VAUDEVILLE AMBIENTAL: UM ESTUDO SOBRE ESTRATÉGIAS E TÁTICAS EM LICENCIAMENTO DE EMPREENDIMENTOS, O CASO DO CAMPO DE DUNAS DO PERÓ, CABO FRIO – RJ.

June 23, 2017 | Autor: Dalila Mello | Categoria: Justica Ambiental, Conservação da Natureza, Governança ambiental
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VAUDEVILLE AMBIENTAL: UM ESTUDO SOBRE ESTRATÉGIAS E TÁTICAS EM
LICENCIAMENTO DE EMPREENDIMENTOS, O CASO DO CAMPO DE DUNAS DO PERÓ, CABO
FRIO – RJ.

MELLO, Dalila Silva
Professora do Instituto Federal Fluminense – Campus Cabo
Frio, Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Meio
Ambiente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro
(PPGMA/UERJ).
[email protected]


MARTINS, Márcia Barbosa
Doutoranda do Programa de Pós-graduação em Meio Ambiente
da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPGMA/UERJ).
[email protected]


NEFFA, Elza
Professora Doutora Associada da Universidade do Estado do
Rio de Janeiro de Pós-graduação em Meio Ambiente da
Universidade do Estado do Rio de Janeiro (PPGMA/UERJ).
[email protected]

RESUMO

O presente artigo propõe uma reflexão à luz da ecologia política, permeado
pelo conceito dos conflitos socioambientais e aponta a importância de uma
análise em diferentes escalas de ação, e de diferentes grupos de atores
sociais, visando fornecer elementos que permitam analisar a problemática
dos licenciamentos ambientais no Brasil, um Vaudeville Ambiental, a partir
de um estudo de caso sobre o licenciamento de um empreendimento hoteleiro e
habitacional no Campo de Dunas do Peró, situado no Município de Cabo Frio,
no Estado do Rio de Janeiro, localizado no interior da Área de Proteção
Ambiental do Pau Brasil. A metodologia utilizada é a etnografia dos
conflitos socioambientais e os procedimentos metodológicos são a observação
participante e a análise documental. Os resultados deste estudo propiciaram
a formulação do conceito de artimanha, que visa esclarecer como algumas
táticas são utilizadas para possibilitar o licenciamento ambiental de
empreendimentos que não estão em conformidade com a legislação vigente.
Palavras –chaves: licenciamento ambiental, conflitos, unidades de
conservação.

ABSTRACT

This article proposes a reflection in the light of political ecology,
permeated by the concept of socioenvironmental conflicts and points to the
importance of analysis at different scales of action, and different groups
of stakeholders in order to provide elements for analyzing the issue of
environmental licenses in Brazil, an Environmental Vaudeville, from a case
study on the licensing of a hotel and housing development in Pero Dunes
Field, located in the city of Cabo Frio, State of Rio de Janeiro, located
inside the Area Environmental Protection of Pau Brazil. The methodology
used is the ethnography of socioenvironmental conflicts and the
methodological procedures are participant observation and document
analysis. The results of this study led to the formulation of the concept
trick, which aims to clarify how some tactics are used to enable the
environmental licensing of enterprises that do not comply with current
legislation.
Key-words: environmental licensing, conflicts, protected areas.

INTRODUÇÃO
Inicialmente, convém esclarecer que Vaudeville é uma modalidade de
teatro francês, que corresponde às sátiras na cultura brasileira, que busca
tornar públicas situações de ordem política através do humor,. No verbete
"vaudeville" do Dictionnaire de Musique, Rousseau define como:
"uma espécie de poema particularmente dos franceses. Tal
afirmação já se encontrava no prefácio do Théâtre de la
Foire, de Lesage e d'Orneval, publicado ainda em 1721,
cujo trecho enfatiza que o Théâtre de la Foire se
caracteriza pelo Vaudeville, espécie de poesia particular
dos franceses, estimada pelos estrangeiros, amada de todo
mundo, e o mais adequado de todos a fazer cumprir as
projeções da mente, a reforçar o ridículo, a corrigir os
costumes (grifo nosso). (in INACIO, 2013, p.22 )


