Uso de óleo de palma \"in natura\" como combustível em comunidades isoladas da Amazônia

June 28, 2017 | Autor: Suani Coelho | Categoria: Palm Oil, General Electric, Diesel engine, Vegetable oil, Performance Test, Electricity Distribution
Share Embed


Descrição do Produto

Trabalho publicado e apresentado em : III Workshop Brasil-Japão em Energia, Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável-23 a 25 de novembro de 2005- Campinas, SP

Uso de óleo de palma “in natura” como combustível em comunidades isoladas da Amazônia Suani Teixeira Coelho* Orlando Cristiano da Silva* Sílvia Maria S. G. Velázquez* Ana Flávia de Andrade Rebello Lisboa* Fabio de Godoy* * CENBIO - Brazilian Reference Center on Biomass –Avenida Prof. Luciano Gualberto, 1289, Cidade Universitária. São Paulo, Brazil. CEP 05508-010. Phone/Fax 55-11-3091 2655. [email protected] ABSTRACT The territorial occupation from the Amazon region is characterized by isolated communities, which makes the conventional electric distribution economically and technically impracticable. To solve the electric problem of these communities, it is necessary for them to produce their own fuel in order to generate electric energy and promote the development. These are the premises which have guided the elaboration of the project PROVEGAM – “Implantation and test of a unit demonstration of vegetable oil energetic utilization” has a conventional diesel engine installation and performance testing objective, adapted to operate with palm oil “in natura” at the Vila Soledade community, Moju, Para, an isolated community that has approximately 700 inhabitants, in 120 houses, and it is located at one hundred and forty kilometers from downtown by car and 30 minutes more by boat. The electric energy of this community was previously generated by a conventional diesel engine, technically inefficient, for causing imperfections in the supply, and economically inefficient for using imported fuel. The PROVEGAM project installed a diesel generator adapted with a conversion kit to operate with “in natura” palm oil. Actually the engine has more

than 4000 hours in operation. During the project, diesel oil emissions and performance were compared with the palm oil. Analyzing the results, this electric model of generating energy is already recommended to be implemented in other Amazon region communities

INTRODUÇÃO O modelo de fornecimento de eletricidade adotado no Brasil é baseado na geração de grandes blocos de energia conectados à rede de distribuição. Este modelo de geração, no entanto, faz com que em regiões de baixa densidade populacional e povoamento esparso, como a região amazônica e algumas áreas da região nordeste, apresentem baixos índices de eletrificação rural uma vez que a extensão da rede para atendimento de poucos consumidores é economicamente inviável. “Segundo dados do Censo 2000 do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) atualmente, 2,5 milhões de domicílios brasileiros - cerca de 11 milhões de habitantes - não têm acesso à energia elétrica”. (ANEEL, 2004), a maioria deles localizados em comunidades isoladas em regiões remotas do país. Atualmente, no Brasil, a eletrificação rural em regiões remotas é baseada predominantemente em sistemas isolados com geradores a diesel, solução esta que tem se revelado pouco satisfatória, na medida em que a aquisição e o transporte de óleo diesel para essas localidades, assim como a manutenção dos equipamentos representam um custo financeiro muito alto no contexto dessas regiões. Como resultado existe espalhado, pelo interior da região amazônica, muitos grupos diesel-geradores desativados devido à falta de combustível e de manutenção. O Ministério de Minas e Energia lançou em 2004 o programa “Luz para Todos”, cujo objetivo é levar energia elétrica a todos os brasileiros excluídos dos benefícios da eletrificação, até 2008. Para atingir esta ambiciosa meta farse-á necessária a inserção, na medida do possível, de fontes não convencionais de energia, de preferência quando estas fontes são disponíveis localmente como, por exemplo, os resíduos das atividades agrícolas e florestais e os óleos vegetais.

Para a substituição do óleo diesel, principal fonte energética utilizada nas comunidades não eletrificadas, os óleos vegetais “in natura” apresentamse como uma alternativa natural, considerando dentre outros fatores, a possibilidade

