UNICEF e algumas práticas de medicalização das famílias e crianças

September 19, 2017 | Autor: Dolores Galindo | Categoria: Michel Foucault, Medicalization of Childbirth, Medicalization
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UNICEF e algumas práticas de medicalização das famílias e crianças UNICEF and some practices medicalization of families and children UNICEF y algunas prácticas de la medicalización de las familias y los niños

Flavia Cristina Silveira Lemos Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém, PA, Brasil. Dolores Cristina Gomes Galindo Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT), Cuiabá, MT, Brasil. Cristiane de Souza Santos Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém, PA, Brasil. Robert Damasceno Rodrigues Universidade Federal do Pará (UFPA), Belém, PA, Brasil.

Resumo O UNICEF, desde o final da II Guerra Mundial, no século XX, vem desenvolvendo intervenções dirigidas à proteção à saúde de mulheres, mas primeiramente de cuidado de crianças órfãs de guerra e, depois, ampliando as ações para a saúde materno-infantil. Após a década de setenta, estendeu suas práticas para a defesa, proteção e garantia de direitos de crianças e adolescentes, em todos os países, especialmente nos que classifica como pobres e em desenvolvimento. O Brasil é um dos países em que o UNICEF vem, desde 1946, atuando. Para tanto, lança publicações, cartilhas, organizando conferências, levantando estatísticas da violação de direitos de crianças e adolescentes, articulando organizações não governamentais politicamente para induzir e fomentar maneiras de governar as condutas das populações que nomeia como em risco, em uma visão médica, higienista, disciplinar e biopolítica da sociedade. Palavras-chave: UNICEF; Crianças e Adolescentes; Práticas Medicalizantes; Análise de Documentos; Brasil.

Abstract The UNICEF since the endof World War II, in the twentieth century, has been developing interventions aimed at protecting the health ofwomen, but first care of children orphaned by warand then amplify ingthe actions formaternal and child health. After the seventies,

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Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ extending their practices to defend, protect and guarantee the rightsof children and adolescents inall countries, especially those classified aspoor and developing countries. Brazil isone of the countriesin which UNICEF has, since 1946, working. Therefore, launches publications, booklets, organizing conferences, raising statistic sof violation of right sof children and adolescents, and non-governmental organizations articulating politically to induce and promote ways to govern the behavior of population sappointing as at risk ina medical, hygienist, disciplinary and biopolitical society. Keywords: UNICEF, Childrenand Adolescents; Medicalization; Document Analysis; Brazil.

Resumen UNICEF desde el final de la Segunda Guerra Mundial, en el siglo XX, ha sido el desarrollo de intervenciones dirigidas a proteger la salud de las mujeres, pero sobre todo de la atención de los niños huérfanos por la guerra y luego amplificar las acciones de salud materna e infantil . Después de los años setenta, se ha expandido su práctica de defender, proteger y garantizar los derechos de los niños y adolescentes en todos los países, especialmente los clasificados como países pobres y en desarrollo. Brasil es uno de los países en los que UNICEF tiene, desde 1946, trabajando. Con ese fin, mensajes publicaciones, folletos, la organización de conferencias, lo cual las estadísticas de violación de los derechos de los niños y adolescentes, articulando políticamente las organizaciones no gubernamentales, para inducir y promover formas de regir la conducta de nombrar como poblaciones en riesgo en un médico, higienista, disciplinaria y la sociedad biopolítica. Palabras clave: UNICEF; Los Niños y los Adolescentes; Prácticas Medicalizadas; Análisis de los Documentos; Brasil.

Introdução

(França), dos pobres (Inglaterra) e do Estado (Alemanha). A higiene pública nasce

Os trabalhos de Michel Foucault

nessa perspectiva de extensão social das

(1979; 2004a; 2004b; 2008) assinalam que

práticas médicas correlatas a outros sabe-

a medicalização é uma extensão da medi-

res, como a Geografia, a Psicologia, a Es-

cina para todas as esferas da sociedade,

tatística, a Epidemiologia, a Demografia, a

emergindo como medicina social, na se-

Pedagogia e a Economia Política. Nesse

gunda metade do século XVIII, por meio

sentido, a medicalização também pode ser

basicamente da medicalização da cidade

chamada de biopolítica, governo da vida,

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Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ em nome da saúde e da expansão da mes-

aspectos políticos, subjetivos, culturais e

ma, em que fazer viver e deixar morrer

sociais que também fazem parte do gover-

passa a ser uma estratégia do Estado Mo-

no das condutas. As tecnologias de poder e

derno e da sociedade, em sua defesa social.

de saber de regulação da população pela

A vida entra na história, mas isso ocorre

entrada da vida na história, como espécie,

através de uma racionalização desta como

passaram a ser chamadas por Michel

espécie biológica.

Foucault de biopolíticas. A gestão da vida

No aspecto do governo meticuloso

como espécie biológica foi combinada ao

das condutas pelas práticas médicas e pelas

poder disciplinar, em que tecnologias

suas extensões e práticas vizinhas, a medi-

disciplinares meticulosas e minuciosas de

calização é igualmente um mecanismo

produção de corpos úteis e dóceis, em uma

disciplinar. Por exemplo, pela criação e

anatamo-política, passaram a operar igual-

difusão dos manuais de civilização e da

mente com a medicalização da cidade, do

execução da gestão detalhada de cada ato

trabalhador e do Estado. Assim, essa liga-

cotidiano, surge aquilo que se conven-

ção entre biopolítica e disciplina passou a

cionou denominar polícia médica, ou seja,

ser denominada biopoder, por Michel

controle minucioso do corpo, anatomo-

Foucault (2004a). A construção de perfis

política. É assim que situamos os docu-

de anormalidade por meio do jogo nor-

mentos – diretrizes, cartilhas, manuais diri-

ma/anormal/anormalidade engendrou uma

gidos à normalização das famílias e das

compreensão simplista do cuidado, o que o

crianças – como instituições, pois têm uma

fez desembocar em prática geradoras de

realidade material e disparam efeitos, tais

mais sofrimento, ao sustentar avaliações

como: lutas, processos de servidão e domi-

racistas que faziamdas expressões de sin-

nação, jogo de palavras composto de peri-

gularidades e das desigualdades, patolo-

gos e de relações de poder, produção de as-

gias/psicopatologias.