Esclarecemos que o título inusitado deste artigo científico,
Vaudeville Ambiental, surgiu durante o processo de pesquisa, sendo
inspirado no título da biografia publicada, Vaudeville: Memórias (AMARAL,
2010), de um dos representantes legais do empreendimento em estudo.
O objetivo é analisar o conflito ambiental instaurado no Campo de
Dunas do Peró, localizado no interior da Área de Proteção Ambiental (APA)
do Pau Brasil, no Município de Cabo Frio, Estado do Rio de Janeiro, que
durante as últimas décadas vem sendo disputado por empresários, para a
construção civil e hotelaria, e por segmentos da comunidade científica e da
sociedade civil, para conservação da biodiversidade e recreação em contato
com a natureza. A APA do Pau Brasil está localizada nos municípios de
Búzios e Cabo Frio, RJ, e foi criada pelo Decreto Nº 31.346 de 06 de junho
de 2002.
Adotamos a etnografia dos conflitos socioambientais (LITTLE, 2006),
como guia teórico-metodológico neste artigo. Os procedimentos metodológicos
adotados foram análise documental e observação participante. A análise
documental consistiu na leitura crítica do Plano de Manejo da APA do Pau
Brasil, com especial atenção no zoneamento ambiental da área do
empreendimento; na leitura crítica do Estudo de Impacto Ambiental (EIA) de
Empreendimento Resort Peró; na busca ativa em sites da internet para
analisar a veracidade das informações orais recebidas de cidadãos dos
municípios de Cabo Frio e Armação de Búzios, localizadas no estado do Rio
de Janeiro, que têm participado deste processo de licenciamento, que se
estende há cerca de uma década. E, finalmente, a análise de dois documentos
que nos foram entregues, também, por cidadãos da região: Relatório
Ambiental Complementar – produzidos por Peró Empreendimentos Imobiliários
Ltda e SERVEC Ecologia; e Parecer Técnico EIA/RIMA – Complexo Turístico
Resort Peró – Processo MP Nº 2006.001.44712.00. A observação participante
tem sido continuamente realizada pela participação das autoras do presente
estudo nas reuniões realizadas no Conselho da APA do Pau Brasil e do Parque
Estadual da Costa do Sol (PECS), de 2009 até a presente data.

1. O MUNDO BIOFÍSICO: caracterização da singularidade do Campo de Dunas
do Peró.


As dunas no Brasil são consideradas Áreas de Preservação Permanente
(APP), mas, apesar da sua importância para a preservação do mosaico
litorâneo sofrem grande pressão dos vetores de crescimento urbano-
econômico, sendo ocupadas indiscriminadamente por moradias, segundas
residências e atividades de lazer e turismo. Tal fato tem sido
característica marcante também nas Dunas do Peró que, mesmo sendo uma APP
dentro de Área de Proteção Ambiental (APA), sofre pressão da especulação
imobiliária.
As dunas do litoral fluminense não seguem o padrão brasileiro,
presente nas regiões Nordeste e Sul. Segundo Lamego (1946), os campos de
dunas no norte fluminense são resultados de fatores ambientais diretamente
associados a agentes climatológicos que, particularmente no litoral entre o
município de Cabo Frio e a foz do rio Itabapoana, no município de São
Francisco de Itabapoana, são submetidos a ventos provenientes do mar para a
terra, em função do posicionamento semifixo da Célula de Alta Pressão do
Atlântico Sul, que gera ventos alísios. Esses ventos incidem na linha de
costa em direção leste ou nordeste durante grande parte do ano apresentando
velocidades próximas a 7m/s, principalmente no verão, em termos de
frequências, e no inverno, com maiores velocidades (BARBIERI, 1999).
As medições pluviométricas no litoral dos municípios de Cabo Frio e
Búzios estão associadas ao microclima distinto (BARBIERI, 1984) do conjunto
tropical dominante de todo o segmento a partir da Restinga de Marambaia em
direção ao norte do estado. As imediações de Cabo Frio apresentam uma
variação do clima Semi-Árido Quente - BSh - pela classificação de Köppe de
1948 (FERNANDEZ et al, 2007).
Para a formação das dunas é necessário que haja uma fonte de
sedimentos finos que possam ser movimentados pela deriva litorânea e
depositados na costa formando o berma, e então com a ação dos ventos são
deslocados sempre no continente formando as feições eólicas. Estes
sedimentos podem ser de fontes diretas, como desembocaduras fluviais ou da
plataforma adjacente. Sedimentos arenosos com estas características foram
mapeados por Muehe (1998) entre os municípios de Cabo Frio e Búzios, sendo
posteriormente detalhados por Pereira (et al. 2007), para o trecho mais
próximo a Cabo Frio, conforme Figura 1.
Figura 1 - Mapeamento da Planície Costeira do Peró.

Fonte: Rodriguez et al, 2007.

Os campos de dunas mais significativos do Estado do Rio de Janeiro
encontram-se na Região dos Lagos, precisamente nas praias do Forte, Peró e
Tucuns.
Este estudo destaca a importância da preservação do maior campo de
dunas remanescente do Estado, o Campo de Dunas do Peró, que se caracteriza
por aproximadamente 5,5 km de dunas de areia, fixas e ativas e alto grau de
preservação de sua restinga associada.
O Campo de Dunas do Peró é formado por diferentes processos eólicos.
Pereira (et al, 2007) descreve como dunas barcanas, a formação de
corredores ajustados preferencialmente aos ventos de NE, associados à
migração atual desta morfologia, em taxas estimadas em 1,5 metros por ano
(CASTRO et al., 2003). Esse sistema de sedimentos ao migrar forma outro
tipo de duna, a mega forma parabólica, que se encontra ativa e é originada
da evolução de campos de dunas transversais mais antigos. É importante
mencionar que os campos de dunas móveis seguem a direção preferencial dos
ventos. A ocorrência das dunas fixas se dá a partir das gramíneas que
crescem de forma natural e fixam as dunas. Em estágios mais desenvolvidos,
encontram-se as dunas cobertas por vegetação arbustiva de restinga. A
vegetação de gramíneas garante o início da fixação das dunas para uma
futura sucessão de vegetação arbustiva mais robusta. Em áreas de depressão,
com a presença de afloramentos do lençol freático, originam-se brejos em
diferentes estágios de evolução. Os mais úmidos possuem vegetação
característica destes ambientes, enquanto os que afloram apenas em
condições de alta pluviosidade são cobertos por vegetação pioneira de
restinga em alto grau de conservação. Grande parte do brejo se estabelece à
retaguarda do campo de dunas móveis uma vez que, em função do amplo campo
de dunas ativas, forma em seu reverso, condições propícias para afloramento
do lençol freático e acúmulo de água de percolação, como observado no Peró,
enriquecendo ainda mais o mosaico representativo e preservado em diferentes
estágios de evolução vegetal na região.


