Valoração Científica dos Geossítios do Parque Nacional Sete Cidades (PI)

August 15, 2017 | Autor: Sheydder Lopes | Categoria: Geoconservation, Geodiversity, Geossites
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A Teoria dos Refúgios Florestais e as Evidências Vegetacionais e Litológicas da Região Sudoeste do Município de Corumbá/MS Profa. Dra. Eva Faustino da Fonseca de Moura Barbosa Universidade Estadual de Mato Grosso do Sul/UEMS [email protected] Resumo O Pantanal Mato-Grossense está de certa forma relacionado com a Teoria dos Refúgios e Redutos, pois essa teoria reúne conhecimentos sobre os padrões de distribuição de flora e fauna na América do Sul, explorando as consequências das mudanças climáticas quaternárias do período Pleistoceno Terminal em determinados espaços fisiográficos, paisagísticos e ecologicamente distintos. Atualmente, os componentes das caatingas arbóreas e cactáceas peculiares do Nordeste permanecem amarrados às vertentes inferiores da Morraria do Urucum e suas adjacências, pressionados entre florestas semidecíduas e os primeiros bosques chaquenhos mistos. Essa área do município de Corumbá/MS está localizada entre os domínios do Cerrado, Chaco e Pré-Amazônia. A diversidade biológica do Pantanal Mato-Grossense resultou de uma fase seca. Então, torna-se importante o esclarecimento sobre as evidências paleoclimáticas que antecederam a progressão da semiaridez e as formas da recomposição da tropicalidade, ao longo dos espaços anteriormente dominados por climas muito secos. Palavras chave: Teoria dos Refúgios Florestais, Pantanal Mato-Grossense, Cactáceas.

Abstract The Pantanal Matogrossense is in some way related to the Refuge Theory, as this theory aggregates knowledge of the distribution patterns of flora and fauna in South America, exploring the consequences of quaternary climate change of the Late Pleistocene in certain physiographic and ecologically distinct spaces. Currently, the components of arborous caatingas and Cactaceae, typical of the Northeast region of Brazil, remain tied to the lower slopes of Morro do Urucum and surrounding areas, squeezed between semi-deciduous forests and the first mixed Chaco forests. This area of the municipality of Corumbá/MS is located between the Cerrado, El Chaco and Pre-Amazon region. The biodiversity of the PantanalMatogrossense was the result of a dry spell. Thus it becomes important to clarify the paleoclimatic evidence prior to the progression of the semiarid condition, and the ways of restoring tropical aspects over the space previously dominated by very dry climates. Keywords: RefugeTheory, Pantanal Matogrossense, Cactaceae.

1. Introdução O Pantanal Mato-Grossense constitui-se geologicamente uma planície com flora e fauna diversificadas, demonstrando possuir ambientes de rica biodiversidade. O Pantanal está localizado na região Centro-Oeste do Brasil, dividido entre os Estados de Mato Grosso e Mato Grosso do Sul e entre os países do Paraguai e da Bolívia. É banhado pelo Rio Paraguai e sua rede de drenagem que cria diferentes paisagens divididas em onze pantanais, obedecendo à interação dos fatores físicos e geoecológicos regionais.

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O esclarecimento das situações paleoclimáticas existentes no sudoeste do município de Corumbá/MS, região do Pantanal Mato-Grossense, torna-se importante, pois estas antecederam a progressão da semiaridez e às formas da recomposição da tropicalidade, ao longo dos espaços anteriormente dominados por climas muito secos. As situações paleoclimáticas, evidenciadas neste texto, tornaram possível o entendimento dos atuais espaços geoecológicos desta região, gerando conhecimentos sobre a estrutura superficial de suas paisagens, com o intuito de esclarecer os processos que ocorreram no Quaternário Antigo, quando existiam outros modelos e dinâmicas de distribuição de flora e fauna. 2. Pressupostos Teóricos As mudanças climáticas ocorridas em diferentes períodos do Quaternário no Pantanal Mato-Grossense proporcionaram mudanças climato-hidrológicas na região, influenciando as paisagens geológicas, geomorfológicas e a distribuição da flora e da fauna da grande Depressão Pantaneira, segundo Ab’Sáber (2006). As paisagens atuais dos diferentes pantanais refletem essas mudanças climáticas. O Pantanal Mato-Grossense tornou-se importante para a Teoria dos Refúgios Florestais porque agrupa conhecimentos essenciais de modelos de distribuição da flora e da fauna da América do Sul, pois esta teoria estuda as consequências das mudanças climáticas quaternárias sobre o quadro distributivo biogeográfico, em tempos definidos ao longo de diferentes espaços paisagísticos. O Pantanal Mato-Grossense possui diversos ambientes que são oriundos de fatores físicos e ecológicos e suas interações. Nestes ambientes os processos físicos condicionam o desenvolvimento e a manutenção da flora e da fauna. A diversificação de paisagens do Pantanal inclui relevantes restos de cactos existentes no sudoeste de Corumbá/MS, considerados por Ab’Sáber (2006) significativos relictos de Caatingas do Nordeste Brasileiro. Conhecidos como refúgios florestais pleistocênicos estes seriam os setores de mais demorada permanência da vegetação tropical, durante os principais períodos de retração das condições tropicais úmidas do Pleistoceno Terminal, de acordo com Ab’Sáber (2006). Esses relictos ou refúgios pleistocênicos, segundo Ab’Sáber (2006) testemunham a complexa evolução paleogeográfica que vem ocorrendo no Pantanal Mato-Grossense desde o Pleistoceno Terminal, reunindo assim conhecimentos importantes sobre os padrões de distribuição de flora e fauna durante este período. 3. Metodologia do Trabalho Para Bigarella, Andrade-Lima e Riehs (1975), a compreensão da distribuição faunística implica em considerações e especulações em torno de mudanças climáticas que refletem a expansão e retração dos vários tipos de associações

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vegetais do passado geológico. As evidências paleoclimáticas vêm sendo acumuladas através de estudos geológicos, geomorfológicos e pedológicos. Este estudo teve como objetivo principal realizar uma pesquisa biogeográfica permitindo a constatação das evidências paleoclimáticas materializadas no espaço geográfico do sudoeste do município de Corumbá/MS, região entre o Rio Paraguai e a Bolívia. Os múltiplos ambientes existentes nesta região advêm de fatores físicos e ecológicos e suas interações, pois nestes ambientes os processos físicos são condicionadores no processo do desenvolvimento e manutenção da flora e da fauna. A pesquisa necessitou do emprego de um conjunto de técnicas a permitir a constatação das evidências paleoclimáticas, na região sudoeste do município de Corumbá/MS. Dentre as técnicas empregadas, pode-se enumerar o que se segue: Constatação direta, em trabalho de campo, de paleodocumentos vegetacionais, geológicos, geomorfológicos e pedológicos existentes em áreas indicadoras de um paleoclima tendendo à semiaridez; Observação direta com registro fotográfico do complexo de morrarias da região sudoeste do município de Corumbá/MS e das diferentes espécies vegetais de cactos e bromélias-de-chão, com ocorrência paradoxal com as condições climáticas atuais, em sítios de bancadas lateríticas e de floresta estacional decidual e semidecidual. 4. Resultados e Discussões 4.1. As Evidências Vegetacionais e Litológicas do Pleistoceno Terminal na Região Sudoeste do Município de Corumbá/MS O trabalho de campo possibilitou a observação da diversidade da paisagem existente na região sudoeste do município de Corumbá/MS, região compreendida entre o Rio Paraguai e a Bolívia. As evidências paleoclimáticas aqui abordadas apontam alguns dos vestígios citados por: Almeida (1964 e 1965) - Formação Pantanal; Valverde (1972) - Formação Xaraiés e o Maciço de Urucum; Bezerra (1999) - Lagoas do Jacadigo, Negra e do Arroz; (Ab’Sáber, 1957) - coberturas detrítico-lateríticas; Ab’Sáber (2006) - Formação Xaraiés, superfícies intermontanas, e os relictos florísticos de cactáceas. 4.1.1. Formação Xaraiés e a Formação Pantanal Essas formações constituem depósitos sedimentares que recobrem a Depressão do Rio Paraguai. Anjos e Okida (2000) identificam que essas formações recobrem acumulações quaternárias nesta ordem: Aluviões Atuais, Formação Pantanal, Formação Xaraiés, Depósitos Coluvionares Detríticos e Sedimentos Detríticos de Idade Quaternária. 4.1.2. Superfícies Intermontanas As superfícies intermontanas, conhecidas como Pediplano Cuiabano, devido à sua origem, evolução e amplitude espacial, passam à superfície interplanáltica, com seus testemunhos e antigos piemontes. As morrarias da região fronteiriça com a

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Bolívia, próximas a cidade de Corumbá/MS e o Rio Paraguai são testemunhos dessa superfície neogênica. Segundo Silva (2000), estas formas estão localizadas ao sul da cidade de Corumbá/MS, e são compostas predominantemente pelas Morrarias do Urucum, de Santa Cruz, de São Domingos, do Grande, do Rabichão, da Tromba dos Macacos, do Zanetti, da Patrulha, a Pelada, a do Sajutá e a do Jacadigo. Essas formas de relevo denudacionais correspondem às unidades de relevo de maior representatividade neste tipo de estrutura do relevo regional. 4.1.3. Coberturas Detrítico-Lateríticas Para interpretar e estudar a história quaternária dos climas do passado na maior e mais importante bacia detrítica quaternária do Brasil, há que se ater às informações referentes aos sedimentos de topo da mesma, projetados pela superfície geral da Planície Pantaneira. Essas formações recobrem as superfícies intermontanas da região da Morraria do Urucum e do Rabichão, em áreas de drenagem, com 100 m de altitude, de acordo com Takahasi (2010). A vegetação que recobre essa região é formada por plantas xerófilas, como as cactáceas e as bromélias. Os trabalhos de campo desta pesquisa registraram nestas formações a presença das bromélias Balansae, Deuterocohnia Meziana e a Dychia; e das cactáceas Cereus Bicolor, Discocactus Ferrícola, Echinopsis Calochlora, Opuntia, Harrisia sp; e a samambaia Selaginella sp. 4.1.4. Lagoas do Jacadigo, Lagoa Negra e do Arroz Ab’Sáber (2006) considera o macroleque do Rio Taquari responsável pela formação destas lagoas, pois o macroleque forçou suas águas divergentes nas reentrâncias formadas pelas morrarias de Corumbá/MS, ficando as águas paradas na borda da morrarias formando as lagoas na fronteira com a Bolívia. As Lagoas Negras e do Arroz ficam próximas à margem direita do Rio Paraguai, em área de acumulação inundável, permanentemente alagada e muito úmida. Essas lagoas possuem bacia de sedimentação semifechadas. Bezerra (1999) analisou e datou as amostras dos três primeiros metros de sedimentos das Lagoas do Jacadigo, Negra e do Arroz observando o predomínio de fácies de areia, ricas em matéria orgânica, típicas de lagos e de sedimentação fluvial. 4.1.5. Relictos Florísticos de Cactáceas Aparece na Depressão Pantaneira um componente fitogeográfico chamado de relicto florístico, relacionado às penetrações anteriores de vegetação provenientes de áreas secas, representadas por certos tipos de cactos e bromélias, espécies da Caatinga brasileira. Segundo Ab’Sáber (2006) em Corumbá/MS, acantonadas entre as encostas da Morraria do Urucum, e os primeiros carandazais e Parques Chaquenhos existem cactos e bromélias, ao lado de Barrigudas e outras espécies restantes, herdadas de antigas expansões de caatingas arbóreas que, atingiram a borda dos pantanais,

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formando relictos ou minirredutos de uma flora que conseguiu resistir, localmente, ao aumento da umidade e das precipitações. Os trabalhos de campo desta pesquisa registraram a presença das bromélias Balansae, Deuterocohnia Meziana e a Dychia; e das cactáceas Cereus Bicolor, Discocactus Ferrícola, Echinopsis Calochlora, Opuntia, Harrisia sp. Essas espécies aparecem na região da Morraria do Urucum, junto as Florestas Estacionais Decíduas e Semi-Decidual. A composição florística desses relictos florísticos são similares à dos afloramentos rochosos do Nordeste do Brasil, resultantes de condições litológicas e climáticas dominantes, conforme Takahasi (2010). 4.2. Resultados Obtidos em Trabalho de Campo na Área da Pesquisa Ab’Sáber (2006, p. 30) considera que “os estudos sobre formações correlativas mais recentes são indispensáveis para interpretações – adaptadas a escalas de tempo, espaço e processos – das formações mais antigas”. É importante o estudo das formas atuais das paisagens do sudoeste do município de Corumbá/MS, pois estas possibilitam o entendimento das formas mais antigas adaptadas às escalas de tempo e espaço e as possíveis correlações entre elas. Para aperfeiçoar as informações colhidas nos trabalhos de campo dividiu-se a área percorrida em seis sub-regiões, a saber: Pantanal do Nabileque; Morro Sajutá; Morraria do Urucum; Albuquerque; Jacadigo; Rio Paraguai. A tabela 1 apresenta as seis sub-regiões analisadas na área pesquisada da região sudoeste do município de Corumbá/MS e as evidências vegetacionais e litológicas encontradas em cada sub-região. Tabela 1: As Evidências Vegetacionais e Litológicas da Região Sudoeste do Município de Corumbá/MS. Sub-Regiões Evidências Vegetacionais e Litológicas Pantanal do Nabileque 1. Cactáceas. 2. Formação Xaraiés. 3. Formação Pantanal. Morro do Sajutá Morraria do Urucum Albuquerque Jacadigo

1. Superfícies Intermontanas. 2. Cactáceas. 3. Barrigudas. 1. Superfícies Intermontanas. 2. Crostas Lateríticas. 3. Cactáceas. 1. Superfícies Intermontanas. 2. Crostas Lateríticas. 3. Cactáceas. 1. Lagoas. 2. Formação Xaraiés. 3. Formação Pantanal. 4. Cactáceas. 5. Barrigudas.

Rio Paraguai

1. Formação Xaraiés. 2. Formação Pantanal. 3. Cactáceas.

Fonte: Barbosa, (2011).

Os trabalhos de campo e os levantamentos bibliográficos permitiram algumas conclusões: 1. Foram encontradas nas regiões percorridas as seguintes evidências vegetacionais e litológicas: os cactos, as bromélias e as barrigudas distribuídas nas Florestas Estacionais Decidual e Semidecidual; as superfícies intermontanas; as crostas lateríticas; a Formações Xaraiés e do Pantanal; e a Lagoa do Jacadigo e as Lagoas Negra e do Arroz; 2. Foram registrados vários tipos de cactos na área pesquisada. O cacto Cereus Bicolor é comum a todas as regiões acima especificadas, aparecendo de Eixo XI – Estudos do Quaternário. XV Simpósio Brasileiro de Geografia Física Aplicada. “Uso e ocupação da terra e as mudanças das paisagens.” Vitória (ES), 8 a 12 de julho de 2013. Departamento de Geografia. UFES. CCHN.

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forma abundante em todos os níveis topográficos das Florestas Estacionais Decidual e Semidecidual; 3. As superfícies intermontanas encontradas são inselbergers, pedimentos e pedimentos inumados, alçadas tectonicamente no Terciário; 4. As crostas lateríticas registradas estão próximas a Morraria do Urucum, incluindo a Estrada Parque do Pantanal Sul MS 228, a rodovia MS 432 e a área do Parque Natural Municipal de Piraputangas em Corumbá/MS; 5. A Formação Xaraiés e a Formação Pantanal constituem verdadeiros depósitos de idade Pliopleistocênica. A Formação Xaraiés aparece em torno da cidade de Corumbá/MS (margem direita do Rio Paraguai) e na região da Lagoa do Jacadigo; e a Formação Pantanal aparece na área das Lagoas Negra e do Arroz e no Pantanal do Nabileque, região sul da área pesquisada. 6. A Lagoa do Jacadigo está próxima às serranias fronteiriças com a Bolívia, região de Formação Xaraiés de idade Pliopleistocênica, constituindo um depósito de pedimento antigo; As Lagoas Negra e do Arroz, em Ladário/MS, próximas a margem direita do Rio Paraguai, estão em uma região de Formação Pantanal e Aluviões Atuais, área de depósitos das planícies de inundação do Pantanal Mato-Grossense. O levantamento das evidências paleoclimáticas visou demonstrar como ocorreu à retração das matas tropicais e a expansão da semiaridez com a Caatinga e os núcleos de Cerrados que se processaram no decurso do Pleistoceno Terminal, buscando explicar que os restos de cactos existentes na região de Corumbá/MS são significativos relictos de Caatingas do Nordeste Brasileiro. 5. Considerações Finais As variações climáticas ocorridas no Pantanal Mato-Grossense entre os períodos Pleistoceno e Holoceno se sucederam do clima semiárido para o clima tropical úmido. O clima seco causou a extinção das paisagens tropicais úmidas das formações geomorfológicas cristalinas e metamórficas. Assim, à medida que o clima regional se umidificou, novos cursos de água se formaram, fixando tipos vegetacionais tropicais em espaços, anteriormente, ocupados por espécies vegetais de climas secos. A coluna sedimentar da bacia do Pantanal conduz afirmar que as mudanças climáticas ocorridas no Quaternário no Pantanal Mato-Grossense trouxeram grandes modificações climato-hidrológicas, pois estas estão registradas nas colunas geológicas e geomorfológicas, e na distribuição da flora e da fauna da grande Depressão Pantaneira, dos pantanais e dos grandes leques aluviais. As feições morfológicas e as espécies vegetais encontradas no Pantanal MatoGrossense são formas reliquiares de uma evolução paleogeográfica condicionada por mudanças climáticas e tectônicas que vêm ocorrendo na América do Sul desde o final do Pleistoceno. Assim, o atual quadro paisagístico do Pantanal MatoGrossense pode ser visto como resultado das mudanças climáticas ocorridas em diferentes espaços paisagísticos, ecológicos e fisiográficos.

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Às paisagens vegetacionais do Pantanal Mato-Grossense alia-se grande número de gêneros e espécies das famílias das Cactáceas e Bromeliáceas. Esta vegetação transpõe os taludes das Morrarias do Urucum, adensando e diversificando a vegetação desta região devido à umidade permanente e ao solo mais rico e espesso. A diversificação de paisagens desta região inclui os importantes restos de cactos existentes na região de Corumbá/MS, considerados significativos relictos de Caatingas do Nordeste Brasileiro. O conjunto de evidências paleoambientais das flutuações climáticas ocorridas no Pleistoceno Terminal na região do Pantanal MatoGrossense demonstradas neste estudo indicou que os restos de cactos existentes nesta região são verdadeiros e significativos paleoindicadores de flutuações climáticas antigas. Referências Bibliográficas AB’SÁBER, A. N. Conhecimentos sobre flutuações do Quaternário no Brasil. Boletim da Sociedade Brasileira de Geologia, São Paulo, v. 6, n. 6, p. 41-48, 1957. ______. Brasil: paisagens de exceção: o litoral e o Pantanal Mato-Grossense: patrimônios básicos. Cotia: Ateliê Editorial, 2006. ALMEIDA. A, F. F. M. Geologia do centro-oeste mato-grossense. Boletim da Divisão de Geologia e Mineralogia, Rio de Janeiro, n. 215, p. 1-133, 1964. ______. Geologia da serra da Bodoquena (Mato Grosso). Boletim da Divisão de Geologia e Mineralogia, Rio de Janeiro, n. 219, p. 1-96, 1965. ANJOS, C. E. dos.; OKIDA, R. Geomorfologia. In: SILVA, J. dos S. V. da (Org.). Zoneamento ambiental da borda oeste do Pantanal: maciço do Urucum e adjacências. Brasília: Embrapa Comunicação para Transferência de Tecnologia; Corumbá: Embrapa Pantanal, 2000. p. 47-54. BARBOSA, E. F. da F. de M. A Teoria dos Refúgios Florestais e as Evidências Vegetacionais e Litológicas da Região Sudoeste do Município de Corumbá/MS. 2011. 123 f. Tese (Doutorado em Geografia) – Instituto de Geociências e Ciências Exatas, Universidade Estadual Paulista, Rio ClaroSP, 2011. BEZERRA, M. A. O. O uso de multi-traçadores na reconstrução do Holoceno no Pantanal MatoGrossense, Corumbá. 1999. 214 f. Tese (Doutorado em Ecologia e Recursos Naturais) – Centro de Ciências Biológicas e da Saúde, Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 1999. BIGARELLA, J. J.; ANDRADE-LIMA, D. de.; RIEHS, P. J. Considerações a respeito das mudanças paleoambientais na distribuição de algumas espécies vegetais e animais no Brasil. Anais da Academia de Ciências, Rio de janeiro, v. 47, supl., p. 411-464, 1975. SILVA, J. dos S. V (Org.).Zoneamento ambiental da borda oeste do Pantanal: maciço do Urucum e adjacências. Brasília: Embrapa Comunicação para Transferência de Tecnologia; Corumbá: Embrapa Pantanal, 2000.

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TAKAHASI, A. Ecologia da vegetação em bancadas lateríticas em Corumbá-MS. 2010. 255 f. Tese (Doutorado em Ecologia) – Instituto de Biociências, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010. VALVERDE, O. Fundamentos geográficos do planejamento do município de Corumbá. Revista Brasileira de Geografia, Rio de Janeiro, v. 34, n. 1, p. 49-144, jan./mar. 1972.

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Pedra do Urubu em Brejo Santo-CE: Relevo e Natureza como Atrativos ao Ecoturismo 1,1

Francisco Edigley Macêdo José Valdir Estrela Dantas 1,3 Frederico de Holanda Bastos 1,2

¹Universidade Regional Do Cariri – URCA 1

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[email protected] [email protected] 3 [email protected]

Resumo O presente trabalho aborda uma breve análise sobre a possibilidade da prática do ecoturismo na Pedra do Urubu – rocha que apresenta traços de um rosto humano, muitas vezes apontado como semelhante ao de Jesus Cristo. Situada no município de Brejo Santo, Ceará, a Pedra do Urubu mostra-se como elemento ímpar da cultura local. A combinação dos diversos elementos da paisagem (principalmente relevo e vegetação) juntamente com os aspectos históricos e culturais, constituem subsídios para práticas ecoturísticas. Além disso, elucida a importância da educação ambiental dos turistas e da população local, tomando como pressupostos a preservação e conservação do lugar e do meio ambiente de modo geral. Os métodos para a construção do referido texto baseiam-se em pesquisas bibliográficas em livros, artigos, jornais, sites e blogs; práticas de campo na Pedra do Urubu e museu de mesmo nome; e em uma entrevista semi-estruturada realizada com o pesquisador Tony Antonio dos Santos. A partir desta análise pode-se considerar altamente viável a implantação do ecoturismo na Pedra do Urubu, tendo em vista a intensificação da preocupação em preservar/conservar este patrimônio além de resgatar a história e a cultura de Brejo Santo que seriam transmitidas aos moradores da cidade e aos visitantes interessados nas trilhas ecológicas realizadas nas adjacências do ponto turístico trabalhado. Palavras chave: Paisagem, Relevo, Educação Ambiental.

Abstract The present study presents a brief analysis of the possibility of ecotourism in practice at the Urubu Rock, a rocky outcrop that shows traits of a human face, frequently given likelihood to the face of Jesus Christ. Located in the municipality of Brejo Santo, Ceará, the Urubu (“vulture”) Rock represents a unique feature of local culture. The combination of diverse landscape elements (mainly relief and vegetation), together with the historical and cultural aspects, form a subsidy for ecotourism activities. Besides this, the importance of environmental education for the tourists and the local population is stressed in the light of the preservation and conservation of this place and the environment in general. The methods for the construction of this text are based on bibliographic research in books, academic articles, newspapers, websites, and blogs; fieldwork at the Urubu Rock and the museum with the same name; and a semi-structured interview with the researcher Tony Antonio dos Santos. From this analysis, the following conclusion can be drawn: the practice of ecotourism at the Urubu Rock can be considered very feasible, taking into account the growing concern about the preservation/conservation of this heritage beyond the recovery of local history and culture that must be passed to the habitants of the town and the visitors who are interested in ecological hikes in the vicinity of this touristic spot. Keywords: Landscape, Relief, Environmental education.

