Universidade Federal do Ceará-Faculdade de Direito 05 a 07 de dezembro de 2012

October 11, 2017 | Autor: Guilherme Dourado Sá | Categoria: Direito, Unicidade Sindical, Direito Sindical
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Universidade Federal do Ceará- Faculdade de Direito 05 a 07 de dezembro de 2012

UNICIDADE E CRISE DA REPRESENTATIVIDADE SINDICAL NO BRASIL

Resumo Este trabalho objetiva fornecer uma análise concisa da organização sindical brasileira, buscando primeiramente uma conceituação de entidades sindicais, passando a analisar os princípios do sistema sindical brasileiro: os princípios da autonomia e da liberdade. Segue-se ao estudo da unicidade sindical, prevista no art. 8º, II, da Constituição Federal de 1988, que consiste na vedação legal da existência de mais de um sindicato representando uma mesma categoria profissional ou econômica numa mesma base territorial não inferior à área de um município. Fundando-se em uma pesquisa bibliográfica de livros, artigos e periódicos, busca-se construir um estudo acerca da representatividade sindical no Brasil, prejudicada pela adoção do sistema de unicidade, apontada como causa da inércia sindical. Busca também analisar a Convenção nº 87 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), elaborada em 1948, sobre liberdade sindical, que já foi adotada pela maioria dos países desenvolvidos ocidentais, como Alemanha, França e Inglaterra, e que ainda não foi ratificada pelo Brasil por seu teor contrário à Constituição Federal. Elabora-se distinção entre unicidade, unidade e pluralidade, demonstrando porque nesses dois últimos princípios há, efetivamente, uma ampla liberdade de sindicalização e o porquê de os líderes sindicais se posicionarem contra tais princípios que fornecem maiores possibilidades aos sindicalizados. In fine, conclui-se que a unicidade representa uma centralização do poder de representação sindical em um grupo dominante alheio aos interesses dos trabalhadores, mas que esse princípio tem sido questionado por meio de Propostas de Emenda Constitucional apresentadas por diferentes grupos sociais favoráveis à ratificação da precitada Convenção. Palavras-chave: Liberdade sindical. Unicidade sindical. Convenção nº 87 da OIT.

Resumo

This work aims to provide a concise analysis of the brazilian trade union organization, seeking a conceptualization of trade unions, passing to a review of the principles of the Brazilian union: the principles of autonomy and freedom. Proceeds to study the single union, under art. 8, II, of the Constitution of 1988, which is the legal prohibition of the existence of more than one union representing the same economic or professional category in the same territorial basis which cannot be less than the area of a municipality. Based on a literature search of books, articles and journals, it seeks to build a study on union representation in Brazil, hampered by the adoption of the system of single union, pointed as the cause of union’s inertia. It also seeks to analyze the Convention 87 of the International Labour Organization (ILO), established in 1948, about freedom of union association, which was adopted by most of the developed western countries, such as Germany, France and England, and has not yet been ratified by Brazil as its content is contrary to the Federal Constitution. It elaborates distinction between the singleness, unity and plurality union systems, demonstrating why in these last two principles there is indeed a broad freedom to unionize and why union leaders position themselves against such principles, which provide greater opportunities to union members. In fine, it is concluded that the single union represents a centralization of power of union representation in a dominant group alien to the interests of workers, but that principle has been challenged by way of Constitutional Amendment Proposals submitted by different social groups in behalf of the ratification of referred Convention. Key-words: Union freedom. Single union. Convention 87 of the ILO.

Introdução A liberdade sindical e os novos rumos do sindicalismo brasileiro foram temas de seminário promovido pelo Tribunal Superior do Trabalho (TST) e Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT) em abril de 2012. No referido encontro, foi discutido, dentre outros temas, a unicidade como organização sindical frente à Convenção nº 87 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) bem como perspectivas de sua ratificação. Por meio do presente trabalho, fundado em uma pesquisa bibliográfica de livros, artigos e periódicos, busca-se uma análise do sistema sindical brasileiro instituído pela Constituição Federal de 1988. De modo preliminar, objetiva-se a conceituação de entidades sindicais, passando em seguida, à análise dos princípios da autonomia e liberdade sindical. A autonomia sindical confere ao sindicato o poder de autorregulação, afastando-o do controle estatal, e conferindo-lhe aptidão a defender os interesses de seus associados sem submeter-se ao poder público, enquanto a liberdade garante o direito de particulares constituírem sindicato da forma que lhes for conveniente, bem como de filiarem-se a um preexistente. Segue-se com a apresentação do princípio da unicidade no sistema sindical adotado no Brasil pela Constituição Federal de 1988, em seu art. 8º,

II, que consiste na vedação à criação de mais de um sindicato representando uma mesma categoria, seja ela profissional ou econômica, numa mesma base territorial. Busca-se fazer análise teleológica para explicar qual seria a intenção do legislador em adotar tal instituto, relacionando-o, com os demais princípios sindicais, demonstrando em que aspectos os mesmos colidem. Objetiva-se explanar como a unicidade sindical concorre para debilitar a representatividade sindical, originando entidades inoperantes que se desvirtuam do real objetivo dos sindicatos. Frente ao problema da inércia e inoperabilidade sindical, apresenta-se a Convenção nº 87 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), não ratificada pelo Brasil por ser incompatível com a Constituição Federal de 1988, e que prima pela pluralidade sindical ao definir que os Estados devem abster-se de limitar a liberdade sindical de qualquer forma, deixando unicamente a cargo dos particulares o direito de constituir ou não, de filiar-se ou não ao respectivo sindicato. Apresenta-se a pluralidade sindical e sua relação com o sistema de unidade, demonstrando o porquê de ambos os princípios estarem sempre coexistindo de forma latente. Ao final, procura-se apresentar a atuação das lideranças sindicais por meio dos grupos de pressão, ou lobbies, na tentativa de evadir-se do debate sobre o fracasso do sistema da unicidade como garantidor da atuação sindical. Por derradeiro, busca-se apresentar alternativas para preparar o texto da Constituição de modo que se acomode com a Convenção nº 87 da OIT, viabilizando a ratificação do que é considerado o mais importante instrumento normativo desta instituição.