2. O MUNDO HUMANO: Caracterização do empreendimento Resort Peró.


Por sua beleza cênica, a Região da Costa do Sol é conhecida em todo o
mundo e, dentro da lógica econômica atual, encontra-se na lista dos locais
com alto potencial de rentabilidade econômica. Desta forma, o poder público
tem tomado decisões para melhoria de infraestrutura e ocupação da região,
na busca de incentivar investimentos privados para as áreas de lazer e de
turismo. Dentro dessa lógica, foram expedidas as licenças para construção
do empreendimento Resort Peró.
O processo de licenciamento do Resort Peró teve início antes da
criação da APA do Pau Brasil, onde o Campo de Dunas do Peró está inserido.
Posteriormente, o empreendimento alterou seu nome para Reserva do Peró e,
atualmente, denomina-se Costa do Peró.
Com discurso preservacionista, apoiado na idéia de que o
empreendimento encontra-se adequado à preservação da diversidade natural, o
EIA/RIMA (2006), entregue à Fundação Estadual de Engenharia do Meio
Ambiente (FEEMA) para licenciamento, afirma que a intenção é implementar um
complexo turístico, hoteleiro, residencial e de lazer, com tipologias
diversificadas, passíveis de se adaptarem à vocação da área e às
necessidades de um mercado que, se mostra dinâmico e em constante
transformação, prometendo ser "o melhor destino turístico do país".
O EIA/RIMA descreve que o primeiro projeto previa uma ocupação de
4.656.511 m², com aproximadamente 4,5 Km de extensão de praia, com forte
adensamento urbano, loteamentos em parcelas com dimensões reduzidas,
elevada taxa de ocupação e predominância de tipologia multifamiliar,
voltada para classe social média, média-baixa, em função da forte pressão
antrópica existente e progressiva. Com a implementação da APA do Pau Brasil
em 2002, o empreendedor justifica que houve necessidade de adequação do
projeto para que a unidade de conservação pudesse suportar tais
investimentos e atualmente prevê uma taxa de ocupação de 7% da área (SERVEC
ENGENHARIA, 2007). O projeto licenciado pelo INEA, em 2006, tem padrão
diferenciado para classe social com maior poder aquisitivo e várias
bandeiras hoteleiras famosas no mundo, como Club Mediterranée (Club Med) e
Sheraton.
Para um melhor entendimento da dimensão e da potencialidade de
degradação ambiental do empreendimento no Campo de Dunas do Peró, optou-se
por transcrever minuciosamente cada unidade hoteleira, habitacional e de
lazer. (SERVEC ENGENHARIA, 2007)
1. Unidade Club Mediterranée: bangalôs em palafitas com
gabarito de, no máximo, 2 pavimentos, composto por 352
quartos de frente para o mar, Mini Club Infantil, ocupando
cerca de 23 ha.
2. Unidade Sheraton: 30 bangalôs em palafitas e 210 suítes
edificadas de até dois pavimentos somando 15 ha, e mais um
campo de golfe de 60 ha (18 buracos);
3. Unidades 3 e 4: 2 hotéis com 100 bangalôs de madeira
cada unidade, com sedes individuais com área social e de
lazer completa (restaurantes, piscinas e clube), com 18 ha
e 12 ha, respectivamente;
4. Unidades 5 e 6: 2 pousadas temáticas, com 6.8 ha (47
bangalôs) e 5 ha (34 bagalôs);
5. Unidades de loteamento: O EIA/RIMA é confuso quanto ao
número de lotes, afirmando conter 8 loteamentos mas, ao
contar as unidades de cada tipologia, conclui-se um valor
de 19 loteamentos em 7 tipologias.
- Uma unidade do tipo Poló: 80 lotes, dois campos de
Poló, piscina e centro hípico;
- Uma unidade do tipo Golfe: 271 lotes e um Campo de
Golfe;
- Duas unidades do tipo Praia: 75 lotes e 34 lotes,
com parque interno individual composto de área de lazer
com piscina, área de caminhada e ciclovia;
- Nove unidades do tipo Parque: 272 lotes no total,
parques individuais com área de lazer com piscina, área de
caminhada e ciclovia;
- Uma unidade do Multi da Praia: dois lotes com 6 e
10 flats, respectivamente.
- Uma unidade Multi Golfe: 55 lotes, compostos de
apartamento de 2 ou 3 quartos, e uma ampla área de lazer;
- Quatro unidades Village: totalizando 172 casas de 2
e 3 quartos, com área de lazer individual para cada casa,
com piscina, varanda, deck e garagem.
6. Unidades comerciais:
- Duas unidades com constituídas de 30 lojas cada
uma, em estilo strip-center;
-Unidade com 92 lojas de tamanhos variados, compostas por
alimentação, restaurantes, lojas de roupas e calçados,
artesanato, mobiliário e decoração, além de mercado,
serviços em geral, banco, lavanderia.


