Valores Civilizatórios das Políticas de Ações Afirmativas para o Desenvolvimento Humano

June 13, 2017 | Autor: Bas' Ilele Malomalo | Categoria: População Negra
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Título: Valores Civilizatórios das Políticas de Ações Afirmativas para o Desenvolvimento Humano1

Autor: Bas´Ilele Malomalo, nascido na República Democrática do Congo, é Filosofo, Teólogo, Mestre em Ciências da religião – Área de concentração Ciência sociais, e Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Sociologia pela Unesp; pesquisador do Centro de Estudos das Culturas e Línguas Africanas e da Diáspora Negra da UNESP (CLADIN) e Secretário Diretor Geral do IDDAB – Instituto do Desenvolvimento da Diáspora Africana no Brasil.

Resumo

O autor busca contextualizar o debate sobre as políticas de ações afirmativas para negros na sua relação com a temática do desenvolvimento humano. Pretende identificar, a partir da sua experiência do ensino das africanidades e da sua investigação sobre programas de promoção da diversidade e de igualdade racial, os princípios ético-políticos que essas ações veiculam. A tese do autor é que, apesar das contradições históricas atreladas às políticas de ações afirmativas em curso no país, elas devem e vêm sendo construídas no horizonte da ética do cuidado que se assenta nos valores de humildade, compaixão, solidariedade, responsabilidade, igualdade e reconhecimento do outro. Estes valores são vistos como fonte de sustentabilidade de uma sociedade em crise e de reinvenção de uma nova civilização brasileira.

Palavra-chaves: Valores, Educação, Africanidades, Desenvolvimento humano.

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Texto publicado pelo Programa das Nações Unidas pelo Desenvolvimento (PNUD) – Série de Textos de Apoio ao Relatório do Desenvolvimento Humano Brasileiro 2009/2010 : Mostra Seu Valor. Disponívem em: http://www.mostreseuvalor.org.br/publicacoes/index.php?pagina=4. Acessado em 5 de jul. 2011.

Título: Valores Civilizatórios das Políticas de Ações Afirmativas para o Desenvolvimento Humano

Introdução

O título desse artigo, Valores Civilizatórios das Políticas de Ações Afirmativas para o Desenvolvimento Humano, não é mera retórica acadêmica. Foi colocado com o único objetivo de responder à demanda do PNUD e de seus parceiros, quanto a necessidade de se organizar um espaço de reflexão sobre o tema de “Valores”, com ênfase nas questões de “educação” e “violência”.

Como é sabido, parte dessas reflexões provenientes dos intelectuais, dos acadêmicos e ativistas dos movimentos sociais, há de compor o Relatório de Desenvolvimento Humano (RDH). Além disso, o PNUD e seus parceiros, ao proceder dessa forma, após a promoção da Campanha Brasil Ponto a Ponto que escutou mais de um milhão de pessoas em todo Brasil para a escolha do tema do RDH, mais uma vez fez uma opção radical pelo uso da metodologia participativa, vista pelos defensores do paradigma do desenvolvimento alternativo (PNUD, 2005; FAVREAU, 2002; 2004; LÉVESQUE, 2001; 2002) como uma prática democrática no enfrentamento dos problemas que atolam a humanidade.

O tema escolhido democraticamente faz parte da minha vivência de pesquisador, educador e ativista social. Gostaria de abordá-los a partir da problemática das ações afirmativas pelo fato de ser um dos assuntos mais discutidos no país, mas que, infelizmente, a mídia dominante esvaziou-o de conteúdo e desviou-se da atenção que merece pela sua estratégia de reduzi-lo a um mero problema de cotas.

Ademais, esse tema desde a abolição da escravatura se tem apresentado em termos de integração do negro na sociedade de classe (FERNANDES, 1965; 1968). O que os abolicionistas estavam discutindo de fato era o acesso do negro à educação, à terra e ao mercado de trabalho (NABUCO, 2000), ou seja, à sua cidadania plena. Dessa forma, a abolição e as políticas públicas subseqüentes propostas pelos abolicionistas visavam, naquele período, nada mais do que a redenção do negro da violência do sistema colonial e escravagista. Porém, a vitória dos militares, coronéis e fazendeiros

na fundação da República significou o aborto daquele projeto tido na época como libertador, para a implementação de um projeto capitalista cego às diferenças e desigualdades sociais e étnico-raciais. O resultado dessa opção política foi e tem sido a permanência das desigualdades, que nos autoriza a dizer que a população negra brasileira se encontra na situação de subdesenvolvimento, pois o racismo, a discriminação, as desigualdades, a pobreza e a miséria incidem de uma forma brutal, e desumana em termos de violência física e simbólica no meio negro (PNUD, 2005; SILVA & SILVÉRIO, 2003). Os conceitos de “valores” e “educação”, mais do que o da “violência”, estão presente nessa minha reflexão. Cabe aqui precisar a partir de qual abordagem teórica. O primeiro conceito encontra-se nas entrelinhas da discussão que faço do ponto de vista da categoria da “ética”. Devo muito à “ética do cuidado” de Leonardo Boff (1999; 2000; 2003; 2009), e da filosofia africana e dos africanistas do mundo. O conceito da educação é tratado no sentido mais amplos, envolvendo os espaços de aprendizagem formais, conhecidos como “escolas”, e informais. Por isso, os sujeitos com quem estabeleço o diálogo sobre as africanidades são chamados de “meus alunos” e “interlocutores”. São sujeitos da periferia e do centro, das academias, dos movimentos sociais, populares, e das igrejas. Portanto, implicitamente falando, são cientistas da educação como Paulo Freire (1994), Edgar Morin (1999), e os pesquisadores e ativistas afro-brasileiras como Luiz Alberto Gonçalves e Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (2001; 2003), Nilma Gomes (2006), que alimentam esse conceito. Educar, nesse contexto das africanidades, significa um ato comunitário. Quer dizer, parafraseando Paulo Freire, ninguém se educa sozinho, educamo-nos uns aos outros. E a educação significa aqui, retomando Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva (2003; 2005), saber conduzir a sua própria vida com, dentro e para com a comunidade. Isto é saber fazer criticamente uso dos valores civilizatórios de sua comunidade para o bem de todos..

Só a partir desses conceitos abertos à complexidade que consigo estabelecer um diálogo entre a ética, a educação e o multiculturalismo. Aliás, é essa última categoria que me possibilita tratar as políticas de ações afirmativas como políticas públicas processadas em diversas áreas da sociedade. Boff (2003), como teólogo e cientista da religião como eu, possibilita-me estender a ligação entre os assuntos profanos aqui abordados até o campo da espiritualidade. Dessa forma, a sua concepção holística da ética corresponde com a concepção africana e dos africanistas sobre o cuidado que se deve ter para a salvação da humanidade.

A minha hipótese consiste em considerar que, como práticas sociais, as ações afirmativas veiculam

valores suscetíveis de serem identificados, refletidos e usados para a reinvenção da nossa civilização em crise. Para muitos estudiosos do desenvolvimento, como Glauco Arbix e Mauro Zilbovinicius (2001) no seu artigo, Por uma estratégia de civilização, essa tarefa passa pelo uso político e responsável do paradigma do desenvolvimento humano proposto por Amartya Sen (2000), PNUD (2005). Concordo com eles, mas ao mesmo tempo, faço observar que num país onde a população negra compõe a maioria da população2, este novo paradigma deve levar em conta a dimensão étnico racial (PAIXÃO, 2003; THEODORO, 2008). As organizações do poder público, do setor privado e da sociedade civil que têm implementado as políticas de ações afirmativas e cotas trabalham com essa mesma suposição.

Para compor o meu argumento, fundamento a minha reflexão sobre as publicações que retratam as políticas de ações afirmativas em curso no país, e uso da minha própria experiência de pesquisador desse tema, e professor da história e cultura afro-brasileira. A sociologia reflexiva (BOURDIEU, 2001) ou a antropologia interpretativa (GEERTZ, 1989 ) é o meu instrumento de análise. Como a ética é, sobretudo, o plano do “dever ser”, o “ser”, que é o mundo da política, em muitos casos se choca com ela. Todavia, tomo cuidado para não deixar o meu leitor perdido. Por isso, divido essa minha reflexão em três momentos. No primeiro faço uma reflexão sobre a diferença entre moral e a ética; ressalto a minha opção pela ética do cuidado vista como a fonte dos princípios, valores que nascem do afeto e da razão humana. No segundo momento, analiso o conceito da ética no âmbito do debate do multiculturalismo e do desenvolvimento humano. E é nesse terreno que se situa também o debate sobre ações afirmativas. No terceiro, busco identificar os valores civilizatórios emergentes da política das ações afirmativas para negros no Brasil para sustentar a minha hipótese.

Ética do cuidado: irradiação do afeto e da razão

O que diferencia a moral da ética? Começo pelo o que entendo por ética. Na busca do significado da ética, o teólogo da libertação, Leonardo Boff, começa por estabelecer a diferença entre esse conceito com o de moral. “A ética é um conjunto de valores e princípios, de inspirações que valem para todos, pois estão ancorados na nossa própria humanidade” (BOFF, 2003: 11). Esses princípios tendem a ser universais.

2 Conforme IPEA, em 2007 os negros representavam 49,8% da população, contra 49,4%; no grupo masculino entre jovens, os negros representavam 51,1%, contra 48,1% dos brancos (PINHEIRO, 2008).

Antes de me envolver com a ética, quero tratar da sua diferença com a moral. Vou ainda me apoiar em Boff (2003, p. 13) para quem se a ética significa a forma de se cuidar da “morada humana”, a moral sinaliza as formas e os diferentes estilos de se organizar a casa. Isso depende de cada cultura que é sempre diferente da outra.

Um indígena, um chinês, um africano vivem do seu jeito o amor, o cuidado, a solidariedade e o perdão. A esse jeito diferente chamamos de moral. Formalizando, podemos dizer: a moral é um conjunto concreto de preceitos e normas que organizam a vida das pessoas, das comunidades e das sociedades e, hoje, da comunidade planetária. Ética, existe uma só para todos. Moral, existem muitas, de acordo com as maneiras diferentes como os seres humanos organizam a vida (BOFF, 2003, p. 13).

