Violencia Politica em Africa: Novas guerras (Marry Kaldor).docx

May 22, 2017 | Autor: Immanuel Simbine | Categoria: International Relations, Security Studies, Peace and Conflicts Studies
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EebenBarloe, foi militar que serviu nas forças especiais do SouthAfrican Defense Force (SADF).
Http://www.bbc.com/portuguese/noticias/2014/04/140407_ruanda_genocide_ms. Visitado no dia 30 de Setembro de 2015, as 10:30.
Docente e investigador do Centro de Estudo Estratégicos Internacionais -CEEI

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Índice
Introdução 2
3.3Objectivos 3
Objectivos Específicos 3
Metodologia do trabalho 3
Estrutura do Trabalho. 4
I SECÇÃO 4
1.Conceito Tradicional de Guerra 4
2.Novas Guerras em África 6
3.Características das novas guerras na perspectiva de Mary Kaldor 6
3.1.Novos actores incluindo a Identidade 7
3.2.Método de Combate 9
3.3.Economia de guerra 10
4.Causas das novas guerras em África 11
Considerações finais 13
Bibliografia 14
II SECÇÃO 15
2.Terrorismo e seus efeitos 15
2.1.Historial do Surgimento do Terrorismo no Mundo 16
2.3.Finalidade do Terrorismo 17
2.4.Alvos de Acções Terroristas 17
3.Terrorismo em África 17
3.1.Alvos dos ataques da Irmandade Muçulmana 18
3.3.Revindicações da Irmandade Muçulmana 19
4.Entrevista com Emílio Zeca (Cenário BokoHaram): 20
5. Considerações gerais: 24
Bibliografia 24






Introdução
O presente trabalho tem como tema "Violência política em África", dando enfoque a novas guerra, o terrorismo e o golpe de Estado. Os conflitos armados em África experimentam uma verdadeira alteração de sentimentos entre a euforia e o desespero, um dos últimos exemplos de guerra devastadora no continente foi o caso do Sudão, que culminou com o desmembramento deste em Sudão do Sul e do Norte. No concernente aos actos terroristas no continente africano são evidenciados ataques terroristas no Egipto perpetuados pelos seguintes grupos terroristas: Irmandade Islâmica, Grupo Armado Islâmico (GIA) e Exercito Islâmico de Salvação (EIS). Em relação a Nigéria destaca-se o grupo terrorista BokoHaram. O trabalho evidencia também questões relacionadas com golpes de Estado em África, trazendo casos específicos de Egipto e Guiné-Bissau.

Objectivos
Objectivo Geral: Compreender as formas de violência política em África.
Objectivos Específicos
Identificar as características dos novos conflitos em África;
Apresentar as principais causas da ocorrência da violência política em África;
Explicar as diferentes formas de violência no continente africano.

Metodologia do trabalho
Na elaboração do presente trabalho são usados os seguintes métodos e técnicas: método histórico, método comparativo, método estatístico, técnica documental e entrevista.

Método Histórico
Segundo Marconi e Lakatos, (2003: 107), o método acima citado consiste em investigar acontecimentos, processos e instituições do passado para verificar a sua influência na sociedade de hoje, pois as instituições alcançaram a sua forma actual através de alterações de suas partes componentes, ao longo do tempo, influenciadas pelo contexto particular de cada época.
Este método é pertinente para a compreensão histórica das diferentes formas de ocorrência da violência política em África, bem como do seu impacto na actualidade.
Método Comparativo,
Para Severino (1999:56), o método comparativo é usado tanto para a comparação de factos de grupos do presente no passado ou entre existentes e os do passado, ou entre os existentes e os passados, quanto entre de sociedades iguais ou de diferentes estágios de desenvolvimento. Este método ajuda a compreender as semelhanças e diferencias entre os diferentes conflitos em África.

Método Estatístico
Marconi e Lakatos(ibid:108),afirmam que o método estatístico consiste em obter conjuntos complexos, representações simples e constatar se essas verificações simplificadas têm relações entre si. Assim, o método estatístico significa redução de fenómenos sociológicos, políticos, económicos etc. A termos quantitativos e a manipulação estatística, que permite comprovar as relações dos fenómenos entre si, e obter generalizações sobre sua natureza, ocorrência ou significado. Este método permitirá a obtenção de dados quantitativos referentes a violência que houve em África.

Técnica Documental
Quanto a técnica documental,Marconi e Lakatos (2003:49), consideram que abrange a pesquisa documental e a bibliográfica. A técnica documental é importante no trabalho, pois permite colectar documentos e artigos científicos que sustentaram as ideias trazidas no estudo em causa.

Técnica de Entrevista
Consiste na formulação de questões à personalidades que têm melhor percepção ou com maior interacção com determinadas questões (Gil, 2009:35). No presente estudo, esta técnica ajuda a compreender questões relacionadas com o terrorismo, sobretudo perpetuado pelo grupo BokoHaram, através do contacto directo com o especialista de Relações Internacionais.

Estrutura do Trabalho.
O presente trabalho estrutura-se em (3) secções, a primeira secção, referente às novas guerras no continente africano. A segunda secção contempla o terrorismo em África. Conflito. A terceira e última secção aborda o golpe de Estado no continente africano.

