Uso de Mapas Conceituais: percepções sobre a construção

July 22, 2017 | Autor: Sylvia De Chiaro | Categoria: Mapas Conceituais, Aprendizagem Significativa, Ensino Aprendizagem
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ARTIGO Ciências & Cognição 2013; Vol 18(2) 158-171 © Ciências & Cognição Submetido em 28/09/2012│Revisado em 08/10/2013│Aceito em 15/10/2013│ISSN 1806-5821 – Publicado on line em 20/12/2013

Uso de Mapas Conceituais: percepções sobre a construção de conhecimentos de estudantes do ensino médio a respeito do tema radioatividade Using Concept Maps: perceptions about building knowledge of high school students on the radioactivity subject Kátia Aparecida da Silva Aquino a, Sylvia De Chiaro b *

Centro de Educação, Colégio de Aplicação, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil; b Centro de Educação, Departamento de Psicologia e Orientação Educacionais, Universidade Federal de Pernambuco, Recife, Pernambuco, Brasil. a

Resumo

Abstract

Este trabalho destina-se a investigar as contribuições dos mapas conceituais na análise da construção do conhecimento relacionado ao tema Radioatividade no ensino de Química com estudantes do terceiro ano do ensino médio, tendo como paradigma teórico a Aprendizagem Significativa de David Ausubel. Tal teoria compreende que o aprendiz se apropria do conhecimento, por elaboração pessoal, a partir de conceitos pré-existentes em sua estrutura cognitiva, que vão se modelando e se aprimorando por diferenciação progressiva e/ou reconciliação integrativa no decorrer do processo de ensino e aprendizagem. Partindo dessa teoria, Joseph Novak desenvolveu a metodologia de mapas conceituais, no sentido de representar como o conhecimento é armazenado na estrutura cognitiva de um estudante. Utilizando como categorias de análise a diferenciação progressiva e a reconciliação integrativa, mapas conceituais de dois estudantes, antes e depois da referida unidade temática, são estudados para a compreensão da organização conceitual que os estudantes atribuíram ao tema. As análises mostram que os mapas conceituais constituem-se em recurso privilegiado de acompanhamento do processo ensino e aprendizagem dos estudantes por seus educadores.

This study aims to investigate the contributions of conceptual maps in the analysis of the construction of knowledge related to the topic Radioactivity in chemistry teaching. Theoretical paradigm of Meaningful Learning from David Ausubel study was utilized with students of high school (third year). This theory includes the learner appropriates the knowledge, personal development, from pre-existing concepts in their cognitive structure, which will be shaping and tweaking by progressive differentiation and/or integrative reconciliation in the process of teaching and learning. Based on this theory, Joseph Novak developed the methodology of conceptual maps, to represent how the knowledge is stored in the cognitive structure of a student. Conceptual maps of two students before and after this thematic unit were studied using as categories of analysis the progressive differentiation and the integrative reconciliation. These aspects were used for understanding the conceptual organization that students assigned to the radioactivity theme. The analysis shows that concept maps are a privileged resource monitoring the teaching and learning processes of students by their teachers.

Palavras-chave: mapas conceituais; radioatividade; ensino de química; diferenciação progressiva; reconciliação integrativa

Keyword: concept maps; radioactivity; chemistry learning; progressive differentiation; integrative reconciliation

S. De Chiaro - Centro de Educação, Departamento de Psicologia e Orientação Educacionais, Universidade Federal de Pernambuco. Av. da Arquitetura s/n Cidade Universitária Recife, PE, cep 50.740-550. e-mail: [email protected] 158

Artigo

1. Introdução O tema Radioatividade tem sua fundamentação teórica na área de ciências exatas, especificamente na parte de Física moderna, contudo é na disciplina de Química que o estudante tem acesso ao estudo deste tema no ensino médio. Vale salientar que o tema Radioatividade não é algo totalmente desconhecido pela maioria dos estudantes. Várias notícias circulam pelos principais meios de comunicação e sempre são acompanhadas por análises envolvendo caos e destruição, como aconteceu no ano de 2011, a partir do acidente nuclear de Fukushima no Japão. Ao se iniciar a discussão sobre radioatividade no ensino médio, encontramos estudantes ávidos por informações e a surpresa dos mesmos é de muita notoriedade quando se discute as suas aplicações benéficas. Sair da proposta do livro didático, principal recurso utilizado por professores, que caminha apenas para os grandes acidentes nucleares e aplicações de fórmulas, dá ao estudante a oportunidade de se posicionar de forma crítica sobre o que de real permeia um tema tão controverso. No ensino de Química é comum a associação de fenômenos que acontecem no cotidiano com os assuntos abordados na sala de aula e acreditamos que as informações sobre tais fenômenos podem se transformar em dúvidas por parte dos estudantes. Esta ação acontece pelo simples fato dos estudantes procurarem dar sentido às inúmeras situações com as quais se defrontam em suas vidas. Assim eles já chegam às aulas de Química com ideias sobre vários fenômenos e conceitos científicos. Para a maioria dos estudantes suas concepções prévias fazem sentido e o que eles aprendem em sala depende tanto de tais concepções prévias como das características do ensino que o professor quer promover. No entanto, nem sempre o conhecimento prévio pode ser considerado uma variável facilitadora, em alguns casos pode até prejudicar o entendimento de um novo conhecimento. Com o tema radioatividade, por exemplo, é comum os estudantes apresentarem alguns conhecimentos prévios que podem se tornar agentes bloqueadores do entendimento do decaimento radioativo. Tal fenômeno está diretamente ligado à compreensão do comportamento do átomo, que para muitos estudantes, é uma 159