Boff (2003) dá um exemplo para ilustrar a sua afirmação citando um princípio: importante na vida é ter uma casa (ética). O estilo e a maneira de construí-la pode variar (moral). Conforme ele, essa casa pode ser simples, rústica, moderna, colonial, gótica, contanto que seja casa habitável. A moral tem a ver com os costumes, hábitos das pessoas e dos povos. É a prática dos princípios éticos das coletividades pelos seus cidadãos.

No plano filosófico, pode se dizer que a ética tende a ser mais teórica do que a moral, que é prática. Boff não analisa essa questão com atenção, como faz Jacqueline Russ para quem a ética é uma reflexão sobre a moral, isto é, os costumes, hábitos e tradições dos povos.

O que designa a ética?Não uma moral, a saber, um conjunto de regras próprias de uma cultura, mas uma 'metamoral', uma doutrina que se situa além da moral, uma teoria raciocinada sobre o bem e o mal, os valores e os juizes morais. Em suma, a ética desconstrói as regras de conduta, desfaz suas estruturas e desmonta sua edificação, para se esforçar em descer até os fundamentos ocultos da obrigação (RUSS, 1999, P.8).

É nesse plano que se situa a abordagem de Jürgen Habermas (1994; 2007) sobre a ética, tratada como conjunto de normas que emerge do processo do diálogo argumentativo na esfera pública. São esses princípios racionais que permeiam os Estados constitucionais democráticos. A ética nessa perspectiva, é vista como uma ação reflexiva de um sujeito autônomo. É uma das característica do sujeito moderno.

Essas concepções da ética merecem algumas explicações. Primeiro, dizer que a humanidade é fonte da ética significa e que a ética é uma construção histórica. Diferente de Jürgen Habermas (1994) que reduz essa fonte na “razão comunicativa”, Boff (2003) entende que para além dessa faculdade há também o “afeto”. Este para ele é a fonte originária da ética. Este é o universo do não-racional

que comporta os elementos vitais como “inteligência emocional”; o amor; a paixão. “Pela paixão captamos o valor das coisas. E o valor é o caráter precioso dos seres, com tudo o que os torna dignos de serem e os faz apetecíveis. Só quando nos apaixonamos vivemos valores. E é por valores que nos movemos e somos” (BOFF, 2009, p. 30).

A partir desses pontos passo a desenvolver a segunda explicação relativas a valores e princípios. Se são eles que nos movem, pode se dizer que a “razão burguesa” que fundamenta a ética capitalista está na base da crise que a humanidade enfrenta hoje. Habermas vê essa ética como portadora de uma “razão instrumental”; aquele que tem por meta só dominar o outro a custo do seu próprio lucro. Contra esse modelo, e outros como a “razão estrategista” dos políticos que visa só o poder, Habermas sugere uma “razão comunicativa”.

[...] a atividade comunicativa se compreende no seio de uma intercompreensão, que visa um entendimento e uma adesão entre parceiros. Nesse último caso, os parceiros procedem argumentando e esta argumentação pressupõe a imparcialidade, a responsabilidade dos interlocutores, o caráter sensato de seu discurso etc. Em suma, a autêntica discussão é consensual e tem relações só com a razão, não com a ameaça: apoia-se na força, desprovida de violência, do discurso argumentativo (RUSS, 1999, p. 92-93).

Em outras palavras, a razão argumentativa tem por base o diálogo na esfera pública para a resolução de problemas concretos da sociedade. Para se chegar ao consenso, Habermas sugere o respeito das normas da comunicação entre outras: a eqüidade; responsabilidade; engajamento nos compromissos assumidos. Entre as críticas que Habermas tem recebido encontra-se a da supervalorização da “comunidade dos interlocutores”, esquecendo-se que a comunicação como ação histórico-social é um ato de força que pode se manifestar de uma forma consciente ou inconsciente. Comunicação é poder (MÉSZÁROS, 2004; BOURDIEU, 2002). Os interlocutores, mesmo nas nações com longas tradições democráticas, não entram no jogo da comunicação inocentemente; são sujeitos históricos que carregam suas histórias de vida, seus interesses e tradições seculares e religiosas (NTUMBA, 1985). São sujeitos movidos as vez pela verdade ou pela falsidade, pela razão ou pela paixão, pelo amor, pela fé, pela espiritualidade (BOFF, 2009).

É nesse ponto que Boff acha que o que os defensores da ética racional têm esquecido é o afeto. Quer dizer a busca da “justa medida” entre as duas dimensões antropológicas da humanidade.

Eis que surge uma dialética dramática entre paixão e razão. Se a razão reprimir a paixão, triunfa a rigidez, a tirania da ordem e a ética utilitarista. Se a paixão dispensar a razão, vigora o delírio das pulsões e a ética hedonista, do puro gozo das coisas. Mas, se vigorar a justa medida, e a paixão se servir da razão para um autodesenvolvimento regrado, então emerge as duas forças que sustentam uma ética promisso: a ternura e o vigor (BOFF, 2009, p. 31).

Boff está trabalhando com a epistemologia da complexidade defendida pelos outros autores como Boaventura de Sousa Santos e João Arriscado Nunes (2003) e Edgar Morin (1999). O primeiro fala de uma razão cosmopolita como aquela que reconcilia a razão e a emoção; e segundo defende uma ética humanamente planetária que tem por base a razão e a consciência. Para estes autores, esse seria o caminho do resgate da humanidade da sua crise atual, que deve se fazer pela reconciliação do ser humano consigo mesmo, com o meio ambiente, com o cosmos e com o divino.

Nessa mesma perspectiva, Boff (2009, p. 31-32) vê na ternura (afeto) e no vigor (razão) a irradiação da ética para a salvação da humanidade. Para ele, a ternura é o cuidado com o outro, o gesto amoroso que protege e confere paz. O vigor abre caminhos, supera obstáculos e transforma sonhos em realidade. É a contenção sem a dominação, a direção sem a intolerância. Ternura e vigor constroem uma personalidade integrada, capaz de manter unidas as contradições e se enriquecer com elas. São os dois princípios capazes de apoiar um humanismo sustentável, fundado na materialidade da história e na espiritualização das práticas humanas. Essa ética é vista por Boff e por mim como a ética do cuidado.

Ética do multiculturalismo para o desenvolvimento humano

Os princípios éticos têm por finalidade a sustentabilidade da comunidade, da humanidade que as constrói. Há uma certa reciprocidade: o ser humano produz normas para se auto-preservar. E sabemos que a sustentabilidade hoje implica também o cuidado com o planeta. Por isso, na busca do significado da ética, Boff (2009) reporta-se à etimologia do termo: ethos significa casa, morada. Ética significa “morada humana”. Para que ela seja suportável, pressupõe-se a harmonia dos que lá moram; construção e respeito dos princípios fundamentais.

Tratado do ponto de vista das teorias do multiculturalismo, a ética é a busca do estabelecimento- de princípios que valorizam a vida. Pondera Habermas: “Por “ética” quero dizer todas as questões relacionadas com a concepções de vida boa, ou uma vida que não é esbanjada” (1994, p. 140).

As lutas dos movimentos étnicos e feministas da metade do século XX trouxeram novidades no

campo da questão multicultural. De um lado, conseguiram que as questões de identidades saíssem do mundo do privado para ser debatidas na esfera pública como problemas ético-políticos nacionais a serem resolvidos pelos cidadãos conforme as regras dos Estados constitucionais democráticos (HABERMAS, 1994; 2002). De outro lado, fizeram com que os direitos culturais sejam hoje tratados ao lado dos direitos civis, políticos, econômicos, sociais como direitos fundamentais.

Os estudos de Santos (2003), baseados nas lutas dos movimentos sociais da alterglobalização, apresentam as novidades trazidas pelo multiculturalismo emancipatório com foco nessas cinco teses:

Tese 1: Diferentes coletivos humanos produzem formas diversas de ver e de dividir o mundo, que não obedecem necessariamente às diferenciações eurocêntricas como, por exemplo, a que divide as práticas sociais entre a economia, a sociedade, o Estado e a cultura, ou a que separa drasticamente a natureza da sociedade. Está em curso uma reavaliação das relações entre essas diferentes concepções do mundo e as suas repercussões no direito e na justiça. (2003, p. 60) Tese 2: Diferentes formas de opressão ou de dominação geram formas de resistência, de mobilização, de subjetividade e de identidade coletivas também distintas, que invocam noções de justiça diferentes. Nessas resistências e em suas articulações locais/globais reside o impulso da globalização contra-hegemônica. (2003, p. 61) Tese 3: A incompletude das culturas e das concepções da dignidade humana, do direito e da justiça exige o desenvolvimento de formas de diálogo (a hermenêutica diatópica) que promovam a ampliação dos círculos de reciprocidade. (2003, p. 62) Tese 4: As políticas emancipatórias e a invenção de novas cidadanias jogam-se no terreno da tensão entre igualdade e diferença, entre a exigência de reconhecimento e o imperativo da redistribuição. (2003, p. 63) Tese 5: O sucesso das lutas emancipatórias depende das alianças que os seus protagonistas são capazes de forjar. No inicio do século XXI, essas alianças têm de percorrer uma multiplicidade de escalas locais, nacionais e globais e têm de abranger movimentos e lutas contra diferentes formas de opressão (2003, p. 64).

Quero insistir na quarta tese. O que se vê é que, dentro da discussão do multiculturalismo, o foco não está mais só na questão de política de reconhecimento ou de identidade cultural, mas fala-se também da política redistributiva, isto é, do acesso à terra, ao mercado de trabalho, a produção dos bens econômicos.

Dois princípios éticos têm dominado o debate multicultural: o da justiça e igualdade. Para não cair no esquizofrenismo teórico e prático, Santos e Nunes (2003, p. 63) alertam: “As políticas emancipatórias e a invenção de novas cidadanias jogam-se no terreno da tensão entre igualdade e diferença, entre a exigência de reconhecimento e o imperativo da redistribuição”. A busca do

equilíbrio entre a questão de classe e de não classe: cultura, raça e gênero, identidade e distribuição, para Boaventura de Souza Santos (2003), deve marcar as práticas multiculturais: “Temos o direito de ser iguais quando a diferença nos inferioriza, temos o direito de ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza”.

