Um poder cibernético? Dificuldades metodológicas em Nye para a compreensão do poder no ciberespaço

June 1, 2017 | Autor: Friedrich Maier | Categoria: International Relations, Cyberspace, Information revolution
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Um poder cibernético? Dificuldades metodológicas em Nye para a compreensão do poder no ciberespaço1 Friedrich Maier2

Resumo: Visto a complexidade e a intangibilidade do ciberespaço observamos nas últimas décadas um interesse por parte de alguns autores das relações internacionais em caracterizar de uma forma teórica os acontecimentos gerados pelo fenômeno da revolução informação. Tais caracterizações ampliam a ressonância da área que, ainda em desenvolvimento, é marcada por lacunas conceituais. Esse trabalho propõe-se a mapear conceitualmente a obra de um importante autor das relações internacionais, Joseph S. Nye Jr, a fim de compreender sua sistematização no que tange às questões de poder cibernético e revolução da informação em relação com outros conceitos já cristalizados do autor (poder brando e poder duro), demonstrando, num segundo momento, as dificuldades e imprecisões metodológicas que surgem dessa relação. Palavras-chave: poder cibernético, revolução da informação, Joseph S. Nye Jr. Introdução O poder é um dos conceitos mais complexos dentro da área de estudo das relações internacionais. As atuais mudanças tecnológicas e a emergência de um espaço cibernético ampliam a complexidade e a intangibilidade do mesmo. Aferimos dentro da obra de Joseph S. Nye Jr sua atenção às influências que o processo de revolução da informação aplica aos atores internacionais e de que modo a emergência de um poder cibernético amplia o jogo de xadrez tridimensional da política internacional. Desse modo nos propomos a realizar um mapeamento conceitual dentro da obra desse importante autor a fim de auxiliar a discussão dos conceitos chave, apontando ao final, algumas críticas referentes à questões de imprecisões metodológicas. Neste resumo estarão sintetizados os objetivos, o material e os métodos, os resultados e discussão, bem como as considerações finais a respeito do tema escolhido. Objetivos O presente trabalho se propõe a resolver a questão: considerando a discussão dos diferentes conceitos de poder de Nye, como avaliar a generalidade e particularidade de Nye no que se refere especificamente ao poder cibernético e revolução da informação? Além disso, pretendemos demonstrar como os aspectos relevantes de cada período histórico pautam as definições de poder na obra do autor escolhido, apontando assim que a revolução da informação e o poder cibernético teriam como sua peculiaridade a configuração mais intangível entre todas estas categorias relacionadas ao poder, visto a amplitude de seu alcance e dificuldade de sua mensuração quantitativa, como também pelos inúmeros instrumentos de controle relacionados prática e potencialmente ao âmbito do espaço cibernético. Essa característica contribuiria então para certas dificuldades metodológicas, relacionadas às caracterizações anteriores de poder do autor, a saber, seus conceitos de poder brando e poder duro3. Resumo expandido destinado à apresentação na Mesa de Comunicações 09 “Teoria das Relações Internacionais”, da “XII Semana de Relações Internacionais da Unesp” (24 a 28 de agosto de 2015). 2 Graduando em Relações Internacionais pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP), na Faculdade de Filosofia e Ciências de Marília. Email: [email protected] Fone: 14981818907 3 Optamos, neste trabalho, em utilizar os termos em português dos conceitos “soft power”, “hard power” e “cyberpower”. 1