bolinha (modelo de Dalton). Complementando tal visão, os átomos são representados por bolinhas que se unem para formar moléculas na maioria dos livros didáticos. Esta representação, bem como a representação de sistema planetário proveniente do modelo atômico do Rutherford para o átomo dificulta imensamente a aprendizagem do que significa uma partícula elementar como o quark no núcleo atômico e sua atuação para promover um decaimento radioativo na perspectiva da Mecânica Quântica. Não estamos falando que entender a Mecânica Quântica seja tarefa fácil, mas os conhecimentos gerados em Química Geral sobre o átomo, de fato contribuem para tal dificuldade e o conhecimento prévio nesta área se torna, segundo Bachelard (1996), um obstáculo epistemológico. Para alguns estudantes se torna mais fácil a memorização de conceitos sem que este estejam interligados diretamente ou ligados de forma arbitrária com algum conhecimento prévio, desta forma a nova informação não faz sentido para o estudante e se estabelece, o que Ausubel (1968) classifica, a aprendizagem mecânica. Normalmente o indivíduo constrói tal aprendizagem por recepção quando a nova informação lhe é apresentada na sua forma final ou por descoberta quando o conteúdo base para nova informação é descoberto pelo estudante (Moreira, 2006). Por outro lado, quando uma nova informação interage com um conhecimento prévio, provocando uma mudança tanto de um quanto do outro a partir de um acerto conceitual, o novo conhecimento passa a ter sentido ou significado para o estudante e acontece o que Ausubel classifica de aprendizagem significativa. Assim, a teoria da aprendizagem significativa tem como base o princípio de que o armazenamento de informações ocorre hierarquicamente dos mais gerais para os mais específicos a partir da organização dos conceitos e suas relações. Para Ausubel (1968) o conhecimento prévio que permite a aprendizagem significativa é um subsunçor, ou seja, um conhecimento que serve de âncora para o novo conhecimento na estrutura cognitiva do indivíduo. Subsunçores se configuram como conceitos, proposições, modelos

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mentais, concepções, ideias e representações sociais já existentes na estrutura cognitiva de quem aprende. Mas e se não houver uma informação que sirva de subsunçor na estrutura cognitiva do estudante para uma nova informação? Ausubel sugere os organizadores prévios que são recursos instrucionais apresentados em um nível mais alto de abstração, generalidade e inclusividade em relação à nova informação (Moreira, 2006). Dentre as possibilidades para organizadores prévios, que podem ser utilizados antes de se ensinar um novo assunto, destacamos o uso de uma pergunta ou texto introdutório, a exploração de uma situação-problema, o uso de um documentário, uso de simuladores ou de animações (mais especificamente no ensino de Ciências). A construção de um novo subsunçor requer captação do conhecimento e sua internalização, por isso é um processo lento e que exige esforços tanto do professor quanto do estudante (Gowin, 1981). Tal como na aprendizagem mecânica, o indivíduo constrói a aprendizagem significativa por recepção ou por descoberta. Aprender por recepção é a forma mais comum e significa, como já citado, que o estudante não precisa descobrir para aprender. Contudo, a aprendizagem significativa por recepção requer do estudante que ele relacione os novos conhecimentos com aqueles já existentes na estrutura cognitiva, envolvendo processos de captação de significados e ancoragem. Já a aprendizagem por descoberta implica no campo da aprendizagem significativa que o estudante primeiramente descubra o que vai aprender contudo, subsunçores adequados e relevantes são exigidos (Ausubel, 2003; Moreira, 2006). No ensino de Química pode acontecer a aprendizagem significativa e das duas formas, pois no caso de se utilizar experimentos, por exemplo, como estratégia de ensino é propiciada a recepção da nova informação ao passo que novas descobertas vão sendo realizadas através da observação de tais experimentos. É importante salientar que as duas aprendizagens, mecânica e significativa, não são dicotômicas, mas fazem parte de duas dimensões independentes ou contínuas: o contínuo aprendizagem mecânica/aprendizagem significativa e o contínuo aprendizagem por recepção/aprendizagem por descoberta onde se tem cada uma

em um extremo. A aprendizagem mecânica pode contribuir para que o estudante aprenda significativamente no momento em que o elemento já incorporado na estrutura cognitiva do indivíduo de forma mecânica se torna uma ancora para um novo conhecimento. Contudo, nesta relação, a nova interação não é apenas um processo estático de mera ancoragem, mas sim um processo dinâmico, onde o produto interacional representa um novo subsunçor na estrutura cognitiva do indivíduo (Moreira e Ostermann, 1999). Não se pode deixar de acrescentar que para a promoção da aprendizagem significativa são necessárias duas condições fundamentais: 1) o estudante precisa ter uma disposição para aprender, ou seja, ter vontade de relacionar o novo conhecimento com um subsunçor que deve existir na sua estrutura cognitiva e 2) o material instrucional deve ser potencialmente significativo com conteúdo estruturado de maneira lógica (Ausubel, 2003). No ensino de Química a utilização de experimentos pode ser um bom caminho para atender a segunda condição e na ausência de laboratórios ou materiais específicos, os simuladores de fenômenos químicos podem ser uma ótima opção. No caso do ensino de radioatividade, em que a manipulação de compostos radioativos é proibida, simuladores e animações podem se tornar um recurso altamente significativo. Além dos recursos didáticos, as atividades realizadas em pequenos grupos também têm grande potencial para facilitar a aprendizagem significativa porque viabilizam a captação/negociação de significados e colocam o professor na posição de mediador do processo. É importante adicionar que, o significado do material é dado pelo indivíduo e não o contrário. As aprendizagens subordinada, superordenada e combinatória são categorias da aprendizagem significativa (Ausubel, Novak & Haneian, 1980). A aprendizagem subordinada acontece quando o novo conhecimento interage com subsunçores, tornando-se significativo. Quando a modificação do subsunçor é bastante acentuada ou é um exemplo que alarga o significado de algo mais amplo que já se sabe resulta em uma aprendizagem subordinada correlativa. Porém quando a nova ideia é um exemplo, uma especificação de algo que já se sabe ou apenas corrobora, refor160