Desenvolvimento 1 Sistema sindical brasileiro 1.1 Conceito de entidades sindicais As associações laborais surgiram nos contornos hodiernos em meados do século XIX, após décadas de clandestinidade, e podem ser conceituadas como entidades associativas de caráter laboral organizadas ao redor de uma mesma categoria profissional ou econômica, reconhecida pelo direito, com personalidade jurídica de direito privado e cujo objetivo é promover a representação dos trabalhadores a elas vinculados na defesa de seus respectivos interesses dentro de uma base territorial previamente determinada não inferior à área de um município.

O ramo do direito do trabalho que trata das relações inter e intra sindicais, bem como entre sindicatos e empregadores de forma direta denomina-se direito coletivo do trabalho, que possui princípios próprios alheios aos do direito do trabalho, uma vez que este é um ramo que sofre fortes influxos do direito público, justificado pela presunção legislativa de desequilíbrio econômico entre seus sujeitos (trabalhador e tomador), surgindo a partir de então seu caráter essencialmente protetivo como forma de eliminar ou, ao menos fictamente, reduzir as desigualdades, equiparando os sujeitos. No direito coletivo do trabalho, ao contrário, prevalece o princípio da autonomia das vontades, que é terem as partes ampla margem de negociação, podendo livremente compactuar acordos ou dirimir seus conflitos de interesses (DELGADO, 2007). Há na doutrina divergências acerca da autonomia desse ramo juscoletivo. Dizse autônomo o ramo do direito que congrega em si objeto, princípios, institutos e legislação próprios. Majoritariamente, tem-se pelo não reconhecimento da autonomia do direito coletivo do trabalho, conforme lição de BARROS (2007) e CASSAR (2008). Para DELGADO (2007) há uma autonomia relativa que dissocia o direito coletivo e individual do trabalho, sem que haja isolamento de ambos os ramos, estando unidos sob a égide de um complexo denominado direito do trabalho. 1.2 Princípios do sistema sindical brasileiro Uma vez feita pertinente distinção, a consequência lógica decorrente das características peculiares ao direito coletivo do trabalho é analisar seus princípios decorrentes, os princípios da liberdade e autonomia sindicais, que tratam da segurança dada às entidades associativas para que possam desempenhar sua função social de defender os interesses de seus representados. Há, ainda, o princípio da unicidade, que baliza os demais, limitando-os, nos termos da lei, no que tange à representação sindical. O princípio da liberdade de associação laboral trata da relação entre particulares ou entre estes e o respectivo sindicato. No primeiro prisma, tem-se como escopo as liberdades de reunião e associação, previstas no art. 5º, XVI, XVII e XVIII da Constituição Federal de 1988, que consistem na possibilidade de trabalhadores ou empregadores reunirem-se e deliberarem pela instituição de uma entidade associativa, no caso, sindical. Essa liberdade conferida especificamente à fundação de associações

laborais é instrumento basilar do direito coletivo do trabalho, motivo pelo qual foi especificamente

mencionado

no

art.

8º,

caput,

CF/88,

reiterando

prévia

instrumentalização constitucional (DELGADO, 2007). Não por acaso o constituinte optou por tal ratificação, vez que liberdade de associação, sobretudo a de caráter laboral, é fundamento de todo Estado democrático, pois possibilita a reunião de indivíduos com ideais convergentes em um organismo mais forte e isto é evidentemente nocivo aos interesses autoritários. Sobre a relação do Estado democrático com as liberdades, tem-se BOBBIO (2000, p. 44): Ideais liberais e método democrático vieram gradualmente se combinando num modo tal que, se é verdade que os direitos de liberdade foram desde o início a condição necessária para a direta aplicação das regras do jogo democrático, é igualmente verdadeiro que, em seguida, o desenvolvimento da democracia se tornou o principal instrumento para a defesa dos direitos de liberdade [...] Todos os Estados autoritários do mundo são ao mesmo tempo antiliberais e antidemocráticos.

O segundo prisma pelo qual a liberdade sindical se apresenta é referente à relação entre o sujeito, seja ele trabalhador ou empregador, e o respectivo sindicato que o representa naquela determinada base territorial, podendo subdividir-se em liberdade negativa e positiva. Esta configura possibilidade de um indivíduo vincular-se e manterse vinculado a sindicato previamente constituído, o que implica na proteção ao direito de filiação e, uma vez filiado, apresenta-se a mais importante segurança conferida ao sindicalizado, que é seu direito de manter-se vinculado enquanto perdure seu animus para tal, evitando dispersões arbitrárias, o que poderia ser utilizado como forma eufêmica de dissolução de uma entidade associativa. Corrobora com tal entendimento SILVA (2009, p. 267), acerca das diferentes faces pelas quais se apresenta o direito de liberdade de associação. A liberdade de associação, de acordo com o dispositivo constitucional em exame, contém quatro direitos: o de criar associação (e cooperativas, na forma da lei), que não depende de autorização; o de aderir a qualquer associação, pois ninguém será obrigado a associar-se; o de desligar-se da associação, porque ninguém poderá ser obrigado a permanecer associado; e o de dissolver espontaneamente a associação, já que não se pode compelir a associação a existir.