beres e difusão destes em espaços insti-

O processo de produção massiva de

tucionais, captura das ações em regimes de

diagnósticos psicométricos, biomédicos e

força, domesticação da multiplicidade em

tecnicistas tem sido ampliado, na atua-

arquivos de uma escrita biográfica e esta-

lidade, de acordo com Castel (1987). Para

belecimento de relações entre aconte-

esse autor, o cuidado está sendo reduzido à

cimentos díspares.

gestão de perfis por meio do cálculo de

A problemática de redução das

riscos, em perícias técnicas. O uso de testes

possibilidades de existência à gestão da

descolados de contextos, situações e histó-

saúde, como controle da vida, silencia os

rias de vida pode fomentar encomendas em

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Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ que os resultados de variações de medida e

preventiva comunitária norte-americana,

a classificação psicopatológica poderão

em especial.

terminar em respostas de urgência técnica

Associações são criadas e surgem

para problemáticas complexas que não po-

entidades de defesa dos nomeados como

deriam ser resolvidas, apenas pela aplica-

doentes escolares. Jacques Donzelot, em

ção de alguns testes e por diagnósticos rá-

“A polícia das famílias” (1986) já salienta-

pidos.

va como a escola e o exército foram portas Para analisar as relações entre sa-

de entrada para a psiquiatria e a neuro-

ber-poder através da genealogia, Foucault

psiquiatria como medicinas sociais norma-

(1979, p. 244) criou a noção de “disposi-

lizantes de condutas. No mesmo livro, as-

tivo”, que ele conceituou como “um com-

sinalava como as mesmas fizeram aliança

junto decididamente heterogêneo que em-

com o campo jurídico, em alguns aspectos,

globa discursos, instituições, organizações

como no atendimento aos adolescentes em

arquitetônicas, decisões regulamentares,

conflito com a lei e adultos que come-

leis, medidas administrativas, enunciados

tessem infrações. Birman e Costa (1994)

científicos, proposições filosóficas, morais,

designaram esse processo de psiquiatri-

filantrópicas”. Portanto, a categoria “dispo-

zação da medicina, em que as noções de

sitivo” é um operador metodológico que

doença mental, transtorno e síndrome inva-

nos auxilia na análise das práticas discur-

diram o debate e as intervenções médicas

sivas, de poder e de subjetivação.

das práticas correlatss. Tal ordem do dis-

Foucault,

em

“Os

anormais”

curso está assentada em uma rede de prá-

(2001), Castel, em “A ordem psiquiátrica –

ticas: saberes, poderes, leis, relatórios, cur-

a idade de ouro do alienismo” (1978) e em

sos, editoras, distribuidoras, congressos,

“A gestão de riscos: da antripsiquiatria à

instituições e profissões variadas bem co-

pós-psicanálise” (1987), apontaram como a

mo em empresas e organismos multila-

medicina social, por intermédio da psi-

terais.

quiatrização dos desvios sociais, possibi-

Interessa-nos captar o intolerável

litou a defesa da sociedade no campo da

do emprego da racionalidade instrumental

relação normal/anormal em termos de es-

biomédica e organicista que permitiu des-

pectros formulados por lógicas racistas e

locar o âmbito da doença a ser tratada para

operacionalizados como economia política

a

liberal, acionadas pelo Estado e pela

de/afastamento frente as idealização das

sociedade, em conjunto com a psiquiatria

normas,

gestão

preventiva

regras

e

de

proximida-

modelos de

viver

(Foucault, 2010). A medicalização da vida Rev. Polis e Psique, 2014; 4(2): 44-64

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Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ pelo UNICEF se conjuga às práticas vizi-

venção dos criados, e o direcionamento da

nhas de normalização, sendo traduzida em

vida dos pobres, em que se buscava mino-

estratégias de educação e promoção de

rar os gastos sociais com sua reprodução.

saúde, o que convoca a uma analítica que

Podemos observar que a difusão desse tipo

contemple essa heterogeneidade.

de literatura, em conjunto com outras ações, abriu espaço para que a figura do

Normalizar, prescrever, cuidar:

médico pudesse

permear as relações

cartilhas para o bom governo pelas

familiares, reorganizando-as em nome da

famílias

higiene e saúde das crianças. Stephanou e Bastos (2004) enfa-

Ariès (2006) ressalta, em sua obra

tizam que, na década de 1930 a 1950, no

“História Social da criança e da família”,

Brasil, pode-se perceber a efetivação de

que a literatura acerca da chamada “civi-

diversas ações médicas que iam desde pro-

lidade” – manuais e tratados que versavam

postas de saneamento até a organização de

de maneira abrangente sobre como viver

manuais de higiene e saúde. Esses manuais

em sociedade – se configurava como uma

marcam a elevada importância que passa a

maneira de materializar e divulgar conhe-

ser dada aos cuidados pessoais, no campo

cimentos os quais escapavam ao apren-

da urbanidade/civilidade.Segundo as auto-

dizado na escola. Cunha (2006), os ma-

ras, os manuais altamente prescritivos

nuais de civilidade visam orientar em um

apresentam um conteúdo caracterizado por

campo de valores morais e por meio de

conselhos, recomendações, especificações

códigos sociais. São formados por regras

de procedimentos a adotar dos compor-

de conduta e por um conjunto de conse-

tamentos em sociedade. Outra caracte-

lhos. Para Donzelot (1980), intensifica-se

rística apontada por Stephanou e Bastos

no século XVIII a produção desse tipo de

(2004) é que esses manuais não buscavam

documento visando à conservação das

impor às pessoas a realização das condutas

crianças.

neles listadas, mas procuravam persuadir,

A fim de que se pudesse alcançar

sugerir aos indivíduos que as “boas condu-

esse propósito, dois pontos são destacados

tas” beneficiariam uma vida saudável e

pelo autor: a “capacitação” dos pais, por

higiênica. Em sua estrutura, os conselhos

intermédio de uma “medicina doméstica”,

têm um misto de argumentos ora cientí-

operacionalizando conhecimentos e técni-

ficos ora morais, os quais possibilitavam a

cas para que a burguesia passasse a priori-

legitimação de tais procedimentos.

