Uma Análise das Práticas de Gestão de Pessoas das Organizações sob a Ótica da Diversidade de Gênero - TCC

June 7, 2017 | Autor: A. Silva | Categoria: Gestão de Pessoas, Diversidade, Gestão Da Diversidade, Diversidade de gênero
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UNIVERSIDADE FEDERAL DE OURO PRETO INSTITUTO DE CIÊNCIAS SOCIAIS APLICADAS CURSO DE ADMINISTRAÇÃO

ANA LUÍZA RIBEIRO DA SILVA

UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS DE GESTÃO DE PESSOAS DAS ORGANIZAÇÕES SOB A ÓTICA DA DIVERSIDADE DE GÊNERO

MARIANA, 2016.

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Ana Luíza Ribeiro da Silva

UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS DE GESTÃO DE PESSOAS DAS ORGANIZAÇÕES SOB A ÓTICA DA DIVERSIDADE DE GÊNERO

Monografia apresentada ao curso de Administração da Universidade Federal de Ouro Preto como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel em Administração. Orientador: Prof. Dr. Harrison Bachion Ceribeli.

Mariana, 2016.

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UMA ANÁLISE DAS PRÁTICAS DE GESTÃO DE PESSOAS DAS ORGANIZAÇÕES SOB A ÓTICA DA DIVERSIDADE DE GÊNERO

RESUMO No mercado de trabalho atual, por razões históricas, percebe-se uma maior quantidade de homens em cargos de liderança em detrimento de mulheres. Portanto, o presente trabalho possui como objetivo analisar as práticas de gestão de pessoas adotadas pelas organizações sob a ótica da desigualdade de oportunidades entre homens e mulheres no âmbito organizacional. Foi realizada uma pesquisa de cunho exploratório-descritivo com coleta de dados realizada por meio de questionário. Por meio de análise dos dados obtidos, percebe-se que, mesmo que as organizações tentem mascarar, a desigualdade de gêneros é uma realidade enfrentada cotidianamente pelas mulheres. A contribuição deste trabalho reside na identificação de falhas nas práticas de gestão de pessoas que direta ou indiretamente mantém a desigualdade de gêneros nas organizações. Como sugestão para pesquisas futuras, recomenda-se entrevistar mulheres que ocupem cargos de liderança de maneira a mapear suas respectivas trajetórias profissionais. Palavras-chave: Gestão de Pessoas, Diversidade, Gestão da Diversidade, Diversidade de gênero.

ABSTRACT Nowadays, for historical reasons, the job market presents itself as a place full of men in leadership positions. Therefore, the present work aims to analyze the people management practices adopted by organizations from the perspective of inequality of opportunities between men and women at the organizational level. An exploratory-descriptive research was lead with data collection conducted through a questionnaire. With an analysis of the data, it can be noticed that even with organizations efforts to mask, gender inequality is a reality faced by women. The contribution of this work is to identify flaws on people management practices that directly or indirectly foments gender inequality in organizations. As a suggestion for future research, an interview with women who occupy leadership positions in order to map their professional trajectory is recommended. Keywords: People Management, Diversity, Diversity Management, Gender Diversity.

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1 INTRODUÇÃO

A discussão sobre diversidade de gênero vem alcançando cada vez mais notoriedade no cenário atual devido à constatação da existência, ainda nos dias atuais, da continuidade das diferenças históricas entre homens e mulheres nas múltiplas esferas sociais. À medida que esse debate é fomentado, diversas questões passam a fazer parte da agenda de pesquisa da ciência administrativa, tais como a ocupação, por mulheres, de cargos de direção em grandes empresas. A tendência comportamental das empresas, de acordo com Melo (2015), é conferir importância e adotar medidas para atenuar a desigualdade existente nas contratações de homens e mulheres, descaracterizando estas como responsabilidade social e encarando-as como medidas necessárias. No entanto, segundo um levantamento realizado por Lima, Gerbelli e Oliveira (2015), até março de 2015, nenhuma das 64 companhias que compõem o Índice Ibovespa possuíam mulheres na presidência. Dados coletados pela KPMG (2014) relevam que a presença de mulheres nos conselhos administrativos de 235 das empresas listadas na BM&FBovespa aumentou de 101 em 2013 para 107 em 2014, indicando que a inserção de mulheres em cargos de direção ainda é um processo lento. Paralelamente, segundo Melo (2015), a Fundação Getúlio Vargas constatou, numa pesquisa realizada em 2013, que, mesmo excluindo da pesquisa cargos como presidência e conselho, as mulheres só ocupavam 7,7% dos cargos de direção no ano de 2013. De maneira genérica, as empresas possuem a mesma proporção de homens e mulheres trabalhando em postos iniciais. Todavia, essa realidade modifica-se à medida que os profissionais atingem patamares mais altos na progressão de carreira, pois a maioria dos que alcançam esses postos são homens. Em alguns segmentos de mercado, é ainda mais difícil obter a inserção de mulheres em cargos de direção em virtude da crença da necessidade destes serem ocupados por homens devido à natureza do produto ou serviço. No Índice Ibovespa, o segmento de construção e engenharia é o único que não possui mulheres em seus respectivos conselhos de administração. Por outro lado, a maior participação de mulheres nos conselhos de administração é encontrada no segmento de tecnologia da informação. Algumas nações estão propondo medidas paliativas para reduzir a dificuldade de as mulheres alcançarem postos de direção nas grandes empresas por meio de cotas. As cotas representam um estímulo gradual que visa o ingresso de cada vez mais mulheres em cargos de direção.