técnica

de

serem

queimados

em

diesel-geradores,

a

disponibilidade de grande variedade de espécies oleaginosas, principalmente na região amazônica, a aptidão edafo-climática para cultivos de espécies oleaginosas de grande produtividade e a possibilidade da prática de uma atividade agrícola cooperativada, voltada para a produção energética e desenvolvimento sustentável local. A dificuldade de suprimento de energia elétrica não permite que atividades econômicas organizadas e potencialmente geradoras de emprego e renda sobrevivam no interior da Amazônia. Este fato tem reflexo direto nas condições de vida e no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) dessa região. O suprimento de energia elétrica para comunidades isoladas é, então, uma das formas de proporcionar melhorias nas condições de vida da população e inserção social, mediante a possibilidade de atividades produtivas associadas à geração de energia. Contudo, as condições de isolamento e dispersão das comunidades impõem soluções específicas e individualizadas de suprimento energético, baseadas na valorização de recursos naturais localmente disponíveis e devem levar em consideração as limitações tecnológicas existentes. Este trabalho descreve a experiência do Projeto PROVEGAM “Implantação e Testes de uma Unidade de Demonstração de Utilização Energética de Óleo Vegetal na Amazônia” - realizado pelo Centro Nacional de Referência em Biomassa / Instituto de Eletrotécnica e Energia da Universidade de São Paulo – (CENBIO/IEE/USP) na Comunidade Vila Soledade, Município de Moju, Estado do Pará. O desenvolvimento do projeto contou com parcerias da EMBRAPA – Empresa Brasileira de Pesquisas Agropecuárias, AGROPALMA – empresa privada produtora de óleo de dendê, Prefeitura Municipal de Moju e com o financiamento da FINEP –Financiadora de Estudos e Projetos. Na experiência foi utilizado o óleo de dendê como combustível para impulsionar um grupo gerador equipado com um motor diesel convencional e, a energia elétrica gerada, distribuída para a comunidade.

A opção pelo óleo de dendê teve como motivação a vocação da região amazônica para a produção deste tipo de óleo e a possibilidade desta produção assumir um caráter familiar. Além do dendê, que é de origem africana, diversas outras oleaginosas nativas da Amazônia podem ser usadas para fins de substituição ao óleo diesel em comunidades isoladas. Experiências anteriores mostraram que os melhores resultados na utilização do óleo vegetal como combustíveis são alcançados quando se introduzem modificações nas suas moléculas transformando-os em ésteres (biodiesel) através do processo de transesterificação. Contudo, este é um processo que demanda uma alta qualificação técnica dos operadores, insumos, equipamentos e um rigor tecnológico, incompatíveis com as condições das comunidades isoladas da Amazônia. A utilização de óleos vegetais “in natura” em diesel-geradores convencionais é possível, conforme mostram certas experiências realizadas na França e na Alemanha, no entanto, exige providências tecnológicas específicas, sob pena de inviabilizar a longevidade do motor e de onerar os custos de manutenção. Na região amazônica brasileira, entre os anos de 1997 e 2000, alguns projetos de utilização energética de óleos vegetais precederam ao projeto executado pelo CENBIO e mostraram o importante papel que esta utilização pode desempenhar, se, aplicado às comunidades isoladas e associado à valorização da biodiversidade local, geração de renda e redução da dependência em relação ao óleo diesel, não obstante a necessidade de continuar a desenvolver estudos e testes para a otimização desta utilização. Em 2002, um estudo muito importante foi realizado no quadro de uma tese de doutorado, no Laboratório de Máquinas Térmicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro, utilizando o óleo de dendê como combustível em um motor diesel convencional. Algumas das conclusões tiradas dessas experiências indicam que a introdução de algumas modificações relativamente simples no óleo vegetal pode

melhorar

o

seu

desempenho

como

combustível.

Dentre

as

recomendações feitas em decorrência destes projetos destacam-se: a degomagem e neutralização de óleos vegetais, de uma forma geral e, no caso

de óleo de dendê, o fracionamento do mesmo para utilizar apenas a fração menos viscosa, a oleína e o aumento da pressão de injeção do combustível. O PROJETO O objetivo central do projeto foi testar, em condições operacionais de campo, por um período relativamente longo de tempo, o funcionamento de um motor diesel convencional utilizando óleo de dendê “in natura” como combustível. O projeto foi implantado na comunidade de Vila Soledade, no Município de Moju - PA, e consistiu na instalação de um grupo-gerador diesel, de 115kVA, equipado com um sistema de alimentação do motor, para permitir que o mesmo funcione com o óleo diesel no início e no final da operação e com o óleo de dendê, ao longo da operação. Este sistema de alimentação que passou a ser chamado de Kit de Conversão, também acumula a função de reduzir a viscosidade do óleo de dendê “in natura”, por meio de aquecimento, utilizando a água de arrefecimento do motor como trocador de calor. Para o efeito, o sistema de alimentação é equipado com um reservatório de óleo diesel e outro de óleo de dendê, além de válvulas, sensores, medidores e tubulações. O motor inicia o funcionamento utilizando o óleo diesel. Após 15 a 20 minutos de funcionamento, tempo suficiente para a realização da troca térmica entre a água de refrigeração e o óleo de dendê, a válvula é comutada manualmente para o reservatório de óleo de dendê, que passa a alimentar o motor. Momentos antes do fim da operação, a válvula do kit é comutada de novo para o reservatório do óleo diesel com a finalidade de eliminar os resíduos do óleo de dendê no interior do motor. O grupo gerador trabalha seis horas por dia (de 17 às 23 horas), fornecendo energia para a comunidade e para a escola pública. Foram gerados aproximadamente 72.500 kWh/ano, a um custo de 0,382 R$/kWh. PROCEDIMENTOS E TESTES Na ausência de normas e procedimentos para testes e ensaios em diesel geradores operando com óleos vegetais in natura, optou-se por