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1. Introdução Localizada no município de Brejo Santo, Ceará, especificamente, no bairro Alto da Bela Vista, a “Pedra do Urubu” apresenta-se como uma singular formação rochosa que exibe várias peculiaridades, onde a principal delas é a rocha apresentar, naturalmente, a forma de um rosto humano. Cabe ressaltar que esta feição chegou a esse estágio em decorrência de fatores externos naturais como: vento, temperatura, chuva e outros, que atuaram sobre a rocha gerando sucessivos processos erosivos que esculpiram tal forma, tornando-a, assim, um elemento bem peculiar. Uma das primeiras perguntas feitas pelos visitantes é: “por que Pedra do Urubu?”. Antigamente, nas proximidades do local, existia um matadouro público onde os restos mortais dos animais atraiam abutres (urubus). A feição de um rosto na rocha passou a ser comparada pelos populares à “face de Cristo”. Tony Antônio dos Santos é líder comunitário e ambientalista, em 2002 descobriu a suposta “face de Cristo”. Foi o precursor e responsável por dar continuidade a esse trabalho. Tony da Pedra do Urubu, assim como é conhecido, trabalha incansavelmente em favor da preservação e reconhecimento do local. Para ele, são três os motivos que impulsionaram à comparação e o batismo. O primeiro é a divisão no local da frontal (testa), como se fosse à marca da coroa; o segundo motivo é uma marca branca (a única na formação rochosa) que fica abaixo do que seria o “olho”, o que lembra uma lágrima; o terceiro e último ponto é o “ângulo privilegiado” onde se consegue enxergar perfeitamente a “face de Cristo”, a curiosidade é que ela está direcionada para a torre da igreja matriz do sagrado coração de Jesus. Segundo a professora, historiadora e escritora, Lenira Macedo: “A identificação da face de Cristo na Pedra do Urubu fortalece o complexo turístico do Cariri, uma região marcada pelo misticismo e abre uma janela para um estudo mais aprofundado da história de Brejo Santo e da preservação do meio ambiente” (Diário do Nordeste, 2008). Um dia, essa área que retrata um patrimônio histórico e natural do município, foi também ponto de encontro de usuários drogas, prática de relações sexuais e outras atitudes lamentáveis que contrastavam com a beleza do local, que em vez de ser visto como ponto cultural era marginalizado. Com o objetivo de coibir essas práticas que arruinavam a imagem do lugar, Tony dos Santos em parceria com a comunidade do bairro Alto da Bela Vista, em 2007, lançou um projeto intitulado “Não deixe a pedra cair”. O titulo reflete bem o objetivo, que é lutar em favor da preservação do local que hoje vive dias melhores. Ainda há de se lamentar outra questão: “pessoas da própria cidade não conhecem o local” afirma Tony. Levando em consideração a importância do monumento lítico, anteriormente citado, e seus entornos, o presente trabalho tem como principal foco elucidar a viabilidade da prática do ecoturismo neste local, devido aos atrativos paisagísticos, culturais, ambientais e sociais, tendo como princípio a conservação deste lugar vinculado com um contínuo processo de educação ambiental. 10

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2. Ecoturismo Atualmente, um dos temas que mais inquietam os profissionais dedicados à natureza faz jus à degradação do meio ambiente. A utilização descontrolada dos recursos naturais, as praticas rudimentares de agricultura, as milhares de toneladas de resíduos despejadas no meio natural, são práticas comuns que gradativamente contribuem para a intensificação de uma pior qualidade de vida. Levando em conta as mazelas ambientais geradas pela intervenção antrópica, a realização de mudanças faz-se necessária, ou seja, é preciso encontrar meios de usufruir da natureza com o mínimo de impactos possíveis, é nesse contexto que o terno Desenvolvimento Sustentável pode ser aplicado. O turismo convencional, baseado no conceito estabelecido pela Organização Mundial de Turismo – OMT (2001), pode ser entendido como as atividades que as pessoas realizam durante viagens e estadas em locais distintos do seu entorno habitual, por um intervalo de tempo inferior a um ano, realizando atividades relacionadas a negócios, lazer, dentre outras. Praticado de forma sustentável, o turismo não oferece riscos significativos para o ambiente, porém, quando analisado em uma dimensão crítica, prejuízos ambientais, intelectuais e culturais, podem, facilmente, ser observados. O turismo está entre as atividades econômicas que podem causar impactos negativos sobre o meio ambiente. Esses podem ser causados pela má administração ou pela falta de controle dos impactos no patrimônio natural e cultural do local receptor (RIOS et al. 2008) Diferentemente do turismo convencional, que almeja apenas a observação de paisagens exóticas para fins de lazer, o ecoturismo vai muito além, caracterizandose como um segmento da atividade turística que utiliza, de forma sustentável, o patrimônio natural e cultural, incentiva sua conservação e busca a formação de uma consciência ambientalista por meio da interpretação do ambiente, promovendo o bem-estar das populações (MTUR, 2010). Para Rodrigues (2003) o ecoturismo pode ser viável levando-se em consideração dez princípios: 1. Usar os recursos de forma sustentável; 2. Reduzir o consumo exagerado e o desperdício; 3. Manter a diversidade; 4. Integrar o turismo ao planejamento; 5. Apoiar as economias locais; 6. Envolver as comunidades locais; 7. Consultar os investidores e o público; 8. Treinar equipes; 9. Fazer o marketing; 10. Realizar pesquisas. Estes pressupostos podem nortear um projeto para a implantação do ecoturismo na Pedra do Urubu, tendo em vista as melhorias advindas por este tipo de prática econômica consideravelmente mais lucrativa do que as atividades turísticas convencionais, tanto do ponto de vista econômico, ambiental, cultural e social. 11

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3. A Pedra do Urubu Brejo Santo é um município brasileiro localizado no extremo Sul do estado do Ceará, mais especificamente na região do Cariri. Inserida na Bacia Sedimentar do Araripe, ao sopé da chapada homônima, esta cidade recebe influência direta do sistema orográfico causado pelo referido relevo, gerando chuvas orográficas, elas são ocasionadas pelo barramento da umidade vinda do litoral que precipita na área de barlavento da chapada do Araripe (LIMA & RIBEIRO, 2012), o que lhe confere uma paisagem diferenciada do restante da depressão sertaneja, tanto do ponto de vista geomorfológico quando do vegetacional. A Chapada do Araripe e os patamares de entorno são constituídos por formações cretáceas do Grupo Araripe, que se sobrepõem às rochas silurodevonianas da Formação Cariri. Corresponde a uma superfície tabular fortemente influenciada pela estrutura geológica e pelo modelo de estratificação (SOUZA & OLIVEIRA, 2006).

Em Brejo Santo predomina uma estrutura sedimentar denominada formação Brejo Santo, datada do Jurássico. Esta formação é constituída litológicamente por argilitos, siltitos e folhelhos vermelhos com intercalações de folhelhos esverdeados calcíferos e fossilíferos. Aflora ao longo da rodovia Missão Velha-Brejo Santo, com uma espessura de 30 a 40 metros (SILVA & SILVA, 1991) A Pedra do Urubu, visível na Figura 1, geomorfologicamente, configura-se como uma típica feição ruiniforme originada por erosão diferencial em rochas sedimentares (arenito). Estas formas de relevo são esculturas singulares que podem variar de milímetros a dezenas de metros. Ressalta-se o caráter diferencial da erosão quando níveis síltico-argilosos estão presentes, aumentando a complexidade morfológica destas feições (MELO, et al 2011).

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Figura 1. Cartão postal criado por Tony Antônio dos Santos.

Segundo Fávera (2003), a topografia ruiniforme é esculpida pelas águas pluviais e pelo vento nos arenitos, gerando feições dômicas ou em forma de torre em desfiladeiros estreitos, que sugerem formas de homens, animais e objetos. Corroborando com o autor citado, dependendo do ponto de vista do observador, a Pedra do Urubu apresenta-se em forma de cabeça, a qual se atribui a face de Jesus Cristo, o que faz dessa localidade um ponto turístico tão importante para a cidade de Brejo Santo e justifica a preocupação com a preservação e conservação deste patrimônio e de sua história. No que diz respeito à vegetação da cidade estudada, a mesma é bastante variada. Devido sua localização, além da caatinga, a cidade também apresenta o cerradão, vegetação característica da área sedimentar que se estende pelo planalto superior da Chapada do Araripe (PEREIRA & SILVA, 2007). A vegetação que circundava a Pedra do Urubu foi intensamente desmatada devido aos avanços urbanos, como, por exemplo, a construção de uma rodovia pavimentada muito próxima ao ponto turístico, obrigando a destruição do observatório 1 e a reconstrução deste em outro local. Recentemente, durante a construção de um trecho da ferrovia Transnordestina, a utilização de artefatos explosivos para abertura de uma passagem de quarenta metros em um pequeno maciço, causou danos tanto a Pedra do Urubu, como às residência próximas ao monumento lítico, populares apontaram para a possibilidade de a referida rocha desmoronar. Devido a estes e outros problemas, a implantação do ecoturismo na cidade anteriormente citada poderia amenizar estes impactos, além de conscientizar a população sobre a importância da conservação e preservação do meio ambiente e da Pedra do Urubu, elemento tão importante para a memória e a cultura da cidade. 1

Lugar construído com o intuito de se obter uma visão privilegiada da Pedra do Urubu, de onde era possível enxergar a suposta face e capturar imagens do ponto turístico.

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4. Metodologia do Trabalho Para a construção do presente texto, fizeram-se necessárias quatro etapas. A primeira limitou-se ao planejamento, onde foram estabelecidos quais seriam os principais elementos para a realização desta tarefa. As demais consistiram na pesquisa bibliográfica; prática de campo na Pedra do Urubu e no Museu da referida formação; além de uma entrevista com um morador e conhecedor do local. Finalmente, foi feita a compilação do conhecimento acumulado em forma de um artigo. A segunda etapa constituiu em uma pesquisa bibliográfica realizada no Museu da Pedra do Urubu e principalmente na biblioteca municipal de Brejo Santo. Foram levantados todos os tipos de fontes: livros, artigos, jornais, sites e blogs, o material foi selecionado, lido, analisado e organizado conforme o grau de importância do documento. Algumas práticas de campo foram realizadas no local com o intuito de obter informações referentes aos aspectos naturais da paisagem constituída pelo objeto de estudo (geologia e geomorfologia), além da identificação do tipo de vegetação, elemento essencial no que tange o ecoturismo. Durante a referida atividade, imagens foram capturadas e analisadas para um melhor entendimento do conjunto paisagístico. Também foram realizadas duas visitas ao Museu da Pedra do Urubu, um pequeno e acolhedor espaço que antes fora a casa de Tony e que hoje guarda em suas dependências, marcas de um passado histórico, repleto de curiosidades dos povos que ali viveram, representando um acervo cultural de Brejo Santo. O pesquisador Tony foi escolhido para participar da entrevista pelo fato deste conhecer bem a área e já ter realizado aulas de campo no local com turmas do ensino fundamental, segundo ele, foram feitas diversas abordagens sobre pontos temáticos da região: flora, fauna, recursos hídricos e impactos ambientais. Além disso, Tony ainda ressaltou que as trilhas ecológicas e a prática da educação ambiental na Pedra do Urubu funcionam como estímulos ao aluno para a preservação e o desenvolvimento da sensibilidade, no que tange as questões do meio ambiente. A entrevista foi constituída de 10 perguntas, onde foi pretendido buscar informações a respeito da área estudada e das atividades realizadas pelo referido pesquisador, que muito se aproximaram de práticas ecoturísticas, ou seja, a paisagem não foi meramente observada, ela foi analisada e interpretada mantendo a preocupação com preservação e conservação do lugar.

5. Resultados e Discussão Dentro da ciência Geográfica, um dos temas mais relevantes, principalmente na área da Geografia Física, é o conceito de Paisagem. Segundo Milton Santos (1988), esta pode ser definida como o domínio do visível e não se forma apenas de volumes, mas também de cores, movimentos, odores, sons etc. É o conjunto de objetos que nosso corpo alcança e identifica. 14

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Para Bertrand (1969, p. 141) “a paisagem não é a simples adição de elementos geográficos disparatados. É, em uma determinada porção do espaço, o resultado da combinação dinâmica, portanto instável, de elementos físicos, biológicos e antrópicos que, reagindo dialeticamente uns sobre os outros, fazem da paisagem um conjunto único e indissociável, em perpétua evolução”. Tendo em vista o referido conceito, além de constituir o objeto de estudos da Geografia Física, também compõe o objeto de interesse dos turistas, por este motivo, a paisagem deve ser interpretada de forma integrada e não apenas superficialmente. A partir da entrevista realizada com o ambientalista Tony, pode-se constatar que o mesmo rompe com o posicionamento de um mero observador e passa a analisar a paisagem constituída pela Pedra do Urubu de uma forma complexa, onde os aspectos vegetacionais, geológicos, geomorfológicos, culturais, paleontológicos, dentre outros, são percebidos e analisados durante as aulas de campo com alunos e/ou turistas. O modo de se observar a paisagem dentro do ecoturismo assemelha-se muito com o olhar dos profissionais da Geografia Física, ou seja, o conjunto de diversos aspectos é analisado para o entendimento do todo. Em Brejo Santo, a prática do ecoturismo pode ser adotada nas redondezas da Pedra do Urubu, tendo em vista a possibilidade da realização de trilhas ecológicas, como as descritas por Tony, tais atividades podem ser de grande valia, como salienta Tabanez & Padua (1997), as interpretações nas trilhas podem incluir: atividades dinâmicas e participativas, em que o público recebe informações sobre, por exemplo, recursos naturais, exploração racional, conservação e preservação, aspectos culturais, históricos, econômicos, arqueológicos etc. Além disso, durante as trilhas ecológicas e outras atividades a serem realizadas na Pedra do Urubu, a interpretação ambiental é um elemento indispensável ao ecoturismo, pois, fundamenta-se na captação e tradução das informações do meio ambiente. Contudo, não lida apenas com a obtenção de informações, mas com significados, buscando afirmar conhecimentos e despertar para novos, exercitar valores cognitivos, criar perspectivas, fomentando a participação da comunidade e trabalhando a percepção, a curiosidade e a criatividade humana (TABANEZ & PADUA, 1997). O Ecoturismo, se realizado de forma correta, pode trazer inúmeros benefícios ao local explorado, como, por exemplo, estimular a compreensão dos impactos do turismo sobre o meio natural, cultural e humano; assegurar uma distribuição justa dos benefícios e custos; gerar empregos, tanto diretamente no setor de turismo, como em diversos setores da administração de apoio e de recursos; estimular as indústrias locais rentáveis; diversificar a economia local, particularmente nas áreas rurais, onde o emprego agrícola pode ser esporádico ou insuficiente; incorporar o planejamento, assegurando o desenvolvimento turístico apropriado para a capacidade de sustentação dos ecossistemas; estimular a melhoria do transporte, da comunicação e de outros elementos da infra-estrutura comunitária; criar instalações recreativas que podem ser usadas pelas comunidades locais e pelos visitantes; demonstrar a importância dos recursos naturais e culturais para o bem15

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estar econômico e social da comunidade, podendo ajudar a preservá-los (LASKOSKI, 2006)

6. Considerações Finais Embora que o ecoturismo não seja uma atividade econômica totalmente sustentável e, de uma forma ou de outra, acabe por produzir algumas modificações negativas na paisagem, a sua implantação em locais que já se utilizam do turismo convencional, muito mais ofensivo ao meio natural e social, torna-se uma atitude coerente, pelo fato de preocupar-se com a preservação/conservação ambiental, resgate da memória e da cultura local, e também por oportunizar e beneficiar as pessoas residentes nas proximidades do ponto turístico. O ecoturismo rompe com o ato de mera observação da paisagem, fazendo com que esta seja interpretada pelo turista, nesse momento o visitante toma consciência de como ele interage nos ecossistemas, da importância da preservação/conservação ambiental, não só da área visitada, mas sim, da natureza vista como um todo. Embora seja um pequeno passo na direção da educação ambiental coletiva, o ecoturismo é um grande salto para a cidade de Brejo Santo. A partir de um projeto bem elaborado, juntamente com o poder público local e estadual e com a participação da comunidade, a infra-estrutura necessária para acolher os ecoturistas pode ser instalada. Inicialmente é inegável que deve haver investimentos, mas os benefícios ambientais, econômicos, culturais e sociais gerados em longo prazo, com certeza, compensaram o esforço inicial. Finalmente, levando em conta os benefícios advindos da substituição do turismo convencional pelo ecoturismo, torna-se viável a implantação desta prática na Pedra do Urubu em Brejo Santo. O entendimento da Paisagem, como conceito geográfico, também constitui a base no que diz respeito às práticas ecoturísticas.

Referências Bibliográficas Bertrand, G. Paisagem e geografia física global: esboço metodológico. Caderno de Ciência da Terra, n. 13, p. 1-27, 1969. Diário do Nordeste. Local Parece Com Face de Cristo. [online] Disponível em: . Acessado em: 01 de agosto de 2012. Fávera, J. C. D. Parque Nacional de Sete Cidades - Magnífico Monumento Nacional. In: Carlos Schobbenhaus; Diógenes de Almeida Campos; Emanuel Teixeira Queiroz; Manfredo Winge; Mylène Luíza Cunha Berbert-Born. (Org.) Sítios Geológicos e Paleontológicos do Brasil. Brasília: DNPM, CPRM, SIGEP, 2003, pp. 335-344. Laskoski, G. T. Ecoturismo: meio ambiente. Curitiba: Universidade Tecnológica Federal do Paraná. 2006. 20p.

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Ambientes de Sedimentação no Canto da Lagoa, Florianópolis/SC: Caracterização Sedimentar Valeska Almeida Marquette1 Marcelo Accioly Teixeira de Oliveira2 1

Fundação Municipal do Meio Ambiente – Gravataí/RS Divisão de Licenciamento Ambiental [email protected] 2

Universidade Federal de Santa Catarina – UFSC Departamento de Geociências [email protected]

Resumo Este artigo é resultado da adaptação de um Trabalho de Conclusão de Curso desenvolvido e concluído no ano de 2008, como desdobramento de perícia ambiental. A área estudada foi objeto de litígio judicial que se concluiu pela ausência de viabilidade para construção de condomínio no local. Este trabalho tem como objetivo a caracterização sedimentar de área localizada às margens da Lagoa da Conceição a fim de melhor investigar indícios de existência de rampa arenosa no local, contribuindo para o uso adequado do solo no município de Florianópolis. Para tanto, foram realizadas diferentes técnicas de análise: análise granulométrica, análise morfoscópica e tratamento estatístico das amostras coletadas. As análises realizadas confirmam os ambientes previamente descritos durante a perícia e fornecem informações complementares que permitem associar os sedimentos eólicos a uma rampa arenosa, ou rampa de dissipação. Os riscos de ocupação de áreas de dunas e de rampas de dissipação estão relacionados à erosão dessas áreas, por tratar-se de material pouco coeso e altamente friável. Além disso, as áreas de dunas e rampas de dissipação são consideradas Áreas de Preservação Permanente. Este trabalho resulta, portanto, em esforço para decifrar os ambientes de sedimentação pretéritos e definir sua capacidade de uso em áreas urbanas. Porém, estudos mais aprofundados ainda são necessários. Palavras chave: análise granulométrica, análise estatística, rampa arenosa / dissipação.

Abstract This article results from the adaptation of a monography, which was concluded in 2008 as developments of a previous forensic report. The study area was the object of a legal pursuit which was concluded by refusing new buildings in the area. This work aim to characterize sediments located on the shores of the Lagoa da Conceição lagoon in order to better investigate evidences for the existence of a sandy ramp in the area, in order to contribute to a suitable soil use in Florianópolis, Santa Catarina. Different analytical techniques were applied: particle size analysis, morphoscopic analysis and sample’s statistics. The results confirm the environments previously described by the forensic report and provide supplementary information, allowing association of Aeolian sediments to a sandy ramp, or dissipation ramp. Soil occupation of dune fields and sandy ramps often occur associated with erosive processes, as materials are usually weakly cohesive and highly friable. In addition, areas of sandy dunes and ramps are considered as Permanent Preservation Area, by law. This work is a result 18

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of efforts for deciphering past sedimentary environments in order to define its use capabilities. However, deeper studies are still necessary. Keywords: sieve analysis, statistical analysis, sandy ramp / dissipation.

1. Introdução A análise sedimentar fornece pistas importantes para a caracterização de ambientes de sedimentação e de seus processos. Estudos preliminares foram realizados na área de estudo deste trabalho, localizada no Canto da Lagoa, Florianópolis (SC), e sugerem a existência de sedimentos eólicos e aluviais no local. Esses sedimentos poderiam estar associados à rampa arenosa, ou rampa de dissipação, segundo Bigarella (1974), devido à sua localização junto ao embasamento cristalino e à presença de material proveniente da encosta misturado a sedimentos eólicos. Este trabalho visa o aprofundamento da caracterização dos sedimentos da área de estudo, a fim de contribuir para uma descrição mais precisa da área e para o seu uso adequado, haja vista o fato de que o local foi objeto de perícia ambiental judicial. Atualmente, as rampas de dissipação são consideradas Áreas de Preservação Permanente (APPs), de acordo com o Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis (IPUF). Segundo Oliveira e Herrmann (2001), os riscos de ocupação de áreas de dunas e de rampas de dissipação estão relacionados à erosão dessas áreas, que possuem material pouco coeso e altamente friável. Daí a importância do aprofundamento de sua caracterização sedimentar, pois a área está destinada a empreendimentos residenciais e a atividades turísticas desse município que se encontra em franca expansão imobiliária.

2. Área de Estudo e Contexto Geográfico A área de estudo está localizada na Ilha de Santa Catarina, entre os paralelos 27º37’15’’ e 27º38’06’’ Sul e entre os meridianos 48º29’13’’ e 48º28’09’’ Oeste, às margens da porção sul da Lagoa da Conceição, na Praia do Porto da Lagoa, conforme mostra a Figura 1.

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Figura 1 - Mapa de localização da área de estudo.

Por estar localizado às margens da Lagoa da Conceição, (uma laguna, de fato) o local possui características morfológicas de terraço lagunar. Apesar de a área de estudo estar morfologicamente associada a terraço lagunar, em estudo preliminar realizado no local, foram identificados sedimentos de origem eólica e aluvial. Segundo Suguio (1980), no que toca aos parâmetros texturais, quando as areias de praia são retrabalhadas pelo vento, durante a formação das dunas, ocorrem: a) o aumento do diâmetro médio, b) a melhoria da seleção granulométrica, c) a passagem de assimetria negativa ou zero para valores positivos, d) o enriquecimento relativo em minerais pesados e e) o aumento do grau de arredondamento das partículas de quartzo. Conforme Pye e Tsoar (1990) apud Paisani (2004), as dunas de cavalgamento são dunas formadas a partir do contato da areia eólica com um obstáculo topográfico, formando uma acumulação de sedimento diante do obstáculo. Os termos rampa arenosa e/ou rampa de dissipação, foram introduzidos por Bigarella (1974) e começaram a ser discutidos mais amplamente depois do International Symposium on the Quaternary, ocorrido em 1975 no sul do Brasil, segundo Paisani (2001). O processo de dissipação decorre de chuvas concentradas que geram corridas de areia no ambiente de duna de cavalgamento, misturando material de granulação fina do manto de alteração do substrato granítico do morro. Porém, feições similares (lamelas) têm sido caracterizadas, cuja origem é dada como pedogenética. Portanto, a designação de estrutura de dissipação para feições lenticulares com padrão ondulante contorcido, constituídas de material com granulação fina, deve ser 20

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usada com cautela, apenas quando for comprovada sua origem associada a processos de dissipação das estruturas eólicas.

3. Metodologia de Trabalho O trabalho de campo foi realizado em cima de um único perfil de amostragem (toposequência), onde foram coletadas 24 amostras deformadas em 10 sondagens realizadas com trado manual, em perfil traçado no sentido NE-SO, conforme Figura 2. Foram retiradas uma ou mais amostras, em diferentes profundidades, de cada furo de sondagem.

Figura 2 – Toposequência da área de estudo. Fonte: Oliveira e Petrucio, 2007.

