Ulisses, a viagem, a morte.doc

June 1, 2017 | Autor: Andrea Lombardi | Categoria: Comparative Literature, Italian Literature
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Descrição do Produto

Prof. Dr. Andrea G. Lombardi, UFRJ
Ulisses: a viagem e a morte[i].

Les vrais voyageurs sont ceux-lá seuls qui partent pour partir
Charles Baudelaire
La poesia non può cancellare dal mondo le realtà etiche
Carlo Emilio Gadda
"Todos os poetas são judeus"... É assim
que a figura dominante
do poeta moderno,
desde o Romantismo, se apresenta:
João Barrento

Num admirável ensaio intitulado "El falso Problema de Ugolino"[ii],
J.L. Borges resolve elegantemente uma controversia da crítica literária,
que há tempo procurava uma "correta" interpretação do Canto 33 do Inferno
de Dante. Escreve Borges:

"De Ugolino debemos dicir que es una textura verbal, que consta de
unos treinta tercetos? Debemos incluir en esa textura la noción de
canibalismo? Repito que debemos supecharla con incertidumbre y temor. Negar
o afirmar el monstruoso delito de Ugolino es menos tremendo que
vislumbrarlo."


E acrescenta imediatamente, mostrando sua crença na literatura em sua
autonomia: "El dictamen Un libro es las palabras que lo componen corre el
albur de parecer un axioma insípido." Borges está-se referindo à
controversia relativa ao canibalismo do conde Ugolino della Gherardesca,
personagem histórico da cidade de Pisa, ferrenho adversário dos
florentinos, traído e emparedado vivo numa torre junto com seus quatro
filhos. A pergunta é se quando Ugolino comeu seus próprios filhos, exerceu
um ato de antropofagia. Um ato tanto mais grave, pois realizado contra seus
próprios consanguíneus! Ugolino será punido na Divina Comédia estando
eternamente preso no gelo, no nono círculo do Inferno, que é o dos
traidores, o lugar mais terrível e mais baixo, pois fez acordos escusos com
os inimigos de sua cidade, com objetivo de conseguir o poder absoluto em
Pisa. O ponto mais controvertido do texto é a interpretação do verso 75,
que conclui a fala do próprio Ugolino: os quatro filhos já faleceram
(ALIGHIERI, 1975, p. 64) [iii] ele luta contra a fome terrível e declara:
"poscia, più che 'l dolor, poté 'l digiuno": "e depois, mais do que a dor,
pôde o jejum"[iv]. Embora não haja uma explicitação clara do ocorrido, o
texto sugere a possibilidade desse monstruoso crime cometido por Ugolino. O
texto sugere, o leitor vislumbra, o contexto evoca e uma dúvida paira. Mas
não há um julgamento definitivo, não há certezas. Um único endecassílabo
aponta para a terrível dúvida[v]: "Então, mais do que a dor pôde o jejum"
(trad. minha: "Poscia, più che 'l dolor, poté 'l digiuno"). Borges lembra
que o texto literário não "afirma", não documenta, não é definitivo nem
categórico: não é um texto jurídico ou jornalístico. Quando o autor
argentino declara que Ugolino é uma textura verbal, indica que a personagem
é uma mera projeção do texto. Que é preciso estudar sua coesão interna, seu
estilo, suas remissões intertextuais, seus efeitos sonoros: um conjunto de
elementos que fazem de um texto uma máquina de produção de significados,
com a possibilidade de uma interpretação infinita.
Em outro canto famoso do Inferno, o XXVI, "O Canto de Ulisses"[vi],
Dante relê as aventuras de Ulisses, protagonista da Odisséia, embora sem
dispor de um exemplar do poema de Homero. Ele se apoiava em inúmeras
versões que circulavam no séc. XIII sobre o mito ou a lenda de Ulisses
(MATTALIA, 1992, p. 522-3)[vii] e realiza uma grande mudança de
perspectiva, sugerindo uma leitura diferente da idéia de viagem e sua
relação com a escrita. Examinamos aqui como o vínculo entre viagem e morte
pode ser lido enquanto metáfora da literatura e como Dante articula de
forma nova e definitiva a relação entre a tradição clássica e o elemento
novo representado pela tradição "judaica" ou "judaico-cristã". Este
acréscimo se manifesta também como tensão entre as duas tradições (ou duas
vertentes de uma única tradição) e traz novidades no estilo, no uso dos
gêneros e na interpretação dos textos.
Dante situa-se no limiar entre duas tradições: Ele assume a
herança da tradição clássica (Horácio, Virgílio, Lucano, Ovídio e Estácio,
citados no Limbo como representantes dos clássicos) e, ao mesmo tempo,