I SECÇÃO
Autores: Emmanuel Simbine e Noriega Copa
Na presente secção, abordaremos sobre as Guerras em África numa abordagem das novas guerras. Primeiro traremos o conceito tradicional da guerra, onde far-se-á o debate conceptual sobre a guerra. Segundo, abordamos sobre as novas guerras em África, onde procuramos trazer as características das novas guerras comparando com a realidade africana. E, por fim, as causas da novas guerras em África, estas que podem ser: a pobreza, perda das legitimidades políticas identitárias.
1.Conceito Tradicional de Guerra
A noção tradicional da guerra, fundada na teoria realista das Relações Internacionais, defende que a guerra é associada a defesa nacional, seguindo a prossecução do interesse nacional. Porem verifica-se uma evolução teórica acerca do conceito de guerra como verificamos ao longo da história. Hugo Grotius, na sua obra "O Direito da Guerra e da Paz", define a Guerra como o estado de indivíduos, considerados como tais, que resolvem suas controvérsias pela força (Grotius, 2004:71-72).
Segundo Clausewitz (1972:51), a guerra é um acto de violência para obrigar o adversário a cumprir a nossa vontade. Nesta definição aparece com clareza a distinção entre o meio empregado, o da violência, e o fim através do uso desse meio perseguido, o qual consiste da imposição da vontade ao inimigo.
Contudo pode-se perceber que a guerra tem fins políticos nas palavras de Clausewitz, em que diz a guerra não é apenas um acto político, mas um verdadeiro instrumento político, o que seria a continuação das relações politicas por meio da violência, mostrando assim uma clara subordinação da guerra a política.
Kallen (1996:5), por sua vez na sua obra, faz uma critica a Clausewitz, onde ele define a guerra como sendo uma disputa armada entre duas ou mais instituições soberanas onde se empregam forças militares para o alcance de certos fins. Ele afirma que a definição de Clausewitz se aplica também ao que chama-mos de paz, principalmente no desporto, nos negócios e nas finanças, pois se aplica a qualquer acto de violência não importando onde ocorre.
Levando em linha de conta estes diversos elementos, a guerra é uma forma de violência politica, colectiva, directa, intencional, manisfesta, instrumental, institucionalizada, por vezes ritualizada ou regulamentada(Dennen, 1977), isto é, o fenómeno paradigmático da irrupção da violência nas relações entre corpos sociais organizados, envolvendo encontros armados generalizados e programados que implicam a destruição, em maior ou menor grau, do adversário, e que visam a obtenção, por outros meios não lográveis, de um a determinada supremacia de efeitos mais ou menos duradoura, fenómeno esse que tem acompanhado a história desde o início da existência de corpos sociais organizados.
As definições acima mencionadas dão enfase a aspectos cruciais sobre o conceito de guerra, primeiro um combate armado, segundo comunidade politica, organização, e por fim alguma forma de sanção de grupo para a implementação de politicas colectivas que criem condições para duas unidades politicas similares possam operar no mesmo ambiente.
2.Novas Guerras em África
Na década de 60 houve uma transformação no que concerne a África, onde verifica-se um processo de descolonização, em que surgem os Estados Independentes em África. E por causa desta colonização estes estados têm estruturas fracas, são dependentes sendo assim influenciados pelas potências colonizadoras. Apesar da independência política estes continuam economicamente dependentes, sendo que na sua maioria a sua política externa serve a metrópole, isto é, não quebram os modus operandusdos países que lhes colonizaram. Sendo que estes estados se encontravam ainda fragmentados com constrangimentos de identidade o que resultou em varias dimensões de conflitos como as novas guerras.
As chamadas "novas guerras", ou guerras dos pós- modernidade, que ocorrem com maior incidência em Estados colapsados, vem constatar com um tipo de conflitualidade de matriz Westefaliana, que correspondeu sobre tudo a construção do Estado moderno, territorial, centralizado e hierarquicamente ordenado. Mary Kaldor foi pioneira na definição e análise deste tipo de conflito, Mary Kaldor defende que estas novas guerras correspondem a um novo tipo de violência organizada que é diferente porque faz com que não se vejam as diferenças entre guerra (geralmente definida com violência entre estados ou grupo organizados por motivos politico), crime organizado (violência introduzida por grupos por organização privada, com objectivos privados normalmente com lucros financeiro) e violações massivas dos direitos humanos (geralmente por parte de estados ou por grupos politicamente organizados contra indivíduos), o que verificamos em África.
3.Características das novas guerras na perspectiva de Mary Kaldor
As novas guerras apresentam características diferentes das guerras tradicionais, devidas as suas formas de actuação como também aos seus mecanismos, os tipos de actores envolvidos, o armamento usado neste tipo de conflito como também metodo de combate. Sendo necessário assim identificar as características que se enquadram neste novo tipo de guerra.
Segundo Kriege(2008:16), citando Kaldor (2006:5), as características das novas guerras são:Novos actores incluindo a identidade, Métodos de Combate e Economia de Guerra
3.1.Novos actores incluindo a Identidade
Além do Estado verificamos o aparecimento de grupos insurgentes, com novas formas de actuação, como: raptos de crianças e adultos. A populaçãodessas regiões afectadas por esses novos grupos ficam sem escolha a não ser de se aliar as forcas governamentais ou aos rebeldes. Também, verifica-se surgimento de mercenários e de companhias militares privadas que tem desempenhado um papel significante nas novas guerras. Perdendo assim,oestado o monopólio do uso força.
Para o caso concreto de África temos o exemplo da ExecutiveOutcomes, esta que era a empresa militar privadaque expulsourebeldes de Angola e Serra Leoa. A ExecutiveOutcomes(EO) foi fundada em 1989 por EebenBarloe.A essência da actividade da empresa se configurava em operações tácticas altamente especializadas de combate militar (Miguel, 2011:9), e essa característica se deve pelo retrospecto de seus contractos, oriundos do 32° Batalhão, aos quais serviram no conflito de Angola (Ostells, 2012:195). A EO tinha basicamente dois tipos de contratos celebrados, e eles poderiam ser mais amplos ou mais detalhados: no primeiro caso, a empresa disponibilizaria todos seus esforços e recursos necessários para definir o conflito. No segundo caso, a empresa complementaria as operações do cliente através de tarefas especializadas (Miguel, 2011:10).
Para o caso angolano a ExecutiveOutcomes entra no mercado e a primeira acção importante que a EO realizou foi para o governo de Angola, mais especificamente para o Movimento Popular de Libertação de Angola (MPLA). Logo após a independência de Angola, a MPLA confrontou-se com o partido anticomunista, a União Nacional para a Independência Total de Angola (UNITA), entrando numa guerra civil. Durante a Guerra Fria, os dois lados receberam armas e financiamento de seus apoiadores, MPLA da União Soviética e a UNITA dos EUA e África do Sul aliado local (Ostells, 2012: 196). Com o fim da Guerra Fria, veio o fim do apoio de armas e dinheiro de ambos os lados. As partes envolvidas no conflito precisavam de alguma forma para financiar suas operações.A UNITA preferiu extrair diamantes da região sul de Angola. O MPLA, por outro lado obteve seu financiamento através das jazidas de petróleo, ao largo da costa da capital Luanda. Estas novas fontes, deram uma continuidade para a guerra civil, no caso da MPLA possibilitou até a contratação da ExecutiveOutcomes: Fragilizado pela queda de seu protector soviético, o MPLA decide recrutar novos soldados de fortuna para garantir sua vitória. O dinheiro do petróleo permite pagar os soldos desses mercenários estrangeiros. Uns cinquenta combatentes, que, em sua maioria, tinham combatido antes pela UNITA, passam assim a servir o MPLA na primavera de 1993 (OSTELL, 2012:196). Neste contexto, foi construída a reputação da EO, mais precisamente na batalha nas instalações de petróleo de Soyo na boca do Rio Congo situada no norte de Angola. Entre Março e Abril de 1993, as forças da ExecutiveOutcomes, representando as forças da MPLA, entraram em combate contra os rebeldes da UNITA, lideradas por Jonas Savimbi. Os 28 combatentes por parte da EO demonstraram "capacidade de combate fora do vulgar, morreram apenas três sul-africanos do lado da EMP e várias centenas de guerrilheiros da UNITA." (MIGUEL, 2011:9). Essa batalha representou a reconquista dessas áreas petrolíferas por parte do governo, antes nas mãos de Savimbi. Pelos resultados positivos, o governo de Luanda estendeu o contrato com a empresa até 1996 onde a "EO tem que se retirar sob pressão exercida pelos EUA e pela ONU sobre a MPLA." (OSTELL, 2012:196). Apesar deste afastamento, a consolidação da empresa em operações na África se fez evidente.
O outro exemplo da actuação da EOé o caso da Serra Leoa onde esta empresa também prestou serviços. De 1991 a 2002, Serra Leoa enfrentou uma guerra civil. Apoiada pelo líder rebelde liberiano Charles Taylor, a Frente Revolucionária Unida (RUF sigla em inglês para Revolutionary United Front) organização liderada por FodaySankoh, ex-cabo do exército serra-leonês, teve por objectivo derrubar o governo estabelecido, se concentrando nas fronteiras perto da Libéria, onde se marginalizaram e perpetuaram acções violentas em sua totalidade. Em 1992, os militares que lutaram contra a RUF realizaram um golpe de estado e destituíram o governo do poder. Essa nova junta foi liderada por Valentina Strasser, que diante de pressões internacionais prometeu realizar eleições democráticas em três anos, ao final de 1995. Muito desse conflito advêm da riqueza de recursos naturais que Serra Leoa possui - em especial, diamantes. Contudo, essa riqueza não permanecia no país, pois Serra Leoa estava presa a licenças internacionais confiadas a estrangeiros que corrompiam o poder vigente. Sabendo desse valor a RUF aspirava primeiramente às áreas diamantíferas, pois essas serviam para financiar o tráfico de armas e drogas na região. (Ostells, 2012:196-197). A RUF, depois que roubou as áreas produtoras de diamantes, avançou cada vez mais. Quando os rebeldes estavam às portas de Freetown, a capital de Serra Leoa, o governo de Strasser recorreu a ExecutiveOutcomes, e em maio de 1995, fechou um contrato que primeiramente enviou 50 contractors. Nos seis meses seguintes chegariam mais 130. Depois da liberação de Freetown pela EO, o alvo da empresa voltou-se para a retomada das áreas diamantíferas Kono-Koidu. Em poucos dias a EO expulsou os rebeldes da região de Kono com poucas baixas, tendo como o saldo mais importante que os rebeldes perderam sua forma de financiamento mais produtiva. Em Janeiro de 1996, a Empresa Militar Privada EO estava se preparando para fazer o ataque final à base da RUF. As eleições livres puderam ser realizadas e Ahmed TejanKabbah foi eleito. Com ele no comando, o contrato com a empresa foi postergado até o fim daquele ano.