Na mesma perspectiva, o que se observa nesse debate é a reciprocidade entre o campo ético-moral e o campo político-jurídico. O que incomoda, muitas vezes, é que os atores sociais envolvidos na questão multicultural ficam num só pólo. É oportuno dizer para a eclosão de um multiculturalismo libertador, além do reconhecimento da dimensão constitucional da questão multicultural no Brasil, ela deve ser debatida numa ótica dos valores também. Pois, só desse ponto de vista é que poderíamos juntos começar a pensar nas possibilidades de uma nação justa e igualitária. Ver as ações afirmativas só como uma questão de “meu direito”, “nosso direito”, talvez deixe escapar outras questões importantes para uma reflexão e uma política emancipatória.

Dessa forma, é preciso alertar que as políticas de ações afirmativas não se confundem com as políticas de cotas (BULGARELLI, 2006), pois estas são uma de suas modalidades históricas. Mas o que realmente representam? A maioria dos estudiosos desse assunto concorda que as são primeiro políticas públicas (THEODORO, 2008; PAIXÃO, 2006; SANTOS e LOBATO, 2003). Para Helio Santos, escrevendo no contexto brasileiro:

A ação afirmativa é uma iniciativa pública cujo objetivo principal é adotar medidas que reparem e compensem os grupos que sofreram no passado perdas em razão de abusos de quaisquer tipos [...] cuida de reparar prejuízos acumulados ao longo do tempo. Isso se dá mediante o estabelecimento de uma efetiva igualdade de oportunidades; o que já sabemos ser possível somente pela adoção da eqüidade, sob pena de operarmos com um sofisma (2001, p. 336).

Para Helio Santos, essa definição comporta três partes de uma ação afirmativa: (1) Esse tipo de medida não cuida só dos efeitos da discriminação racial. Ela pode contemplar as mais diferentes categorias: mulheres, idosos, etc. Ditas em outras palavras: As políticas de ações afirmativas são medidas que buscam garantir a oportunidade de acesso dos grupos discriminados, ampliando sua participação em diferentes setores da vida econômica, política, institucional, cultural e social. Elas se caracterizam por serem medidas temporais e por serem focalizadas nos afro-brasileiros, ou seja, por dispensarem um tratamento diferenciado e favorável com vistas a reverter um quadro histórico de discriminação e exclusão (JACCOUD & BEGHIN, 2002, p. 56).

(2) A ação afirmativa não se limita a “políticas de cotas”, como ficou conhecida no Brasil. Pois,

para Helio Santos, a expressão “cotas” sinaliza um percentual – 10%, 20%, etc. – e passa uma idéia de obrigação, espécie de “reservas de mercado” (2001, p. 337). Deslocadas de seu contexto histórico marcado pela sua ligação com ações afirmativas, de seus princípios éticos e de suas finalidades que é o desenvolvimento das populações beneficiárias, cotas tornam-se “meras metas numéricas” afirma Jacques D`Adesky (2001, p. 12). Voltando no Hélio Santos. (3) As políticas de ações afirmativas não são eternas. A reparação que se busca fazer deve cumprir um tempo suficiente para que as oportunidades passem a ter um curso de efetiva igualdade (HELIO, 2001, p. 336-337). Todavia, no entendimento de Jaccouud e Beghin (2002, p. 56), quando aplicadas como ações valorativas, elas não têm um caráter nem temporário, nem focal. Nesse sentido as políticas e as ações valorizativas possuem caráter permanente e não focalizado. Seu objetivo é atingir não somente a população racialmente discriminada – contribuindo para que ela possa reconhecer-se na história e na nação -, mas toda população, permitindo-lhe identificar-se em sua diversidade étnica e cultural. As políticas de informação também serão aqui identificadas como ações valorizativas (JACCOUD & BEGHIN, 2002, p. 56).

Vistas a partir das ciências jurídicas, defendendo a sua constitucionalidade, Joaquim Barbosa Gomes (2003, p. 21) define as políticas de ações afirmativas com essas palavras: As ações afirmativas se definem como políticas públicas (e privadas) voltadas à concretização do princípio constitucional da igualdade material e à neutralização dos efeitos da discriminação racial, de gênero, de idade, de origem nacional e de compleição física. Na sua compreensão, a igualdade deixa de ser simplesmente um princípio jurídico a ser respeitado por todos, e passa a ser um motivo constitucional a ser alcançado pelo Estado e pela sociedade.

Na literatura brasileira, quando se fala de ações afirmativas como políticas públicas, o “público” tende a se reduzir à ação do Estado. Joaquim Barbosa Gomes, ao colocar “e privadas” entre parêntese subentende que a “esfera pública” da realização das ações afirmativas não é só do apanágio do Estado. Posteriormente, na republicação do mesmo artigo, ele se desfaz dos parênteses, reconhecendo que são “políticas públicas e privadas” (GOMES, 2005), isto é, ações da responsabilidade do Estado, da sociedade civil e do setor privado.

Outra característica das ações afirmativas é tratá-las como políticas públicas focadas ou particularistas contra as desigualdades raciais, voltadas para a promoção da igualdade racial no Brasil (SANTOS e LOBATO, 2003) ou, melhor, étnico-racial. Tais políticas, para promover o desenvolvimento sustentável das populações beneficiadas, precisam ser combinadas com as

universais, pois nenhuma das modalidades é absoluta; cada uma comporta suas limitações (PAIXÃO, 2005; D´ADESKY, 2001).

Ademais, faço minha as idéias de Marcelo Paixão em relação às “Políticas sociais e a superação das desigualdades raciais no Brasil”, mas quero destacar que entendo que as políticas de ações afirmativas não se limitam somente às políticas sociais. Cobrem também as de cunho econômico, o mercado de trabalho, as ações das empresas (INSTITUTO ETHOS, 2006). Para Paixão (2006, p. 132): “As políticas de ação afirmativa estão fundamentadas em um princípio ético que, buscando a superação das desigualdades (sociais, raciais, étnicos, de gênero, de outras minorias), defende a hipótese da concessão de tratamento desigual a pessoas socialmente desigual”. Os dois princípios éticos mais conhecidos que orientam o debate sobre as ações afirmativas são: o reconhecimento da igualdade e da eqüidade. De modo geral, a igualdade tende a ser um conceito disciplinar das ciências políticas e jurídicas (BOBBIO, 1997; SILVA JÚNIOR, 2002; GOMES, 2003). Assim, referindo-se à “igualdade material” ou “de resultados”, Joaquim Barbosa Gomes (2003, p. 40) escreve: “Vê-se, portanto, que a Constituição Brasileira de 1988 não se limita a proibir a discriminação, afirmando a igualdade, mas permite, também, a utilização de medidas que efetivamente implementam a igualdade material”.

Esse é também o entendimento de Hédio Santos Júnior. Na sua perspectiva, a igualdade passa a ter o sentido da justiça distributiva.

Por fim, não podemos deixar de mencionar o fato de que, ao consignar o princípio da promoção da igualdade, o sistema constitucional brasileiro resgata e positiva o princípio aristotélico de justiça distributiva segundo o qual, justiça implica necessariamente tratar desigualmente os desiguais, ressalvando que tratamento diferenciado não se presta a garantir privilégios, mas sim possibilitar a igualização na fruição de direitos (SILVA JÚNIOR, 2002, p. 124).

A teoria marxista seria responsável pela crítica em relação à visão dogmático-legalista da igualdade propostas pelas teorias liberais do direito e da política.

A noção da igualdade material ou

“igualdade substantiva” bebe daquela teoria. Apesar de reconhecer o mérito da visão marxiana em introduzir a categoria de igualdade material ou substantiva contra as desigualdades sociais, os estudiosos das relações raciais reconhecem ao mesmo tempo suas limitações em dialogar com a categoria raça. Para superar essas lacunas, os autores pós-marxistas têm trabalhado com o binômio

“raça e classe”, ou trinômio “raça, classe e gênero”. Parafraseando Marcelo Paixão (2003, p. 143144), diria que para se entender a discriminação sofrida pelos negros e mulheres no mercado de trabalho precisa-se recorrer a outros fatores extra-econômicos, tal como a questão de identidade social e racial. É nesse sentido que os estudos das relações raciais e do multiculturalismo se tornam úteis para a análise da igualdade material, numa lógica focal, no contexto da dinâmica das relações interraciais. Vista do ponto a partir do quadro teórico das ações dos movimentos anti-racistas do pensamento tradício-comunitarista e particularista estudado por André-Pierre Taguieff – que se opõe ao pensamento indivíduo-universalista liberal –, pode se afirmar com Jacques D´Adesky (2001, p. 231) que a igualdade material tratada em termos de eqüidade remete à concepção de uma justiça social baseada no princípio da “igualdade de oportunidade”, ou seja, “[a]ceita-se o tratamento diferencial a membros de certas coletividades, pois se considera que este não produz forçosamente a desigualdade, enquanto o tratamento idêntico para todos pode provocar graves disparidades entre indivíduos”. A eqüidade, para D´Adesky (2001, p. 232-233), supõe critérios de igualdade mais exigentes: “Ela é algo mais que a igualdade, na medida em que tem por conseqüência tornar mais concreta a igualdade de oportunidade entre indivíduos e pelo fato de atenuar a má percepção que as pessoas ou a sociedade têm de determinado grupo cultural ou comunidade étnica”. Em outras palavras: A eqüidade, compreendida como valor que orienta a política pública, corresponde à necessidade de favorecer condições de oportunidades iguais e não de fomentar situações que reproduzam ou reforcem as desigualdades. A partir daí, a eqüidade torna-se uma forma de gestão que exige tomar em conta não apenas o contexto social e histórico, mas também as necessidades particulares de certos grupos (D´ADESKY, 2001, p. 233).