afirma uma visão herética e messiânica inspirada na tradição cristã, mas
que, em seu radicalismo, sugere analogias com posições extremas presentes
na tradição judaica. Impressiona, também, em Dante a ênfase na numerologia,
que irá motivar mais tarde até Galileu a pesquisar a Comédia à procura das
relações entre números e conceitos, e que permite uma justaposição entre
sua visão e a do cabalista espanhol Abraão Abulafia (1240-1291), a ele
praticamente contemporâneo [viii]. Parece que Dante assume a tradição para
distanciar-se dela. Ele proclama-se clássico e logo inclui na visão do
clásico os elementos da tradição que o formou: messianismo e salvação, uma
visão rebelde e herética e, no plano do estilo, a defesa de uma língua e de
uma forma exuberante, expressionista segundo a definição do filólogo
italiano Gianfranco Contini (CONTINI, 1989, p. 103)[ix]. Dante cria,
portanto, um outro Ulisses, com características totalmente novas: não mais
o guerreiro empreendedor e astucioso, falador e de boa aparência, que é
impedido pelos deuses caprichosos de voltar para casa, pátria e família.
Mas sim, um Ulisses velho, obstinado e briguento, mal humorado e obsessivo,
que persegue seu objetivo até a morte, de forma temerária, desafiando os
deuses, tanto os deuses gregos quanto o deus cristão. O Ulisses de Dante
não almeja a volta a Ítaca, não persegue o nóstos. Ele vislumbra um futuro
de grandeza, que expressa também uma certa megalomania. Segundo Piero
Boitani (BOITANI, 2006, p. 31)[x] "O Ulisses do Trezentos encarna na
tragédia o nascimento do mundo moderno" A montanha do Purgatório que ele
procura – um anacronismo deliberado, tratando-se de Ulisses, herói grego e
pré-cristão – a montanha que une a terra ao céu, aquela que está situada
além das colunas de Hércules, é altamente proibida, em ambas as tradições:
o mito da proibição simbolizada pelas colunas de Hércules e, por outro
lado, o desafio da Torre de Babel, uma montanha de altura análoga. No canto
dantesco, o final trágico de Ulisses é esperado, por ele mesmo, tanto
quanto o final feliz é esperado pelo herói no poema de Homero. O episódio
da passagem das colunas pode ser lido também como mise em abîme,
focalização de uma leitura da inteira Divina Comédia, uma metaleitura: há
uma analogia significativa entre o verso 125 do Canto XXVI: "com os remos
demos asas ao louco vôo" ("dei remi facemmo ali al folle volo") e o verso
35 do II Canto do Inferno: "receio que minha vinda seja louca" ("temo che
la venuta non sia folle"). Neste segundo caso, quem está falando é,
segundo Contini (CONTINI, 1976, p. 33) é Dante personagem (e não Dante
autor ou Dante narrador); ele identifica sua viagem com a metáfora do vôo e
usa o adjetivo louco. Logo antes, ele afirmara (com uma dupla negação
retórica): "Eu não sou Enéias, eu não sou Paulo" ("Io non Enea, io non
Paulo sono", Inferno, II, 35), estabelecendo, de fato, uma comparação com
Enéias, o herói grego que teria viajado para o Além e o Apóstolo Paulo, que
também realizara a mesma tarefa, segundo uma lenda medieval que Dante
conhecia[xi]). O adjetivo folle, portanto, na Comédia define o
comportamento de Ulisses e o de Dante. Em outros trechos o adjetivo indica
novamente o percurso de Ulisses: "um caminho louco" ("folle strada":
Inferno VIII, 91) ou descreve o seu percurso "a passagem louca de Ulisses"
("il varco folle d'Ulisse"/: Paraíso, XXVII, 83). Em outro, Dante julga ter-
se excedido nos ataques a um papa "Eu não sei se eu fui aqui louco demais"
("I'non so s'i'mi fui qui troppo folle", Inferno, XIX, 88). Haverá outros
momentos – poucos – em que o adjetivo folle será usado na Comédia[xii],
menos relevantes para esta análise. A viagem de Dante, sua ascensão ou seu
sonho, espelha-se na viagem de Ulisses, seu exílio ou seu pesadelo. Quase
uma sinédoque, uma parte pelo todo que, por meio do cordão umbilical do
adjetivo, tem o efeito de criar uma verdadeira vertigem na interpretação.
Ou uma antinomia, uma total oposição. Borges (BORGES, 1994, p. 355)
enfatiza que há identificação entre Dante, como personagem, e Ulisses
relido por Dante:


"Dante, nuevo Ulises. Dante es un aventureiro que, como Ulises pisa
no pisados caminos, recorre mundos que no ha divisado hombre alguno y
pretende las metas más difíciles y remotas"[xiii].