Para acesso ao resort e suas unidades, o EIA informa que será
implantado um sistema viário com uma estrada que acessa a rodovia RJ-102,
bem como uma rede de ruas internas; dispondo também de espaços destinados a
estacionamento para acesso às áreas de lazer.
Na ausência de infraestrutura, serão implementados sistemas de
drenagem, esgoto e tratamento sanitário, abastecimento de água e coleta de
resíduos sólidos.
O projeto urbanístico prevê a construção de um horto, denominado
Horto Zoobotânico Florestal do Peró, com 40 ha, para a produção de mudas
que garantissem a manutenção e a recomposição da vegetação da flora e fauna
local, não só do empreendimento, como de toda a região contida na APA do
Pau Brasil.


3. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA


Este trabalho está fundamentado em pressupostos teóricos que
compreendem as questões ambientais como fenômenos complexos que demandam
uma abordagem transdisciplinar. O presente estudo busca analisar os
problemas ambientais nas suas interações diversas. Desta forma, propõe uma
reflexão à luz da ecologia política, campo que vem se consolidando nas
ciências sociais, permeado pelo conceito dos conflitos socioambientais,
onde surgem as disputas pelo acesso aos recursos naturais. Para Little
(2006), o conceito socioambiental apresenta três dimensões: o mundo
biofísico e seus múltiplos ciclos naturais; o mundo humano e suas
estruturas sociais; e o relacionamento dinâmico e interdependente entre
esses dois mundos. Os conflitos socioambientais são observados devido a
embates entre grupos sociais, que interagem de diferentes formas com o
ambiente social e natural.
"A etnografia dos conflitos socioambientais difere
da etnografia tradicional em vários aspectos essenciais.
Primeiro, o foco da etnografia não é o modo de vida de um
grupo social, mas tem como seu objetivo principal a
análise dos conflitos socioambientais em si e as múltiplas
interações sociais e naturais que os fundamentam. Segundo,
não trata de um único grupo social, mas tem que lidar
simultaneamente com vários grupos sociais. Terceiro, o
escopo geográfico é rara vez limitado ao âmbito do local
do grupo, já que incorpora vários níveis de articulação
social. Finalmente, enquanto etnografias tradicionais
dedicavam um capítulo ao habitat natural do grupo, na
etnografia dos conflitos socioambientais o ambiente
biofísico se torna uma elemento crucial em quase todos os
assuntos a serem tratados." (LITTLE, 2006, p. 4)
Neste contexto, a década de 1980 no Brasil foi um divisor de águas
para a defesa do meio ambiente. Em 1981, houve a criação da Política
Nacional de Meio Ambiente; em 1986, começaram a ser elaboradas as
resoluções do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA) e, em seguida com
o processo de descentralização e com a promulgação da Constituição Federal
de 1988, houve um aumento do reconhecimento da importância da participação
social no processo de gestão ambiental. Desta forma, os processos de
licenciamento ambiental passaram a ser obrigatórios pela Resolução CONAMA
001/86 e os interesses locais passaram a ter maior importância durante o
processo de licenciamento ambiental. Em 2000, a participação social foi
também legitimada nos processos de criação e planejamento de áreas
protegidas, com o estabelecimento das consultas públicas, bem como dos
conselhos - a partir da legislação que criou o Sistema Nacional de Unidades
de Conservação da Natureza (SNUC). Neste contexto, na legislação do
licenciamento ambiental, as Audiências Públicas e os Conselhos de UC
passaram a se constituir como arenas modernas, nas quais ocorrem as
disputas pelos recursos naturais.
O estudo de caso do Campo de Dunas do Peró revela que estas arenas
modernas, segundo a teoria da ação comunicativa de Habermas (1997),
favorecem o processo de argumentação, possibilitando a mudança de um
"interesse próprio" para uma "moral cívica", levando a uma "auto-
organização" da sociedade. A esfera pública se torna um espaço político de
expressão do poder, gerado de forma argumentativa e não somente
administrativa, política e econômica. Por outro lado, as audiências
públicas podem se transformar em um espetáculo teatral, senão circense, em
que os atores sociais, representantes do Estado, do Mercado e da Sociedade
Civil participam, e na qual, algumas vezes se legitimam procedimentos
ilegais. Nestas situações, a expressão Vaudeville Ambiental se torna
adequada.
Vários fatores podem desencadear conflitos num processo de
licenciamento ambiental de um empreendimento desse porte dentro de uma UC,
dentre eles, citamos a relação desigual de poder entre os atores sociais
(empresas, gestores e comunidades locais), que se dá pelos interesses
diferenciados destes em relação ao uso dos recursos naturais, bem como, na
disputa pela ocupação de seu território.
Certeau (2007) faz uma distinção entre estratégias e táticas,
apresentando um esquema inicial mais adequado à compreensão de como esta
disputa de poder ocorre. Para ele, a estratégia vem de um sujeito de querer
e poder (uma empresa, um exército, uma cidade, uma instituição cientifica).
A estratégia postula um lugar suscetível de ser circunscrito como algo
"próprio" e ser a base de onde "se pode" gerir as relações com uma
exterioridade de alvos ou ameaças (os clientes ou os concorrentes, os
inimigos, o campo em torno da cidade, os objetivos de pesquisa etc.) A
estratégia tem um "próprio", que seria uma vitória do lugar sobre o tempo.
Permite capitalizar vantagens conquistadas, preparar expansões futuras e
obter assim, para si, uma independência em relação à variabilidade das
circunstâncias. É um domínio do tempo pela fundação de um lugar próprio.
Então, nenhuma delimitação de fora lhe fornece a condição de autonomia. A
tática não tem por lugar senão o outro. E por isso deve jogar com o terreno
que lhe é imposto, tal como organiza a lei de uma força estranha. Não tem
meios para se manter em si mesma, à distância numa posição recuada, de
previsão e de convocação própria: a tática é movimento "dentro do campo de
visão do inimigo".
No licenciamento, o órgão ambiental tem o próprio e define a
estratégia, o empreendedor deve jogar no lugar que lhe é imposto e lançar
mão da tática para alcançar seus objetivos.
Silvestre (2015) argumenta que se enfrentam barreiras adicionais, tais
como a corrupção e infraestrutura, para a sustentabilidade de economias em
desenvolvimento e emergentes, que contribuem para um maior grau de
complexidade e incerteza, devido à existência de ambientes de negócios
altamente turbulentos e vazios institucionais. Esses fatores, por sua vez,
dificultam a oferta de aprendizagem na cadeia de inovação e reduzem a
inclinação das cadeias de abastecimento com trajetórias de
sustentabilidade. Desta forma, Silvestre (ibid) em sua pesquisa sobre
cadeias de suprimento de petróleo no Brasil, identifica que:
[...] a corrupção impede o desenvolvimento econômico das
economias emergentes e em desenvolvimento (Guasch e
Straub, 2009; Blake e Morris, 2009). (...) Este problema
foi claramente evidenciado no estudo de cadeias
sustentáveis de abastecimento no Brasil. Nesses ambientes,
a corrupção é um problema sistêmico, que envolve todos os
níveis e áreas da sociedade, ao contrário dos casos
isolados que são observados nos países desenvolvidos. A
existência de sistemas tributários complexos e elevados
níveis de burocracia muitas vezes reforçam esquemas de
suborno e a cultura da corrupção. O alto nível de
tributação e a multiplicidade de impostos cumulativos
criam um sistema fiscal complexo que é difícil para os
empresários locais para entender e gerenciar (Ferretti
Funchal, 2011; Varsano et al., 1998). Embora algum grau de
burocracia seja necessário, um nível excessivo de
burocracia é um problema que dificulta o desenvolvimento.
(grifo nosso). (SILVESTRE, 2015, 162)