desenvolver procedimentos específicos para este caso e que possibilitasse a comparação com o óleo diesel. Verificações de desempenho e emissões (CO2, CO, NOx, HC, O2 e Opacidade) do motor foram realizadas ao longo do teste a cada 700 horas. Para tal foi necessário definir com clareza os pontos fundamentais selecionados nas normas técnicas, que garantissem coerência e consistência técnicas dos dados obtidos. Entre eles podemos destacar: • controle das condições ambientais; • freqüências de inspeção periódicas e intermediárias durante o ciclo de teste; • análise da combustão através dos gases de escape e dos depósitos formados; •

análise dos parâmetros de desempenho através das variáveis medidas como a rotação do motor, consumo de combustível, consumo de ar de admissão, umidade relativa;



determinação das temperaturas (ambiente (bulbo seco), do combustível, do ar de admissão, dos gases de escape, do óleo Lubrificante e da água de arrefecimento) e;



medição das pressões (barométrica, do ar de admissão, dos gases de exaustão e do óleo lubrificante). Considerou-se para teste de durabilidade, o fato de que o motor instalado

em Moju/PA irá funcionar em regime normal de operação para a comunidade, não sendo possível impor ao mesmo um ciclo de funcionamento. Por isso, foram realizados periodicamente os seguintes ensaios: -

Análise do óleo lubrificante a cada 100 horas de teste;

-

Registro fotográfico do cabeçote através de instrumento de inspeção visual específico (boroscópio) para análise do cabeçote e bicos injetores a cada 350h.

-

Teste dos bicos injetores em empresas autorizadas Bosch para análise de estanqueidade, pressão de abertura, retorno de combustível, ruído característico e forma de jato, quando ocorrer queda de potência superior a 5% do inicio dos testes.

RESULTADOS

Após cerca de 4.500 horas de funcionamento acompanhados mediante um monitoramento sistemático, pudemos tirar algumas conclusões a cerca do desempenho, emissões de gases e durabilidade de um motor diesel convencional, funcionando com óleo de dendê in natura, nas condições de comunidade isolada da Amazônia. A análise dos principais gases de exaustão, realizados ao longo do projeto mostraram que os níveis de emissões gasosas do grupo gerador funcionando com óleo de dendê estão dentro dos parâmetros atualmente encontrados em motores a Diesel. O óleo de dendê apresenta adicionalmente a vantagem de não possuir enxofre, um dos principais componentes causadores da chuva ácida, e pelo fato de ser biomassa, sua contribuição em componentes de carbono, causadores de efeito estufa, é nula devido ao processo de fotossíntese na fase de crescimento da palmeira. Estes dados são muito importantes quando se tem como uma das principais preocupações ambientais, atualmente, o aquecimento global provocado pelos gases de efeito estufa. A contribuição deste projeto em especial pode ser considerada pequena, porém, considerando a necessidade de atender uma quantidade muito grande de comunidades, ainda, não eletrificadas e a possibilidade de replicar esta experiência, abre-se a possibilidade de evitar o consumo de grande quantidade de óleo diesel e, com isso, de emissão de uma grande quantidade de gases de efeito estufa. Em termos de desempenho foi constatado um consumo 10% superior, quando o grupo gerador trabalha com óleo de dendê, em comparação com o óleo diesel. Assim o consumo do óleo diesel é de 10 litros por hora e o de óleo de dendê, de 11 litros por hora. Esta diferença de consumo é atribuída à diferença do poder calorífico entre os dois óleos. O óleo diesel apresenta o poder calorífico inferior (PSI) em torno de 10.150 kcal/kg, enquanto que o PSI do óleo de dendê é em torno de 9.104 kcal/kg. Compensada esta diferença no consumo, todos os outros parâmetros analisados mantêm-se inalterados em relação ao consumo do óleo diesel. Avaliações de desgastes no motor, provocados pelo uso de óleo de dendê, feitas ao longo do projeto mostraram maior vulnerabilidade de componentes como os bicos de injeção, os filtros de combustíveis e as

