Venda das Acções da Rio Tinto Coal Mozambique: Qual é o futuro dos Trabalhadores?

June 14, 2017 | Autor: Domingos Bihale | Categoria: Industrial And Labor Relations
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Organização dos Trabalhadores de Moçambique-Central Sindical

UNIDADE DE PESQUISA SINDICAL

Venda das Acções da Rio Tinto Coal Mozambique Qual é o futuro dos Trabalhadores?

Elaborado por:

Domingos Bihale

Maputo, Setembro de 2014

V ENDA

DAS A CÇÕES DA R IO C OAL M OZAMBIQUE

T INT O

Qual é o futuro dos Trabalhadores? Resumo Este documento surge na sequência do anúncio da venda dos activos da empresa Rio Tinto Coal Mozambique a International Coal Ventures Private Limited da India e tem por objectivo expor as preocupações do Movimento Sinidcal em geral e da OTM-CS em particular em relação ao futuro laboral dos trabalhadores da empresa Rio Tinto Coal Mozambique após a conclusão do processo de venda. O documento foi elaborado com base em evidências buscadas através de informações veiculadas nos meios de comunicação social, comunicados da Rio Tinto Coal Mozambique aos trabalhadores, página oficial da Rio Tinto e entrevistas aos colaboradores. Por razões éticas as fontes orais e os comunicados oficiais do Rio Tinto aos Trabalhadores não foram citadas. Através deste posicionamento, a OTM-CS junta-se aos esforços que o comité sindical da RTCM está a empreender para salvar os postos de trabalho e todos os direitos laborais dos colaboradores da empresa. Insta igualmente o Governo central e provincial para convidar a Rio Tinto Coal Mozambique (RTCM) e International Coal Ventures Private Limited (ICVL) a um encontro tripartido, que envolva os sindicatos nacionais, para discutir e produzir-se uma declaração conjunta de garantias de que o processo não vai resultar em despedimentos dos trabalhadores e por último, exigem do Governo, o envolvimento dos sindicatos em todos processos de negociações de contratos com os megaprojectos, bem como nos processos de transmissão, como forma de garantir que a agenda e os interesses dos trabalhadores não serão relegados ao segundo ou terceiro planos.

INTRODUÇÃO Rio Tinto é uma empresa multinacional de origem autraliana e opera em todo o mundo e em diversas áreas de mineração tais como alumina, alumínio, bauxite, carvão, cobre, diamantes, minério de ferro,titânio, urâneo, ouro e prata. Em 2011, a Rio Tinto adquiriu as acções da empresa Riversdale Mining Limited relativas à Mina de Benga, em Tete, num valor estimado em 4 biliões de dólares americanos, passando a designar-se Rio Tinto Coal Mozambique (RTCM). A RTCM passou a controlar, para além da mina de Benga, os activos da cadeia de carvão, a Concessão Mineira de Zambeze, as licenças de prospecção e pesquisa de Tete Leste, entre outras licenças. Em 2013 a RTCM iniciou o processo de venda de suas acções, seus activos e suas conceções em Tete e a 28 de Julho de 2014 assinou o contrato de venda da Mina de Benga, dos activos da cadeia de carvão, da Concessão Mineira de Zambeze, das licenças de prospecção e pesquisa de Tete Leste, bem como de outras licenças por ela detidas à empresa International Coal Ventures Private Limited (ICVL), num valor estimado em 50 milhões de dólares americanos. A International Coal Ventures Private Limited (ICVL) é um consórcio criado pelo Governo indiano com o objectivo específico de adquirir minas e activos de carvão fora da Índia como forma de responder eficazmente a procura interna de carvão estimulada pela sua indústria em franco crescimento. O processo de venda, como se referiu, iniciou a 28 de Julho de 2014, com a duração de 60 dias.

Nestes termos, a sua conclusão está prevista para o dia 26 de Setembro de 2014. PROBLEMA Qual vai ser o futuro dos trabalhadores depois da concluão do processo de transição da RTCM para a ICVL? Que disposito legal protege os trabalhadores de despedimentos consequentes do processo de venda? Que papel assume o governo perante o processo? A RTCM declara que vai assumir a responsabilidade de gerir as actividades até à conclusão do processo de venda e garante assegurar os postos de trabalho para os colaboradores nacionais e estrangeiros com os quais possui contratos de trabalho. Isto significa, pelo menos à letra, que os seus contratos vão transitar para a nova empresa. O mesmo vai acontecer com as condições, remuneração e direitos previstos nos contratos, incluindo o acordo colectivo de trabalho. Em relação aos trabalhadores subcontratados, a RTCM imputa a responsabilidade dos empregadores directos. Entretanto, é necessário sublinhar que isso só vai acontecer durante a transição para a nova empresa, ou seja, as declarações da RTCM são práticas apenas no período de transição (60 dias) que terminam a 26 de Setembro de 2014. Depois deste período, a ICVL assumirá todas as responsabilidades. Este é o período que levanta preocupações. Primeira preocupação - A RTCM não comunicou, nem envolveu formalmente os trabalhadores aquando das negociações com ICVL, alegadamente por ela ser uma empresa cotada na bolsa de valores. Este argumento não é de todo convincente porquanto fere claramente o procedimento de transmissão

prescrito na Lei do Trabalho nr:23/2007 de 1 de Agosto, segundo o qual “O transmitente e o adquirente devem, previamente, informar e consultar os órgãos sindicais de cada uma das empresas ou, na falta destes, a comissão dos trabalhadores ou a associação sindical representativa, da data e motivos da transmissão e das projectadas consequências da transmissão” (Nº1 do Artigo 77 da LT),

sublinhado nosso.