ça o subsunçor, é promovida uma aprendizagem subordinada derivativa (Ausubel, 2003). Com o assunto radioatividade, por exemplo, quando o estudante entende que a saída de um neutrino é de fundamental importância para a conservação de quantidade de movimento no decaimento beta acontece uma subsunção derivativa, pois ele reforça que as leis de conservação servem para qualquer fenômeno e o decaimento beta é mais um exemplo. Agora quando o estudante aprende que para acontecer um decaimento beta em um núcleo atômico instável, um nêutron se transforma em um próton e este fenômeno só é possível porque estas partículas não são elementares e sim uma junção de quarks (partículas ainda menores que os prótons e nêutrons) acontece a subsunção correlativa. O novo conceito relacionado com os quarks provavelmente modificará o conceito sobre as partículas que compõem núcleo atômico, aprendido nos primeiros estudos do indivíduo na disciplina Química. Na aprendizagem superordenada uma ideia mais geral se forma a partir de subsunçores, os organizando como partes de tal ideia. Neste tipo de aprendizagem não é necessária uma ideia nova a ser assimilada, uma vez que um novo conhecimento vai ser adquirido a partir da realização de novas interações entre subsunçores que já estão presentes na estrutura cognitiva do estudante. Assim, a aprendizagem superordenada envolve os processos de abstração, indução e síntese de novos conhecimentos que passam a subordinar o subsunçores que lhes deram origem (Moreira & Masini, 1982). Um bom exemplo deste tipo de aprendizagem pode ser quando o estudante aprende que um núcleo radioativo é caracterizado pelo seu excesso de energia. Desde seus primeiros contatos com a química o estudante aprende o conceito de átomos e sabe que estes são a parte fundamental de toda a matéria que o circunda. Estudar radioatividade é entender que nem sempre os átomos são estáveis e para se estabilizarem ejetam partículas e ondas eletromagnéticas do núcleo para perder energia (decaimento radioativo). Moléculas que perdem energia ou a transformam é algo muito vivenciado no ensino de Química. Assim, todas as informações necessárias para o entendimento geral de um decaimento radioativo já estão presentes na estrutura 161

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cognitiva do estudante, organizar tais ideias permite o bom entendimento de tal fenômeno. Quando uma aprendizagem não é subordinada ou superordenada pode ocorrer então a aprendizagem combinatória, pois não se liga a conceitos ou proposições específicas. A aprendizagem combinatória pode ser entendida como aprendizagem de proposições mais amplas, mais gerais do que aquelas que já existem na estrutura cognitiva. Um novo conhecimento implica na interação com vários outros conhecimentos já existentes na estrutura cognitiva, inclusive conhecimentos de outras áreas, de outros domínios que não aquele que está sendo foco no momento, mas não é nem mais importante e nem mais específico do que os conhecimentos originais. Por exemplo, para entender o significado da lei de Soddy para os decaimentos alfa e beta não basta saber os conceitos envolvidos em radioatividade é preciso um conhecimento mais amplo não só da Química quanto de Física também e estes já devem estar na estrutura cognitiva do indivíduo. Do ponto de vista processual, a aprendizagem significativa pode ocorrer por meio da diferenciação progressiva e/ou da reconciliação integrativa (Moreira, 1980). Ambos fazem parte da dinâmica da estrutura cognitiva. Na diferenciação progressiva um determinado conceito é desdobrado em outros conceitos que estão contidos, ou em parte ou integralmente, em si. Um exemplo deste processo se dá quando o estudante consegue relacionar um decaimento radioativo a partículas (comportamento corpuscular) e ondas eletromagnéticas (comportamento geral ondulatório). Assim, existe uma diferenciação progressiva, pois foi possível apresentar as diferentes instâncias (onda e partícula) de um conceito complexo (decaimento radioativo). A diferenciação progressiva normalmente está presente na aprendizagem significativa subordinada. Já na reconciliação integrativa, é provocada a integração de instâncias particulares de um conceito no próprio conceito, ou seja, partindo dos conceitos mais específicos há uma integração sucessiva até os conceitos mais gerais. Neste processo um determinado conceito é relacionado a outro aparentemente sem nenhuma ligação com o primeiro. Acontece, por exemplo, quando o estudante compreende os conceitos relacionados

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aos quarks, bósons e léptons (Física Moderna) para organizar as ideias sobre átomo (Química) e entender sua instabilidade nos fenômenos radioativos (Físico-Química). Normalmente a re-

conciliação progressiva ocorre na aprendizagem significativa superordenada ou na aprendizagem significativa combinatória.

Figura 1. Mapa que resume as principais ideias sobre como se processa a aprendizagem na estrutura cognitiva de um indivíduo.

Na aprendizagem significativa, o indivíduo não é um receptor passivo. Longe disso ele se torna protagonista nos processos de ensino e aprendizagem. Ele deve fazer uso dos significados que já internalizou, de maneira substantiva e não arbitrária, para poder captar os significados trazidos pelo professor/mediador e construir novos. Nesse processo, ao mesmo tempo em que está progressivamente diferenciando sua estrutura cognitiva, está também fazendo a reconciliação integradora de modo a identificar semelhanças e diferenças e reorganizar seu conhecimento. Assim, no processo de aprendizagem significativa não existe a diferenciação progressiva sem que haja a reconciliação integrativa dada a grande relação estabelecida entre eles (Moreira, 1980). A partir da Figura 1 procuramos mapear os conceitos trabalhados até o momento buscando resumir como pode se construir a aprendizagem. Baseado na teoria da aprendizagem signifi-

