Vítimas do Fogo Cruzado

June 28, 2017 | Autor: Rodrigo de Azevedo | Categoria: Segurança Pública
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3

PrOA , 11 de outubro de 2015

TAXAS DE MORTES VIOLENTAS POR 100 MIL HABITANTES NOS ESTADOS

66,5

Alagoas 50,8

Ceará

50,0

Rio Grande do Norte

48,9

Sergipe 44,8

Pará

42,9

Goiás

42,6

Mato Grosso

42,2

Espírito Santo

41,4

Bahia 38,4

Paraíba

37,0

Pernambuco

Socióloga, professora da UFPEL e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

32,2

Maranhão

30,9

Rondônia 26,8

Acre

26,5

Amazonas

25,8

Distrito Federal

25,3

Paraná

24,4

Mato Grosso do Sul

24,1

Tocantins

22,9

Piauí

22,2

Rio Grande do Sul 19,7

Minas Gerais 14,7

Roraima

Fonte: Anuário Brasileiro de Segurança Pública

FERNANDA BESTETTI DE VASCONCELLOS

34,7

Rio de Janeiro

São Paulo

Sociólogo, professor da PUCRS e membro do Conselho do Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

35,6

Amapá

Santa Catarina

POR RODRIGO GHIRINGHELLI DE AZEVEDO

13,8 12,7

Quando foi criado, em 2006, um dos principais objetivos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública era o de qualificar o debate sobre o tema, buscando identificar e difundir boas práticas de redução da violência e dar transparência aos dados da criminalidade e da gestão da segurança pública no Brasil. Com a publicação da 9ª edição do Anuário Brasileiro de Segurança Pública, podemos dizer que o objetivo de aumentar a transparência foi atingido, mas não foi acompanhado por uma melhora sustentada da gestão da segurança. Utilizando dados fornecidos pelas secretarias estaduais de segurança pública referentes ao ano de 2014, a última edição do Anuário chama a atenção para o fato de que, depois de um período (iniciado no ano de 2003) de redução e estabilização das ainda muito elevadas taxas de mortes violentas intencionais (que incluem homicídios, lesões corporais seguidas de morte, latrocínios e mortes praticadas pela polícia), a curva volta a subir a partir de 2012, e o ano de 2014 marca um novo recorde, sendo ultrapassado o alarmante e absurdo índice de 58 mil mortes ao ano, o equivalente a uma taxa nacional de 27,8 casos por 100 mil habitantes. Os números apresentados pelo Anuário permitem constatar que há diferenças de Estado para Estado, mas no

Levantamento do Fórum Brasileiro de Segurança mostra aumento do número de mortes violentas e sinaliza o desgaste das políticas tradicionais de combate ao crime no país

Vítimas do

fogo cruzado último período o aumento dos homicídios foi verificado em 18 das 27 unidades da Federação, e aqueles que não acompanham a tendência de aumento apresentam pequena redução em relação ao ano anterior. O maior crescimento pode ser observado em alguns Estados da região Nordeste, mas também no Rio Grande do Sul, que apresentou o segundo maior crescimento, da ordem de 21,1%. O Anuário compila dados oficiais e apresenta estatísticas sobre o gasto com segurança pública no país e em cada Estado, os números da população carcerária e dos adolescentes submetidos a medida socioeducativa. O que se constata é que o gasto público no setor não é pequeno e tem aumentado, e as taxas de encarceramento também são cada vez maiores. O que estes números demonstram é que a fórmula tradicional de combate ao crime e à violência é cara e não traz os resultados esperados. Em um cenário marcado pela dificuldade de integração entre as polícias, ausência de mecanismos de controle efetivos da atividade policial, descontrole do superlotado ambiente carcerário e disseminação da violência nos conflitos cotidianos e nas disputas entre grupos ligados aos mercados ilegais, as poucas experiências exitosas, como o Pacto Pela Vida em Pernambuco, não conseguem se manter ao

longo do tempo, pela falta de reformas estruturais no setor e pela falta de um comprometimento maior da União na indução de políticas de segurança e dos municípios na implementação de programas de prevenção. A aposta tradicional tem sido a de colocar toda a responsabilidade na redução da criminalidade nas mãos das polícias, carentes de uma reestruturação que racionalize a utilização de recursos escassos e viabilize a melhoria das taxas de esclarecimento de crimes graves, e que aproxime as estruturas policiais da comunidade. O resultado é uma dinâmica de criminalização que apenas atua no varejo dos mercados ilegais, superlotando presídios e instituições de internação juvenil e potencializando a capacidade de arregimentação das facções criminais. Inverter essa lógica passa, em primeiro lugar, por qualificar o debate e abandonar a postura de muitos gestores, que adotam a máxima de que “o que é bom a gente divulga, o que é ruim a gente esconde”. Também não é mais possível iludir a sociedade com afirmações como “a polícia prende e a justiça solta”: a legislação penal é uma só para todo o país, e investindo em prevenção, no controle de armas e na qualificação da atuação das polícias, integradas territorialmente e mais próximas da comunidade, alguns estados têm obtido, pelo menos em pe-

ríodos em que os governos assumem protagonismo na área, resultados importantes na redução da violência. O Anuário apresenta também uma pesquisa, realizada pelo Datafolha, que demonstra que metade dos brasileiros concorda com a afirmação de que “bandido bom é bandido morto”. Afirmação corroborada por muitos porta-vozes da segurança pública, quando afirmam que a taxa de homicídios é alta porque são “bandidos matando bandidos”. Do outro lado, certos círculos universitários aderem a um discurso supostamente crítico, que coloca sobre os policiais e sobre o “sistema” a responsabilidade pela violência. No meio do fogo cruzado, mais e mais vidas humanas são perdidas, trazendo um custo social cada vez mais elevado em sofrimento e dor para as vítimas preferenciais, e acirrando as tensões sociais. Reverter este cenário através de um pacto nacional pela redução de homicídios, qualificando a atuação das polícias e investindo na soma de esforços do poder público e da sociedade civil, com foco na prevenção, parece ser a ação mais eficaz contra a opção pela chacina e pelo justiçamento. A receita já foi em parte experimentada e apresentou bons resultados. Por que não é aplicada?

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