A autonomia sindical é o princípio que trata da relação de independência entre sindicato e as empresas ou o Estado. Refere-se à possibilidade de o sindicato ser constituído independente de autorização estatal e de reger-se de acordo com a vontade de seus dirigentes, não se vinculando a interesses alheios aos de seus membros. A autonomia sindical assegura a própria existência do sindicato bem como sua efetiva participação na busca pelos interesses de seus representados. Esta relação de autonomia não poderia existir sem uma forma de sustento do sindicato, que se dá principalmente mediante a contribuição compulsória, cuja legitimidade será questionada adiante. Protegido de influências externas e detentor de subsídios próprios, o sindicato resta constitucionalmente blindado para estar apto realizar seu objetivo maior, que é a defesa dos interesses de seus associados. Sem dúvidas a autonomia e independência dos sindicatos derivam de sua liberdade, e, de fato, nos primórdios do direito sindical, ambos os institutos eram reunidos sob o amplo princípio da liberdade, até que a evolução histórica dessas entidades revelou demasiada importância de autonomia. À época das primeiras regulamentações, predominava a filosofia do Estado intervencionista, de forte atuação nas relações entre particulares, interferindo ativamente dentro dos sindicatos, inclusive com poderes para criar ou extingui-los (SÜSSEKIND, 2005). No contexto pátrio, em 1931, Vargas regulamentou o sindicalismo por meio do Dec. nº 19.770 do mesmo ano, sem, no entanto, reconhecer a autonomia aos sindicatos, submetendo-os ao crivo de seu Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio desde o momento de sua criação até sua deliberação organizacional. Somente a partir da década de 1980 começou a ser reconhecida a autonomia dos sindicatos no Brasil, passando, a partir da promulgação da Constituição Federal de 1988, a ser reconhecida a autonomia sindical constitucionalmente (SÜSSEKIND, 2005). 1.2.1 Unicidade sindical na Constituição de 1988 Liberdade e autonomia sindicais no Brasil, no entanto, não são princípios plenos, uma vez que a Constituição Federal de 1988, seguindo teleologia das constituições anteriores, impôs o princípio da unicidade sindical, que consiste na proibição de criação de mais de uma entidade sindical representante de uma mesma

categoria profissional ou econômica em uma determinada base territorial, a qual não poderá ser inferior à área de um município. Presente no ordenamento pátrio desde a Constituição de 1934, a unicidade sindical foi inspirada na Carta del Lavoro da Itália fascista, que prescrevia: “A organização sindical ou profissional é livre. Mas, só o sindicato legalmente reconhecido e subordinado ao controle do Estado tem direito de representar legalmente toda a categoria dos empregadores ou dos trabalhadores, em virtude da qual é constituído [...]” (FÓRUM SINDICAL DOS TRABALHADORES, 2012, online). Tal princípio foi largamente adotado no início da história dessas associações, no intuito de fortalecer os sindicatos em estágio embrionário, para que, teoricamente, pudessem melhor defender seus associados. Foi, na verdade, instrumento conveniente aos regimes intervencionistas que desejavam manter os sindicatos sob sua custódia. Por meio deste princípio, confere-se aos sindicatos um monopólio na representação dos trabalhadores e empregadores. Ressalte-se que tal princípio não proíbe a criação de entidades laborais em uma mesma base territorial, mas fulmina a possibilidade de escolha do indivíduo no momento em que obriga que a representação sindical se dê por meio de um único dos existentes, vinculando-os ad eternum ao sindicato que primeiro obter registro junto ao Ministério de Trabalho e Emprego, sem permitir qualquer forma de meritocracia. Em suma, a unicidade sindical institui uma corrida contra o tempo cujo prêmio é o direito de exclusividade na tutela da representação de toda a categoria, direito esse que, uma vez concedido, tenderá a permanecer eternamente sob a égide da entidade “vencedora”. Dessa forma, a Lex Constitucionalis, apesar de não vedar a criação de entidades laborais, submete-as a certos requisitos para que detenham caráter de sindicato, conforme explanar-se-á. A entidade sindical propriamente dita é uma associação laboral que, por cumprir trâmite determinado em lei, obteve o registro de seu ato constitutivo no órgão competente. O registro da entidade sindical no órgão competente é ato vinculado, ou seja, não é afetado pela ledice do administrador. Por esse motivo, entende a doutrina (SÜSSEKIND, 2004, p. 390) que a exigência de requisitos legais não configura interferência estatal no funcionamento ou na criação de sindicatos. O Comitê de Liberdade Sindical da Organização Internacional do Trabalho

