UMA PROPOSTA EPISTEMOLÓGICA PARA OS ESTUDOS SOBRE PERTENCIMENTO AFROBRASILEIRO EM COMUNICAÇÃO

July 24, 2017 | Autor: D. de Campos | Categoria: Música, Negritude, Pertenencia a Grupos Identitarios
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UMA PROPOSTA EPISTEMOLÓGICA PARA OS ESTUDOS
SOBRE PERTENCIMENTO AFROBRASILEIRO EM COMUNICAÇÃO

Deivison Moacir Cezar de Campos
RESUMO: Os estudos sobre identidade e pertencimento afrobrasileiro em Comunicação tem sido realizado principalmente a partir da perspectiva da representação. A tese sobre telenovela de Joel Zito Araújo criou um paradigma replicado em outros observáveis, como livros didáticos, filmes, telejornais, publicidade etc. Apesar das abordagens construírem-se, principalmente, a partir dos Estudos Culturais, não atendem ao princípio teórico-político de pesquisa que propõe responder O que está se passando? Um estudo sobre experiência, baseado na perspectiva das materialidades, e a ideia de apropriação, cara aos estudos sobre consumo cultural, articulados com saberes e conceitos afro e africanos, possibilitam novas perspectivas de estudos e um forte tensionamento – requerido por pesquisadores como Nilma Gomes (2010) e Paul Gilroy (2007) – da epistemologia euro-moderna hegemônica. Essa proposta surge num estudo de doutoramento que problematiza o papel da música gravada na construção de pertencimento afrobrasileiro, tendo a roda como síntese do processo. 
PALAVRAS-CHAVE: Afro-brasileiro; música gravada; experiência.

AN EPISTEMOLOGICAL PROPOSAL TO STUDIES
ON AFRICAN-BRAZILIAN BELONGING IN COMMUNICATION

ABSTRACT: Studies about African-Brazilian identity and belonging in Communication has been especially made from the representation perspective. The Joel Zito Araújo thesis about soap opera created a replicated paradigm in other means that may be observed, such as textbooks, movies, television news, advertising, etc. Besides the treatment being especially built from Cultural Studies, they do not reach the theoretical political research principle that propose answer the question What is going on? A study about experience based on materiality perspective and the appropriation idea, costly to studies on cultural consumption, connected to Afro and African knowledge and concepts, enable new studies perspectives and a strong tension – required by researchers such as Nilma Gomes (2010) and Paul Gilroy (2007) – of hegemonic European-Modern Epistemology. This proposal arises in a doctoral degree study which questions the role of music recorded in African-Brazilian belonging built, having the round as synthesis for this process.
KEYWORDS: African-Brazilian; music recorded; experience.

1 O QUE SE PASSA COM O PERTENCIMENTO NEGRO?

O presente texto refere constatações e uma proposição epistemológica para os estudos que relacionam Comunicação e identidade afrobrasiliera, surgidas numa pesquisa de doutorado em andamento. O estudo investiga a reconfiguração da construção do pertencimento afrobrasileiro com o atravessamento do midiático no consumo coletivo de música por jovens negros, a partir da investigação das interações e apropriações ocorridas a partir da presença em festas de black music.
Durante a pesquisa da pesquisa, momento do "revisitar, interessado e reflexivo, as pesquisas já realizadas sobre o tema" (BONIN, 2006, p.31), constatou-se que a identidade e cultura negra no Brasil tem sido pouco abordada em pesquisas de Comunicação por outras perspectivas que não a da representação do negro nas diferentes mídias. Essa abordagem sobre representação do negro, dinamizada na primeira década do século 21 e igualmente crescente na área de Educação, tem como marco o estudo de doutorado de Joel Zito Araújo sobre o negro na telenovela, defendido em 1998 na USP.
Esses estudos textuais cumprem um importante papel na denúncia e desconstrução dos estereótipos. No entanto, não promovem um avanço, ou tensionamento no conhecimento científico, pois utilizam-se sempre os mesmos instrumentos teórico-metodológicos, e social, levando a mesma conclusão: a mídia promove a invisibilidade e, quando representam o negro, predominam os estereótipos.
Se por um lado identifica-se um programa político de denúncia, como referido, por outro esconde-se um preconceito epistemológico contra estudos que não sigam essa tendência, fora das áreas da História, Antropologia e Educação. Não são poucos os relatos de pesquisadores que recebem a recomendação de bancas de seleção a programas de pós-graduação para apresentarem seus trabalhos numa dessas áreas, consideradas tradicionais dos estudos sobre o negro.
Entretanto, a centralidade das mídias e dos processos comunicacionais na cultura contemporânea torna os estudos nessa área estratégicos para se entender e explicar a sociedade. A ampliação e diversificação das abordagens torna-se necessário para a atuação política e construção de uma cidadania plena. Por outro lado, mesmo tendo os Estudos Culturais como referencial das análises de representação, poucas das pesquisas identificados avançam do texto para o vivido, buscando responder a questão política "O que está se passando?" (GROSSBERG, 2013, palestra), nuclear aos estudos dessa vertente. A pesquisa aqui apresentada propõe uma abordagem diferenciada para os estudos sobre cultura afrobrasileira relacionada à Comunicação, indicando um movimento possível em direção ao vivido.
Ao discutir a afetação da construção da identidade afro-brasileira pelo midiático, a pesquisa busca atender a duas provocações teóricas: a busca por indicações de uma síntese da "dialética racial do negro brasileiro" (MOURA, 1994) e a retomada da discussão sobre pertencimento, um dos grandes temas deixados de lado com a globalização (SANTOS, 2000). As questões levam à reflexão sobre o pertencimento para numa perspectiva local e global, respectivamente, projetando a questão numa dimensão espacial, considerando esse um sistema de fixos e fluxos (SANTOS, 1996). Essa relação espacial leva aos estudos sobre diáspora que, para Gilroy (2001), torna-se