zar os cuidados à criança, sem a interRev. Polis e Psique, 2014; 4(2): 44-64

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Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ No trabalho “Lições de casa: dis-

dicos para além dos consultórios, pois po-

cursos pedagógicos destinados à família no

deriam servir “como um suporte de

Brasil”, Magaldi (2007) realiza um levan-

informações particularmente útil, na medi-

tamento e problematização de cinco ma-

da em que, estando sempre a mão, podiam

nuais de orientação da conduta das famí-

ser consultados no exato momento em que

lias, no Brasil. Em seu estudo, a autora evi-

surgisse uma dúvida em relação ao cuidado

dencia uma clara preocupação, no início do

com o bebê” (Lima, 2007, p. 103). Dessa

século XX, dos mais diversos intelectuais

forma, o saber sobre o cuidado com as

em articular recomendações no âmbito da

crianças seria compartilhado nos manuais,

saúde e da educação, tendo como objetivo

e a família, tendo esse instrumental a seu

e alvo de suas ações as famílias. Nas

favor, se constituiria como aliada para pre-

estratégias construídas, salientacomo se

venir doenças e combater a mortalidade

constitui uma noção de evidente dimensão

infantil (Lima, 2007). É importante desta-

normativa e normalizadora simultânea, nos

car ainda que, nesse processo de legiti-

manuais. Para Magaldi (2007), esses ma-

mação desse tipo de documento, os médi-

nuais1 apresentam para a família brasileira

cos também criaram estratégias para com-

hábitos, comportamentos “corretos”, numa

testar mulheres mais velhas, como as avós,

proposta de “moldagem social” (p.33),

comadres e vizinhas, já que as mesmas

valorizando a estabilidade da família, que

poderiam criar obstáculos aos preceitos

refletiria como a estabilidade da nação,

divulgados nos manuais.

exaltando sua função educativa 2, materia-

O que aparece nos manuais é uma

lizando as investidas, intervenções e com-

série de práticas sociais normalizadas e

troles por parte dos médicos na sociedade,

padronizadas para referendar as condutas

já que, nesse período, “a medicina, preo-

dos indivíduos, porque o que é considerado

cupada crescentemente com as doenças so-

como normal, nesses documentos, acaba se

ciais e com a necessidade de sua cura via

naturalizando em nossa sociedade. Dessa

higiene, havia eleito a família como um

maneira, a partir de comportamentos natu-

foco primordial de sua intervenção tera-

ralizados, serão criados diversos dispo-

pêutica” (p. 36).

sitivos, a fim de aproximar os indivíduos

Os manuais foram instrumentos es-

desviantes para a norma. Os estudos de

tratégicos utilizados pelos médicos higie-

Magaldi (2007) mostram que os manuais

nistas para disseminar os princípios da

regulam as famílias, subjetivando-as, de

puericultura (Lima, 2007). Assim, esses

sorte a alterar seu modo de pensar e agir

manuais expandiriam os ensinamentos mé-

em relação aos cuidados com a criança. A

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Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ lógica que norteia a produção de manuais

venção da medicina e sua difusão foram

veiculados, em diferentes épocas, é a de

intensivas e se tornaram um receituário de

oferecer à família um instrumental a seu

práticas com ações supostamente legítimas,

favor, e, desde que esta siga de maneira

para dar atenção a um conjunto de pro-

correta as prescrições, além de minimizar

blemas de ordem política e econômica que

os gastos sociais, garantirá o cultivo da

se apresentavam e que dizem respeito à po-

saúde da criança e o desenvolvimento de

pulação. O autor ressalta que a emergência

toda sua potencialidade. Foucault (1979),

da preocupação com o corpo social, com a

ao estudar a política de saúde do século

população, no que diz respeito aos aspectos

XVIII, evidencia como a família foi

relacionados à saúde e doença, possibilitou

medicalizada e se constituiu em um agente

que a família começasse a ser concebida

medicalizante. Isso foi possível porque a

como operador para a gestão das popu-

relação pais-filhos foi reorganizada por um

lações. Nesse sentido, a família constituiu-

conjunto de obrigações, as quais se

se, a partir de então, como um dos segmen-

colocavam para que a infância pudesse ser

tos mais importantes pelo qual se pode

gerida da melhor maneira, a fim de garantir

governar, pois, “na medida em que, quando

a sobrevivência e o desenvolvimento da

se quiser obter alguma coisa da população

criança.

– quanto aos comportamentos sexuais, à

As condutas dos pais passariam a

demografia, ao consumo, etc. – é pela fa-

ser moralmente definidas, já que o inves-

mília que se deverá passar” (Foucault,

timento sobre a família possibilitou a “arti-

1979, p. 289).

culação dos objetivos gerais relativos à boa

Donzelot (1986), em “A polícia das

saúde do corpo social com o desejo ou a

famílias”, indica como se deu o intenso

necessidade de cuidado dos indivíduos”

investimento na vida familiar e o aconte-

(Foucault, 1979, p. 200). Os médicos

cimento de “um governo da família para

passaram a orientar os indivíduos em sua

um governo através da família” (p.86). De

higiene, saúde, habitação, alimentação,

acordo com o autor, no antigo regime, a

comportamento. Esse saber, durante o sé-

família se constituía como sujeito e objeto

culo XVIII, para além de um serviço que

de governo, simultaneamente. Ela engloba-

se encarregasse das doenças e das formas

va um encadeamento de relações que se

de curar os indivíduos, assumiu um lugar

circunscreviam no âmbito público e priva-

estratégico e ascendente de relevância nas

do, e o chefe de família acumulava funções

estruturas administrativas.

de conduzir, guiar, se responsabilizar pela

Foucalt (1979) afirma que a interRev. Polis e Psique, 2014; 4(2): 44-64

família e sua participação nas relações so|50

Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ ciais. Estado e família colaboravam entre si

porém,de ativar estratégias que primassem

para a manutenção da ordem pública.

