Uma execução penal pautada na proteção dos Direitos Humanos

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23/05/2016

Uma execução penal pautada na proteção dos Direitos Humanos

Quinta­feira, 19 de maio de 2016

Uma execução penal pautada na proteção dos Direitos Humanos

José Neto Rossini Torres  Advogado Pouco conhecida é a Convenção Interamericana sobre o Cumprimento de Sentenças Penais no Exterior, que foi pactuada em 1993 na cidade de Manágua, capital da Nicarágua. No Brasil, a Convenção foi inicialmente aprovada com reservas pelo Decreto Legislativo nº 268/01, e só promulgada pelo Decreto 5.919/06. Surge, assim, para o estrangeiro legalmente condenado em outro território nacional, a possibilidade de cumprir a sentença em seu Estado Pátrio, como forma de assegurar a melhor administração da justiça mediante a reabilitação social da pessoa sentenciada. Nesse passo, se torna quase indiscutível que a execução penal é um dos problemas mais sérios ao tratarmos de políticas criminais no mundo, haja vista a dificuldade de efetivar todos os princípios que direcionam esse cumprimento. Um exemplo claro disso é o fato inconteste de que o Executivo não consegue acompanhar minimamente o aumento vertiginoso do encarceramento, principalmente com a escassa estrutura penitenciária atual. O problema é grave, mas questões práticas não justificam a violação de direitos. Deste modo, o Decreto cooperativo visa “conceder à pessoa sentenciada a oportunidade de cumprir a sua pena no país do qual é nacional” [1], sendo uma possibilidade menos danosa. Uma diretriz humanitária, que é a condizente com todo o estudo protetivo da Convenção Interamericana de Direitos Humanos. Em meio a um Ordenamento Magno, que fora construído com bases de um Estado Democrático de Direito em 1988, apenas agora vemos indícios da utilização de um Princípio Humanitário, que vai além da “[...] proscrição das penas cruéis e de qualquer pena que desconsidere o homem como pessoa” [2], e torna­se uma diretriz irradiadora de uma Constituição propositiva para um Estado presente. Logo, o princípio humanitário deve perdurar, assim como o da dignidade da pessoa humana, como influenciador na tomada de decisões. A sua vertente deve restar presente nas cabeças de todos os agentes judicantes, fortalecendo um devido processo penal humanitário. Em recente decisão, a Corte de Cassação da Itália (que seria uma espécie de Supremo Tribunal Federal italiano) concluiu que um estrangeiro, morador de rua, que havia tentado furtar alguns alimentos de um supermercado em Gênova, não cometeu nenhum crime. http://justificando.com/2016/05/19/uma­execucao­penal­pautada­na­protecao­dos­direitos­humanos/

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Uma execução penal pautada na proteção dos Direitos Humanos

A coerente análise feita pela Corte entende que, diante das circunstâncias, o indivíduo estava praticando o ato exclusivamente para saciar sua fome. Condenado em instâncias inferiores a uma pena de 06 meses de prisão, mais 100 (cem) euros de multa, o estrangeiro foi pego com uma lata de salsichas e dois pedaços de queijo, o que equivale a 4 (quatro) euros, algo em torno de R$ 16,00 (dezesseis reais). Essa atuação, portanto, está amparada em um Estado de Necessidade do cidadão, ao passo que a sua dignidade se sobrepôs à proteção ao Direito à propriedade. Desse modo, a Corte italiana segue uma tendência global Humanitária, proclamando Convenções de proteção aos Direitos Humanos e enaltecendo o caráter garantista da norma Constitucional. No Brasil, existem alguns julgados nesse sentido, lembrando que o Estado de Necessidade também é defeso em solo pátrio, constando no art. 24 do Código Penal. Há, porém, posicionamento contrário a essa aplicação “automática” dessa excludente de antijuridicidade. Entendem alguns que, para ser um real Estado de Necessidade, deve restar comprovado o iminente resultado danoso; no caso de fome, por exemplo, deve preexistir prova de que naquele momento a falta do alimento lhe causaria a consequente morte. Posição que não nos parece legítima em um cenário humanitário. Por além desse debate, seria mais proveitosa uma análise com base na “insignificância” do caso. Certo de que, diante das circunstâncias do fato, seria evidente a inexistente ou baixa violação a bem jurídico, concluindo­se pela excludente de tipicidade (inexistência do crime). Quanto à nossa legislação de execução penal, também vislumbramos esse direcionamento humanitário ao reeducando, ao passo que não só engloba o aspecto retributivo da pena, mas sabe que a reinserção social do condenado constitui um dos objetivos fundamentais de uma execução penal Constitucional, de forma que o Estado deve providenciar todos os aparatos para a sua efetivação. Assim, como o foco do Decreto citado, a Legislação brasileira entende (corretamente) que a execução penal humanizada é crucial para o resgate da pessoa humana, que se encontra oculta na pessoa do condenado, oferecendo­o estímulos gratificantes. Para concretizar todo esse ideário, indispensável é a participação da comunidade, como expõe o item 24 da Exposição de Motivos da Lei 7.210/84: “nenhum programa destinado a enfrentar os problemas referentes ao delito, ao delinquente e à pena se completaria sem o indispensável e contínuo apoio comunitário”. [3] Essa aproximação com a sociedade é mais proveitosa em localidades onde os aspectos individuais são comuns, como cultura e educação. Enfim, o cumprimento de pena imposto ao condenado em seu país será mais condizente com o escopo de uma Execução Penal Constitucional, pautada na proteção dos Direitos Humanos, proclamando uma necessária humanização da pena, o que Beccaria já defendia em meados de 1764. Pontos esses que nos inspiram a dizer que, apesar de mansa, há alguma crescente na utilização de teorias humanitárias no cotidiano da máquina penal. Aguardamos ansiosos por mais. José Neto Rossini Torres é Advogado Criminalista. Pós­Graduando em Direito Penal e Processual Penal pela Escola Paulista de Direito – EPD. Membro da Comissão de Políticas Criminais e Penitenciária da OAB/ES. REFERÊNCIAS 1  Convenção Interamericana sobre o Cumprimento de Sentenças Penais no Exterior. Disponível em: . Acesso em: 19 maio 2016. 2  ASSIS, Rafalel Damaceno de. Do direito humanitário e o princípio da humanidade. Disponível em: . Acesso em: 19 maio 2016.

http://justificando.com/2016/05/19/uma­execucao­penal­pautada­na­protecao­dos­direitos­humanos/

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Uma execução penal pautada na proteção dos Direitos Humanos

3  LEI Nº 7.210, DE 11 DE JULHO DE 1984. Disponível em: . Acesso em: 19 maio 2016.

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