A identidade está relacionada aos combatentes, pois estes muita das vezes se organizam na base de diferentes estratos sociais, Kaldor discuti sobre os tipos de identidade que são mobilizáveis para a guerra. Estas normalmente estão localizadas num nível, em que o povo clama pelo poder baseado em estratossociais, religiosos ou regionais.
A identidade étnica também se revela pertinente neste tipo de conflito, pois em Africa a delimitação de fronteiras foi apenas de caracter geográfico e não de caracter étnico, o que significa que não há uma correlação entre a etnicidade e a geografia, o que cria também varias situações de conflito em Africa.
Temos o exemplo concreto do genocídio de Ruanda de 1994, este ocorreu devido a homogeneidade étnica, pois em 1959 houve um derrube da monarquia Tutsi pelos Hutus, onde dezenas de Tutsis fugiram para países vizinhos e criaram a Frente Patriótica Ruandesa (FPR), esta que invadiu a Ruanda em 1990 e lutou continuamente ate que em 1993 chegaram a um acordo. Na noite de 6 de Abril de 1994, houve o derrube do avião que transportava o presidente do Ruanda, Juvenal Habyarimana e o presidente do Burundi, CyprienNtaryamira, ambos hutus , o que criou descontentamento, e os extremistas hútus culparam a FRP, e imediatamente começaram a organizar uma campanha organizada de assassinato.
3.2.Método de Combate
A segunda característica das novas guerras é o modo de guerra, pois, este tipo de guerra é caracterizada por uma não clara distinção entre guerra e o crime organizado. Em ambos casos existe violação massiva dos direitos humanos. Se distinguindo assim da visão do Clausewitz sobre a guerra.
Nestas novas guerras, muito das vezes os rebeldes desenvolvem um modo de guerra do tipo guerrilha, para se movimentar em torno de uma grande concentração de forças militares, estas caracterizadas pelo seu modo convencional de guerra. Na guerrilha o território fica sob controlo político da população e os ataques ou batalhas directas são evitadassempre que possível.
A contra-insurgencia, é uma táctica desenvolvida pelo estado, que consiste em ganhar de volta os corações e as mentes da população local. Porem também haja por vezes o uso da forca, matanças, como também a intimidação psicológica, política e económica.
Nas novas guerras a violência é direccionada geralmente aos civis, sendo que a violência aqui é usada para meter medo e criar conflitos, e não para derrotar o inimigo como nas guerras convencionais. Nestas guerras também usam-se armas mais leves e menores, e não encontramos mais exércitos, mas sim as populações locais que lutam em guerras de soldados, as habilidades militares estão cada vez mais ausentes.
Temos exemplo concreto de Moçambique no âmbito da Guerra Civil, entre o governo da Frelimo e a Renamo, em 1975 verificando-se o seu termino com a assinatura dos acordos gerais de paz em l992. Neste conflito a Renamo vez o uso da guerrilha, sendo esta uma estratégia de longa duração que durou 16 anos, onde se verificava um acordo intimo entre a população e os guerrilheiros em Gorongosa.
3.3.Economia de guerra
Nestas situações a participaçãopública é relativamente baixa, e o desemprego da economia é extremamente elevado. O acontece nestas situações é que, forcas envolvidas no conflito pagam os seus próprios gastos, através da pilhagem, raptos, saqueando como também através de assistência externa. O comércio ilegal ajuda a financiar as actividades; os exemplos claro destas actividades ilegais incluem a venda de armas e drogas, trafica de seres humanos, e actividades no mercado negro (Walter, 2001:519).
Segundo a Kaldor (2006:112), afirma que economia torna-se informalizada, no qual somente aqueles que estão dentro da guerra beneficiam-se.
A populacao muita das vezes torna-se deslocada e consequentemente refugiada, sendo necessário a criação de campos de refúgios em algum lugar. A ajuda humanitária muita das vezes não é suficiente e as condições de vivência dos refugiados no campo torna-se insuportável, como da cria oportunidade para a mobilização política. (Kaldor, 2006:113-114).
A economia das novas guerras tem um efeito spill-over, o que cria uma situação de insegurança na região, pois os refugiados podem criar instabilidade nos países que os recebem, pois os mesmos precisaram de recursos tais como alimentação e habituação que podem ser escassos nos países receptores.
4.Causas das novas guerras em África
As principais causas do conflito em África, obrigatoriamente passam pela relevância da pobreza e a sua relação com a ocorrência de conflitos armados.
Pobreza
Segundo Tiburcio(2009:124), os países com renda per capita baixa estão em maior risco de conflitos armados. Esta constatação, caso confirmada tem grande peso pois, desafia a teoria de que os conflitos civis tem suas raízes principais em queixas ou ressentimentos (grievances) socio-económicos, políticos e culturais que geram insatisfações generalizadas e resultam em rebeliões armadas. A pobreza estaria acima das queixas étnicas nas guerras por recursos, pois a ganância (greed) dos empresários bélicos seria o real combustível dos conflitos armados em países pobres.
De facto, guerras civis ocorremincomparavelmente mais em países pobres do que os países de renda media ou alta. Assim pobreza medida através de produtos internos brutos per capita baixos, tem indicado uma relação estaticamente significativa com um risco maior de conflito civil.
Em África verifica-se também uma maior presença de jovens sem perspectiva de vida que pode facilitar o recrutamento (comumente, forcado) de combatentes, alem de tornar a reposição de feridos e mortos menos onerosa. Os baixos níveis educacionais também estão relacionados a pobreza e podem contribuir para maiores riscos de conflitos armados. Na média, países dependentes de exportações de commodities de alto valor, tendem a crescer mais devagar, quando comparados a países com pouco disponibilidade de recursos (Ibid:125).
As Políticas de Identidade
Em termos gerais, a expressão "políticas de identidade" faz referência a movimentos mobilizados em torno de identidades étnicas, raciais ou religiosas com o propósito de obter poder estatal. Dentro dessa concepção, uma dada "identidade" pode ser percebida como um rótulo sui generis (racial, cultural ou ambos), que serve de base para reivindicações políticas.Uma forte razão para isso está na utilização de identidadespolíticas, como um direito nato ("etnia"), não raro apresentado em termos nacionalistasou religiosos, que serve de base para polarizar estruturas sociais a fim de produzir o queentendemos por "conflito étnico". E, em áreas de conflito endêmico, onde estasestruturas polarizadas se encontram historicamente presentes, políticas de identidadetendem a adquirir tons extremistas, transformando-se em fundamentalismo, isto é, emuma rígida adesão/obediência a determinada doutrina (Kaldor, 2007:80).
Políticas de identidade carregam uma lógica de fragmentação social, que emergena década de 1990 em resposta a erosão das estruturas estatais forjadas durante a GuerraFria. Percebe-se, assim, o efeito desagregador da onda globalizante, que percorreu omundo nessa época, de forma ainda mais notável naqueles Estados autoritários ecentralizados que integravam o império soviético, cujos espaços de economiaplanificada passariam por um rápido processo de desregulamentação. Esse efeito,atrelado a perda de legitimidade de Estados pós-coloniais na África e sul da Ásia, oumesmo ao declínio do estado de bem-estar nos países mais industrializados, propiciouum ambiente adequado ao desenvolvimento de novas formas de políticas de identidade.
Essas políticas tendem a adquirir significado através da insegurança, do reavivamentodo medo em relação a inimigos históricos ou pela percepção de se estar ameaçado por"outros", com rótulos diferentes (Ibid:81).
Segundo Mary Kaldor (2007:82-85), asnovas políticas de identidade, que emergem nesse contexto, originam-sefundamentalmente de duas fontes, ambas conectadas ao processo de globalização: porum lado, aparecem como uma reacção à crescente impotência e declínio de legitimidadedas classes políticas estabelecidas, como uma forma de mobilização política ante aperda de influência dos movimentos nacionalistas pós-89; e por outro, emergemtambém da crescente insegurança atrelada ao processo de globalização, particularmentecomo a advento de "economias paralelas" em espaços de rápida e incontroladadesregulamentação, caracterizados por forte competição política sobre o controle dedeterminados recursos escassos, como terra, petróleo e minérios.
A falta de legitimidade política
Guerras de terceiro tipo predominam no sistema internacional desde 1945. Elas persistem e persistirão no futuro. Porque em muitas regiões do mundo a disputa em torno de quem controlará o Estado e a relação do mesmo com suas nações, comunidades e povos que vivem em suas fronteiras não foi resolvida com a descolonização. Em particular, Estados fracos – não no sentido militar, mas em termos de legitimidade e eficácia – são e serão os locais de guerra. (Holsti, 1996: 40).
Para Holsti (1996:40), haveria duas dimensões que compõem a legitimidade política: a vertical, relativa aos princípios que embasam o direito a governar, e a horizontal, que se refere à definição da comunidade sob a qual o governo é exercido.
Guerras de terceiro tipo têm diversas características únicas. Suas histórias variam, assim como seus resultados – derrota dos insurgentes na Malásia, vitória na Argélia, impasse na Caxemira e no Sudão – mas todas têm uma fonte comum: a definição da comunidade política legítima e a busca pela condição de Estado. A mística do Estado e da "nacionalidade" move as guerras de hoje, assim como equilíbrio de poder, sucessões, disputas por hegemonia e rivalidades sobre colónias moviam as guerras do século XVIII (Holsti, 1996: 41).
Dentro das características estruturais dos Estados saídos do processo de descolonização, três saltam aos olhos. Em primeiro lugar, temos um nível baixo (ou mesmo completa ausência) de legitimidade vertical, isto é, parcelas substanciais da população rejeitam o Estado e negam lealdade às lideranças. Em segundo lugar, há uma personalização do Estado, o qual é muitas vezes apenas um reflexo do líder, tornando a distinção entre o público e o privado, no mínimo, opaca. Em terceiro lugar, tais países carecem de legitimidade horizontal, ou seja, não há uma única comunidade política; pelo contrário, há uma disputa para definir o critério de pertencer, seja ele em termos de etnia, religião, classe, casta, dentre outros.
Considerações finais
Em África a maior presença de jovens sem perspectiva de vida facilitar o recrutamento de combatentes. Os baixos níveis educacionais que estão relacionados a pobreza contribuem para ocorrência de novas guerras.As novas guerras apresentam características diferentes das guerras tradicionais,devidoas suas formas de actuação como também aos seus mecanismos, os tipos de actores envolvidos, o armamento usado neste tipo de guerras e ométodo de combate.
Assim, em África verifica-se o aparecimento de grupos insurgentes, com novas formas de actuação, como: raptos de crianças e adultos. A populaçãodas regiões afectadaspor " novas guerrasʺ fica sem escolha a não ser de se aliar as forças governamentais ou aos rebeldes. É também notória a emergência de mercenários e de companhias militares privadas que tem desempenhado um papel significante para ocorrência de novas guerras.