As amostras e suas respectivas profundidades podem ser visualizadas na Tabela 1. A análise textural foi feita no Laboratório de Pedologia do Departamento de Geociências da UFSC. Tabela 1 - Profundidade das amostras. Amostras

Profundidade (cm)

Amostras

Profundidade (cm)

S-01 Am1

20

Am8

127

Am3

32

S-07 Am1

100

Am7

72

Am 2a

113

S-02 Am3

27

Am2b

113

S-04 Am1

20

Am4

138

Am2

40

Am9

200

S-05 Am2

25

S-08 Am6

52 21

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S-06 Am1

20

Am10

85

Am2a

67

S-09 Am1

118

Am2b

67

S-10 Am1

15

Am3

78

Am2

80

Am6

106

Am3

310

Na análise granulométrica, primeiramente foi retirada toda a umidade das amostras. As amostras foram quarteadas e reduzidas a 15g cada uma. Para que a matéria orgânica não interferisse nos resultados da granulometria, foi realizado o procedimento de queima da matéria orgânica com peróxido de hidrogênio. Após a determinação do teor de matéria orgânica foi acrescentada solução defloculante, a fim de desagregar totalmente os grãos. Para os sedimentos grosseiros (mais de 0,062 mm de diâmetro) utilizamos o processo de peneiramento. Para os sedimentos finos (com diâmetro igual ou menor a 0,062) foi utilizado o processo de pipetagem. No peneiramento a fração grosseira foi classificada de acordo com Wentworth, da maior abertura da malha para a menor, em: seixos; grânulos; areia muito grossa; areia grossa; areia média; areia fina, e areia muito fina. O material equivalente a cada classe foi transferido para um béquer e pesado, o resultado foi anotado na ficha de cálculos. Depois de pesado o material foi guardado em sacos plásticos a fim de se realizar análise morfoscópica. Depois de lavados os sedimentos grossos na peneira de 0,062 mm até a água da lavagem ficar límpida, o material que passou pela malha (finos em suspensão aquosa) passou pelo processo de pipetagem. O cálculo para a determinação do tempo, quantidade a ser pipetada e profundidade de coleta são feitos com base na Lei de Stokes. Os béqueres com o conteúdo pipetado voltaram à estufa para posterior pesagem. Na pipetagem, foi coletada a fração argila, calculando-se a fração silte por diferença de peso residual. Por último foram realizados os cálculos. Para a determinação da esfericidade, arredondamento e brilho das partículas utilizou-se lupa binocular devidamente ajustada a cada fração de amostra analisada. Os aspectos de esfericidade e arredondamento foram comparados a uma tabela de comparação visual proposta por Krumbein & Sloss (1963) apud Suguio (1973) na qual observa-se, para a determinação da esfericidade, a proporção entre comprimento largura das partículas e, para a determinação do arredondamento, a curvatura das arestas das feições. Foram traçadas curvas de frequência acumulada de cada amostra e determinados os graus de assimetria e curtose, com a utilização do software de análise e gráficos sedimentológicos Sysgran, versão 3.0, ajustado à metodologia proposta por Folk e Ward (1957). A partir desses dados, que foram analisados com base em Suguio (1973), foram tecidas considerações a respeito dos prováveis ambientes de sedimentação da área de estudo e dos mecanismos de transporte atuantes. 22

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4. Resultados e Discussão Os resultados da análise granulométrica permitem a identificação de características associadas a depósitos eólicos, aluviais e horizontes pedogenéticos. Os sedimentos eólicos são bem caracterizados pela sua bimodalidade (areia média e areia fina); os sedimentos aluviais contêm frações de sedimentos grossos (cascalho) indicando transporte e aporte de material do embasamento cristalino (substrato granítico); os sedimentos pedogenizados, ou relacionados a zonas de alagamento, são caracterizados por maior ocorrência de finos em relação às demais amostras, e ocorrem usualmente em amostras mais próximas à superfície, conforme mostra a Tabela 2. Tabela 2 – Distribuição das frações granulométricas. Fi (Φ)

-2

-1

0

1

2

3

4

5-8

9

Tamanho

Seixo

Grânulo

AMG

AG

AM

AF

AMF

TG

Fundo

Silte

Argila

T Ge

S-01 Am 1

0

0

0,02

0,28

16,23

56,57

6,39

79,49

0,3

8,34

10,08

98,21

Am 3

0

1,98

1,53

0,61

19,82

68,28

4,19

96,41

0,08

0,56

3

100,05

Am 7

0

1,87

1,41

0,59

17,91

69,8

3,9

95,48

0,06

2

1

98,54

S-02 Am 3

0

0

0,07

0,04

12,02

70,06

8,18

90,37

0,42

1,34

5,71

97,84

S-04 Am 1

0

0

0,28

4,49

68,47

18,59

3,39

95,22

0,08

2,04

1,02

98,36

Am 2

0

0

0,29

4,62

73,99

14,63

2,36

95,89

0,11

1,68

2,01

99,69

S-05 Am 2

0

0

0,09

0,66

45,94

35,41

9,43

91,53

0,32

3,67

2,7

98,22

S-06 Am 1

6,14

14,76

7,71

3,62

2,79

4,8

4,21

44,03

0,82

28,53

23,83

97,21

Am 2a

0

0

0,2

4,15

50,09

9,94

5,13

69,51

0,22

15,02

12,63

97,38

Am 2b

0

0,55

0,21

6,14

51,48

6,11

3,69

68,18

0,13

28,5

2,42

99,18

Am 3

0

0

0,18

7,4

48,27

6,58

3,99

66,42

0,32

15,3

16,33

98,38

Am 6

0

0

0,14

11,8

67,89

4,91

1,83

86,52

0

6,02

6,36

98,9

Am 8

0

0

0,17

7,83

69,3

8,48

2,61

88,4

0,06

1,47

8,71

98,64

S-07 Am 1

0

1,32

0,84

1,51

5,01

13,15

5,85

27,68

0,06

43,99

23,77

95,5

Am 2a

0

0,37

1,01

1,21

11,3

20,85

12,37

47,15

1,01

22,7

26,12

97,01

Am 2b

0

1,86

2,95

3,69

15,34

20,08

10,96

54,88

0,95

22,7

18,67

97,24

Am 4

0

0,14

0,4

5,88

49,8

10,77

4,41

71,35

0,18

8,68

19,09

99,3

23

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23

Am 9

0

0,06

0,7

20,23

53,53

4,6

2,06

81,21

0,04

8,61

8,96

98,82

S-08 Am 6

0

0

0,74

1

24,37

63,78

3,23

93,12

0,07

2

4,68

99,87

Am 10

0

0

0,33

1,38

29,44

62,75

3,11

97,01

0

S-09 Am 1

0

0

0,07

10,94

56,12

14,33

1,39

82,85

0,03

1,61

15,23

99,72

S-10 Am 1

0

0,7

0,42

0,45

22,84

55,25

8,29

87,95

0,23

5,1

5,1

98,38

Am 2

0

0,05

0,41

1,6

33,1

48,47

4,1

87,77

0,08

2,68

9,06

99,59

Am 3

0

0

0,2

0,18

21,49

58,85

7,09

87,81

0,23

2,68

7,72

98,44

0,33

2,33

99,67

S = sondagem; Am = amostra; AMG = areia muito grossa, AG = areia grossa; AM = areia média; AF = areia fina; AMF = areia muito fina; TG = total de grossos; T Ge = total geral. Tipo de Sedimento:

= Eólico

= Aluvial

= Pedogenizado

= Aterro

A análise morfoscópica gerou os seguintes resultados (Tabela 3).

Tabela 3 – Grau de esfericidade, arredondamento e brilho das frações analisadas. Esfericidade Amostra

Fração

Arredondamento

Brilho

N

0,3

0,5

0,7

0,9

Ang

SAng

SAr

Ar

BAr

Fosco

Polido

S-04Am1

AM

100

20

26

34

20

16

20

28

26

10

52

48

Am2

AF

100

34

40

20

6

25

34

18

21

2

30

70

Am2

AM

100

12

23

40

25

12

13

26

33

16

65

35

S-06Am8

AM

100

9

34

31

26

2

7

10

33

48

60

40

Am2a

AM

100

17

38

33

12

1

4

15

41

39

62

38

S-10Am1

AF

100

28

28

28

16

17

8

31

32

12

33

67

Am1

AM

100

20

14

37

29

3

8

19

47

23

63

37

Am3

AF

100

29

36

25

10

12

10

28

29

21

35

65

Am3

AM

100

19

34

28

19

8

12

26

26

28

44

56

N = número de grãos analisados; AF = Areia fina; AM = Areia média; Ang = angular; SAng = subangular; SAr = subarredondado; Ar = arredondado; BAr = bem-arredondado.

A análise do grau de esfericidade, arredondamento e brilho das partículas de quartzo das frações analisadas, sugere a existência de sedimentos de origem eólica misturados a sedimentos aluviais ao longo do perfil de sondagem. O brilho polido 24

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está relacionado a sedimentos aluviais enquanto o brilho fosco a sedimentos eólicos. Quanto ao grau de arredondamento, as partículas mais angulares estão associadas a sedimentos aluviais enquanto as arredondadas a sedimentos eólicos. O grau de esfericidade varia nos resultados obtidos, estando associado tanto a partículas de características eólicas quanto a partículas de características aluviais. Uma partícula com esfericidade correspondente a 0,3 é menos esférica que uma com esfericidade de 0,9. Os gráficos representando as curvas de frequência acumulada são apresentados a seguir.

Figura 3 - Curvas de frequência acumulada de todas as amostras analisadas. F = Sondagem; A = Amostra.

As curvas de frequência acumulada das amostras analisadas permitem a identificação de três tipos de sedimentos: areias de duna, na parte mais elevada do terreno, representadas pelas amostras F1A1, F1A3, F1A7, F2A3, F8A6, F8A10, F10A1, F10A2 e F10A3; areias aluviais com aporte pedogenético, nas amostras F7A1, F7A2a e F7A2b e areias aluviais bem lavadas, através da atuação de escoamento superficial, ilustradas pelas amostras F4A1, F4A2, F5A2, F6A2a, F6A2b, F6A3, F6A6, F6A8, F7A4, F7A9 e F9A1. Os resultados da análise do grau de assimetria e curtose podem ser visualizados na Tabela 4. Tabela 4 – Interpretação do grau de assimetria e curtose das amostras analisadas. Amostra

Assimetria

Classificação

Curtose

Classificação

Interpretação

S-01 Am 1

0,6359

Muito positiva

3,251

Extremamente leptocúrtica

Origem eólica mais expressiva

Am 3

-0,1222

Negativa

1,464

Leptocúrtica

Origem eólica

Am 7

-0,1484

Negativa

1,422

Leptocúrtica

Origem eólica

S-02 Am 3

0,3332

Muito positiva

3,979

Extremamente leptocúrtica

Origem eólica mais expressiva

25

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25

S-04 Am 1

0,3724

Muito positiva

1,364

Leptocúrtica

Origem eólica Origem eólica

Am 2

0,3638

Muito positiva

1,494

Leptocúrtica

S-05 Am 2

0,3493

Muito positiva

1,496

Leptocúrtica

Origem eólica

S-06 Am 1

-0,2058

Negativa

0,4971

Muito platicúrtica

Aterro

Am 2a

0,7753

Muito positiva

0,8913

Platicúrtica

Origem aluvial com aporte pedogenético

Am 2b

0,5323

Muito positiva

1,043

Mesocúrtica

Origem aluvial com aporte pedogenético

Am 3

0,748

Muito positiva

0,7327

Platicúrtica

Origem aluvial com aporte pedogenético

Am 6

0,5467

Muito positiva

4,396

Extremamente leptocúrtica

Origem eólica mais expressiva

Am 8

0,5591

Muito positiva

4,51

Extremamente leptocúrtica

Origem eólica mais expressiva

S-07 Am 1

-0,1672

Negativa

0,6715

Platicúrtica

Origem aluvial com aporte pedogenético

Am 2a

0,2836

Positiva

0,558

Muito platicúrtica

Origem aluvial com aporte pedogenético

Am 2b

0,3249

Muito positiva

0,7111

Platicúrtica

Origem aluvial com aporte pedogenético

Am 4

0,7632

Muito positiva

0,817

Platicúrtica

Origem aluvial com aporte pedogenético

Am 9

0,6465

Muito positiva

3,663

Extremamente leptocúrtica

Origem eólica mais expressiva

S-08 Am 6

0,2045

Positiva

3,157

Extremamente leptocúrtica

Origem eólica mais expressiva

Am 10

-0,1546

Negativa

0,9694

Mesocúrtica

Origem aluvial com aporte pedogenético Origem eólica mais

S-09 Am 1

0,7309

Muito positiva

2,622

Muito leptocúrtica

expressiva Origem eólica mais

S-10 Am 1

0,2581

Am 2

0,27 71

Am 3

2,912

Positiv a

0,33 75

Positiva

Muito leptocúrtica 2

,682 Muito

positiva

,513

Origem eólica mais Muito leptocúrtica

3

expressiva

expressiva

Extremamente leptocúrtica

Origem eólica

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A análise do grau de assimetria e curtose permitiu a identificação de sedimentos eólicos transportados para outros ambientes, sedimentos aluviais e horizontes pedogenéticos. Os resultados obtidos na análise granulométrica sugerem que a área de estudos possui características associadas a depósitos eólicos, intercalados com sedimentos aluviais e horizontes pedogenéticos. A presença de sedimentos provenientes da encosta e com características de transporte aluvial, misturados a sedimentos eólicos, é um indício de que a provável duna existente na área de estudo sofreu processos de dissipação, caracterizando rampa arenosa ou rampa de dissipação, segundo terminologia proposta por Bigarella (1974). 5. Considerações Finais Segundo Oliveira e Herrmann (2001), os riscos de ocupação de áreas de dunas e de rampas de dissipação estão relacionados à erosão dessas áreas, por tratar-se de material pouco coeso e altamente friável. O bairro do Canto da Lagoa, onde está localizada a área de estudo, passa por processo de urbanização acelerada, que acontece no município de Florianópolis. Segundo Barbosa (2003), de acordo com a Lei Municipal 2193/85, referente ao Plano Diretor dos Balneários, a área de estudo é considerada Área Turístico Residencial. Áreas de dunas e rampas de dissipação são consideradas Áreas de Preservação Permanente de acordo com IPUF (2004). Este trabalho resulta, portanto, em esforço para caracterizar ambientes de sedimentação pretéritos, auxiliando a definição de sua capacidade de uso em áreas urbanas. Porém, estudos mais aprofundados ainda são necessários na Ilha de Santa Catarina.

Referências Bibliográficas BARBOSA, T. C. P. Ecolagoa: um breve documento sobre a ecologia da Bacia Hidrográfica da Lagoa da Conceição. Florianópolis: Gráfica Agnus, 2003. BIGARELLA, J.J. (1974) Structures developed by dissipation of dune and beach ridge deposits. Catena, 1:107-152. CARUSO Jr, F. 1993. Mapa Geológico da Ilha de Santa Catarina, escala 1:100.000, texto explicativo e mapa. Notas técnicas, IG/CECO/UFRGS, n.6. IPUF - Instituto de Planejamento Urbano de Florianópolis, 2004. Atlas do Município de Florianópolis. Prefeitura Municipal de Florianópolis. Florianópolis – SC. MUNSSEL SOIL COLOR CHART. Munssel Color Company. Baltimore, 1994. OLIVEIRA, M. A. T.; HERRMANN, M. L. de P. Ocupação dos solos e riscos ambientais na área conurbada de Florianópolis. In: GUERRA, A. J. T. [et al.] Impactos Ambientais Urbanos no Brasil. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001. 27

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OLIVEIRA, M. A. T.;PETRUCIO, M. M. Laudo Pericial, ao Doutor Zenildo Bodnar, Juiz Federal Substituto, Vara Ambiental e Agrária, Subseção Judiciária de Florianópolis, Seção de Santa Catarina. Processo de número 2004.72.00.009707-0. Jul/2007. PAISANI, J. C. (2001) Estruturas de Dissipação: uma Revisão Conceitual. Pesquisas em geociências, n. 28(2), p. 133-140. PAISANI, J. C. Estratigrafia, Significado Paleoambiental e Evolução de Rampa Arenosa/Dissipação no Balneário Praia Mole – Ilha de Santa Catarina. Tese de Doutorado. UFSC, Florianópolis, abril 2004. PAISANI, J. C. 2006. Sedimentologia e Estratigrafia de Rampa Arenosa – Praia Mole (SC) – e sua Correlação com Eventos Paleoclimáticos Globais.Pesquisas em Geociências, 33 (2): 87 – 99, 2006. SUGUIO, K. Introdução à Sedimentologia. São Paulo: Edgard Blücher, 1973. SUGUIO, K. Rochas Sedimentares: propriedades, gênese, importância econômica. São Paulo: Edgar Blücher, 1980.

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Considerações acerca da Evolução das Chapadas do Oeste Mineiro: O estudo da Evolução das Vertentes no Subcompartimento da Chapada Oriental na Área de Influência do Rio Bagagem 1

Silvério Antônio Neves Juliana Paula da Silva Rodrigues 3 Carlos Alberto Araujo Campos

2

1,2,3

Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM 1

[email protected] 2 [email protected] 3 [email protected]

Resumo O seguinte trabalho tem o intuito de efetuar uma análise a respeito das feições geomorfológicas da Bacia do Rio Bagagem, destacaremos a compartimentação geomorfológica na bacia hidrográfica do Rio Bagagem e a evolução de uma subacia de amostragem. Os pressupostos teóricos estão pautados nos estudos desenvolvidos por Ab‟Saber (1969) e os mapeamentos foram elaborados com materiais fornecidos pelo Laboratório de Cartografia do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia. Cartas Topográficas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 1979) em escala 1:100.000, imagens de Satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). A redução das áreas úmidas em função da agricultura, implementou uma nova dinâmica nas vertentes. A quantidade de energia que entra nesse sistema propicia uma saída maior de matérias. Esse fator foi bem acentuado pela substituição da vegetação natural por culturas. Os fluxos superficiais ganharam uma nova participação na retirada de matéria da microbacia, impondo uma nova esculturação nas vertentes. A intensa ocupação das vertentes arremete a considerações acerca do uso do solo e suas limitações. Desta forma a aplicação da metodologia proposta por Ab Saber (1969), possibilita a compartimentação topográfica e a individualização das áreas da paisagem conforme suas características e facilita a aplicação de estudos pontuais, que podem gerar informações de grande relevância quanto a dinâmica de evolução das chapadas.O estudo permite avaliar que os processos erosivos que ocorrem na área de experimentação, são comuns as demais subacias que compõem a bacia hidrográfica do rio Bagagem. Palavras chave: Erosão, Evolução das Chapadas, Relevo

Abstract The following work aims to make an analysis about the geomorphological features of the watershed of Bagagem river, we are going to highlight the partitioning of this watershed and geomorphological evolution of a channel first order of sampling. The theoretical assumptions are guided by the studies developed by Ab’Sáber (1969) and the maps were elaborated with materials provided by Cartography Laboratory of the Institute of Geography, University Federal Uberlândia. Topographic charts of the Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 1979) at 1:100,000 scale, Satellite images from the Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). The reduction of wetlands due to agriculture, implemented a new river slope dynamic. The amount of energy that enters this system provides a greater output of materials. This factor was well marked by the replacement of natural vegetation by crops. The surface flows gained a new interest in matters of withdrawal of the watershed, imposing a new sculpture on the river slope. The intense occupation of the river slope rushes to considerations of land use and its limitations. Thus the application of the methodology proposed by Ab Saber (1969), enables the topographical partitioning and individualization of the landscape areas according to their 29

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characteristics and facilitates the implementation of specific studies that can generate information of great relevance as the dynamic evolution of the plateaus. The study allows us to evaluate the erosion processes that occur in the area of experimentation, are common in sub watersheds of the Bagagem river. Keywords: Erosion, Evolution of the plateaus, forms of land

1. Introdução A busca pelo entendimento da dinâmica dos processos erosivos nos motivou ao estudo e à elaboração deste trabalho, visando gerar informações que possam direcionar ou pelo menos nortear pesquisas relacionadas ao tema: erosão laminar e seus impactos na evolução das vertentes e, consequentemente, a dinâmica das Chapadas. A agricultura e sua característica marcante de ocupação de extensas áreas sugere um entendimento do novo padrão de comportamento instaurado na paisagem, cabendo então à ciência esta análise integrada, da ocupação antrópica e do novo padrão imposto à paisagem. As chapadas em estudo neste trabalho conforme a Figura 01, apresentaramse como áreas com um grande potencial para a expansão da agricultura sendo propícias à mecanização da agricultura, e sendo assim, foram rapidamente absorvidas pela nova ordem capitalista, visando a obtenção de lucros através da exportação de grão. Esta situação foi direcionada por planos governamentais. Assim novas áreas passaram a reproduzir esse interesse, como uma grande “célula inoculada por um vírus, sendo obrigada a reproduzir para ele”. A paisagem foi então retrabalhada em função de interesses, mas com o passar do tempo, os primeiros sintomas ou efeitos foram surgindo, como assoreamento dos rios, diminuição de vazão, poluição dos solos, erosão, etc. Entendemos que a paisagem encontra-se “doente” necessitando de um diagnóstico, e urgentemente de um prognóstico. Frente a essa expansão agrícola, os cerrados passaram a contar com uma agricultura moderna. Segundo Baccaro (1990), a modernização da agricultura não tem sido benéfica ao meio natural, onde o uso de maquinários tem gerado a compactação dos solos, acentuando o escoamento superficial e, em consequência, a erosão laminar. Essa forma de ocupação das áreas de cerrados vem acelerando os processos de erosão e, consequentemente, os de assoreamento de fundo de vales, bem como levando ao empobrecimento dos solos e a diminuição da vazão dos mananciais. Assim, ao se estudar a dinâmica dessa paisagem do cerrado, tem que se avaliar as ações antropogênicas do passado e do presente, acreditando que as alterações são bruscas e rápidas.

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2. Pressupostos Teóricos O desenvolvimento do trabalho foi pautado na linha teórico-metodológica proposta por Ab’Sáber (1969) através da obra Um conceito de geomorfologia a serviço das pesquisas sobre o Quaternário que, em poucas palavras, contribuiu de forma decisiva para um novo encaminhamento das pesquisas geomorfológicas no Brasil, por permitir ao pesquisador trabalhar desde as macro escalas até os processos pontuais. Para Abreu (1982) a metodologia proposta por Ab ‟Saber (1969), revela uma flexibilidade que permite um ajustamento mais satisfatório em relação à essência dos fatos estudados, tanto do ponto de vista espacial como temporal. Desta forma para a análise regional, foi considerada a Bacia Hidrográfica do Rio Bagagem, já para a avaliação dos processos erosivos pontuais, adotou-se uma subacia, em um compartimento representativo, localizado em uma área de topo plano e baixas declividades. A análise bibliográfica foi realizada durante todo o desenvolvimento da pesquisa abrangendo desde artigos, livros, dissertações, teses, capítulos de livros, relatórios, fotografias, enfim todo tipo de material que pudesse contribuir de alguma forma para o enriquecimento do trabalho. É uma etapa que não se finda por estar sempre surgindo novas discussões e visões sobre os temas estudados, contudo buscamos nortear nossas leituras nos temas referentes à geomorfologia ambiental, estudos ambientais, relevo e paisagem, representação de fatos geomorfológicos. Os mapeamentos foram feitos com base nos materiais fornecidos pelo Laboratório de Cartografia do Instituto de Geografia da Universidade Federal de Uberlândia. Cartas Topográficas do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE, 1979) em escala 1:100.000, imagens de Satélite do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).Foram elaborados os mapas da Compartimentação Geomorfológica em escala 1:250.000 e mapeamentos geomorfológicos em escala 1:50.000 da área de amostragem. O software utilizado para digitalização dos mapas é o AutoCad 2010.

3. Resultados e Discussões O Rio Bagagem conforme Figura 02, possui características de rio de chapada, em seu curso superior predominando área de topo plano, com vertentes longas e suaves e distância interfluvial grande, tendo baixas declividades. A área de influência do rio, também foi estudada por Ferreira e Baccaro (2000), tendo classificado o relevo em duas grandes Unidades estruturais e esculturais sendo elas: • Bacia Sedimentar do Paraná, com unidade morfo-escultural Planalto Tabular, compreendendo áreas elevadas de cimeira entre 950 e 1.050m, com topos planos, com um modelado do tipo denudacional tabular e declividades entre 1 e 10%. A litologia descrita é formada por rochas da Formação Marília, Formação Uberaba e Serra Geral. Os solos são do tipo Latossolo – Vermelho – Escuro, Vermelho – Amarelo Distrófico e Eutrófico. 31

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• No médio e baixo curso a morfo-estrutura é diferenciada sendo ela apontada como Faixa de Dobramento, com litologias vulcânicas sedimentares, que sofreram metamorfismo, originando rochas do tipo xisto e Filito. A Unidade Moro-escultural presente é o Planalto Dissecado (Faixa Uruaçu), caracterizada por formas convexas, aguçadas e planícies fluviais. O grau de entalhamento dos vales varia entre fraco e forte, a dimensão interfluvial é pequena. Suas declividades são bem variadas, indo de 2 a 90%, com altimetrias que vão de 700 a 900m. A litologia desta unidade escultural é descrita pelos Quartizitos, Filitos e Gnaisses. Os solos são litólicos na parte mais dissecada, e na área mais convexa predominam os Podzólicos Vermelho – Amarelo e Latossolo Vermelho – Amarelo.