Segundo Borges (BORGES, ib.), há muitos elementos que levam a
contrapor as duas viagens ("Essa acción parece el reverso de aquélla". Ele
chega à conclusão que a ação de Ulisses é sua viagem, enquanto a ação de
Dante é meramente metafórica, pois "la acción o empresa de Dante no es el
viaje de Dante, sino la ejecución de su libro". Segundo Borges, Dante
simula (ou representa) um conflito, que – de certa forma – realmente
deveria ter ocorrido no autor: "Dante fue Ulises y de algún modo pudo temer
el castigo de Ulises" (BORGES, 1994, p. 356), da mesma forma em que o autor
argentino aponta para uma semelhança entre Ulisses e Achab, de Melville,
pois ambas são personagens destinadas ao suicídio e, pode-se acrescentar,
ambas morrem no mar. A releitura empreendida por Dante é, portanto, uma des-
leitura, uma leitura equivocada ou deliberadamente alterada, em sua
essência. Pois o conceito de nóstos significa principalmente o retorno,
retorno para a pátria, reconhecimento de sua própria identidade. A cicatriz
de Ulisses, como lembra Auerbach (AUERBACH, 1976, p. 1), está lá, igual,
como anteriormente: uma marca do passado, que não pode ser apagada nem
modificada, uma memória fixa, cristalizada, petrificada. Ulisses de Homero
é audaz e temerário, expressão de um esquema circular em que ele, conduzido
pelo seu destino, alcançará um final feliz.
De certa forma, o andamento da Odisséia relembra – com as devidas
diferenças – o percurso de uma comédia, cuja natureza é,segundo as palavras
de Dante "um princípio 'horrível' e 'fétido' e um final 'próspero' e
'grato'" (apud AGAMBEN, 1976, p. 10). Se é verdade que Ulisses volta à
pátria e aos braços de Penélope amadurecido e sábio, pode-se dizer que essa
volta é cercada por uma atmosfera quase irreal: seus inimigos serão
derrotados e desaparecem, sua esposa (que não mostra o tempo que se passou)
é intocada e fiel, tão bela quanto era antes. O mundo retoma com seu
retorno seu curso e há a suspeita de que o período das aventuras possa ser
considerado um parêntese, dentro de um mundo tão fixo e estável quanto a
abóboda do céu grego.
***
Em princípio, pode-se afirmar que cada leitura de um texto apresenta
elementos de análise específicos e fragmentos de uma declaração de
princípio, explicitação da posição do autor do texto sobre a questão 'da
origem´ em nossa tradição: relação entre texto e mundo, entre texto e ação
e, mais especificamente, entre leitor e texto. O conceito de origem
desempenha uma função de intermediação, apenas uma metáfora para a leitura
e uma metonímia da relação entre escrita e oralidade na tradição, e
condensando a tensão entre o sistema interpretativo grego (e,
posteriormente, greco-cristão) e o judaico. Atenas e Jerusalém devem ser
consideradas metáforas de perspectivas muito complexas e variadas. À
primeira atribui-se a definição de limites na interpretação, conforme
apontado por Havelock (HAVELOCK, 1983)[xiv]. À segunda, em princípio,
associa-se a interpretação infinita, considerando que a cabala judaica seja
lida como um sistema de interpretação de textos e não como uma doutrina
esotérica (BLOOM, 1991, p. 92)[xv]. Evidentemente tal esquema não pode
ser visto como absoluto. Há dentro da tradição judaica uma posição que
defende uma leitura muito conservadora e, da mesma forma, na tradição
grega, há quem defendeu ou defende a interpretação infinita (BORI, 1982).
Esta dupla vertente na tradição ocidental dá vida a uma dupla origem, uma
origem dividida, entre uma visão grega e uma visão judaica, que se baseia
numa avaliação oposta da função da escrita: visão negativa no Fedro de
Platão, que é contraposta à da tradição hebraica, na qual o mito da
escrita coincide com aquele da libertação da escravidão, sendo portanto uma
visão radicalmente positiva.