pela conservação e formação da população

Esses breves apontamentos acerca

e servissem aos interesses da economia

dos manuais dirigidos às famílias são

liberal. Isso pôde acontecer por meio da

importantes para pensar como um conjunto

filantropia. Conforme Donzelot (1986),

de prescrições presentes em documentos

não devemos entender essa modalidade de

que visam à regulação e ao governo de

assistência como uma simples ação que

condutas das crianças e das famílias, como

busca sanar problemas sociais com uma

é o caso das ações realizadas pelo UNICEF

intervenção no âmbito privado, sem ne-

ocorrem, no Brasil. Para Foucault (1995),

nhuma finalidade política, mas como uma

“conduta” seria o termo que facilitaria

estratégia que despolitiza. A filantropia vai

alcançar o que existe de particular nas

se ancorar estrategicamente com o polo

relações de poder. Segundo o autor, a

assistencial e o polomédico higienista. No

“conduta” é simultaneamente a própria

primeiro polo, o Estado se constituirá co-

ação de “conduzir” os outros e o modo, a

mo um meio formal para a ampla divul-

maneira de ordenar comportamentos num

gação de conselhos e regras de compor-

campo limitado, mas não fechado de

tamentos, operando um deslocamento de

possibilidades.

questões relativas aos direitos políticos para a moralidade econômica. Já através do

Filantropia, saúde e proteção social:

polo médico higienista,buscava-se impedir

rearranjos entre família e Estado

a degradação física e moral da população, pela prescrição de regras a respeito do

A partir do século XVIII, a autoridade

da

família

passa

a

ser

questionada e, além disso, a família já não

bem-estar e saúde, visando a eliminar riscos que afetassem a sociedade (Donzelot, 1986).

consegue encarregar-se da manutenção de

A força dessa estratégia da filan-

seus membros, de sorte que aumenta

tropia foi de direcionar para a família ques-

consideravelmente o quantitativo de pobres

tões provenientes do campo moral e de

que começam a requerer algum tipo de

uma atuação dos trabalhadores sociais pau-

ajuda. Esses dois acontecimentos são

tada no inquérito. A própria família entra e

considerados por Donzelot (1986) como

é acionada como dispositivo de governo,

desencadeadores da inadequação desse

pelo qual se governa a condutas de crian-

sistema de aliança entre Estado e família.

ças. O movimento higienista se orientou

Tratava-se agora não apenas de repressão,

pela preocupação de dar visibilidade à

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Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ aliança entre medicina e Estado moderno,

texto dos Estados-Nações, da

gestão

podendo fazer dos países ocidentais nações

urbana, da gerência do Estado Moderno e

fortes, prontas a entrar em concorrência

da regulação dos corpos dos trabalhadores

entre si com indicadores de desenvolvi-

pobres (Foucault, 1979). Toda uma política

mento social e econômico, no quadro do

da vida foi sendo tecida da segunda metade

liberalismo político.

do século XIX em diante, em que a criança

A produção da saúde tem sido for-

pequena e sua mãe eram figuras separadas

mulada como objeto e como uma maneira

da sociedade mais ampla, como devendo

de garantia e promoção de direitos e, si-

receber atenção especial dos trabalhadores

multaneamente à sua objetivação como di-

sociais, na assistência médica e higienista

reito fundamental, ela passa a ser instituída

pautada nos modos de normalização em

no bojo dos saberes higienistas e da medi-

interlocução com a filantropia dos bene-

cina social, os quais vão se constituindo

méritos moralizadores (Donzelot, 1986).

paralelamente, desde a passagem do século

Os manuais de civilidade e de

XIX para as primeiras décadas do século

prescrição de puericultura foram intensa-

XX, como forma de defender a sociedade,

mente usados desde o século XIX e eram

em uma clara perspectiva de segurança. A

adotados nos cursos de formação das

saúde é uma das principais questões tra-

normalistas pelos professores médicos, que

zidas pelas cruzadas educativas, via escola

visavam a torná-las futuras educadoras

e família, pelos aparatos médicos. Tais

difusoras dos ideais higienistas. Minu-

aparatos irão focar o segmento das mães e

ciosas técnicas de cuidado e de higiene

das professoras normalistas com vistas a

eram ensinadas às mulheres, por inter-

alcançar de maneira preventiva as crianças

médio de cartilhas muitas vezes intituladas

pequenas, difundindo as ideias do movi-

“gotas de amor” por pediatras, nas últimas

mento higienista, nas primeiras décadas do

décadas. A medicina preventiva e social,

século XX, no Brasil, e ainda hoje conso-

ligada a algumas teorias da psicanálise que

lidando essa estratégia por meio das famí-

traziam definições sobre maternidade e

lias e escolas, em especial, com o apoio de

desenvolvimento psicossexual de crianças

mulheres que tiveram seus corpos medica-

e adolescentes, ajudou a forjar práticas

lizados desde pequenas, ainda crianças e

educativas preocupadas em prevenir futu-

adolescentes (Boarini, 2003).

ros desvios sociais e compôs os conteúdos

A perspectiva preventiva e comuni-

transmitidos às normalistas que iriam edu-

tária de cuidado em saúde foi ganhando

car as crianças pequenas. As campanhas,

materialidade e relevância política, no con-

encampadas por médicos, educadores e

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Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ trabalhadores sociais, foram sendo dis-

simultaneamente às táticas de controle dos

seminadas e, de maneira geral, vinham se-

corpos e vigilância dos mesmos bem como

guidas de pedidos de elaboração de leis de

pode forjar iatrogenias, ou seja, menos

proteção às crianças e adolescentes, postu-

saúde. As tecnologias de saúde comportam

lando a demanda pela estruturação de seto-

níveis de proteção e linhas de modulação

res estatais responsáveis pela formulação,

das condutas por meio de prescrições de

execução e financiamento das políticas de

como se cuidar, se alimentar, quantas horas

saúde e educação. O UNICEF requisita e

dormir por dia, o que se deve fazer para

recomenda essa prática, propõe seu entre-

não adquirir doenças, que exercícios e com

cruzamento com outras modalidades de

qual regularidade deverão ser feitos, como

atendimento, na composição do Complexo

os pais devem ser preparar para gerar

Tutelar.