Figura 01: Bacia do Rio Bagagem MG Fonte: Base Cartografica do IBGE 1978

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Figura 02: Bacia do Rio Bagagem MG Fonte: Imagem TM/Landsat (1997)

Feltran Filho (1997) aponta algumas hipóteses relativas a origem das chapadas, em uma síntese geológica, climática e geomorfológica. Para este autor a evolução percorre desde o Devoniano e o Jurássico, onde a bacia do Paraná sofreu grandes transformações, em função do arqueamento no País. Essa situação de arcos formou um embaciamento onde se depositaram no cretáceo, os sedimentos do Grupo Bauru. O basculamento da região do Triângulo e Alto Paranaíba teriam orientado a drenagem no sentido do rio Paranaíba. O Terciário na Região Centro-Oeste do Brasil passou de um clima árido, predominante no Cretáceo, para um clima mais úmido, no Cenozóico inferior. Criaram-se condições de aprofundamento dos canais fluviais e um desnivelamento topográfico e acentuando o recuo paralelo das vertentes. Esse ambiente propiciou o rebaixamento das cotas altimétricas e a continuada remoção de sedimentos dos topos para o fundo de vale. Segundo Ab’Sáber (1977) apud Feltran Filho (1997) dentro do Plioceno, a região passou por uma mudança climática associada a uma reativação tectônica, o clima passou a ser mais seco e frio. O lençol freático passou por oscilações e rebaixamento lento e os canais fluviais provocam uma incisão mais pronunciada, redefinindo o nível de base local. No Holoceno as condições do clima na região, formularam uma alternância entre estação chuvosa e estação seca, acelerando o intemperismo químico e a erosão superficial. Com uma maior quantidade de água no sistema a denudação prevalece e a evolução topográfica segue seu rumo com intensa lixiviação e formação de camadas detríticos – lateríticas. Feltran Filho (1997) ainda faz uma análise na chapada e caracteriza os topos, como uma área importante para as atividades (urbanas e rurais ), sendo por isso mesmo, cada vez mais requisitadas. Os topos das chapadas juntamente com as 33

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vertentes, objeto deste estudo, segundo King (1956), representam os testemunhos mais preservados de um processo erosivo generalizado, ocorrido no Terciário, denominado de superfície “Sul-Americana”. Segundo proposta apresentada pelo autor, é possível identificar, ainda no Oeste mineiro, mais duas superfícies de aplainamento: uma delas mais elevada e mais velha que a “Sul-Americana” foi chamada de “ Pós-Gondwana”; a outra, em compartimento morfológico mais baixo que a “Sul-Americana”, corresponderia ao ciclo “Velhas”. Dada a importância que a análise climática representa na estruturação das paisagens influindo na determinação do tipo de meteorização dominante e interferindo nos processos morfoclimático, na cobertura vegetal e na esculturação das vertentes, são muito relevantes as informações da dinâmica atmosférica geral da América do Sul e do Brasil, para entender como as massas de ar determinam as condições climáticas regionais. Durante a fase seca, de meados de abril a meados de setembro, o domínio regional é exercido pela massa de ar Tropical Atlântica. A Massa Tropical Atlântica ao encontrar a barreira formada pelo relevo da (Serra do Mar), perde parte de sua umidade por condensação, provocando chuvas na orla marítima, chegando, ao interior do continente, mais seca. No Oeste mineiro, as precipitações leves e chuviscos são entendidas popularmente como precursoras de resfriamento do clima. Neste período do ano as condições atmosféricas são de estabilidade, com céu limpo, baixa umidade relativa do ar, com temperaturas altas durante o dia, devido à insolação, e acentuada queda durante a noite, pela ausência de cobertura de nuvens. Os ventos predominantes de leste na região são indicadores de tempo estável. Resultados obtidos por Baccaro (1990), chama a atenção para a concentração de chuvas de 24 horas, superiores à 60mm, comuns durante os meses mais chuvosos, e para os problemas de erosão na área rural. Registra também a ocorrência de desastres no meio urbano, relativos ao escoamento superficial, decorrentes do rápido crescimento da cidade. Nas chapadas do oeste mineiro, os Latossolos Vermelho-Amarelos (LE) e Vermelho-Escuro (LV) são os de maior ocorrência. Ocupam os topos das chapadas, em relevos planos e suaves ondulados, sob vegetação de cerrado, em altitudes superiores a 850m. São solos minerais, não hidromórficos e apresentam horizontes B latossólico. Os Latossolos Vermelho Escuros Distróficos, no geral, são profundos a muito profundos, bem drenados, friáveis, bastante porosos, com baixa saturação de bases. Possuem estrutura granular, pequena a muito pequena raramente em blocos subangulares, fraca a pequena, conferindo-lhe aspecto macio; são solos argilosos a muito argilosos, com teor de argila entre 43 a 90% e são pouco suscetíveis a erosão. Para a área das chapadas, o RADAM BRASIL (1983) apud Feltran Filho (1997) chama a atenção à diferenciação existente entre os Latossolos VermelhoEscuros derivados de rochas do grupo Bauru (com textura média e teores de argila entre 12 e 31%, com predomínio de valores inferiores a 25%) e os localizados na área de contato com os da cobertura Terciária, com grande variedade textural. 34

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Quanto à distribuição dos solos nas chapadas, podemos supor de modo geral, que os Latossolos Vermelho-Amarelos são os que predominam nas partes mais elevadas da topografia. Os solos hidromóricos estariam distribuídos nas chapadas, sempre margeando os cursos fluviais e áreas deprimidas, formando as veredas. Dentro deste contexto de esculturação implementado no Quaternário, a pesquisa irá abordar o médio / alto curso do rio Bagagem, buscando uma subacia expressiva no âmbito do compartimento de Topo Plano, bem como de suas características de uso do solo e tipo de solo. Segundo Feltran Filho (1997), na análise das paisagens destaca-se em importância a vegetação, que além de reduzir os efeitos do escoamento superficial, especialmente em zona climática tropical, possui ação controladora ou estabilizadora. A vegetação natural exterioriza as relações combinadas entre os fatores e elementos, sob determinadas condições ambientais, refletindo os processos morfodinâmicos que comandam a construção de um conjunto organizado de características, denominado paisagem. Desta forma percebe-se que a vegetação não só insere na paisagem a beleza, como também protege o solo das intempéries climáticas. Conforme Lima (1998), o cerradão, mata galeria e matas ocupam 21,9% da região, o cerrado ocupa 13,8% do Triângulo Minero, podendo ser representado pelo cerrado “sensu strictu”, com espécies arbóreas de 4 a 8 metros de altura, campo cerrado de 2 a 4 metros de altura, apresentado mata galeria ou mata ciliar ao longo dos canais fluviais. Na subacia de estudo os dados da vegetação são representados conforme a Tabela 01, onde o uso pela atividade agrícola predomina na área, o que impõem uma dinâmica considerável, ao que tange os processos erosivos nas encostas e sua relação direta com a evolução da Chapada em análise. Tabela – 01 – Cobertura Vegetal Natural e o Uso do Solo na Microbacia do Córrego Pantaninho.

Categoria Cultura Temporária Reflorestamento Campo Higrófilo Cerrado Represa Mata Pastagem Cultura Perene Total

Km2 22,37 9,39 3,64 0,9 0,61 0,58 0,5 0,47 38,46

Há 3.237 939 364 90 61 58 50 47 3846

% da área 58,5 24 9,5 2,4 1,6 1,5 1,3 1,2 100

Fonte: Campos (2004).

A avaliação desses elementos apontados é de grande relevância para a compreensão do grande mosaico que forma as paisagens das chapadas e ainda facilitar a delimitação de processos esculturais atuantes na área. Na subacia 35

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adotada para as análises mais pontuais, foram montadas estações experimentais, para a quantificação do escoamento pluvial, e as taxas de perda de solo. Os resultados obtidos são expressos na Tabela 02, e que permite inferir acerca dos dados, apontando que mesmo em áreas planas a condição do uso do solo impõe uma relativa contribuição nas perdas de solo e água, principalmente em situações de preparo do solo e início do desenvolvimento das culturas que são cultivadas. Tabela 02: Perda de solo e água na Cultura de Soja/Palha no período de out/2000 – mar./2001.

Período Out./2000 Nov./2000 Dez./2000 Jan./2001 Fev./2001 Mar./2001

Uso do Solo Palha Soja Soja Soja Soja Soja

Pluviosidade mm 71,00 193,00 273,00 131,10 20,00 158

Perdas Solo T/ha/m 0,003 0,344 0,022 0,0199 0,00014 0,003

Água

L/ha/m 8800 28200 37900 16100 2000 31800

Fonte: Campos (2004).

4. Conclusões/Considerações Finais A cobertura vegetal possui uma ampla relevância nos aspectos pertinentes aos processos erosivos. De uma forma geral os primeiros meses da estação chuvosa são cruciais, para uma avaliação da dinâmica das vertentes dessa microbacia. A compreensão dessa dinâmica pode direcionar novas ocupações nas áreas de chapadas, pois, essa microbacia é extremamente representativa em termos de uso do solo, ocupação, tipos de solos e pluviosidade. Assim, a dinâmica de suas vertentes torna-se um referencial a ser adotado para um manejo racional de bacias hidrográficas em topo de chapadas. A fragilidade da sub-bacia do córrego Pantaninho está bem evidenciada, pelos resultados apresentados. A intensa ocupação das vertentes arremete a considerações acerca do uso do solo e suas limitações. A redução das áreas úmidas em função da agricultura, implementou uma nova dinâmica nas vertentes. A quantidade de energia que entra nesse sistema propicia uma saída maior de matérias. Esse fator foi bem acentuado pela substituição da vegetação natural por culturas. Os fluxos superficiais ganharam uma nova participação na retirada de matéria da microbacia, impondo uma nova esculturação nas vertentes. Com as características argilosas dos solos e sua compactação, ocorre o aumento do escoamento superficial pluvial e uma diminuição considerável da infiltração, avaliando ainda que essa dinâmica está limitada as áreas com culturas. O reflorestamento de pinus na unidade Geoambiental de Topo, garante uma boa infiltração das águas pluviais no solo, formando uma grande reserva de água para a sub-bacia. 36

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A representação da sub-bacia como uma referência pela busca de parâmetros de uso do solo, torna-se de fundamental importância para o entendimento da dinâmica imposta a chapada, principalmente no que tange a representatividade da mesma no contexto do uso do solo, características dos solos, declividades e unidades de vertentes. Desta forma a aplicação da metodologia proposta por Ab Saber (1969), possibilita a compartimentação topográfica e a individualização das áreas da paisagem conforme suas características e facilita a aplicação de estudos pontuais, que podem gerar informações de grande relevância quanto a dinâmica de evolução das chapadas. O estudo permite avaliar que os processos erosivos que ocorrem na área de experimentação, são comuns as demais sub-bacias que compõem a bacia hidrográfica do rio Bagagem. Referências Bibliográficas ABREU, A.A. Análise Geomorfológica: reflexão e aplicação – Uma contribuição ao conhecimento das formas de relevo do Planalto Diamantina – MG. 1982. Tese (Livre Docência em Geografia) Faculdade de Filosofia Letras e Ciências Humanas, Departamento de Geografia, Universidade de São Paulo, São Paulo. 1982. AB’SÁBER, A.N. Um conceito de Geomorfologia a serviço das pesquisas sobre o Quaternário. Geomorfologia 18, São Paulo, 1969. BACCARO, C.A.D.; CAMPOS, C.A.A. Os processo Erosivos e a Sustentabilidade Ambiental em Área de Cerrado. SHIKI, S. (Org.). In:________ Sustentabilidade do Sistema Agroalimentar nos Cerrados: Entornos de Irai de Minas. Uberlândia, EDUFU, 2000. p. 69 – 86. BACCARO, C.A.D. Estudo dos processos geomorfológicos de escoamento pluvial em área de cerrado. Tese (Doutorado em Geografia Física), FFCHL, Universidade de São Paulo, 1990 BERNARDINO, A.R. Fertilidade e compactação dos solos da microbacia do córrego Pantaninho. Sociedade e Natureza, Uberlândia, v.1, n.15, p.75-81, jan/dez. 1996. CAMPOS, C. A. A. O uso de estações experimentais para avaliação da erosão laminar em área agrícola, em condições de vertente e fundo de vale – Córrego Pantaninho – Romaria – MG. 2004. 127f. Dissertação (Mestrado em Geografia). Instituto de Geografia, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2004. FELTRAN FILHO, A. A estrutura das paisagens nas chapadas do oeste mineiro. Tese (Doutorado em Geografia Física) FFCLH – USP. São Paulo, 1997. FERREIRA, I.L.; BACCARO, C.A.D Mapeamento Geomorfológico do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba. Relatório FAPEMIG / UFU. Uberlândia. Agosto de 2000. KING, L. C. A Geomorfologia do Brasil Oriental. Revista Brasileira de Geografia. Rio de Janeiro. Nº 18. 1956. LIMA, S.C et al. Avaliação do cerrados de Minas Gerais e indicação de áreas potenciais para preservação. Uberlândia. Sociedade & Natureza, v.1, nº19, p.05-44, nov.1998. 37

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Carste em Rochas Quartzíticas: o Exemplo das Grutas do Parque Estadual do Ibitipoca/MG 2 e seu Potencial para o Geoturismo Lilian Carla Moreira Bento1 Sílvio Carlos Rodrigues2 Universidade Federal de Uberlândia – UFU – Instituto de Geografia – IG

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Resumo O Parque Estadual do Ibitipoca é uma unidade de conservação localizada no sudeste de Minas Gerais e que faz parte do Distrito Espeleológico Ibitipoca com grande quantidade e diversidade de grutas esculpidas em quartzito. Nesse sentido, o objetivo desse trabalho é compreender o processo de carstificação envolvido na gênese dessas grutas, analisando o potencial desses locais para a prática do geoturismo. A metodologia empregada constituiu-se, em síntese, de revisão bibliográfica pertinente ao tema, trabalhos de campo na área de estudo e trabalhos de gabinete, momento em que ocorreu a integração e análise dos dados. Conclui-se na expectativa de que esse processo de carstificação em rochas quartzíticas, aqui estudado, possa ser repassado aos turistas através do geoturismo e que o Parque Estadual do Ibitipoca, em destaque para suas grutas, seja visto muito além de sua beleza cênica, mas como uma página de evolução do planeta Terra que merece ser interpretada, valorizada, divulgada e (geo) conservada. Palavras chave: Carste. Quartzito. Geoturismo.

Abstract Taking into consideration that the Parque Estadual do Ibitipoca, located in the cities of Lima Duarte, Santa Rita do Ibitipoca and Bias Forte, in the southeast of Minas Gerais, is parto of the Ibitipoca Speleological District with a great quantity and diversity of caves shaped in quartzite, the objective of this paper is to reflect upon the process of karstification involved in the genesis of those caves. More than just reflect, it is expected that the results hereby discussed may be made available to tourists of the park, through an accessible language in personalized or non-personalized interpretative means. The methodology used has constituted, to sum up, of bibliographical revision concerning the theme, field works in the study area and office work, the moment when integration and data analysis took place. One has concluded in the expectation that this karst process in quartzite rocks here studied may be given to tourists through geotourism and that the Parque Estadual do Ibitipoca, remarking their caves, may be seen beyond its scenical beauty, but as an evolution page of the Earth planet which deserves to be interpreted, valued, publicized and (geo) conserved. Keywords: Karst. Quartzite. Geotourism.

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Texto adaptado do artigo “FEIÇÕES CÁRSTICAS EM ROCHAS QUARTZÍTICAS: UM ESTUDO DAS GRUTAS DO PARQUE ESTADUAL DO IBITIPOCA/MINAS GERAIS E SUAS IMPLICAÇÕES PARA O GEOTURISMO” submetido a Revista Brasileira de Geomorfologia em 27 de maio de 2012.

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1. Introdução O Parque Estadual do Ibitipoca é uma unidade de conservação do Estado de Minas Gerais que apresenta uma grande beleza cênica a qual está associada, entre outros, ao processo de carstificação em quartzitos, destacando-se um grande número de grutas, entre as quais a Gruta das Bromélias é considerada uma das maiores do mundo. Apesar da atividade turística já estar consolidada na área, percebe-se a inexistência de segmentos que incentivem o entendimento dos turistas acerca dos atrativos visitados, no intuito de promover sua valorização como propõe o geoturismo, em específico dos aspectos geológico-geomorfológicos que são a base para o entendimento das feições encontradas no parque. O objetivo desse trabalho é compreender a formação das grutas encontradas neste parque, dada sua diversidade e quantidade, de forma que posteriormente essas informações possam ser aproveitadas e repassadas aos turistas, levando-os a compreender o processo de carstificação em rochas siliciclásticas, superando sua visão contemplativa. A justificativa para tal é que apesar dessas grutas, entre outras feições cársticas do parque, serem seu cartão postal, são também apenas alvo de apreciação e deslumbramento, negligenciando seu potencial de sensibilização quanto a importância desse tipo patrimônio natural que representa um bem singular para a sociedade em geral, numa perspectiva já apontada por Tilden (1977): “através da interpretação, a compreensão; através da compreensão, a apreciação, e através da apreciação, a proteção”.

2. Metodologia O PEI é uma unidade de conservação com 1488 ha criada em 1973, localizada entre os municípios de Lima Duarte, Santa Rita do Ibitipoca e Bias Forte e segundo pesquisas, as rochas predominantes no parque são os quartzitos associados ao Grupo Andrelândia – Proterozóico Médio (NUMMER, 1991; DNPM, 1991; ZAIDAN, 2002; SILVA, 2004; RODELA, 2010;), não se encontrando na área rochas carbonáticas – (Figura 1).

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Figura 1: Localização da área de estudo

A metodologia empregada para atingir os objetivos propostos pode ser dividida nas seguintes etapas: a) Revisão bibliográfica: baseou-se na leitura e fichamento de obras referentes à caracterização da área de estudo, sobre estudos de carstificação em rochas não carbonáticas e, ainda, sobre o geoturismo. b) Trabalhos de campo: ocorreram no Parque Estadual do Ibitipoca para reconhecimento da área, enfatizando as grutas, com anotação das coordenadas geográficas através de um aparelho de GPS modelo Juno ST da Trimble e documentação fotográfica. c) Trabalho de gabinete: permitiu a integração e análise dos dados obtidos, além da elaboração do mapa geológico-estrutural com a localização das grutas atualmente abertas à visitação, utilizando a plataforma ArcGIS 9.3.1 a partir de informações cartográficas disponibilizadas pelo Instituto Estadual de Florestas.

3. Contexto Geológico-geomorfológico do Parque Estadual do Ibitipoca Por se tratar de uma área bastante metamorfizada não é tarefa fácil distinguir as rochas aflorantes no parque, pois se trata, na verdade, de um complexo litológico que abrange desde quartzitos (de granulação média a grossa, com teor baixo e alto de mica), a gnaisse finamente bandado, micaxisto, biotita, muscovita etc., sendo os 40

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primeiros de maior expressão local (90%) e representando a unidade superior do Grupo Andrelândia na região. Sobre isso o DNPM (1991) relata que os quartzitos encontrados são de granulometria média a grossa, há níveis de transição para tipos com aspecto de quartzo de veio, com pouca mica e minerais coloridos e apresentam estrutura com orientação plana, geralmente alongada. Subordinadamente a esses quartzitos grossos aparecem outros mais finos e micáceos, geralmente onde as grutas tendem a ser esculpidas (Figura 2). Choudhuri ([200?]) explica que esse tipo de granulometria ocorre quando as rochas são submetidas aos graus médio e alto de metamorfismo, a que corresponde a fácies anfibolito, resultando numa granulometria maior por causa da melhor cristalização e/ou recristalização dos grãos minerais, bem como formação de minerais novos, reforçando a foliação da rocha. O relevo é influenciado por tectonismo de idade estimada do PlioPleistocênica (SCHAEFER, 2006), com soerguimentos de blocos e falhamentos os quais impõem controle estrutural sobre a morfologia atual. Isso é evidenciado por grandes linhas de falha e escarpas, relevos alinhados coincidindo com os dobramentos e falhamentos mais recentes, sendo as direções principais dos lineamentos NE-SW (RODELA, 2010). Ao redor do parque são encontradas rochas do Complexo Mantiqueira, predominando os gnaisses, os quais sendo mais facilmente erodidos que os quartzitos geram um modelado mais suave, de mares de morros, enquanto que no parque são encontradas as maiores altitudes, com o Pico da Lombada (1784m), apresentando um modelado mais íngreme, montanhoso. Esse tipo de erosão diferencial também já foi verificado em outras regiões, como na Depressão de Gouveia e entorno, onde os granitos se mostraram mais susceptíveis à desnudação do que os quartzitos, bem como no Quadrilátero Ferrífero (SALGADO; VALADÃO, 2003, SALGADO et al, 2004) - (Figura 2).

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Figura 2: Mosaico de fotos com características geológicas e do relevo do PEI: (A) – Inclinação das camadas rochosas; (B) – Estrutura planar das camadas de quartzito; (C) – Granulometria grossa do quartzito; (D) – Vale encaixado refletindo influência tectono-estrutural e (E) – Contraste do relevo do parque a leste com dos arredores a norte/oeste. Autor: Bento, 2012.

Como resultado do controle estrutural associado a litologia e clima locais aparecem diferentes feições geomorfológicas no parque: cânions, quedas d’água, praias fluviais, grutas, entre outros, que são os grandes atrativos turísticos do Parque Estadual do Ibitipoca.

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4. Resultados e Discussão A espeleogênese das grutas encontradas no Distrito Espeleológico Ibitipoca (DI) já foi alvo de algumas pesquisas, como as de Corrêa Neto et al (1997) e Silva (2004), os quais buscaram processos similares em outros países para embasar suas teorias. A gênese das grutas do Ibitipoca está associada a dois momentos distintos, envolvendo processos também distintos. Num primeiro momento, o nível de base ficou estável fazendo com que um fluxo de água (lento, ácido devido ao acúmulo de matéria-orgânica como presenciamos nos cursos d’água do parque e constante, pois o índice pluviométrico na região é elevado) entrasse em contato com as rochas predominantes, no caso os quartzitos, através de seus pontos de fraqueza (fraturas, falhas e planos de acamamento com abundância de mica e quartzito mais fino), e a partir disso provocasse a dissolução da sílica (quartzo) e dos minerais presentes nas micas e feldspatos (aluminossilicatos). Importante destacar o papel das descontinuidades no processo de carstificação de rochas siliciclásticas, haja vista que nesse tipo de rocha “[...] a infiltração da água superficial segue zonas de descontinuidades da rocha, principalmente fraturas e as estratificações, associadas à ocorrência de depressões com sistemas de lineamentos” (ROBAINA; BAZZAN, 2008, p. 63). Dando continuidade ao processo, num segundo momento, houve o aumento do nível de base local, o que na região está associado aos movimentos neotectônicos e consequente diferença entre o nível de base local e regional, cerca de 250-350 metros, fazendo com que a velocidade da água fosse aumentada, potencializando seu poder erosivo. Desde então ao papel da dissolução passa a ser somado o da remoção mecância de grãos de quartzo, formando uma rede de condutos cilíndricos, denominados pipes (Figura 3). A formação de condutos maiores (condutos de dissolução) e das galerias ocorre através do alargamento e interligação desses pipes, além do abatimento de blocos como foi verificado em grande parte das grutas visualizadas (Figura 3). Sobre esses dois momentos associados ao processo de carstificação nos quartzitos do parque, os autores supracitados alegam que são todos passíveis de visualização in locu, no caso da dissolução da sílica pela presença, entre outros, de espeleotemas de opala-A, bem com presença de galerias abandonadas e leitos fósseis de rio, como indício de movimentos neotectônicos. Quanto à evolução dessas grutas, Corrêa Neto et al (1997, p. 9), aponta o papel do controle estratigráfico no sentido de que a medida que as galerias aumentam na vertical, entram em contato com o quartzito grosseiro e este sendo mais resistente ao processo erosivo inibe esse alargamento, mas induz na horizontalização e aprofundamento das galerias, momento que há controle dos fraturamentos, sendo que nas grutas de maior porte como a dos Moreiras (673 m) e dos Viajantes (440 m), “a direção e a inclinação das galerias são ditadas pela intersecção de fraturas com o plano da camada de quartzito mais friável [...]”. No interior de algumas grutas, nas galerias mais superficiais, visualizou-se algumas microfeições, tais como: a) pequenas caneluras formadas pelo escoamento da água ao longo das paredes da rocha, provocando sua erosão, b) microtravertinos 43

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constituídos de argila expansiva e formados em associação com presença constante de água corrente e c) cúpulas de dissolução, verificadas nos tetos das galerias como indício de que as mesmas já estiveram inundadas e sofreram dissolução (Figura 3).