(tratar-se-á da OIT adiante) manifestou-se nesse sentido: “los Estados quedan libres para fijar en su legislación las formalidades que les parezcan proprias para asegurar el funcionamiento normal de las organizaciones profesionales” (Verbete de jurisprudência nº 275 do precitado Comitê, in OIT, 2005, p. 62). À dictura do verbete, percebe-se ser válida a exigência de formalidade ou procedimento para o registro da entidade sindical, o que é, de fato, pertinente. É natural a previsão de um mínimo formalismo que organize a concessão do registro sindical. Todavia, a formalidade adotada no Brasil para registro de entidades sindicais visa garantir o cumprimento do princípio da unicidade e instituir o monopólio. Conforme MARANHÃO (apud Süssekind, 2004, p. 389): “O registro referido na Constituição constitui, inquestionavelmente, a garantia da unicidade sindical [...]”. Como o Brasil adota o princípio da unicidade sindical, os requisitos para deferimento do registro de sindicato invariavelmente passarão sob o crivo do Ministério do Trabalho e Emprego, órgão competente, para que seja respeitada a unicidade. Não será registrada a entidade disposta a representar uma categoria profissional ou econômica em uma base territorial que já possua sindicato com tal fim, de modo que isso gera um limite à liberdade de associação. Conforme já declinado, a entidade que primeiro se constituir ganhará a proteção do Estado por meio da garantia da unicidade, da não-concorrência, de modo que posteriores entidades terão seu registro indeferido. O indeferimento do registro da associação laboral é séria interferência do Estado na liberdade de associação dos particulares. Analisando a situação de cima para baixo, vislumbrar-se-á meramente um ato administrativo vinculado proferido por um órgão competente em cumprimento do princípio da estrita legalidade. Extirpando o individualismo dos particulares e analisando-os apenas como associação, não se percebe fortes consequências desse ato no âmbito privado, individual. O ato de indeferir o registro de uma associação laboral com intenção de tornarse sindicato é o ato de proibir que um grupo de indivíduos que, teoricamente, tem liberdade, capacidade e maturidade para regerem a si mesmos e instituir associação que as represente na forma de sindicato. Pessoas livres que, no exercício de sua liberdade sindical horizontal, decidem constituir sindicato e pessoas igualmente livres que, no exercício de sua liberdade sindical vertical escolheriam filiar-se àquele sindicato são

impedidas de fazê-lo por determinação do Estado, que intercede em favor de outro grupo de pessoas livres que primeiro lhe bateu às portas. O Comitê de Liberdade Sindical admite a procedimentalização, ou a adoção de certas formalidades para o registro do sindicato, conforme já exposto. Essas formalidades exigidas devem respeitar a autonomia e a liberdade de constituir o sindicato, de forma que não incidam em arbitrariedades do Estado, submetendo as entidades a um processo que, ao invés de ser mera forma de organizar o procedimento de registro sindical, tornam-se instrumentos que coíbem ou impedem o surgimento de novas entidades sindicais. O mesmo Comitê possui jurisprudência no sentido de proteger a liberdade sindical tanto de trabalhadores como empregadores da exigência, por parte do Estado, do princípio da unicidade: “si bien es cierto que los fundadores de un sindicato deben respetar las formalidades previstas por la legislación, a su vez estas formalidades no deben, por su naturaleza, poner trabas a la libre creación de las organizaciones” (Verbete de jurisprudência nº 276 do precitado Comitê, in OIT, 2005, p. 62), e ainda: “los requisitos prescritos por la ley para constituir un sindicato no deben aplicar de manera que impidan o retrasen la creación de organizaciones sindicales, y toda demora provocada por las autoridades en el registro de un sindicato constituye una violación del artículo 2 del Convénio núm. 87.” (Verbete de jurisprudência nº 279 do precitado Comitê, in OIT, 2005, p. 63). 2 Receitas sindicais e contribuição compulsória São receitas sindicais as prestações pecuniárias prestadas pelo associado, seja trabalhador ou empregador, ao respectivo sindicato. No Brasil tem-se quatro espécies de contribuição sindical. As chamadas mensalidades são prestações mensais, como se aufere pela nomenclatura, devidas pelo sindicalizado a seu sindicato. Não são tipicamente sindicais uma vez que as mensalidades são comuns a qualquer tipo de associação. A contribuição assistencial deve ser aprovada em acordos e convenções coletivas e é instituída pelo próprio sindicato extraordinariamente como forma de angariar receitas. A contribuição confederativa é prevista na própria Lex Fundamentalis em seu art. 8º, IV, consistindo na prestação para custear o sistema confederativo

sindical. Somente poderá ser cobrada dos sindicalizados e é destinada a manter o funcionamento da cúpula do sistema sindical brasileiro (DELGADO, 2007). Adotada no Brasil desde a era corporativista de Vargas, a contribuição sindical compulsória é receita colhida anualmente de todos os trabalhadores, empregadores ou mesmo profissionais liberais de determinada categoria, independente de serem associados ou não (DELGADO, 2007). A instituição da contribuição compulsória é um grande incentivo à criação de novos sindicatos, pois as volumosas receitas decorrentes do pagamento obrigatório atraem o interesse de sindicalistas. Movidos quase que exclusivamente pela oportunidade de apropriação da contribuição compulsória, muitos sindicatos são instituídos sem que tenham o menor fulcro de defender e representar os trabalhadores ou empregadores (ROMITA, 2003). A instituição de contribuições sindicais obrigatórias é afronta ao princípio da liberdade sindical, pois obriga a todos a contribuição anual em favor de sindicato, mesmo que este seja inoperante. É fato que a contribuição compulsória oferece atrativos à instituição de sindicatos, mas, aliados, a ganância que atrai e o monopólio da representação, fomentam a criação de sindicatos inoperantes, desestimulados. 3 Representatividade sindical no Brasil A conjuntura do monopólio da representação sindical com a contribuição compulsória faz com que o sistema sindical brasileiro propicie uma germinação de sindicatos inoperantes. Enquanto a contribuição compulsória fornece receitas consideráveis aos líderes sindicais, a unicidade os blinda de qualquer concorrência, qualquer julgamento meritocrático, perpetuando um grupo sindicalista dominante que se beneficia das receitas sindicais em proveito próprio e, sem concorrência, nada os estimula a participar ativamente da defesa e representação da categoria. Protegidos pela unicidade, os sindicatos já constituídos não enfrentam qualquer tipo de concorrência nem se submetem a qualquer controle meritocrático, o que lhe dá uma confortável estabilidade, um comodismo frente a sua real função. Conforme ROMITA (2003), não é de difícil compreensão analisar o porquê da debilidade de alguns sindicatos quando da representação de sua categoria uma vez que sabe-se que o sindicato é protegido constitucionalmente contra outras entidades, não apenas contra o