Bibliografia
CLAUSEWITZ, C.Von (1972). De la Guerre, EditionsMinut. Paris
GROTIUS, H. (2004). O Direito da Guerra e da Paz. Editora Unijuri. São Paulo
HOLSTI, Kalevi( 1996). The State, War, and the State of War. New York: Cambridge University Press.
KALDOR, Mary(2007). New & Old Wars. 2nd Edition. Stanford, California: StanfordUniversity Press,
MIGUEL, N. G. (2011). Empresas Militares Privadas: Actores Privados Em Guerras Públicas. Lisboa: Instituto de Estudos Superiores Militares.
MOURA,Tatiana (2000).Novissimas Guerras, novíssimas pazes. Desafios Conceptuais e políticos.Centrode Estudos sociais.São Paulo
TIBURCIO, James Augusto (2009). Paz e Guerra em Angola: Um Estudo Exploratório. Brasilia.
OSTELLS, W (2012). História dos Mercenários: de 1789 aos nossos dias. São Paulo.
WALTER, B. F. (200l). "New andOldWars: OrganizedViolence in a Global Era by Mary Kaldor" in TheAmericanPoliticalScienceReview.
KRIGE, Greta (2008). Perspectives on ʺ New Wars" In Afrca: The Case ofSierra Leone. New York