câmaras de combustão. Foram verificadas obstruções parciais dos bicos injetores, entupimentos freqüentes dos filtros e formação de crostas de material carbonoso nas câmaras de combustão, em níveis superiores se comparados ao padrão (funcionando com óleo diesel). Propõe-se para próximos projetos elevar a pressão de injeção do combustível em aproximadamente 20 bar, como forma de reduzir os problemas nos bicos injetores e nas câmaras de combustão, e adotar um sistema de pré-filtragem do óleo de dendê para reduzir as obstruções nos filtros. Não se espera, com estas medidas, eliminar os problemas, mas sim minimizá-los. Em face destes problemas constatados e que têm a ver com a durabilidade do motor, foi introduzido um calendário de manutenção preventiva, com o período de troca de filtros, desobstrução dos bicos e descarbonização das câmaras de combustão que permitissem uma longevidade do motor equiparável ao padrão. Estas medidas resultam num aumento do custo de manutenção na ordem de 20 a 25%. Estes problemas, verificados na durabilidade de motores funcionando com óleos vegetais, têm sido as justificativas colocadas por alguns especialistas em motores de combustão interna, contrários ao uso de óleos vegetais como combustível. Em que pese à pertinência das objeções, há a considerar que, para localidades como as comunidades isoladas da Amazônia e para o uso em sistemas estacionários de geração de energia, os óleos vegetais são uma opção a considerar, mesmo implicando em maior custo de manutenção. O custo de transporte de óleo diesel até a essas comunidades chega a duplicar o seu preço de venda, em relação aos grandes centros, enquanto o custo de produção do óleo de dendê situa-se em menos da metade do preço do óleo diesel. Este fator, assim como, a opção de atendimento através da rede de distribuição de energia elétrica torna inviável a eletrificação destas comunidades. Em termos sociais verificou-se uma modificação positiva na qualidade de vida da comunidade. A escola municipal passou a oferecer o curso noturno com as sérias mais avançadas, que não são oferecidas durante o dia. Algumas famílias adquiriram máquinas despolpadeiras do açaí e frigoríficos, e passaram a conservar e vender polpas deste fruto, que é uma das bases da alimentação da região, aumentando assim suas rendas. Constatou-se também um aumento

considerável em número de eletrodomésticos e equipamentos como aparelhos de som e televisores, com isso, a melhoria no conforto das famílias e maior possibilidades de entretenimento, informação e formação. CONCLUSÕES Os seguintes pontos constituem as conclusões tiradas do projeto prossigam: Óleos vegetais in natura podem ser uma opção viável para geração de energia em comunidades isoladas, enquadrada no Programa Luz para Todos. O baixo custo de implantação, em relação a outras alternativas pode compensar o custo de manutenção, que pode ser reduzido com a implementação de um sistema conveniente de limpeza do Óleo Considerando a hipótese da produção do óleo de palma pela comunidade, a custo de aproximadamente R$ 0,80, o custo de energia gerada pode se situar compatíveis com o de óleo diesel. Os níveis de emissões estão dentro dos parâmetros atualmente encontrados para motores diesel, com a vantagem de ser biomassa,com emissão de enxofre e de incremento para o efeito estufa nulos. A utilização de óleo vegetal pode trazer benefícios sociais e econômicos, se associado à produção local do óleo e a utilização de energia para fins produtivos. Necessita de uma regulação apropriada e de políticas de incentivo que viabilizem a auto geração e auto gestão pela comunidade.

REFERÊNCIAS CENBIO – Centro Nacional de Referência em Biomassa. Projeto PROVEGAM, Relatório Projeto PROVEGAM, São Paulo, 2003. FONSECA, M. A. N. Pesquisa de óleo vegetal em motores diesel – Programa OVEG I – CENPES PETROBRÁS –1981. Laboratório de Máquinas Térmicas da Universidade Federal do Rio de Janeiro – LMT/UFRJ. 4° Relatório do Projeto PROVEGAM, Rio de Janeiro, 2003. SILVA, O. C., Análise do Aproveitamento Econômico e Energético do Óleo de Palma na Guiné Bissau na Perspectiva do Desenvolvimento Sustentável, Dissertação de M.Sc., Universidade de São Paulo, São Paulo, 1997. Agência Nacional de Energia Elétrica – ANEEL. Metas de Universalização Disponível em http://www.aneel.gov.br, acesso em 04/03/2005. PIMENTEL, V. S. B., BELCHIOR C. P. R.– Análise e Diagnose de Diesel Geradores Operando com Óleo de Dendê “in Natura” AGRENER 2002 - 4º Encontro de Energia no Meio Rural, 2002.

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.