filhos e cuidar deles, em que momento da vida as pessoas podem se casar, que dietas

Cruzadas educativas: práticas de

seguir e que substâncias são maléficas à

medicalização da vida pelo UNICEF

saúde

entre

tantas

outras

incitações

reguladoras. Nisto consiste a produtividade Foucault (2004a), ao pensar a

dos saberes e poderes, de acordo com

produção de saúde, afirma que esta implica

Foucault (1979), pois ele avançou na

a proposição de uma demanda infinita

análise das relações de poder para além das

dentro de um sistema finito, pois a questão

concepções negativas de repressão, de

de reivindicar a saúde em nome da vida

opressão, dos binarismos e da dominação

gerava todo um gasto e concretude de

legal e econômica.

práticas que eram financiadas totalmente pelo

Estado

liberal

de

Com efeito, não é possível pensar a

bem-estar,

proteção/seguridade social como oposição

recebendo restrições ainda maiores em um

ao controle, pois ambos são correlatos; ou

Estado neoliberal, o qualpassa a realizar

seja, a medicalização protege e controla ao

políticas compensatórias de gestão de risco

mesmo tempo. Assim, a produção de saúde

e retroceder em parte considerável do

opera medicalizações e estas forjam corpos

financiamento do sistema público de

saudáveis e vigiados/regulados concomi-

saúde, desde as duas últimas décadas do

tantemente. Isto não é bom e/ou mal como

século XX (Foucault, 2008).

uma essência e sim uma analítica da

Vale ressaltar que a medicalização

produção de uma racionalidade e dos

não é uma prática de saber e poder que

efeitos que ela gera no contemporâneo.

produz efeitos de saúde e segurança,

Assim, quando afirmamos que o UNICEF

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Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ medicaliza estamos afirmando que ele

crianças e adolescentes, sobretudo aqueles

recomenda saúde e cada vez mais corpos

que denomina grupos de risco, que poderão

plenos e cheios de vitalidade; inclusive,

resultar em supostos problemas futuros no

fazendo desta prescrição um direito a ser

campo da segurança e em prejuízos ao

cumprido e uma missão quase espiritual a

Estado, em funcão de adoecimentos,

ser seguida com afinco.

situações que tornarão esses grupos menos

O UNICEF é criado em 1946 e,

produtivos e úteis, financeiramente.

paulatinamente, vai se apresetando como organismo

multilateral,

vinculado

à

Há uma objetivação das diferenças pelos

saberes

médicos,

psicológicos,

Organização das Nações Unidas. O Fundo

neuropedagógicos, estatísticos, jurídicos e

das Nações Unidas para a

Infância

da administração social, a qual produziu

(UNICEF) é uma agência internacional que

uma racionalidade cristalizada, que reduziu

se propõe gerir a vida e proteger crianças e

o espectro da multiplicidade das maneiras

adolescentes,

práticas

de viver à lógica de medidas, permeadas

disciplinares e biopolíticas, as quais forjam

por pretensões universais e por padro-

simultaneamente efeitos de cuidado e de

nizações silenciadoras da diversidade. O

controle medicalizantes dos corpos desse

processo

de

segmento da população. Assim, suas

formatos

normalizantes,

intervenções

e

modelos, tornando os desvios de normas

defender direitos, de forma concomitante à

uma suposta natureza e entidade patológica

expansão da higienização do corpo e da

e psicopatológica. A naturalização e a

sociedade como estratégias políticas nos

normalização restringem as práticas de

países em que atua.

atendimento à noção de vida, em seus

por

meio

de

possibilitam

garantir

A força prescritiva dos relatórios do UNICEF

ressalta

a

relevância

objetivação

ocorre

em

fixados

em

aspectos biológicos, os quais operam no

de

recorte de um espectro de delineamento

pensarmos as práticas desse organismo

entre o normal e patológico, de maneira

multilateral, ligado à Organização das

atrelada à economia política e ao sujeito de

Nações Unidas (ONU). Essa agência

direitos, tendo no dispositivo assisten-

privilegia a gestão da saúde, dos corpos

cialista e de proteção social uma salvar-

higienizados pela oferta de saberes e de

guarda institucional (Fonseca, 2003).

técnicas, funcionando muitas vezes como

Para o UNICEF, assegurar saúde

manuais de saúde e de educação em

passa por uma adesão do Estado e da

direitos humanos para a gestão da vida, em

Sociedade Civil a um conjunto de saberes e

termos de ampliação da produtividade de

expertises

Rev. Polis e Psique, 2014; 4(2): 44-64

oriundas

dos

campos

da |54

Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ Educação,

Psiquiatria,

Psicologia

e

A vinculação do UNICEF com a

Medicina Preventiva. Logo, o chamado é

Pastoral da Criança é uma constante

ao

o

prática, nas últimas décadas, no Brasil.

concebido

Este acontecimento implica no fomento à

como processo linear e universal que

caridade por esta agência multilateral que

atualiza as práticas de normalização morais

encomenda e se articula politicamente a

das condutas. A família é convocada a uma

entidades

profissionalização do cuidado dos filhos

governo das condutas das crianças e das

pelo UNICEF. Para esta campanha, este

famílias. Juntamente com a Pastoral age

órgão convida o terceiro setor juntamente

em todo o território nacional, em especial,

com a comunidade a um auxílio voluntário

com marcante atuação de mão de obra

às famílias no plano da atenção à saúde das

voluntária ligada à pastoral, que foi

crianças. Este ato assinala que o UNICEF

designada como agente comunitária de

afirma um Estado Mínimo, em que os

saúde e tinha a relação próxima e direta

direitos são oferecidos pela chamada

com as mulheres e crianças moradoras dos

sociedade civil e em que a culpa da

bairros em que realizava suas ações

violação de direitos é lançada nas famílias,

cotidianas. A distribuição do soro caseiro e

desqualificadas como despreparadas para

as campanhas pelo parto normal, efetuadas

cuidar da prole. Para esta agência, é

por parteiras vinculadas às comunidades,

necessário prevenir os desvios pelo vigiar

são fortes e presentes, em termos de

das condutas justificado pelo apoio ao

redução da mortalidade infantil, no país.