cativa, Novak (1990) desenvolveu a metodologia de mapas conceituais, procurando representar como o conhecimento é armazenado na estrutura cognitiva de um estudante. Conceito é um termo que representa uma série de objetos, eventos ou situações que possuem atributos comuns. Com o uso de mapas conceituais, o conhecimento pode ser exteriorizado através da utilização de conceitos e palavras de ligação, formando proposições que mostram as relações existentes entre conceitos percebidos por um indivíduo (Cañas, Ford & Coffey, 2000; Moreira, 1992), como exemplificamos a partir da construção do mapa da Figura 1. Segundo Novak e Gowin (1999), os mapas são indicadores relativos do grau de diferenciação dos conceitos porque representam ligações específicas entre eles. Existe uma variedade de tipos mapas disponíveis, que foram imaginados e construídos pelas mais diversas razões. Alguns mapas estão descritos na Tabela 1. A escolha de um ou outro tipo de162

pende de fatores como a facilidade de elaboração (tipo aranha), pela clareza na explicação de processos (tipo fluxograma), pela ênfase no produto que descreve ou pela hierarquia conceitual que

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apresenta (Tavares, 2007). Porém, o único tipo de mapa que explicitamente utiliza uma teoria cognitiva em sua elaboração é o mapa hierárquico do tipo proposto por Novak e Gowin (1999).

Tabela 1. Tipos de mapas mais importantes Tipo do mapa Teia de aranha

Fluxograma

Hierárquico

Descrição Tema central no meio do mapa com os conceitos que se irradiam deste centro sem nenhuma preocupação com relações hierárquicas ou interligações entre informações. As informações estão ligadas por uma ordem lógica e sequencial sem preocupação de explicar um determinado tema. Este mapa é utilizado quando se quer mostrar um processo e geralmente inclui um ponto final e um ponto inicial. As informações são interligadas em uma ordem decrescente de importância. Neste mapa os conceitos mais importantes ficam explícitos e os menos importantes se inter-relacionam. Este mapa, embora seja o mais difícil de externar, representa melhor a clareza do seu autor sobre determinado tema.

Estudar ou produzir um mapa conceitual durante o processo de aprendizagem de um determinado tema proporciona ao estudante não só o entendimento dos conceitos e interligações relacionados a este tema, como poderá proporcionar a percepção de lacunas que poderá levar à procura de materiais instrucionais. Este processo dinâmico facilita a construção de significados sobre o conteúdo que está sendo estudado. O mapa conceitual então se constitui em uma ferramenta de aprendizagem para o estudante, à medida que auxilia no planejamento dos estudos, preparação para avaliações e resolução de problemas. Um mapa conceitual apresenta uma visão idiossincrática de um indivíduo sobre a realidade a que se refere, logo não existe mapa certo ou errado. Existe uma representação de como se ligam os conceitos em sua estrutura cognitiva tornado

clara tanto a diferenciação progressiva como a reconciliação integrativa. Por isso, os mapas conceituais podem também ser utilizados pelo professor como uma ferramenta de avaliação ou auxiliar na preparação de suas aulas, tornando claros os conceitos ou preenchendo as lacunas apresentadas pelos estudantes nos seus respectivos mapas conceituais (Moreira, 1984, 1998; Tavares, 2008). Nesta direção, procurou-se neste trabalho utilizar os mapas conceituais como instrumento didático tanto para identificação de conhecimentos prévios sobre o tema radioatividade como para obter uma visualização da organização conceitual que o estudante atribuiu após ações pedagógicas sobre o referido tema, nos permitindo uma maior compreensão sobre o processo de aprendizagem do mesmo.

2. Metodologia A construção de mapas conceituais foi realizada por estudantes de uma turma de terceiro ano do ensino médio do Colégio de Aplicação da Universidade Federal de Pernambuco (CAp/UFPE). Tal turma era composta de 29 estudantes com 3 horas/aula de Química semanais. O tema escolhido foi Radioatividade, cujas discussões aconte163

ceram através de debates que foram seguidos de aulas expositivas com ênfase na contextualização do tema, ou seja, as aulas foram guiadas a partir da exposição de como a radioatividade ambiental está presente no cotidiano de cada pessoa na sociedade. Trabalhar a radioatividade ambiental e as aplicações da energia nuclear tinha como o objeti-

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vo mostrar para os estudantes que os fenômenos radioativos não se limitam a produção de energia ou material bélico e desta forma enriquecer o debate e promover a reflexão O tema radioatividade é usualmente trabalhado na disciplina de Química, no segundo ano do ensino médio, contudo no CAp/UFPE este tema é trabalhado no início do terceiro ano do ensino médio, o que significa que, do ponto de vista do ensino formal, os alunos analisados estavam tendo sua primeira experiência com a temática. Os processos de ensino e aprendizagem conduzidos de maneira usual são apoiados em livros texto e poucas informações contextualizadas sobre o tema radioatividade são encontradas nestas fontes. Quase sempre os livros didáticos terminam seus capítulos de Radioatividade descrevendo os principais acidentes nucleares, o acidente radiológico que aconteceu em Goiânia, no Brasil e as lamentáveis bombas de Hiroshima e Nagasaki. Para dar outro direcionamento nos debates em sala de aula os estudantes analisavam fatores da atualidade, além de discussões sobre a Radioatividade na água e alimentos (radioatividade ambiental) justamente para proporcionar um trabalho contextualizado. Mais especificamente, depois de solicitada a construção do primeiro mapa conceitual, a primeira ação sobre o tema em sala foi a discussão do grupo classe utilizando a frase geradora: “Radioatividade: vida ou morte?”. Por ser um tema controverso, socializar as concepções prévias de