Estado, como seria o ideal, e que, além de não concorrer com nenhum outro, tem assegurado o recebimento de contribuições obrigatórias impostas a todos, mesmo aqueles que não tem nenhum vínculo com o sindicato, em favor deste. Os defensores da unicidade sindical apresentam argumentos que costumam seguir a mesma linha de raciocínio. Alardeiam que os sindicatos defendem o interesse da categoria e que para isso é necessária uma união entre os trabalhadores de modo a dar ao sindicato um maior poder para lutar por tais interesses. Não por acaso, os defensores da unicidade em grande parte são representantes e militantes dos líderes dos sindicatos, temerosos de perderem o poder frente à liberdade de escolha dos associados. Percebe-se nesse discurso uma lógica perversa, dissimulação ideológica para justificar a consolidação do poder nas mãos dessa classe dominante, que se assume capaz de defender os interesses de todos os seus representados. O que se verifica nos sindicatos hoje é uma consolidação de um grupo dominante alheio aos interesses reais dos trabalhadores. Não há como uma única razão ser capaz de dizer o que é bom e o que não é bom para uma coletividade de trabalhadores. Somente há a real representatividade se houver uma pluralidade sindical, uma opção alternativa, critérios de valoração, de modo que, se um segmento da categoria não se sentir satisfeito com a atuação sindical, poderia, por exemplo, utilizando sua liberdade sindical, desfiliar-se e fundar um novo sindicato que defenda os interesses que esse grupo ache importantes. Se fosse uma reivindicação comum aos demais trabalhadores, este novo sindicato atrairia um número cada vez maior de filiados. Portanto, na pluralidade sindical são os próprios filiados que decidem quais são seus interesses, e não uma casta dominante. O poder de desfiliar-se de um sindicato para se filiar a outro seria o fator de valoração dos sindicatos. Por fim, retomando o exemplo, se o novo sindicato reunisse um grupo considerável de filiados, o sindicato original poderia sentir-se prejudicado e, como forma de retomar seus antigos associados, também lutaria pelos interesses em questão, de modo que, se suas conquistas fossem melhores que as do novo sindicato, os trabalhadores voltariam ao sindicato original. Percebe-se que uma saudável concorrência entre sindicatos é capaz de dar condições laborais muito melhores aos filiados. E é esse o objetivo do sindicato. Não adianta uma classe chegar ao poder e ignorar que o objetivo da entidade é somente lutar por melhores condições de vida para os trabalhadores. Na pluralidade, estes teriam o poder de escolher quem melhor atende

essa função. Discorre Henrique (2012, online), ex-presidente nacional da Central Única dos Trabalhadores: Aproveitando-se da unicidade, muitos sindicatos mantêm um estatuto antidemocrático, que não permite a participação de chapas de oposição nos processos eleitorais que definem a direção da entidade. Assim, torna-se impossível o debate sobre os rumos da entidade e a definição de sua agenda. Muitos dirigentes, encastelados nessa estrutura, permanecem décadas na presidência e, ao final de seus longos mandatos, entronizam em seus lugares parentes ou aliados incondicionais. Com tamanha tranquilidade e conforto, o sindicato se afasta das lutas diárias e quem perde com isso são os trabalhadores, que não tem a quem recorrer.

Do mesmo modo que um único partido político não satisfaz todos os interesses da sociedade e que uma única empresa não é capaz de atender aos interesses de todos os consumidores, um único sindicato jamais atenderia a todos os interesses dos filiados. Se a concorrência entre empresas beneficia os consumidores, por certo a concorrência sindical beneficiaria sua categoria. Os defensores da unicidade tratam o sindicato como um fim e não um meio. Seu fim seria meramente fortalecimento, sem perceber que o objetivo do sindicato é, na verdade, lutar por seus representados. Não necessariamente um sindicato com alto número de filiados seria atuante na defesa de seus interesses. Da mesma forma, um sindicato pequeno pode, sim, fazer ser ouvido perante os demais, se houver interesse e empenho para tal. 4 A Convenção nº 87 da Organização Internacional do Trabalho A Organização Internacional do Trabalho (OIT) é instituição fundada em 1919 que tem objetivos muito amplos e abstratos, muitos dos quais foram inspirados na Declaração da Filadélfia. Estão elencados na Constituição da OIT seus quatro objetivos básicos, a partir dos quais se desenvolvem os restantes: a) promover e cumprir as normas, os princípios e os direitos fundamentais no trabalho; b) gerar oportunidades para que homens e mulheres tenham acesso a empregos dignos; c) ampliar a abrangência e eficácia da seguridade social a todos; e d) fortalecer o diálogo social (VELASCO, 2008). No ano de 1947, o Conselho Econômico e Social da Organização das Nações Unidas apresentou à OIT proposta de que incluísse em seu programa a discussão acerca da liberdade sindical. No ano seguinte, em reunião na cidade de São Francisco, foi aprovada a Convenção nº 87 da OIT, que assegura o direito à sindicalização em relação

