabalho. Outrossim, Gnosiologicamente4, pode-se inferir que este método apriorístico de conceber postulados que virão a vigorarem, em dado momento, se assemelha a forma como os teóricos utilizados para alicerçar a tese deste paper, no tocante ao empirismo, pois os mesmos apresentam ideias inteligíveis de Estados no qual seu regimento seria extremamente eficaz e caso houvesse caos ter-se-á a solução para tal, com antecedência, baseados em experiências de outrem. Um exemplo deste empirismo é o positivismo lógico: O positivismo lógico foi uma forma extrema de empirismo, segundo o qual as teorias não apenas devem ser justificadas, na medida em que podem ser verificadas mediante um apelo aos fatos adquiridos através da observação, mas também são consideradas como tendo significado apenas até onde elas possam ser assim derivadas. (CHALMERS, 1993, p. 20)

Este anseio pela efetiva realização da teoria é uma característica em comum ao Direito, pois este apresenta-se no âmbito fenomênico - existe para gerir as relações físicosociais entre os indivíduos. É neste momento que tal conceito toca a disciplina referente ao trabalho, pois nesta estuda as formas de gerência de um Estado. Para tanto elencar-se-á dois pensadores do Estado: Nicolau Maquiavel e Thomas Hobbes para, ao mesmo tempo que, exemplificar o pensamento desta corrente de desenvolvimento mostrar o pertencimento desta temática a disciplina.

2.1.

NICOLAU MAQUIAVEL

Poeta, dramaturgo, diplomata e filósofo, Nicolau Maquiavel (1469-1527) foi um grande pensador florentino. Com sólida formação humanista, tornou-se um arguto observador

3

Definição extraída da Wikipédia Gnosiologia, também conhecida como teoria do conhecimento, é uma ciência que, semelhante a epistemologia, estuda a gênese da forma de se expressar das demais ciências. 4

9

dos acontecimentos ao seu redor; produziu tratados políticos, peças teatrais, poemas e inúmeros relatórios diplomáticos. Nascido em 3 de maio de 1469, Florença, Itália, faleceu em 21 de junho de 1527 no mesmo local de seu nascimento. Fez parte da República florentina, mas fora afastado de suas funções com a queda da mesma. Republicano, ocupou cargo de importância durante este período, porém, com a perda do poder da poderosa família Médici para Carlos VIII, deixou-se a república e instaurou-se uma espécie de ditadura teocrática - período o qual fora mesmo afastado de sua cidade por caracterizar uma ameaça à gestão à época. Foi neste período que escreveu sua obra mais conhecida, O Príncipe (1515). Florença era palco do conflito entre duas tendências: a da exaltação pagã do indivíduo, da vida e da glória histórica, representada por Lourenço de Médici e seu irmão Juliano de Médici; e a da contemplação cristã do mundo, voltada para o além, que se formava como resposta ao ressurgimento da primeira nos mais variados aspectos da vida como a arte e até na Igreja, representada por religiosos como Girolamo Savonarola.5 Anunciando a chegada de Carlos VIII como a de um salvador, contrário aos Médici e com grande apoio popular, o pregador Girolamo Savonarola tornou-se a figura mais importante da cidade dando ao governo um viés teocrático-ditatorial. Com sua crescente autoridade e influência, Savonarola passou a criticar os padres de Roma como corruptos e o Papa Alexandre VI por seu nepotismo e imoralidade. Em 12 de maio de 1497, o papa excomungou o frade, mas a excomunhão foi declarada inválida por ele. No entanto, Savonarola acabou preso e executado pelo governo provisório em 23 de maio de 1498. Com a demissão de seus simpatizantes, cinco dias depois da morte do frade, Maquiavel, com 29 anos, foi nomeado para o cargo de secretário da Segunda Chancelaria de Florença. Por hora, pode-se perceber que Maquiavel viveu em um período de instabilidade governamental, portanto, deleitou tanto de um Estado republicano - o qual considera-se ser aquele que era mais afeito - e uma monarquia, lato sensu. Diante disso, percebe-se o porquê de suas obras serem tocantes aos dois âmbitos e possuírem datações afastadas. Com isso, precisa-se apresentar suas contribuições ao pensamento jurídico - hodierno e de outrora.

5

Ao mesmo tempo, homem de ação e idealista, Maquiavel sonhou com a pátria unificada, tendo sido o primeiro a meditar, em termos de sua época, a respeito dos vários problemas suscitados pela ciência política.

(CRETELLA, 2012, p. 125)

10

2.1.1. SUA CONTRIBUIÇÃO À FORMAÇÃO DO PENSAMENTO JURÍDICO Pode-se inferir deste pensador das formas de Governo possíveis sua grande relevância ainda hodiernamente no que tange aos pensamentos acerca das atitudes dos governantes e governados. Tendo escritos que tratam tanto de monarquias quanto de repúblicas, sua obra mais lida e de maior influência, ainda hoje, nas interpretações do comportamento dos detentores do poder é O Príncipe (1532)6. Detentor também da emblemática frase implícita nesta obra que questiona se é melhor ser amado ou temido por quem está governando, versado no trecho: Nasce disso uma disputa: se é melhor ser amado do que temido, ou o contrário. Responde-se: nem um, nem outro, mas ambos. No entanto, como é difícil estarem juntos, é mais seguro ser temido do que amado, quando há de faltar um dos dois. Porque dos homens se pode dizer isto geralmente: que são ingratos, volúveis, simuladores, dissimuladores, covardes, ambiciosos; e, enquanto fazes o seu bem, são todos teus [...]; porém, quando a ti se aproxima [as adversidades], eles se revoltam (MAQUIAVEL, 2015, p. 74).