cada aluno em um debate, além de contribuir para expressarem suas opiniões, possibilitou possíveis mudanças em suas concepções, pela exposição de argumentos de outros estudantes. As ações seguintes ao debate foram aulas expositivas dialogadas com ênfase na contextualização usando as aplicações nucleares. Procurou-se ministrar nas aulas uma orientação ausubeliana, no sentido de conceitos mais gerais a serem apresentados primeiro e os desdobramentos que se seguem (Moreira, 1984). As construções dos mapas conceituais aconteceram em dois momentos: 1) Momento 1: antes do debate em sala de aula que foi pautado na radioatividade ambiental e da aula expositiva dialogada com ênfase nas aplicações nucleares para identificação dos conhecimentos prévios sobre o tema radioatividade - subsunçores; 2) Momentos 2: ao final da unidade temática para avaliar como os novos conhecimentos interagiram e foram associados com os conhecimentos prévios de cada estudante. Assim, aqui são analisados os dois momentos da construção dos mapas conceituais de dois estudantes desta turma de forma a mostrar de que maneira os mapas permitem acompanhar a aprendizagem significativa sobre o tema da radioatividade no percurso destes alunos. Uma vez que a aprendizagem significativa se dá a partir dos movimentos de diferenciação progressiva e reconciliação integrativa, estes dois movimentos são tomados como categorias analíticas deste estudo.

3. Resultados e discussões Estudante 1 A Figura 2 mostra o mapa conceitual produzido pelo primeiro estudante no Momento 1. Observa-se que este estudante traz em sua estrutura cognitiva alguns conhecimentos prévios sobre o tema Radioatividade. Esses conhecimentos são dispostos em duas ramificações simples ligadas diretamente a raiz ‘RADIOATIVIDADE’, com um caráter em comum entre elas, ambas privilegiam o aspecto negativo da radioatividade ao conduzirem aos conceitos de destruição, guerra e bomba. Observa-se ainda que, mesmo uma aplicação do fenômeno, que são as usinas nucleares, é identificada pelo estudante como uma ação de des-

truição uma vez que as associa não a função a que elas se propõem, a produção de energia elétrica, mas sim aos acidentes de Fukushima e Chernobyl. Esta representação sugere que as relações apresentadas estão ligadas com as informações de destruição que sempre são veiculadas pelos principais meios de comunicação. Os mapas conceituais construídos pelos outros estudantes do grupo classe foram muito similares ao mapa apresentado na Figura 2, ou seja, em sua maioria, os alunos tenderam a construir seus mapas iniciais com ênfase nos acidentes e bombas nucleares, próprios do conhecimento do senso comum sobre o tema. 164

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Figura 2: Mapa conceitual 1, estudante 1

A Figura 3 mostra o mapa conceitual produzido pelo mesmo estudante no Momento 2, após o debate e as aulas expositivas-dialogadas. É possível observar a associação de novas ramificações ligadas à raiz ‘RADIOATIVIDADE’, o que denota um

grande avanço na interligação de novos conceitos. O referido mapa conceitual também mostra o estabelecimento de relações explícitas entre o novo conhecimento e aquele já existente.

Figura 3: Mapa conceitual 2, estudante 1

Como vimos no Momento 1 (mapa da Figura 2), o estudante entendia que o fenômeno da radioatividade era capaz, ou por intermédio do enriquecimento do urânio ou dentro de usinas nucleares de produzir a morte, ora por acidentes (vazamento de material radioativo em Fukushima e Chernobyl), ora pela guerra (bombas em Hiroshima e Nagasaki) e para este estudante era a única forma de aplicação dos fenômenos radioativos. No Momento 2, a partir do mapa da Figura 165

3, é possível observar que, se Hiroshima/ Nagasaki e Chernobyl no Momento 1 ocupavam ramos distintos dentro de uma única possibilidade de compreensão da radioatividade, agora se encontram interligados dentro de um mesmo ramo, de ‘Acidentes Nucleares’, sendo esta apenas uma das possibilidades de compreensão do fenômeno em questão neste momento. Essa mudança da construção do mapa denota uma reorganização da estrutura cognitiva do aluno, característica do

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processo de reconciliação integrativa, que como diz Ausubel (1968), acontece quando no curso da aprendizagem significativa, elementos iniciais existentes na estrutura cognitiva (subsunçores) com certo grau de diferenciação passam a ser vistos de forma relacionada, adquirindo novos significados. Assim, neste movimento, conceitos que antes pertenciam a diferentes ramos da raiz passam a se relacionar, proporcionando uma reconciliação, uma conexão entre eles que antes não era perceptível. Esse movimento dinâmico em que conceitos e proposições já existentes na estrutura cognitiva sofrem reorganizações e adquirem novos significados e conceitos mais abrangentes é característico de uma aprendizagem significativa do tipo superordenada. Corrobora a compreensão deste tipo de aprendizagem aqui o fato de ‘Acidentes nucleares’ aparecer neste segundo mapa como um novo conceito hierarquicamente acima das ideias já existentes na estrutura cognitiva do estudante, mais geral do que o conjunto das mesmas e que agora as interliga. É possível observar ainda que relacionadas à mesma raiz, RADIOATIVIDADE, surgem novas ramificações interligadas às aplicações nucleares através da medicina, elementos históricos como o casal Curie e o prêmio Nobel de Química, Ernest Rutherford, além do fenômeno físico nuclear propriamente dito no momento que o estudante representa os decaimentos alfa, beta e gama. Cabe salientar que o estudante não descartou os conhecimentos que já existia, a nova organização dos conceitos pôde apenas colocá-los em um contexto mais histórico, consequente do fenômeno nuclear e não mais como uma única aplicação de tal fenômeno. Importante chamar a atenção para a relação que existe entre os processos de reconciliação integrativa e diferenciação progressiva uma vez que a aprendizagem que resulta em reconciliação integrativa tende a resultar também em diferenciação progressiva adicional de conceitos e proposições. Isso porque, a reconciliação integrativa é uma forma de diferenciação progressiva da estrutura cognitiva. Segundo Moreira (1988), é um processo cujo resultado é o explícito delineamento de diferenças e similaridades entre ideias relacionadas. Um bom exemplo da diferenciação progres-