um conceito que ativamente perturba a mecânica cultural e histórica do pertencimento. Uma vez que a simples seqüência dos laços explicativos entre lugar, posição e consciência é rompida, o poder fundamental do território [espacial] para determinar a identidade pode também ser rompido (p.158).

Partindo igualmente de uma concepção espacial, Garcia-Canclini (1998, p.309) vai dizer que as "buscas mais radicais sobre o que significa estar entrando e saindo da modernidade são as que assumem as tensões entre desterritorialização e reterritorialização". O pertencimento afro na perspectiva diaspórica do Atlântico Negro (GILROY, 2001), adquire essa configuração hibrida e translocal.
A construção de uma proposição de partida se deu a partir de Glissant (1989 apud GILROY, 2001, p.192), para quem "não é nada novo declarar que, para nós, a música, o gesto e a dança são formas de comunicação, com a mesma importância que o dom do discurso". A referência reforçou a ideia de que, na diáspora africana, a música constituiu-se num importante elemento agregador desde o escravismo. Soma-se a isso, a condição de ser o principal produto cultural negro circulando pelo sistema de mídias na atualidade. Desta forma, buscou-se refletir sobre a relação entre música, experiência estética e Comunicação nas vivências tradicionais e midiáticas.
A definição do tema demandou a construção de uma visada, refletida a partir de Nilma Gomes (in SANTOS; MENESES, 2010) para quem a presença de pesquisadores negros tensiona a ciência euro-moderna dominante na academia, pois "a entrada dos diferentes como produtores de ciência e a chegada de ex-objetos ao mundo da pesquisa acadêmica configuram um novo campo de tensão epistemológica e política" (p.509). Defende também que as formas "de transmissão, construídas por meio da memória, da oralidade, da ancestralidade, da ritualidade, da temporalidade, da corporeidade" (p.510) são determinantes para refletir sobre a produção de conhecimento a partir do universo afro. Gilroy (2001) também evoca, para o estudo das culturas do Atlântico Negro, "um encontro maior com as teorias da cultura e sua integridade territorial e corporal" (p.12).
A opção por observar as festas de black music surgiu pelo fato deste locus congregar os elementos apontados durante a construção do objeto em pesquisa. A música gravada, neste contexto, torna-se médium que circula e relaciona o local (festa) ao global (Atlântico negro). As experiências desencadeadas pela presença, através das interações e performances, relacionam igualmente o tempo da festa com o tempo da tradição. Dessa forma, a tese a ser defendida é que as interações sociais da comunidade negra, realizadas em torno do consumo coletivo de música, que se organizavam tradicionalmente pela estrutura de rodas sagradas ou profanas, foram afetadas pelo midiático. A partir dela, os elementos constitutivos do pertencimento, desterritorializados pelos movimentos de diásporas, antes compartilhados somente pela interação pessoal nas rodas, são difundidos por dispositivos tecno-midiáticos sonoros. Com isso, o consumo coletivo de músicas de matriz afro gravadas possibilita novas formas de interação, a experiência comunicacional.
A perspectiva de consumo de música produzida no Atlântico Negro possibilita pensar a relação entre o local e o global, pois as produções musicais mantêm marcas da cultura local em que são produzidas. As que alcançam uma circulação global voltam a ser consumidas em âmbito local, desencadeando processos de tradução e hibridação, adquirindo, muitas vezes, novos usos e sentidos, matriz da vitalidade das culturas do Atlântico Negro. A ambiência tecno-midiática musical da festa se torna, neste contexto, um território integrado ao circuito de consumo cultural (GÁRCIA-CANCLINI, 2007) da chamada Black music no Atlântico Negro, investigado como um território negro em fluxo.