Um dos teóricos do Estado de maior relevância ainda hoje, Maquiavel possui forte influência no momento em que se debruça sobre as posturas político-sociais, das formas de alcançar o poder, de como manter-se nesse e muitas outras contribuições reconhecidas por aqueles que o leem. Em seu livro O Príncipe, ele dedica seus capítulos para trazer instruções ao governante de como se manter no poder de maneira que não seja ameaçado: Por um lado, ele enfatiza, tanto no Príncipe quanto mais tarde nos Discursos, que nas condições de uma corrupção política já acentuada será preciso numa República tanto quanto num principado -- recorrer ao poder forte de um único homem, a fim de restaurar no Estado a virtù que se perdeu. Mas, por outro lado, no Príncipe dá a entender, e posteriormente afirma com todas as letras nos Discursos, que sua preferência pessoal sempre estará voltada para a liberdade política e, por conseguinte, para a forma republicana de governo. (SKINNER, 1996, p. 145)

Este estilo de escrito denomina-se espelho dos príncipes7. Neste momento sua teoria se encaixa a temática deste artigo, pois para calcificar seus escritos ele se vale de experiências já vivências outrora, mesmo que por outras pessoas. Logo, pode-se inferir de Maquiavel que sua visão é empirista por excelência. Não abandona a razão, a racionalidade, porém alicerça e fundamenta suas hipóteses em experiências sensíveis, em momentos históricos e que possuem grande carga de influência e 6

Há um conflito entre datas. Fora elencado duas datas para o livro O Príncipe, porém, a primeira (1515) é referente ano em que foi entregue a obra para governante à época; a segunda (1532) é a data da primeira publicação do livro. 7 Tipo textual no qual os autores tecem conselhos que podem auxiliar os governantes na manutenção de seu poder, bem como idealizam um Estado sem vícios ou revoluções (não necessariamente).

11

validade à época. Formula um postulado no qual defende suas ideias acerca de como deve-se gerir um Estado para que o mesmo não venha a ruína. Maquiavel também possui dois conceitos, os quais faz-se necessário trazer à luz para que se compreenda seu ponto de vista: a virtù e a fortuna. A virtù, traduzida por muitos como virtude, é o ato da temperança, o agir conforme julgar melhor para que não gere caos ao coletivo ou invalide suas aspirações. A fortuna é uma espécie de sorte, é o acaso, mas sempre previsível e conseguinte das ações efetuadas antes. Outro termo importante é a prudência, não com a mesma conotação de hoje - seria uma vertente da virtù, o ato de agir da maneira mais sensata à garantia da manutenção de seus poderes, propriedades e territórios. Possuidor de uma visão de Estado centralizado, Maquiavel se assemelha do pensamento do próximo jusfilósofo que será abordado (Hobbes), pois ambos vêem no poder delegado a um único indivíduo uma saída para a resolução dos impasses da sociedade. Não obstante, far-se-á uma melhor comparação entre os dois a posteriori. Ademais, é importante afirmar que esta abordagem não contempla toda sua teoria, mas fora aproveitado aquilo que se julgou de valia para a formulação deste paper.

2.2.

THOMAS HOBBES

Matemático, teórico político e filósofo, Thomas Hobbes (1588-1679) foi um importante teórico inglês. “Hobbes devia à tradição uma única, mas importantíssima, ideia: recebeu da tradição de que a filosofia política ou ciência política é possível ou necessária” (STRAUSS, Leo. 2009. p. 145), assim, afirma-se sua relevância para o pensar juridicamente. Para ratificar esta afirmativa: Desde A República de Platão aos primórdios da modernidade, a filosofia situou a busca pela melhor república em seu centro. Thomas Hobbes deu continuidade a essa tradição que aproximou o pensamento político e as questões jurídicas. [...] de acordo com Arendt, “tornaria a política uma ciência tão exata quanto fez o relógio para o tempo” (DOUZINAS, 2009, p. 83)

Nascido em 1588 na Inglaterra dos Tudors, Thomas Hobbes foi influenciado pela Reforma Anglicana, que ocorrera cinco décadas antes. A cisão com a Igreja Católica fez com que a Espanha interviesse nos assuntos ingleses enviando a Invencível Armada (Grande y Felicíssima Armada), fato que, mais tarde, seria relatado por Hobbes em sua autobiografia e que teria grande influência sobre sua obra.

12

O século XVII na Europa continental é o marco do absolutismo monárquico (representado na Inglaterra pela Reforma Inglesa), tendo sido, seu expoente máximo, Luís XIV de França, o "Rei Sol", que ficou famoso pela frase L'État c'est moi ("O estado sou eu"). A filosofia do barroco se baseava no dualismo existente entre o hedonismo e o medo do pecado (ou fervor religioso) – enquanto que a busca pelo essencialmente humano já havia começado no renascimento; havia o receio do divino sobrenatural, que poderia punir o terreno e transitório. Baseado nisto, pode-se afirmar que o autor de Leviatã um arcabouço histórico contemporâneo a si o qual calcifica suas posturas e doutrinas rente o Estado. Portanto, faz-se necessário apresentar parte de sua contribuição para o pensamento jurídico de sua época e pode ser relida na atual conjuntura e aplicada para explicar certos Estados absolutistas.