Figura 3: Mosaico com fotos com as principais características das grutas do PEI: (A) – Caneluras nas paredes das galerias das grutas; (B) – Cúpula de dissolução; (C) – Queda de blocos; (D) – Coralóides escurecidos com impurezas; (E) – Microtravertinos e (F) – Linha de pipes. Autor: Bento, 2012. 44

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Necessário mencionar que como o objetivo desse trabalho é relacionar o processo de carstificação nas grutas do Parque Estadual do Ibitipoca com o geoturismo, tevese o cuidado de analisar apenas as que estão atualmente abertas ao público, bem como as passíveis de visitação, considerando o quesito segurança.

5. Considerações Finais O PEI é uma unidade de conservação que tem no processo de carstificação em quartzitos o agente principal na geração de paisagens de grande beleza cênica e com uma rica geodiversidade, sendo as grutas e demais feições cársticas apenas uma amostra, fazendo do parque a sétima unidade estadual mais visitada no Brasil (MMA, 2004). De acordo com pesquisas de Simiquele (2008), grande parte dos turistas que procuram o parque (69%) tem como principal motivação o lazer e o descanso, mas que apesar disso sentem falta de mais explicações ao longo das trilhas, o que sinaliza para o potencial do geoturismo ser implantado na área. É de suma importância que os turistas compreendam o local que visitam e, no caso das grutas do PEI, saibam como ocorreu sua formação, evolução, sua importância não só do ponto de vista físico, mas também ecológico, possibilitando uma visitação com caráter sistêmico e na qual bio e geodiversidade sejam reconhecidos no mesmo grau de relevância, evidenciando seu potencial para a prática do geoturismo.

6. Agradecimentos Agradecimentos a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) pela bolsa de doutorado, a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (FAPEMIG) pelo apoio à participação no presente evento e ao Instituto Estadual de Florestas (IEF) pelo apoio à pesquisa. Referências Bibliográficas

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Evolução e Constituição da Planície Sedimentar de Caraguatatuba-SP Prof. Ms.Estéfano Seneme Gobbi1 Prof. Dr. Francisco Sérgio Bernardes Ladeira2 MsC. Marcelo da Silva Gigliotti3 1

Pontifícia Universidade Católica de Campinas – PUC-Campinas/CEATEC [email protected] 2,3

Universidade Estadual de Campinas – UNICAMP/IGe 2

[email protected] [email protected]

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Resumo A Planície Sedimentar de Caraguatatuba, localizada em meio a praias de bolso do litoral setentrional do Estado de São Paulo é caracterizada por possuir a maior área de continuidade de sedimentos depositados nos municípios de Caraguatatuba, Ubatuba e São Sebastião. Em análises da coluna sedimentar da região foram verificados sedimentos de origem marinha, fluvial e gravitacional. Ao longo do Período Quaternário, por meio de variações do nível do mar e consequentemente da linha de costa e dos canais de drenagem, foram depositados sedimentos de variadas granulometrias em toda a área. Associado a esta dinâmica de eventos, ocorreram sucessivos depósitos gravitacionais por meio de escorregamentos oriundo da Serra do Mar. As altas declividades associados ao intenso intemperismo ocorrente na área apresentam grande vulnerabilidade quando submetidas a eventos de altas precipitações, vindo a movimentar-se e acumular-se na área costeira. Por meio de levantamento bibliográfico, coleta de material em atividades de campo e análises físicas laboratoriais foram determinadas as granulometrias dos materiais obtidos, corroborando com as hipóteses verificadas na bibliografia. Desta maneira foi possível a confecção do Mapa de Elevação do Terreno em ambiente Sistema de Informações Geográficas, relacionando as informações anteriormente citadas com os dados topográficos da área obtidos na base cartográfica Palavras chave: Nível do Mar, Sedimentos Marinhos, Depósitos Gravitacionais

Abstract The Plain Sedimentary of Caraguatatuba, located amid pocket beaches northern coast of São Paulo State, is characterized by having the largest area of continuity of sediment deposited in the cities of Caraguatatuba, São Sebastião and Ubatuba. Analyzing the sedimentary column of the region were verified sediments of marine origin, fluvial and gravitational. Throughout the Quaternary Period through variations in sea level and consequently the shoreline and drainage channels have been deposited sediments of various grain sizes in the entire area. Associated with this dynamic event, occurred through successive deposits gravitational landslide derived from the Serra do Mar. The steep slopes associated with intense weathering occurring in the area have great vulnerability when subjected to high rainfall events, steadily move up and accumulate on the coast. Through literature review, collection of material on field activities and physical analysis laboratory were determined grain sizes of the materials obtained, confirming the assumptions noted in the bibliography. Thus, it was possible to manufacture the map land elevation in Geographic Information System environment, relating the information mentioned before with the topography data of the area obtained in base map. Keywords: Level Sea, Marine Sediments, Gravitacional Landslides.

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1. Introdução Para a Planície Sedimentar de Caraguatatuba são admitidas variações do nível médio dos mares que tenham representatividade nos depósitos sedimentares a partir de 123 000 anos A.P.. Neste período o nível do mar estava entre 7 e 10 metros acima do atual. Posteriormente, passou a sofrer um paulatino rebaixamento, até atingir a cota negativa de 110 metros há aproximadamente 16.000 anos. Neste momento passa a haver uma fase ingressiva e o nível do mar tem uma rápida ascensão, atingindo a cota de 5 metros há 5 150 anos AP (Villwock, 1994). Desde então, com algumas oscilações, o nível do mar recuando, determinando um novo período regressivo. Almeida (1964) coloca a Planície Sedimentar de Caraguatatuba na Província Costeira do Estado de São Paulo, por apresentar uma drenagem que corre diretamente para o Oceano. Villwock (1994) e Muehe (2001) enquadram a área como pertencente ao Litoral sudeste, porém este se subdivide em outros compartimentos, sendo o de interesse denominado de Litoral das Escarpas Norte, situado entre a Ilha de Marambaia (RJ) e o município de São Vicente (SP). Essa compartimentação, segundo o autor, foi feita baseada em condicionantes geológicos, geomorfológicos e oceanográficos, que traduzidos em uma flexura continental, propiciam atualmente um afogamento do litoral da região. Tessler et al (2006), em consonância com demais autores como Almeida (1964), IPT (1981) e Ross & Moroz (1997), classifica o litoral paulista como Província Costeira, podendo esta ser subdividida em Planície Costeira e Baixadas Litorâneas, de modo que cada uma de suas subzonas sejam divididas seguindo fatores, tectônicos, genéticos e sedimentares. O litoral paulista pode ser subdividido em duas zonas distintas, segmentadas pelo Canal de Bertioga e pela Ilha de São Sebastião (Tessler et al, 2006 e Fúlfaro et al, 1979). Na porção austral, a direção geral da linha de costa é NE-SW e as planícies sedimentares apresentam uma maior e mais continua extensão, por conseqüência da distância entre a linha de arrebentação e as escarpas do Planalto Atlântico. Porém, na porção boreal, a linha de costa redireciona-se para E-W, as planícies tornam-se descontínuas e reduzidas, com baías, enseadas e um menor distanciamento entre as isóbatas, denotando uma maior declividade da plataforma continental, que atinge a marca de 50 metros de profundidade nas proximidades da cidade de São Sebastião. Desta forma, segundo Fúlfaro et al (1976), a Planície Sedimentar de Caraguatatuba pode ser colocada em regime exceção, pois apesar de ser considerada uma das praias de bolso situadas no litoral norte de São Paulo, por ser bem delimitada pelas escarpas cristalinas da Serra do Mar e não apresentar uma longa continuidade na linha de arrebentação, é caracterizada por distancia relevantemente superior entre a zona de arrebentação e as áreas sob domínio do Planalto Atlântico, se comparada com demais as praias setentrionais. Esta anomalia é explicada pelo condicionamento estrutural local, que proporcionou em períodos de nível marinho inferiores ao atual, uma elevada taxa de erosão remontante, 48

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ocasionada pela rede de drenagem do atualmente denominado Rio Camburu (Fúlfaro et al, 1976 e Fúlfaro et al, 1979), que disseca a porção central da planície. Segundo IPT (1981), IPT (1981) e Ross & Moroz (1997), as Praias de Bolso do litoral norte paulista são compostas por sedimentos marinhos, fluviais e lagunares indiferenciados e inconsolidados, incluindo areias, argilas de mangues e areias litorâneas. Possuem altimetrias variáveis entre 0 e 20 metros, e declividades inferiores a 2%. Em geral, possuem uma baixa densidade de drenagem, com padrão meandrante e localmente anastomosado. Fúlfaro et al (1974) e Almeida (1964) destacam que o embasamento cristalino da Planície Sedimentar de Caraguatatuba é Pré-Cambriano e que esta apresenta características de submersão. A origem da área de estudo remonta ao soerguimento da Serra do Mar (Cretáceo Superior) e posterior subsidência da Bacia Sedimentar de Santos, fatos que deram a atual conformação tectônica de grande parte do litoral paulista. Posteriormente, no Período Quaternário são verificadas as ocorrências de dois importantes eventos transgressivos, com seus máximos registrados há 123.000 anos A.P. (Cananéia) e 5.150 anos A.P. (Santos) (Suguio & Martin, 1976). Ainda segundo os autores, a gênese das planícies sedimentares paulistas estão intrinsecamente ligadas mudanças no nível do mar, pois é por meio destas que as escarpas da fácie litorânea sofrem abrasão, tendo sedimentos retirados para posterior deposição na planície e na plataforma continental. Segundo Almeida (1964), a Planície Costeira de Caraguatatuba é constituída por sedimentos detríticos de idades posteriores ao Pleistoceno. Ainda segundo o autor, em meio a estes sedimentos de cores variegadas se confundem materiais de origem de praias, dunas, argilas e lamas orgânicas dos mangues. Suas origens podem ser atribuídas a planícies aluviais, canais fluviais, restingas praias e lagunas e são geralmente friáveis e recobertos por aluviões.

2. Metodologia O Mapa de Elevação do Terreno foi executado com base nas informações coletadas na revisão bibliográfica, nas atividades e análises de campo, de modo que a divisão altimétrica da sua legenda se justifica pelas pretéritas variações nível do mar ao longo do quaternário. Desta maneira, admitiu-se que as cotas entre 0 e 3 metros tenham sido ocupadas nas ingressões mais recentes; as cotas de 3 a 5 metros contenham registros e depósitos da Transgressão Santos; as cotas de 5 a 7 metros apresentem materiais da Transgressão Cananéia, assim como as de 7 a 10 (porém com menor probabilidade). As segregações 10 a 15 e 15 a 20 seguem as linhas topográficas das Cartas 1:10 000 (Plano Cartográfico de São Paulo, 1978) e as entre 20 e 100 metros correspondem aos morros isolados situados no interior da Planície Sedimentar.

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3. Resultados e Discussão De acordo com Muehe (1998), planícies costeiras são superfícies que apresentam relativo aplainamento, com baixas altimetrias, situadas em proximidade do mar, com sua gênese associada a depósitos marinhos e fluviais. A conformação da planície de Caraguatatuba se deu de forma mais efetiva a partir da Transgressão Cananéia (ocorrida há 123.000 anos A.P.), quando a totalidade da atual Planície Sedimentar de Caraguatatuba foi ocupada pelo avanço das águas marinhas (aproximadamente de 7 a 10 metros acima do atual), depositando na área areias transgressivas (Ross & Moroz, 1997; Suguio & Martin, 1976). Cruz (1974) e Ab’Saber (1965) afirmam que por epirogênese pode-se admitir que a ocorrência de sedimentos marinhos na Planície Sedimentar de Caraguatatuba seja verificada em altimetrias de até 13 metros acima do nível do mar atual. Dados como estes vêem a complementar as hipóteses de que a variação do nível do mar não é um índice absoluto, mas sim, relativo ao local de estudo. Desta forma, pode-se admitir que a área da planície de Caraguatatuba sofreu um soerguimento da ordem de 2 metros em relação a seu datum vertical a aproximadamente 123.000 A.P. Ab’Sáber (1955, 1956 e 1965) agrega que neste evento houve um grande desenvolvimento do relevo local com esculturação das escarpas e afogamento das desembocaduras das drenagens, sendo conformada uma paisagem de golfões por todo o litoral norte paulista e sul fluminense. Segundo Fúlfaro et al (1974), a preservação destes sedimentos marinhos, alocados na porção mais interior da planície, devido a um “grande alinhamento estrutural E–W” (Linha Estrutural do Camburu), que possibilitou a formação de um anfiteatro de erosão. Almeida (1964) trata que esta pode ser considerada a formação primitiva da faixa litorânea brasileira (ainda distante da conformação atual), denominando estes depósitos de Formação Jacupiranga, tendo origem em terraços marinhos. No entanto, atualmente admitiu-se para os depósitos decorrentes desta ingressão a nomenclatura de Formação Cananéia e podem ser verificados em todo a litoral SE brasileiro (Fúlfaro & Suguio, 1974). Petri & Suguio (1971) destacam que esta formação é constituída por areias bem selecionadas com poucas intercalações argilosas. Em sua base são verificados cascalhos e areias conglomeráticas oriundas da Formação Pariquera-Açu. Esta formação se deu por conta da elevação do nível marinho e conseqüente ascensão do nível de base, ocasionando depósitos fluviais em ambientes de baixa energia. Estes sedimentos foram posteriormente soterrados pelos depósitos marinhos durante o Quaternário. Denominada no Estado de São Paulo de Formação Pariquera-Açu, estes vestígios de terraços arenosos e cascalhentos situam-se, de maneira geral em cotas próximas a 13 metros acima no nível atual do mar, tendo sido conformadas em eventos trangressivos posteriores a 325 000 A.P. e anteriores a 123 000 anos A.P., com formação de lagunas e ilhas-barreira ao longo de grande parte do litoral central brasileiro (Villwock, 1994 e Villwock et al, 1986 apud Suguio, 2001). No entanto as áreas de maior ocorrência desta formação situam-se nas proximidades do vale do Rio Ribeira de Iguape, (litoral sul do estado de São Paulo), sendo encontrados poucos vestígios desta formação na porção setentrional, fato explicado pelo menor 50

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dimensionamento das bacias hidrográficas da região norte quando comparadas com as da região sul. IPT (1981) afirma que as áreas de maior ocorrência desta formação também são verificadas na porção austral do estado, tendo a quantidade de depósitos diminuída a medida em que se aproxima o litoral fluminense. Sendo constituída na maior parte de seus depósitos por “areias finas de extrema uniformidade granulométrica”, a Formação Cananéia apresenta como estrutura mais recorrente a estratificação plano-paralela. O máximo ingressivo e, portanto, deposicional é verificado há 123.000 anos A.P. (IPT, 1981). Posteriormente, com o rebaixamento do nível marinho, foi formada na área de entrada da baía uma ilha-barreira, de modo a bloquear o contado do mar com a água retida na planície, constituindo duas zonas lagunares, delimitadas pelo Esporão do Camburu (Suguio & Martin, 1976). Estas lagoas sofreram processos de colmatagem argilo-arenosos (Fúlfaro et al, 1976) por ação de depósitos gravitacionais oriundos da Serra do Mar e de gênese fluvial (SUDELPA, 1986). Com a continuidade dos processos regressivos, cordões litorâneos ainda foram acrescidos à planície, porém estes foram total ou parcialmente destruídos por erosão. Durante este período a drenagem da área se processava preferencialmente nas zonas intercordões. No Pleistoceno Superior (23.000 a 12.700 anos A.P.) ocorreu uma regressão marinha da ordem de aproximadamente 110 metros (Período Würm IV-Wisconsin Superior), em que áreas antes submersas, emergiram, passando a ser drenadas e dissecadas por uma hidrografia que se estendia momentaneamente a uma paleolinha de costa mais distante (Ab’Sáber, 2007). Esse período foi caracterizado por apresentar, além de uma intensa Era Glacial e conseqüente rebaixamento do nível marinho, baixos índices pluviométricos e diminuição das temperaturas, com seu ápice há 16.000 anos A.P.. Assim sendo, o canal de drenagem do Rio Juqueriquerê, responsável pela maior área de drenagem da planície de Caraguatatuba (382 km2), segundo Tessler (2006), prolongou-se, drenando uma área ainda maior, até sua foz, no Oceano Atlântico. Com base nestas informações pode-se aferir que no Período Quaternário a Planície de Caraguatatuba ainda não possuía seus limites atuais, porém, sua área já apresentava-se emersa. Isto ocorreu, pois a paleolinha de costa estava 110 metros abaixo em relação à presente, o que propiciava que as hoje as conformadas praias de bolso do litoral norte paulista e sul fluminense constituíssem uma grande e única planície sedimentar, tendo, por exemplo, Ilha de São Sebastião (SP) e Ilha Grande (RJ) como morros isolados, em uma única e extensa planície, caracterizada por uma maior distancia da Serra do Mar, tendo esta uma menor quantidade de indentações no Oceano Atlântico (Corrêa, 1979). Almeida (1964) trás que em períodos glaciais a plataforma continental ficou sem a cobertura marinha e por conta disso a drenagem fluvial pode escavar vales mais profundos. Essas variações da linha de costa se devem ao fato do Período Quaternário ser marcado por uma grande quantidade de mudanças climáticas que influenciam diretamente nas transgressões glacio-eustáticas, que por sua vez exercem um papel preponderante na gênese das planícies sedimentares. Segundo Suguio & Martin 51

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(1976) e Corrêa (1979) estes eventos transgressivos deixaram duas séries de cordões arenosos e sedimentos argilo-arenosos compostos por matéria orgânica. Com a mudança no nível de base, a ação erosiva dos corpos fluviais modificou-se, de modo a proporcionar uma maior entalhe nos sedimentos da planície. Estes entalhes viriam a se constituir como área a serem preenchidas por sedimentos marinhos em novas variações glácio-eustáticas, como aponta Cruz (1974). Corrêa (1979) e Suguio (2001) nos trazem que a partir do máximo regressivo verificado há 16.000 A.P. passou a ocorrer uma rápida subida do nível marinho (com valores médios aproximados de 1cm/ano), de modo que no intervalo de 10.000 anos (16.000 a 6.000 A.P.) a linha de costa registre um avanço superior a 110 metros (Ab’Sáber, 2007). Na primeira Transgressão Holocênica, ocorrida há 5.150 anos A.P. (Transgressão Santos), na qual o nível marinho atingiu cotas aproximadas de 5 metros (Suguio et al, 1985 e Villwock, 1994), de modo a submergir grande parte dos sedimentos depositados no evento “Cananéia”, vindo a destruir quase que a totalidade das feições criadas no evento pretérito. Após o máximo ingressivo, formou-se uma nova ilha-barreira, a qual deu origem a uma segunda zona lagunar, isolando-a. No período inter-ingressivo aproximadamente há 4.000 anos AP, segundo Martin & Suguio (1976), - a restinga foi complementada com uma nova geração de cordões litorâneos e a drenagem pôde se aprofundar nas zonas intercordões. As últimas transgressões, verificada há 3.200 e 2.000 anos A.P. foram caracterizadas por novos avanços marinhos, os quais novamente adentraram nas zonas de menores cotas altimétricas, ocupadas por cordões arenosos, depositando sobre estes argilas orgânicas e material calcário. Nas novas regressões marinhas, novas gerações de cordões se formaram. Na penúltima, a ascensão do nível marinho foi entre 3 e 4 metros acima da linha de costa atual e na mais recente atingiu cotas variáveis de 0,5 a 2 metros (Suguio & Martin, 1978), conformando a Planície Sedimentar como demonstra o Mapa de Elevação do Terreno (Figura 1). Cruz (1974) também afirma que por conta dos eventos de escorregamento de massa de 1967, a dinâmica sedimentares fluvial sofreu alterações significativas durante os anos subsequentes, de forma que os depósitos sedimentares ocorridos no fim da década de 1960 e início da década de 1970 tiveram uma considerável influência, ambos recebendo aportes coluviais, retrabalhando-os depositando-os. Concomitantemente com as variações glácio-eustáticas e consequentemente mudanças no nível de base dos rios são verificados na área de estudo movimentos de massa, que constituem eventos inerentes à região por conta da grande proximidade da barreira orográfica que é a Serra do Mar. Estes movimentos foram responsáveis inicialmente, quando no período da formação de lagunas na área da atual planície, por colmatarem os reservatórios naturais de água salobra represada pela formação de ilhas-barreira. Os depósitos aluviais e coluviais ali sedimentados vieram por enterrar as lagunas pleistocênicas e posteriormente a laguna conformada no Holoceno (Suguio & Martin, 1976; Fúlfaro et al, 1976). No entanto, esses pretéritos escorregamentos não podem ser verificados atualmente, pois já foram 52

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retrabalhados. Cruz (1974) discorre que são verificados remanescentes de paleoescorregamentos apenas na bacia do rio Santo Antônio, próximo ao Ribeirão Mantegueira, provavelmente oriundo do Pleistoceno Inferior.

Cruz (1974) ainda agrega informações a respeito da forma de deposição destes materiais oriundos de topografias mais elevadas. Segundo a autora, nas baixas encostas e proximidades de pé de serra, formam-se rampas de desgaste ou de aplainamento, verificadas por meio de rupturas de declive, sendo estas menos íngremes que as declividades verificadas no restante da encosta. Estas áreas caracterizam-se pelo talude de detritos que as compõe, já que com a forte ruptura na declividade, o leito d’água deixa de ser um agente erosivo e passa ter características deposicionais. Desta maneira, a formação de planícies sedimentares como a de Caraguatatuba ocorre pela evolução das vertentes das escarpas e a variações no nível do mar, conformando-a em seu estádio atual (Figura 2).

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Figura 2 – Perfil Esquemático da Planície Sedimentar de Caraguatatuba. atualmente (Fonte: Suguio & Martin, 1976 - adaptado).

4. Considerações Finais Com base nas informações levantadas junto a revisão bibliográfica e em atividades de campo para coleta de amostras de materiais relacionados à eventos de depósitos gravitacionais e ingressões marinhas pode-se confeccionar o Mapa de Elevação do Terreno em ambiente SIG ao cruzar todas esta informações com o levantamento topográfico apresentado pela base cartográfica da área. Desta forma, foi possível estabelecer as relações entre o entalhamento do relevo executado pela drenagem da Planície Sedimentar, os sucessivos e diversos eventos de transgressões marinhas e as áreas de depósitos gravitacionais, de modo a mapear a planície no que concerne a áreas ocupadas pelo avanço no nível médio dos mares e, consequentemente, a existência de sedimentos correlatos. 5. Agradecimentos Os autores agradecem a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP – processo 07/53644-1) pelo financiamento da pesquisa, ao projeto “Estudos da previsibilidade de eventos meteorológicos extremos na Serra do Mar” (FAPESP - 04/09469-0) e a jornalista Talita Gobbi pelo auxílio na tradução.