2 A RODA COMO PONTE ENTRE PRESENÇA E SENTIDO

O consumo coletivo de música é "um pilar central do Atlântico Negro" (COSTA, 2006, p.117). Essa importância da música, no entanto, só pode ser entendida dentro de um contexto em que a comunicação pela palavra tornou-se uma impossibilidade, restando o corpo como meio de manifestação e comunicação. A música, neste contexto, "no és una forma de expressar ideas; és una forma de vivirlas" (FRITH in HALL; GAY, 2003, p.187), reforçando com isso a dimensão de presença.
No espaço acústico (MCLUHAN citado por ELIZONDO; GUERTIN, 2011) das festas de Black music, a roda de dança constitui-se num evento performático (SCHESCHNER, 2012). Geralmente a partir de uma seqüência de funk, participantes reúnem-se em frente ao palco para dançar, formando uma roda. A formação surge espontaneamente, como uma aparição. No centro, um a um, organizados por líderes eventuais, os dançarinos apresentam seus passos. Neste momento, encontram-se duas territorilidades, a midiática [espaço acústico da festa] e a relacional [interações entre indivíduos], ressurgindo o valor de culto (BENJAMIN, 1985) da roda tradicional.
As performances fazem então com que os dançarinos sintam a música "mergulhar em si, envolvendo-a com o ritmo de suas vagas, absorvendo-a em seu fluxo" (BENJAMIN, 1985, p.193). A formação da roda é entendida por alguns DJs como um momento de catarse, no qual muitos dos que estavam dançando sozinhos ou em pequenos grupos param para acompanhar as performances e alguns arriscam passos no centro da roda. A observação da festa aponta que as primeiras danças são realizadas pelos frequentadores mais velhos. Esses estão ligados à tradição recente dos bailes dos anos 70 e 80. Depois disso, a participação em revezamento conta com danças de freqüentadores mais jovens.
A aparição da roda na festa inverte a lógica da roda tradicional, que é formar-se antes do evento musical-performático. A roda constrói na festa uma circularidade simbólica que possibilita a formação de uma territorialidade diferenciada em meio ao espaço acústico da festa. Essa formação possibilita a reterrritorialização do ethos da roda, recompondo a forma tradicional das manifestações musicais de interação e socialização dos negros. Desta forma, pode-se propor hipoteticamente que junto com a gravação da música ocorreu a transposição do ethos da roda para o disco, possibilitando que circule através das gravações pelo Atlântico Negro em substituição aos navegantes que iniciaram esse processo de diálogo entre as populações negras espalhadas no mundo (GILROY, 2001).
A formação da roda tradicional e midiatizada nas manifestações culturais afro no Atlântico Negro remete a uma continuidade da cosmovisão africana. A circularidade é um princípio central nessas culturas, pois é tida como uma metáfora da vida. Ao mesmo tempo, a circularidade representa o movimento e a renovação, considerados necessários à vida, pois "viver é movimentar-se". Pelo fato de todos poderem se enxergar nessa formação, a roda possibilita também que seja compartilhada a "força vital" (CASTINIANO, 2012), que é "a energia que movimenta o universo africano" (OLIVEIRA, 2004), responsável permanente renovação da comunidade. Essa forma de organização possibilita também que todos ocupem posições iguais dentro de uma coletividade, por isso "privilegia a perspectiva relacional" (OLIVEIRA, 2004).
A circularidade também tem relação com a ancestralidade que "leva a um pensamento circular repetitivo que nunca passa exatamente pelo mesmo lugar" (OLIVEIRA, 2004). O tempo, para os africanos, é o tempo dos antepassados e, segundo Mbiti (1969 citado por CASTINIANO, 2012), pode ser compreendido a partir de duas referências: o Sasa, experiência imediata, e o Zamani, que é um passado complexo de longa duração.