Ulisses é personagem central no Canto XXVI do Inferno de Dante. Ele
está junto a Paolo e Francesca, personagens do Canto V, Ugolino della
Gherardesca, do Canto XXXIV e Farinata degli Uberti, do Canto XV: cantos do
Inferno, onde surgem as imagens mais fortes da Comédia. Ele é protagonista
no poço (bolgia) dos conselheiros fraudulenti (impostores, trapaceiros),
que utilizaram o próprio engenho (de fato, sua astúcia) para obter um
benefício e traíram os troianos. Embora este ato atucioso traga vantagens
para a Grécia, Dante é muito severo e condena Ulisses, assim como deveria
condenar a si mesmo. O louco vôo de Ulisses é seu próprio louco vôo e pode
ser apresentado em três episódios distintos:
No primeiro, Dante entra no poço dos traidores e, frente aos pecadores
e suas penas terríveis, ele expressa sua dor (ALIGHIERI, 1975, 513-4)


"E então eu senti e agora ainda sinto,/ quando aponto minha atenção ao
que vi" ("Allor mi dolsi, e ora mi ridoglio/ quando drizzo la mente a cio
che vidi"[xvi]


Logo eele é levado a usar grande cautela. Dante está tão tenso que
ameaça cair no abismo: uma alusão à paisagem do Inferno, mas talvez há uma
proximidade entre o abismo de Ulisses e o abismo metafórico, a consciência
de Dante de sua transgressão, seu folle volo, sua heresia radical.
No segundo episódio, Dante vislumbra algo de interessante em duas
chamas no Inferno, que apontam para dois pecadores: Ulisses e Diomedes (o
companheiro do herói grego na Odisséia). Nessa cena, há uma alusão à cena
bíblica da Revelação, em que, entre trovões e imagens, Deus fala ao povo,
cena que é evocada por Dante nos versos 34-39, com a citação da carruagem
de Elias (que lembra a de Ezequiel, citada em textos cabalísticos (BLOOM,
1991, p. 31). Dante personagem não consegue quase acompanhar as chamas
ofuscantes e Virgílio, tradutor e intermediário, se oferece para protê-lo,
pois os dois "pecadores" gregos certamente não dirigiriam a palavra a ele.
A imagem da chama imita o movimento de uma fala: a língua de fogo se agita
e Ulisses fala por si e por Diomedes, como Francesca fala por si e por
Paulo, no canto V. A própria duplicidade da chama evoca uma substancial
ambigüidade de Ulisses e de Dante, que é ambigüidade da figura, entre
história e alegoria (AUERBACH, 1997; GIUCCI: 1992, p. 31), que aponta para
a tensão entre um lado humano e um lado transcendente.
Um terceiro episódio se dá quando Ulisses se dirige a Virgílio e narra
sua história. Ele relata que seu desejo intenso ("l´ardore", v. 97 ) o
levara a retomar suas viagens, sem se importar com seu pai, seu filho, sua
esposa Penélope. Ele embarca num navio com uma pequena e fiel tripulação,
navega sem rumo no Mediterrâneo e, já velho e fraco ("tardivo"), alcança e
ultrapassa Gibraltar, onde se encontram as duas colunas de Hércules, postas
"para que o homem não se meta além delas" (v. 109). Ulisses discursa para
tripulação, que evidentemente manifesta dúvidas e medos (v.112-121):


"Ó vós irmãos, que por centos de milhas/ chegastes, por perigos, ao
sol-poento,/ ora a esta pequeníssima vigília/ / que é do nosso sentir
remanescente,/ não lhe queirais negar o experimento,/ por trás do sol, do
mundo sem mais gente. // Considerai estirpe e nascimento:/ para viver não
sois feitos quais brutos/ mas por seguir veraz conhecimento [trad. Haroldo
de Campos]."
("O frati", dissi, "che per cento milia/ perigli siete giunti
all'occidente,/ a questa tanto picciola vigilia// de'nostri sensi ch'è del
rimanente,/ non vogliate negar l'esperienza,/ di retro al sol, del mondo
sanza gente./ Considerate la vostra semenza: / fatti non foste per viver
come bruti/ ma per seguir virtute e canoscenza").