Outro princípio ético que norteia o debate sobre as ações afirmativas é de responsabilidade. A concepção da ética da responsabilidade social dos intelectuais ligados aos SEBRAE e Ignacy Sachs traz uma das visões mais compartilhadas entre os pensadores do desenvolvimento alternativo: “A responsabilidade social leva a assumir claramente a opção pelos fracos, os sem poder e sem voz, na sua imensa maioria também pobres” (SACHS, 2003, p. 67-68). Sabemos que a maioria de pobres brasileiros são negros. Os intelectuais negros que renovaram a teologia da libertação têm afirmado que os negros na América Latina são os “pobres entre os mais pobres”.

Votando em Ignacy Sachs, devo destacar que algo admirável nele é a sua concepção de promoção do desenvolvimento visto a partir das populações brasileiras fracas e pobres.

O sucesso na promoção do desenvolvimento será medido pelo tempo necessário para que todos eles [os fracos e pobres] possam aceder à cidadania plena, ao exercício do conjunto dos seus direitos não apenas políticos, civis e cívicos, mas também econômicos, sociais e culturais - entre estes o direito ao trabalho digno -, enfim, os direitos coletivos ao desenvolvimento, ao meio ambiente e à infância (SACHS, 2003, p. 68).

Para os intelectuais ligados aos SEBRAE e Ignacy Sachs, a responsabilidade social como uma postura ética na prática do desenvolvimento é a busca do equilíbrio entre os seus três eixos: o social, o econômico e o ambiental. É essa ética do cuidado, para Leonardo Boff (1999), que levaria para um desenvolvimento sustentável.

Situado no contexto dos estudos das relações raciais, Paixão alerta:

É importante salientar que as medidas de promoção da cidadania da população afrodescendente somente poderão ser eficazes em um cenário de superação do atual modelo econômico, que, excessivamente atrelado às exigências da estabilidade monetária, acaba freando o ritmo de crescimento da economia e encolhendo os gastos sociais PAIXÃO, 2005, p. 133).

Apesar das contradições históricas e ideológicas de suas políticas macro-econômicas do desenvolvimento nacional dos governos de FHC e Lula, deve-se reconhecer que foram eles a introduzir um pensamento de reconciliação do crescimento com o desenvolvimento econômico e social nacional. Nos governos Lula essa questão vêm ficando mais clara apesar das limitações que imperam neles. As políticas de promoção de igualdade racial fazem parte dessa nova lógica do desenvolvimento nacional (THEODORO, 2008). Marcelo Paixão (2003) é um dos intelectuais afrobrasileiro que nos têm ajudado a pensar a questão do desenvolvimento da população negra viés desenvolvimento nacional e desenvolvimento humano.

A busca de valores civilizatórios das ações afirmativas no Brasil

Quero focalizar a minha discussão nessa seção sobre as questões práticas, tendo a minha experiência de educador como ponto de partida para corrigir alguns pontos que os estudiosos de ações afirmativas têm deixado de lado no Brasil. Ser a favor ou contra as ações afirmativas no Brasil não justifica o abandono de uma reflexão sobre valores que elas são portadoras. Entendo que estes valores podem nos ajudar a construir uma nova civilização ou humanidade. Para tanto, precisamos enfrentar nossos males, e cultivar certos ethos, isto é, uma certa eticidade e moralidade em nossas ações (BOFF, 2009).

Ethos da humildade para aprender Ao afirmarmos que a ética tem a ver com o cuidado da casa, da nossa nação, isto volta dizer cuidar com qualidade a vida de seus moradores-cidadãos. Ademais, deve-se reconhecer que a melhora na qualidade desse cuidado depende da nossa capacidade de aprender com nossos erros e acertos. Essa virtude é chamada de humildade.

Humildade dentro das práticas de ações afirmativas significa entender a razão da sua existência e da sua finalidade. Não existem ações afirmativas desvinculadas de uma história. Quando olharmos pela nossa história nacional, logo descobrimos que é um mundo de barbárie, marcado pelo escravismo, racismo, discriminação, preconceito, patriarcalismo e desigualdades de gênero, raça, gerações, regionais (PNUD, 2005). Tais práticas são crimes e anti-éticos. Ferem a cidadania da maioria brasileira.

As ações afirmativas, nas sociedades modernas multiculturais, vieram para promover a qualidade de vida de grupos sociais que historicamente foram excluídos por razão de cor, etnia, gênero. São políticas focais, pois se voltam para o benefício desses grupos.

É nesse contexto que se justificam políticas de ações afirmativas para negros e indígenas. Povos cuja história é marcada pelo escravismo e racismo. Questões que não afetam necessariamente outros grupos de excluídos de descendência européia. O entendimento dessas questões históricas exige uma certa humildade moral da parte dos gestores da sociedade, dos formadores de opiniões, agentes da mídia, da ciência, dos movimentos sociais, de igrejas, escolas.

Pois, a hipocrisia, a desonestidade, a manipulação, vistas por nós como anti-valores, têm-se transformado em “virtudes” para os seguidores da ética capitalista que se posicionam contra as políticas de cotas e de ações afirmativa no nosso país (MANIFESTO EM DEFESA DA JUSTIÇA E CONSTITUCIONALIDADE DAS COTAS, 2008). Muitos discutem-nas de forma a-histórica ou pseudocientífica. Para eles, as desigualdades sócio-raciais não têm história. É uma questão de vontade. Com essa filosofia voluntarista, a vítima torna-se réu: “o problema é do negro”; “o negro é que é racista”, escuta-se dizer. Trata-se de uma cegueira epistemológica e ética.

A humildade deve guiar também as ações dos defensores de ações afirmativas e cotas. Nesse sentido, as notícias que nos têm chegado é de encarar os erros, sobretudo no plano de

implementação de política de cotas, como limitações humanas (MUNANGA, 2009) e novas oportunidades para se apreender. Lembro-me como na discussão da história e cultura africana e afro-brasileira, quando meus alunos e interlocutores me perguntam uma coisa que escapa ao meu conhecimento, respondo humildemente: “olha, esse assunto não sei. Vou investigar e trago para vocês a resposta mais tarde”. Já presenciei dessa atitude da parte de alguns dos meus professores da USP e da UNESP. Os conhecimentos sobre os africanos e seus descendentes são vastos. Ninguém tem o domínio de tudo. Muitos de meus alunos da universidade, ativistas e freqüentadores de movimentos populares, oriundos de periferias e negros, têm cultivado a humildade como virtude. Comportam-se de forma diferentes dos alunos dos alunos anti-cotistas que tendem a ser arrogantes. Nos cursos que demos, muitos deste só vêm com intuito de nos nos testar e enfrentar. Como os intelectuais anti-cotistas não vêem a relevância dos saberes africados e afrodescendentes, por isso buscam sabotá-los. A humildade é a primeira virtude que o ensino das africanidades no transmite se queremos apreender com eles.

Ethos da compaixão perante desigualdades sócio-raciais

A virtude da humildade tem outras companheiras. A primeira a ser evocada aqui é a compaixão. As pessoas que se colocam contra políticas de ações afirmativas e cotas para negros (FRY, 2007), muitas vezes o fazem só pelo fato de “não gostar deles”. A “negrofobia” é a sua “virtude”. De fato, trata-se de posturas racistas anti-negros. A má-fé, a cegueira epistemológica e ética, são suas armas políticas. Apesar das evidências trazidas pelas pesquisas sérias das instituições como IPEA, IBGE, o PNUD, o Relatório das Desigualdades Raciais (THEODORO, 2008; MUNANGA, 2009; PAIXÃO, 2009), sobre as desigualdades sócio-raciais, a miséria, a pobreza que afetam a população negra no Brasil, querem convencer a opinião nacional que o problema brasileiro é social. Os opositores têm a mania do reducionismo3. Reduzem toda a problemática de inclusão da população negra em questão de cotas. Interpretam a questão de ações afirmativas em termos de desigualdades de classe. Alguns até falam de “habitus de precariedade” (SOUSSA, 2006), só que essa precariedade não tem cor nem sexo, nem opção sexual nem religiosa. É o mesmo grupo que tem transformado o debate substancial ao formalismo jurídico. Para eles, a igualdade material não existe, não pode e não deve existir. Fazem da cegueira a sua opção epistemológica. Usam da razão instrumental, e se esquecem do afeto. Trata-se de um sadismo intelectual e ético.

3 Entre os mais conhecidos temos os antropólogos Ivonne Maggie e Peter Fry. As principais idéias desses autores encontram-se nesse livro: Divisões perigosas: Políticas raciais no Brasil contemporâneo, coordenado por Peter Fry ( 2007).

Como sair desse sadismo e cegueira? Se a humildade é um dos primeiros passos no reconhecimento de nossos problemas, o segundo seria a adoção da virtude da compaixão. O filme “Vista a minha pela” é pedagógico nesse sentido. Compaixão significa colocar-se no lugar do outro para “sentir” um pouco de seus problemas, e assim juntos procurar soluções (BOFF, 2003). Lembro-me que durante o “Projeto São Paulo Educando pela diferença para Igualdade” (SECRETARIA DO ESTADO DE SÃO PAULO, 2005), que consistiu em um curso de capacitação de professores da rede estadual de São Paulo sobre as africanidades, uma de minhas colegas, formada em pedagogia, me dizia em 2006: “se você quer ganhar o público dos professores, deve deixar de ser racional; você deve atingir seus corações!” Só mais tarde que vim a entender o que ela queria me falar: levar em conta a pedagogia do afeto e do cuidado. Confesso que este aspecto nos ajudou a compartilhar os conhecimentos e afetividades sobre a nossa história, a história dos negros brasileiros, e entender não na sua totalidade, mas em boa parte os problemas de falta de reconhecimento e de pobreza que eles afrentam.

Os políticos, professores, agentes da imprensa dominante também são educadores. Se quisermos que o problema das desigualdades que afetam a população negra seja tratado com a devida atenção que merece, essa discussão não deve só ser colocado no plano jurídico, mas deve envolver também as questões éticas. A ética da compaixão, que nos leva a compartilhar o sofrimento do outro, é ela também que nos abre o caminho para deixarmos de lado o paradigma da razão cega (MORIN, 1995) e sádica, para embarcarmos no paradigma da razão cosmopolita (SANTOS & NUNES, 2003). Com esse, nós passamos a entender que o desenvolvimento nacional não é só uma questão do crescimento econômico, nem meramente uma questão de classe, ele implica também a questão do reconhecimento das identidades e da redistribuição das oportunidades de trabalho e emprego.