Neste contexto de barreiras adicionais, às quais muitas vezes estão
expostos os empreendedores, alguns tipos de táticas são utilizadas nos
processos de licenciamento, visando burlar a legislação vigente às quais
denominamos artimanhas.

4. O DINÂMICO RELACIONAMENTO ENTRE OS MUNDOS BIOFÍSICO E HUMANO.


Os resultados deste estudo propiciaram a formulação de alguns
conceitos que visam ajudar o cidadão a entender como alguns licenciamentos
são concedidos pelos órgãos licenciadores, embora, estejam em desacordo com
a legislação vigente. Então, é proposto o conceito de artimanha, definido
pelo Dicionário Aurélio (2015) como "Procedimento ou ato de astúcia
dolosa", para caracterizar alguns tipos de táticas que vêm sendo utilizadas
nos processos de licenciamento, que visam burlar a legislação vigente. No
caso do empreendimento em estudo, podem ser identificadas três artimanhas
utilizadas: a omissão de informações, a promiscuidade política e o
zoneamento tendencioso.

4.1 Artimanha 1 – omissão de informações

Uma das artimanhas mais comuns no licenciamento é a omissão de
informações. Neste caso, apareceu sob duas formas: tanto por parte do
empreendedor, na elaboração do EIA/RIMA, quando omite a apresentação
completa da legislação na qual que se enquadra o empreendimento em questão
(não foi diferente ao apresentar os estudos ambientais); quanto por parte
do órgão licenciador que oculta e/ou nega o acesso à íntegra do processo de
licenciamento aos representantes da sociedade civil organizada (o que
também aconteceu neste processo de licenciamento). A omissão de informações
contraria a Lei de Acesso à Informação, Nº 12.527 de 2011, que regulamenta
o direito constitucional de acesso às informações públicas, que
possibilitam qualquer pessoa, física ou jurídica, sem necessidade de
apresentar motivo, o recebimento de informações públicas dos órgãos e
entidades. Esta lei vale para os três Poderes da União, Estados, Distrito
Federal e Municípios, inclusive aos Tribunais de Conta e Ministério
Público.
Após analisar o capítulo que discorre sobre a legislação, e
ressaltando que o estudo foi elaborado em 2006, citamos abaixo as
principais leis e resoluções, com suas respectivas seções, que foram
ignoradas no EIA/RIMA:
Lei 4771, de 15 de novembro de 1965 (Código Florestal)
Art. 2º Consideram-se de preservação permanente, pelo só
efeito desta Lei, as florestas e demais formas de
vegetação natural situadas:
f) nas restingas, como fixadoras de dunas ou
estabilizadoras de mangues;


Lei 9.985, de 18 de julho de 2000(SNUC)
Art. 15. A Área de Proteção Ambiental é uma área em geral
extensa, com um certo grau de ocupação humana, dotada de
atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais
especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-
estar das populações humanas, e tem como objetivos básicos
proteger a diversidade biológica, disciplinar o processo
de ocupação e assegurar a sustentabilidade do uso dos
recursos naturais.