2.2.1. SUA CONTRIBUIÇÃO À FORMAÇÃO DO PENSAMENTO JURÍDICO A filosofia de Thomas Hobbes, especialmente sua teoria a respeito da origem contratual do Estado, exerceu profunda influência no pensamento de Rousseau, Kant e dos enciclopedistas. Além disso, contribuiu para preparar, no plano ideológico, o advento da Revolução Francesa. Partidário do Absolutismo político, defende-o sem recorrer à noção do “direito divino”. Segundo o filósofo, a primeira lei natural do homem é a da autopreservação, que o induz a impor-se sobre os demais – guerra de todos contra todos. O Leviatã (1651) – nome retirado do monstro bíblico (Livro de Jó), que tudo devora é que, em sentido figurado, designa algo de formidável, colossal, monstruoso, como o Estado, na sua concepção – é a mais importante obra deste jusfilósofo. Uma breve apresentação de sua contribuição pode ser ilustrada por: O direito natural, que os autores geralmente chamam de jus naturale, é a liberdade que cada um possui de usar seu próprio poder, de maneira que quiser, para a preservação de sua própria natureza, ou seja, de sua vida. Consequentemente de fazer tudo aquilo que seu próprio julgamento e razão lhe indiquem como meios adequados a esse fim. (HOBBES, 2009)

Hobbes, descobrindo o fundamento do Direito no utilitarismo, aplica uma redução do Direito à economia, lato sensu8. Se toda lei é justa, ele dirá que o problema é descobrir a lei

Em um estudo intitulado “Hobbes et la dogmatique juridique”, o jurista Tullio Ascarelli observa que o pensamento jurídico moderno se caracteriza por uma consciência moral. 8

13

que é boa, útil e eficaz. Doravante, só quando o Direito é concebido como autônomo é que se opõe o problema da lei boa. Em relação às leis civis, o autor as define como normas que os homens estão subordinados, não por serem de uma ou outra commonwealth, mas por integrarem uma commonwealth9. Todavia, é mister a compreensão de que Hobbes não reduz as leis em meros comandos quaisquer. Na sociedade de Hobbes, o indivíduo, para se auto afirmar retira-se do todo: Desta igualdade quanto à capacidade deriva a igualdade quanto à esperança de atingirmos os nossos fins. Portanto, se dois homens desejam a mesma coisa, ao mesmo tempo que é impossível ela ser gozada por ambos, eles tornam-se inimigos. E no caminho para o seu fim (que é principalmente a sua própria conservação, e às vezes apenas o seu deleite) esforçam-se por se destruir ou subjugar um ao outro.

(HOBBES, 2009) Rente isso, baseado na ideia de abandono do estado de natureza, transforma a linguagem em um signo da existência do estado civilizado, plausível de discussões acerca do bem comum e menor violência, como percebido neste trecho de O Leviatã: “Qualquer governo é melhor que a ausência de governo. O despotismo, por pior que seja, é preferível ao mal maior na Anarquia, da violência civil generalizada e do medo permanente da morte violenta”. O pensamento de Hobbes era avançada à época, à medida que submetia o Direito a um poder político arbitrário como condição mesma de exercício da razão utilitarista no controle da sociedade. Para ele a entrega das liberdades ao Estado não é vista com uma forma de cercear as liberdades individuais, todavia, garantir as liberdades do todo - submeter-se aos anseios do coletivo para que, assim, assegure-se seus próprios. Possuidor de uma visão pessimista do homem, Hobbes afirma que o ser humano é egoísta e que, por isso, toma as decisões pautados em suas aspirações e necessidades - para tanto, o homem precisa de uma liderança para que a mesma interceda nas disputas de interesses e a sociedade não retorne ao estado de natureza10. A partir desta visão é que formula-se a icônica frase deste jusfilósofo – a qual fora apropriada de uma peça teatral de Plauto (Asinária): “o homem é lobo do próprio homem” (homo homini lupus). Na política, parte primeiro de Epicuro, sustentando que a condição normal da natureza humana é a vida isolada, independente. Assim foi no início, quando os

9

Jurisdição. Não há um momento na história referente a este estado não-social, essa expressão significa um comportamento coletivo, no qual todos defendem seus interesses a todo custo - podendo ceifar a vida de outrem para isso. Um estado de total individualidade e extremismo. 10

14

homens, egoístas e maus, estavam em luta constante, nem estado de guerra: bellum omnium contra omnes guerra de todos contra todos. (Ibidem. 131)

Seu ponto tangente ao tema deste paper está implícito: Hobbes enquadra-se como a própria teorização ao formular o estado de natureza (Estado de Guerra) sem nenhuma experiência sensível antes. Contraditório ao afirmado no paper, sua teoria é pura, podendo apenas ser comprovada por meio de literaturas posteriores, como O Caso dos Exploradores de Cavernas11. Porquanto, isto não implica em uma inutilidade de seus postulados, por outro lado, são fundamentais para a compreensão e afirmação de um Estado totalitário e absolutista. Ademais, é importante afirmar que esta abordagem não contempla toda sua teoria, mas fora aproveitado aquilo que se julgou de valia para a formulação deste paper.