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A Geomorfologia Urbana e os Depósitos Tecnogênicos: Aspectos Teórico-Metodológicos e Estudo de Caso Marcel Bordin Galvão Dias1 1

Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” – FCT/UNESP [email protected]

Resumo O desenvolvimento das técnicas e a complexificação da sociedade atribuíram ao homem o papel de agente geomorfológico, responsável por promover transformações na fisionomia da paisagem. A ação humana no ambiente resulta na formação de depósitos tecnogênicos, materiais testemunhos da transformação destes ambientes pelas atividades humanas, dentre elas, a urbanização. Nos ambientes urbanizados, a gênese destes depósitos está relacionada ao modelo de uso-ocupação do solo vigente e à forma de apropriação dos compartimentos do relevo pelos diferentes grupos sociais. Em certas localidades, a precariedade ou inexistência de infraestrutura adequada, como os sistemas de drenagem urbana, associada à ocupação do solo sem o planejamento devido, promove a remobilização dos materiais superficiais, resultando na gênese de depósitos associados às vertentes e na transformação da dinâmica fluvial, especialmente pelo progressivo aterramento das planícies aluviais. A ação geomorfológica do homem produz efeitos diversos, especialmente em áreas urbanas, na qual se amplia e diversifica, afetando, direta ou indiretamente, a qualidade de vida da população. Este trabalho propõe-se a investigar a gênese dos depósitos tecnogênicos e sua relação com a urbanização na região noroeste do município de Goiânia (GO). Para tanto, procederam-se as etapas de caracterização ambiental da área e levantamentos de campo para a identificação e classificação dos materiais tecnogênicos. A ocorrência de depósitos de primeira e segunda ordem indica a modificação dos processos naturais, a exemplo do assoreamento dos corpos d’água por erosão antrópica, somado à presença de materiais úrbicos (tijolos, madeira, vidro, plásticos) incorporados às camadas superficiais, atestando a origem recente destas formações. Palavras chave: depósitos tecnogênicos, uso-ocupação do solo, Goiânia (GO) Abstract Techniques development and complexification of society attributed to human a geomorphological agent's paper, responsible for promoting changes in landscape physiognomy. The human lawsuit in environment results the formation of tecnogenics deposits, material witnesses the transformation of these environments by various human activities such as urbanization. In urbanized environments, the genesis of these deposits is related to use and occupation model and appropriation of relief by different social groups. In certain localities, the precariousness or lack of urban infrastructure, such as urban drainage systems, associated with the occupation of land without planning promotes the remobilization of surface materials, reflecting the genesis of deposits associated with the transformation of slopes and river dynamics, especially by progressive grounding floodplains. Therefore, the geomorphological action of man produces several effects, especially in urban areas, which is extended and it diversifies, allocating, direct or indirectly, the quality of life. This study aims to investigate the genesis of tecnogenics deposits and its relationship with the urbanization in northwestern city of Goiânia (GO). For so, proceeded up the steps of environmental characterization about area and field surveys for identification and classification of tecnogenics materials. The occurrence of deposits of first and second order indicates modification of natural processes, such as the siltation of streams by anthropogenic erosion, coupled with the presence of urbic materials (brick, wood, glass, plastic) incorporated into surface layers, confirming the recent origin these formations. Keywords: tecnogenics deposits, use and occupation, Goiânia (GO) 57

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1. Introdução Ao longo do tempo, diferentes civilizações consolidaram-se a partir da apropriação e transformação dos recursos naturais, produzindo os bens necessários à sua existência, ao mesmo tempo em que imprimiam modificações às condições naturais originais. Concomitantemente a esta apropriação, iniciou-se um processo de produção da natureza, no qual a história social se coloca como uma continuação da própria história natural da Terra. O espaço urbano é um exemplo eloquente da ação humana sobre a natureza, através do trabalho, adaptando o meio natural em consonância com as especificidades da cultura e da organização socioespacial, criando um verdadeiro habitat do homem. A cidade é, assim, fruto da construção humana, produto social ou projeção do trabalho sobre natureza, caracterizada por espaços distintos com funções diferenciadas (produzir, consumir, habitar, viver). Conforme Casseti (1991), o modo como sociedade e natureza se interrelacionam no tempo-espaço é diretamente influenciado pelo conjunto de relações (de produção) estabelecidas entre sujeitos dentro do próprio sistema social. Assim, as relações de produção, determinadas historicamente, são evidenciadas na relação sociedade-natureza. Tal relação é condicionada por um conjunto de fatores, responsáveis por estabelecer distintos modos de intervenção, resultando em ambientes com fisionomias, dinâmicas e funcionalidades diversas. Os distintos modos de intervenção, por sua vez, são condicionados pelos aspectos socioeconômicos, determinantes do tipo e amplitude da intervenção humana no ambiente. Por vezes, as ações sobre o ambiente acabam resultando em impactos ambientais, a exemplo da erosão antrópica (ou acelerada), responsável pela formação dos depósitos tecnogênicos, principais indicadores da ação geológica e geomorfológica do homem. Esta ação pode ser caracterizada e dimensionada a partir da comparação entre os processos naturais (endógenos e exógenos) e os processos antrópicos na transformação da superfície terrestre. Este trabalho se propõe a investigar a formação de depósitos tecnogênicos no perímetro urbano de Goiânia (GO), com ênfase em sua região noroeste, considerando as características ambientais, tais como a litologia, as feições geomorfológicas e os solos, e o histórico de uso e ocupação da área, buscando identificar como as atividades humanas desenvolvidas naquele local contribuíram para transformar o ambiente. 2. Pressupostos Teóricos As discussões sobre a capacidade interventora da sociedade na natureza têm ganhado espaço no meio científico, interessado em entender em que medida a sociedade se coloca como agente produtora e transformadora da paisagem, a partir do uso de diferentes técnicas e saberes desenvolvidos ao longo do tempo. Estes saberes acumulados e aprimorados historicamente, objetivam potencializar a apropriação dos recursos naturais e otimizar as condições necessárias ao desenvolvimento científico e tecnológico. 58

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Nesta perspectiva, os processos de construção e desenvolvimento social interferem diretamente nas dinâmicas da natureza, fonte dos recursos necessários à sobrevivência da espécie humana. O resultado da intervenção antrópica na natureza se materializa através da formação de depósitos tecnogênicos, testemunhos dos ambientes antropizados, bem como seus processos geradores e modificadores das paisagens atuais (Oliveira et al, 2005). A ação do homem sobre a natureza, através da atividade produtiva, tem produzido efeitos geológicos e geomorfológicos que se acumulam em quantidade e se diversificam em qualidade, a ponto de ter sido proposta a designação de um novo período geológico para caracterizar tal época: o “Quinário” ou “Tecnógeno”. A Geologia do Tecnógeno concentra-se, então, no estudo dos produtos (depósitos e feições do relevo, dito “tecnogênicos”) gerados diretamente ou influenciados pela atividade humana [...] (PELOGGIA, 1998, p. 11).

Este novo período geológico conhecido como “Quinário” ou “Tecnógeno” é caracterizado pelo desenvolvimento e difusão da técnica, responsável por ampliar a capacidade transformadora da sociedade, especialmente no tocante as formações geológicas, as feições geomorfológicas e as coberturas pedológicas. O termo “tecnogênico”, portanto, foi proposto como uma forma de correlacionar a aceleração das transformações da natureza a partir do uso da técnica, entendendo-a como produto da evolução da razão humana e do desenvolvimento científico. Deste modo, a classificação dos ambientes específicos de formação dos depósitos tecnogênicos torna-se uma tarefa difícil. Deve-se ponderar que estes materiais são produtos de uma ação específica, ou seja, a atividade humana e, portanto, sua classificação deve estar relacionada à ação desenvolvida em um dado ambiente. A classificação destes pondera o ordenamento e a hierarquização quanto aos tipos, como podemos observar em Oliveira et al (2005, p. 366): 1) depósitos de primeira ordem ou geração, a partir da sistemática geral proposta por Oliveira (1990), que diferencia depósitos construídos (resultantes da ação humana direta; por exemplo, aterros), induzidos (resultantes de processos naturais modificados, por exemplo assoreamento induzido por erosão antrópica) e modificados (depósitos naturais preexistentes, mas alterados, como solo contaminado); e 2) de segunda ordem, depósitos remobilizados (por exemplo, depósitos de fundo de vale, formados por escorregamento de aterros) e retrabalhados (propostos por Nolasco, 1998, por exemplo aterros ravinados).

As concepções acerca dos depósitos tecnogênicos são variadas dentro da comunidade científica e entre as entidades competentes. Chemekov (1983) e TerStepanian (1988) concordam que os “os depósitos tecnogênicos são marcados por grande variedade, feições diferenciadas claras, diversidade de composição e grande variação de espessura”. Em contrapartida, o Serviço Geológico do Brasil (CPRM) denomina como “depósitos tecnogênicos” os sambaquis, aterros, lixões e pilhas de rejeito, englobando-os na categoria de formações superficiais. 59

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No Brasil as discussões e estudos referentes a este novo período geológico, o Tecnógeno, e os depósitos tecnogênicos tiveram início a partir da década de 1990, embasados pela matriz teórica proposta por Ter-Stepanian (1988). Os trabalhos desenvolvidos desde então contribuíram para o aprimoramento das bases teóricometodológicas necessárias à análise e entendimento da gênese e evolução dos depósitos tecnogênicos, especialmente em áreas urbanas. Neste contexto, merecem destaque os trabalhos desenvolvidos por Oliveira (1994), Cunha (2000), Moura e Mello (1991), Nolasco (2002), Silva (2012) e Peloggia (1998), este último analisando os agentes geológicos e sua relação com a intervenção humana em encostas e várzeas do município de São Paulo (SP). Estes e outros estudos subsequentes corroboraram a alteração das áreas pesquisadas pela ação antrópica em um ritmo mais acelerado quando comparado à ação dos processos naturais. No âmbito da Geografia Física, os estudos relativos dos depósitos tecnogênicos despertam especial interesse, visto que se situam na interface da relação sociedade – natureza, constituindo-se enquanto a materialização da ação humana sobre o ambiente físico-geológico. Neste contexto, a identificação e caracterização destes materiais, especialmente em áreas urbanas, mostram-se relevantes ao possibilitar o entendimento a respeito das dinâmicas da natureza, em simultaneidade aos processos sociais, resultando em transformações na fisiologia da paisagem, através da gênese de novas feições geomorfológicas, a exemplo das planícies e terraços tecnogênicos.

3. Metodologia A operacionalização deste trabalho contou com as etapas de caracterização físico-ambiental da área de estudo, através de levantamentos bibliográficos e elaboração de material cartográfico representativo dos aspectos geomorfológicos e pedológicos. A elaboração das cartas de unidades geomorfológicas e de solos, em escala 1:40.000, ocorreu a partir da digitalização do mapa geomorfológico integrante da Carta de Risco de Goiânia (IPLAM). Os parâmetros de compartimentação do relevo foram extraídos de Casseti (1992), o qual classifica a geomorfologia do município de Goiânia (GO) em cinco unidades morfológicas distintas. A carta pedológica foi elaborada com base no Sistema Brasileiro de Classificação de Solos (Embrapa, 1999), contemplando o primeiro e o segundo nível categórico. Os produtos cartográficos contém a representação da malha urbana, cujos dados foram extraídos do Mapa Urbano Básico Digital de Goiânia, elaborado pela Companhia de Processamento de Dados de Goiânia (COMDATA). Após a obtenção da base de dados georreferenciados referente à geomorfologia, aos solos e à malha urbana, procedeu-se a finalização dos mapas em ambiente SIG. Findada as etapas de caracterização do meio físico e elaboração dos produtos cartográficos, seguiu-se, em campo, a validação das cartas temáticas. O histórico de uso e ocupação da área fora elaborado a partir da revisão de literatura e de informações obtidas através do Anuário Estatístico de Goiânia (SEPLAM/DPESE). A classificação dos materiais tecnogênicos, especialmente aqueles localizados nos 60

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fundos de vale e planícies, foi realizada a partir da identificação das diferentes camadas de deposição dos sedimentos e a presença de materiais úrbicos, oriundos do uso-ocupação a montante e no entorno da área de estudo.

4. Resultados e Discussão O município de Goiânia está localizado na porção centro-sul do Estado de Goiás e é sua capital político-administrativa. Possui uma extensão territorial de 726.885 km2 e uma população de 1.281.975 habitantes, de acordo com levantamento realizado pelo Anuário Estatístico (2010). A partir da década de 1970, experimentou um vertiginoso incremento da população urbana, acolhendo fluxos migratórios advindos do meio rural e de outras regiões do estado e do país. A necessidade de acolher a população migrante fez com o planejamento de uso e ocupação do solo urbano desconsiderasse as características do meio físico, resultando na gênese ou intensificação de problemas ambientais, com destaque para os processos erosivos, dentre outros relacionados à ocupação de fundos de vale. A região noroeste (figura 1) caracterizou-se, inicialmente, como área de expansão urbana da metrópole. Devido à inobservância das condições ambientais locais, os solos, em especial, foram profundamente alterados pela ação antrópica, incorporando artefatos diversos, produto das atividades desenvolvidas ao longo do processo de ocupação, resultando na formação de depósitos tecnogênicos, especialmente nas planícies aluviais que integram a rede de drenagem da área. Em relação aos aspectos ambientais, a região está, geologicamente, situada sob o embasamento de rochas metamórficas proterozóicas e depósitos quaternários. Destacam-se principalmente granulitos ortoderivados (APIgaio) e granulitos paraderivados (APIgaip) subordinadamente, do Complexo Granulítico AnápolisItauçu, no trecho setentrional; e xistos, gnaisses e quartzitos do Grupo Araxá Sul de Goiás (PMa), no restante da área (CAMPOS et al., 2003). Na área de estudo, destacam-se os granulitos anfibolitos e bandados.

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Figura 1. Localização da área de estudo

O município encontra-se compartimentado em cinco unidades morfológicas, o Planalto Dissecado de Goiânia (920-950m) a nordeste, os Chapadões de Goiânia (860-900m) na região sudoeste, o Planalto Embutido de Goiânia (750-800m) na faixa central (de SE para NW), Terraços e Planícies da Bacia do Rio Meia Ponte (700-720m) e Fundos de Vale. Segundo Casseti (1992), associados a essas unidades morfológicas estão os materiais de cobertura eluviais, coluviais e aluviais. A área de estudo situa-se nos domínios do Planalto Embutido de Goiânia, no qual predominam declividades pouco acentuadas (5-10%). Os materiais de cobertura superficial são representados por Latossolos, em geral ocorrendo em relevo plano a suave ondulado. As principais classes encontradas consistem em Latossolo Vermelho-Escuro (LVE), correspondente a aproximadamente 25,5 % da área; Latossolo Roxo (LR), originado das rochas ultrabásicas, totalizando 25,5 % da área e Latossolo Vermelho-Amarelo (LVA), correspondente a 41 % da área. A área de estudo situa-se sobre os domínios dos Latossolos Vermelhos (LV), entremeados por Neossolos Litólicos (RL). 62

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Os depósitos tecnogênicos apresentam grande diversidade de materiais constituintes, em consonância com os processos deposicionais responsáveis por sua gênese. Conforme mencionado, a classificação dos depósitos pode ser realizada de forma integrada utilizando-se diferentes parâmetros, dentre eles a estrutura, a composição e a forma de ocorrência (Peloggia, 1999a). Quanto à composição, tais depósitos podem ser classificados em materiais “úrbicos”, “gárbicos”, “espólicos” e “dragados”. Na área de estudo, encontram-se depósitos de primeira e segunda ordem, conforme a proposta de Oliveira et al (2005). Os depósitos de primeira ordem enquadram-se na categoria de depósitos induzidos, pois sua origem associa-se a modificação dos processos naturais, a exemplo do assoreamento dos canais de drenagem por material sedimentar oriundo da erosão antrópica. Porém, daremos ênfase ao enquadramento destes materiais atentando-se, prioritariamente, para sua composição e estrutura. Para tal análise, elegeram-se dois pontos representativos da gênese dos depósitos tecnogênicos na região de estudo. O primeiro ponto localiza-se no Jardim Fonte Nova. O bairro tem origem recente e se localiza contínuo ao setor Alto do Vale, no sentido topo-vertente, de modo que a formação de depósitos nesta localidade está associada ao loteamento de ambos os bairros. Durante o processo de loteamento, o solo exposto nos lotes forneceu os sedimentos que foram carreados para as áreas de várzea, resultando em seu aterramento. Neste caso, observa-se a existência de três camadas sedimentares distintas, denominadas genericamente de 1, 2 e 3 (figura 2). A camada 1 corresponde ao material detrítico remobilizado de montante, com a presença de pequenas concreções ferruginosas (lateritas), típicas da região de Cerrado. A camada 2 é constituída por material arenoso (fino), bem drenado e com pouca presença de matéria orgânica. A camada 3, por sua vez, é composta por material argiloso, mal drenada, rica em matéria orgânica, indicativo do processo de gleização, típico das áreas de várzea devido as condições de excesso de água (hidromorfismo). Conforme a classificação proposta por Peloggia (1998), este depósito se enquadra na categoria dos depósitos de segunda ordem (remobilizados).

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Figura 2. Depósito tecnogênico localizado no Jardim Fonte Nova, em Goiânia (GO).

O segundo ponto localiza-se no setor Morada do Sol, bairro assentado sobre a mesma vertente do Jardim Fonte Nova e dos setores Vila Finsocial e Parque Tremendão. O local situa-se às margens do córrego da Divisa, afluente do córrego Caveirinha. Esquematicamente, dividiu-se o depósito em 3 camadas sedimentares distintas, também denominadas genericamente 4, 5 e 6 (figura 3). A camada 4 corresponde ao material remobilizado (e depositado) pela prática da terraplanagem no local e em áreas circunvizinhas. A camada 5 é constituída por materiais “úrbicos”, isto é, artefatos manufaturados, tais como resquícios de construção civil (tijolos, telhas, cimento) e outros como madeira, plásticos e metais diversos, transportados pelos fluxos de escoamento superficial das áreas de topo para a baixa vertente. A camada 6 representa a alteração provocada no aporte de sedimentos pelo usoocupação no entorno e a montante, resultando no assoreamento do curso d’água, modificando a dinâmica fluvial.

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Figura 3. Depósito tecnogênico localizado no setor Morada do Sol, em Goiânia (GO).

5. Considerações Finais Os depósitos tecnogênicos urbanos estão comumente associados à forma de apropriação dos compartimentos do relevo e as práticas de uso e manejo do solo que, por vezes, desconsideram as fragilidades naturais do meio físico, ampliando os quadros de degradação ambiental. Os estudos envolvendo estes tipos de depósito, especialmente nos ambientes urbanizados, mostram-se relevantes ao estabelecer novas perspectivas de análise e intervenção em áreas degradadas, com ações voltadas para a recuperação ou reabilitação destes ambientes. Os ambientes tecnogênicos são, portanto, testemunhos da ação humana sobre a natureza e dos processos pretéritos responsáveis pelas diferentes fisionomias da paisagem que, por sua vez, condicionam os processos naturais. A magnitude da intervenção humana no ambiente se reflete não somente nas dinâmicas da natureza, mas também na dinâmica social, de modo que o entendimento acerca da ação geológica do homem deve considerar também os aspectos sociais, históricos, culturais e políticos da vida humana.

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Caracterização Faciológica do Registro Estratigráfico em Paleovoçoroca no Planalto das Araucárias (Sul do Brasil) 1

Andressa Fachin Josielle Samara Perreira 3 Julio Cesar Paisani

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1,2,3

Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE 1

[email protected] [email protected] 3 [email protected]

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Resumo O objetivo deste trabalho é apresentar a caracterização faciológica em uma paleovoçoroca no Planalto das Araucárias na região sudoeste do Paraná e noroeste de Santa Catarina onde são identificadas formações superficiais constituídas de sedimentos coluviais, aluviais, colúvio-aluviais e paleossolos. O levantamento da seção estratigráfica denominada HS14 baseia-se principalmente na abordagem lito-, pedo-, e aloestratigráfica e foi conduzida por trabalho de campo e análises laboratoriais. Em campo foi identificado e registrado em papel milimetrado a disposição das unidades litológicas e pedológicas, caracterizada por discordâncias erosivas e incisões lineares. A princípio elas foram individualizadas em paleossolos e sedimentos. Em laboratório, foi determinado o percentual granulométrico em por técnicas de peneiramento da fração grossa e pipetagem da fração fina. A individualização das unidades contou com a identificação de sutis tendências granulométricas. A classificação textural foi determinada através da plotagem dos dados granulométricos no diagrama triangular de Flemming. A seção HS14 revela a presença de paleossolo com horizonte A húmico enterrado e truncado pelas incisões erosivas. Esse tipo de incisão erosiva é um importante registro das mudanças hidrológicas ocorridas na área de estudo provavelmente durante o Quaternário Tardio. Os resultados mostram que a seção apresenta 25 unidades, distribuídas entre fáceis coluvial, colúvioaluvial e aluvial. Palavras chave: Quaternário, caracterização estratigráfica, paleovoçorocas.

Abstract The objective of this work is to present a facies in a paleogully in Araucárias Plateau in southwestern Paraná and Santa Catarina northwest of where they are identified superficial formations consist of colluvial, alluvial, colluvial and alluvial-paleosols. The lifting of the stratigraphic section called HS14 is mainly based approach litho-, pedo-and allostratigraphy and was conducted by field work and laboratory analyzes. In field was identified and recorded on graph paper the arrangement of lithological units and soil, characterized by erosive disagreements and linear incisions. At first they were isolated in paleosols and sediments. In the laboratory, the percentage was determined by grain size in technical screening of coarse fraction and fine fraction of pipetting. The individualization of the units included the identification of subtle textural trends. The textural classification was determined by plotting the data in the triangular diagram of granulometric Flemming. The HS14 section reveals the presence of humic horizon palaeosol with truncated and buried by erosional incisions. This type of erosive incision is an important record of hydrological changes occurring in the study area probably during the Late Quaternary. The results show that the section has 25 units, distributed among easy colluvial, alluvial-colluvial and alluvial. Keywords: Quaternary, stratigraphic characterization, paleogully. 67

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1. Introdução Desde 2008 o grupo de pesquisa “Gênese e Evolução de Superfícies Aplainadas e Formações Superficiais”, cadastrado no CNPq e formado na UNIOESTE, vem levantando informações a respeito da evolução da paisagem do Planalto das Araucárias no Sudoeste do Paraná e Noroeste de Santa Catarina. Até o momento foram reconhecidas oito remanescentes de superfícies aplainadas (Figura 1), onde apenas na Superfície II são identificadas formações superficiais constituídas de sedimentos coluviais, aluviais, colúvio-aluviais e paleossolos (Paisani et al., 2008).

Figura1: Localização dos Remanescentes de Superfícies Aplainadas identificadas a partir da imagem gerada com os dados do radar SRTM. A área de estudo se encontra na Superfície II entre 1.201 a 1.300m. Fonte: Modificado de Paisani et al. (2008).

Até o momento foram levantadas 14 seções estratigráficas ao longo dessa superfície geomórfica. As seções correspondem a transectos em depósitos de colmatação de fundos de vales de baixa ordem hierárquica (1ª a 3ª ordem). Uma das seções, designada de HS-14, assume destaque por apresentar a colmatação de paleovoçorocas. Esse tipo de incisão erosiva é um importante registro das mudanças hidrológicas ocorridas na área de estudo durante o Quaternário Tardio. Assim, o presente trabalho traz resultados da caracterização faciológica dessa seção, com destaque para a identificação de fácies ambiental. 68

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2. Pressupostos Teóricos As regiões sudoeste do Paraná e noroeste de Santa Catarina fazem parte do Planalto Meridional Brasileiro, mantido por rochas básicas, intermediárias e ácidas da Formação Serra Geral da Bacia do Paraná, de idade Eocretácea (Schneider, 1974). As rochas ácidas se subdividem-se em Membros Palmas e Chapecó (Nardy et al., 2002). A área de estudo é mantida por riolitos do Membro Palmas, embora haja afloramentos de derrames fortemente meteorizados por fluídos hidrotermais (Lima, 2012). Seu relevo é caracterizado por colinas amplas suavemente convexas, que na paisagem mostram-se como mesetas, vales rasos de fundo chato. As formações superficiais são raras, se concentrando em paleovales de baixa ordem hierárquica. Diante disso, o critério morfoestratigráfico é de difícil aplicação para mapear tais registros sedimentares. No entorno das mesetas são observadas rampas coalescentes de colúvios delgados. A drenagem atual é deficiente, havendo canais incisivos apenas em segmentos de maior ordem hierárquica. A área é historicamente usada para pastoreio, uma vez que predomina vegetação de campo (Maack, 1981). Tal vegetação ocorre na área a pelo menos nos últimos 41.000 anos AP resistindo as mudanças climáticas ocorridas durante o Quaternário Tardio (Paisani et al., 2012). Acredita-se que as condições climáticas atuais não favorecem o estabelecimento de floresta. Sua ocorrência esta restrita aos fundos dos vales. Nessa superfície geomórfica dados meteorológicos históricos permitem classificar o clima, segundo Köppen, como Cfb, onde o “C” – Clima mesotérmico temperado; “f” – chuvas bem distribuidas durante o ano todo; “b” – verões brandos com temperaturas amenas (Maack,1981). Quanto a pluviomsidade esta é bem distribuida o ano todo, com médias anuais de em torno de 1.500mm a 2.000 mm. Essa condição climática aparenta não trazer elementos para se entender o registro estratigráfico, sobretudo a presença de sedimentos coluviais amplamente distribuídos pela Superfície II. Igualmente, não permite explicar a presença de paleovales de baixa ordem hierarquica colmatados. Pelos levantamentos feitos até o momento na área, sabe-se que é comum a manutenção da sedimentação em paleovales face a inversão de revelo (Paisani et al., 2012 b). Acredita-se que a inversão de relevo foi comandada pelo fenômeno de neotectônica. Por outro lado, não se sabe as condições ambientais que favoreceram a estocagem de colúvios nos paleovales. É possível que haja uma sinergia entre fenômenos de movimentação neotectônica e fenômenos de mudanças climáticas no estabelecimento e isolamento das áreas de estocagem de sedimentos (Paisani et al., submetido a). É nesse contexto que se insere a caracterização faciológica das paleovoçorocas na Superfície II do Planalto das Araucárias.