ao Estado, posteriormente complementada pela Convenção de nº 98, que se preocupa das relações sindicais horizontais, além de estabelecer diretrizes acerca da negociação coletiva, método autocompositivo de solução de conflitos laborais juscoletivos. Precitada Convenção prevê, em seu art. 2º, que “os trabalhadores e os empregadores, sem distinção de qualquer espécie, terão direito de constituir, sem autorização prévia, organizações de sua escolha, bem como o direito de se filiar a essas organizações, sob a única condição de se conformar com os estatutos das mesmas”, e em seu art. 8º, 2, que “a legislação nacional não deverá prejudicar – nem ser aplicada de modo a prejudicar – as garantias previstas pela presente Convenção”. Desse modo, a Convenção nº 87 da OIT solidifica a ampla liberdade sindical como um dos direitos fundamentais dos trabalhadores, prevendo a opção de fundação de sindicatos concorrentes independente de limitações relativas à base territorial. No ano de 1949, foi apresentada pelo então presidente Eurico Gaspar Dutra ao Congresso Nacional a proposta de aprovação da Convenção, que chegou a ser aprovada na Câmara dos Deputados, mas nunca chegou a ser homologada pelo Senado Federal. Certamente por força da grande influência corporativista remanescente do governo fascista de Getúlio Vargas (influência esta que se faz presente até os dias de hoje) a Convenção jamais teve uma ampla margem de aceitação (ROMITA, 2003). Atualmente, a Convenção já foi ratificada por 151 países, dentre eles a maioria dos países desenvolvidos ocidentais. Ainda assim, países com grande força laboral recusam-se a ratificá-la por pressão de seus poderosos “cartéis” sindicalistas, os chamados trade unions. São eles os Estados Unidos, China, Índia e Brasil (ILO, 2012, online). 4.1 Pluralidade e unidade sindicais A pluralidade sindical, defendida pela OIT por meio da Convenção nº 87 é a obrigação negativa de o Estado não impor qualquer restrição à liberdade de associação laboral. É oposta à unicidade na medida em que permite a livre constituição de sindicatos, a despeito da volúpia estatal. Pluralidade pode ser de facto ou de direito. Nesta, a lei simplesmente não veda a existência de múltiplos sindicatos, mas a vontade dos mesmos pode definir de modo diverso. Se há pluralidade de direito, os sindicatos podem unir-se voluntariamente e instituir um regime de unidade. Na pluralidade de facto, há efetivamente uma variedade de sindicatos representantes de mesma categoria profissional. Há neste uma melhor representatividade, pois a concorrência entre os sindicatos favorece tão somente aos

filiados (SÜSSEKIND, 2004). Em suma, na pluralidade há uma potencial unidade, e esta agrega, potencialmente, aquela. Conforme Verdier (apud SÜSSEKIND, 2000, p. 327), a pluralidade “não exige a pluralidade de fato e se acomoda com a unidade sindical”. Não há restrições ou imposições. Nesses sistemas a decisão cabe aos sindicatos e não ao Estado. É de se notar, portanto, que a maior liberdade das partes encontra-se nos sistemas de pluralidade e unidade. 4.2 Os grupos de pressão política e a manutenção da unicidade Desde a elaboração da Constituição vigente no país há controvérsias acerca da unicidade sindical. Para SÜSSEKIND (2005, p. 1126), a opção por esse modelo de monopólio foi fruto de estranho consenso entre parlamentares do chamado “centrão” na assembléia constituinte junto de líderes sindicais representantes de trabalhadores e empregadores, que, como não poderia deixar de ser, temiam perder o monopólio sindical, frente à liberdade de opção de seus representados. Nesse contexto de nova ordem jurídica a ser inaugurada por meio da assembléia constituinte, instalada em 1º de fevereiro de 1987, à vista da oportunidade de proteger seus interesses próprios com força constitucional, formaram-se os chamados grupos de pressão, que tentaram, e algumas vezes, conseguiram impor sua vontade no texto elaborado. Grupos de pressão são grupos de interesse, ou seja, organizações intermediárias entre o indivíduo e o Estado que representam um interesse incorporado e que buscam guiar as decisões do poder público de modo que beneficiem determinada categoria social (BONAVIDES, 2012). A atuação desses grupos de pressão foi denominada lobby quando, nos Estados Unidos, houve a primeira tentativa de regular a dinâmica de tais grupos. Tentou-se, na ocasião, reconhecer a legitimidade de sua atividade, bem como restringi-la, sobretudo, trazendo-a à luz da democracia como forma de evitar que a força dos lobbies fosse utilizada para interesses ilegais ou obscuros. Hodiernamente, é inquestionável que a atividade dos grupos de pressão produz resultados negativos e positivos (BONAVIDES, 2012), estando estes orbitando, principalmente, o dinamismo democrático, bem como a representatividade de interesses plurais. A força dos grupos de pressão pode ter aspecto positivo a depender do objeto e da legitimidade do interesse pelo qual advogam. Como qualquer força, poderá ser utilizada para bem ou para mal. No entanto, surge a problemática da utilização desses grupos de pressão para patrocínio de interesses eminentemente individuais à revelia do Estado democrático. Por