11

Neste livro pessoas são isoladas da sociedade e, em uma forma de manter o máximo de vidas, matam uma das pessoas que lá estavam para alimentar as demais e garantir sua sobrevivência. Mesmo que o objetivo tenha sido coletivo, as aspirações individuais de continuar vivo devem ser consideradas chave para a compreensão da obra.

15

3. RACIONALISMO É a corrente filosófica que iniciou com a definição do raciocínio como uma operação mental, discursiva e lógica que usa uma ou mais proposições para extrair conclusões, ou seja, se uma ou outra proposição é verdadeira, falsa ou provável.12 Detentora de uma ideia de silogismo lógico, parte de premissas racionais e falsificáveis para a obtenção de uma premissa universal - genérica e objetiva. No que toca à Teoria do Estado, o racionalismo pode ser atribuído ao pensar democrático e republicano, pois, deve-se racionalizar as diferenças e igualdades, de maneira sensata e seguindo uma justiça vil, para a gerência e ingerência dos cidadãos – logo, saindo mais daquele âmbito subjetivado e fixando-se em uma visão mais coletiva (pautando-se na caracterização da generalidade das leis). Muitos são os pensadores que teceram suas teorias baseados nesta vertente de pensar, tais como René Descarte, Spinoza e Leibniz. Porém, este paper terá um pensador mais filosófico e clássico, cujo encaixa-se, também, em parte, neste ensejo. Trata-se de Platão, filósofo clássico, considerado uma das referências do pensamento aristotélico (mesmo que os dois possuam visões divergentes no tocante a origem das virtudes). Por muitos considerado um empirista por excelência, mas detentor de uma teoria idealista, neste trabalho, ganhou uma conotação racionalista, pois ao mesmo tempo que considera a experiência como algo necessário remeter-se a uma ideia de razão inata, logo, nasce consigo e não necessita, necessariamente, de uma experimentação para tanto.

3.2.

PLATÃO 3.2.1. CONTEXTO HISTÓRICO

Platão (427-347 a. C.), cujo nome próprio era Aristocles, nasceu em Atenas, descendente de família nobre, parente de Crítias, um dos Trinta Tiranos, da linguagem de Sólon. Foi até à morte de Sócrates seu discípulo, aceitando o ensinamento de que a justa apreciação conduz à virtude, digna de ser aprendida. Morre aos 80 anos e sua rica personalidade, mais que invulgar, é extraordinária. Foi ao exterior. No Egito, aprimorou seus conhecimentos matemáticos e astronômicos. Viveu na Magna Grécia (baixa Itália e Silícia), adquirindo, provavelmente, aí sua influência pitagórica por meio das doutrinas órficas. 12

Definição extraída da Wikipédia

16

Retornou, definitivamente, a Atenas, decidiu consagrar-se de corpo e alma aos seus estudos, tendo, sem dúvida, falhado como político (que é sempre um homem hábil e prático), mas vitorioso como fundador da Academia, que durou quase mil anos (386 a. C. – 529 d. C.). “Outrora na minha juventude experimentei o que tantos jovens experimentaram. Tinha o projeto de, no dia em que pudesse dispor de mim próprio, imediatamente intervir na política” (PLATÃO. 354 a. C.), escrito para parentes e amigos de Díon de Siracusa, explicitando suas aspirações pela vida política.

3.2.2. RELEVÂNCIAS AO PENSAMENTO JURÍDICO The Republic is, thus, in the first case a totalitarian blueprint and in the second a utopian composition which shows the limitations there are in political solutions in a somewhat comical way. What both take seriously is the contents of Plato’s proposals and arguments: in one case refuting them, and in the other learning from his pointing out of the limits of the political.13 (COLEN, José. 2012)

Em A República ou Politeia, apresenta o Estado absolutista, apoiando uma ideia de extinção da propriedade privada e superação da monogamia. Distintamente da concepção comunista, seu Estado ideal é orientado por preocupações éticas e políticas, não por considerações econômicas, como bem observa Del Vecchio. Doravante, apesar de seu Estado ser absoluto, Platão defende a ideia de uma gerência a qual almeja garantir o bem-estar dos seus participantes, cada qual em sua esfera. Logo, a finalidade máxima do Estado consiste na realização profissional plena de cada indivíduo na sociedade em que vive, seguindo uma conduta virtuosa. Outrossim, Platão também formula uma ideia de Direito Natural: Parte Platão para sua tese de Direito Natural ligada a contemplação do justo por Deus e que tendo também os homens contemplado em sua vida anterior divina anseiam por realizá-lo no mundo imperfeito em que vivem. Mas somente o conseguem através da eleição livre e inescrutável de Deus. (LITRENTO, 1984, p. 59)

Porquanto, sua teoria do Direito Natural é o epílogo de sua teoria de Estado – absoluto, como já fora expresso. Uma contemplação não mais ludibriada pela doxa, ou seja, pela opinião sensível, todavia, perspicaz no tocante a manutenção do Estado e poder, pois só eram governantes os sábios. Com esta última afirmativa dá-se ensejo para se apresentar a divisão dos estratos do Estado platônico.