II SECÇÃO
Autores: Carlos Macuácua e Raimundo Zebra
2. Terrorismo e seus efeitos
A partir do seculo XXI, o terrorismo ganhou uma dimensão inédita, antes restrito a regiões ou países com cismas sociais, culturais, económicos, religiosos ou étnicos, actualmente é colocado como pauta obrigatória na agenda de relações internacionais. Desde que foi estabelecido em dicionário pela primeira vez, há mais de dois séculos, o termo"terrorismo" teve diferentes significados e foi empregue para se referir a diferentes tipos, práticas, nos mais diversos contextos.
Segundo Laqueur, (2002:7) "nenhuma definição pode abarcar todas as variedades de terrorismo que existiram ao longo da história". Contudo, há autores que vão mais longe, ao argumentarem que a violência política não deve ser rotulada de terrorismo, dada a sua importância histórica no contexto das revoluções Inglesa (séc.XVII), Americana (1775-1783) e Francesa (1789-1799) que foram movimentos de ampla base popular e que envolveram as sociedades da época.

Portanto, existe uma definição específica que classifica o terrorismo em dois tipos, nomeadamente, primeiro "o agente usa uma forma de acção para atingir objectivos preciosos. Para este caso, a violência aplicada é pragmática, mais ou menos sob o controlo do agente que, pode mudar de estratégia, não necessariamente o uso de violência." Segundo, "o terrorismo pode ser uma lógica de acção. Nesse caso, os fins justificam os meios, e o agente apresenta uma acção sistemática e em cadeia, muitas vezes, só é interrompida pelo uso da forҫa, através da repressão, prisão ou morte", (Outhwait e Bottomore, 1996:36).
2.1. Historial do Surgimento do Terrorismo no Mundo
Fazendo uma breve retrospectiva histórica, verifica-se que os actos de terrorismo estão presentes desde o início da civilização. O facto mais surpreendente é que o agente mais letal nas acções de terror foi o próprio poder estabelecido, ora contra nações inimigas, ora contra o seu próprio povo como forma de repressão. O império Romano utilizou tácticas de terrorismo contra os povos dominados, com finalidade de baixar a moral e enfraquecer a resistência das tropas inimigas. A expressão utilizada na época era guerra punitiva, que mais tarde, foi substituída por guerra destrutiva. Entre os actos inomináveis praticados pelas legiões romanas estavam a violência sexual e saques, como forma de recompensa aos soldados, já que eram extremamente mal remunerados, (Carr,2002:77). Entretanto, "é a partir das décadas de 1970 e 1980 que diversos estudiosos desta matéria traçam o histórico do terrorismo com carácter firmemente internacional. Na formulação de Brian Jenkins (1978:116), um tipo de terrorismo "onde os terroristas cruzam fronteiras para atacar, escolhem alvos por suas conexões com Estados onde são estrangeiros, atacam aeronaves em vôos internacionais ou desviam aviões para outros países".
Para Cronin (2002:37), "esse novo fenómeno aparece, em parte, como resultado dos avanços tecnológicos e, em parte, como reacção a explosão da influência da média internacional". De fato, os avanços na tecnologia e na comunicação e suas implicações para as relações políticas e sociais estão directamente ligados a transformações do terrorismo no fim do século XX.
No fim da década de 1960 e a durante a década de 1970, "o terrorismo continuava a ser visto como parte de um contexto revolucionário. No entanto, o uso foi expandido para incluir grupos nacionalistas e étnico-separatistas fora do contexto colonial ou neocolonial, assim como organizações radicais e inteiramente motivadas por ideologia" (Hoffman, 2006:16).
2.3.Finalidade do Terrorismo
Provocar reacções indiscriminadas ou provocar a repreensão, desmoralizar as pessoas, criando, de modo geral, uma atmosfera de ansiedade, medo e insegurança manter a disciplina na organização terrorista ou forcar a obediência interna, dissolver as normas sociais, publicitar a causa, fazer propaganda através da acção e obter recursos financeiros para, por exemplo, adquirir armas ou e explosivos (Silva, 2005:32).
O terrorismo político é caracterizado pela referência a uma movimentação política, ideológica ou político-religiosa Silva citando Brian Jenkins (2005:33) " era necessário definir terrorismo de acordo com a qualidade do acto, não com a identidade do perpetrador ou a natureza da causa. Concluímos que um acto terrorista era, antes de mais nada, um crime no sentido clássico, como um homicídio ou sequestro, embora por motivos políticos".