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Para validar a relevância da implementação do sistema de cotas, o estudo da EY Center for Board Matters (2015) aponta a existência de quatro CEOs chamados John, Robert, William ou James para cada presidente do gênero feminino, entre as companhias do índice Standard & Poor’s 1500, que se refere ao índice de empresas norte-americanas relacionadas por seu tamanho, liquidez e setor. Além disso, Lima, Gerbelli e Oliveira (2015) revelaram que, entre os anos de 2003 e 2014, o salário de homens aumentou 47,96%, enquanto o salário de mulheres, apenas 40,13%. A organização internacional Actionaid (2015) concluiu que a desigualdade de gêneros custa às mulheres que vivem em países em desenvolvimento US$ 9 trilhões, devido às diferenças salariais e de acesso ao mercado. Melo (2015) apresentou ainda uma pesquisa realizada em 2013, reforçando que, no Brasil, homens possuem 20 vezes mais chances de serem CEOs, em detrimento das mulheres. Segundo a ótica da criação de políticas públicas, a Noruega sancionou no ano de 2008 uma lei que destina 40% das vagas do conselho administrativo para mulheres. Luíza Trajano, proprietária do Magazine Luíza e também integrante do grupo Mulheres do Brasil, entregou ao congresso nacional em dezembro de 2014 um projeto de lei que pretende estabelecer uma reserva de 30% das vagas para mulheres nos conselhos de administração de estatais e empresas de economia mista, com duração até o ano de 2033, de forma a reduzir as diferenças. De forma análoga às práticas adotadas pela Noruega, a Alemanha recentemente determinou que 30% das posições dos conselhos administrativos sejam destinadas a profissionais do gênero feminino. Segundo Melo (2015), países como Espanha, França, Finlândia, Holanda e Itália seguem pelo mesmo caminho. Conforme estudos realizados pela Organização Internacional do Trabalho, publicados pela Revista Veja (2015), a responsabilidade familiar é um papel atribuído mais à mulher que ao homem e as empresas enxergam esse fator como um obstáculo à liderança, deixando sob a gestão das mulheres apenas áreas como comunicação e gestão de recursos humanos. Atrelado ao fator familiar, as empresas consideram que contratar uma mulher é mais caro do que contratar um homem, devido aos ajustes necessários relacionados à gravidez de funcionárias e os custos atrelados a suas respectivas licenças. Por meio da análise dos dados até aqui expostos, percebe-se que a desigualdade de gênero nas organizações é uma realidade recorrente em diversos países no mundo, incluindo o Brasil. Por isso, torna-se necessário aprofundar-se a discussão a respeito da diferença de

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tratamento dado a indivíduos dos gêneros masculino e feminino, com o intuito de identificar medidas a serem tomadas para diminuir a disparidade existente entre homens e mulheres. Neste contexto, este trabalho teve como objetivo analisar as práticas de gestão de pessoas adotadas pelas organizações, sob a ótica da desigualdade de oportunidades entre homens e mulheres no âmbito organizacional. Como justificativa para esta pesquisa, destaca-se que a igualdade de gêneros é fator fundamental para o desenvolvimento social, visto que não há nenhuma premissa que indique melhores índices de comprometimento com o trabalho e alcance de resultados pautados na distinção de gêneros dos indivíduos. Sendo assim, além de discutir as raízes do problema, a relevância deste trabalho reside na falta de trabalhos acadêmicos que abordem este assunto com profundidade, principalmente em âmbito nacional. A discussão sobre desigualdade de gêneros nas organizações contribui para a consolidação de uma teoria validada cientificamente, além de promover a sensibilização dos gestores quanto à problemática abordada.

2 REFERENCIAL TEÓRICO

2.1 Conceito de diversidade

O Brasil é um país caracterizado por possuir origens diversificadas e padrões culturais singulares, oriundos da chegada de colonizadores que ocuparam o país com o objetivo de explorar os recursos que este possuía em abundância, como mão de obra escrava e matéria prima. Como consequência da ocupação, os colonizadores deram origem aos indivíduos que compõem a sociedade brasileira atual, por meio das relações instituídas e da miscigenação entre brasileiros, europeus, asiáticos e africanos (FLEURY, 2000). A sociedade proveniente destas relações se classifica como uma sociedade livre de qualquer tipo de preconceito, pois sua formação reside na interação entre povos de características e costumes distintos. Porém, o panorama atual revela a existência de uma sociedade estratificada com oportunidades diferentes definidas por origens econômicas, sociais e/ou raciais. Desta forma, são identificados dois grupos na sociedade: os grupos de maiorias e os grupos de minorias (FLEURY, 1999). As primeiras discussões em âmbito acadêmico sobre o tema diversidade tiveram início em meados dos anos 90, com o objetivo de formular uma definição geral que satisfizesse o conceito do termo e identificasse seu impacto na identidade e no comportamento dos

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indivíduos inseridos nas organizações. Porém, de forma isolada, nenhuma definição foi suficiente para conseguir abordar a complexidade do tema (NKOMO; COX, 1999). Em virtude da ausência de construção científica acerca do tema, a maior parte dos conceitos de diversidade não possui rigor, desenvolvimento teórico e especificidade histórica. Por possuir conteúdo extraído apenas do trabalho de profissionais nas organizações, a elaboração de conceitos mais complexos é limitada, restando apenas definições rasas que, quando não são excessivamente amplas, são muito restritas (NKOMO; COX, 1999; NÓBREGA; SANTOS; JESUS, 2014). A diversidade, seguindo uma vertente conceitual mais restrita, pode ser identificada por atributos humanos, como gênero, classe social, raça, etnia, cultura, idade, orientação sexual, estilo de vida e religião (TRIANDIS, 2003), fatores estes que fragmentam a sociedade. Essa fragmentação converte-se em um movimento social, caracterizado por Fleury (2000) como minoria. Em contrapartida, as definições amplas de diversidade englobam atributos de diferenciação entre indivíduos de maneira mais abrangente, como história pessoal e corporativa, formação, personalidade, estilo de vida, preferência sexual, idade, origem geográfica, status, etc. (NKOMO; COX, 1999). Na tentativa de contrabalancear as duas vertentes de diversidade, Nkomo e Cox (1999) definiram o conceito de diversidade como intrínseco ao conceito de identidade, compreendendo assim um misto de pessoas com identidades grupais diferentes que compõem o mesmo sistema social. Segundo Nóbrega, Santos e Jesus (2014), diversidade é o resultado de diferentes experiências culturais em um mesmo sistema social. Por sua vez, Tillery e Rutledge (2009) argumentam que diversidade é um termo a ser utilizado para categorizar as diferenças de pensamentos, ações, crenças, valores, necessidades, gênero, cor da pele, raça, idade, nível educacional e outros atributos. Para Roberge (2013), diversidade se refere às diferenças de atributos presentes nos indivíduos, sejam crenças, características demográficas, de personalidade, orientação sexual, saúde física e mental, etc. Pereira e Hanashiro (2007) apresentam três vertentes de pensamento que definem a diversidade: a concepção da diversidade a partir da identidade social (diferenças de um grupo em relação a outro), a partir da identidade pessoal (diferenças entre indivíduos) e a análise de diferenças e similaridades dos indivíduos. As autoras diferenciam ainda características que são imutáveis (raça, sexo, idade) e passíveis de mudança (educação, renda, estado civil). Fleury (2000) define os três aspectos citados por Pereira e Hanashiro (2007) como diversidade cultural, corroborando a definição apresentada por Cox (1993), que defende não

