\"Uma Introdução aos Manuscritos do Mar Morto O que são os Manuscritos do Mar Morto?\" (Trans. Hugo Martins)

May 30, 2017 | Autor: Lawrence Schiffman | Categoria: Dead Sea Scrolls (Religion)
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Uma Introdução aos Manuscritos do Mar Morto O que são os Manuscritos do Mar Morto? Por Lawrence H. Schiffman Os Manuscritos do Mar Morto são quase 850 documentos judaicos antigos, a maior parte deles fragmentos, que remontam ao período pré-cristão. Os primeiros sete manuscritos foram descobertos em uma caverna próxima às margens do Mar Morto em 1947. Subsequentemente, entre 1952 e 1956, em outras dez cavernas, foram encontrados mais manuscritos e fragmentos de manuscritos. Esses documentos foram meticulosamente agrupados em 1960, mas, por razões diversas, a maioria dos documentos continuaram não publicados. Após uma campanha pública, liderada pela Biblical Archaeology Review e apoiada por estudiosos dos Manuscritos do Mar Morto do mundo inteiro, a Israel Antiquities Authority reorganizou a equipe editorial em 1991. Como resultado, traduções e edições acadêmicas dos textos restantes foram publicadas e o corpo inteiro dos documentos estão, agora, disponíveis para estudo. Acredita-se, geralmente, que esses manuscritos foram reunidos por uma seita que ocupava as ruínas conhecidas como Khirbet Qumran por volta de 150 A.E.C até 68 D.E.C, quando este lugar, adjacente às cavernas onde os manuscritos foram encontrados, foi destruído pelos romanos durante a Primeira Guerra Judaico-Romana (66-73 D.E.C). A composição dos textos incluída nos manuscritos abrange um longo período de tempo, começando com os mais antigos livros da Bíblia Hebraica. Os escritos não-bíblicos foram compostos entre o terceiro século A.E.C e por volta da guerra. A datação dos manuscritos preservados é dentre o terceiro século A.E.C e os primórdios do primeiro século D.E.C; embora a grande maioria dos manuscritos foram copiados nos primeiros dois séculos A.E.C. Chegou-se, originalmente a esta datação, por meio de estudos da Paleografia (o estudo da história da escrita) e da Arqueologia das ruínas, posteriormente confirmada pela sofisticada datação por Carbono-14.. Portanto, a maioria das composições preservadas nessa antiga biblioteca não foram compostas pelos sectários que habitavam o complexo de cavernas em Qumran. Essa cronologia confirma, também, que os textos são pré-cristãos e não possuem quaisquer referências diretas a Jesus ou a João Batista. Qualquer análise da coleção dos manuscritos depende, de alguma forma, da identidade do povo que reuniu os manuscritos e os colocou nas cavernas de Qumran. Desde os estágios mais prímevos da pesquisa sobre Qumran, determinou-se que os manuscritos, as cavernas e as ruínas estavam correlacionadas. As cavernas preservaram uma estrutura de olaria singular, incluindo um tipo específico de jarro próprio de Qumran, o qual alguns dos manuscritos foram encontrados. Há uma única exceção, um exemplar encontrado próximo a Jericó, que era o centro comercial mais próximo de Qumran. A escavação arqueológica das ruínas, que durou de 1951 a 1956, determinou que a localidade foi ocupada por diversos períodos. Incialmente, este lugar servia como uma fronteira entreposta no período dos reinos do Norte e do Sul, onde ainda se encontra uma cisterna da Idade do Ferro e muros que testificam desse período. Posteriormente, o núcleo do complexo de cavernas parece já ter estado em funcionamento por volta de 150 A.E.C e, tão logo depois, o período da ocupação sectária parece ter começado. Nesse período havia uma imensa sala de jantar comunitária e inúmeras banheiras para