A Direcção Geral da RTCM começou a informar os trabalhadores sobre o decurso do processo depois da assinatura do contrato. Quanto à ICVL, até ao momento ainda não reuniu com os trabalhadores. Sabe-se, contudo, que apenas emitiu um comunicado por escrito a tranquilizar os trabalhadores, em consequência da pressão levada a cabo por eles. A questão que se coloca é: que validade legal tem o comunicado? Se aconteceu com os trabalhadores, aconteceu também com o Governo. As declarações da Ministra dos Recursos Minerais, em torno do negócio expressam uma grande surpresa com que o Governo acolheu a notícia da assinatura do contrato de venda: “Formalmente não conheço o valor que a Rio Tinto terá encaixado neste negócio, mas podem ficar seguros de que qualquer montante que for apurado será tributado no âmbito das mais-valias” (Esperança Bias, Ministra dos

Recursos Minerais, in Jornal Notícias, Sexta, 01 Agosto 2014). Segunda preocupação - Não há nenhuma garantia contratual nem legal de que, após a conclusão do processo de venda, a ICVL manterá todos os postos de trabalho activos, incluindo as condições de trabalho, os direitos e privilégios dos trabalhadores. É incerto, e a RTCM é premptória neste aspecto, que a actual política relativa a assitência médica,

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medicamentosa e social, incluindo a segurança social irá continuar nos moldes actuais. O futuro aponta para a perda de muitos postos de trabalho por parte de trabalhadores (nacionais e estrangeiros), caso não se tome medidas pontuais de fiscalização do processo. Terceira preocupação - Há incerteza e desconfiança dos trabalhadores em relação ao seu futuro laboral. A incerteza e desconfiança abrem espaço, nos termos da lei, para a rescisão dos contratos por justa causa, conferindo aos trabalhadores o direito à indeminização. Porém, a acontecer, a rescisão prejudicaria os trabalhadores porque muitos deles são novos na empresa. A LEI DO TRABALHO NÃO VAI EVITAR POSS ÍVEIS DESPEDIMENTOS A Lei do Trabalho abre espaço para a transição do trabalhador de um empregador para outro em resultado de uma mudança de titularidade de uma empresa ou estabelecimento, mas não obriga ao novo empregador para tal acto. Diz a Lei que com a mudança de titularidade de uma empresa ou estabelecimento, pode o trabalhador transitar para o novo empregador (Nº 1 do Artigo 76 da LT), negrito nosso. A assunção dos trabalhadores por parte do novo empregador é uma possibilidade, conforme o espírito da Lei. Adicionalmente, a Lei do Trabalho permite a ocorrência de rescisão de contrato sempre que o adquirente tenha intenção de mudar ou venha a mudar o objecto da empresa, nos doze meses subsequentes, se essa mudança implicar uma alteração substancial das condições de trabalho (alínea d) do Nº 2 do artigo 76)

É evidente que a Lei determina que, Havendo transmissão de uma empresa ou estabelecimento de um empregador para outro, os direitos e obrigações, incluindo a antiguidade do trabalhador, emergentes do contrato de trabalho e do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho existentes

passam para o novo empregador (Nº 3, do artigo 76).

Mas esta determinação não impõe que o novo empregador mantenha todos os postos de trabalho e as condições de trabalho durante um determinado período, porque o respeito pelos postos de trabalho e as condições depende do bom senso do novo empregador, já que, de acordo com a Lei, [o] novo titular da empresa ou estabelecimento é solidariamente responsável pelas obrigações do transmitente vencidas no último ano de actividade da unidade produtiva anterior à transmissão, ainda que respeitem a trabalhadores cujos contratos tenham já cessado, nos termos da lei, à data da referida transmissão (Nº 4, do artigo 76), negrito nosso.