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ser possível compreender o termo diversidade quando este não leva em consideração a cultura dos grupos. Nota-se, portanto, que cada autor traz sua definição adaptada sobre a diversidade, devido às diferenças presentes nas abordagens sobre o tema (PEREIRA; HANASHIRO, 2007). Apresentados os diferentes conceitos de diversidade, o presente trabalho tem por objetivo analisar as ações das organizações atuais perante o tema, identificando a existência ou a ausência de práticas que favoreçam a diversidade de gênero e o contexto de aplicação das mesmas.

2.2 Gestão da diversidade

A movimentação de profissionais da área de gestão no que diz respeito à diversidade fez com que o tema ganhasse notoriedade nos estudos organizacionais, o que tem incentivado pesquisas nesta área (NKOMO; COX, 1999). Administrar a diversidade é o mesmo que planejar e executar sistemas e práticas organizacionais de modo a maximizar suas vantagens potenciais e minimizar suas desvantagens (COX, 1993). O principal objetivo da gestão da diversidade reside na gestão das relações de trabalho, das práticas de emprego e da composição força de trabalho, de maneira a alcançar os melhores talentos dento dos grupos de minoria (FLEURY, 2000). Sempre que for observada em uma organização, a diversidade deve ser gerenciada, de maneira a criar oportunidades iguais, promover a integração, enriquecer a cultura organizacional, estimular a tolerância e propiciar a convivência entre indivíduos diferentes (AGUIAR; SIQUEIRA, 2007). No entanto, a empresa deve possuir capacidade para promover a mudança e dar suporte a suas consequências, sempre considerando a repercussão e a variedade de problemas que as políticas de gestão da diversidade podem gerar, visto que a cultura organizacional pode não estar preparada para apoiar as políticas de diversidade (BOND; PYLE, 1998). Nesse contexto, a capacidade de gerir minorias pode transformar-se em vantagem competitiva para as empresas, visto que a integração entre elas induz à tomada de melhores decisões, ao aumento da produtividade e ao desenvolvimento de novas competências (NÓBREGA; SANTOS; JESUS, 2014; FLEURY, 1999; BOND; PYLE, 1998). Cox (1993) afirma que a diversidade, quando não gerenciada ou negligenciada, pode gerar conflitos entre grupos majoritários e minoritários, visto que a presença da diversidade impacta diretamente na eficácia das organizações (NKOMO; COX, 1999).

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A valorização da diversidade promove um combate ao preconceito e à discriminação ao passo que demonstra a dificuldade de modifica-los, visto que estes se encontram enraizados na cultura dos indivíduos que, ao carregarem esta intolerância para as instituições que trabalham, criam mitos e crenças difíceis de serem desfeitos (AGUIAR; SIQUEIRA, 2007). A cultura organizacional pode ser considerada um fator que impede o sucesso dos programas de gestão da diversidade. Embora a tendência seja acreditar que as novas gerações serão mais tolerantes com a diversidade, estudos revelam que mesmo as gerações mais recentes preferem trabalhar com pessoas parecidas consigo mesmas. Indivíduos que possuem maior tolerância com a diversidade geralmente vivenciaram experiências relacionadas a diferentes culturas (BOND; PYLE, 1998). Embora Pereira e Hanashiro (2007) apontem a escassez de estudos de base metodológica confiável que comprovem a existência de vantagens ou desvantagens da diversidade nas organizações, autores como Fleury (2000), Aguiar e Siqueira (2007), Nóbrega, Santos e Jesus (2014), Nkomo e Cox (1999), Bond e Pyle (1998) e Jackson e Alvarez (1992) destacam que, com a adoção de políticas de gestão adequadas, a diversidade pode se tornar um diferencial para a empresa, ao passo que requer que a equipe abra mão de seus valores individuais e passe a assumir os valores coletivos. Nos Estados Unidos, a inserção de negros e minorias foi iniciada pelo presidente Kennedy em uma tentativa de diminuir a possibilidade de conflitos e revoltas, visto que indivíduos que ocupam posições de poder reconheceram que, de forma a manter seu status quo, deveriam ofertar oportunidades mais equitativas às minorias (BOND; PYLE, 1998). Ao fim da década de 60, foi promulgada pelo governo federal dos Estados Unidos a lei de Ações Afirmativas (AA), com a função de regulamentar a diversidade no corpo de funcionários de empresas que recebiam recursos ou tinham contratos com o governo, assim como balancear a composição da força de trabalho com a presença de mulheres, hispânicos, asiáticos e índios, para alcançar a igualdade de oportunidades de educação e emprego (FLEURY, 2000). Atualmente, os índices de inserção da diversidade na força de trabalho se encontram em crescimento devido à percepção das empresas sobre a relevância do tema, pois se entende que a eficiência da organização aumenta ao passo que as diferenças entre os funcionários são respeitadas. Contudo, os modelos de gestão utilizados para lidar com essa diversidade são diferentes e, em alguns casos, divergentes, pois variam de acordo com a empresa que as aplica. A falta de padronização na aplicação destes modelos de gestão provém da falta de uma