comprometimento

desenvoolvimento

com

humano

religiosas

para

oferecer

o

desenvolvimento das crianças: Ligada à Conferência Nacional dos Bispos Essas

redes, apoiadas

por governos,

do Brasil (CNBB), a Pastoral da Criança

e

promove ações de melhoria da saúde das

principalmente das comunidades, devem

crianças e suas mães, orienta os homens

ser capazes de engajar as famílias em

sobre o papel do pai no desenvolvimento

processos de aprendizado e aquisição de

da criança, distribui a multimistura (uma

habilidades para cuidar das crianças em

opção barata e eficaz de combate à

casa,

desnutrição),

organizações

de

da

forma

sociedade

a

civil

melhorar

o

alfabetiza

homens

e

desenvolvimento infantil nas áreas física,

mulheres, mantém brinquedotecas e apóia

emocional, social e cognitiva (UNICEF,

ações de geração de renda para famílias

2001, p. 11).

pobres. Um dos resultados de maior impacto da atuação da Pastoral em todo o país é a redução drástica nos índices de

Rev. Polis e Psique, 2014; 4(2): 44-64

|55

Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ mortalidade infantil (UNICEF, 2001, p.

analisadores sociais sintomáticos dos mal-

31).

estares de uma sociedade consumista de fórmulas

Os relatórios do UNICEF vinculam explicações das desigualdades sociais pelo desempenho

ligado

às

características

individuais, associadas a determinadas perfomances. Nesse sentido, a Psicologia tecnicista cumpriu uma missão liberal de atuar em função da ordem individualista e seletiva das tensões sociais, filtradas em construções de estigmas e rótulos que sustentam uma sociedade desigual (Castel, 1987). A crítica ao preconceito presente nos rótulos e carimbos de setores sociais discriminados em sistemas de avaliações baseadas em desvios de normas vem sendo intensivamente realizada por antropólogos

pragmáticas, de urgência

e

ilusórias de bem-estar a qualquer preço (Castel, 1987; Collares & Moisés, 2010). Resguardando-se

por

painéis

de

consultores e educadores que assimilam, inclusive, as problematizações em torno da medicalização

da

vida,

o

UNICEF

recomenda um detalhamento do controle do tempo livre das crianças, por exemplo, que o monitoramento do crescimento das crianças e a fixação de determinados perfils e performances se converte em direito à saúde. Apoiando-se no cálculo econômico de base neoliberal, a criança e a família continuam sendo o foco das ações do UNICEF:

e sociólogos, os quais afirmaram a lógica racista que ancorava muitos procedimentos

Os custos de dar ao adulto uma segunda

capazes

chance na vida são muitos maiores do que

políticas

de

transformar

em

divergências

anormalidades

universalizavam

condutas

e

que

os custos de se prover cuidados no tempo

padrões,

adequado à criança, principalmente em

e

estigmatizando as diferenças por meio do

seus

primeiros

anos

de

vida.

O

investimento na criança oferece de melhor

enquadramento em modelos ditos de

aproveitamento escolar, maior produtivi-

normalidade (Collares & Moyses, 2010).

dade e comportamentos positivos ao longo

Outra

crítica

em

relação

à

medicalização se deu pela interrogação das maneiras

da

indústria

farmacêutica

mercantilizar a saúde; que, com o fim ou

da vida. Serviços sociais básicos de saúde e

educação,

por

exemplo,

investimentos preventivos

são

muito mais

efetivos e humanos (UNICEF, 2001, p. 17).

quase fim dos manicômios, passou a comercializar outros tipos de manicômicos,

A ampliação das demandas de

os químicos, ou melhor, camisas-de-força

cuidado em saúde, sobretudo das mulheres

psicofarmacológicas

e das crianças,está articulada à visão de

para

silenciar

Rev. Polis e Psique, 2014; 4(2): 44-64

os

|56

Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ zelar pelo que era e ainda é denominado o

adquirir linguagem e aprender. Apesar de

futuro da nação; a clientela selecionada

cada um ser capaz de compensar as oportunidades

como prioritária se tornou um foco de

acumulados

perdidas,

os

efeitos

de desnutrição, falta de

proteção, na medida em que se tinha um

cuidados de saúde, água não potável,

programa político de não apenas tornar o

saneamento

corpo saudável, mas também dócil e útil

ambiental, falta de estimulação intelectual

para o trabalho, lucrativo, ao mesmo tempo

e abuso físico ou emocional na primeira infância

em que era educado em termos de normas

precário,

podem

ter

degradação

conseqüências

duradouras para indivíduos e sociedades

de seguridade social e práticas educativas

(UNICEF, 2001, p. 15).

dos modos de vida preventivamente, acarretando um cálculo econômico da

O incentivo à escolarização das

oferta de saúde à população. A prescrição

mulheres, à sua entrada no trabalho de

de saberes agencia um plano de poder

modo mais formal e com direitos garan-

como incitação de condutas a efetuar para

tidos, a demanda por creches para as

cuidar cada vez mais e mais, o que

crianças pequenas, a utilização de métodos

configura a biopolítica − gerir a vida pela

anticonceptivos,

expansão da saúde. A antecipação de crises

prevenção à maternidade não planejada, a

e/ou de doenças pela promoção de uma

valorização da configuração familiar do

educação em saúde implica em ensinar a

casal

viver de certa maneira para alcançar metas

determinada renda e escolaridade, foram

de uma agenda internacional, ratificada

práticas

pelos países membros das Nações Unidas,

UNICEF como maneira de gestão da saúde

entre eles, o Brasil. O fato de assinar estes

materno-infantil. A demanda pela ama-

pactos traz um compromisso ao país uma

mentação exclusivamente materna, nos

obrigação de aceitar ser monitorado pelo

primeiros meses do bebê, foi e tem sido

UNICEF detalhadamente por

alvo

meio de

as

campanhas

heterossexual

de

bastante

atenção

adulto,

incentivadas

dos

assessores

pela

com

pelo

do

avaliações sistemáticas, formuladas com

UNICEF. Estas normas prescritas fazem

indicadores estatísticos de todos os dados

parte do que Foucault (1979) denominou

que esta agência qualificar como produção

de família medicalizada medicalizante. Ele

de saúde e de vida.