Ambos Sasa e Zamani têm qualidade e quantidade. Pessoas referem-se a ele como grandes, pequenos, curtos, longos, etc., em relação a um fenômeno ou evento particular. Sasa liga geralmente os indivíduos ao ambiente imediato. É o período da vida consciente. Por seu lado, Zamani é o período do mito, dando a sensação de fundação, ou 'segurança' para o período do Sasa (p.90).

A roda pode ser entendida, nessa perspectiva, como um evento do Sasa que ganha sentido ao ser inserido no Zamani. Sua aparição provoca uma leitura diferenciada do tempo presente tensionado pela ancestralidade, remetendo à tradição. Por isso, a importância dos mais velhos que tem uma memória mais longa, podendo apresentá-la aos mais jovens. Por possibilitar a presentificação desses conhecimentos, a roda mostra-se como uma permanência das manifestações culturais africanas nas quais, segundo Asúa-Altuna (1985, p.481), as "cerimônias coletivas são os ritos maiores, a mais alta expressão da vida moral, social e intelectual do grupo, a manifestação e o manancial da sua vitalidade".
Essa dualidade constitutiva entre experiência e tradição da cosmovisão africana está expressa na concepção temporal do Sasa e Zamani. No Atlântico Negro, a identidade cultural afro mantém essa dualidade, se compreendida a partir do conceito de dupla consciência, de Du Bois (1996), que propõe uma dicotomia constitutiva de "ser e de não pertencer" (GILROY, 2007, p.103). Por constituir-se num espaço relacional, a roda atende, no tempo da experiência [o Sasa], essa demanda de pertencimento [tradição/Zamani]. Em meio a essas dinâmicas, continuamente atualizadas e hibridizadas, permanecem as manifestações musicais em roda.

3 O EIXO TEÓRICO PARA TRANSPOSIÇÃO DO DISCO À RODA

Gerado nas interações coletivas, propõe-se aqui que o ethos da roda acabou capturado pelo sistema tecno-midiático através do processo de gravação. Desta forma, a transposição da música de matriz afro da roda para o disco faz com que se ampliem as possibilidades de diálogo no Atlântico Negro. Isso porque a musicalidade da roda possuía valor de culto (BENJAMIN, 1985). No processo de gravação, aumenta o valor de exposição e a técnica provoca uma emancipação dos elementos simbólicos que podem, desta maneira, construir espaços acústicos a partir do fluxo comunicacional, neste caso a música. Demanda também uma tradução para adequar-se ao lugar (local).
No espaço acústico da festa, "o objeto artístico [a música] torna-se o medium de uma presentificação de experiências" (GUIMARÃES, 2006, p.16). Ao adotar essa perspectiva, a pesquisa em desenvolvimento insere-se nos estudos que enfocam a experiência estética a partir da interação comunicacional. Essa perspectiva possibilita o deslocamento da experiência frente à obra para as interações que se organizam a partir dela, sendo esse o momento da experiência comunicativa (BRAGA, 2010).
A atenção às interações entre os indivíduos, destes com o ambiente e à corporeidade numa ambiência midiática, aproxima o estudo da noção de experiência de Dewey (2008), para quem "la experiencia es el resultado, el signo y la reconpensa de esta integracción del organismo y el ambiente, que cuando se realiza plenamente es uma tranformacción de la interacción en participacción y comunicacción" (p.26). Seguindo o princípio de continuidade, recusa a separação entre o ideal e a matéria, apontando a necessidade de recobrar a continuidade da experiência estética com os processos normais da vida.
A perspectiva adotada para a tese em desenvolvimento entende que a experiência estética produz efeitos de sentido e de presença (GUMBRECHT, 2010). A experiência adquire, então, a qualidade de estética em função da "combinación de movimiento y culminación, de rompimientos y reuniones" (DEWEY, 2008, p.19), elementos constituintes da experiência afro no Atlântico Negro, reconfigurados a partir da memória e de sobrevivências culturais.
Essa experiência afro, segundo Hall (in HALL; GAY, 2003), é resultado de uma situação diaspórica e mantém como marcas o "proceso de desestabilización, recombinación, hibridización y de cortar y mezclar" (p.311). Essas características, relacionadas à música, têm sido apontadas por Gilroy (2001) na construção do pertencimento negro na diáspora. O autor diz ainda que a auto-identidade, a cultura política e a estética têm sido construídas "por meio de sua música e pelos significados culturais e filosóficos mais amplos que fluem de sua produção, circulação e consumo" (p.208).
A ênfase na presença possibilita pensar a partir da lógica de "apropriação do mundo pelo corpo humano" (GUMBRECHT, 2010, p.60). Vislumbra-se, com isso, "um modelo de performance que pode complementar e deslocar o interesse pela textualidade", requerido por Gilroy (2001, p.93), para análise das culturas do Atlântico Negro. Frith (in HALL; GAY, 2003), nesse sentido, argumenta que