3. Metodologia do Trabalho A caracterização faciológica do registro estratigráfico que colmatou dígitos de uma paleovoçoroca na Superífice II do Planalto das Araucárias foi conduzida por 69

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trabalho de campo e análises laboratoriais. Em campo foi identificado e registrado em papel milimetrado a disposição das unidades estratigráficas, caracterizada por discordâncias erosivas, incisões lineares. A princípio elas foram individualizadas em paleossolos e sedimentos. Diante disso, aplicou-se dos critérios pedo-, lito- e aloestratigráficos. As unidades pedológicas foram descritas considerando: a) cor (Carta de Munsell); b) estrutura (Manfredini et al., 2005); c) consistência; d) resistência; e) porosidade; f) transição inferior; g) presença de feições pedológicos. Quanto às unidades litológicas a descrição da seção HS14 seguiu utilizando-se dos seguintes critérios: a) nomenclatura das unidades; b) contato entre unidades; c) espessura média; d) tipo de estratificação; e) gradação; e f) cor (Carta de Munsell). Após, o reconhecimento e descrição das propriedades macroscópicas procederamse as coletas de amostras para análises granulométrica totalizando 128 amostras analisadas distribuído em quatro janelas de observação. A análise granulométrica foi realizada no laboratório de Análises e Formações Superficiais – Unioeste, sob o método de quarteamento da amostra, peneiramento da fração grossa e pipetagem da fração fina (Suguio, 1973; Paisani, 1998). Os resultados foram organizados em percentuais granulométricos dispostos em gráficos de linhas conforme as frações granulométricas (argila, silte, areia, grânulo e seixo) e distribuídos segundo a profundidade. Tais percentuais foram plotados no Diagrama Triangular de Flemming (Oliveira & Lima, 2004) para determinação das classes texturais.

4. Resultados e Discussões 4.1 Caracterização da seção estratigráfica A seção estratigráfica HS14 (Figura 2) apresenta aproximadamente 18 m de extensão por 3,50 m de altura. Foi identificada a presença de paleossolos com horizonte A húmico enterrado e truncado pelas incisões verticais. As sutis tendências de variação nas frações granulométricas foram usadas para identificar descontinuidades estratigráficas de sedimentos aparentemente homogêneos (Figura 3), similarmente ao realizado por Paisani (2004). Até o momento foram reconhecidas 25 unidades litológicas, que podem ser colúvios, aluviais e colúvio-alúvios.

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Figura 2: Seção HS14. (I) Rocha alterada; (II) Paleossolos enterrados; (III) Fragmentos de calcedônia; (IV) lito e pedorrelíquias; (V) Lentes; (VI) Vegetação atual.

Figura 3: Distribuição dos precentuais de areia, silte e argila, correspondentes as janelas 1, 2 ,4 e 5 da seção HS14.

A unidade 1 apresenta em media 40 cm de espessura. Os materiais encontrados estão em contato abrupto com a rocha alterada, derivada do derrame vulcânico de rocha ácida classificada como riolito (Paisani, et al submetido b). Sua cor é 2.5YR 7/4 (amarelo oliváceo), apresenta textura de lama arenosa com clastos suportados (Figura 4).

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Figura 4: Resultado da plotagem das amostras das janelas J1, J2, J4 e J5 da seção HS14, no Diagrama Triangular de Flemming (2002). A unidade 2 tem cerca de 40 cm de espessura, consiste em um material extremamente plástico, com cor 7.5YR 2.5/2 (preto) e textura lama arenosa extremamente siltosa. Inicialmente pensava se tratar da rocha alterada, porém bruscas mudanças da distribuição granulométrico sugerem se tratar de um colúvio pedogenizado (horizonte BA). A unidade 3 refere-se à paleossolo enterrado com horizonte A húmico distribuído lateralmente ao longo da seção. A sua granulometria varia de forma brusca em relação ao material subjacente, levando a pensar que se trata de um colúvio pedogenizado e melanizado. Sua espessura média é de aproximadamente 1m, exibindo truncamento pelas incisões lineares (paleovoçorocas). Sua textura é lama levemente arenosa extremamente argilosa variando para lama levemente arenosa muito argilosa. A cor corresponde há 7.5YR 2.5/1(preto). A unidade 4 representa um colúvio heterométrico misturando materiais minerais, com cor 7.5 YR 3/3 (bruno escuro), e manchas (“lentes”) 7.5 YR 5/8 (bruno forte) de material melanizado. Apresenta textura entre lama levemente arenosa muito argilosa a lama levemente arenosa extremamente argilosa. Tal evento promoveu a colmatação de uma das gerações de paleovoçorocas, possivelmente ocasionado por fluxos de lama vindos de uma área fonte muito próximo dada a mistura de materiais. Quanto às unidades 5, 9 e 16 exibem sutil estratificação plano-paralela, cor 7.5 YR 3/ 4 (bruno escuro) e textura de lama levemente arenosa muito argilosa à lama arenosa extremamente argilosa. A sutil estratificação sugere ação de fluxos de lama tendendo para fluxos hiperconcentrados concentrados na base de paleovoçorocas. Diante disso, foram interpretados como fáceis aluviais. As unidades 6, 7, 8, 10, 11, 12, 13,14 e 15 podem corresponder a fáceis de transição entre eventos de encosta e retrabalhamento ao longo do eixo das voçorocas. Assim, foram interpretadas como fácies colúvio-aluvial. Destaca-se a cor 7.5 YR 3/3 (bruno escuro) com manchas 5 YR 4/6 (bruno forte). A textura caracteriza-se como lama levemente arenosa muito argilosa há lama arenosa muito siltosa. 72

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As demais unidades (17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, e 24) são típicas fáceis coluviais e correspondem ao último estágio de preenchimento das paleovoçorocas. São aparentemente homogêneo e apresenta uma quantidade significativa de litorrelíquias de diversos tamanhos, bem como, fragmentos de calcedônia. A cor varia de 7.5 YR 4/4 (bruno) a 7.5 YR 2.5/2 (bruno muito escuro), enquanto a textura predominante dessas fáceis é lama levemente arenosa extremamente argilosa à lama arenosa siltosa. Tais características texturais apontam para dois fatores importantes, uma área fonte constituída de materiais pedogenizados sem cascalho nos horizontes C e sendo gerados por fluxos de lama ou terra. Quanto à unidade 25 corresponde a colúvio pedogenizado com horizonte A atual, melanizado e com expressiva quantidade de raízes. A cor do material é 7.5 YR 2.5/1 (preto) e sua textura é classificada como lama arenosa siltosa à lama arenosa muito siltosa. No geral, identificou-se 3 fáceis aluvial, 9 colúvio-aluvial e 12 fáceis coluvial, bem como um nível de paleossolo enterrado distribuído lateralmente ao longo da seção. Datações pelo 14C realizadas em outras seções que apresentam paleossolo similar apontam para um evento de pedogênese nos fundos dos vales ocorrido entre 24.000 e 41.000 anos AP (Paisani et al., 2012 b; Guerra e Paisani, 2012). 4.2 Classificação Textural da Matriz Segundo Flemming Observando os percentuais de argila em todas as janelas (Figura 3), percebese maior percentual de argila comparado com as demais frações desde o topo das janelas até as suas bases, com exceção das janelas J1 e J4 onde o percentual de argila decresce à medida que aumenta o percentual de silte. No caso da J1, isso ocorre no topo do paleossolo. Quanto a J4 esse acréscimo de silte com relação à fração argila ocorre na base da janela onde situa-se o riolito alterado. A fração silte vem logo em seguida se mostrando expressiva em termos de quantidade variando entre 20 a 60%. Esse aspecto revela um poder de seleção, sutil, mas importante dos fluxos que colmataram a paleovoçoroca. A fração grossa, correspondente a areia, seixo e grânulo que apresentam valores inferiores as demais frações não ultrapassando 20%. Quanto ao tipo de gradação na J1 apresenta gradação inversa na unidade 1, assim como na unidade 25 e gradação normal na unidade 2. Já a J2 possui gradação inversa na unidade 19 e normal na unidade 10. A J4 apresenta apenas gradação normal na unidade 24. Já J5 possui gradação inversa nas unidades 23 e 24 e gradação normal na unidade 25. Igualmente, a sutil seleção foi responsável pelas variações na fração grossa. De acordo com o diagrama triangular de Flemming (figura 4) constata-se que a maior parte das amostras é constituída de lama levemente arenosa muito argilosa (D-V), apresentando algumas variações entre lama levemente arenosa extremamente argilosa (D-VI) a lama arenosa muito siltosa. Do ponto de vista faciológico as janelas apresentam expressiva semelhança entre suas fácies coluvial, aluvial e colúvio-aluvial. Isso sugere que o poder de modificação das propriedades da área fonte pelos fluxos foi sutil, registrando-se uma forte pedodependência. 73

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5. Conclusões/Considerações Finais Este trabalho apresenta os resultados da caracterização faciológica do registro estratigráfico que colmatou dígitos de uma palevoçoroca na Superfície II no Planalto das Araucárias. Essa caracterização faciológica foi conduzida por trabalho de campo e análises laboratoriais. Em campo foi identificado e registrado disposição das unidades estratigráficas, enquanto em laboratório classificou-se essas unidades caracterizada por discordâncias erosivas e incisões lineares. A seção levantada exibe paleossolo enterrado com horizonte A húmico, bem como unidade coluviais, aluviais e colúvio-aluviais. Ao todo foram individualizadas 25 unidades sendo 3 fáceis aluviais, 12 coluvial e 9 colúvio-aluvial, demostrando expressiva semelhança entre si, principalmente em relação a textura. A classe textural predominante entre as fáceis é lama levemente arenosa muito argilosa (D-V), com variações entre lama levemente arenosa extremamente argilosa (D-VI) a lama arenosa muito siltosa. Entre os estudos já realizados na área de estudo constata-se que esse evento de voçorocamento corresponderia ao Período do Último Maximo Glacial. Nesse contexto, a caracterização faciológica das paleovoçorocas indica a ação de processos erosivos-deposicionais atuando na esculturação e remodelamento da Superfície Aplainada II nesse período.

6. Agradecimentos A CAPES pelo apoio financeiro através da concessão da bolsa de mestrado.

Referências Bibliográficas FLEMMING, B.W. A revised textural classification of gravel-free muddy sediments on the basis ternary diagrams. Continental Shelf Research. n. 20, 2000, p. 1125 1137. GUERRA, S.; PAISANI, J. C. Levantamento estratigráfico das Formações Superficiais Cenozóicas no Planalto de Palmas (PR) e Água Doce (SC): subsídio ao estudo da evolução da paisagem a partir do Estágio Isotópico Marinho 3. Ambiência (UNICENTRO), v. 8, p. 651-665, 2012. LIMA, J. G. G. Mapeamento e caracterização de derrame alterado sob rocha sã no Planalto de Palmas (PR)/Água Doce (SC). Dissertação (Mestrado em Geografia) 2013. Francisco Beltrão, PR. MAACK, R. Geografia Física do Estado do Paraná. 2. ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1981. 450p. MANFREDINI, S. et al., Técnicas em Pedologia. In: VENTURI. (org.) Praticando a Geografia: técnicas de campo e laboratório em geografia e análise ambiental. São Paulo: Oficina de Textos, 2005. NARDY, A.J.R.; MACHADO, F.B.; OLIVEIRA, M.A.F. As rochas vulcânicas mesozóicas ácidas da Bacia do Paraná: litoestratigrafia e considerações geoquímico-estratigráficas. Geociências, UNESP, v.38, n.1, p.178-195, 2008.

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OLIVEIRA, M.A.T; LIMA, G.L. Classificação de sedimentos quaternários em cabeceira de vale através da aplicação do Diagrama de Flemming: Município de Campo Alegre, norte de Santa Catarina. São Paulo, UNESP, Geociências, v.23, n.1/2, p. 67/78, 2004. PAISANI, et al.; Contribuição para a reconstrução de paleoperfis de alteração no Planalto de Palmas/Água Doce - Sul do Brasil. Geographia UFC, submetido a. PAISANI, J..C; Descontinuidades Hidrológicas, Escoamento Superficial e Desenvolvimento de Incisões Erosivas em Área de Cabeceira de Drenagem: Estudo de Caso na Colônia Quero - Quero, Palmeira (PR). Departamento Geociência. UFSC, 1998. PAISANI, J.C.; et al. Superfícies aplainadas em zona morfoclimática subtropical úmida no Planalto Basáltico da Bacia do Paraná (SW Paraná/ NW Santa Catarina): primeira aproximação. Geociências, v.27, n.4., p.541-553, 2008c. PAISANI, J.C. Utilização de diagrafias granulométricas no estabelecimento da lito e pedoestratigrafia de rampa arenosa costeira - O caso Praia Mole (Ilha de Santa Catarina).Geografia: Revista do departamento de Geociências, v.8,n.1, p. 139-151, 2004. PAISANI, J.C. et al.; Dinâmica ambiental e da vegetação do Planalto das Araucárias – Superficie II – No Quaternário Tardio: contribuições de analises de fitólitos, de isótopos de carbono e da mineralogia de argila.In: IX Simpósio Nacional de Geomorfologia (SINAGEO), 2012, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. PAISANI, J.C.; et al. Evolução de bacias de baixa Ordem Hierarquica no Planalto de Palmas/Água Doce( Sul do Brasil) nos 41.000 anos AP – O caso da seção HS1.Mercator, submetido b. SUGUIO, K. Introdução à sedimentologia. SP: Ed. Blücher, Ed. USP, 1973. SCHNEIDER, R. L. Revisão estratigráfica da bacia do Paraná. Anais do XXVIII Congresso Brasileiro de Geologia, p. 41-65, 1974.

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Fácies Coluvial e Aluvial na Colmataçao de Paleocanal de Segunda Ordem no Planalto das Araucárias (Sul do Brasil) 1

Josielle Samara Pereira 2 Andressa Fachin 3 Julio César Paisani

1,2,3

Universidade Estadual do Oeste do Paraná 1

[email protected] 2 [email protected] 3 [email protected]

Resumo O presente artigo traz os resultados da identificação das facies coluvial e aluvial na colmataçao de paleocanal de segunda ordem no Planalto das Araucárias (Sul do Brasil) com base em informações da seção estatigráfica HS11. Até o momento sabe-se que as formações superficiais dessa área são constituídas por solos gerados in situ e sedimentos quaternários. Nas áreas de ocorrência desses sedimentos iniciou-se a 4 anos levantamento sistemático de seções estratigráficas. O levantamento da seção estratigráfica no Planalto das Araucárias se baseia na abordagem aloestratigráfica e conta com informações geradas em campo por meio da descrição da seção, revisão bibliográfica e análises laboratoriais (granulometria e datação pelo 14C). A seção HS11 registra os eventos geomórficos de colmatação de um canal de 2ª Ordem estabelecido na Superfície II. Ela exibe sedimentos tanto de ambiente de encosta quanto fluvial estabelecidas sobre derrame intemperizado. Concluiu-se que fenômenos de coluvionamento coincidiram com a colmatação do paleovale por sedimentos aluviais. O coluvionamento é recorrente na área como demonstra a presença de paleossolo enterrado e camadas coluviais sobrejacentes a este. Em termos gerais, a seção descrita revela processos erosivos-deposicionais atuando na esculturação do relevo durante o Holoceno no Planalto das Araucárias, especificamente na Superfície II. Palavras chave: Quaternário, caracterização estratigráfica, paleocanal.

Abstract This article presents the results of the identification of colluvial and alluvial facies in the clogging of buried paleochannel second order in the Araucaria Plateau (southern Brazil) based on information from stratigraphic section HS11. To date it is known that the surface formations are comprised of this area generated in situ soils and sediments quaternary. In the areas of occurrence of these sediments began the survey four years of systematic stratigraphic sections. The lifting of the stratigraphic section in Plateau Araucárias approach is based on allostratigraphy and has generated information in the field 14 through the description section, literature review and laboratory analysis (grain size and timing at C). The HS11 records the events section of geomorphic channel clogging of a 2nd Order established the Surface II. It displays both sediments of fluvial environment hillside as established on weathered spill. It was concluded that colluvial deposition phenomena coincided with the clogging paleovalley by alluvial sediments. The colluvial deposition is recurrent in the area as evidenced by the presence of buried palaeosol and overlying colluvial layers to this. In general, the section described reveals erosion-depositional working in sculpture relief during the Holocene in the Araucaria Plateau, specifically the Surface II. Keywords: Quaternary, stratigraphic characterization, buried paleochannel.

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1. Introdução A evolução da paisagem geomorfológica do Planalto das Araucárias no Sudoeste do Paraná e noroeste de Santa Catarina por apresentar formas de relevo diferenciadas, é o principal objeto de compreensão do grupo de pesquisa “Gênese e Evolução de Superfícies Geomórficas e Formações superficiais”, formado na Unioeste e cadastrado no CNPq. Segundo Paisani et al. (2008), tal planalto é caracterizado por uma paisagem com formas de relevo composta por uma sucessão de remanescentes de superfícies aplainadas, organizadas em escadaria de leste para oeste. Nesta área, estes autores identificaram oito remanescentes de Superfícies aplainadas, geradas simultaneamente pelo balanço entre alteração e erosão mecânica, durante o soerguimento da área, tais processos responsáveis pela elaboração dessa superfície ainda estão em estudo. Apenas uma superfície é exceção, a superfície de cimeira, que se encontra como pediplano. Até o momento percebe-se que predominam ao longo das superfícies perfis de intemperismo com diferentes espessuras de Nitossolos e Latossolos (Paisani et al., 2012 a). Há também depósitos de colúvio, colúvio-alúvio e alúvio, bem como solos enterrados que tem sido revelado através do reconhecimento e caracterização das formações superficiais (Guerra e Paisani, 2012). Tais registros levam a pensar em uma área cuja evolução se deu por fases alternadas de estabilidade e instabilidade ambiental. Esses fatos são evidencias para que assim se chegue ao entendimento da formação e evolução dessas superfícies. Somando a esses fenômenos morfogenéticos, a área registra casos de inversão de relevo, aumentando a complexidade de sua evolução. Até o momento sabe-se que as formações superficiais dessa área são constituídas por solos gerados in situ e sedimentos quaternários. Nas áreas de ocorrência desses sedimentos iniciou-se a 4 anos levantamento sistemático de seções estratigráficas (Paisani et al., 2012 b)

Neste contexto, o presente artigo tem por objetivo apresentar as Fácies Coluvial e Aluvial na colmatação de Paleocanal de Segunda Ordem no Planalto das Araucárias (Sul do Brasil), com base em informações da seção estratigráfica HS11, caracterizada como paleocanal de segunda ordem colmatado nos últimos 1.500 anos AP. 2. Pressupostos Teóricos A área de estudo localiza-se ao Sudoeste do Paraná e Noroeste de Santa Catarina mais especificamente na Superfície Aplainada II (Paisani et al., 2008), que corresponde a uma unidade morfológica inscrita na unidade morfoestrutural regional conhecida como Planalto das Araucárias (Almeida, 1956).

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Figura 1 – Mapa de localização dos remanescentes de superfícies aplainadas identificadas por Paisani et al. (2008).

A superfície Aplainada II se encontra entre 1.200 e 1.300 m de altitude (Paisani et al., 2008). Há um importante divisor de água regional mantido nessa superfície, que divide na área de estudo as águas que drenam para o sistema hidrográfico do rio Chopinzinho, ao Norte, e para o sistema hidrográfico do rio Chapecózinho, ao Sul, ambos afluentes dos rios Iguaçu e Uruguai. Tal divisor de água também é definido como limite político entre os dois estado Paraná e Santa Cararina (Paisani et al. 2012a ). Em relação ao clima desta região, ele é predominantemente temperado, caracterizado por 2.000 mm anuais bem distribuídas ao longo do ano e estações marcadas por contrastes de temperatura (Maack, 1968). Na área é comum a morfologias de degradação, como relevos residuais cujos topos correspondem aos remanescentes da Superficie I. Áreas de acumulação são raras e se encontram na situação de paleofundos de vales colmatados e alçados na paisagem. Tais fundos de vales correspondem a paleocanais de baixa ordem hierárquica (1ª a 3ª ordens). Tal situação sugere que fatores neotectônicos foram importantes nos fenômenos de inversão do relevo e manutenção dessas áreas de agradação (Paisani et al., 2012 a). Até o momento sabe-se que paleovales de 2ª. Ordem situado junto ao atual dividor de águas regional eram funcionais até o final do Pleistoceno (Paisani et al., 2012 a). Por outro lado, a colmatação desses paleocanais é um processo pouco compreendido. Diante disso, este trabalho contribui para elucitar tal questão e contribui para entender que processos foram 78

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responsáveis pela colmatação dos canais de baixa ordem hierárquica, sobretudo naqueles situados atualmente fora do divisor de águas regional.

3. Metodologia de Trabalho A metodologia para a realização deste artigo correspondeu na descrição de seção estratigráfica designada de HS11 onde se baseia na abordagem aloestratigráfica, e conta com informações por meio de trabalho de campo e análises laboratorias, essa ultima consistiu na realização da granulometria e na datação pelo 14 C. O trabalho de campo consistiu na reprodução em papel milimetrado a geometria das unidades estratigráficas, sendo reconhecido paleossolo enterrado e sedimentos coluviais e aluviais. A granulometria foi realizada em amostras coletadas sistematicamente em quatro locais na seção HS11, designados de janelas 4, 9, 15 e 21. Os resultados granulométricos foram organizados em gráficos para se ter os percentuais granulométricos (silte, argila, areia, grânulo e seixo), conforme a profundidade, e em seguida plotados no diagrama de Fleming (Oliveira e Lima, 2004) para determinação das classes texturais. Sendo ela estabelecida no Laboratório de Análise de Formações Superficiais da UNIOESTE, onde se processou a partir do peneiramento para a fração grossa e da pipetagem para a fração fina, com separação via úmida (Paisani, 1998). Os percentuais das frações granulométricas foram decisivos na individualização das unidades litológicas. A textura foi definida objetivando classificar as unidades. A idade dos registros estratigráficos foi definida pelo método do 14C de sedimento organo-mineral encontrado na base do paleocanal. A análise foi realizada pelo laboratório de isótopos do CAIS (University of Georgia - USA).

4. Resultados e Discussões 4.1 Caracterização da seção A seção HS11 registra os eventos geomórficos de colmatação de um canal de 2ª Ordem estabelecido na Superfície 2. Ela exibe sedimentos tanto de ambiente de encosta quanto fluvial estabelecidas sobre substrado constituído de derrame meteorizado por fluxos hidrotermais (Lima, 2012) (Figura 2). No ambiente de encosta foram reconhecidas 8 unidades coluviais (unidades 1, 2, 3, 4, 6, 8, 9, 16, 23) e dois paleosolos húmicos (unidades 5 e 7). No ambiente fluvial identificou-se 11 unidades aluviais (unidades 10, 11, 12, 13, 14, 15, 17, 18, 19, 20, 21, 22). Estas últimas foram individualizadas levando em consideração presença ou ausência de sutil gradação (normal ou inversa).