Material e métodos A pesquisa se realizou em método empírico e com fontes primárias, uma vez que utilizarmos apenas a obra do autor e de algumas obras que participou em coautoria para atingir nossos objetivos. A bibliografia em questão já foi levantada e selecionada. O critério de seleção utilizado apontou os textos e livros de Joseph S. Nye Jr que tratam dos conceitos acima discutidos. Desse modo, o mapeamento deu-se a partir da leitura em extensão dos mesmos, divididos a partir de um critério temporal. Admitiu-se também a fins de elaborar discussão final a leitura de comentadores e críticos do autor em questão a fim de basear teoricamente as críticas encontradas no final deste trabalho. Resultados e Discussão Observamos na obra do teórico estadunidense Joseph S. Nye Jr atenção às questões relacionadas ao poder cibernético e sua influência dentro das relações internacionais. Para Nye o poder cibernético implica, junto do fenômeno da revolução da informação, numa mudança qualitativa dos processos de câmbio de poder, isto é, para o autor a emergência do ciberespaço e de uma forma de poder nele, o poder cibernético, contribui para um fenômeno novo: a difusão do poder. (NYE, 2010). A argumentação de Nye baseia-se no seguinte encadeamento lógico: visto que a revolução da informação tem por base os rápidos progressos tecnológicos baseados no computador, nas comunicações e nos softwares e que estes progressos caracterizam-se por “diminuições dramáticas nos custos de criação, processamento e transmissão da informação”(NYE, 2010, p 1-2, tradução nossa), diferentes atores teriam, graças às reduções nos custos de entrada, acesso ao domínio cibernético, podendo dessa forma atuar sobre este a fim de obter seus objetivos desejados, caracterizando-se assim, o poder cibernético no marco dos chamados poderes comportamentais de Nye (behavioral power). (NYE, 2010; 2012). Tendo o poder cibernético como um conjunto de recursos que influenciam na criação, controle e comunicação das informações geradas dentro do ciberespaço pela rede mundial de computadores, Nye demonstra que o poder cibernético existe então como uma capacidade de obter resultados através do uso dos recursos informacionais dentro do ciberespaço e ainda, como uma habilidade de utilizar o ciberespaço para criar vantagens e influência em outros ambientes operacionais em torno dos instrumentos de poder (NYE, 2010). Visto a natureza híbrida do ciberespaço, os objetivos, as vantagens e as influências ocasionadas pelo poder cibernético poderão acontecer tanto na camada física, ou infraestrutural, quanto na camada virtual desse ciberespaço (NYE, 2010; 2012). Isso significa que ataques por meio da camada física do domínio cibernético, como por exemplo o bombardeamento de cabos e servidores, terão influências na camada virtual, da mesma forma que ataques originados do ambiente interno ao ciberespaço podem causar danos materiais na camada física (NYE 2012), como no caso do vírus Stuxnet, responsável por causar danos em instalações nucleares no Irã em 2010. Considerações finais Depreendemos que algumas das categorias utilizadas por Nye em suas obras carecem de um certo rigor metodológico. A primeira questão relaciona-se com o grau de intangibilidade das suas qualificações de poder. Zahran e Ramos (2010) apontam algumas situações nas quais os poderes duro e brando tornam-se difíceis de mensurar, escapando assim à proposição do autor estadunidense que afirma o poder duro como tangível e o poder brando como intangível (NYE, 1991; 2005; 2012). Nesse aspecto relevamos a importância

da perspectiva crítica dos autores, que afirmam que Nye deixa o leitor sem esses critérios da tangibilidade para especificar seus conceitos e inferimos, que o mesmo problema conceitual se aplica à categoria de poder cibernético, dada a dificuldade técnica e teórica para a composição de um arcabouço conceitual capaz de especificar as questões que envolvem tal forma de poder (KELLO, 2012). Isto é, dentro de nossa avaliação, o conceito de poder cibernético em Nye, apresenta um notável grau de intangibilidade e imprecisão, advindo por um lado da própria característica intangível do ciberespaço e, por outro lado, da relação que o autor faz entre o poder cibernético, o poder brando e o poder duro. Outra questão de importante referência é a existência ou não de uma relação entre o poder brando e o poder duro. Em outras palavras, se há alguma dependência do primeiro para com o segundo. Nesse aspecto, temos novamente um problema de rigor metodológico. Nye afirmará que não, ou seja, o poder brando não depende necessariamente do poder duro, entretanto não oferece nenhum argumento teórico para justificar tal proposição e apenas apresenta exemplos que o justificam (ZAHRAN & RAMOS, 2010, p. 19). Passamos essa questão também no que se refere ao poder cibernético: Nye não explicita de forma clara se há alguma relação de dependência entre o poder cibernético e o poder brando ou duro, afirmando apenas que o primeiro pode ser utilizado tanto numa perspectiva dura quanto numa perspectiva branda. Em síntese, observamos, em acordo com Kello (2012), nas questões que envolvem o ciberespaço e o poder cibernético que ainda existe dentro do campo de estudo das relações internacionais uma lacuna sobre o tema, derivada em parte pelo alto grau de intangibilidade do mesmo, e em parte pela falta de interesse na temática. Aferimos dentro da leitura das obras de Nye, uma atenção especial nos últimos anos à temática do poder cibernético. As tentativas empreendidas por Nye de caracterizar o poder cibernético e sua dinâmica em torno da revolução da informação contribuem grandemente para o estudo dentro da área. Todavia, encontramos também alguns pontos de imprecisão metodológica, derivados do sistema de caracterização de outros conceitos já cristalizados do autor, a saber o poder brando e o poder duro. Referências Bibliográficas KELLO, Lucas. Cyber disorders: Rivalry & Conflict in a Global Information Age. In: International Security Program Seminar Series, 2012, Cambridge. International Security Program, Belfer Center for Science and International Affairs, Harvard Kennedy School, 2012. NYE, Joseph S. Jr. Bound to Lead: The Changing Nature of American Power. New York: Basic Books, 1991b. _______________. Cyberpower. Harvard Kennedy School, 2010. Disponível em: . Acesso em: 25/03/2015. _______________. O futuro do poder. Tradução: Magda Lopes. São Paulo: Benvirá, 2012a. _______________. O paradoxo do poder americano – por que é que a única superpotência mundial não pode actuar isoladamente. Tradução: Tiago Araújo. Lisboa: Gradiva, 2005. ZAHRAN, Geraldo & RAMOS, Leonardo. From hegemony to soft power: implication of a conceptual change In: PARMAR, Inderjeet & COX, Michael (Eds.) Soft Power and US Foreign Policy: theoretical, historical and contemporary perspectives. Abingdon: Routledge, 2010, p. 12-31.

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