meio dos grupos de pressão, poderiam seus beneficiários utilizar-se do poder político, por exemplo, na elaboração de leis viciadas, subjugando todo o restante da sociedade os seus ideais por meio de engenharia social, criando uma “democracia” condicionada aos interesses de uma classe dominante, que, por não ser diretamente política, poderia perpetuar-se no poder impondo seus interesses de forma indireta. A representação e os governos são apenas a superfície que oculta as forças vivas e condicionantes do processo governativo, forças que jazem quase sempre invisíveis ao observador desatento. Toda razão tem Charles E. Gilbert quando sustenta que de último os mais importantes problemas da representação provavelmente se acham no interior dos grupos e não dos governos. Têm sede, portanto, nos chamados “grupos de pressão”. (BONAVIDES, 2012, p. 235)

No âmbito da liberdade e autonomia sindical, faz-se contundente analisar o contexto em que deliberou-se pela manutenção de institutos superados na ampla maioria dos países desenvolvidos (ILO – INTERNATIONAL LABOUR ORGANIZATION, 2012, online) que guarda resquícios do superado modelo corporativista fascista em uma Constituição com aspirações democráticas. A

força

das

lideranças

sindicais,

representadas

na

constituinte

predominantemente pelos partidos de cunho socialista, que tiveram berço nos movimentos e lutas operárias, fez com que houvesse certo consenso na opção pelo regime de monopólio da unicidade sindical. Para SÜSSEKIND (2005, p. 1126), deu-se um “acordo exótico entre parlamentares do centro e algumas lideranças sindicais de trabalhadores e empresários.”. As pressões exercidas pelos líderes sindicais abafam discussões mais aprofundadas sobre o tema no âmbito político. Sem um debate aberto, os interessados acabam por estigmatizar qualquer discurso em prol da pluralidade, da liberdade sindical. Dessa forma, os grupos de pressão interessados em manter a unicidade consolidam o status quo, impondo seus interesses de manter o domínio sobre os sindicatos à revelia dos reais interesses e necessidades da sociedade (ROMITA, 2003). Para BONAVIDES (2012, p. 234), a presença dos grupos de pressão desvirtua a expressão da legítima vontade popular, uma vez que fazem seu discurso parecer mais forte pela mera desconsideração dos argumentos contrários: Busca-se, portanto, a “identidade”, proclama-se sua importância para atestar o legítimo caráter democrático das instituições representativas, mas quando se põe em movimento a operação política que há de captá-las, o que se colhe é frustratório desse empenho. Não fala a vontade popular, não falam os cidadãos soberanos de Rousseau; fala, sim, a vontade dos grupos, falam seus

interesses, falam suas reivindicações.

4.3 Perspectivas de ratificação da Convenção nº 87 da OIT As convenções e tratados internacionais, em regra, quando de sua ratificação, adentram no ordenamento jurídico brasileiro com força de lei ordinária. No Brasil, como a Constituição Federal prescreve de modo adverso à referida Convenção, não é possível sua ratificação nos hodiernos termos Constitucionais. As soluções possíveis para esse impasse são a alteração do texto da Lex Constitucionalis no que colidir com a Convenção ou a utilização de instituto acrescido pela Emenda Constitucional nº 45, o procedimento especial previsto no art. 5º, § 3º, da Lex Fundamentalis, o qual prescreve que os tratados e convenções internacionais que versem sobre direitos humanos adentrarão no ordenamento pátrio com hierarquia equivalente à de Emenda Constitucional desde que siga o rito de votação em dois turnos em cada Casa do Congresso Nacional e obtenha aprovação de, pelo menos, três quintos dos votos dos respectivos membros de cada Casa. Ambos os casos serão objeto de análise a seguir. 4.4 Propostas de Emenda à Constituição apresentadas Conforme exposição prévia, uma das formas de propiciar eventual ratificação da Convenção nº 87 é promovendo alteração do texto constitucional. Nesse caso, a solução seria formular uma alteração formal do texto da Carta Magna por meio de uma Emenda Constitucional. Por força do art. 60, CF/88, as Propostas de Emenda à Constituição (PEC) deverão passar por votação em ambas as Casas do Congresso Nacional, em dois turnos cada, necessitando da aprovação por mais de três quintos dos membros correspondentes a cada Casa. Modificando o texto constitucional de forma a harmonizá-lo ao da Convenção, está estará apta à ratificação. Somente seguindo esse rito no Poder Legislativo é que a Convenção poderá ser ratificada pelo Poder Executivo. Já em 1998, o então presidente Fernando Henrique Cardoso apresentou ao Congresso Nacional Proposta de Emenda Constitucional que alteraria, dentre outros, o art. 8º da Constituição (PEC nº 623/98) e se propunha a extinguir o sistema de unicidade sindical dando nova redação ao caput e aos incisos do precitado artigo. Ainda no ano de 2000, tal PEC foi arquivada. Segundo ROMITA (2003, p. 9): “Certamente, os tempos ainda não estavam maduros para a implantação da liberdade sindical no Brasil. Os interesses pessoais afetados pelas transformações são de grande monta. A resistência às mudanças é fortíssima”.