Entende-se, claramente, que a preservação do número de postos de trabalho e das condições de trabalho nos actuais termos contratuais dependerá do bom senso e solidariedade da ICVL. Sabe-se na prática que a solidariedade não é obrigação e, não sendo, não pode decorrer de um dispositivo legal. Esta lacuna legal alarga o campo de manobras para a ICVL despedir um número grande de trabalhadores, ampliando desta forma o raio de dúvidas e receios dos trabalhadores da RTCM em relação ao seu futuro laboral em Tete. O GOVERNO ESTÁ MAIS PREOCUPADO COM AS MAISVALIAS DO QUE COM A SEGURANÇA DOS POSTOS DE TRABALHO O Governo de Moçambique, através do Ministério de Recursos Minerais e Ministério das Finanças (Autoridade Tributária de Moçambique), já vieram ao público pronucniar-se sobre o anúncio da venda da RTCM a ICVL. Em ambos pronunciamentos, o Governo centra a sua preocupação na taxação

das mais-valias e em nenhum momento mostrase preocupado com a salvaguarda dos postos de trabalho e das condições sócio-laborais inerentes. No lugar de estar inteiramente envolvido no processo, o Governo limita-se a acompanhar o processo, incluindo a questão laboral. “Segundo temos acompanhado, a Rio Tinto não está em condições de continuar com as operações em Moçambique. Estamos informados de que isso não significa a paralisação das operações, e todos os direitos dos trabalhadores estão salvaguardados” (Esperança Bias, Ministra dos Recursos

Minerais, in Jornal Notícias, Sexta, 01 Agosto 2014). O Governo apenas está informado que “todos os direitos dos trabalhadores estão salvaguardados”. Quem informou? A RTCM claro. O Ministério do Trabalho ainda não se fez ao terreno para ir perceber in loco o que está acontecer e nem convidou os representantes da RTCM e muito menos os da ICVL para ter uma explicação exaustiva e garantias. O Governo Provincial também continua à margem do processo. Este posicionamento indica que, numa situação de despedimentos massivos, o governo não estará em condições de repor a ordem e legalidade e muito menos estará em condições avantajadas para salvar os postos de trabalho dos colaboradores nacionais da RTCM. A OTM-CS é PELA SALVAGUARDA DOS POSTOS DE TRABALHO E CONDIÇÕES INERENTES A Organização dos Trabalhadores de Moçambique-Central Sindical (OTM-CS) e o Movimento Sindical em geral juntam-se incondicionalmente aos esforços que o comité sindical da RTCM está a empreender para salvar os postos de trabalho e todos os direitos laborais dos colaboradores da empresa. Neste sentido comprometem-se apoiar todas as

acções legalmente reconhecidas, concorrentes para a justiça laboral durante e depois da conclusão do processo de venda. A OTM-CS insta vigorosamente ao Governo central e provincial para convidar a RTCM e ICVL a um encontro tripartido, que envolva os sindicatos nacionais, para discutir e produzir-se uma declaração conjunta de garantias de que o processo, efectivamente, não vai lançar cidadãos nacionais colaboradores da RTCM ao desemprego e nem vai alterar as condições de trabalho ora vigentes. A venda da RTCM expõe claramente a lacuna existente na legislação laboral e mineira moçambicana. A OTM-CS desafia o Governo e os empregadores a discutir, na Comissão Consultiva do Trabalho (CCT), a actual lei do Trabalho, tendo em conta o actual contexto da descoberta de recursos minerais e energéticos. O artigo 76 da Lei do Trabalho sobre “Transmissão da empresa ou estabelecimento” pode ser revisto ou ser regulamentado para cobrir situações futuras idênticas à da venda dos activos da RTCM a ICVL. É importante que se estabeleça um período mínimo de garantia dos postos de trabalho dos colaboradores das empresas em caso de transmissão. Por último, a OTM-CS exige do Governo, o envolvimento dos sindicatos em todos processos de negociações de contratos com os megaprojectos, bem como nos processos de transmissão, como forma garantir que a agenda e os interesses dos trabalhadores não serão relegados ao segundo ou terceiro planos.

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REFERÊNCIAS Jornal Notícias, Economia, “Ministra Esperança Bias Reage- Venda da mina de Benga é um processo normal”, Sexta, 01 Agosto 2014. Jornal O País, Economia, Governo investiga negócio polémico da mineradora Rio Tinto”, Segunda, 11 Agosto 2014. Jornal Sol do Indico “Ministra dos Recursos minerais considera «normal» a venda de mina de Benga”, 1 de Agosto, 2014: http://www.soldoindico.co.mz/ministra-dos-recursos-mineraisconsidera-normal-a-venda-de-mina-de-benga/08/2014

Lei n.º 23/2007, de 1 de Agosto, Lei do Trabalho, in Boletim da República- Publicação Oficial da República de Moçambique, I SÉRIE — Número 31, Quarta-feira, 1 de Agosto de 2007, Maputo: Imprensa Nacional; Macau Hub, Notícias, “Governo de Moçambique atento à venda de activos do grupo Rio Tinto”,2014/08/11: http://www.macauhub.com.mo/pt/2014/08/11/governo-democambique-atento-a-venda-de-activos-do-grupo-rio-tinto/ Rio Tinto Media Release, “Rio Tinto agrees sale of coal assets in Mozambique”, 30 July 2014: http://www.riotinto.com/media/media-releases-237_11406.aspx

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