Ulisses apela à uma natureza ou a uma origem divina do homem (oposta à
natureza animal e bruta), e evoca a possibilidade de redenção da culpa (a
sua, a de Ulisses, e a da humanidade). Mas ele o faz apontando um caminho
herético, que não corresponde aos ensinamentos cristãos.
***


Aqui se colocam algumas hipóteses de leitura, que podem e devem ser
aprofundadas:
1. O Ulisses de Dante empreende sua viagem consciente de que esta será
sua última viagem, rumo à morte. Para Boitani (BOITANI, 2005, p. 18), há
uma prefiguração clara da morte: "A história de Ulisses está predestinada
por um iniludível telos narrativo que é thanatos: perder-se e ir, ir para a
morte" Ulisses sabe que será punido pela sua inaudita ousadia. Mesmo assim,
sacrifica sua vida em prol da virtude e canoscenza, dois termos complexos,
que podem ser traduzidos aproximadamente por caráter e conhecimento. Os
famosos versos são solenes, em seu ritmo:


"para viver não sois feitos quais brutos/ mas por seguir veraz
conhecimento." ("Fatti non foste per viver come bruti, / ma per seguir
virtute e canoscenza")

Assim Ulisses transforma-se do aventuroso representante do humano (em
contraposição aos deuses gregos) em "algo a mais, de mais elevado, de maior
e fundamentalmente diferente" (NIETZSCHE, 1983, p.44) – a incarnação do
humano demasiado humano nietzscheano: uma combinação de espírito de
aventura, curiosidade, anseio de viajar e conhecer. Por isso ele
transgride, pois quer elevar-se ao plano divino. Sua morte aponta para um
modelo, um sacrifício.
2. Pode-se dizer que Ulisses representa o caráter prometéico e divino,
que seria próprio do humano e o espírito empreendedor do comerciante e
marinheiro do primitivo capitalismo, que também está imbuído de uma missão
e que anseia resgatar a cultura da antigüidade clássica, sua glória e seus
mitos. O que move Ulisses de Dante é um plano, uma estratégia, um
objetivo, em que ele – humano – irá mostrar audácia e conhecimentos
divinos. Seus movimentos são contrários à viagem circular, cujo desfecho é
a volta ao lar, à família, aos súditos. À circularidade que caracteriza o
Ulisses de Homero, a Comédia contrapõe a linearidade: do conhecido ao
desconhecido, do mundo povoado, ao "mondo sanza gente" (o mundo sem gente,
desabitado), do Oriente ao Ocidente ("di retro al sol"; por trás do sol).
Uma bipartição que o próprio Ulisses sublinha, quando fala que estão-se
dirigindo rumo à manhã (o Ocidente), do lado mancino. Em língua italiana
antiga, mancino significa canhoto ou esquerdo: a embarcação de Ulisses está
acompanhando o litoral da Africa, indo para o Sul. Mancino denota, porém,
algo contrário ao usual, contrário ao que é familiar aos marinheiros.
Ulisses e sua tripulação estão indo para o lado mancino, que é o lado
esquerdo, mas também perturbante ou unheimlich. De resto, é neste terceto
(nos versos 124-5) que aparece, pela primeira vez, a menção ao vôo louco
(ALIGHIERI, 1975, p. 530) [xvii].


"para o lado do oriente vôlta a popa, / a remar nos lançamos, louco
vôo,/ sempre avançando pela via canhota." [Trad. Haroldo de Campos]
("E volta nostra poppa al mattino, / Dei remi facemmo ali al folle
volo,/ Sempre acquistando dal lato mancino")


A tripulação recusa-se a avançar e ameaça desertar, levando Ulisses a
repreendê-la. Ele está a procura da montanha do Purgatório, que é uma
utopia (na concepção da época, que excluía a possibilidade do mundo
continuar, após Gibraltar), literalmente um não lugar. Esse objetivo é,
também, para alguém imbuído de uma missão, um caminho rumo à redenção, à
ascensão, embora seja lugar de morte certa. Há leituras que atribuíam ao
Ulisses de Homero uma analogia à figura de Cristo (GIUCCI, 1992, p. 32),
neste sentido podería-se estabelecer uma justaposição entre o Ulisess de
Dante e Moisés. Ambos coléricos, ambos visionários e líderes e ambos
abandonados, tiveram que enfrentar a descreença e a rebelião. Os dois não
chegam a ver de perto o lugar que procuravam.

3. A figura de Ulisses certamente inspirou-se num episódio histórico:
a viagem no Atlântico realizada em 1291 pelos genoveses Tedisio d'Oria e
pelos irmãos Ugolino e Vadino Vivaldi. Uma viagem sem retorno e que teve
grande repercussão (GIUCCI, 1992, p. 46; ALIGHIERI, 1975, p. 522)". A
grande aventura atlântica havia recém começado. Como afirma Boitani
(BOITANI, 2005, p. 32 e 38), a literatura prefigura um mundo novo:

"O incontro entre interpretação, poesia e história gera, como veremos, uma
sequência tipológica na qual o Ulisses dantesco constitui a 'figura' e
Cristóvão Colombo o 'cumprimento', no qual a realidade 'cumpre' as
escrituras que a profetizaram...A Narração torna-se história"

Ulisses será citado nas famosas quatro cartas de Américo Vespúcio,
provavelmente redigidas, como afirma T. Todorov (TODOROV, 1994), por um
ghost writer culto de Florença, onde Vespúcio inventa o nome Mundus Novus,
novo mundo, para as Américas e, por um equívoco da história, dá nome ao
continente inteiro. A literatura, que nasce aparentemente para representar
o mundo e a história, adquire o papel oposto: o de antecipar o futuro,
transformando o mundo ou ajudando a moldá-lo.