siva está presente na organização hierárquica que o estudante mostra ser capaz agora (no mapa 2 da Figura 3) de fazer na primeira ramificação, de ‘Acidentes Nucleares’, a de ‘Hiroshima e Nagasaki’. Percebemos que se na Figura 2 o estudante encerrava uma de suas ramificações em Hiroshima e Nagasaki, na Figura 3 é possível ver claramente que estes, no curso de sua aprendizagem, servem de subsunçores ligando-se a novos conceitos. Mais especificamente, esses conceitos iniciais (Hiroshima e Nagasaki) que interagem com o novo conhecimento e servem de base para a atribuição de novos significados (fissão nuclear → reações nucleares → fusão nuclear → bomba de hidrogênio → sol) vão ao mesmo tempo também se modificando em função dessa interação se diferenciando progressivamente. Assim, os subsunçores Hiroshima e Nagasaki, neste exemplo, se tornaram mais elaborados, mais diferenciados e capazes de servir de âncora para a atribuição de novos significados, denotando a ampliação significativa do conhecimento. Esse é um exemplo claro de um dos movimentos da dinâmica da estrutura cognitiva chamado de diferenciação progressiva. A ancoragem de novos conceitos com conceitos subsunçores já presentes na estrutura cognitiva do aprendiz alargando o significado inicial denota a presença de uma aprendizagem significativa do tipo subordinada correlativa. Para finalizar é importante destacar que o estudante 1 consegue entender que o raio X não é de origem nuclear e o posiciona, de forma correta, em uma ramificação paralela ao das radiações nucleares. O estudante conectou o raio-X a um evento histórico (sua descoberta pelo Roentgen) que foi de fundamental importância para o avanço dos estudos da radioatividade. Geralmente os estudantes tendem a associar, de forma equivocada, o raio X como um fenômeno nuclear. No caso do estudante 1 temos um avanço. Contudo é possível observar um erro conceitual relacionado com a aplicação do raio X na medicina. Tal onda eletromagnética é utilizada para o radiodiagnóstico e não na radioterapia. Neste sentido os mapas conceituais também são úteis como uma ferramenta de avaliação das correlações estabelecidas que pode orientar novas ações na sala de aula.

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Estudante 2 Outro exemplo interessante de como os mapas conceituais nos permitem observar um movimento de aprendizagem significativa podemos encontrar na análise do estudante 2. A Figura 4

nos mostra o mapa conceitual deste estudante no início da unidade temática, ou seja, no momento 1 (mapa 1, estudante 2).

Figura 4: Mapa conceitual 1, estudante 2

Percebemos inicialmente que à raiz ‘RADIOATIVIDADE’ encontram-se ligadas quatro ramificações, tendo apenas uma delas, a de ‘Energia Nuclear’, uma pequena tentativa de hierarquização de informações que já se encontram presentes na estrutura cognitiva do estudante. Nesta, percebemos a presença do aspecto negativo vinculado à radioatividade (contaminação → anomalias), comum aos mapas iniciais conforme relatado na análise do estudante 1. Nas demais ramificações apresentam-se ideias ainda bastante soltas, provavelmente conceitos dos quais o estudante já ouviu falar relacionados ao tema central, mas que ainda não é capaz de fazer relações ou mais expli-

citações. Exemplo disso podemos perceber pelo fato do estudante associar o raio X a um fenômeno radioativo dando indícios de que ele não sabe definir o que é um fenômeno nuclear. Como já foi comentado para o estudante 1, a associação do raio X com a radioatividade é comum e o que provavelmente contribui para tal equívoco são as placas com o símbolo da radioatividade coladas nas portas das salas de radiodiagnóstico (conhecido popularmente como sala de raio X). O mapa conceitual 2 deste mesmo estudante (Figura 5), já nos traz um panorama muito diferente.

Figura 5: Mapa conceitual 2, estudante 2

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Um olhar inicial deste mapa já nos chama atenção pela quantidade de informações novas aderidas ao mesmo. Mas, uma análise mais aprofundada nos permite observar bem mais do que inclusão de novas ideias e conceitos a partir das ideias iniciais, que agora servem de subsunçores, mas também novas relações entre essas ideias iniciais, demonstrando mais uma vez caminhos diferentes levando o estudante a uma aprendizagem significativa: diferenciação progressiva no primeiro caso e reconciliação integrativa no segundo. Podemos iniciar observando que, neste segundo momento, surgem novas ramificações: ‘Bequerel’, trazendo o desenvolvimento de uma perspectiva histórica sobre o tema, e ‘Radioativo = núcleo instável’, ainda não desenvolvido. Das ramificações iniciais, mantém-se a ideia da ‘presença da radioatividade em todos os lugares’ e da ‘Energia Nuclear’; as outras duas ramificações iniciais (‘Raio X’ e ‘Raio α, β, ɤ’) não desaparecem, apenas mudam de lugar, passando agora a pertencer a ramificação ‘Energia Nuclear’ e mostrando com isso que uma nova forma de relação entre esses conceitos foi reconhecida pelo estudante, isto é, as proposições já existiam em sua estrutura cognitiva mas adquiriram novos significados, passando por uma reorganização. Para compreender melhor basta nos atermos ao fato de que se antes o estudante não reconhecia o ponto de ligação entre os raios X e ɤ, neste momento ele sente necessidade de criar uma nova ramificação dentro da ramificação maior ‘Energia Nuclear’, a ramificação ‘Ondas eletromagnéticas’, que os inter-relaciona. Ao retirar ɤ da relação com α e β, agora entendidos como ‘Decaimentos radioativos’ e construir uma nova relação entre X e ɤ, ‘Ondas eletromagnéticas’, elaborando, pois novos significados, percebemos tanto uma aprendizagem do tipo superordenada a partir de um movimento de reconciliação integrativa entre conceitos já existentes, como uma aprendizagem do tipo subordinada correlativa a partir da diferenciação progressiva, ampliando seu conhecimento. Isso porque, como vimos antes, a reorganização (reconciliação integrativa) muitas vezes resulta em diferenciação progressiva adicional de conceitos (aqui: ‘ondas eletromagnéticas’ e ‘decaimentos radioativos’). Contudo para este estudante o raio X ainda possui