Nos anos seguintes, anteprojetos foram apresentados pela CUT (Central Única dos Trabalhadores) sem obter maiores repercussões jurídicas. A proposta apresentada pela CUT previa um regime de transição por meio de ultratividade das convenções e acordos coletivos vigentes (ROMITA, 2003). Em 2003, foi apresentada a PEC nº 29/03, que também previa modificação na estrutura sindical, com ênfase na abolição da unicidade e da contribuição sindical compulsória. Seguiu a mesma linha das propostas anteriores, sendo arquivada em janeiro de 2011 e desarquivada em fevereiro do mesmo ano. Encontra-se atualmente na Câmara dos Deputados aguardando designação de relator. A mais recente, a PEC nº 369/05, também se propõe a extinguir a unicidade, mas realizando profundas reformas no sistema sindical brasileiro ao instituir a negociação coletiva para os servidores da administração pública e o incentivo à arbitragem para solução de conflitos trabalhistas. Esta PEC encontra-se aguardando parecer na CCJC. Restam infrutíferas todas as propostas de reforma do texto constitucional. Os interesses da alta cúpula sindical, aliada a sua grande representatividade por meio dos partidos políticos que construíram seus patamares eleitorais no movimento sindical da década de 1980, acabam por enrijecer toda e qualquer iniciativa de debate e releitura do dispositivo constitucional. 4.5 A ratificação conforme o art. 5º, § 3º da Constituição Federal de 1988 Introduzido na Constituição de 1988 por meio da Emenda Constitucional de nº 45, o § 3º do art. 5º da Lex Fundamentalis instituiu o reconhecimento de hierarquia supra legis às convenções e tratados internacionais que versem sobre direitos humanos. Conforme já exposto, para que a norma adentre ao ordenamento jurídico pátrio com esse caráter supra legal faz-se necessário rito de aprovação idêntico ao das Propostas de Emenda Constitucional em que se exige votação em dois turnos de votação em cada Casa do Congresso Nacional, obtendo aprovação de três quintos dos membros em cada. Restam as mesmas críticas referentes à dificuldade de se aprovar Emenda Constitucional sobre o assunto. Conforme exposto acima, como é necessária a aprovação de pelo menos três quintos dos membros de ambas as casas do Congresso Nacional é preciso haver uma grande mobilização nacional com interesses convergentes em favor da Emenda Constitucional e da Convenção, o que não ocorre. Em termos de liberdade sindical, o Brasil ainda possui heranças de sua história corporativista, de modo que a tendência dos líderes sindicais é manter sua unicidade, evitando a

concorrência entre sindicatos e mantendo os trabalhadores presos a um sindicato único, ainda que inoperante (ROMITA, 2003).

Conclusão Por meio do presente trabalho, conclui-se que sindicatos são entidades associativas de caráter laboral cujo objetivo é promover a representação e defesa dos interesses de sua categoria. São três os princípios do sistema sindical brasileiro. O princípio da liberdade garante ao indivíduo o direito de se filiar a uma entidade já existente, bem como de constituir uma nova. O princípio da autonomia trata da capacidade de auto-organização sindical frente ao Estado. O terceiro princípio trata da organização sindical no Brasil e é elencado pela Constituição Federal de 1988 em seu art. 8º, II, que adotou o princípio da unicidade sindical, consistente na vedação de criação de mais de um sindicato representante de uma mesma categoria profissional ou econômica em uma mesma base territorial, a qual não poderá ser inferior a um município. A unicidade foi inspirada na Carta del Lavoro da Itália fascista e confere monopólio da representatividade sindical à entidade que primeiro tiver deferido seu ato constitutivo no órgão competente, vinculando todos os trabalhadores e empregadores de determinada categoria àquele sindicato. A unicidade é uma mitigação aos demais princípios na medida em que impede que indivíduos livres e capazes exerçam sua liberdade para constituir sindicato se outro já tiver obtido registro no órgão competente. Ao existir apenas um sindicato representando uma mesma categoria profissional e este depender de registro no Ministério do Trabalho e Emprego para funcionar, tem-se uma ameaça à própria autonomia do sindicato, que passa a depender do crivo estatal para funcionar. Conclui-se que a Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 1948, elaborou a Convenção de nº 87, não ratificada pelo Brasil por contrariar a Constituição de 1988. Nessa Convenção, define-se que o Estado não pode interferir de forma alguma na liberdade sindical, devendo abster-se de legislar mitigações a tal princípio. Ao recomendar a ampla liberdade sindical, a OIT defende a pluralidade, que é a possibilidade de existência de mais de uma entidade sindical representante de uma mesma categoria em determinada base territorial. A pluralidade sindical consiste na mera abstenção do Estado em limitar a liberdade de constituir sindicatos, de modo que

não é necessário haver efetivamente vários sindicatos concorrentes. Na pluralidade, os sindicatos podem unir-se e atuarem em regime de unidade sem que aquele sistema seja ferido. Enquanto a Carta Magna permanecer com sua redação atual, é impossível a ratificação da Convenção, motivo pelo qual foram apresentadas diversas Propostas de Emenda Constitucional, todas infrutíferas. A partir de 2004, com o advento da Emenda Constitucional nº 45 e o acréscimo do § 3º ao art. 5º da Lex Fundamentalis, seria possível a ratificação da Convenção sem vício de inconstitucionalidade, obtendo hierarquia de Emenda à Constituição ao seguir o rito previsto naquele dispositivo. No entanto, a atuação dos grupos de pressão, chamados lobbies, representantes dos grandes líderes sindicais dificulta iniciativas em sentido favorável à ratificação da Convenção.

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