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definição concreta do conceito de diversidade e do fato de os conceitos de igualdade e equidade serem observados sob óticas diferentes em cada organização (PEREIRA; HANASHIRO, 2007; BOND; PYLE, 1998). No Brasil, a diversidade passou a ter um papel representativo nas organizações graças às pressões que as multinacionais norte americanas estavam sofrendo da lei de Ações Afirmativas nos anos 90, repassando essa movimentação em torno do tema para as filiais localizadas no país. Na época, as questões relacionadas a desigualdades raciais e de gênero eram tratadas apenas em discussões políticas alavancadas por movimentos de defesa de negros, mulheres e homossexuais. Essas discussões ocasionavam repercussão nas mídias e nas esferas governamentais, mas não promoviam ações que buscassem reduzir essas desigualdades, além de desconsiderar as consequências dessas desigualdades em âmbito organizacional (FLEURY, 1999; FLEURY, 2000). Ao observar as tendências das discussões sobre diversidade, as organizações iniciaram um processo de definição de medidas para trabalhar internamente o conceito de minorias, estabelecendo diretrizes para políticas de diversidade e suas respectivas práticas adequadas. Neste processo, o primeiro aspecto observado pelas empresas foi a diversidade de gênero, com enfoque na discussão de renovação das políticas de recrutamento de mão de obra feminina, assim como da projeção de carreira (FLEURY, 1999). No entanto, por possuir problemas de fundamentação de conceitos, as políticas de gestão da diversidade geraram efeitos colaterais que se mostraram barreiras para o progresso de uma força de trabalho integrada e efetiva. O aumento da atenção sobre diversidade na força de trabalho suscitava insegurança nos trabalhadores em geral, pois estes se preocupavam com possíveis mudanças de cunho econômico e psicológico, além da expectativa negativa sobre contratar pessoas menos qualificadas, estabelecer programas de cotas e existir discriminação reversa (BOND; PYLE, 1998).

2.3 Diversidade de gênero

O homem, por questões históricas, possui uma posição privilegiada na sociedade devido ao fato de a racionalidade ser uma característica atribuída majoritariamente a este gênero, resultando em oportunidades desiguais e colocando a mulher em posição inferior. Esta situação se estendeu a todas as esferas sociais, inclusive ao mercado de trabalho. Entretanto, a partir da década de 1970, as mulheres seguem conquistando maior espaço na sociedade, o que também inclui as organizações (LIMA, 2009).

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É importante destacar que de acordo com a tradição patriarcal brasileira, a mulher é submetida a uma posição que implica em subordinação (AGUIAR; SIQUEIRA, 2007). Ainda que a mulher tenha dado início à conquista de espaço no mercado de trabalho, a inserção da figura feminina se deu de forma desproporcional, onde mulheres ocupavam cargos que exigem a execução de atividades rotineiras, enquanto homens se concentravam nas áreas mais especializadas e inovadoras (AGUIAR; SIQUEIRA, 2007; BONELLI, 2013). Desta forma, é possível perceber que o mercado teve a função de barrar ou gerar oportunidades de carreira com base na diferença de gênero (BONELLI, 2013). Dados do IBGE (2015) revelam que houve um crescimento significativo da População Economicamente Ativa (PEA) das mulheres na década de 2000, indicando que a inserção da mulher no mercado está evoluindo, mesmo que de forma espaçada. No entanto, a mão de obra feminina ainda é caracterizada por possuir salários inferiores quando comparados aos salários dos homens que ocupam cargos iguais, com mesmo nível de responsabilidade e carga horária. As diferenças de ganho na oferta de trabalho para homens e mulheres são relacionadas com a orientação destas para a família. As organizações associam essa orientação como interferência em horas de trabalho, possíveis interrupções na carreira e no regime de trabalho. A premissa sugere que homens e mulheres são conduzidos a diferentes posições na estrutura organizacional, sendo os homens favorecidos com salários mais lucrativos (BONELLI, 2013). De modo a progredir em sua carreira, a mulher precisa provar constantemente que possui a competência necessária para executar seu trabalho. Para que isso ocorra, muitas vezes elas se comportam como homens, suprimindo emoções para não serem vistas como fracas. Muitas vezes, as mulheres abrem mão do desenvolvimento de suas carreiras devido aos sacrifícios da vida pessoal necessários para alcançar cargos de chefia (AGUIAR; SIQUEIRA, 2007). Informações coletadas pelo Instituto Ethos (2010) na pesquisa “Perfil Social, Racial e de Gênero das 500 Maiores Empresas do Brasil e Suas Ações Afirmativas” apontam que o espaço ocupado pela mulher no mercado de trabalho cresceu progressivamente, mas a representação feminina ainda é relativamente baixa. O estudo classifica os cargos em quatro níveis hierárquicos: executivo, gerência, supervisão e quadro funcional. No quadro funcional, mulheres representam uma parcela de 33,1%, enquanto, no nível executivo, o número cai para 13,7%. A inserção em círculos sociais no meio empresarial também se dá de maneira diferente para homens e mulheres. Tais círculos sociais promovem a integração da força de trabalho assim como favorece decisões corporativas importantes e, na maioria das vezes, as mulheres