Há uma outra lição que podemos aprender com os defensores de ações afirmativas e cotas. Todos nós sabemos que esse debate no Brasil está atrelado à questão da segunda abolição, da política de reparações cujos movimentos pró-negro continuam sendo atores principais. Dos anos de 1995 até 2009, essas políticas, em vez de se reportaram apenas à população negra, vem beneficiando também outras parcelas da população que sempre foram postas à margem da cidadania: os indígenas e os brancos pobres. É dessa forma que se fala hoje de cotas sociais e raciais. Essas políticas na sua diversidade, dependendo das universidades que as implementam além do critério racial, incorporam também outros como de gênero e de renda. Sem ser ingênuos, os defensores dessas políticas têm aprovado tal extensão (MANIFESTO EM DEFESA DA JUSTIÇA E CONSTITUCIONALIDADE

DAS COTAS, 2008). De fato, o que impera aqui é uma lógica da complexidade, e não do reducionismo, e a ética da compaixão e solidariedade para com outros grupos dos excluídos da sociedade. A Educafro, por exemplo, tem estendido os benefícios de suas políticas públicas de vestibular e de bolsas para os afro-descendentes aos carentes que são brancos e pobres (MALOMALO, 2009). Pois bem, a miséria do outro deve nos interpelar, e não ser um motivo de chacota. Deve nos levar para um compromisso ético-político de transformação coletiva da nossa nação.

Ethos da solidariedade e responsabilidade social

Para os cientistas sociais que trabalham com o tema da política, essa atitude de compaixão dos ativistas dos movimentos negros seria só uma estratégia de ampliação da rede das alianças. Visto dessa forma, é encarar a verdade só pela metade. De fato, uma associação como a Educafro está impregnada pela lógica da compaixão franciscana (MALOMALO, 2009). Além dessa mística cristã, bebe também do valor civilizatório africano que é a solidariedade: “Ubuntu”, traduzindo: “Eu só existo, porque nós existimos”. Aliás, é esse valor que fez de sorte que muitos negros pudessem sobreviver até os dias de hoje. Entre os negros escravizados no Brasil, ele é vivenciado pela noção de “malungu”: ser companheiro de viagem na terra do exílio da escravidão. Os quilombos incorporam o mesmo valor da vida comunitária. A teoria da complexidade à l´africaine nos obriga procurar a verdade entre essas entrelinhas histórico-antropológicas.

Esse movimento de solidariedade não se apresenta somente dentro das associações negras. Ele está presente também entre as organizações do setor público, privado e da sociedade civil que promovem políticas de igualdade racial ou da diversidade. Como é sabido, muitas dessas organizações são coordenadas por pessoas não negras. Além de sabermos que alguns só chegaram a adotar essas políticas com intuito de cumprir a lei, ou responder as pressões dos movimentos negros. Sabemos também que só essa atitude não basta para justificar o sucesso que tais ações vêm tendo na escala nacional e internacional (GUTTO, 2006). Portanto, para além dos objetivos racionais e estratégicos dessas organizações, impera também a ética do cuidado em suas ações. Pois, muitos de seus gestores se deixaram abalar pela virtude da humildade e da compaixão para criar espaço de transformação de igualdade formal em igualdade de oportunidade para negros nas suas instituições e empresas, parceiras ou não parceiras. É dessa forma que elas têm interpretado suas ações em termos de valorização da diversidade, de promoção de igualdade racial e de responsabilidade social (INSTITUTO ETHOS, 2006).

Vista do ponto de vista de uma teoria marxista radical, a lógica de ações afirmativas é tratada como reformista, e não revolucionária. Mas não é por causa disso que se deve negar seus impactos benéficos para seus destinatários. O gesto de solidariedade que essas ações acarretam, apesar de suas limitações e contradições históricas, nos autoriza dizer que as políticas de ações afirmativas e cotas, quando implementadas com a ética do cuidado-solidariedade, tendem a transformar vidas de muitos negros e de suas famílias (MALOMALO, 2008; 2009; SEPPIR, 2008; INSTITUTO ETHOS, 2006).

O melhor seria dizer não só a vida de negros, mas também de não negros quando o campo da sua implementação envolve direta ou indiretamente toda sociedade. No campo de direito, pode-se citar as leis contra o racismo. Isto não se justifica só pelo fato de que hoje muitos brasileiros se colocam a disposição para testemunhar nas delegacias para registrar o boletim de ocorrência de uma vítima do racismo, mas também pelo fato de observarmos a emergência de uma nova política do Estado na implementação de instituições que visam o atendimento aos crimes e delitos que degradam a humanidade dos gays, negros, judeus, ciganos, nordestinos (ALSP, 2009). Pode-se dizer que, os benefícios identitários e materiais, que essas políticas trazem, alcançam toda comunidade nacional.

Uma primeira lição histórica que a política de ações afirmativas tem para nos ensinar é o mito segundo o qual as empresas privadas não podem se envolver com a transformação da sociedade. Apesar de todas as reservas que se deve ter em relação aos seus interesses mercadológicos, os lucros, a postura prudente é de não cair no reducionismo, na generalização e na precipitação abusivas. Além disso, elas nos informam que as políticas públicas não são só da responsabilidade do Estado, mas também do setor privado e da sociedade civil organizada. Dito em outros termos, seguindo os ensinamentos dos ditados populares: “Uma andorinha só; não faz verão”; “a união faz a força”. Essa força do ponto de vista das africanidades é o axé, a força vital que nasce da sinergia entre o divino (o sobrenatural; divindades; orixás), o cosmos e a humanidade. As ciências das religiões e teologias abertas, nos autorizam fazer essa leitura das forças planetárias, que um setor das ciências sociais tem chamado de solidariedade e responsabilidade social. As ações da Educafro corroboram essa nossa concepção da ética.

Ethos da igualdade, diversidade e da distribuição

O que se pode aprender com as políticas públicas de ações afirmativas, chamadas de políticas de

igualdade e diversidade, pelo poder público, pelas empresas capitalistas e pela sociedade civil brasileira? Esse item poderia ser tratado junto com o anterior, mas o separei porque gostaria de ressaltar o ethos da igualdade, da diversidade e da redistribuição presentes nas ações dessas organizações.

O poder público continua sendo o grande responsável pela maioria das ações afirmativas no país (HERINGER, 2001). O governo federal, através da SEPPIR, está ainda na liderança quando comparadas suas ações com as dos governos municipais e estaduais. Suas ações se estendem a todos os campos, conforme este esquema de análise que venho sugerindo: (i) saúde e saneamento básico; (ii) educação; (ii) cultura e mídia; (iii) direitos; (iv) mercado de trabalho (MALOMALO, 2009). Cobre também todas as áreas territoriais: espaços negros urbanos, rurais e quilombolas. A lógica de suas ações de desenvolvimento é mista: capitalista e solidária. As avaliações de novas disposição apontam para o sucesso dessas ações4. Mas não faltam também críticas que acusam os limites dos recursos destinados à SEPPIR e a ausência de uma política do Estado quanto à questão racial (THEODORO, 2008).

No segundo plano do ponto de vista de amplitude de projetos de ações afirmativas vêm os da sociedade civil, e o último lugar é ocupado pelas empresas capitalistas. As ações da sociedade civil ora recebem financiamento do poder público, ora de agências e dos fundos de desenvolvimento nacionais e/ou internacionais, enquanto as organizações privadas contam geralmente com seus próprios recursos (HERINGER, 2001). As ações da sociedade civil e das empresas privadas concentram-se em grande parte no campo da educação e do mercado de trabalho. Mas a primeira tem mais autonomia em diversificar a orientação de suas ações conforme suas áreas de atuação, em escolher o seu público-alvo, mais do que as empresas privadas que geralmente são condicionadas pelos seus objetivos mercadológicos capitalistas. A lógica de ação da sociedade civil tende a ser mista. Suas organizações atuam na intermediação das carências deixadas pelo setor público e pelo setor privado.

As últimas avaliações que vêm sendo feitas no país nos autorizam a dizer que as ações afirmativas implementadas pelo poder público, o setor privado e a sociedade civil visam três objetivos principais: a efetivação da igualdade, da diversidade e da distribuição (HERINGER, 2001). Quero

4 Cito algumas avaliações: avaliações sobre ações afirmativas e cotas (PETRUCELLI, 2006;QUEIROZ & SANTOS, 2006; BENEDITO [2006] 2008); sobre comunidades quilombolas (SEPPIR, 2008); Projeto Cor da Cultura: capacitação de professores sobre a lei 10.639/03 (KAPPEL, 2008; SILVÉRIO, 2008).

me concentrar, no primeiro momento, no campo de educação e no mercado de trabalho para fundamentar a minha argumentação.

No campo da educação, as políticas de ações afirmativas no campo da educação têm, por atores principais, as universidades públicas federais e estaduais, e as associações do movimento negro (HERINGER, 2001; 2005; FERREIRA, 2009). Estas, além de ser responsáveis pela efetivação dessas políticas nas universidades públicas e privadas, são protagonistas na organização de centros de capacitação para a inclusão de negros no ensino superior. A Educafro e a Afrobras são dois exemplos dentro da sociedade civil de São Paulo: organizam cursos pré-vestibulares comunitário. A primeira organização tem na sua bandeira a luta pela política de reserva de vagas, distribuição de bolsas, permaneciam de alunos negros e brancos pobres nas universidades públicas e privas. A Afrobras fundou a Unipalmares para suprir essa demanda. Ambas, como tantas outras organizações negras, têm se mobilizado hoje para a efetivação de estágios e de inclusão no mercado de trabalho dos alunos oriundos das ações afirmativas. Aqui também os resultados tende a ser positivos (MALOMALO, 2009).

As empresas privadas pró-ações afirmativas ou políticas da diversidade têm uma atuação também no campo da educação e, sobretudo, no da empregabilidade. Muitos bancos optaram pela reinvenção do modelo do projeto piloto do Banco Boston: Projeto Geração XXI implementado desde 1999 (SILVA, 2003). O Banco Itaú, o Banco Real (hoje Grupo Santander Brasil), Banco Bradesco estão entre as principais (INSTITUTO ETHOS, 2006; REVISTA AFIRMATIVA PLURAL, 2007).

