Uma caixa de diapositivos: recurso didático em dois tempos

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UMA CAIXA DE DIAPOSITIVOS: RECURSO DIDÁTICO EM DOIS TEMPOS Daniela Domingos1; Nuno Martins Ferreira1,2; Ana Teodoro1,2; Laurence Vohlgemuth1,2 Escola Superior de Educação – Instituto Politécnico de Lisboa; 2Centro Interdisciplinar de Estudos Educacionais

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Modalidade da apresentação: Comunicação oral

Resumo A Escola Superior de Educação de Lisboa é depositária de um importante acervo de instrumentos científicos e didáticos correspondentes a várias épocas, em relação ao qual iniciou um projeto de musealização. Este projeto adota como metodologia de trabalho o modelo de Winterthur modificado e é desenvolvido por estudantes e professores numa perspetiva formativa. A divulgação e o conhecimento desse acervo abrem interessantes perspetivas didáticas: desde contribuir para elevar a cultura – geral, científica e didática – dos estudantes, à tomada de consciência das potencialidades de um objeto com potencial museológico enquanto instrumento de formação e ensino. Neste trabalho apresenta-se um estudo de caso: a investigação em curso, seguindo a citada metodologia, sobre uma das peças que faz supor a persistência ao longo do tempo do uso de imagens projetadas como recurso didático. A peça em estudo é uma caixa de 100 diapositivos para lanterna mágica, da firma Les Fils d’Emile Deyrolle. Algumas das questões discutidas e para as quais se avançam hipóteses e respostas são: Quando chegou a Portugal? Quem a encomendou? Que intenções estariam subjacentes à escolha e aquisição dos diapositivos? Em que circunstâncias terão sido usados? Simultaneamente, discute-se o modo como a abordagem seguida nesta investigação possibilita aprendizagens e o desenvolvimento de competências relevantes para a formação de professores e para um entendimento das relações entre cultura, educação e ciência. Para isso analisam-se dados recolhidos através de uma entrevista semiestrututrada à estudante que investigou a peça indicada. Palavras-chave: história da didática, lanterna mágica, diapositivos, formação de professores

Abstract Escola Superior de Educação de Lisboa holds a relevant collection of scientific and didactic instruments, from a diversity of periods, and has already began a museology project upon those objects. The project adopts the modified Winthertur model for museology research of scientific instruments and is undertaken by students and professors, aiming to provide several learning experiences. The knowledge about the collection and its communication provide interesting didactic experiences: from contributing to improve students’ culture – general, scientific and didactic –, to making students aware of the possibilities of using a potential museum piece as a teaching and training resource.

The current work is a case-study in which it is presented the undergoing research upon one of the pieces which raises the supposition of a continuum in the use of projected images as a teaching strategy. This piece is a box of 100 magic lantern slides, from the company Les Fils d’Emile Deyrolle. When did these items arrive in Portugal? Who ordered them? What were the underlying purposes when the slides were chosen and acquired? In what circumstances could the slides have been used? These are some of the questions that are discussed and tentatively answered. Concomitantly, it is analysed how the research methodology contributes to the learning outcomes and the development of competences deemed important for teachers’ training and for a better understanding of the connections between culture, education and science. To attain this goal, an interview to the student performing the research is conducted and the collected data analysed. Keywords: history of didactics, magic lantern, slides, teachers’ training