4. Em seu livro É este um Homem?, Primo Levi dedica o capítulo "O
Canto de Ulisses" à leitura que faz Dante do herói grego. O texto de Levi
constitui, de certa forma, uma ponte entre um inferno metafórico (o de
Dante) e o inferno real que é o campo de concentração. Levi descreve a
tentativa do protagonista Primo– que, como Dante, é ao mesmo tempo
narrador, protagonista e autor do texto– de transcender o embrutecimento a
que o campo de concentração reduz o homem. Primo tenta rememorar os versos
do Canto de Dante, mas fracassa; a memória não o ajuda e, nesta tentativa
fracassada de rememorar um trecho da Comédia, ele desenvolve novas
interpretações do "Canto de Ulisses", principalmente a intuição sobre algo
sobrenatural que teria traçado o destino de Ulisses (e o seu próprio). O
sobrevivente tem necessidade de descrever um mundo, cuja abjeção ultrapassa
tudo o que tinha sido descrito anteriormente; o próprio objeto não parecia
permitir representação, embora o imperativo ético (que revela um tom
análogo ao exortação de Ulisses dirigida aos tripulantes de seu navio) seja
apresentado como obrigação.
Ulisses de Dante é – como o próprio Dante – um narrador
autobiográfico. Ele é movido por um imperativo ético, mas seu discurso se
apresenta de forma ambígüa e seu comportamento é herético. Ulisses está
relatando a própria morte, um fato extremo, que ele conscientemente
enfrenta, como uma punição ao seu desafio. A decisão de sua ousada e
temerária viagem está anunciada no verso 100 do Canto XXVI: "E me lancei,
então, ao mar aberto" ("E misi me per l'alto mare aperto"). Levi relata ter
intuído no campo de concentração a posição pouco usual da pronome: na
língua italiana dir-se-ia "e mi misi" e não "e misi me". O acento recai,
portanto, na decisão de Ulisses, em seu livre-arbítrio, sua temeraridade,
pois ele empreende a viagem, de livre e espontânea vontade, não foi levado
por uma divinidade ou pelo destino. Ulisses induz a tripulação a continuar
e ele realiza a descrição da própria morte, uma descrição de algo
impossível, que constitui o limite da assim chamada literatura de
testemunho, da literatura em geral e da própria vida. No final do canto, o
mar se fecha sobre o navio e seus tripulantes e Ulisses narra: "e nos fecha
das águas na clausura" ("e infin che ´l mar fu sopra noi richiuso")
(ALIGHIERI, 1975, p. 533)[xviii]. Em Ulisses não há culpa e nos
sobreviventes dos campos de concentração a culpa é produto de um mecanismo
perverso, que inverte a situação em que estão ou estiveram. Toda a
literatura é regida por temas e problemas análogos: A morte e sua descrição
representam o extremo limite da literatura, que a literatura de testemunho
escolhe como objeto privilegiado de sua elaboração.


5. Na Comédia Ulisses é condenado por ter traído os troianos. Isso não
aconteceu com o Ulisses de Dante, que não traiu: ao contrário, ele defende
o caráter autêntico da humanidade e empreende audaciosamente (e não
astuciosamente) o caminho rumo à morte. De fato, num contexto mais moderno,
a morte de Ulisses poderia ser considerada como um suicídio. Parece que a
morte de Ulisses de Dante resgata a culpa (a astúcia, a falta de ética) de
Ulisses da Odisséia. Ulisses no lugar do outro Ulisses: uma redenção. Uma
transformação. Uma libertação.

