Um \"teatro da corte\" no século XXI

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spelho política

o uma figura mais agradável para do. Creio que é possível criar um impático”, mas não se consegue m “político empático”; um político uína capacidade de entender ades da população, colocandougar e sentindo aquilo que ela recentes cartazes de campanha etiram essa dificuldade, expondo (e os erros) de uma estratégia anda eleitoral. Por isso, diversas onsideram que o discurso político sta à realidade e não espelha a dadão comum, centrando-se cada m dados estatísticos e jargões os que muitos não compreendem. ação está descontente com a político que sente que não a a como devia. Basta refletirmos xa de abstenção recorde de 66,2% últimas eleições europeias ebermos que algo de grave se sar. Senão, vejamos: os vínculos os que nós criamos com os outros minantemente emocionais. Infelizmente, os vínculos dos cidadãos com os políticos são cada vez mais frágeis e erráticos, o que ajuda a explicar o fosso progressivamente maior entre políticos e eleitores. O tempo demasiado prolongado na vida política acaba por contribuir para esse afastamento, subsistindo a ideia de que “eles” não vivem como “nós”; “eles” não sofrem como “nós”; eles estão todos ados pelos privilégios do poder. ade, por mais competentes os estrategas de marketing e ção dos partidos políticos, não apenas através da imagem e s frases conquistar a confiança as. A escolha do voto — tal como em muitas áreas da nossa vida a forte componente emocional. que há líderes que não sobem de ade nas sondagens de opinião. m dissimulados, e deixaram de onfiança, outros nunca nos tocaram

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amos de líderes políticos que acto os seus neurónios-espelho, nica forma de compreenderem ades e aspirações do povo que se governar.

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PÚBLICO, DM 16 AGO 2015, p. 54

Um “teatro da corte” no século XXI Debate Ópera Mário Vieira de Carvalho

N

a viragem para o século XIX, na Alemanha, a ópera italiana foi substituída como “teatro da corte” pela ópera alemã. O movimento alastrara rapidamente a todos os príncipes alemães, incluindo, por fim, em 1801, a corte prussiana de Berlim. Uma pujante esfera pública burguesa acabara por impor os seus valores à sociedade da corte. Entre os momentos particularmente assinaláveis da mudança, contam-se a inauguração, pelo imperador José II, do Nationalsingspiel em Viena, em 1778, e, por exemplo, a atividade do teatro da corte de Weimar, onde, sob a direção de Goethe (desde 1791), alternavam peças ditas declamadas e óperas em língua alemã (muitas delas em traduções de originais franceses ou italianos, como As Bodas de Fígaro, de Mozart). Todas subsumidas no conceito global de teatro. Christoph Martin Wieland dá voz (em 1775) ao discurso iluminista burguês que prevaleceu. Critica a ópera como “um prazer demasiado caro” e lamenta que os governantes olhem para as artes como “um mero passatempo”, ou que, levados pelos “preconceitos de uma educação pedante”, não compreendam a “interrelação das coisas humanas”. Por isso, contrapõe ao fausto da corte, com os seus castratti e outros músicos importados, pagos a peso de ouro, os modestos Singspiele, que exigiriam “tão parco investimento” que “até uma cidade mediana da Alemanha teria meios para oferecer aos seus cidadãos um prazer público da mais elevada natureza”. Havia que reconhecer a “influência muito útil no gosto e nos costumes” dos Singspiele e o seu contributo para “a promoção da humanidade”. Assim entendida “eticamente” (Max Weber) como “missão de serviço público” (dir-se-ia hoje), a ópera alemã é um evento com consequências estruturais profundas e de longa duração. Para além da sua função cultural ou “formativa” substantiva, desencadeou emprego artístico local em larga escala e uma imensa rede de atividades produtivas correlacionadas. O seu efeito multiplicador repercutiu-se não só na esfera cultural e artística, mas também na esfera do desenvolvimento humano, social e económico. Os 50 teatros de ópera hoje existentes na Alemanha, com as suas companhias locais e espetáculos diários, são produto desse evento que ocorreu em finais do século XVIII. O seu desaparecimento seria uma catástrofe, tanto para a cultura como para a economia. Constituem (keynesianamente) um indispensável motor de ambas. Em Portugal, tivemos muito cedo um

teatro da corte em língua portuguesa: o vicentino. Mas logo escancaramos as portas a um fundamentalismo ideológico — o da Inquisição — que lhe era hostil. E, com a morte de Gil Vicente, logo desapareceu o teatro da corte em língua portuguesa. Quando é readmitido por João V, o teatro da corte confina-se à ópera italiana, realizada por castratti e outros músicos italianos contratados para a Capela Real. Primeiro tolerada como passatempo, transforma-se com José I no suprassumo da representação faustosa do poder real. Mas tal matriz, longe de ser repudiada pela nossa burguesia, antes a seduz. Será transposta para o São Carlos em 1793: ópera italiana na presença do rei. Só companhias italianas e língua italiana até final da monarquia. Mesmo para obras de tema e autores portugueses. Enquanto a Alemanha, em finais do século XVIII, passou a exportar ópera alemã, Portugal ainda hoje se atém ao modelo da ópera importada. Pedantemente. Perdulariamente. Um teatro que custa 40 mil euros por dia para produzir ópera só abre para a ópera 30 dias por ano. E a “missão de serviço público” do São Carlos? Está na lei, mas ninguém faz caso. Prefere-se a jactância do desperdício a uma visão estratégica na mobilização dos recursos humanos e financeiros.

Enquanto a Alemanha, em finais do século XVIII, passou a exportar ópera alemã, Portugal ainda hoje se atém ao modelo da ópera importada. Pedantemente

Professor catedrático jubilado (FCSH-UNL)

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