Um novo modelo para as Centrais de Abastecimento

July 4, 2017 | Autor: A. Almeida Cunha | Categoria: Fresh Produce Wholesale Markets, Food Market, Wholesale and Retail Markets
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Um novo modelo para as Centrais de Abastecimento Altivo Almeida Cunha1 e Walter Belik 2

A mudança do entreposto paulistano da Ceagesp para alguma área próxima do Rodoanel está criando imensas expectativas e abre espaço para recolocar a discussão do papel das Centrais de Abastecimento. O modelo brasileiro de comércio atacadista público iniciado nos anos 70 integrava diversas praças comerciais pelos padrões de preços e qualidade. Por uma série de razões, que vão desde a falta de investimentos públicos no setor e o descompasso com a evolução dos sistemas de logística, o sistema nacional que regulava a atuação de mais de 50 entrepostos atacadistas foi desfeito em meados dos anos 80 . No entanto, ainda que mambembe e sem coordenação, a lógica de hierarquia das Centrais de Abastecimento manteve-se de alguma maneira no aspecto comercial, com as grandes Centrais funcionando como expedidoras para centros regionais. Por outro lado, essas organizações perderam algumas das suas funções, “clássicas”, seja no estabelecimento de padrões de classificação ou na transparência de preços. Apesar dos problemas, as Ceasas são responsáveis por uma parcela significativa do abastecimento de produtos frescos das grandes e médias cidades brasileiras. Em 2014, esses equipamentos comercializaram 16,1 milhões de toneladas de produtos hortigranjeiros, cifra que posiciona o Brasil entre os grandes do mundo. Neste sistema pouco coordenado, a Ceagesp atua como um grande hub de distribuição, sendo responsável por 1/3 da comercialização de hortigranjeiros das Centrais atacadistas brasileiras. Essas estatísticas são possíveis porque a as Ceasas registram cotidianamente as informações sobre quantidade, valor e origem de expedição da produção que chega a seus entrepostos. Estes dados representam uma informação estratégica e diferente dos dados do Censo Agropecuário. É possível também estimar o comércio inter entrepostos, seja dentro das filiais de uma mesma empresa ou entre empresas. Um estudo realizado com a base de dados da Conab no período 2010-2013 identificou que pelo menos 6% da origem total de frutas comercializadas entre as Ceasas têm como origem as grandes centrais de abastecimento, sendo que 4% vêm do sistema atacadista da Ceagesp. Portanto, qualquer transformação que ocorra na Ceagesp afeta, em efeito cascata, todo abastecimento nacional. Apesar dos grandes números, a Ceagesp é um gigante que encolhe continuamente. A quantidade de hortifruti comercializada pelo entreposto paulistano no último triênio foi 10,4% inferior a da quantidade comercializada em 2000-2002. Na realidade, esta perda é muito maior em termos relativos se observarmos que no período 2000/14 o PIB nacional cresceu 55% em termos reais. 1 2

Consultor FAO/ONU. Professor Titular do Instituto de Economia da Unicamp

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O mote da qualidade, da segmentação e diferenciação dos produtos, da rastreabilidade e dos orgânicos nem passou perto dos entrepostos públicos, dirigindose diretamente aos supermercados e agora ao varejo repaginado como gourmet. Esta realidade podia ser antevista na crise do modelo dos grandes mercados atacadistas de 2ª geração, que se revelou na Europa na década de 70, com perda de importância de muitos mercados atacadistas. As razões da crise do modelo europeu estão ligadas à emergência de novas formas de coordenação do abastecimento representado pelas grandes redes de supermercados. Voltando ao Brasil, o serviço oferecido pelos atacadistas tradicionais se tornou caro, não atendendo às necessidades da nova distribuição que requerem seleção, conservação, embalagem, preços competitivos e gestão de marcas. No caso brasileiro, esta tendência foi agravada por um processo contínuo de depreciação das estruturas, das funcionalidades e principalmente da gestão das Ceasas brasileiras. Alguns mercados europeus reagiram à crise situação através de um processo de reestruturação que atraiu para dentro das grandes centrais as plataformas logísticas privadas. Para isto, as Centrais promoveram investimentos em logística, estímulo ao investimento privado na cadeia do frio e estruturação do transporte multimodal. Os mercados abrigaram novos negócios, como os serviços de fornecimento para restaurantes e hotéis e novos produtos, como os minimamente processados, orgânicos e produtos de origem certificada. Este processo de reestruturação deu origem à um novo modelo de negócios que caracteriza os mercados de 3ª geração. O modelo 3G dos mercados europeus, baseado na modernização logística e em novos negócios de abastecimento é adequado para uma região em que a produção agrícola está consolidada, a renda é estável e a população cresce moderadamente. Já a reestruturação do abastecimento brasileiro tem que mirar objetivos ainda mais desafiadores. O primeiro é atender os novos valores desejados por consumidores que querem informação embarcada nos produtos: qual seu valor nutricional, qual sua qualidade sanitária, como foi produzido, onde foi produzido e quem o produziu. A variável preço é resultado desta escolha, sendo que o mais caro não necessariamente é o melhor. Produtos locais, mais frescos e com menor intermediação comercial podem ter preços mais compensadores. O segundo objetivo é fazer com que a escolha dos consumidores favoreça a entrada de novas regiões agrícolas, valorizando os aspectos locais e regionais associados à gastronomia. O terceiro desafio é fazer com que os operadores atacadistas sejam agentes eficientes e inovadores. Para isto as transações nos mercados atacadistas têm que ser rápidas, com baixos custos de transação em ambiente limpo e seguro e amparada por uma inteligência de negócios. Esta configuração é encontrada nos modernos mercados definidos como Pólos Agroalimentares, que caracterizam mercados de 4ª Geração. Por exemplo, nossos vizinhos uruguaios estão em vias de inaugurar o moderno Parque Agroalimentario de Montevideo, um mercado 4G concebido em moldes internacionais para ordenar todo o

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sistema de abastecimento nacional. Se olharmos para o Sul, encontraremos o norte que precisamos.

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