2.4.Alvos de Acções Terroristas
Os terroristas cometem actos violentos, a fim de captar a atenção dos públicos e das suas vítimas imediatas. Os seus alvos são escolhidos de forma indiscriminada. O público-alvo pode variar entre um determinado segmento do governo para toda a comunidade internacional em geral. Importa sublinhar que a loucura calculada de terrorista consiste, precisamente, no facto das vitimas terem pouco ou quase nada a ver a sua revindicação e terem ainda menos capacidades de cumprir as exigências requeridas, (Dougherty e Pfaltzgraff, 2003:495).
3.Terrorismo em África
Egipto
De alguma forma, o Egipto é o berço do terrorismo religioso e do integrismo islâmico contemporâneo. À semelhança do que aconteceu no Sudão, no Egipto os intérpretes do fundamentalismo sempre ameaçaram tomar o Poder. "No Egipto proliferam as (Gamaa't) Braço Armado da Irmandade Muçulmana, grupos armados radicais originados a partir da "Irmandade Muçulmana". Estas células terroristas surgiram nos anos setenta entre os movimentos estudantis, e representavam uma espécie de núcleo juvenil dos ancestrais "irmãos muçulmanos". Certa altura, porém, no momento em que aderiram à violência e à prática de actos terroristas, esses jovens idealistas tornaram-se incontroláveis e romperam a sua ligação paternal", (Barrau, 1993:79).

A Irmandade Muçulmana, cujo líder e guiaespiritual na altura, Mohamed Hamed Abu ai-Nasr, indivíduo fiel aos valoresda moderação.Hoje, a responsabilidade pelo maior número de atentados ocorridos no Egipto é atribuída às Gamaa't ai Islamya, que normalmente reivindicam as acções que protagonizam. Exemplo disso foi o atentado cometido na Etiópia contra o Presidente Mubarak, embora se admita que se tratou de uma acção concertada com o Sudão. As Gamaa'taIIslamya reconhecem o Xeque, Omar Abdel Rahmane, um invisual de 65 anos, exilado nos Estados Unidos da América (E.U.A) desde 1990 e recentemente sentenciadopela autoria moral e instigação de diversas acções terroristas, designadamente doatentado ocorrido no Cairo em 1994.


3.1.Alvos dos ataques da Irmandade Muçulmana
Numa fase inicial, estas milícias terroristas elegeram alvos domésticos: intelectuais, escritores, jornalistas e professores e outros indivíduos que, de uma forma ou de outra, se manifestavam a favor da normalização das relações com o ocidente, da paz israelo-árabe (veja-se o caso do escritor NaguibMahfouz) ou que suprema blasfémia ousassem contestar o rigor doutrinal da Sharia.
Estes grupos terroristas também não tardaram em demonstrar a sua fúria xenófoba, perpetrando múltiplos atentados contra cidadãos estrangeiros. São, aliás, responsáveis pela ruptura do tradicional influxo turístico no Egipto, sector da economia que se debate com uma crise sem precedentes.

3.2.Acções terroristas
Desde Março de 1992, O marco cronológico que assinala o recrudescimento da violência integrista na terra dos faraós, foram desferidos inúmeros ataques contra estrangeiros, de que já resultaram 43 mortos e mais de 60 feridos graves.
O último atentado, certamente, o mais mortífero e sangrento provocou a morte de 18 turistas gregos e ferimentos noutros 15 abatidos a tiro por presumíveis membros das Gamaa't ai lslamya. Estes números dispensam outro tipo de comentários, ilustrando a apetência dos extremistas para infligirem baixas aos infiéis ocidentais.
3.3. Revindicações da Irmandade Muçulmana
As pessoas têm medo e, paulatinamente, o Egipto transforma-se numa rota turística interdita, facto que entronca, perfeitamente, nos objectivos integristas. No plano interno, as Gamaa't ai lslamya, prosseguem a luta armada para derrubarem o regime. Publicamente, os seus dignitários já declararam que, tal como Anwar Sadate, Hosni Mubarak será morto, pois também utiliza a linguagemprópria dos infiéis. Entendem que os governos devem orientar-se pelo Alcorão e pela tradição maometana. As leis e constituições em vigor jamais serão aceites pelos islamitas convictos.
Mas a capacidade operacional destas milícias terroristas estende-se além-fronteiras. Para além do já referido atentado contra o Presidente Mubarak, perpetrado na Etiópia, as Gamaa't reclamaram a responsabilidade pelo rebentamento de um carro armadilhado na Croácia em Outubrode 1995 que provocou um morto e 29 feridos e no mês seguinte, os seus comandos colocaram uma bomba na Embaixada do Egipto em Islamabad, capital paquistanesa, de que resultaram 17 mortos e cerca de 60 feridos, (Barrau, 1993:81).
Este movimento terrorista não circunscreve ao Egipto o seu território de intervenção, revelando uma preocupante plasticidade e poder de actuação desdobrado, nos quatro cantos do mundo referenciados.
Nigéria
No norte da Nigéria, as regras são ditadas por etnias de maioria muçulmana, onde os Hausa-Fulani são especialmente influentes, até pelas suas relações internacionais com irmandades muçulmanas em África e no Médio Oriente. O centro operacional do grupo terrorista BokoHaram é o Norte, mas também impõe a sua violência no Sul. A intensidade (também em número) das actividades terroristas mais recentes do BokoHaram é motivo de grande preocupação em Africa concretamente na região do Sahel.
4.Entrevista com Emílio Zeca (Cenário BokoHaram):
- Antes de tudo, o conceito BokoHaram é problemático. Para uns significa terrorista, outros lutadores de libertação. Mas, a Resolução de Conflito e Segurança distingue claramente o terrorista do lutador de libertação. Portanto, Terrorista usa terror nas suas incursões e acções com objectivos políticos, enquanto o lutador de libertação tem um ideal mais abrangente, que é a libertação de um povo. Todavia, não há dúvida que o grupo BokoHaram usa terror. Este emergiu no Estado nigeriano, fundado por indivíduos apologistas da Al Qaeda, tendo como elemento ideológico a questão do cristianismo e educação ocidental como uma vida pervertida. Essencialmente, o termo BokoHaram traduzido em línguas nativas nigerianas significa luta ou posição contra educação ocidental. O contexto do surgimento deste grupo é mais alargado, não é somente a questão da educação ocidental, há outros factores: caso da implementação da Charia como uma lei de orientação política, social e até económica do povo nigeriano. Mais do que isso, o grupo acusa o Estado de ser corrupto, recorrendo a implementação daquela doutrina islâmica para combater os males, nomeadamente, perversão ocidental cristã, prostituição e corrupção.