origem nuclear. Embora dentro das discussões tenha sido esclarecida tal diferença de ordem física, as discussões sobre a similaridade da interação da radiação gama e do raio X com a matéria podem ter levado ao tipo de associação apresentada na Figura 5 pelo estudante 2. Desta forma destacamos mais uma vez a importância dos mapas conceituais para nortear ações em sala de aula que possam sanar associações indevidas de conceitos. Além disso, ancorado nas ideias iniciais (‘Raios X e gama’, subsunçores), o estudante assimila um novo conceito, os ‘Raios ultravioleta’, desdobrando esta mesma ramificação. Destes três tipos de ondas eletromagnéticas o estudante traz uma bifurcação nova para mostrar as aplicações das mesmas. Assim, esta nova configuração em seu mapa, caracterizada por um movimento indo de conceitos mais globais para menos inclusivos também denota a presença da diferenciação progressiva, comum à aprendizagem do tipo subordinada correlativa. Mesmo considerando que as ‘Aplicações’ pudessem ficar mais coerentes se subordinadas à ramificação ‘Presente em todos os lugares’, o que nos faria pensar em uma compreensão mais clara do tema (talvez uma possível alteração a ser feita pelo estudante em um momento posterior de sua aprendizagem), para este momento, o fato das ‘Aplicações’ aparecerem e já trazendo temáticas importantes (‘irradiação de alimentos’; ‘medicina’, ‘datação’) denota uma aprendizagem significativa em curso. Essa observação nos pareceu importante na medida em que queremos deixar claro que ao analisar um mapa conceitual não nos importa aqui ver se o conhecimento está ‘pronto’ no sentido de uma aprendizagem ‘final’ pretendida pelo professor, mas sim um movimento de aprendizagem no ponto em que a mesma se encontra. Outro exemplo disso está relacionado aos conceitos de instabilidade e estabilidade. O estudante neste ponto de sua aprendizagem traz a ramificação ‘Radioativo = núcleo instável’ ainda não relacionada a nenhuma informação, embora dentro de ‘decaimentos radioativos’ (ramificação de ‘Energia Nuclear’), ele coloque como consequência dos raios β e α, a ‘busca pela estabilidade’. Interessante, portanto, perceber no momento uma maior clareza do ponto de vista das diferenças e semelhanças entre ondas eletromagnéticas e par168

tículas embora já se perceba uma compreensão inicial, bastante incipiente, de que as mesmas guardam outras formas de relação, vinculadas a questão da transformação de núcleo instável para estável. Para que esse conhecimento se desenvolva, o estudante terá que relacionar a ramificação ‘Radioativo = núcleo instável’ com as ramificações menores ‘Beta (β), ‘Alfa (α)’ e ainda ‘Raios gama’, uma vez que este também leva a estabilidade. Percebe-se que estas são outras relações possíveis entre os conceitos já existentes na estrutura cognitiva do estudante, mas que ainda estão em ponto de construção inicial, diferente das que ele já traz concretizadas em seu mapa no momento. Além disso, é importante ter a consciência de que essas são análises de mapas conceituais feitas sem a presença do autor dos mesmos e com a opção dos estudantes por não usarem preposições e conectivos entre as ideias, o que nos leva a ter o cuidado de pontuar apenas indícios. Por exemplo, o que nos leva a pensar o fato da ramificação ‘Ondas eletromagnéticas’, já comentada antes, se encontrar ainda em outra localização do mapa conceitual do estudante (dentro da ramificação ‘Bequerel’). Podemos compreender a partir disso que é mais um exemplo da análise feita acima, de uma compreensão ainda não muito clara do conceito (inicial), levando-o a não saber onde melhor situá-lo em seu mapa. Ou podemos, ao contrário, defender que essa duplicação nos mostra justamente a habilidade já conquistada pelo estudante de perceber um mesmo conceito sobre perspectivas diferentes (histórica e também conceitual), possibilidade esta que nos parece mais crível neste caso dado o fato de que faz o mesmo também com o próprio conceito de ‘radioatividade’. Este se encontra ao mesmo tempo como tema central e dentro de ‘Marie Curie’ (escrito errado pelo estudante como Marrie Courrie, provavelmente pela tentativa de escrever da forma que se pronuncia o nome), nos indicando que nesta segunda posição ele está chamando a atenção para outra perspectiva, a importância desta personagem na