6. A posição que ocupa o Canto XXVI dentro do livro do Inferno é
interessante. Sabe-se que Dante atribuia grande importância aos números
(HARDT e KIEFER, 2002)[xix]. Sendo o 26º canto da Comédia ele marca um
quarto da obra inteira, que contém cem cantos. De certa forma, Ulisses
mostra um caminho e representa uma chave de leitura. É uma posição
privilegiada. No Decameron de Giovanni Boccaccio, obra que compete com a
Comédia, também composta de cem novelas, análoga posição privilegiada é
ocupada pela Introdução à IV jornada, onde o autor Boccaccio entra como
híper-narrador que conta uma outra novela, fora da coletânea. No Decameron,
assim como na Comédia, esta intervenção inspirada na numerologia cria uma
mise em abîme. Isto reforça a hipótese que a nova versão das aventuras de
Ulisses sugira uma chave de leitura da Comédia.
7. De fato, em Dante a nova articulação entre a tradição clássica e a
"judaico-cristã", comentada entre outros por Auerbach (AUERBACH, 1976, p. 1-
20), parte de uma questão hermenêutica relevante. Dante apresenta um
sistema de interpretação que, embora não sendo original, torna-se muito
produtivo: na Epístola a Cangrande della Scala (ALIGHIERI, 1974, 346-361)
sugere uma interpretação em quatro níveis da Comédia: literal, alegórico,
moral e anagógico que, de fato, consolida a mistura no uso das figuras
retóricas da tradição grega (Aristóteles) e da patrística medieval. De
certa forma, esse sistema é compatível com o sistema interpretativo da
tradição judaica, pois em seu topo Dante coloca a anagogia, conceito já
usado por Aristóteles, que designa a interpretação mística. Diferentemente
da tradição grega, porém, a mística na leitura do texto parte da idéia de
um privilégio do texto escrito, ou seja: algo que está muito longe do
essencialismo platônico e que a tradição judaica, em sua vertente
cabalista, defende.
8. Desta forma, a relação entre viagem e morte pode ser lida não
unicamente como limite ou como alegoria (a punição pela temerariedade), mas
como elemento central para a definição do que é literatura. Há uma
insistência no tema da morte na literatura da época de Dante: na sua viagem
ao além e no vínculo que há entre o afresco do Triunfo da morte em
Boccaccio e o Decameron (BATTAGLIA RICCI, 2000), cuja moldura apresenta a
mais terrível das mortes: o grande flagelo da peste de 1348.
A morte de Ulisses pode ser interpretada, entre outras coisas, como
morte do mundo clássico, por ele representado. Ela alude, evidentemente, a
um processo de transcendência ou de sublimação. Mas ela se torna também
símbolo: da resistência do humano, demasiado humano. É uma morte procurada
e almejada, pois, para alcançar uma vida nova, a literatura que surge no
milênio de Dante tem que passar pela experiência da morte. Morte de
Virgílio, do mundo clássico, da tradicional divisão dos gêneros clássicos,
ou sua inversão[xx].
9. Dante evidencia uma propriedade fundamental do texto, a sua
possibilidade – potencialmente infinita – de releitura ou interpretação.
Implicitamente, o texto de Dante sugere uma ética: não tanto uma ética do
comportamento (pois Ulisses pode ser condenado ou absolvido nos dois casos,
no de Dante assim como no de Homero), quanto uma ética aplicada à leitura
ou ética na e da leitura. Na interpretação de um texto clássico, Dante não
recua: matando o Ulisses de Homero, ele demonstra libertar-se de sua
tradição, tornando-se paradigma da liberdade de escolha na leitura e sendo,
ao mesmo tempo, uma metáfora do problema hermenêutico. Seu procedimento
demonstra-se altamente produtivo, pois libera a narrativa da angústia da
influência, o que confirma que, na literatura, o problema é a produtividade
e não a verossimilhança ou a verdade.
10. A mudança de perspectiva realizada impõe uma nova leitura da
relação entre nóstos (o retorno) e exílio, entre circularidade harmônica e
estratégias (de viagem, de leitura) redentoras e messiânicas. Uma nova
relação entre escrita e viagem.