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não são incluídas nas atividades sociais. Apesar das políticas de progressão de carreira não estabelecerem regras de promoções com base em gênero, as decisões são subjetivas e, muitas vezes são tomadas por outros homens, privilegiando indivíduos do mesmo gênero (AGUIAR; SIQUEIRA, 2007) por meio do convívio favorecido pelos círculos sociais fora da empresa. Percebe-se que a progressão de carreira nas organizações passa por um afunilamento hierárquico, ao desviar as oportunidades das mulheres na medida em que aumentam suas atribuições (ETHOS, 2010). Mulheres e negros são foco de discriminação não só como força de trabalho nas empresas, mas também como estudantes, consumidores e como integrantes da sociedade (BOND; PYLE, 1998). De acordo com Aguiar e Siqueira (2007), apesar de 48% da força de trabalho da indústria financeira nacional ser composta por mulheres com níveis de formação mais elevados quando comparados aos dos homens, elas são minoria em cargos de chefia. Essa situação é recorrente em virtude do mercado financeiro ser visto como um espaço majoritariamente masculino. Além disso, as mulheres inseridas nesse tipo de organizações relatam discriminações em forma de piadas e brincadeiras, fazendo com que as pessoas que se utilizam desses artifícios não consigam ser culpabilizadas. As licença-maternidade, por exemplo, eram vistas de maneira pejorativa e prejudicavam promoções, enquanto homens que se ausentavam por longos períodos para operar o joelho não eram penalizados (AGUIAR; SIQUEIRA, 2007). Comportamentos de liderança provenientes de homens e mulheres são julgados de maneira diferente mesmo quando são idênticos: estes tendem a favorecer o gênero masculino. Ao agir de maneira intempestiva, o homem é visto como um indivíduo responsável e empenhado com o bem estar da organização. Quando a mesma situação é protagonizada por uma mulher, esta é avaliada como um indivíduo sem controle emocional (LIMA et al., 2013). A autoridade exercida pela mulher possui características diferentes da autoridade masculina. O homem atua sob uma perspectiva mais objetiva e agressiva e por isso considera a postura mais democrática e transparente da mulher uma dificuldade de fazer cumprir sua autoridade, enquanto se trata apenas de uma maneira diferente de exercê-la (LIMA et al., 2013). Deste modo, nota-se que a ascensão feminina é dificultada por uma variação no estilo de liderança num ambiente majoritariamente masculino (ENGEN; LEEDEN; WILLENSEN, 2001). Uma pesquisa realizada por Ryan e Haslam (2005) na Inglaterra indicou que a ascensão na carreira de homens e mulheres se dá de maneiras diferentes. Os pesquisadores buscavam compreender os efeitos da gestão de ambos os gêneros no conselho administrativo

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comparando as performances das organizações antes e depois do início da respectiva gestão. Organizações que apontavam homens para cargos de direção possuíam o preço de suas ações estáveis antes e depois da promoção. Porém, em tempos de crise e baixo preço de ações, as empresas apontavam mulheres para exercer os cargos de direção. Desta forma, percebe-se que as mulheres que assumiram estes cargos de liderança estavam mais expostas a críticas e corriam risco de serem culpabilizadas por futuros resultados negativos, que já estavam presentes desde antes da promoção (RYAN; HASLAM, 2005). De acordo com o evidenciado, mulheres são confrontadas por uma barreira invisível que dificulta a ascensão profissional para cargos de liderança, conhecida como glass ceiling (teto de vidro), enquanto os homens são beneficiados ao alcance de posições gerenciais, promovido pelo glass escalator (escada de vidro). Estudos recentes demonstram que as mulheres estão iniciando o processo de quebra desse “teto de vidro” e alcançando posições de liderança nas organizações. No entanto, assim que estas atingem cargos gerenciais, são colocadas sob um minucioso exame que não costuma ser otimista (RYAN; HASLAM, 2005). A estrutura, composição e características do conselho administrativo são importantes variáveis para determinar a eficácia de seu desempenho nas organizações. Para que isso ocorra, o capital humano do conselho administrativo deve possuir membros com altos níveis de habilidades e atitudes para atribuir vantagem competitiva à organização. Nesse sentido, quando alinhada a eficiência dos processos de gestão, a diversidade pode ser um fator de geração de vantagem competitiva sustentável (KAKABADSE, 2015). 3 ASPECTOS METODOLÓGICOS

A presente pesquisa pode ser classificada como exploratório-descritiva, de caráter qualitativo. As pesquisas exploratórias têm o propósito de desenvolver, elucidar e modificar conceitos e ideias, tendo em vista a formulação de problemas específicos para formular hipóteses em temas pouco estudados. As pesquisas descritivas visam traçar as características de uma população ou fenômeno, assim como estabelecer relações entre variáveis (GIL, 2008). Por fim, a pesquisa qualitativa é aquela que visa analisar de forma aprofundada emoções, valores e subjetividades, aspectos não quantificáveis, mas necessários para a construção da pesquisa social (GOLDENBERG, 2004). Quanto ao método de pesquisa, optou-se pelo estudo de casos múltiplos, visto que este permite o estudo detalhado de um ou poucos objetos, de maneira a permitir conhecer ampla e detalhadamente o objeto de estudo, além de buscar explicar as causas de determinado

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fenômeno em situações complexas que não podem utilizar levantamentos e experimentos (GIL, 2008). A coleta de dados foi realizada por meio de um questionário eletrônico desenvolvido pelo autor a partir da ferramenta Google Forms. Tal questionário foi encaminhado via e-mail ao setor de Gestão de Pessoas de quatro organizações, de setores diferentes, junto a uma apresentação da pesquisa e identificação do pesquisador. Para fins de estudo, a identidade das organizações foi mantida em sigilo; portanto, foram adotados nomes fictícios. O questionário foi estruturado em cinco seções e as informações requisitadas incluíram o perfil básico do indivíduo que respondeu o questionário (cargo ocupado, tempo de empresa, gênero), os procedimentos de recrutamento e seleção, os processos de treinamento e desenvolvimento, políticas de remuneração e mecanismos de promoção de funcionários, sempre com foco na questão do gênero. Os dados coletados são analisados na próxima seção.

4 APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

4.1 Caracterização das organizações e respondentes

A primeira organização a contribuir com esta pesquisa foi a empresa Alfa, organização que opera no setor educacional há mais de 20 anos. A mesma possui sede no Rio Grande do Sul, além de quatro filiais, também localizadas no referido Estado. A empresa considera como seus compromissos institucionais a comunidade e realidade regional, a qualidade universitária, a responsabilidade social e ambiental, a democracia e os direitos humanos. Nesta organização, o questionário foi respondido pela Subcoordenadora de RH, que possui mais de cinco anos de serviços prestados à empresa. Posteriormente, o questionário foi respondido pela empresa Beta, que se caracteriza por ser uma organização atuante no mercado de crédito consignado, com mais de 30 filiais espalhadas em todo o território nacional, possuindo mais de 10 anos de mercado. Na empresa Beta, o questionário foi respondido pela Supervisora de Recrutamento e Seleção, que possui mais de três anos de serviços prestados à empresa. A empresa Gama é uma organização social filiada a uma empresa de grande porte que atua no setor industrial brasileiro. A Gama incentiva e assessora mulheres de baixa renda e baixa escolaridade que vivem em comunidades vulneráveis por todo o território nacional a