CONAMA nº 303, de 20 de março de 2002.
Art. 3º Constitui Área de Preservação Permanente a área
situada:
...
IX - nas restingas:
a) em faixa mínima de trezentos metros, medidos a partir
da linha de preamar máxima;
b) em qualquer localização ou extensão, quando recoberta
por vegetação com função fixadora de dunas ou
estabilizadora de mangues;
...
XI - em duna;


CONAMA 341, de 25 de setembro de 2003
Art. 2º. Poderão ser declarados de interesse social,
mediante procedimento administrativo específico aprovado
pelo Conselho Estadual de Meio Ambiente, atividades ou
empreendimentos turísticos sustentáveis em dunas
originalmente desprovidas de vegetação, atendidas as
diretrizes, condições e procedimentos estabelecidos nesta
Resolução.
§ 1º. A atividade ou empreendimento turístico sustentável
para serem declarados de interesse social deverão obedecer
aos seguintes requisitos: I - ter abastecimento regular de
água e recolhimento e/ou tratamento e/ou disposição
adequada dos resíduos; II - estar compatível com Plano
Diretor do Município, adequado à legislação vigente; III -
não comprometer os atributos naturais essenciais da área,
notadamente a paisagem, o equilíbrio hídrico e geológico,
e a biodiversidade; IV - promover benefícios
socioeconômicos diretos às populações locais além de não
causar impactos negativos às mesmas; V - obter anuência
prévia da União ou do Município, quando couber; VI -
garantir o livre acesso à praia e aos corpos d'água; VII -
haver oitiva prévia das populações humanas potencialmente
afetadas em Audiência Pública; e VIII - ter
preferencialmente acessos (pavimentos, passeios) com
revestimentos que permitam a infiltração das águas
pluviais.
§ 2º. As dunas desprovidas de vegetação somente poderão
ser ocupadas com atividade ou empreendimento turístico
sustentável em até vinte por cento de sua extensão,
limitada à ocupação a dez por cento do campo de dunas,
recobertas ou desprovidas de vegetação.


Lei Municipal 108, de 16 de novembro de 1979.
Art. 8º [...]
§ 1º Consideram-se de preservação permanente, segundo a
Lei Federal nº 4.771, de 15 de setembro de 1.976 - Código
Florestal - as florestas e demais formas de vegetação
natural [...]
§ 2º Serão consideradas ainda de preservação permanente,
as florestas e demais formas de vegetação natural
destinadas;
a. a atenuar a erosão das terras;
b. a fixar as dunas;
e. a asilar exemplares da fauna ou flora ameaçadas de
extinção


Lei Municipal nº 116, 16 de novembro de 1979:
Art.6º O Município de Cabo Frio, fica para fins de
organização do território, dividido nas seguintes áreas:
IV. Área de Preservação Permanente (APP) - constituída
pelas dunas, costões, ilhas oceânicas, sambaquis e mancha
florestal.


