Um híbrido entre a pomba-galega (Patagioenas cayennensis) e pombão (Patagioenas picazuro) (Columbiformes: Columbidae)
É importante conhecer as formas híbridas, elas podem auxiliar em identificações difíceis e suspeitas em museus, ou mesmo no campo. Pierotti & Annett (1993) citam que a hibridação entre as aves pode ser um mecanismo evolutivo, e isso permite uma maior diversidade genética e adaptação às mudanças das condições ambientais, em especial nos ambientes alterados pelo homem. Agradecimentos Somos gratos a Rafael Fortes, Amarildo Jordão e Danilo Mota pela colaboração com as fotos para a ilustração desse artigo. Também a Bruna de Aquino Yokota pelas sugestões dadas na elaboração da primeira versão do manuscrito.
Marco A. Crozariol1,2,3 & José Indiani3 O cruzamento entre dois táxons distintos, também conhecido como hibridismo, é bastante difundido entre as diferentes famílias e ordens de aves (Mengel 1963, Jehl Jr. 1978, Craven & Westemeier 1979, Haramis 1982, Parkes 1984, Smith 1987, Spear 1987, Rensel & White 1988, Oliphant 1991, Hamer et al. 1994, Lencioni Neto 1995, Hoag 1999, Seamans et al. 2004). Várias espécies de aves descritas no mundo atualmente são consideradas inválidas pelos especialistas por acreditarem, ou comprovarem, que essas são formas híbridas. O próprio Brasil possui algumas “espécies” nessa situação (ver MalletRodrigues 2005). São tantos os casos de hibridismo nas aves que Cockrum (1952) publicou um artigo reviFigura 1. Patagioenas picazuro, pombão. sando todos os híbridos de aves descritos na Fotos de Rafael Fortes (esquerda) e Amarildo Jordão (direita). América do Norte e norte do México. No entanto, em sua revisão, somente de casos ocorridos na natureza, nenhum Columbidae foi citado. Revisamos a literatura disponível à procura de prováveis registros de Columbidae híbridos e não encontramos nenhum caso. Dessa maneira, relatamos aqui um caso de hibridismo em Columbidae, que ocorreu em cativeiro, entre as espécies Patagioenas picazuro e P. cayennensis. Na natureza essas duas espécies ocorrem lado a lado em grande parte da sua distribuição, porém desconhecem-se casos sobre híbridos entre elas. O pombão, Patagioenas picazuro, é um dos maiores columbídeos do Brasil, com cerca de 34 cm (Sick 1997), embora Belton (2000) cite 38.5-39 cm para a espécie. Habita matas de galeria, caatinga e capões, beneficiando-se do desmatamento (Willis & Oniki 1987, Alvarenga 1990). Ocorre do Nordeste ao Rio Grande do Sul, Goiás e Mato Grosso, Bolívia e Argentina (Sick 1997). Quanto à coloração, o pombão possui como mais notáveis características a região escamada pouco abaixo da nuca e uma faixa branca que contorna parte da asa quando esta está fechada. Também as penas das coberteiras das asas possuem uma estreita faixa terminal cinza claro (figuras 1). A pomba-galega, Patagioenas cayennensis, é uma das espécies mais abundantes em regiões de baixadas quentes, possuindo cerca de 32 cm (Sick 1997) enquanto Belton (2000) cita 33.9 cm e Sigrist (2006) 25-26 cm. Habita beira de matas e margens de rios estando distribuída por todo o país, além do México, Argentina e Uruguai (Sick 1997). A coloração da espécie é bem mais homogênea que a do pombão, possuindo um tom vináceo na maior parte do corpo. O peito é cinzento assim como a cabeça, principalmente a região da nuca, que também possui alguns reflexos metálicos (fiFigura 2. Patagioenas cayennensis, gura 2). pomba-galega. Foto de Danilo Mota. 6
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Referências Bibliográficas
Figura 3. Híbrido entre o macho de P. cayennensis e a fêmea de P. picazuro, “pombão-galego”. Fotos de José Indiani.
O indivíduo híbrido, que nomeamos de “pombão-galego”, nasceu no viveiro do criador e amador de aves, José Indiani. O instante do acasalamento foi observado e ocorreu com o indivíduo macho de P. cayennensis e a fêmea de P. picazuro. Apenas um ovo, de coloração branca, foi colocado em um ninho raso, assim como citado na literatura para ambas às espécies (Skutch 1964, Oniki & Willis 2000). O “pombão-galego”, com mais de um ano de nascido e, portanto, adulto, não foi medido nem pesado, mas aparentemente o seu tamanho é um pouco maior do que a de P. cayennensis, sendo então mais parecido com a de P. picazuro. A coloração da plumagem é uma mistura, algumas vezes discreta, dessas duas espécies. São observados leves traços da escamação na nuca e, principalmente, a borda branca da asa e o contorno cinzento nas penas das coberteiras das asas, como características de P. picazuro e tons vináceos na região do peito e pescoço, mais a cabeça cinzenta com algumas penas de reflexos metálicos na nuca, de P. cayennensis (figura 3). Provavelmente a pressão do cativeiro favoreceu esse acasalamento interespecífico, mesmo estando disponíveis outros indivíduos das duas espécies em questão no mesmo recinto. Atualidades Ornitológicas Nº 153 - Janeiro/Fevereiro 2010 - www.ao.com.br
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1 – Grupo de Pesquisa em Ecologia e Conservação de Aves, Universidade Federal do Tocantins (UFT), Palmas.
[email protected]; 2 – Mestrando em Ecologia de Ecótonos (UFT); 3 - Clube de Observadores de Aves do Vale do Paraíba, SP (COAVAP). 7