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descoberta da radioatividade. Não podemos ainda deixar de analisar a ramificação ‘Usina Nuclear’. Apesar de a mesma continuar como um ramo de ‘Energia Nuclear’, percebe-se uma grande diferenciação no desenvolvimento do conceito. ‘Enriquecimento de Urânio’ cede o lugar para duas novas ramificações, ‘Fissão Nuclear’ e ‘Fusão Nuclear’. Estas mostram desdobramentos progressivos em novos conceitos, tornando-se cada vez mais elaboradas e diferenciadas, e ao final, relacionadas. Essa bifurcação configura uma diferenciação progressiva pela aprendizagem de novos conceitos a partir de um conceito subsunçor. Este, na aprendizagem do tipo subordinada correlativa, própria desse movimento de diferenciação progressiva, ao assimilar novos conhecimentos, modifica-se. Para finalizar essa análise, chamamos ainda a atenção para o fato de que neste último exemplo de diferenciação progressiva, o estudante vai buscar conceitos da física, conservação de massa (já estudados pelo mesmo) na elaboração de conceitos da química, fissão e fusão nuclear. Esse conceito da física está aqui servindo de âncora para que o estudante possa construir uma aprendizagem significativa na química, e essa relação, que mostra a interdisciplinaridade em curso, se dá de forma não arbitrária e lógica, isto é, o estudante usa conceitos já bem elaborados em sua estrutura cognitiva e relaciona-os com os novos, o que facilita a sua compreensão e consequente aprendizagem. Esse tipo de aprendizagem significativa, em que a nova ideia não se encontra hierarquicamente nem acima nem abaixo da ideia existente previamente em sua estrutura cognitiva e que lhe serviu de âncora, chama-se aprendizagem significativa combinatória. Não há neste tipo de aprendizagem nenhuma relação de subordinação nem de superordenação entre conceitos específicos do tema em si que está sendo trabalhado, mas sim, com um conteúdo mais geral, da estrutura cognitiva do sujeito, em seu sentido mais amplo.

4. Considerações Finais Mapas conceituais foram utilizados tanto na médio, como na avaliação da aprendizagem do análise dos conhecimentos prévios sobre o tema referido tema. Os mapas conceituais são recursos radioatividade de estudantes do 3° ano do ensino flexíveis e dinâmicos que enfatizam o ensino e a 169

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aprendizagem de conceitos, algo que muitas vezes fica perdido em meio a uma grande quantidade de informações e fórmulas no ensino de Química. Como instrumento de avaliação também podem ser utilizados para se ter uma imagem da organização conceitual, ou seja, das relações hierárquicas entre conceitos que o estudante estabelece para um dado conteúdo, facilitando assim um melhor acompanhamento da construção dos conhecimentos sobre o mesmo. Sem dúvida, essa é uma visão não tradicional de avaliação que é essencialmente qualitativa, mas que pode ser muito valiosa para o professor no sentido de guiar sua prática pedagógica. Neste trabalho mostramos a análise de mapas conceituais desenvolvidos por dois alunos do ensino médio sobre o tema Radioatividade. Ao observar os mapas construídos antes e depois da intervenção sobre o tema baseado em debates e aulas expositivas com ênfase na contextualização, foi possível constatar uma negociação entre os conhecimentos prévios e os novos conhecimentos através tanto dos movimentos de reconciliação interativa como de diferenciação progressiva, característicos da aprendizagem significativa em seus três tipos: subordinada, superordenada e combinatória. Foi possível ainda observar que o fato de se ter discutido o tema de forma mais histórica e com a exposição e discussão sobre as aplicações benéficas da radioatividade permitiu aos estudantes analisados uma reorganização de conceitos. Tal reorganização foi representada pelas novas conexões estabelecidas entre, por exemplo, os acidentes nucleares (que antes era a principal aplicação da radioatividade) e sua nova posição menos importante e mais histórica dentro da hierarquia apresentada nos mapas. A adição das aplicações nucleares e a elaboração de conceitos mais específicos da física de partículas nos mapas do segundo momento dos dois estudantes leva a crer que a discussão histórica seguida de uma exposição dialogada mais contextualizada possibilitou uma ancoragem mais consistente dos novos conhecimentos. Vemos a partir dessas análises o quanto o processo de aprendizagem significativa é dinâmico. O conhecimento vai sendo construído a partir de uma reorganização constante na estrutura cog-

nitiva do indivíduo a partir da interação entre novos conhecimentos e os já existentes, os subsunçores. Estes, à medida que servem de âncora para atribuição de significados às novas informações ou interagem com outros subsunçores construindo novas relações, também vão se modificando e se tornando aos poucos mais estáveis e diferenciados, ao mesmo tempo em que novos subsunçores vão se formando e interagindo entre si. Reconhecendo toda a idiossincrasia que caracteriza a construção dos mapas conceituais, não podemos deixar de refletir sobre um último ponto. A inadequação da utilização dos mapas conceituais pelo professor como instrumento de avaliação se este partir de um modelo seu considerado como correto. Não existe um mapa conceitual certo, mas antes, os mapas dos estudantes refletem os significados que estes vão atribuindo aos conceitos e as relações significativas que vão construindo entre estes. Assim, ir em busca de um mapa conceitual “correto” tira deste recurso o que ele tem de mais precioso, a autonomia do aluno no caminho de seu processo de aprendizagem, pois, o importante não é estar certo ou errado mas, os indícios que os mapas podem nos oferecer sobre este estudante estar aprendendo significativamente o conteúdo desejado. Essa reflexão, esperamos, pode implicar na própria atribuição de novos significados aos conceitos de ensino, aprendizagem e avaliação. Isso porque, nos permitindo ir adiante, propomos que mais importante ainda que refletir e dar indícios de onde o estudante se encontra, está a própria construção deste mapa pelo estudante. Construir um mapa conceitual não é tarefa simples, implica relacionar conceitos, decidir hierarquias, refletir, ir e vir... Propor aos estudantes a construção de mapas conceituais implica, pois, pensar não somente no resultado pronto no papel que nos dirá algo sobre como está seu aprendizado mas, principalmente no que este resultado implicou na própria constituição do conhecimento destes estudantes e portanto na sua aprendizagem significativa. Somente assim não veremos mapas conceituais simplesmente como produtos, mas de forma bem mais profunda, como processos de aprendizagem significativa!

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