13

A República é, portanto, no primeiro caso um plano totalitário e no segundo uma composição utópica que mostra as limitações que há em soluções políticas de uma forma um tanto cômica. O que ambos levam a sério é o conteúdo das propostas e dos argumentos de Platão: em um caso refutando-os, e no outro aprendendo com o apontar dos limites do político. (Tradução livre)

17

Seu Estado está dividido em dois três classes sociais: 1) filósofos ou governantes (arcontes): gerir e manter funcional a educação, pois, sem a mesma, o homem não alcançará sua plenitude profissional futura, logo, o governo será falho; 2) guerreiros ou militares (fylakes): função de segurança, garantindo a integridade do coletivo contra ameaças externas e internas; 3) obreiros ou trabalhadores: função econômica, garantir a produção e circulação de bens e mercadorias. A primeira classe tem por característica máxima a sabedoria. A segunda, a fortaleza. A terceira a justa realização e relação. Logo, Oliveiros Litrento (1984) afirma, com brilhantismo: Se, hierarquicamente, a classe dos trabalhadores [...] está submetida à dos arcontes [...] e à dos fylakes [...], respectivamente simbolizadas pela sabedoria e fortaleza, cabendo-lhe a conservação econômica do Estado (polis), esta classe inferior apenas acima dos escravos é explicada pelo desprezo com que gregos encarnavam o trabalho material. (p. 62)

Corroborando à ideia de que quanto maior seu ócio, ou seja, seu tempo para pensar na manutenção social maior é seu grau de importância na comunidade, por isso, fora afirmado que o próprio Platão falhou como político, pois, o mesmo, não fazia uso com exacerbação do ócio, era ativo. Em uma outra perspectiva, é importante lembrar que Platão foi o intérprete máximo de Sócrates (seu professor), pois, é a partir dele que o mundo atual conhece os postulados socráticos. Sócrates foi o exemplo máximo de obediência das leis, porque mesmo sendo condenado à morte injustamente e a ele ter sido oferecido ajuda para escapar de tal injustiça, o mesmo não a fez. Acatou a decisão do governante e fora executado (assassinado). Assim, dá-se base para abordar as questões das leis. Como fora apreendido dos ensinamentos de Sócrates, o homem não é injusto por vontade própria, mas, sem temperança é dominado pelas paixões. Logo, é através da penalidade existente nas leis, como medida de remediação, que se alcança a conscientização – pois, o delito é considerado uma enfermidade social, se não tratada devidamente pode contaminar o Estado. Com tudo exposto acima, pode-se inferir que o pensamento de Platão possui grande relevância ao pensar jurídico. Ademais, é importante afirmar que esta abordagem não contempla toda sua teoria, mas fora aproveitado aquilo que se julgou de valia para a formulação deste paper.

18

4. SABER TEÓRICO E SABER PRÁTICO Para Aristóteles, o indivíduo deve possuir três tipos de saber em harmonia para atingir a eudaimonia (felicidade): saber teórico, prático e artístico. Com base nisso alicerça-se este artigo ao afirmar que a formação do pensamento jurídico necessita dos dois primeiros tipos – teóricos e práticos – para se fundar com legitimidade – no sentido de validez. O saber teórico fica aos encargos das ciências o nutrir, bem como a consciência individual. O saber prático é incumbência do dia a dia, pois é no cotidiano que pode-se expressar uma ação verdadeiramente prática, como afirma Jacy de Souza14. Para tanto, esta relação entre teoria e experiência é necessária para que qualquer ciência exista e possa ser comprovada. Igualmente, não seria diferente na fundação do pensamento jurídico, o qual busca ensejo nas demais ciências para se positivar. É neste contexto que Chalmers, embasado nos postulados de Francis Bacon e John Paul, afirma uma tentativa de se fazer ciência – falha, como o próprio diz ser – a qual consiste em partir de uma observação despreocupada e sem um fórum teórico pré-estabelecido para em seguida formular uma tese15. Logo percebe-se qual o problema desta hipótese de gênese científica: teoria e experiência estão intrinsecamente ligadas. Não se pode partir do alento à experimentação, pois isso não eliminaria a carga de subjetividade desnecessária para que se tenha um resultado fidedigno, além do risco de permanecer na mesmice. No âmbito do Direito dá-se da mesma forma, porque não se pode deixar que um único caso modifique ou funde uma norma, um posicionamento jurídico, uma forma de pensar juridicamente. Seria hediondo afirmar que alguém pensaria em um novo tipo de crime sem sequer haver um caso do mesmo – isso seria premeditar a má índole dos seres humanos – o que iria contra o princípio da presunção de inocência (artigo 5º, inciso LVII, da Constituição Federal). Outrossim, esta relação também está presente entre consciência e memória. Não se pode ter consciência de algo sem antes ter-se vivenciado – formado uma memória do acontecido antecedente, precedente. Ideal que contrapõe a ideia de Platão no que tange ao inatismo, mas ratifica-o acerca da reminiscência, ao corroborar que a partir da experiência dada habilidade ou conhecimento são adquiridos e relembrados quando necessário. Assim, pode-se dizer que a experiência é um ato de formar consciência por meio do trabalho memorial, stricto sensu. O pensamento jurídico possui uma historicidade a qual deve 14 15

No seu livro “Introdução ao Estudo do Direito”. No seu livro “O que é ciência afinal?”.