destacava que a família se tornou o segmento privilegiado de governo da vida

No desenvolvimento de uma criança, existem períodos

críticos

que dizem

respeito à sua capacidade de observar,

Rev. Polis e Psique, 2014; 4(2): 44-64

na biopolítica e que se tornou a principal instituição centrada no casal-filhos a

|57

Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ educar crianças a partir de determinados

UNICEF, em rede com outros organismos

ideais médicos de saúde, como os que são

e entidades em prol da busca incansável da

difundidos pelo UNICEF.

oferta de mais saúde para as famílias e

A preocupação em enfatizar a

consequentemente

para

as

crianças

importância da vacinação de todas as cri-

brasileiras. Eis aí um dos efeitos de poder

anças brasileiras e de seu acompanhamento

saber nestas práticas, pois elas pressionam,

médico é uma das intervenções signi-

ou seja, governam por relação de força

ficativas dessa agência multilateral. Cam-

com força, em alianças e em chantagens

panhas de vacinação, seguidas de incen-

diante do fato dos Estados cumprirem ou

tivos à amamentação com leite materno, ao

não

aumento de escolaridade das mães, à

internacionalmente.

a

agenda

de

metas,

pactuada

entrada precoce na escola, ao planejamento familiar, à realização de consultas de pré-

Calcular, investir, engajar: UNICEF e o

natal, à submissão ao parto normal, à

governo da sáude

preocupação em fazer o registro de nascimento civil, à atenção às orientações

A criação do Programa Saúde da

de como educar os filhos pequenos e como

Família

zelar pelo seu desenvolvimento, em todas

UNICEF, em parceria com o Ministério da

as

Saúde, no país, o qual passou a se chamar

áreas

são

práticas

do

UNICEF,

implementadas no Brasil. É

fundamental

Estratégia realçar

que

foi

uma

Saúde

das

da

iniciativas

Família

e

do

se

o

generalizou como modelo de atenção

governo das condutas exercido por esse

primária, sobretudo focado nos bairros

organismo multilateral, além de incidir

considerados pobres. Este programa é

diretamente sobre as famílias, exerce-se

interessante no plano da promoção da

também sobre o Estado e a denominada

saúde da família e das crianças, sem

Sociedade Civil, apelando ao engajamento

dúvida, contudo, amplia a vigilância destes

da mesma na causa/missão do UNICEF de

corpos em uma rede fina e disciplinar além

proteger crianças e adolesentes. Assim, a

de biopolítica dos modos de vida dessas

sociedade é convidada a controlar o Estado

populações já que esta política implica nas

com o auxílio deste organismo multilateral

visitas de acompanhamento permanente

para vigiá-lo quanto ao cumprimento das

das condutas das famílias em bairros

normas e das leis de defesa e promoção

pobres brasileiros.

dos direitos de crianças e adolescentes. Medicalizar é uma prática comum ao Rev. Polis e Psique, 2014; 4(2): 44-64

|58

Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ Assim como bem-estar significa mais do

ESF) e o SUS são fundamentais para o

que riqueza, pobreza significa mais do que

cuidado das crianças e das famílias. Consi-

renda

insuficiente

para

cobrir

as

necessidades mínimas de uma família.

dera ainda que juntamente com a promul-

Sinais de que as necessidades básicas não

gação do Estatuto da Criança e do Ado-

estão sendo atendidas – como saúde frágil,

lescente (ECA), estas políticas ganharam

baixa

expressão relevante de promoção de vida e

escolaridade,

discriminação

e

marginalização – também são indicadores de pobreza. Assim, a pobreza está ligada ao acesso inadequado a serviços sociais

saúde da população brasileira. Todavia, o UNICEF, no que tange à gestão da saúde,

e suas

assinala a precariedade da mesma e a

alternativas, pré-escolas, postos de saúde e

necessidade de qualificá-la e controlá-la no

saneamento adequado (UNICEF, 2001, p.

uso das ferramentas e instrumentos de

27).

gerência da saúde. Além do mais, o

básicos, como boas

creches

UNICEF alerta o país para o fato deste O Programa de Saúde da Família (PSF), iniciado em 1994 por meio de uma

ainda precisar melhorar indicadores, tais

parceria entre o Ministério da Saúde e o

como: o de saneamento básico e seu

UNICEF, mostra que oferecer às famílias

impacto nas condições de vida, somado à

serviços de saúde preventiva e curativa em

habitação em moradias em locais de

suas próprias comunidades resulta em

exposição a maiores riscos de doenças e de

melhorias importantes nas condições de saúde das atendidas.

mulheres Um

quinto

e das da

crianças população

brasileira de mais de 160 milhões de

acidentes

de

parte

significativa

da

população pobre e em situação de miséria, no país.

pessoas está atualmente em contato com as equipes de saúde da família, compostas por

Intimamente relacionados à pobreza estão

um médico, um enfermeiro, um auxiliar de

as oportunidades de inclusão no mercado

enfermagem e cinco ou seis agentes

de trabalho e o acesso aos serviços

comunitários de saúde. Cada uma dessas

públicos de saúde, educação, água e

equipes trabalha com 800 famílias e os

saneamento e habitação. [...] Essa condição

agentes

nas

reflete-se diretamente nos índices de

comunidades onde trabalham (UNICEF,

mortalidade infantil no país (UNICEF,

2001, p. 25).

2001, p. 28).