BIBLIOGRAFIA

AGAMBEN, Giorgio. Categorie Italiane. Padua: Marsilio, 1976
ALIGHIERI, Dante. Epístola a Cangrande della Scala in R. ANTONELLI. La
poesia del Duecento e Dante. Florença: La Nuova Italia, 1974, p. 346-361
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[i] In: X Congresso Internacional da ABRALIC, 2006, Rio de Janeiro. Anais
do X Congresso Internacional da ABRALIC. Rio de Janeiro: ABRALIC, 2006.
v.1. p.1 – 15
O tema de Ulisses na literatura evidentemente não é novo. Este texto nasce
da exigência de definir a existência de origens em nossa tradição
ocidental. Há, entre muitos textos, dois que gostaria de destacar, por ser
de ilustres estudiosos e amigos. A sombra de Ulisses de Piero Boitani (São
Paulo: Perspectiva, 2005), que contém traduções que Haroldo de Campos
realizou expressamente para publicação da edição brasileira. E um livro
publicado anteriormente, mas que ainda conserva todo seu vigor: Viajantes
do Maravilhoso, de Guillermo Giucci ( São Paulo: Companhia das Letras,
1992). Ambos os textos contém muita sabedoria e resolvem muitos dos
problemas e das questões, que aqui serão apontadas. Mesmo assim, espera-se
que o leitor e o ouvinte encontrem elementos para reflexão ou para uma
disputa.
[ii] "El falso Problema de Ugolino" In "Nueve Ensayos dantescos" In
BORGES, Jorge Luiz. Obras Completas. [Buenos Aires, 1989 ]. São Paulo:
Melhoramentos, 1994, p. 351-3
[iii] Os documentos históricos confirmam que Ugolino della Gherardesca foi
murado vivo junto com quatro jovens (dois sobrinhos e dois filhos), em 1283
e teria morrido de fome em 1289 (ALIGHIERI, Dante. La Divina Commedia [org,
e notas Daniele Mattalia], I Inferno. Milão: Rizzoli, 1975, p. 64, nota 13-
4
[iv] As traduções desses versos de Dante são minhas. De agora em diante
serão de Haroldo de Campos, In "Caderno de Poemas" (BOITANI, op. cit., p.
199-204).
[v] O endecasílabo italiano corresponde ao decasílabona métrica portuguesa.
[vi] segundo o título dado por Primo Levi a um capítulo de LEVI, Primo.
Este um Homem?Rio de janeiro: Rocco, 1997
[vii] Entre elas: Horácio Epistola aos Pisones, Séneca Epistola LXXXVIII, 6
e seg.; Cícero (De Finibus, v. 18 e De Officiis, III, 26) e as acenos dos
geógrafos Giulio Solino e Plínio o Velho e outros. MATTALIA, Daniele. La
Divina Commedia (comentário). Milano: Mondadori, 1975, p. 522-3, nota 90,
além da viagem empreendido no Atlântico em 1291 pelos irmãos genoveses
Tedisio d'Oria e os irmãos Ugolino e Vadino Vivaldi, uma viagem sem
retorno. Veja-se também: BOITANI, Piero, op. cit. , p. 29
[viii] Em artigo intitulado "Um Corpo que Cai (reler Dante)", no prelo na
revista Entrelivros, sugeri uma comparação entre o cabalista espanhol e
especialista em numerologia Abrahão Abulafia e Dante Alighieri. Umberto
Eco, em capítulo de seu livro La lingua ricerca della lingua perfetta nella
cultura europea. Bari: Laterza, 1992 o havia já documentado.
[ix] CONTINI, Gianfranco. Ultimi esercizi ed elzeviri. Torino: Einaudi,
1989, p. 103
[x] BOITANI, Piero. A Sombra de Ulisses. São Paulo: Perspectiva, 2006, p.
31
[xi] A lenda da Odissea que Dante lê não foi certamente a Odisséia de
Homero. Veja-se BOITANI, Piero, op. cit., p. 25 e Daniele MATTALIA, op.
cit., p. 41 , Nota 28
[xii] V.A. Encicolpedia dantesca. Roma: Istitudo dell'Enciclopedia
italiana, 1970 [Vol. II , verbete: "folle"]
[xiii] Borges reporta aqui comentários feitos por Carlo Steiner e August
Rüegg (in ib.)
[xiv] Veja-se HAVELOCK, Eric. [Preface to Plato, aqui na tradução
italiana]. Cultura orale e civiltà della scrittura. Bari: Laterza, 1983
[xv] "A grande lição que a Cabala pode dar à interpretação contemporânea é
que o significado nos textos tardios é sempre errante".
[xvi] Inferno, Canto XXVI, , v. 19-20
[xvii] Inferno, Canto XXVI, v. 124-126
[xviii] Inferno, Canto XXVI, v. 142
[xix] Em capítulo de seu livro, Umberto Eco analisa a proximidade entre
Dante e Abulafi ("La lingua perfetta di Dante"). Afirmei a mesma tese em
artigo no prelo ("Um corpo que cai", revista entrelivros). Veja-se, também
o amplo estudo sobre numerologia em Dante em HARDT, Petra Christina et
alii.
[xx] Como mostra Giorgio Agamben (op. cit.), a escolha do gênero da comédia
realizada por Dante inverte a tradicional hierarquia e contraria a
comparação com Virgílio, seu precursor clássico.
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