2. Artimanha 2: promiscuidade[1] política


Nas reuniões do Conselho da APA do Pau Brasil, eram recorrentes
comentários sobre o patrocínio do Plano de Manejo pelo empreendedor. Por
essa razão, o zoneamento da APA do Pau Brasil teria sido elaborado de forma
a facilitar a licença do empreendimento. O Professor José Silva
Quintas[2], Coordenador Geral de Educação Ambiental do IBAMA, se utiliza da
metáfora "é colocar o vampiro para tomar conta do banco de sangue" para
exemplificar a promiscuidade política entre Mercado e Estado, encontrada
nos processos de licenciamento ambiental
Para confirmar a informação de patrocínio verificou-se ao Plano de
Manejo da APA do Pau Brasil (2002), que em seu capítulo Equipe Técnica, no
item Patrocinador do Estudo é apresentada a Organização Não Governamental
VIVA RIO, na figura de seu presidente. Com essa informação confirmada, foi
realizada uma pesquisa na internet e confirmou-se que um dos empreendedores
do Resort Peró consta na lista dos Fundadores e Amigos da ONG VIVA RIO.
Esta situação provocou a necessidade de elucidar algumas questões
levantadas. Arcar com os custos de um Plano de Manejo é obrigação do Estado
do Rio de Janeiro, gestor da Unidade de Conservação. Por que os agentes do
Estado aceitaram que a ONG VIVA RIO patrocinasse[3] o Plano de Manejo
(documento que define as normas para o uso dos recursos naturais) da APA do
Pau Brasil? Outra questão que chama atenção é o tempo recorde da elaboração
deste Plano de Manejo - apenas seis meses após a criação da UC - o que não
se coaduna com a realidade das outras UC estaduais.
Durante pesquisa na internet, encontrou-se uma entrevista (GUZMAN,
2014), da qual excertos são citados abaixo e que permitem apreender o âmago
de como a questão ambiental vem sendo tratada no Brasil:
O que esperar da biografia de um dos mais bem-sucedidos
empresários do ramo de entretenimento do país? Um
verdadeiro vaudeville, que o autor define como "espetáculo
que tem um pouco de tudo, um grande entra e sai de
personagens e situações, permitindo até uma dose
circense". Mas, ao invés de mágicos, bailarinos e
acrobatas, o leitor assiste ao desfile de artistas,
políticos, modelos, jornalistas, empresários, bicheiros,
divas e mafiosos. (...)
* * * *
Admite francamente, por exemplo, que sempre influiu no
resultado dos concursos de beleza que participou como
jurado. Alega em sua defesa que promovia "marmeladas" para
assegurar a justiça e garantir que vencesse a mais
bonita. (...)
* * * *
No livro, você cita uma frase de Fellini que diz que a
vida é feita de sexo, circo e espaguete. Em sua vida teve
mais o quê?
- Eu me identifico com essa frase, gosto desse equilíbrio.
Acho que, se fizer um balanço, minha vida teve circo, sexo
e espaguete. Mas, no geral, eu me sinto sempre trabalhando
num grande circo. (GUZMAN, 2014)


Em um determinado momento da entrevista, reflete Guzman (2014) : "Por
que alguém com tantas histórias impublicáveis escreve um livro de memórias?


3. Artimanha 3: zoneamento tendencioso


O Zoneamento do Plano de Manejo da APA do Pau Brasil (Figura 2),
estabelece em seu Art. 2º que, para fins de adoção das medidas necessárias
à disciplina, ocupação do solo e exercício de atividades causadoras de
degradação ambiental, a APA fica dividida nas seguintes zonas: I- Zona de
Preservação da Vida Silvestre –ZPVS; II- Zona de Preservação da Vida
Silvestre 1 – ZPVS1; III- Zona de Conservação da Vida Silvestre – ZCVS; IV-
Zona de Influência Ecológica – ZIE; V- Zona de Uso de Aqüiculturas – ZUAQ;
e VI- Zona de Ocupação Controlada – ZOC.
O Conselho da APA - durante o processo de consulta pública para a
criação do Parque Estadual da Costa do Sol - analisou o zoneamento da área
do empreendimento em tela e constatou que o zoneamento tendencioso ocorreu
em duas tipologias de zonas: Zona de Preservação da Vida Silvestre 1
(ZPVS1) e Zona de Ocupação Controlada (ZOC).
Destacamos que a ZPVS1 é uma categoria inexistente nos roteiros
metodológicos dos órgãos ambientais que normatizam o processo de elaboração
de planos de manejo, o que nos leva a inferir que tenha sido criada
especificamente para este Plano de Manejo. A Zona de Preservação da Vida
Silvestre 1 (ZPVS 1) é assim descrita:
"Destinada à salvaguarda de espécies nativas que, apesar
de endêmicas e/ou ameaçadas de extinção, encontram-se em
estado vulnerável de degradação ambiental em consequência
de pressão antrópica local, em sua área de ocorrência na
APA, fruto de ocupação urbana descontrolada, e cuja
possibilidade de preservação, pode estar associada à
adoção de medidas de caráter compensatório a serem
adotadas em caso de solicitação formal aos órgãos federal,
estadual e municipal de meio ambiente de competência para
a deliberação sobre intenção de ocupação ordenada. A
elaboração de Estudo de Impacto Ambiental, é obrigatória
nestes casos, devendo definir parâmetros urbanísticos
compatíveis com as características da área em foco, quando
da definição de medidas e programas ambientais de
pertinência." (grifos nossos)
(RIO DE JANEIRO, DL 32.517/2002)


Figura 2 - Zoneamento da APA do Pau Brasil

Fonte: Rio de Janeiro, 2002.
A Figura 3 mostra que o local escolhido para a implantação da ZPVS1
faz limite com o bairro Cajueiro, uma área de ocupação desordenada. A
intenção que "parece" ter motivado a criação desta nova categoria de zona
foi a preocupação com uma possível expansão desordenada sobre o Campo de
Dunas do Peró. No entanto, ressaltamos que a delimitação da ZPVS1 abrange
uma área de grande valor ecológico e pouca degradação ambiental,
contrariando a necessidade de proteção desta área. A ZPVS1 legitima a
possibilidade de construção no local "sobre a intenção de ocupação
ordenada" como exposto no Plano de Manejo. Caso a mesma estivesse em risco
de ocupação desordenada, reforçando um discurso recorrente nas reuniões dos
Conselhos. O discurso postula que o Estado Brasileiro, em suas três esferas
(federal, estadual e municipal), tem sido ineficiente na proteção da
natureza, mostrando-se incapaz de conter ocupações desordenadas dos
segmentos de baixo poder aquisitivo da sociedade brasileira sobre as Áreas
de Preservação Permanente (APP); por isto, é melhor permitir que os
segmentos de alto poder aquisitivo da sociedade, pretensamente "mais
sustentáveis", sejam autorizados a construir sobre as APPs, ainda que tal
crime esteja configurado na legislação brasileira desde o Código Florestal
de 1965.