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Figura 2: Seção HS11: (1) derrame intemperizado. (2) colúvio lama levemente arenosa argilosa a argila siltosa. (3) colúvio lama levemente arenosa argilosa a lama levemente arenosa siltosa. (4) paleohorizonte húmico lama levemente arenosa argilosa. (5) alúvio lama levemente arenosa argilosa sem gradação. (6) alúvio lama levemente arenosa argilosa com gradação normal. (7) alúvio lama levemente arenosa argilosa a argila siltosa com gradação inversa. (8) cascalho. (9) colúvio lama levemente arenosa argilosa com mistura de material organo-mineral.

As facies coluviais (ambiente de encosta) apresentam as seguintes texturas: lama levemente arenosa argilosa com mistura de material organo-mineral (unidade 9), lama levemente arenosa argilosa a argila siltosa com cascalho (unidades 1 e 6), lama levemente arenosa argilosa a lama levemente arenosa siltosa sem cascalho (unidades 2, 3, 8, 16 e 23), lama levemente arenosa argilosa sem cascalho (unidade 4), e lama levemente arenosa argilosa pedogeneizada (unidades 5 e 7). As facies aluviais (ambiente fluvial) apresentam as seguintes texturas: lama levemente arenosa argilosa(unidade 10, 11, 12, 13, 14, 15, 17,18, 19, 20, 21) e argila siltosa (unidade 22). Através da datação do 14C é visto que a seção apresenta a colmatação de um paleocanal de segunda ordem hierárquica preenchido por sedimentos aluviais durante o Holoceno Superior, uma vez que a idade pelo 14C corresponde a 1.440 ± 20 anos AP (612 a 671 cal. AP). 4.2 Análise Granulométrica Através da granulometria constata-se o percentual de da cada fração presente na amostra cujas frações são: seixo, grânulo, areia, silte e argila. Foi analisada a J4 contendo 23 amostras, J15 com um total de 24 amostras, J9 com 25 amostras e a J21 na qual foram tratadas 29 amostras.

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Figura 3: Gráficos Granulométricos.

A figura 3 apresenta os gráficos dos percentuais granulométricos da janela 4, janela 9, janela 15 e janela 21. A janela 4 localiza-se no início do paleocanal em sua margem direita e apresenta um alto teor de argila seguido de um elevado percentual de silte. A areia permanece com um percentual baixo assim como as frações grânulo e seixo que se encontram mal distribuídas. A Janela 9 localizada-se no meio do paleocanal e apresenta um alto teor de argila seguido de um elevado percentual de silte. A areia apresenta algumas variações em determinadas amostras, enquanto grânulo e o seixo se encontram mal distribuído com um percentual baixo. A Janela 15 se encontra no ambiente de encosta mais ou menos no meio da seção próxima ao paleocanal, percebe-se através do gráfico da figura 3 que ela apresenta alto teor de argila, seguida por um percentual médio de silte, ao contrário o percentual de areia se apresenta muito baixo e a fração seixo se encontra mal distribuído. A janela 21 localiza-se assim como a janela 15 no ambiente de encosta mas a diferença é que ela se encontra distante do paleocanal e próximo ao limite oeste da seção. Ela apresenta em seus percentuais granulométricos elevado teor de argila. O teor de silte exibe variabilidade, sobretudo na unidade 1, caracterizada por colúvio com cascalho, enquanto que a areia se apresenta com seu teor baixo não ultrapassando 10%. O granulo permanece constante tendo algumas pequenas variações, o seixo em muitas amostras não é encontrado.

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Figura 4: Diagrama Triangular de Flemming.

De acordo com a figura 4 constata-se que a maior parte das amostras nas respectivas 4 janelas analisadas classificam-se de acordo com o diagrama triangular de Flemming, como sendo Lama levemente arenosa argilosa (D-IV), possuindo algumas variações entre: lama levemente arenosa siltosa(D-III) na janela 9, 15 e 21, argila siltosa (E-III) presentes na janela 9 e 21 e uma amostra apenas sendo Lama levemente arenosa muito argilosa (DV) na janela 4. Percebe-se assim que os materiais das amostras analisadas da encosta e do paleocanal encontram-se relacionados, pois a textura é a mesma, ou seja, os materiais encontrados no paleocanal são indicio de que anteriormente estavam presente na encosta até então se depositarem no canal.

5. Conclusões/Considerações Finais A seção apresenta a colmatação de um paleocanal de segunda ordem hierárquica preenchido por sedimentos aluviais durante o Holoceno Superior (1.440 ± 20 anos AP / 612 a 671 cal. AP). Este processo coincide com fenômeno de coluvionamento no setor de encosta do respectivo paleovale, resultando na interdigitação entre unidades coluviais e aluviais. Acredita-se que o fenômeno de coluvionamento é recorrente na área como demonstra a presença de paleossolo enterrado e camadas coluviais sobrejacentes a este. Em termos gerais, a seção 82

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descrita revela processos erosivos-deposicionais atuando na esculturação do relevo durante o Holoceno no Planalto das Araucárias, especificamente na Superfície 2.

6. Agradecimentos Agradeço ao CNPq pelo financiamento e pela bolsa de iniciação científica.

Referências Bibliográficas ALMEIDA, F. F. M. O Planalto basáltico da Bacia do Paraná. Boletim Paulista de Geografia, n. 24, p. 03-34, 1956. GUERRA, S.; PAISANI, J.C.; Levantamento estratigráfico das Formações Superficiais Cenozóicas no Planalto de Palmas (PR) e Água Doce (SC): subsídios ao estudo da evolução da paisagem a partir do Estágio Isotópico Marinho 3. Ambiência (UNICENTRO), v. 8, p. 651-665, 2012. LIMA, J.G.G.; Mapeamento e caracterização de derrame alterado sob rochas sã no Planalto de Palmas(PR)/Água Doce(SC). Dissertação (Mestrado em Geografia) 2013. Francisco Beltrão, PR MAACK, R. Geografia física do Estado do Paraná, 1968. 350p. OLIVEIRA, M.A.T; LIMA, G.L. Classificação de sedimentos quaternários em cabeceira de vale através da aplicação do Diagrama de Flemming: Município de Campo Alegre, norte de Santa Catarina. São Paulo, UNESP, Geociências, v.23, n.1/2, p.67/78, 2004. PAISANI, J. C; Descontinuidades Hidrológicas, Escoamento Superficial e Desenvolvimento de Incisões Erosivas em Área de Cabeceira de Drenagem: Estudo de Caso na Colônia Quero - Quero, Palmeira (PR). Departamento Geociência. UFSC, 1998. PAISANI, J. C. et al.; Dinâmica ambiental e da vegetação do Planalto das Araucárias – Superfície II – No Quaternário Tardio: contribuições de analise de fitólitos, de isótopos de carbono e da mineralogia de argila. In: IX Simpósio Nacional de Geomorfologia (SINAGEO), 2012, Rio de Janeiro, RJ, Brasil. PAISANI, J. C; PONTELLI, M.E; ANDRES, J. Superfícies aplainadas em zona morfoclimática subtropical úmida no Planalto Basáltico da Bacia do Paraná (SW Paraná e NW Santa Catarina: primeira aproximação. Geociências, UNESP, v.27, n.4, p.541 – 553, 2008. PAISANI, J. C; PONTELLI, M.E; CALEGARI, M, R. Evolução de Bacias de Baixa Ordem Hierárquica nos 41.000 Anos AP- Brasil Meridional. Mercator, Fortaleza, v. 11, n. 26, p. 131-148, set./ dez. 2012.

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Coleção de Referência de Fitólitos da Floresta Ombrófila Densa (Linhares, ES): Subsídios para Reconstrução Paleoambiental (Primeira Aproximação) Fernanda Aparecida Cecchet – UNIOESTE- FB/PPP-Geografia [email protected] Paula Louíse de Lima Felipe- UNIOESTE-FB /PPP-Geografia [email protected] Marcia Regina Calegari- UNIOESTE-MCR/CGEO [email protected] Luiz Carlos Ruiz Pessenda – CENA/USP [email protected] Resumo A distribuição atual dos biomas brasileiros, elaborado no período Quaternário, reflete as instabilidades dos climas passados. Vários estudos de microfósseis, análises polínicas e isotópicas, entre outras técnicas são utilizadas como meios para investigar o comportamento climático e suas implicações nos paleoambientes. A essas técnicas de investigação, soma-se a análise fitolítica, utilizada para complementar os estudos pertinentes ao tema. Fitólitos são corpos de sílica amorfa (SiO2.nH20), produzidos por plantas e após a morte de suas produtoras podem ser incorporados ao solo/sedimentos, podendo permanecer ali por longos períodos de tempo. Para que a análise fitolítica possa ser desenvolvida de forma consistente, há necessidade de coleções de referência que permitam comparações entre os fitólitos de plantas atuais, com aqueles encontrados nos solos e sedimentos. Entretanto, há uma carência muito grande destas coleções, que impedem que os estudos sejam realizados, inclusive na área estudada – bioma Mata Atlântica. O objetivo deste artigo é apresentar os resultados preliminares da coleção de referência de fitólitos da Floresta Ombrófila Densa. Os procedimentos adotados para a extração de fitólitos foram adaptados de Campos & Labouriau, (1969) e Piperno (1998). Os resultados indicaram que as espécies selecionadas são boas produtoras de fitólitos e os morfotipos identificados possuem significado ambiental e taxonomico, o que resulta em interpretações mais precisas da estrutura paleoambiental das paisagens brasileiras. Palavras chave: Fitólitos; Coleção de referência; Reconstrução paleoambiental.

Abstract The current distribution of biomes, developed in Quaternary period, reflects the instability of past climates. Several studies of microfossils, pollen and isotopic analyzes, among other techniques are used as a means to investigate the climatic behavior and its implications for palaeoenvironments. To these investigation techniques, sum up the phytolithic analysis, used to complement the studies relevant to the topic. Phytoliths are bodies of amorphous silica (SiO2.nH20), produced by plants and after the death of their producers can be incorporated into the soil/sediment, and may remain there for long periods of time. For the development of a consistently phylithic analysis can be done, is need a reference collection that allow comparisons between the current plant phytoliths, with those found in soils and sediments. However, there is a major lack of these collections, which prevent the studies are performed, including the study area - the Atlantic Forest biome. The purpose of this paper is to show the preliminary results of the reference collection of phytoliths from the Rain Forest. Procedures for extraction of phytoliths were adapted from Campos & Labouriau, (1969) and Piperno (1998). The results demonstrated that the species selected are good producers of phytoliths and morphotypes possess identified taxonomic and environmental significance, resulting in more accurate interpretations of palaeoenvironmental structure of Brazilian landscapes. Keywords: Phytoliths, Reference Collection, Palaeoenvironmental Reconstruction. 84

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1. Introdução Em todo o mundo e principalmente no Brasil os estudos sobre o Quaternário ainda são recentes. Cronologicamente podemos perceber que as primeiras fases desses estudos ocorreram nas primeiras décadas do Século XX, com os estudos de Darwin. Já em 1970 Tricart se torna um importante pesquisador dentro da geografia física com ênfase aos estudos do Quaternário. No Brasil se destacam Bigarella e Aziz Ab’Sáber com várias pesquisas realizadas em sítios arqueológicos no interior do continente e nas planícies costeiras ainda nas décadas de 1960 e 1970 (Suguio, et al, 2005). Para os estudos de reconstrução paleoambiental os marcadores ambientais (proxies biológicos) são utilizados como ferramentas (isótopos de carbono, os registros palinológicos, as diatomáceas, espículas de esponjas e os fitólitos). Quase sempre estes proxies são usados em conjunto e se complementam. As coleções de referência de fitólitos permitem uma análise comparativa da vegetação pretérita (preservada em solos e sedimentos) com a vegetação atual e abordam a identificação das plantas por famílias e até mesmo espécies, garantindo uma análise mais consistente dos registros fósseis. No Brasil, os trabalhos de reconstrução paleoambiental na geografia usando como base as coleções de referência de fitólitos e as assembleias preservados em solos e sedimentos ainda são incipientes, porém importantes nos estudos de gênese de solos e evolução de paisagens (Calegari et al., 2013). A elaboração de coleções de referência de fitólitos de plantas modernas (folhas, raízes, flores, sementes) das fitofisionomias de nosso país é importante nesse sentido, pois os estudos de reconstrução realizados até o presente (por exemplo, Borba-Roshel et al., 2006; Calegari et al, 2013; Coe et al., 2013) se basearam em coleções de referência de biomas extraídos e identificados fora do Brasil. Fitólito, do grego “pedra produzida por plantas”, é o termo que tem sido usado para identificar as formas de substâncias mineralizadas pelas plantas (biomineralizações), sejam elas formadas por sílica hidratada (ácido monossílico) ou oxalato de cálcio (Rovner, 1971; Piperno, 2006). Os fitólitos de sílica (silicofitólitos), doravante chamados fitólitos são formados devido à absorção do ácido monossílico (Si.OH4) absorvido do soluto do solo pela planta durante o seu crescimento. Quando a planta ou parte dela morre, o material orgânico é mineralizado e os fitólitos são liberados para serem incorporados ao solo por processos de erosão, transporte e deposição como qualquer outra partícula sedimentar na fração silte (Piperno, 2006;Thorn, 2007). Os fitólitos apresentam grande potencial para aportar informações arqueológicas e paleoambientais significativas sobre uma área (Rapp e Mulholland, 1992; Piperno, 2006; Thorn, 2007;) e sobre hábitos alimentares e sociais de grupos pré-históricos. O desenvolvimento dos fitólitos nas plantas está relacionado com uma série de fatores, como por exemplo: climática (ambiente de crescimento dessa planta); edáfico (natureza do solo), a quantidade de água armazenada no solo, senelitude da planta e principalmente a afinidade/capacidade taxonômica da própria planta na produção dos corpos de sílica (Piperno, 1988). É importante ressaltar que os fitólitos variam em tamanho e forma de acordo com o tecido vegetal em que se formaram, 85

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porém nem todas as plantas produzem fitólitos identificáveis, por isso se torna importante confeccionar coleções de referencias, pois elas indicarão quais espécies/famílias são produtoras. Em geral se sabe que a produção é mais abundante nas monocotiledôneas do que nas eudicotiledôneas (Rapp e Mulholland, 1992). A combinação de uma boa produção de fitólitos em plantas modernas aliada a uma boa preservação nos solos e sedimentos denota a esse proxy grande potencialidade para trabalhos biogeográficos, pedológicos, arqueológicos e paleoambientais em geral. As vantagens que esse proxy oferece estão relacionadas também a abundância de fitólitos bem preservados em solos e sedimentos que podem indicar as passagens/mudança de vegetação por exemplo camposcapoeirões, campo-floresta, que podem ser claramente distinguidos através da análise fitolítica em solos bem drenados (ambientes oxidados). A solidez e a robustez dos fitólitos permite que eles sejam preservados nos regitros fósseis em ambientes redutores ou oxidados e não sofram danos mecânicos, sobretudo ambiente seco oxidado, que geralmente atingem os grãos de pólen (Thorn, 2007). A identificação e classificação dos fitólitos deve seguir a nomenclatura padronizada. A mais moderna e em uso é o Código Internacional de Nomenclatura de Fitólitos – ICPN 1.0. (International Code of Phytolith Nomenclature) (Madella et al, 2005), que foi criado a partir de abordagens anteriores (de caráter taxonômico, tipológico e misto). Ele visa uniformizar a nomenclatura dos fitóltios e facilitar a comunicação entre os pesquisadores em suas análises comparativas dos vários morfotipos de diferentes biomas e regiões do mundo. Na Europa e América do Norte as pesquisas com fitólitos são bem desenvolvidas e aplicadas à reconstrução de paisagens e hábitos socioculturais pretéritos. Entretanto, no Brasil as pesquisas relacionadas ao estudo de fitólitos ainda são pouco utilizadas, principalmente devido a ausência de coleções de referencias consistentes que expressem, em termos de assembléia/coleções de fitólitos, as características das unidades fitofisiográficas mais relevantes do país. Neste sentido, visando minimizar essa falta de coleções de referencia esse trabalho, que é parte de um projeto maior, sob a coordenação do Prof. Dr. Luiz c. Ruiz Pessenda (“Reconstrução da vegetação e clima desde o Holoceno Médio no Brasil”- FAPESP 07/03615-5), visa especificamente, elaborar uma coleção de referência de fitólitos extraídos das plantas representativas da Floresta Ombrófila Densa das Terras Baixas – Mata de Tabuleiro (Bioma da Mata Atlântica).

2. Metodologia de Trabalho As 39 espécies selecionadas para este trabalho pertencem a 14 famílias, elas são algumas das mais representativas da Floresta Ombrófila Densa das Terras Baixas, predominante na região sudeste do Brasil. As amostras foram coletadas na Reserva Natural da Vale – RNVALE, situada em Linhares, norte do Estado do Espírito Santo. Para esse trabalho as amostras coletadas foram identificadas e 86

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classificadas pelo Parabotânico Geovani Seiqueira (VALE) e em seguida foram lavadas, secas e embaladas para o transporte até o laboratório. 2.1.Extração de Fitólitos A extração foi realizada no Laboratório de Estudos de Fitólitos da UNIOESTE, Campus Marechal Cândido Rondon, adaptando os procedimentos preconizados por Campos e Labouriau (1969) e por Piperno (2006), que consiste em: lavagem do material vegetal em lavadora ultrassônica por 15minutos; secagem em estufa a 75ºC por uma noite; pesagem da massa seca; calcinação por 4 horas a 400ºC em mufla; adição de uma solução de ácido clorídrico (HCl) a 5N e deixar fazer a digestão em placa aquecedora por 15 minutos para eliminar os carbonatos presentes nas cinzas do tecido vegetal carbonizado; lavagem das cinzas passando o material em filtro e lavagem com água destilada até total eliminação do HCl; segunda calcinação em mufla durante 6 horas a 600ºC. Todas as amostras após serem retiradas da mufla foram pesadas novamente para obtenção do peso final do material residual que contém os fitólitos (cinzas), e armazendos s em frascos de vidro de 5 ml identificados com o número/código e o nome da amostra. 2.2. Contagem, Identificação e Classificação dos Fitólitos Após a extração lâminas temporárias (com óleo de imersão) foram feitas para a contagem dos fitólitos conforme Carnelli et al. (2002). A identificação e classificação taxonômica seguiram o Código Internacional de Nomenclatura de Fitólitos – ICPN 1.0 (Madella et al 2005). Os morfotipos foram fotografados em microscópio, com magnificação de 63X e medidos em μm. 3. Resultados A análise do material residual (cinzas) obtidos das 23 espécies amostrada nos estratos herbáceo e arbustivo da floresta Ombrófila Densa, pertencentes as famílias Poaceae, Cyperaceae e Pteridophyteae, Arecaceae e Marantaceae, revelou que todas as espécies, independentemente da quantidade, são produtoras de fitólitos identificáveis (Tabela 1). Algumas espécies apresentaram uma maior diversidade de morfotipos como é o caso das Cyperaceas e as Poaceae (Figura 1). De modo geral todas as famílias produziram uma boa quantidade de cinzas (Tabela 1) Contudo, convém salientar que a produção de cinza não significa a produção de fitólitos. A cinza é o resíduo final da queima das folhas da planta e nem todas as plantas são produtoras de fitólitos, como se pode observar pela produção de fitólitos por espécies deste trabalho (Tabelas 1 e 2). Observou-se também que entre as Pteridophytae, a espécie Adianthum Sp.A apresentou muitos esporos na lâmina e uma produção média de fitólitos, diferentemente da espécie Adianthum Sp. B. que não apresentou esporos e o número de fitólitos produzidos foi considerado abundante (>300 fitólitos por lâminas). Entre as espécies de Arecaceae a espécie Attalea humilis foi a única a apresentar uma produção média de fitólitos, em todas as demais a produção foi 87

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abundante (Tabela 1), o morfotipo globular echinate 3, assim como na literatura corrente, foi identificado como o morfotipo diagnóstico desta família. Variações foram observadas quanto a cor, tamanho e grau de esfericidade deste morfotipo diagnóstico. Estas características e suas variações estão sendo estudas pelo grupo para entender o significado taxonômico e ambiental das espécies e assim diferenciar tanto em nível de espécie (taxonomia) quanto o ambiente os diferentes morfotipos globulars echinate encontrados em registros fóssies. As amostras de algumas espécies foram separadas em partes (folha, talo, semente, flor e rais) para a extração de fitólitos, a emxemplo da espécie Olyra latifólia (Poaceae) e Cyperus distatus (Cyperaceae). A primeira não apresentou diferença significativa na produção de fitólitos sendo classificada como média tanto na folha como no talo. Na Cyperus distatus a produção foi abundante nas folhas e raízes e média nas demais partes (Tabela 1). De modo geral as espécies de Cyperaceae são reconhecidas na literatura como grandes produtoras de fitólitos (Piperno, 2006), como confirmado nas três espécies analisadas. No estrato arbóreo, foi realizada a extração somente das folhas de 16 espécies, embora se tenha material lenhoso amostrado. Este material será analisado em uma próxima etapa do projeto De modo geral, a produção entre as espécies sintetizadoras de sílico foi muito variada, quatro espécies não produziram morfotipos de fitólitos identificáveis, uma espécie teve sua produção classificada como pouca, três como média e quatro abundantes (Tabela 2). Tabela 1: Produção de fitólitos pelas espécies dos estratos herbáceo e arbustivos da Floresta Ombrófila Densa das Terras Baixas (Mata de Tabuleiro), município de Linhares (ES). % da Produção Partes da Família Nome científico Nome vulgar Massa de Planta* Seca fitólitos** Arecaceae

Astrocaryum aculeatissimum Brejaúba

5.89

●●●

Allagoptera arenaria

Purunã

F

0.64

●●●

Attalea humilis

Pindoba

F

1.64

●●

Bactris bahiensis

Ouricana

F

2.81

●●●

Bactris caryotifolia

Tucum-branco

F

2.95

●●●

Bactris vulgaris

Airi-mirim

F

0.19

●●

Geonoma rodienses

Aricanga marrom avermelhada

F

4.33

●●●

Geonoma elegans

Aricanguinha

F

6.04

●●●

F

0.76

●●●

Polyandrococos caudescens Palmito-amargo

Bromeliaceae

F

Euterpe edulis

Palmito-juçara

F

0.01

●●●

Tillandsia usneoides

Barba-de-velho

F

0.04



3

A nomenclatura dos morfotipos foi mantida em inglês por ainda não haver uma tradução oficial para o português.

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F

2.69

●●●

T

1.95

●●

R

1.52

●●●

S/Fl

1

●●

F

1.57

●●●

Fl

6.45

●●●

Eleocharis interstctas

F

4.49

●●●

Eleocharis sp.

F

3.87

●●●

Bombacaceae Eriotheca macrophylla Cyperaceae

Imbiruçu

Cyperus distatus

Bequeria cimosa

Marantaceae

Calathea

Caethé Roxeada

F

0,44

●●●

Maranta subterranea

Caethé Rasteira

F

0,47

●●●

F

3

●●

T

6.85

●●

F

1.05

●●

F

5.51

●●●

Poaceae Olyra latifólia Pteridophytae Adianthum sp. A Adianthum sp. B

Samanbaia-preta

* Produção de fitólitos: ausência (+)Rara: < 10 fitólitos a cada três linhas por lâmina (-); Pouca: 10 – 100 (●); Média: 100 – 300(●●); Abundante: >300 (●●●). ** F=folha; Fl=flores; R=raízes; T= talos e S=sementes

A maior porcentagem de cinza dentre todas as espécies desse estrato foi recuperada da Sorocea guillermiana, membro da família Moraceae, isto é, 2,55% da massa inicial. As demais espécies que apresentaram valores elevados foram a Rinorea brasiliensis (Violaceae) 1,87%, a Pterygota brasiliensis (Sterculiaceae) 1,34% e a Carpotroche brasiliensis (Flacourtiaceae) 1,55% da massa seca. Pela Tabela 3 é possível observar que existe variação intra e entre famílias. As demais espécies produziram
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