rituais e diversas sepulturas judaicas. Alguma interrupção da ocupação pode ter ocorrido em virtude do terremoto que assolou a Judeia em 31 A.E.C; mas, por outro lado, as instalações continuaram em funcionamento até a destruição do centro pelas mãos dos romanos durante a Primeira Guerra Judaico-Romana, por volta de 68 D.E.C. Como as ruínas desse lugar parecem ter provido o ambiente ideal para um grupo religioso judaico (comumente rotulado de “seita”) e, de semelhante modo, os documentos incluem composições anteriormente desconhecidas de qualquer grupo assim, chegou-se à conclusão que esta seita ocupou o complexo de cavernas de Qumran. Foram eles que colecionaram os rolos da Bíblia, algumas composições contemporâneas e, incluindo a sua própria literatura, esconderam todos esses manuscritos nas cavernas onde foram encontrados dois milênios depois. Os manuscritos podem ser artificialmente divididos em três categorias separadas: (1) aproximadamente um terço do material representa os livros da Bíblia Hebraica, chamada pelos cristãos de Antigo Testamento. Partes de todos os livros da Bíblia Hebraica são encontrados, exceto o Livro de Ester. Enquanto alguns eruditos acreditam que Ester não fazia parte da Bíblia em Qumran, outros veem esta ausência, entre os fragmentos bíblicos de Qumran, como mera coincidência. (2) O segundo grupo é composto de textos apócrifos e pseudoepígrafos, isto é, textos judaicos do período do Segundo Templo que de algum modo estão relacionados com a Bíblia e eram parte da herança literária comum do povo judeu desse tempo. Em alguns casos, esses livros já eram conhecidos em grego, em etíope, ou em outras línguas e os manuscritos de Qumran preservaram o texto na linguagem original; mas, em muitos outros casos, essas eram obras anteriormente desconhecidas. (3) O terceiro tipo de texto são as composições sectárias, aquelas obras compostas e transmitidas dentro do grupo que habitaram as cavernas de Qumran, que colecionaram os rolos e os esconderam nas cavernas nos tempos antigos. Esses textos são os mais importantes para a discussão da identificação da seita. Entretanto, a coleção como um todo deve ser estudada para esclarecer a história do judaísmo da época, sua relação com desenvolvimentos posteriores no judaísmo e com a ascensão do cristianismo. O debate acerca da identidade da seita, de fato, começou antes da descoberta dos manuscritos no deserto da Judeia em 1947. Em 1910, dois fragmentos de manuscritos medievais, de uma obra anteriormente desconhecida, recuperados do Guenizá do Cairo, o armazém da Sinagoga Ben Ezra no antigo Cairo, apareceram na Inglaterra. Esses manuscritos, posteriormente, fariam parte dos Manuscritos do Mar Morto quando dez cópias parciais do mesmo texto, conhecidas como Fragmentos Zadoquitas, foram encontradas nas cavernas de Qumran. A publicação dos Fragmentos Zadoquitas, efetivamente, iniciou o debate acerca da identidade do que viria a ser conhecida como a seita do Mar Morto. Nesse tempo, praticamente todo tipo de teoria já tinha sido sugerido. A seita dos manuscritos foi identificada como os fariseus, saduceus, essênios, cristãos, zelotes e os caraítas medievais. Alguns defenderam, até mesmo, que esses eram documentos de um grupo ainda não conhecido. Com a descoberta dos manuscritos de Qunram em 1947, a maioria dos eruditos concordaram com aqueles que tinham sugerido que a seita dos manuscritos era para ser identificada como os Essênios, um grupo mencionado por Josefo, Filo e outros