O UNICEF elogia a criação do

Igualmente

comunitários

vivem

é

evidenciado

pelo

Sistema Único da Saúde (SUS), no país, e

UNICEF que o não acesso à água tratada, a

seu financiamento pelo Estado. Afirma que

ausência de rede de esgotos estruturada, a

o PSF (agora Estratégia Saúde da Família -

falta de limpeza das cidades, o acúmulo de

Rev. Polis e Psique, 2014; 4(2): 44-64

|59

Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ lixo em locais próximos aos rios e às casas,

postulados em muitas leis brasileiras, tais

a distância das moradias e a ausência de

como: alimentação, habitação, saúde, edu-

transportes ou dificuldade na mobilidade

cação e assistência social.

para acesso aos serviços de saúde e de

Para disseminar práticas de norma-

trabalho impactam no adoecimento de

lização das condutas, na heterogenidade

muitas crianças e adolescentes, de maneira

regional, o UNICEF recorre aos disposi-

ainda drástica. Esta agência salienta que a

tivos já consolidados politicamente no

qualidade da prestação de práticas de saúde

controle social parecidos com os manuais

e de educação deixa muito a desejar, no

de civilização, que são as cartilhas, os

Brasil, apontando as grandes disparidades

livretos e outros materiais educativos com

regionais nos indicadores de realização da

versões locais para cada estado abrangido

atenção à saúde e da oferta e acesso à

como prioritário para as ações desse orgão,

educação escolar de maneira equitativa, no

bem como para as ações definidas como

país. Por exemplo, mulheres morrem mais

bem-sucedidas pelo UNICEF. Esta agência

no parto por falta de atendimento e

premia com o chamado Selo UNICEF as

ausência de consultas de pré-natal, nas

entidades que aplicam estes manuais de

regiões Norte e Nordeste. Crianças e suas

conduta periodicamente.

mães são menos escolarizadas, nessas

Fica patente a escolha política do

mesmas regiões. A baixa qualidade dos

UNICEF, quando este frisa que as lacunas

serviços de saúde existentes aparece como

do alcance e da qualidade das políticas

um indicador mais presente em ambas as

deverão ser supridas pela comunidade, no

regiões supracitadas, de acordo com os

voluntariado, e pelas organizações da

assessores dessa agência da ONU.

sociedade civil. A veiculação dessa postura

Há disparidades regionais e locais,

implica defender um Estado mínimo e que

entre contextos urbanos e rurais, as quais

atua muito mais como regulamentador das

são realçadas pelo UNICEF e assinalam a

ações em saúde do que financiador. Apesar

gritante desigualdade, quando se analisa a

de o Brasil ainda ter um sistema como o

produção de saúde em termos de território

SUS e o financiar, este não tem sido

e dinâmica da população no mesmo.

suficiente para atingir toda a população de

Localiza-se no espaço onde estão os pobres

crianças e jovens, bem como suas mães.

e famílias na miséria e o lugar onde estão é

Além disso, há denúncias frequentes, nos

o local em que morrem, por ausência de

relatórios do UNICEF, do desvio de

garantia de muitos direitos fundamentais

dinheiro público por inúmeras redes de

que ainda lhes são negados, apesar de já

corrupção, as quais impedem a concre-

Rev. Polis e Psique, 2014; 4(2): 44-64

|60

Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ tização de coberturas significativas no

forças em luta e embate constante. Há uma

cuidado integral e intersetorial em saúde,

polícia discursiva, de acordo com Foucault

em todo o Brasil.

(2004a), que filtra os discursos, apagando

As políticas de descentralização fo-

alguns, jogando luz sobre outros, contro-

ram uma importante conquista das demo-

lando quem fala e o que fala, fixando

cracias atuais, especialmente no Brasil,

limites de fala, estabelecendo critérios para

país com história de um Estado centra-

a fala, qualificando algumas falas, desauto-

lizador, marcado por conluios de cor-

rizando outras; conservando alguns discur-

rupção, de resquícios escravistas, de imen-

sos em arquivos e banindo outros, distri-

sas desigualdades na distribuição de renda,

buindo alguns discursos e impedindo a

de altas taxas de violação de direitos

circulação de outros, defi-nindo fronteiras

básicos, de classes médias que visam a

de discursos em discipli-nas específicas,

buscar mais privilégios que direitos, de

produzindo veneração de determinados

ausência de oportunidades de acesso a um

discursos, recortando-os e os recompondo

conjunto de benefícios educacionais, políti-

sob novas roupagens.

cos, culturais, econômicos, sociais, de

Assim como Foucault enfatizava

mobilidade social e de comunicação, de

que ele captava o intolerável e efetuava

alimentação, de moradia, de lazer, de saúde

uma análise como atitude crítica, forjando

e de trabalho,capazes de fazer romper com

práticas de heterotopias, também visamos

os dramas históricos. O UNICEF, como

agir na inquietude de quem não se

operador político estratégico, fomenta e

conforma com as sujeições atuais e busca

opera a transposição e fixação das políticas

cartografar quais são os novos perigos em

de normalização para o campo de uma

nosso tempo, tentando efetuar uma história

prevenção, educação e promoção de saúde

de nosso presente de mundialização dos

focadas na formação do adulto idealizado

direitos e da cultura. Desejamos captar o

são, legalista, produtivo e dócil.

intolerável da violação de direitos sustentada pela presença ainda intensa das

Considerações finais para uma crítica do

lógicas reducionistas pautadas na ciência

presente

tecnicista hierarquizante dos saberes, nos processos constituintes das políticas da

As mudanças nas leis, nas práticas

vida, no Brasil, em seus atravessamentos

institucionais, nos saberes e nos modos de

com os fluxos internacionais do capital, do

pensar e conceber a criança e o adolescente

direito e da educação, via organizações

constituem um exemplo desse jogo de

multilaterais e suas prescrições as quais

Rev. Polis e Psique, 2014; 4(2): 44-64

|61

Lemos, F.; Galindo, D.; Santos, C.; Rodrigues, R. _________________________________________________________________________ colocam em jogo tantos interesses quanto

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Notas

xia e TDAH: uma análise a partir 1

A autora entende como manual todo

da ciência médica. In: Conselho

documento que possui uma finalidade

Regional de Psicologia de São Pau-

pedagógica.

lo & Grupo Interinstitucional de

2

Magaldi

(2007)

destaca

que

essa

Queixa Escolar (Orgs.). Medicali-

compreensão se ancorava na Encíclica

zação de crianças e adolescentes:

Divini Illiu Magistri, de Pio XI, que a

conflitos silenciados pela redução

apontava como missão natural da família;

de questões sociais a doença de in-

somam-se a isso as outras duas instituições

divíduos. São Paulo: Casa do Psicó-

onde essa educação aconteceria: a Igreja e

logo.

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