19

ser respeitada e exegeticamente lida. Não se fundou os conceitos e acepções jurídicas de um desejo individual e atual, mas baseando-se em pensamentos e posturas que foram formados no decorrer da história. Após a apresentação deste tópico com um viés empirista far-se-á uma contemplação desta teoria às dos jusfilósofos apresentados nesta vertente de pensamento: Hobbes e Maquiavel.

5. REFLEXÃO ACERCA DOS PENSAMENTOS DE HOBBES E MAQUIAVEL COM BASE NA TEORIA DE ARISTÓTELES Como já foi visto nos dois tópicos anteriores, Hobbes e Maquiavel são dois teóricos importantes para compreender as formas de governos inteligíveis pelo ser humano. Hobbes apresenta-se como um teórico do absolutismo. Maquiavel, por outro lado, pode ser considerado um jusfilósofo de vários tipos de Estado, todavia, aprioristicamente abordou-se seu pensamento dentro de uma monarquia, logo, far-se-á uso da mesma. Ambos concordam no que tange aos fatores centralização do poder e dominação dos territórios. Ademais, Maquiavel viveu um período histórico diferente de Hobbes. Vivendo no século XVI, o primeiro vivenciou apenas ensaios de repúblicas – mesmo havendo relatos de algo do tipo outrora em obras filosóficas – por isso seus escritos acerca de monarquias são de mais valia, contudo, sua visão de apropriação do poder, uso descabido e necessário para a gestão do Estado, pode ser aplicado na atual conjuntura brasileira – uma disputa não-armada, mas política por poder e conquista a qualquer custo. Igualmente, Hobbes, século XII, possui uma grande valia ao se avaliar os Estados totalitários hodiernos, porém, com uma diferença importante: o poder não é delegado pelos civis aos Chefes de Estados, mas usurpado pelos mesmo - analisando por esta ótica encontra-se contrassenso aos pensamentos hobbesianos no que toca às liberdades que passam a ser cerceadas e não mais geridas pelo soberano. Agora, no que se refere aos postulados aristotélicos, Thomas e Nicolau subvertem o conceito de eudaimonia uma vez que tornam sua obstinação individualista e exterior ao ser. Neste sentido, pode-se inferir que os dois jusfilósofos são empiristas por excelência, mas possuem grande carga do racionalismo. Fazem uso de seus saberes teóricos para formular suas teorias sobre o comportamento humano rente o poder maior; seus saberes práticos advêm de experiências sensíveis de outrem que servem de ensejos para aquilo que fora dito pelos

20

mesmos; outrossim, fazem uso dos seus saberes criativos, pois por meio de obras literárias apresentam aos demais seus pensamentos, estas com funções de alcance do bem comum, mesmo este sendo conceituado de maneira difusa ao pensamento e ideal de Aristóteles. Viu-se que ao tecer sobre o empirismo é inevitável tocar na razão. Logo, após esta abordagem empirista, resta apresentar o objetivo deste paper, o qual se encerra em mostrar que a uma relação intrínseca entre as duas formas de pensar.

6. A INTERDEPENDÊNCIA ENTRE EMPIRISMO E RACIONALISMO Este trabalho tem por título “empirismo vs. racionalismo: a dialética dialógica na formação do pensamento jurídico”, com isso tentou-se mostrar que uma teoria é complementar da outra por meio da utilização de teóricos que divergem o pensamento de muitos quanto sua raiz teórica. Cabe, neste momento, explicar que este tópico será o mais objetivo e um conjunto entre introdução e conclusão. O ponto tangente a estas duas teorias do conhecimento recai sobre a própria razão, pois, esta possui uma divisão sistemática em três, como já fora explicitado por Aristóteles: razão teórica, razão prática e razão criativa. Ademais, quando se aborda o âmbito do empirismo toca-se em duas destas – prática e teórica. Ao abordar o racionalismo toca-se nas mesmas duas razões – teórica e prática. O jogo de ordem de apresentação conceitual feito acima é para, de maneira didática, explicar qual a diferença entre os dois tipos de pensamento. O empirismo possui sua raiz principal sendo nutrida pela prática, pelo fenomênico, pela experiência. Por outro lado, o racionalismo, apela à razão teórica para se fundar e findar com exatidão (não muito, esta forma de pensar, em muitas vezes, é chamada de forma matemática, pois possui grande influência desta ciência exata). Não obstante, ambas possuem uma segunda razão, as quais se apropriam do método. O racionalismo tem sua parte fenomênica – razão prática – e o empirismo sua parte ontológica – razão teórica. Estas duas razões possuem uma relação diretamente proporcional ao avanço das comunidades, pois, ambas possuem cálcio na historicidade – esse é fonte, inexorável, de conhecimento teórico e prático, como afirma o filósofo francês Maurice Blondel (1861-1949), em sua obra L’Action (A Ação):

21

Não existe no ser inércia total nem espontaneidade pura. Existir é passar da essência à existência; é ser em ação. Todos os seres estão permanentemente em ação. O ser que não age não é. [...] a ação humana não é exclusivamente imanente tão pouco transitiva. É imanente porque brota de dentro da natureza humana, porque é um acabamento da virtualidade; mas é transitiva no sentido em que tende a um estado de perfeição de nosso ser (APUB. MENDONÇA, Jacy de Souza. 2011. p.