escritores antigos. Essa visão continua como a majoritária entre os eruditos dos manuscritos, ainda embora o significado preciso da palavra “Essênio” não esteja certo e nunca ocorre nos Manuscritos do Mar Morto. Recentemente, alguns chegaram à conclusão que a tradição normativa judaica da seita tem sua origem nos saduceus, o que gerou diversas modificações na Teoria dos Essênios. Alguns eruditos, agora, acreditam que, o grupo conhecido como Essênios, originaram-se de uma ala dos Saduceus, rompendo com seus correligionários logo após o término da Revolta Macabeia (168– 164 A.E.C). Outros defendem uma redefinição do termo “Essênio” para designar um tipo de grupo sectário, mas não necessariamente uma seita em particular. Os manuscritos contribuíram muito para esclarecer a condição da Bíblia Hebraica nos dois últimos séculos A.E.C. Os manuscritos proveem uma evidência prímeva do conceito de um cânone bíblico de três partes — Torá, Profetas e Escritos — tal como encontrado na tradição rabínica. Enquanto todos os livros, que são parte deste cânone, foram considerados sagrados pelos sectários (com a possível exceção do Livro de Ester), é bem possível, que eles, também, incluiam o Livro dos Jubileus e uma versão do Testamento de Levi em sua “Bíblia”. Dentro dos livros, também, há evidência de variações textuais. De fato, os sectários toleravam múltiplos textos do mesmo livro, algo que os futuros judeus considerariam como inaceitável. Alguns fragmentos bíblicos demonstram evidência do texto hebraico que foi traduzido em grego, tradução conhecida como Septuaginta. Alguns outros são versões prímevas da Torá Samaritana. A imensa maioria dos textos é de uma variação proto-massorética, apontando em direção aos textos fixados pelos rabinos talmúdicos, ou de um tipo misto que, frequentemente, incluía as formas linguísticas conhecidas das composições do grupo de Qumran. Mesmo que o texto qumranita já estivesse a caminho de uma padronização, por volta do tempo dos textos de Bar Kokhba e dos textos de Masada no primeiro século D.E.C, o texto proto-massorético já estava padronizado. Devemos notar, também, que nenhum texto do Novo Testamento foi encontrado em Qumran. Considerando a história do judaísmo, os manuscritos têm-nos ensinado acerca de uma rica variedade de abordagens em relação a teologia e a lei judaica no segundo e no primeiro século A.E.C. Somado a isso, eles, também, esclareceram a extensão com que a especulação messiânica era, praticamente, a norma para muitos grupos judaicos desse tempo. Eles, indiretamente, derramaram muita luz sobre a história prímeva da tradição rabínica, desde que eles polemizaram tão extensivamente contra a abordagem dos fariseus, os predecessores dos rabinos. Esses argumentos nos mostram que muito do que conhecemos como tradição rabínica na Mishnah, já era a norma vigente entre os fariseus desse período e esta conclusão confirma o valor histórico tanto de Josefo como dos registros rabínicos. Em relação as origens do cristianismo, os manuscritos nos ajudam a entender a natureza das abordagens para com o judaísmo existente quando o cristianismo surgiu. Muito do que, anteriormente, entendíamos como influência estrangeira, são agora compreendidos como “troncos de raízes judaicas”. Além do mais, podemos, agora, entender melhor em que Jesus diferia dos grupos judaicos de seu tempo. Ainda que não haja uma ligação direta entre Jesus e os manuscritos, de fato, existem muitas diferenças substanciais entre os seus ensinos e aqueles da seita de Qumran.

Em suma, os manuscritos abriram um novo capítulo no estudo do judaísmo em um período crucial para o seu desenvolvimento. O estudo desses documentos está, realmente, apenas no início e podemos esperar por conclusões ainda mais importantes conforme procederem as pesquisas. Bibliografia John J. Collins, The Scepter and the Star: The Messiahs of the Dead Sea Scrolls and Other Ancient Literature (New York, 1995). Frank Moore Cross, The Ancient Library of Qumran, 3rd ed. (Sheffield, 1995). Florentino García Martínez, The Dead Sea Scrolls Translated: The Qumran Texts in English (Leiden, 1994). Florentino García Martínez and Julio Trebolle Barrera, The People of the Dead Sea Scrolls: Their Writings, Beliefs and Practices (Leiden, 1995). Lawrence H. Schiffman, The Eschatological Community of the Dead Sea Scrolls: A Study of the Rule of the Congregation, Society for Biblical Literature Monographs 38 (Atlanta, 1989). Lawrence H. Schiffman, The Halakhah at Qumran (Leiden, 1975). Lawrence H. Schiffman, Reclaiming the Dead Sea Scrolls (Philadelphia, 1994). Lawrence H. Schiffman, Sectarian Law in the Dead Sea Scrolls: Courts, Testimony and the Penal Code, Brown Judaic Studies 33 (Chico, CA, 1983). Eugene Ulrich and James VanderKam, eds., The Community of the Renewed Covenant: The Notre Dame Symposium on the Dead Sea Scrolls (Notre Dame, IN, 1994). James C. VanderKam, The Dead Sea Scrolls Today (Grand Rapids, 1994). James C. VanderKam and Peter Flint, The Meaning of the Dead Sea Scrolls: their Significance for Understanding the Bible, Judaism, Jesus and Christianity (San Francisco, 2002). Roland de Vaux, Archaeology and the Dead Sea Scrolls (London, 1973). Geza Vermes, The Dead Sea Scrolls: Qumran in Perspective (Cleveland, 1977). Yigael Yadin, The Temple Scroll: The Hidden Law of the Dead Sea Sect (New York, 1985).

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