la cuestión no és cómo una determinada obra musical o una interpretación refleja a la gente, sino cómo la produze, cómo crea y construye una experiência – que solo podemos compreender si asumimos una identidad tanto subjetiva como coletiva (p.184).

A relação entre presença (GUMBRECHT, 2010), apreendida na experiência, e sentido (GARCIA-CANCLINI, 2007), cuja leitura demanda da cultura em que a manifestação está inserida e encontra ressonância na dualidade estruturante da identidade afro [dupla consciência] e na cosmovisão africana [Sasa (experiência) e Zamani (tradição)]. Apresentando-se então como síntese dessa aparente contradição entre os estudos das materialidades e os estudos de cultura, a proposição atende a esses elementos constituintes da identidade cultural estudada. Desta forma, numa ambiência musical afro, a dimensão de presença torna-se predominante pelas relações espaço-temporal que possibilita, pelas performances e uso de objetos identitários e, igualmente, ressalta os componentes culturais.

4 (IN)CONCLUSÃO

As proposições teóricas compõem um estudo em desenvolvimento, portanto não apresentam conclusões mesmo que provisórias. No entanto, busca-se trazer elementos para as discussões sobre as possibilidade de aproximação entre os estudos de Comunicação e os de experiência estética, agregando autores africanos e afro-diaspóricos, considerando a centralidade do corpo e da experiência no processo de produção de conhecimento das culturas negras do mundo.
Inserem-se, por outro lado, numa investigação que propõe aprofundar a discussão sobre a cultura negra e afrobrasileira nos estudos de Comunicação, que tem sido pouco abordada por outras perspectivas que não a da representação do negro nas diferentes mídias. Extrapola-se, desta forma, a esfera do discurso em direção ao vivido.
Além desse deslocamento, propõe-se uma epistemologia mais ligada a presença do que ao sentido, aproximando-a das concepções de experiência afro e africanas. Assim como a própria ideia de afro é resultado do encontro entre culturas, não se pode negar os conhecimentos produzidos na tradição europeia, mas busca-se mantê-los em permanente tensionamento, trazendo para discussão outros saberes e formas de conhecer oferecidos por pensadores afro e africanos e pela observação das experiências e vivências dos sujeitos pesquisados em territorialidades afro.

REFERÊNCIAS

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Jornalista. Doutor em Ciências da Comunicação. Coordenador do curso de Jornalismo da Ulbra. Email: [email protected]
A pesquisa aqui em parte relatada quando submetida pela primeira vez a um programa de Comunicação foi qualificada como "política", sendo recomendada sua apresentação em programa de Antropologia.
Clóvis Moura denomina de dialética racial do negro brasileiro o distanciamento da maioria da população negra do discurso de identidade e pertencimento afrobrasileiro construído pelo movimento social.
A proposição de Benjamin (1985) refere-se à escuta de rádio, mas pode ser transposta para a estada na festa sem alterar o contexto por se tratarem igualmente de mídias sonoras.
É interessante observar a relação dos pragmatistas do início do século XX com a Fisk University, os movimentos sociais negros e a luta pelos direitos civis nos Estados Unidos. Dewey, por exemplo, integrou o grupo de fundação da National Association for the Advancement of Colored People em 1909 em reação ao massacre de negros em Illinois. A organização mantém-se em atividade (NAACP, 2009).
Segundo o princípio da continuidade de Dewey (1980), não há separação entre a cultura e a natureza, pois "a experiência é da tanto quanto em a natureza. Não é a experiência que é experenciada, e sim a natureza" (p.4).

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