34) Pois, ao apresentar uma tese de imanência e transição ratifica a ideia de existirexpressar, no que tange ao poder-se considerar aquilo que emana do ser é a comprovação de sua existência e o que transita a partir do ser é sua expressão no mundo sensível. A teoria de Blondel é análoga aos dois últimos níveis do conhecimento jurídico, elencados por Javier Hervada16, os quais, também, têm uma relação direta com teoria e experiência: casuístico17 e prudencial18. Decerto, os mais práticos no mundo sensível. O nível casuístico é como a experiência, a memória e a imanência, um alicerce para que o próximo nível seja afirmado e possível; responsáveis por recolher informações e ações para positivação posterior. O outro nível, prudencial, é último e prático, faz uso dos conhecimentos adquiridos no anterior e executa o que lhe é devido, bem como funciona a teoria, consciência e a transição. Portanto, é plausível inferir que as duas teorias do conhecimento possuem uma relação intrínseca e são imediatas uma a outra. Ademais, para tornar mais concreto esta afirmação far-se-á a apresentação de um caso hipotético no qual se abordará as duas visões e a qual veredicto pode-se chegar, não obstante, é uma projeção delituosa fictícia extraído do livro O Caso dos Exploradores de Cavernas, mesmo que o mesmo tenha sido solapado por um caso concreto ocorrido nos Estados Unidos.

No seu livro “Lições Propedêuticas de Filosofia do Direito”. Também pode ser chamado de nível dos precedentes e antecedentes. É o que a priori avalia o que já aconteceu e fundamenta alguma regra ou expressão social. 18 O nível da prática, da tomada de atitude a partir da teoria formada no nível anterior (casuístico). 16 17

22

7. UM CASO HIPOTÉTICO Este caso foi extraído do livro O Caso dos Exploradores de Cavernas, de Lon Fuller, o qual trata de um grupo de espeleólogos que ficam trancados para o lado de dentro de uma caverna após um tremor que resulta no soterramento da entrada. Durante dias eles permanecem sem acesso a água e comida. Para não morrer de inanição eles resolvem na sorte quem irá ser morto para a nutrição dos demais – caracterizando canibalismo, homicídio doloso e formação de quadrilha. O livro possui um próprio veredicto desfavorável aos réus. Todavia, apresentar-se-á duas visões: uma racionalista (positivista, lato sensu) e uma empirista (jusnaturalista, latíssimo sensu).

7.1. VISÃO RACIONALISTA Baseado naquilo que fora escrito neste trabalho, pode-se afirmar que a decisão do juiz da obra seria mantida, pois, segundo Platão, as leis precisam serem aplicadas para a manutenção da ordem social, para que, também, sirvam de exemplo a outrem e não mais se retorne a este erro. Diz-se uma decisão positivista por ela está pautada naquilo que está positivado, afirmado, em lei. Por pautar-se nos preceitos, normas, estabelecidos outrora e não ponderar se há razoável justificação de tais atos. Não se está dizendo, entenda leitor, que a ação do grupo pode ser justificada, mas que por força maior de sua apropriação dos textos das leis não se faz julgamento de juízos nem, tampouco, da temperança e desespero momentâneos. Logo, sua decisão, a priori, seria desfavorável aos réus e estes seriam condenados da mesma forma que foram no livro.

7.2. VISÃO EMPIRISTA Sustentando a ideia deste excerto, pode-se afirmar que haveria uma dualidade de decisão: podendo haver uma decisão contra e outra a favor dos réus. Ademais, por ter sido posto o caráter jusnaturalista desta vertente do pensamento, infere-se que sua decisão seria a favor dos réus. Porém, deve-se explicar o porquê da dualidade.

23

Seria contra os réus se se alicerçar sua argumentação na ideia do bem comum. Para a melhor manutenção da ordem social justa deve-se expurgar os que causam caos social. Rente isto, é notória a necessidade de se aplicar com exatidão a lei para que a mesma se torne um fenômeno histórico-memorial aos contemporâneos e sirva de exemplo – uma espécie de precedente cotidiano necessária ao bem comum. Logo, se fizesse uso de uma visão mais utilitarista. Não obstante, seria favorável aos réus se se baseia numa visão de saída do Estado civil – logo, em um iminente estado de natureza –, porém, não com todas as características ímpares conhecidas, as quais Hobbes explícita, mas em uma situação que gira em torno do bem individual, sobreviver, e ao mesmo tempo coletivo, pois todos ali almejam a manutenção de suas vidas. Para tanto, fazem uso da linguagem cognoscível – não existente na visão de Hobbes – para gerência do bem comum da maioria. Neste momento enquadra-se o egoísmo humano e está configurado o estado de natureza. Porquanto, estes posicionamentos são expressões pessoais da apreensão feita durante a produção deste paper. Assim, encaminha-se para sua parte conclusiva.