INTRODUÇÃO A formação de professores/educadores para os primeiros anos de escolaridade estabeleceu-se de forma continuada com a entrada em funcionamento da Escola Normal para o sexo masculino em 1862 e quatro anos depois da sua congénere para o sexo feminino (Mogarro & Zaia, 2009). A Escola Superior de Educação de Lisboa (ESELx) é herdeira de várias instituições, nomeadamente as que ocuparam o atual edifício: Escola Normal Primária de Lisboa (1918), Escola do Magistério Primário (1930) e a BibliotecaMuseu do Ensino Primário (1933). Consequentemente, a ESELx encontra-se na posse de um diversificado acervo de instrumentos didáticos e científicos, de várias épocas, relativamente aos quais iniciou um projeto de musealização. Este projeto visa, através do trabalho de professores e estudantes, a preservação do acervo, a reflexão conjunta sobre a história da formação de professores e a aquisição, pelos estudantes, de conhecimentos e competências que possam contribuir para o seu futuro desempenho profissional nas áreas de formação da Escola. Desde 2011 que se trabalha nesse acervo, visando a sua preservação e a criação de uma coleção visitável. 1. Primeiro tempo 1.1. Musealização de instrumentos O projeto de musealização dos instrumentos didáticos e científicos do acervo da ESELx inscreve-se, em termos teóricos, no quadro mais geral da assunção da importância da cultura material da ciência e na fronteira da História da Ciência com a História da Educação (Covelo et al, 2012). Segundo Brenni (2010), os instrumentos científicos podem ser classificados em instrumentos usados na investigação, na indústria e no ensino. Estes últimos instrumentos didáticos - derivaram grandemente de instrumentos usados inicialmente na investigação.

Como metodologia, fazemos uso do modelo de Winterthur de Fleming (1974), na versão desenvolvida por Anderson, Frappier, Neswald e Trim (2011), no qual o instrumento é sujeitado a quatro operações analíticas baseadas em propriedades respetivas como a sua história; material de que é feito e técnicas de construção; o design; e a função (explícita ou implícita). As operações analíticas são: i) estabelecer essas propriedades através do estudo do objeto e de documentação que lhe diga respeito; ii) avaliar o objeto considerando decisões de acabamento, estética e fabrico; iii) fazer a análise cultural que inclui as funções e usos do objeto (uso, significado e o que comunica acerca do fabricante e utilizadores anteriores) e iv) estabelecer a relevância e significado do artefacto para o tempo e cultura presentes. No entanto, Anderson et al. (2011) sustentam que o desenvolvimento da destreza sensorial exigida pelo objeto, a par com o desenvolvimento dos aspetos cognitivos, aquando da aplicação daquelas operações analíticas, deve ser transversal a todo o processo. A olhos não treinados, uma vez tendo identificado um objeto, facilmente escapam pormenores que poderão ser relevantes. Estes autores recomendam ainda o uso de estudos comparativos, utilizando instrumentos do mesmo tipo, categoria, etc., encontrados no mesmo lugar ou fazendo uso dos cada vez mais abundantes sítios eletrónicos nos quais os museus disponibilizam digitalmente as suas coleções. As referidas operações analíticas são realizadas por estudantes, sob supervisão dos professores, visando completar a ficha de inventário de cada peça em estudo. Esta ficha permitirá registar as propriedades básicas do artefacto, bem como o resultado das operações analíticas subsequentes, contemplando campos para inclusão da avaliação do objeto, da análise cultural e da interpretação da importância atual e para os registos imagéticos que os estudantes realizam. 1.2. Caixa de diapositivos Entre as cerca de 450 peças já listadas encontram-se instrumentos usados na investigação e/ou no ensino. Várias peças evidenciam uma intenção de utilização de imagens projetadas com fins pedagógicos. É o caso da caixa de madeira com diapositivos que é objeto desta comunicação. A caixa em questão tem pega em metal, duas fechaduras e duas dobradiças em metal, pesa 1,569 kg e mede 22,9 cm de largura, 41,5 cm de comprimento e 12,0 cm de altura. No interior da tampa lê-se num emblema de metal: Mobilier et materiel pour L’enseignement. Les Fils D’ Emile Deyrolle. 46, Rue du Bac. Paris. Na caixa encontram-se 100 diapositivos de vidro dispostos em duas filas. Os diapositivos correspondem a três grandes áreas: pessoas e grupos humanos; botânica e zoologia; esculturas/monumentos/cidades. A inventariação da caixa e dos diapositivos levantou algumas questões, como as seguintes: o conjunto foi fabricado pela casa Deyrolle?; a que período

corresponde a fabricação, comercialização e utilização pedagógica destes diapositivos?; Qual a instituição em Portugal que a encomendou? Existem evidências de diapositivos semelhantes comercializados e utilizados em instituições de ensino nas primeiras décadas do século XX. Além disso, a diversidade dos temas observados nos diapositivos faz pressupor uma intenção pedagógica na sua aquisição.