Figura 3 – Localização da ZPVS1 e do Bairro Cajueiro
Fonte: INEA, 2015

A outra zona destacada neste estudo é a ZOC, que de acordo com o Plano
de Manejo da APA do Pau Brasil (RIO DE JANEIRO, 2002):
"É aquela onde deverão ser controladas as ocupações já
existentes e onde poderão ser permitidas outras ocupações
mediante a adoção de parâmetros urbanísticos diferenciados
em função das características ambientais da área em
questão. Neste sentido, serão adotadas as siglas ZOCa,
voltada ao controle das ocupações em áreas já antropizadas
e ZOCp para aquelas a serem objeto de posterior
antropização. As áreas que poderão ser futuramente
ocupadas são entendidas como aquelas que apresentam certo
nível de degradação ambiental, com menores possibilidades
de preservação. (grifos nossos) (RIO DE JANEIRO, 2002)


A Figura 4 apresenta uma imagem extraída do EIA/RIMA Resort Peró e
demonstra o bom estado de conservação do ambiente. Entretanto, esta zona
foi delimitada como Zona de Ocupação Controlada posterior (ZOCp) em
contradição com os critérios estabelecidos no próprio Plano de Manejo.
Figura 4- Zoneamento do Campo de Dunas do Peró

Fonte: SERVEC ENGENHARIA, 2006.


O Relatório realizado pelo Ministério Público, através do Grupo
Técnico Especializado (GATE), afirma a qualidade ambiental da área e
questiona o zoneamento. Destacamos alguns trechos a seguir (MPERJ, 2007):

"A área pretendida para o empreendimento representa um
dos trechos em melhor estado de conservação do primeiro
distrito do Município de Cabo Frio, que por sua vez está
incluído em região de restinga que se destaca pela elevada
riqueza e grau de endemismos para diferentes grupos
animais e vegetais." (Carta da Dra Maria Alice Alves,
UERJ, p. 4)

"A área pretendida para o empreendimento proposto
constitui ainda uns dos principais trechos de ocorrência
deste lagarto (Liolaemus lutzae) no Estado do Rio de
Janeiro e um dos trechos em que o estoque populacional
ainda está em bom estado, comparado com as áreas de
ocorrência."( Carta do Dr. Carlos Frederico, UERJ, p. 5)

"A espécie Liolaemus lutzae, assim como a Formicivora
littoralis [espécie de pássaro endêmico, conhecido como
formigueiro-do-litoral], constam da lista de Espécies da
Fauna Brasileira Ameaçadas de Extinção (...) Tais
informações não foram apresentadas no EIA/RIMA."
(Comentários do GATE p. 6)

"Apesar de conhecer muitos ecossistemas aquáticos
continentais, a diversidade e estado de preservação da
Área de Intervenção, situada na APA do Pau Brasil me
surpreendeu e sem sombra de dúvida, é uma região que
merece ser estudada, (...). Desta forma, é no mínimo
estranho que no Plano de Manejo da APA do Pau-Brasil esta
área seja denominada como uma zona de ocupação controlada
(ZOC)." ( grifo do autor) ( Dra Claudia Bove, UFRJ, p.9)

"Por conseguinte, aponta-se que a obediência ao Zoneamento
estabelecido no Plano de Manejo da APA do Pau Brasil,
atualmente em vigor (Decreto Estadual 32.517 de 23
/12/2002), não garante a efetiva preservação das Áreas de
Preservação Permanente referente às Dunas do Peró.
(Comentários do GATE p. 15)


Os trechos destacados nos levam a postular que o zoneamento da APA do
Pau Brasil foi tendencioso ao criar as zonas ZPVS1, ZOC2p, ZOC3p e ZOC4p
no Campo de Dunas do Peró, desconsiderando os pareceres supracitados de
renomados cientistas brasileiros que confirmam o alto grau de conservação
desta área. A licença ambiental foi concedida pelo órgão ambiental estadual
baseada neste zoneamento tendencioso.

CONSIDERAÇÕES FINAIS


O embate de vários atores sociais, como entidades da sociedade civil e
da comunidade científica, ao longo do processo, merece estudo próprio, e
foi um dos principais elementos de contrapeso, numa relação de poder
econômico e político desigual, que culminaram na suspensão das licenças
dadas, no segundo semestre 2015, pela Justiça Federal.





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-----------------------
[1] Que se compõe de elementos distintos, misturados desordenadamente;
confuso, misturado. Que abarca elementos desonestos; que contém imoralidade
ou degradação moral. Dicionário online de Português

[2] Comunicação oral durante o Curso de INTRODUÇÃO À EDUCAÇÃO NO PROCESSO
DE GESTÃO AMBIENTAL, realizado pelo IBAMA em 2001, em Teresópolis – RJ

[3]Proteção, auxílio, apoio. Custeio de um programa de rádio, televisão
etc., de um espetáculo ou de uma disputa esportiva.

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