Como podia se evitar o seu surgimento
- Em estratégia, há um princípio que preconiza: "Nunca se pode menosprezar o adversário sob o risco de ter surpresas estratégicas." Parece-me que houve menosprezo das capacidades do grupo BokoHaram em fazer face ao exército nigeriano. O outro factor explica-se pelo facto do exército da Nigéria sempre pretender transmitir a ideia de ser forte, sobretudo, nas incursões militares que a Comunidade dos países da África Ocidental (CEDEAO) tem vindoafazer, com vista a reestabelecer ou impor a paz na África Ocidental. Portanto, com a actuação do BokoHaram constatou-se que o exército nigeriano tinha muitas lacunas, com enfoque para a prontidão militar ainda defeituosa.
Não se pode esquecer da estrutura político-administrativa da Nigéria, que é essencialmente de Estados Federados, com uma certa autonomia administrativa e segurança. As acҫões deste grupo sempre foram terroristas, pois atacam nos momentos em que todos pensam que a segurança está garantida. As Forças de Defesa e Segurança nigerianas falharam na componente de inteligência, em grande escala nas previsões ou antevisões, que este grupo rebelde podia representar em termos de ameaça. Ademais, este grupo extrapolou as fronteiras, e passou a atacar países vizinhos como os Camarões e a Costa do Marfim. BokoHaram detém o controlo de vários estados do norte que têm o nível de escolaridade baixo, alta taxa de pobreza, e onde a educação islâmica é um dos elementos de instrumentalização e politização.
Medidas para solucionar o conflito
-Em termos de resolução de conflito, tendo em conta actores terroristas, há uma doutrina dominante, segundo a qual não se negoceia com terrorista. Todavia, há uma outra abordagem em emergência (ainda não consolidada) que procura saber quais são as reais motivações dos terroristas para que se avance com os mecanismos alternativos da resolução do conflito. Portanto, o terrorista na sua essência é um actor político ou social, que se encontra numa situação da percepção de ser marginalizado. Ele usa o terror como instrumento de luta, por isso, alguns teóricos defendem que terrorismo é um mecanismo de luta de pobres, e a guerra, estratégia de luta de ricos. A segunda abordagem relativa à negociação tem a ver com a percepção da revindicação dos terroristas.
Esta parece ser a forma mais recomendada para o contexto actual de terrorismo. Desde a emergência do estado islâmico, nota-se uma mudança na acҫão dos terroristas: antes levavam a cabo as suas actividades de forma clandestina, actualmente temos um Boko Haram com duas faces, nomeadamente com características de um Estado islâmico, do outro da Al Qaeda de Magrebe, que forma um triângulo de acҫões bárbaras. Parece-me que uma espécie de negociação, com a tentativa de percepção das reais motivações terroristas, pode ajudar na resolução de um conflito desta natureza. A partir desta via, pode-se desenhar políticas públicas de integração destes grupos para que não olhem o terrorismo como meio da obtenção e controlo do poder. Este assunto è multidisciplinar, e implica coordenações multilaterais, porém, não devia ser sό o exército a resolver questões terroristas, mas também antropólogos, juristas, incluindo o pessoal da resolução de conflitos para pacificar e propor mecanismos.
Descontentamento em relação ao sistema governamental
- Podíamos explicar este fenómeno de uma forma simples. Se o grupo Boko Haram pretende instaurar a charia como a lei de orientação política, económica e social da Nigéria, esperaríamos que se transformasse num partido político, e que concorresse nas próximas eleições. Todavia, este grupo é considerado terrorista, logo não tem reconhecimento internacional, muito menos uma convivência política. Zeca conclui que o tipo de reivindicação manifestado por este grupo desajusta-se ao mecanismo ideal que é apresentado para se ascender e controlar o poder. Uma vez que o Boko Haram não legitima o regime político nigeriano vigente por alegadamente apresentar sinais de corrupção. "O norte da Nigéria é uma região pobre, o sul é rico por causa do petróleo e gás, e em muitos Estados há sempre essa disputa de lugares onde há recursos. Só com "lentes" podíamos perceber a relevância da revindicação deste grupo que não poupa crianças e mulheres nos seus ataques.
Autoria: Carlos Macuácua, publicada in Semanário Debate, 28/02/2015.
Argélia
O fenómeno integrista é característico de vários países africanos, mas é na Argélia que se localiza pelo menos desde 1992, o epicentro da agitação social e do terrorismo urbano. A insurreição armada do (GIA) Grupo Armado Islâmico, na sequência da impugnação das eleições legislativas de Dezembro de 1991 que lhe conferiam a vitória com maioria absoluta deixou o maior país do Magrebe mergulhado num estado geral, de calamidade pública e em situação de literal guerra-civil.