24

8. CONCLUSÃO Foi-se abordado o empirismo de maneira abstrata e fenomênica, bem como, o racionalismo. Apresentou-se, também, três jusfilósofos: Nicolau Maquiavel, Thomas Hobbes e Platão. Cada um em sua seara do conhecimento e postulação do Estado. Outrossim, mostrou-se a configuração da sociedade. Decerto, pode-se afirmar suas contribuições para a atual configuração social. Todos com uma visão absolutista, porém, com fins (thelos) diferentes. No empirismo: Maquiavel, com sua visão cosmopolita da sociedade – aspirante por um estado republicano como era outrora – funda sua teoria no humanismo e no realismo. Pensador das várias formas de Estado, vê em um Estado forte e centralizado a saída para o alcance do bem comum – este sendo o bom convívio da comunidade, bem como, o mantimento do poder. Hobbes, por sua vez, em uma visão um pouco mais eclesiástica, funda sua teoria em um absolutismo vil. Atribui ao soberano um caráter divino e necessário para a gerência do Estado. Divinizado este soberano é inquestionável e tem sob suas mãos as liberdades dos civis, as quais, por meio do contrato, foram cedidas a ele. No racionalismo: tem-se Platão, relativista, idealista, absolutista. Finca seis postulados numa ideia de divino, também, e acredita ser dever do governante a boa gestão e administração da educação. O ócio em seu tempo é valorizado e necessário para a boa cidadania, logo, a escravidão é legítima para que os sábios possuam mais tempo para refletir sobre as questões sociais. Por fim, este paper encerra-se afirmando que esta é uma das interpretações possíveis à temática. Podendo, assim, existirem várias outras, convergentes ou divergentes.

25

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Volume 2. 4ª edição. Coleção Os Pensadores. Editora Cultura. São Paulo, 1991. CARVALHO, Marcelo. Teoria e Experiência. Volume 26. 1ª edição. Coleção Filosofias: o prazer do pensar. Editora WMF Martins Fontes. São Paulo, 2013. CHALMERS, Alan Francis. O que é ciência afinal?. 1993. Editora Brasiliense. DOUZINAS, Costas. O Fim dos Direitos Humanos. 2009. Rio Grande do Sul, São Leopoldo. Editora Unizinos. Coleção Díke. FULLER, Lon. Caso dos Exploradores de Cavernas. São Paulo, 2003. Editora Leud. GILES, Thomas Ransom. Introdução à Filosofia. São Paulo. Editora da Universidade de São Paulo, 1979. HERVADA, Javier. Lições Propedêuticas de Filosofia do Direito. 1ª edição. Editora: WMF Martins Fontes. Tradução por Elsa Maria Gasparotto. São Paulo, 2008. HOBBES, Thomas. Leviatã, ou Matéria, Forma e Poder de um Estado Eclesiástico e Civil (Leviathan, or The Matter, Form and Power of a Commonwealth Ecclesiastical and Civil). Coleção A obra-prima de cada autor. Série Ouro. Editora Martin Claret. Tradução por Rosina D’Angina. Nº 1. 2ª edição. São Paulo, 2009. JASPERS, Karl. Iniciação Filosófica. Lisboa: Guimarães Editores, 1987. JUNIOR, Tércio Sampaio Ferraz. Estudos de Filosofia do Direito. 3ª edição. São Paulo, 2009. Editora Atlas. LITRENTO, Oliveiros. Curso de Filosofia do Direito. 2ª edição. Rio de Janeiro: Forense, 1984. MAQUIAVEL, Nicolau. O Príncipe. 6ª edição. Rio de Janeiro, 2015. Editora Vozes. Coleção Vozes de Bolso. ___________________. Da Arte da Guerra. 2ª edição. São Paulo: Martin Claret, 2015. Coleção A obra-prima de cada autor; 105. MENDONÇA, Jacy de Souza. Introdução ao Estudo do Direito. 4ª edição. São Paulo, 2011. Coleção de Direito Rideel. Editora Rideel. PLATÃO. A República. Edição especial. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2016. Coleção Clássicos para Todos. PINTO, Débora Morato. Consciência e Memória. Volume 20. 1ª edição. São Paulo, 2013. Coleção Filosofias: o prazer do pensar. Editora WMF Martins Fontes. REALE, Miguel. Filosofia do Direito. São Paulo. 1994. Editora Saraiva.

26

SKINNER, Quentin. As Fundações do Pensamento Jurídico Moderno. São Paulo, 1996. Editora: Companhia de Letras. (1ª reimpressão) STRAUSS, Leo. Direito Natural e História. Portugal - Lisboa. 2009. Edições 70, LDA. TONNETTI, Flávio; MEUCCI, Arthur. Ética, Medo e Esperança. Rio de Janeiro, 2013. Editora Vozes. Coleção Miniensaios de Filosofia. Coleção Os Pensadores - Platão: Vida e Obra. Editora Nova Cultura. São Paulo - SP. 2000. http://philosttwo.blogspot.com.br/2009/01/o-racionalismo-platnico.html (acesso em: 24 de setembro de 2016. 16:43) https://pt.wikipedia.org/wiki/Racionalismo (acesso em: 24 de setembro de 2016. 18:32) https://pt.wikipedia.org/wiki/Empirismo (acesso em: 24 de setembro de 2016. 18:34) https://www.google.com.br/webhp?sourceid=chrome-instant&ion=1&espv=2&ie=UTF8#q=Maquiavel (acesso em: 25 de setembro de 2016. 00:01) https://pt.wikipedia.org/wiki/Thomas_Hobbes#Contexto (acesso em: 25 de setembro de 2016. 03:37) http://www.scielo.gpeari.mctes.pt/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S080789672012000200012&lang=pt (acesso em: 26 de setembro de 2016. 09:09

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.