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serem empreendedoras. A atuação da referida organização ultrapassa 10 anos e possui dois projetos em andamento, com foco em assessoria nas áreas de alimentação e lavanderia. A empresa Gama capta mulheres que estejam interessadas em abrir o próprio negócio e que atendem o perfil econômico supracitado, ensinam a estas técnicas administrativas, fazem

doações

de

materiais

e

equipamentos

necessários ao

funcionamento

do

empreendimento e realizam um acompanhamento para ajudar no planejamento do negócio. Esta organização teve o questionário respondido pela Analista de Recursos Humanos, que possui mais de cinco anos de serviços prestados a empresa. A última organização a colaborar com a pesquisa foi a empresa Delta, indústria multinacional com sede na Índia que opera há quase 60 anos no mercado, com aproximadamente vinte mil funcionários no mundo todo. A Delta considera como seus valores a integridade, a paixão, o comprometimento, a presteza e o trabalho em equipe. Na empresa Delta, o questionário foi respondido pela Analista de Recursos Humanos Júnior, que possui menos de um ano de serviços prestados a empresa.

4.2 Recrutamento e seleção

De maneira geral, o processo de recrutamento e seleção das quatro empresas entrevistadas é realizado por meio da divulgação das vagas pelos canais de comunicação que mais atendem o perfil e as necessidades de contratação de cada empresa. No que se refere à inserção de minorias no quadro de funcionários, as empresas Alfa e Delta disseram possuir apenas políticas de inserção para pessoas com deficiência que, no Brasil, são obrigatórias por lei. As empresas Beta e Gama não se posicionaram nesse aspecto. A empresa Alfa relatou que, em cargos de vigilância e atividades de manutenção, a maioria dos candidatos é do gênero masculino. Essa informação se assemelha com o retorno dado pela empresa Delta que, por se situar no ramo industrial, possui maior número de candidatos homens para ocupar cargos como mecânicos, auxiliares e demais funções que exijam maior força física. A empresa Beta declarou não ter cargos com candidatos predominantemente masculinos e alegou que no setor comercial da empresa existem mais mulheres que homens. A empresa Gama negou a existência de cargos que possuam maior quantidade de candidatos homens. Ao serem perguntadas sobre a existência de práticas que garantam oportunidades iguais a todos os candidatos, as quatro empresas se posicionaram de maneira similar ao dizer que, na fase de recrutamento e seleção, não há parcialidade na escolha dos candidatos aptos a

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ocupar o cargo com base em gênero ou nenhum outro grupo de minorias. As empresas Beta e Gama dão enfoque nas competências dos candidatos e mencionaram que o conjunto dessas competências é o único critério que torna um candidato apto a preencher alguma vaga dentro da organização. De maneira análoga, a empresa Delta diz buscar candidatos mais próximos ao perfil desejado pela empresa.

4.3 Treinamento e desenvolvimento

Os processos de treinamento e desenvolvimento seguem a mesma lógica nas quatro empresas, mas suas respectivas operacionalizações se dão de forma diferente. A empresa Alfa treina e desenvolve seus funcionários por meio de uma matriz de capacitação que possui cronograma de funcionamento de um ano e engloba capacidades institucionais, técnicas e comportamentais. A empresa Beta treina seus funcionários desde o primeiro dia de trabalho por meio de uma plataforma virtual, o que possibilita que o treinamento seja feito à distância. Além disso, a Beta possui avaliação de desempenho 360º com frequência semestral. Ainda sobre processos de treinamento e desenvolvimento, a empresa Gama contrata empresas terceirizadas para treinar seus funcionários com a justificativa de que é uma empresa com poucos funcionários. Já a Delta promove a integração dos novos membros da empresa para que eles conheçam outros funcionários e as instalações da mesma durante a primeira semana. Posteriormente, a empresa treina o indivíduo para o cargo específico que este irá ocupar, havendo a possibilidade de renovação dos treinamentos em intervalos préestabelecidos pela gerência. De acordo com a empresa Alfa, qualquer um de seus funcionários está apto a participar de seu programa de capacitação, exceto quando há a necessidade desenvolver um treinamento personalizado para um público-alvo específico. A empresa Beta treina todos os novos funcionários e só se preocupa em dar treinamentos aos funcionários antigos quando estes são promovidos ou possuem sua responsabilidade de trabalho aumentada. A empresa Gama avalia regularmente sua equipe e treina todo funcionário que, por meio dessa avaliação, possuir falha na execução do serviço, falta de conhecimentos e/ou habilidades. A empresa Delta treina seus funcionários regularmente pois, devido à natureza de seu negócio, precisa que seus funcionários, por questões de segurança, mantenham seus certificados de treinamento com data de validade em dia. Outras áreas são treinadas de acordo com a necessidade percebida pelos gestores da empresa.

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As oportunidades de desenvolvimento dos funcionários, segundo a empresa Alfa, se dá de forma igualitária. A empresa Beta alinha suas oportunidades de desenvolvimento apenas com os resultados individuais apresentados. Na realidade apresentada pela empresa Gama, o desenvolvimento dos funcionários depende do orçamento disponível e da necessidade do cargo. Já a Delta se preocupa em divulgar suas oportunidades de desenvolvimento para todos os funcionários já contratados antes de se empenhar na divulgação das vagas no ambiente externo. A referida empresa permite que os funcionários se candidatem e escolhe aquele que ela considera mais apto, exceto quando nenhum funcionário da empresa atenda as especificidades do cargo e ela tenha que captar um funcionário externamente. Embora as empresas tentem promover uma imagem de igualdade neste aspecto, nenhuma das quatro organizações possui treinamentos ou ações afirmativas que preparem mulheres para assumir cargos de liderança, visto que, em pelo menos duas delas, há predominância de funcionários homens. As respondentes das empresas Beta, Gama e Delta concordaram que a existência de um preparo para a liderança da mulher seria válida e traria benefícios para a gestão da empresa. Em especial, a respondente da empresa Delta revelou que, na realidade de sua empresa, esse tipo de treinamento seria fundamental, visto que a cultura organizacional possui traços da cultura indiana, que privilegia homens em detrimento de mulheres. Foi informado pela respondente que mulheres em posições de gerência não são bem aceitas e, por isso, o treinamento deveria ser aplicado não somente à mulher, mas a todos os funcionários da empresa, para que estes respeitem a liderança da mulher.