O ponto comum é que se trata geralmente de um projeto de capacitação dos alunos afrodescendentes no sentido da teoria do capital humano. Os selecionados são geralmente contratados pelas próprias empresas treinadoras ou são absorvidos pelo mercado externo. Portanto, a ação baseia-se nesse processo: seleção + capacitação + estágio + mercado (contratação ou não). Outro ponto interessante é que a maioria dos projetos dessas empresas são feitos em parceria com as organizações sociais do movimento negro. Em São Paulo, após o Projeto Geração XXI que foi uma parceria entre o Banco Boston e o Geledés - Instituto da Mulher Negra, a Educafro e a Unipalmares são duas organizações em destaque.

Qual lição moral tirar de todas essas histórias? Primeiro: todas essas ações são fundamentadas nas normas éticas, e o seu aproveitamento são, para nós, possibilidades de correção de nossos erros e

males civilizatórios. Contra as desigualdades raciais e sociais que afetam a maior parte da nossa sociedade, é o seu dever de fazer algo de diferente, sem medo de errar. Pois, o erro faz parte da aprendizagem (MORIN, 1999), nos ensina a virtude da humildade. Segundo: todas as instituições envolvidas tomaram a igualdade, a diversidade e a distribuição como seus valores. São valores que orientam suas ações nas empresas, e ao conversar com alguns, o ter lido o que eles escrevem, se percebem que seus gestores são irradiados por eles. Na minha entrevista sobre a política de ações afirmativas (29 de maio de 2009) com Maria Cristiana da Costa R. de Carvalho, Superintendente Executiva e Coordenadora das ações de diversidade do Grupo Santander Brasil, pude perceber de perto como esses gestores têm comprado essa briga, mesmo muitos deles não sendo nem especialistas das questões relações raciais nem ativistas do movimento negro.

Não só isso, e essa é a terceira lição: os valores nos quais os sujeitos que atuam no poder público, setor privado e sociedade civil acreditaram ter salvo muitas vidas de jovens negros, e de muitas famílias. Fazer uma universidade significa, para eles, renascer como um cidadão. Ter um emprego ainda tem dado a muitos a possibilidade de satisfazer outras necessidades vitais, ou seja levar uma vida descente como ser humano. Os projetos da SEPPIR com as comunidades quilombolas têm mais um impacto coletivo do que individual. O exemplo contundente é do Programa Brasil Quilombolas que foi idealizado desde 2003, e pretende atender 1739 comunidades quilombolas localizadas em 330 municípios e 22 estados brasileiros (PBQ, 2009).

Enfim, quero insistir no último ponto. Sabemos que formam ainda a minoria as empresas que se comprometem com a política de inclusão social de negros (INSTITUTO ETHOS, 2003), e muitos ainda preferem trabalhar com o público de deficientes especiais do que com a temática racial (MEYERS, 2003). Uma das lições a tirar disso, é que a salvação da vida de maioria dos brasileiros que convive com a miséria deve sair dos pequenos gestos. A espiritualidade de Santa Terezinha é instrutiva nesse sentido. É nesse contexto que a sabedoria bíblica fala do “resto de Israel”, dos “pequenos”, dos “fracos”. O melhor como nos alerta a sabedoria popular: “se cada um fizer um pouco”; “ cada um fizer a sua parte”, nós podemos transformar o mundo. O “resto de Israel” no caso representam as organizações e pessoas que acreditam ainda nos valores abordados aqui. Os “fracos” e “pequenos” são os descendentes dos africanos escravizados no Brasil.

Com o sucesso das ações afirmativas executadas por essas empresas, pode se dizer que a política de ações afirmativa pode dar e está dando certo. Elas têm salvado a vida de poucos negros, mas podem

ainda salvar de muitos se outros atores da sociedade viessem a adotá-las como um dever éticopatriótico. O ponto crucial é que elas são mecanismos de efetivação da igualdade, diversidade e distribuição em termos de oportunidades reais. Mesmo se em alguns ou outros casos imperam as contradições entre a lógica do capitalismo e do socialismo (MALOMALO, 2009), elas nos mostram do outro lado que é possível trilhar o caminho da justa medida.

Ethos da convivência: berço do reconhecimento, respeito e tolerância

Do ponto de vista do multiculturalismo, o valor maior que as políticas de reconhecimento e redistribuição buscam introduzir na sociedade é ensinar as pessoas a saberem conviver com as diferenças. Ao tratar da virtude da convivência no seu livro, Virtudes para um outro mundo possível, Boff (2006, p. 7) reconhece que o respeito, a tolerância, e acrescento o reconhecimento e outras virtudes que hei de mencionar, estão, na verdade, contidos na virtude da convivência, categoria central da fase planetária da humanidade.

Começo pelo mal que inviabiliza essa virtude. Existe um problema no nosso país que dificulta a realização do multiculturalismo emancipatório, quando vemos acriticamente o Brasil como um país da “cordialidade”, da “vivência harmoniosa das raças”. Isso se manifesta pelo fato de muitos afirmarem que não existe racismo no país, mas já presenciou atos racistas. Que contradição! Numa palavra, a idéia da “democracia racial” tem impedido o enfrentamento do racismo e a elaboração de uma política nacional de convivência de raças desde após-abolição. Isso só começou a aparecer com a

criação

da

SEPPIR

em

2003

(MANIFESTO

EM

DEFESA

DA

JUSTIÇA

E

CONSTITUCIONALIDADE DAS COTAS, 2008; THEODORO, 2008).

Portanto, o primeiro passo a ser feito, aqui também, é da humildade para se reconhecer os males; para enfrentar os tabus e os mitos. A briga entre os defensores e opositores de cotas e ações afirmativas, nesse plano, tem sido de saber se a democracia racial é um mito ou não. Aliás, todos concordam que é um “mito”, mas o problema que fica é: De que mito se trata? O que fazer com ele? Trata-se de ter coragem para se fazer uma opção político-pedagógica na história.

De uma forma radical, pode se dizer que os defensores de ações afirmativas pregam a sua destruição, enquanto os opositores pregam a sua conservação. O princípio da “justa medida” deve permanecer se queremos chegar a um acordo. Explico-me: as pesquisas quantitativas e qualitativas comprovam que existem desigualdades sócio-raciais entre negros e brancos; a mestiçagem

brasileira em si é um eurocentrismo que não quer dizer seu nome. Ou seja, é uma celebração da brancura que se apresenta como uma estratégia de genocídio da raça e da cultura negras brasileiras (NASCIMENTO, 2002); negros são preteridos pelo racismo à brasileira, que é de marca e não de origem, como bem demonstrou o sociólogo brasileiro, Oracy Nogeuira (1985). Essas evidências se impõem por si só. O que os educadores pró-ações afirmativas devem fazer é buscar a forma de passá-las para a opinião pública. A ética do afeto se impõe aqui, como me referi anteriormente, em relação ao meu público de professores cuja maioria é branca e feminina; mas isso deve se estender também para qualquer outro público brasileiro. Quando os “opositores” afirmam que o mito da democracia racial é um valor a ser construído, como princípio, até lá não há nenhum problema. O problema maior é em que base se deve construí-lo? Que ética deve guiar essa construção? Sabendo de muitas falácias do ponto de vista das interpretações raciais que esse grupo tem introduzido, um educador defensor da diversidade não se deve deixar cair em suas armadilhas. A humildade deve ser a sua mestra. Isto quer dizer que apesar das contradições de nossas relações raciais, a maioria de brasileiros teve pelo menos uma vez na sua vida uma experiência de convívio saudável com uma pessoa de outra raça. Se nunca vivenciou isso pode ser que já viu ou ouviu falar disso nos jornais, na televisão, nas igrejas, no emprego, no futebol, no samba, no carnaval. Tenho procurado dialogar com esses “universos existenciais” para conversar sobre as africanidades com meus alunos, ou meus interlocutores. Essa postura do cuidado nos leva a ir para além das experiências ruins que minam a nossa convivência. Isto não significa que devemos deixar de falar dos males que afetam os negros e a nação, mas após um processo de destruição das representações estereotipadas sobre o negro com cuidado que isto merece, sem caça a bruxos e bruxas, é preciso fazer o caminho da (re)construção, da redenção das vidas. A ética do cuidado tem esse dois pólos. Vou evocar dois casos para ilustrar o meu pensamento: o primeiro é sobre o cuidado com o reconhecimento, e o segundo com a ecologia e a espiritualidade. Sendo ambos os pontos cruciais que aparecem nas discussões e práticas sobre ações afirmativas e ensino das africanidades brasileiras.

Cuidado com o reconhecimento

O princípio de reconhecimento para ser autêntico deve implicar todas as dimensões da vida de uma pessoa ou de uma comunidade. O conceito que em muito tem ajudado para tratá-lo é o da identidade

pessoal ou coletiva. Todos os fazedores das ações afirmativas sabem que ela é a mina de ouro. A falta de cuidado com ela pode prejudicar o sucesso de uma ação afirmativa.

A pedagogia do cuidado em si é uma pedagogia popular pluralista, pois bebe das experiências culturais africanas, das diásporas negras, e ocidentais. Uma das características dos educadores negros brasileiros é que já vivenciaram de uma ou de outra forma os conteúdos que ensinam (CUNHA, 2008). Eles são partes do princípio enunciado por Guerreiro Ramos (19995): “Negro sum”. Essa realidade já é um passo para se falar de identidade com propriedade. O “ser negro” nesse sentido epistemológico-pedagógico nada tem a ver com a realidade biológica do educador, mas com suas vivências, suas convivências, o seu grau de envolvimento com a cultura negra e os problemas enfrentados por negros. Trata-se da compaixão com a negritude, não no sentido de considerar o outro como um coitado, mas sim de sentir o seu mundo e de se comprometer a lutar ao seu lado. Ser o seu aliado. É situar-se do ponto de vista do mundo negro. Essa é uma das razões pela qual podemos encontrar aliados brancos nos movimentos de defesa de ações afirmativas e cotas para negros e indígenas.