Figura 1. Caixa de diapositivos.

Figura 2. Exemplo de um diapositivo.

2. Segundo tempo Atendendo ao valor formativo das tarefas de inventariação, pesquisa documental e valorização dos instrumentos, pretende-se com este projeto o desenvolvimento de aprendizagens pelos estudantes. De facto, considera-se uma das mais-valias resultante do envolvimento no projeto a multiplicidade das aprendizagens em domínios como as Ciências Naturais, a História da Ciência, a Didática das Ciências ou do Estudo do Meio. Outra mais-valia é a compreensão das potencialidades que um espaço museológico pode ter enquanto instrumento de formação e ensino, em contextos formais e não formais. Nesta segunda parte do artigo pretende-se analisar as aprendizagens realizadas pelos estudantes e a sua relevância no âmbito da formação de professores. Queremos verificar se este ambiente de aprendizagem - uma atividade extra-curricular de uma instituição superior de formação de agentes educativos -, potencia o desenvolvimento de competências consideradas básicas e essenciais para todos os cidadãos no século XXI (Cachapuz, Sá-Chaves e Paixão, 2002), como: “Aprender a aprender”, “Comunicar adequadamente”, “Cidadania ativa”, “Espírito crítico” e “Resolver situações problemáticas e conflitos”. Queremos aferir igualmente o desenvolvimento de competências profissionais específicas dos docentes (Perrenoud, 1999), por uma estudante em formação profissional para a docência e que está envolvida no estudo da caixa de diapositivos.

Os dados analisados resultaram de uma entrevista biográfica, semiestruturada e individual, focada nas experiências vividas pela estudante apontada e na explicitação dos processos desenvolvidos. A categorização temática dimana dos quadros teóricos referidos bem como do discurso da estudante.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS Anderson, K., Frappier, M. Neswald, E. & Trim, H. (2011) Reading instruments: Objects, text and museums. Science & Education doi: 10.1007/s11191-011-9391-y online first. Brenni, P. (2010). The evolution of teaching instruments and their use between 1800 and 1930. Science & Education doi: 10.1007/s11191-010-9326-z Cachapuz, A., Sá-Chaves, I. e Paixão, F. (2002). Relatório do estudo "Saberes básicos de todos os cidadãos no século XXI". Conselho Nacional de Educação. Acedido a 25 de março de 2015, em http://tinyurl.com/qxe8lmr Covelo, R., Maurício, P., Pessoa, S. C., Ramos, M., Santos, A. M., Teodoro, A., Vohlgemuth, L. (2012). Os instrumentos científicos e didáticos do acervo da Escola Superior de Educação de Lisboa na transição entre a monarquia e a república – um projecto de musealização. In M.J. Mogarro & M.T.S. Cunha (orgs.) (2012), Rituais, Espaços & Patrimónios Escolares. IX Congresso Luso Brasileiro de História da Educação (Atas). Lisboa: Instituto de Educação da Universidade de Lisboa. Mogarro, M. J. & Zaia, I. B. (2009). Do Palácio ao Calvário – Escolas de formação de professores em Portugal no século XIX. In J. Pintassilgo & L. Serrazina (Eds.), A Escola Normal de Lisboa e a formação de professores: Arquivo, história e memória (pp. 41- 60). Lisboa: Colibri. Perrenoud, Ph. (1999) Dix nouvelles compétences pour enseigner. Invitation au voyage. Paris : ESF.

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