Diariamente, a um ritmo verdadeiramente torrencial, chegam notícias deatentados que causaram invariavelmente, vítimas mortais. Nem as mulheres,que conforme postula a lei islâmica pertencem a um género inferior e poresse motivo não devem ser molestadas ou agredidas têm sido poupadas à fúriaintegrista na Argélia. Recordam-se, a propósito de dois eloquentes episódios ocorridos em 1994 sem misericórdia, duas freiras espanholas foram liquidadas a tiro num atentado cometido contra a comunidade católica indígena, um padree uma freira, ambos de origem Sul-Africana foram impiedosamente abatidosGoytisolo, 1994:91).Desde o Verão de 1994, cerca de 700 estabelecimentos de ensino em Argel foram incendiados ou destruídos por grupos radicais islamitas, e um número estimadoem mais de meia centena de docentes e responsáveis escolares, foram assassinados. A espiral de violência desencadeada na Argélia é devida fundamentalmente,à acção terrorista de duas organizações armadas: O (GIA) o mais temível e destacado e o (EIS), Exército Islâmico de Salvação, (ibid).

Argélia: Centro de Referência e de Lideranças para a AQIM
O estudo feito a partir da leitura de jornais e confrontação de dados constata que a Argélia continua a ser o centro de poder da AQIM no Norte de África. 'A organização resulta de uma evolução histórica que remonta a 1990, quando uma coligação de partidos muçulmanos, a Frente Islâmica de Salvação (FIS), foi a mais voltada das eleições municipais e provinciais de 12 de Junho de 1990, bem como nas eleições presidenciais de 25 de Dezembro de 1991, mas foi impedida de assumir o poder pelo Conselho Superior de Segurança da Argélia, que anulou o acto eleitoral e desmantelou a FIS a 4 de Março de 1992. Membros radicais da FIS, alguns dos quais veteranos da guerra do Afeganistão, reorganizaram-se sob novo nome, Grupo Islâmico Armado (GIA), e assim intervieram na guerra civil da Argélia (de Dezembro de 1991 a 2002) sob a forma de Jihad magrebina (inicialmente regional) com ligações à Jihad global desenvolvida a partir do Afeganistão", (Filui,2010: 2).
Enquanto a FIS e o seu Exército Islâmico de salvação (EIS) tinha alvos militares, o GIA impunha o terror principalmente a civis. A FIS propôs uma trégua em 1997, ao aperceber-se que a população se revoltava contra o terrorismo de que era alvo, e porque não se queria confundido com o GIA. Este último foi derrotado durante a guerra civil argelina; mas renasceria sob nova designação, GSPC, por volta de 1998 sob a batuta de Hassan Hattab, ex-membro da GIA, um pára-quedista argelino nascido em 1967. Os ataques terroristas passaram então a visar mais alvos militares e policiais do que civis, (ibid). No pós-11 de Setembro de 2001, destacam-se os dois atentados terroristas com carros bomba a 11 de Abril de 2007 em Argel, resultaram em mais de trinta mortos e foram assumidos por Samir Saiud (conhecido por Abu Moussab) um argelino, veterano do Afeganistão, engenheiro de profissão e especialista em explosivos. Seguiram-se os ataques terroristas de Julho, Setembro e Dezembro do mesmo ano. Neste período destaca-se o carácter simbólico do ataque de 11 de Dezembro de 2007, em que a AQIM protagonizou um ataque bombista ao edifício da ONU na capital da Argélia, Argel. O que poderá ter sido uma acção de imitação, à semelhança do ataque suicida organizado por Abu Musab al-Zarqawi (um militante jordano de ascendência palestiniana com ligações à Al-Qaeda desde 2004) contra as instalações da ONU em Bagdade (Iraque) em 2003 e que matou o Alto-comissário das Nações Unidas para os Direitos Humanos, o brasileiro Sérgio Vieira de Mello.

5. Considerações gerais:
O terrorismo é uma violência armada contra civis e uma forma instrumental de fazer disseminar o pânico no seio de um povo, um governo ou um Estado. O terrorismo é um fenómeno com História nas relações internacionais. Independentemente das causas e das desculpas invocadas pelos seus agentes para o justificar, o terrorismo é uma forma de exercer poder que almeja consequências, pelo que é planeado pragmaticamente. Sendo assim, é útil analisá-lo ao nível das causas e consequências, que acabam por ser mais ou menos padronizadas e estudadas, e que conferem características especiais a este fenómeno, mesmo agora que adoptou um perfil mais pós-moderno e transnacional na contemporaneidade.Em relação ao terrorismo no continente africano, importa ressalvar que os grupos terroristas que perpetuam acções terroristas neste continente têm como característica comum a concepção do cristianismo e educação ocidental que são vistos como uma vida pervertida. Estes grupos terroristas apresentam sempre motivações religiosas para justificarem suas acções. A outra tem a ver com as suas acções, os terroristas cometem actos violentos, a fim de captar a atenção dos públicos e das suas vítimas imediatas. Os seus alvos são escolhidos de forma indiscriminada. O público-alvo pode variar entre um determinado segmento do governo para toda a comunidade internacional em geral.


Bibliografia
Para além das notícias e informações avulsas colhidas em diversos órgãos de imprensa nacional e internacional, as principais fontes bibliográficas para a redacção do presente artigo foram as seguintes:

Dougherty, E. James e Robert Pfaltzgraffjr.(2003): Relações Internacionais – As teorias em confronto. 1ª Edição, Gradiva: Lisboa.

BRIERE, Claire& BLANCHET, Pierre (Em entrevista com Michel Foucault) (1980), «Irão: A Revolução em Nome de Deus»,Lisboa: Moraes Editores

ROUSSELLIER, Jacques (2011). "Terrorism in North Africa and the Sahel: Al- Qa'ida's Franchise or Freelance?" Policy Brief, Middle East Institute, N. º 34, August, pp. 1-10.

SANTOS LOPES, Margarida (2010). Novo Dicionário do Islão – Palavras, Figuras e Histórias. (2ª Edição) Alfragide: Casa das Letras.

RUBY, Charles L.(2002). "The Definition of Terrorism",Analyses of Social Issues and Public Policy, The Society for the Psychological Study of Social Issues, pp. 9-14.










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