Não basta assumir a negritude para implementar as ações afirmativas, ou ensinar as africanidades. O educador das africanidades brasileiras deve também em todo momento praticar a vigilância epistemológica e ética para não prejudicar o seu trabalho. Vigilância como virtude significa ter a humildade de reconhecer suas limitações e se comportar como aliado da verdade. Significa se autoreconhecer antes de levar seus interlocutores, alunos, a sociedade, a reconhecer a sua identidade. Significa reconhecer que falar de nossas identidades é um processo político, pedagógico e ético; é um caminho doloroso, pois a construção da nossa identidade nacional está fundamentada na negação de muitas outras identidades. Essa negação deixou no caminho muitas feridas abertas.

Sabendo disso, sempre digo aos meus interlocutores, alunos, que o educador das africanidades deve se comportar como um profeta: aquele homem e mulher que tem por missão curar as feridas; resgatar as identidades jogadas para o inferno, o lixo. Ele tem a missão do Bom Samaritano como nos lembra Boff (2006, p. 15): homem e mulher que se compadece com a dor do outro; que “convive com diferentes entre os mais diferentes”.

Minhas colocações não são simples elucubrações teóricas. São coisas vivenciadas desde a minha terra natal, a RDCongo, e na minha terra de renascimento, o Brasil. No primeiro caso, o reconhecimento da minha identidade pessoal como afro-congolês da diáspora negra brasileira é

fruto do cuidado da implementação de políticas de ações afirmativas, chamada na época de política de autenticidade, isto é, de resgate de identidade africana e congolesa. Nos anos de 1973, o Estado congolês fez essa opção para superar os estragos do escravismo e do colonialismo (MALOMALO, 2005). Meus professores, meus catequistas, meus pais, ou seja, todos os educadores congoleses e africanos que cruzaram o meu caminho me ajudaram, e a toda minha geração, a renascer pelo batismo do resgate de uma identidade afro-congolesa que carrego até hoje. É ela que me dá força para conversar com meus interlocutores e alunos sobre essas questões históricas dolorosas, mas com serenidade.

Na minha convivência com meus interlocutores e alunos brasileiros, busco tomar sempre a minha experiência, e de outros mestres/as da vida, como ponto de partida. Como já mencionei, a minha identidade atual é africano-congo-afro-brasileira. Quer dizer que renasci como pessoa e educador no Brasil, nos meios populares, das comunidades eclesiais de base católicas e ecumênicas, nas organizações do movimento negro. Quando cheguei ao Brasil, em 1997, o meu primeiro contato com os afro-brasileiros me dava a impressão que eram passivos quanto às reivindicações contra o racismo. Logo depois de convivência e muito estudo que continuo fazendo até hoje, percebi que não se tratava de passividade. A verdade é que o “colonialismo interno”, o racismo à brasileira tinha seus códigos que o diferencia da realidade histórica do Congo ou de outros países africanos visitado por mim. Além disso, quando comecei a investigar a história brasileira e suas relações raciais, não demorei a perceber que em todos seus períodos negros nunca foram passivos. Ao contrário, a cultura afro-brasileira que pode aparecer à primeira vista para um estrangeiro, como no meu caso, como uma “cultura de passividade”, na verdade é uma “cultura de resistência” como bem demonstrou Clóvis Moura (1994).

O cuidado com o reconhecimento das identidades significa levar em conta as diferenças de suas inserções históricas e as linguagens que expressam a sua resistência e criatividade. Em geral, na sala de aula e em outros espaços de formação, o processo de desconstrução das representações sobre as identidades incomoda. Afirmar que as representações da identidade nacional construídas sobre a miscigenação e a democracia racial são “engodos”, estratégias de dominação da elite brasileira, choca. Muitos de nossos ouvintes chegam até a nos dizer que somos nós a inventar esses “engodos”. Na realidade, o uso da sóciogenêse, da ciência para desmascarar as

“verdades

aparentes” impostas durante séculos é uma propriedade do cientista social engajado com as mudanças (BOURDIEU, 2002). Isso leva tempo para que seja assimilado pelos futuros educadores. É preciso dar o tempo ao tempo !

Não só isso. Quando à crítica se dirige as identidades pessoais, as relações inter-raciais nas preferências sexuais, estéticas, religiosas. Aqui também a fala sobre as identidades pega fogo. Os ataques discursivos frontais à celebração da brancura, ao narcisismo estético branco, a uma identidade negra alienada, incomodam. Começar a mostrar, por exemplo que, há pessoas negras que se mutilam: não gostam da sua cor; crianças que querem se jogar numa bacia com água sanitária para mudar de cor; chamar atenção que há brancos que ainda pensam que a mulher negra só é para a cama, e a branca que é feita para se casar, incomodam mesmo (NEUSA, 1983). Essas falas sobre “nós mesmos” não incomodam pela novidade, mas sim pelo fato de tocar nas feridas existenciais. Tratando-se de nossas vidas, vidas de nossos alunos, nossos pais, mães, irmãos e irmãos, primos e primas, é com cuidado que se deve falar dessas questões sem expor, nem machucar ninguém.

Uma outra questão delicada no processo de reconhecimento da identidade negra dentro da identidade nacional é quando se discute as cinco categorias de classificação de IBGE da população brasileira segundo cor ou raça: branco, pardo, preto, amarelo e indígena. Classificar-se ou ser classificado, que um exercício de poder do outro sobre mim ou sobre mim mesmo, se tem apresentado como um incômodo para muitos de nossos alunos, sobretudo entre os negros, isto é, conforme o movimento negro, pardos e pretos. A celebração da brancura tem munido os eurobrasileiros nesse sentido, pois no Brasil eles se identificam como tais com facilidade. Mas muitos pardos ou pretos vítimas do engodo da democracia racial e da miscigenação assimilacionista, quando, após reflexões sobre as identidades, começam a perceber que realmente o engodo em questão é um fato, geralmente trilham os estágios da reconstrução de identidade afro-descendente investigada pelo psicólogo social, afro-brasileiro, Ricardo Franklin Ferreira (2000): (i) estágio da submissão: idealização do mundo branco como escudo; (ii) estágio do impacto: descoberta do grupo etno-racial de referência; (iii) estágio de militância: construção de uma identidade afrocentrada; (iv) e enfim, estágio de articulação: abertura para a alteridade.

O educador das africanidades, o gestor das ações afirmativas, ciente do processo desses estágios tem muita chance de sucesso para realizar a sua missão de resgate de identidades feridas. Ele se torna um facilitador de um diálogo intercultural sadio, porque se fundamenta numa ética do cuidado e da valorização do outro. Mas ele não deve perder de vista que se há negros com identidades alienadas, submissas, do outro lado, há brancos também com identidades “corrompidas” pela brancura. Esse fenômeno é interpretado por Guerreiro Ramos em termos de “patologia do branco”; e que Elisa Larkin Nascimento (2003) chama de “O Brasil e a confecção do branco virtual”. Esses

aspectos devem ser tratados conjuntamente.

A saída aqui é que o educador das relações brasileiras deve saber que o trabalho de redenção de identidade brasileira implica trabalhar reciprocamente a branquitude e a negritude. O ideal, numa sala de aula é levar os alunos negros e brancos a discutirem publicamente essas questões com cuidado, respeito e tolerância. Como já assinalamos, a cultura brasileira em si nos oferece também exemplos de convivência interraciais sucedidos. É preciso criar-se momentos de reflexão e socialização de experiência sobre eles; falar de nossas famílias miscigenadas; de nossos amigos de nossas escolas, dos nossos times de futebol, das nossas quadras de samba, dos nossos espaços de trabalhos, das nossas igrejas, que são freqüentados por brancos, pretos, pardos, amarelos. Fazer nossas festas juninas, nossos chás do bebê, nossas congadas, nossos maracatus, nossos carnavais, nossos natais sem exclusão do outro. Precisamos começar a falar de nós mesmo sem vergonha, nem hipocrisia; sem complexo de superioridade nem de inferioridade.

Cuidado com a ecologia e a espiritualidade

Esse ponto faz também parte das políticas de reconhecimento. Coloquei-o a parte só para organizar melhor minhas idéias. Quero insistir mais na questão religiosa, pois essa é outro tema delicado dentro do processo de discussões sobre ações afirmativas. Como outros temas, dependendo do uso que se faz da religião, ela pode facilitar ou impedir o diálogo intercultural no nosso país, na sala de aula, na empresa, na rua, na igreja.

Aqui também imperam armadilhas que o educador das africanidades deve desfazer para não se tornar refém. O Brasil é um país com 99% de crentes, pessoas que acreditam num ser superior (VEJA, 2001). Quer dizer a vida de maioria dos brasileiros é guiada pelos valores religiosos. Mas do outro lado, contraditoriamente é no mesmo país onde a intolerância racial e religiosa convivem. A intolerância religiosa se manifesta sobretudo da parte dos cristãos contra os não-cristãos. A cultura africana, afro-brasileira, sobretudo do seu ponto de vista manifestação religiosa, sofre preconceito e discriminação. Estou me referindo ao Candomblé e à Umbanda que para muitos são vistos como “coisa do diabo”, “macumba”.

A diabolização das religiões afro-brasileiras, a cooptação e a capitalização dos bens culturais afrobrasileiros são as estratégias usadas pelas classes dominantes e seus acólitos para a domesticação dos negros. A última estratégia é usada, ironicamente, para a sua “valorização” ou

“supervalorização”, mas com finalidades de servir aos interesses das classes dominantes. A mercadologização da cultura popular afro-brasileira, do carnaval, do capoeira são alguns exemplos. Nesse processo, quando a cultura negra atinge a indústria cultural, seus produtores (BACELAR, 2001), que em maioria é gente simples, perde a propriedade intelectual de seus produtos culturais, ou aproveitam poucos deles. Não é essa crítica contra os agentes do capital que me interessa aqui. Quero mais mostrar como os bens culturais produzidos pelos afro-brasileiros podem ajudar no processo da construção de uma civilização brasileira. A diabolização ou a “macumbização” das práticas religiosas afro-brasileiras tem por finalidade a sua exclusão, a negação da sua participação na cidadania cultural. Só é temido algo que nós sabemos que tem força.