4.4 Remuneração e suporte organizacional

A empresa Alfa afirma utilizar, atrelada à remuneração, um plano de carreira que apresenta variações nos salários de funcionários que ocupam o mesmo nível hierárquico, ou seja, funcionários com as mesmas atribuições podem receber salários diferentes, de acordo com seu desempenho. Ao ser questionada sobre a existência de medidas corretivas para evitar possíveis distorções nos salários de homens e mulheres devido às gradações salariais já mencionadas, a empresa Alfa garante que existe equiparação salarial em termos de gênero. A empresa Beta afirma haver mesma remuneração para todos os funcionários que atuam no mesmo nível hierárquico. Além do salário fixo, a empresa recompensa seus funcionários do setor de suporte com premiações anuais e garante ao setor comercial comissão de vendas e premiações.

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A empresa Gama não especifica qual é a política salarial adotada, apenas garante seguir a referência mercadológica para definir valores de remuneração. Os salários no mesmo nível hierárquico possuem diferenças com base em critérios como tempo no cargo, anos de serviços prestados à empresa e desempenho no cargo. A empresa afirma não haver distorções entre salários de homens e mulheres. A empresa Delta também adota salários diferenciados para funcionários que ocupam cargos no mesmo nível hierárquico. No entanto, está passando por uma reestruturação de cargos e suas respectivas atribuições e, por conseguinte, os salários serão alterados. A organização está em busca de padronização, de maneira a estabelecer uma faixa salarial fixa ao invés de acordar com cada funcionário qual será seu respectivo salário. Analisando os dados obtidos, percebe-se que, com exceção da empresa Beta, as demais adotam como prática a remuneração diferenciada de indivíduos que se encontram no mesmo nível hierárquico, com base em critérios definidos, tais como desempenho apresentado no cargo. E essa diferenciação, apesar de apresentar como vantagem a possibilidade de remunerar melhor os funcionários que apresentam maior desempenho, independente do cargo, pode acarretar distorções salariais relacionadas ao gênero dos indivíduos, caso haja uma percepção mais ou menos compartilhada pelos gestores e implícita na cultura organizacional de que os homens tendem a apresentar resultados mais sólidos no trabalho em comparação às mulheres nos mesmos cargos. Sendo assim, é plausível considerar que as organizações estudadas, ao ignorarem a existência de possíveis distorções em sua política salarial no que tangencia a questão do gênero, possam estar reforçando a manutenção do status quo apontado pelas pesquisas de Lima, Gerbelli e Oliveira (2015) e da Actionaid (2015), que constataram desigualdades salariais severas entre os gêneros. As políticas de flexibilização de jornada de trabalho são estabelecidas por meio de banco de horas na empresa Alfa e por negociação informal com o superior imediato na empresa Gama. Os objetivos pelos quais essa política é adotada não estão claros para as respondentes de nenhuma das duas empresas; portanto, estas não souberam responder se tal flexibilização visava permitir que as mulheres com filhos pequenos se mantivessem no mercado de trabalho. As duas empresas supramencionadas possuem também auxílio-creche, que se caracteriza como um benefício facilitador para mães que trabalham nas empresas, de modo a fomentar a existência de uma estrutura de apoio para que as mulheres consigam exercer suas funções dentro da empresa.

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Já as empresas Beta e Delta não possuem políticas de flexibilização da jornada de trabalho, assim como não possuem estrutura de atendimento a filhos dos funcionários. A não existência destas políticas implica em falta de suporte para mulheres que possuem filhos e trabalham na empresa, que podem ter suas respectivas capacidades laborais limitadas pela demanda dos filhos em tenra idade. Além disso, ao ignorar a importância dessa estrutura de suporte, as empresas entram em conflito com seus respectivos posicionamentos, que dizem garantir oportunidades iguais para seus funcionários.

4.5 Promoção

O processo de promoção utilizado pela empresa Alfa funciona a partir de políticas de sucessão, e os critérios que tornam um funcionário apto a concorrer a uma promoção são basicamente avaliações de desenvolvimento e avaliação do gestor/superior imediato. Na empresa Beta, o processo de promoção dos funcionários está sendo alterado e, desde o início do ano de 2016, os funcionários que obtiverem bons resultados nos quesitos alcance de metas, avaliação de desempenho e tempo de serviço, serão analisados pelo comitê de aprovação composto por membros da diretoria da empresa e terão a oportunidade de possuir uma franquia do negócio. Como a Gama é uma empresa com poucos funcionários, as promoções são oferecidas àqueles que possuem um desempenho elevado em relação ao restante dos funcionários. Já na empresa Delta, devido às adaptações que estão sendo feitas na estrutura de cargos, as promoções atualmente são aleatórias, de acordo com critérios pouco claros. Quando surge uma vaga em um cargo superior, existem duas possibilidades: os funcionários de cargos menores passam por um processo de seleção ou o gestor seleciona um determinado funcionário sem haver processo seletivo. A escolha do gestor sem a imparcialidade de um processo seletivo que seja capaz de checar as competências e habilidades do melhor funcionário para ocupar o cargo geralmente envolvem favoritismo, que vai contra a igualdade de oportunidades que a empresa busca promover. Em conformidade com as respostas relacionadas ao processo de recrutamento e seleção, as empresas Alfa e Delta possuem setores nos quais há mais funcionários homens em cargos de chefia, em detrimento das mulheres. Os setores de predominância de indivíduos do sexo masculino na empresa Alfa são os setores de tecnologia da informação, manutenção e vigilância. Já na empresa Delta, todos os setores da organização possuem predominância de homens trabalhando.

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A respondente da empresa Delta explicou ainda que, devido ao ramo de atuação da mesma, há maior demanda por profissionais formados em áreas historicamente ocupadas por homens, como técnicos e mecânicos. Adicionalmente, os cargos estratégicos são, em sua maioria, ocupados por homens, devido a ascendência indiana e a dificuldade de aceitação da liderança feminina inserida por essa cultura. Nos programas de desenvolvimento gerencial, que buscam preparar futuras lideranças, as empresas Beta e Delta afirmam haver maior proporção de homens inscritos, enquanto as empresas Gama e Delta afirmam que, nas políticas operacionalizadas pelas respectivas áreas de recursos humanos, mulheres não são preparadas para cargos de chefia na mesma proporção que homens. Nenhuma das quatro empresas possui ações afirmativas que busquem tornar iguais as oportunidades de promoção para homens e mulheres. Nota-se, portanto, uma discrepância nas entrevistas concedidas pelas empresas, pois, ao mesmo tempo em que estas declaram promover a igualdade, fornecem evidências de que ignoram as situações de desigualdade de oportunidades para as mulheres em suas respectivas organizações. A respondente da empresa Delta revelou que, atualmente, não existem mulheres liderando equipes nas áreas operacionais; as mesmas se atêm a gestão de áreas como Recursos Humanos e Finanças, consideradas na organização áreas de menor dificuldade técnica. Assim sendo, percebe-se a dificuldade de as empresas lidarem com a desigualdade de gênero no âmbito organizacional, visto que negam a existência de tal fenômeno e, por conseguinte, ignoram a necessidade de criação de políticas para diminuir essas distorções. Mesmo com vários estudos apontando a diversidade nas organizações como fator positivo para a empresa, os dados parecem sinalizar que as organizações preferem manteremse indiferentes quanto ao problema do tratamento desigual destinado a homens e mulheres.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realidade das mulheres nas organizações é um retrato de sua vida na sociedade. Não importa o meio em que estejam inseridas, suas habilidades continuam sendo consideradas inferiores quando comparadas às habilidades dos homens. Muitas vezes, a mulher que escolhe investir em sua carreira profissional enfrenta dupla jornada de trabalho (devido à responsabilidade quase que exclusiva pelos afazeres domésticos) e enfrenta uma série de obstáculos para realizar suas funções dentro das organizações, devido a preconceitos diversos. As empresas ignoram a realidade: as mulheres estudam mais comparativamente aos homens e, mesmo assim, possuem uma remuneração menor. Agravando essa situação, as

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mulheres se veem obrigadas a lidar com uma competição acirrada e desleal no mercado de trabalho pois, além enfrentarem outros profissionais, sofrem preconceito e discriminação (AGUIAR; SIQUEIRA, 2007). Partindo do pressuposto de que esses preconceitos tendem a se fazer presentes nas práticas de gestão de pessoas nas organizações, delimitou-se como objetivo geral desta pesquisa analisar essas práticas, sob a ótica da desigualdade de oportunidades entre homens e mulheres. De acordo com os resultados apresentados, ficou evidenciado que as empresas ignoram a possibilidade de que haja desigualdade de gêneros em suas políticas de pessoal e não fazem esforços significativos para alterar tal situação, mesmo que pesquisas indiquem que a diversidade de gêneros traz benefícios para as organizações. Para reforçar essa constatação, resgata-se o fato de que duas dentre as quatro empresas analisadas não oferecem nenhum tipo de suporte para mulheres que possuem filhos (flexibilização da jornada de trabalho e auxílio-creche ou creche na empresa), o que faz com que muitas desistam da carreira e abandonem seus empregos, devido à falta de condições de conciliar demandas familiares e profissionais. Para diminuir a desigualdade de gênero, as organizações devem adotar condições que tratem homens e mulheres com equidade, ou seja, tratar os iguais de maneira igual e os diferentes na medida de suas diferenças. Para que a mulher tenha condições de permanecer no mercado de trabalho, as organizações devem fomentar políticas atreladas à flexibilização da jornada de trabalho, o que inclui jornadas reduzidas, horários flexíveis e homeworking. Além disso, benefícios como o auxílio-creche (ou mesmo manter uma creche na sede da empresa) precisam ser incorporados aos pacotes remuneratórios dos funcionários. Também se faz necessário promover uma mudança cultural, que estimule os homens a compartilharem a responsabilidade pelos afazeres domésticos e criação/educação dos filhos, de maneira que nenhum seja prejudicado em sua vida profissional. Por isso, a flexibilização da jornada de trabalho deve igualmente ser estendida aos indivíduos do gênero masculino. Em todas as organizações estudadas, a presença de mulheres em cargos de liderança é quase inexpressiva, fator que pode ser explicado ao se observar a predominância de homens inscritos nos programas de desenvolvimento gerencial. Tal dado vem ao encontro das pesquisas do Instituto Ethos (2010), que concluíram que há notável desproporção entre homens e mulheres nos níveis hierárquicos organizacionais mais elevados, apontando grande diminuição na quantidade de mulheres que, de cargos funcionais, passam a ocupar cargos executivos.

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De maneira a transmitir uma mensagem de equidade, é importante que as organizações adotem medidas que aumentem a proporção de mulheres a serem preparadas para cargos gerenciais. A criação e aplicação de ações afirmativas nesses aspectos tende a auxiliar no combate à cultura predominantemente machista que vigora em muitas organizações, que favorece a criação de estigmas sociais tanto para homens quanto para mulheres. No que diz respeito a salários, é necessário adequar as práticas de remuneração com base no que a gestão de pessoas traz de inovação, à medida que há parâmetros como competências ou habilidades que podem determinar o salário de um indivíduo de maneira mais justa e criteriosa. Ao se utilizar das inovações nos estudos da ciência administrativa, é possível evitar distorções de salários entre gêneros e promover um ambiente de trabalho mais integrado e cooperativo. A contribuição deste trabalho reside na identificação de alguns gargalos nas práticas de gestão de pessoas adotadas pelas organizações modernas, no que diz respeito à questão da diversidade de gênero. Espera-se, com isso, que esta pesquisa auxilie gestores na redefinição de políticas organizacionais relacionadas à flexibilização da jornada de trabalho, remuneração e carreiras, tornando o ambiente corporativo mais equânime para homens e mulheres. Como sugestão para pesquisas futuras, recomenda-se utilizar entrevistas em profundidade com mulheres que ocupam cargos de liderança de maneira a mapear as dificuldades enfrentadas em suas trajetórias profissionais, assim como na execução de suas funções enquanto gestoras.

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