Quero ainda voltar na sala de aula. Um certo dia, numa das minhas aulas, trilhando o meu caminho de construção/desconstrução/cuidado, antes de apresentar aos meus alunos os valores que carregam o Candomblé, tive uma conversa com eles sobre a cultura africana e sobre a religião tradicional africana. Trouxe alguns mitos de criação, africano, inca, judaico (gênese), e grego. A conversa sobre eles nos ajudou a relativizar a visão totalizante do cristianismo fundamentalista que acha que só o Deus cristão que é o criador. Chegamos a perceber que Pachamama dos inca, Olodumarê dos yorubas, Zeus dos gregos, criaram o universo e a humanidade da mesma forma que o Deus dos judeus e dos cristãos. Uma das conclusões que tiramos dessa conversa foi essa: do ponto de vista da antropologia religiosa, todo ser humano e o cosmos são criaturas de Deus. A humanidade e a natureza contêm germes na dividades dentro de si, por isso todas as tradições religiosas prezam pela preservação da vida. É nesse contexto que é tratada como sagrado.

Ensinar as africanidades não é só flores. Como já falei, os educadores das africanidades, e gestores de políticas de ações afirmativas são testados, confrontados em todo momento. É que desconstruir os estereótipos, as falsas representações, não é tarefa fácil. Não é algo que se faz num dia só. É um longo processo político, pedagógico e ético. O que importa para nós brasileiros é que esse processo civilizatório já está em marcha. Como bem nos lembrou Habermas é dentro do debate público cidadão que nasce a ética.

Vou ilustrar a minha fala. Durante a atividade sobre os mitos na sala de aula, entreguei para meus alunos os mitos para ler e encenar. O mito da criação de gênese caiu nas mãos de um dos meus alunos que era negro e evangélico devoto. Lemos, encenamos, interpretamos, comparamos,

brincamos com os mitos. No final de aula, esse meu aluno, levantou a mão, e após a minha autorização, fez essa comentário: “Professor, entendo a intenção do senhor; gostei dos mitos...Mas eu fico com esse...”. Apontando para o mito cristão, e acrescentou: “Para mim só Jesus, só Deus que é o criador e que salva”. Numa outra aula, depois de uma aula durante a qual apresentei para a sala os elementos do Candomblé, esse mesmo aluno começou a criticar seus adeptos afirmando que o preconceito contra eles eram provocados por eles mesmos, porque sacrificavam os animais e não respeitam o higiene, a saúde pública. Fora da sala de aula, me lembro de outra cena no museu afrobrasil, no Parque Ibirapuera de São Paulo, onde depois de ter percorrido o corredor de exposição de orixás de Candomblé e ter falado de Exu, logo na esquina havia uma outra exposição de Exu com chifres e um tridente conforme a idéia de Umbanda. Essa aluna logo questionou: “professor, o senhor falou que ele não era diabo, mas olha aqui; olha para os chifres e o tridente”.

O educador das africanidades deve em todo momento se vigiar, pois é o mais testado e questionado pelo seus interlocutores. Mas o que fiz? E que lição podemos tirar desses fatos relatados? No caso do aluno da sala de aula, nos dois momentos de suas intervenções, outros alunos se posicionaram trazendo outras perspectivas. Essa atitude me tinha animado bastante. Pois, o debate público estava estabelecido. Demais, devemos entender que muitas vezes há pessoas que nos apóiam com o seu silêncio, outras com suas ações. Percebi que tinha outros aliados. E é verdade, o educador das africanidades deve sempre ter a consciência que nessa luta pela cidadania não está sozinho. Do ponto de vista da cosmovisão africana, há outros parceiros do mundo visível e invisível que o acompanham. Do outro lado, falei para o meu aluno que a minha intenção não era de convertê-lo. Aliás, as religiões afro-brasileiras não são prosélitas. E insisti que a minha missão era de ampliar a visão do mundo de cada um. Oferecer novos instrumentos de dialogo intercultural focando nesses valores: convivência, respeito e tolerância religiosa. Portanto, essa nova visão baseava-se no resgate da “ciência com consciência” (MORIN, 1999).

Quanto à questão de sacrifício dos animais, mostrei para ele que isso não era só uma prática de Candomblé. Além disso, cada cultura tem a sua lógica própria que os não nativos precisam respeitar. O sangue dos animais representa a vida, como o sangue do Carneiro para os judeus, ou o sangue de Cristo para os cristãos. As religiões afro-brasileiras prezam a saúde dos seres humanos e do meio ambiente. Essa consciência ecológica está cada vez mais se ampliando. Os organizadores do Projeto cor da cultura retrataram-na com essas palavras:

As religiões afro-brasileiras são, com trocadilho, ecológicas por natureza. Seus fiéis

aprenderam com os antepassados uma grande lição africana: o equilíbrio surge da convivência harmoniosa entre todos os seres vivos, dos quais o homem é apenas uma pequena semente. Quando o primeiro ser humano respirou sobre a Terra, as plantas já faziam parte desta infinita paisagem universal há mais de 400 milhões de anos (COR DA CULTURA, 2009).

Por isso, deve se dizer que encarar as práticas religiosas afro-brasileiras com uma visão ecológica preconceituosa e hipócrita, é compactuar com a visão dominante do mundo. Espiritualidade ou religiosidade para os africanos e seus descendentes é a forma de se situar no mundo, se relacionar com equilíbrio com as divindades, o meio ambiente e a comunidade dos humanos. A justa medida foi de chamar a atenção sobre esse ditado: “Saber diferenciar, trigos dos joios”. Em todas as religiões existem desvios, mas não se deve confundir práticas e exceções das práticas.

A minha aluna do museu, me levou ainda a falar na outra aula sobre Exu, e sobre outros assuntos relativos à epistemologia e à ética, como o bem, o mal, o pecado na nossa sociedade. Do ponto de vista da epistemologia, rediscutimos as formas de internalização e reproduções de conhecimentos, de representações sobre o mundo e o outro. Logo verificamos o seguinte: o que a sociedade, nossas igrejas, escolas e famílias, nos ensinam sobre a cultura africana e afro-diaspórica muitas vezes não condiz com a verdade. E no Brasil, sem ofensa e exagero, o afropessimismo além de ser uma estratégia da dominação, é fruto da ignorância. O que a maioria dos brasileiros, ditos cultos e gente do povo, tem como “conhecimentos” sobre a África e a Afro-Diáspora, em geral, são estereótipos veiculados pelo racismo científico do período colonial e pelo setor da mídia ignorante e tendenciosa. Uma das noções básicas da epistemologia é que estereótipo e preconceitos são falsidades. Não constituem, em momento algum, verdades científicas. Para um aluno que pretende se tornar um educador, cientista social, só existe uma opção: ou ele aceita vivenciar as normas éticas da pesquisa científica, ou fica no bando dos ignorantes preconceituosos e racistas.

Com isso, estou afirmando que, para um cientista social que trabalha com as africanidades, fazer ciência implica uma opção ética. Um dos seus princípios é não faltar com a verdade. O outro é ter a humildade e a coragem de se desfazer dos preconceitos, das pré-noções, pois prejudicam a busca da verdade. Nesse mesmo ceara da epistemologia, o processo da reconstrução, ou reapropriação de uma nova visão do mundo, exige do aprendiz uma abertura ao diferente. No caso, deve dar ouvido aos praticantes e estudiosos do Candomblé para saber como eles concebem Exu. Quando analisamos as funções de Exu como entidade do movimento, da comunicação; aquele abre os caminhos, essa aluna não teve mais o que dizer. Entendeu que tinha uma visão preconceituosa. Além disso, a diabolização do Exu da parte dos cristãos e de um segmento de Umbanda é uma

questão de disputa de poder; de imposição de uma visão ortodoxa.

As religiões afro-brasileiras, para os defensores das ações afirmativas, constitui um dos bens culturais nacionais que merece cuidado. Pois, como se diz, é um dos elos frágeis pelo qual os “negrofóbos” e os fundamentalistas cristãos penetram para minar a resistência e a belíssima contribuição negra do nosso país. Cuidar desse patrimônio é um dever moral para todos nós. Pois, é pelo axé que muitos negros resistiram e muitos continuam resistindo. Se o cristianismo imperialista ajudou no processo da escravidão dos africanos, calou-se perante o racismo sofridos pelos negros, os cristianismos fundamentalistas, católicos, protestantes e evangélicos, nos dias de hoje, constituem-se em aparatos de incentivos à intolerância e ao desrespeito dos direitos humanos. São máquinas da produção da violência contra negros pelo seu silêncio e práticas intolerantes. É desse ponto de vista que nós, teólogos da libertação, que trabalham com as africanidades, entendemos o que vem a ser o mal, o pecado (SILVA, 1998).

Conclusão

Busquei mostrar nas linhas que antecederam de que forma as ações afirmativas em curso no nosso país podem nos ajudar a pensar o tema de valores, educação e violência. Ao optar pela valorização da minha experiência do pesquisador, ativista e educador das africanidades, focalizei mais a minha reflexão nos dois primeiros temas: valores e educação.

Ao longo da minha análise, pude confirmar a hipótese formulada por mim segundo a qual as ações afirmativas implementadas no Brasil contêm valores a nos ensinar para a reinvenção da sociedade brasileira e planetária. Essa tarefa em construção no país, tornar-se-á cada vez mais sustentável, a longo prazo, se fizermos alguns deveres de casa, pois a ética, na sua raiz, como vimos, significa “cuidar da morada”. Dessa forma, do ponto de vista da ética do cuidado, os cidadãos brasileiros precisam cultivar:



O ethos da humildade para aprender como sujeito autônomo e com os outros



O ethos da compaixão perante desigualdades sociais e raciais



O ethos da solidariedade e responsabilidade social



O ethos da igualdade, da diversidade e da distribuição



O ethos da convivência, do reconhecimento, do respeito e da tolerância

Considero o uso político e pedagógico desses valores como um caminho para a promoção do desenvolvimento humano de todos os excluídos e discriminados da terra.

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