2016_PROFESSORES UNIVERSITÁRIOS DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS: UM OLHAR PARA SUA FORMAÇÃO PEDAGÓGICA

May 28, 2017 | Autor: A. Franco da Rocha | Categoria: Education, Teacher Education, Science Education, Higher Education, Educational Research, Technology in Teacher Education, Teacher Research, Teacher Training, Teachers' professional development, ICT in Teachers Education, Teacher Development, Teacher professional development, Teacher, Educación, Educational Sciences, Science teacher education, Ensino, University, Sociologia da Educação, Science and Mathematics Education, Ciências Da Educação, Educação, Formação De Professores, DOCENCIA UNIVERSITARIA, Teacher Preparation, Formação de professores e prática pedagógica, Universidad, FORMACION DE PROFESORES, Ciencias Biologicas, Docencia, Educação científica e tecnológica, Ensino Superior, Maestría En Educación, Ciências da Educação - Formação de Professores, Docencia en educación superior, Maestria, Ciencias Biológicas, Ensino De Ciências, Enseñanza de las ciencias, Educação em ciências, SUPERVISÃO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES, Formación docente, Ciências biológicas, Docência no ensino superior, Sciences of Education, Teacher Training and Education, Formação docente continuada, Ensino de Biologia, Docência do Ensino Superior, Ensino De Ciências E Biologia, Maestria En Docencia Universitaria, Formação inicial e continuada, Pedagogia Universitária, FORMACIÓN DE DOCENTES, Teachers Training and Development, Actividad Docente, Higher Education Feminist Studies of Science and Technology, Departement of Educational Sciences, EDUCATIONAL DEVELOPMENT OF UNIVERSITY PROFESSOR, Technology in Teacher Education, Teacher Research, Teacher Training, Teachers' professional development, ICT in Teachers Education, Teacher Development, Teacher professional development, Teacher, Educación, Educational Sciences, Science teacher education, Ensino, University, Sociologia da Educação, Science and Mathematics Education, Ciências Da Educação, Educação, Formação De Professores, DOCENCIA UNIVERSITARIA, Teacher Preparation, Formação de professores e prática pedagógica, Universidad, FORMACION DE PROFESORES, Ciencias Biologicas, Docencia, Educação científica e tecnológica, Ensino Superior, Maestría En Educación, Ciências da Educação - Formação de Professores, Docencia en educación superior, Maestria, Ciencias Biológicas, Ensino De Ciências, Enseñanza de las ciencias, Educação em ciências, SUPERVISÃO E FORMAÇÃO DE PROFESSORES, Formación docente, Ciências biológicas, Docência no ensino superior, Sciences of Education, Teacher Training and Education, Formação docente continuada, Ensino de Biologia, Docência do Ensino Superior, Ensino De Ciências E Biologia, Maestria En Docencia Universitaria, Formação inicial e continuada, Pedagogia Universitária, FORMACIÓN DE DOCENTES, Teachers Training and Development, Actividad Docente, Higher Education Feminist Studies of Science and Technology, Departement of Educational Sciences, EDUCATIONAL DEVELOPMENT OF UNIVERSITY PROFESSOR
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PROFESSORES UNIVERSITÁRIOS DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS: UM OLHAR PARA SUA FORMAÇÃO PEDAGÓGICA Indjara Probst (Mestrado PPGECT-UFSC/Bolsista CAPES) André Luís Franco da Rocha (Doutorado PPGECT-UFSC/Bolsista CAPES) Beatriz Pereira (Mestrado PPGECT-UFSC/Bolsista CAPES) Resumo: A questionável valorização do conteúdo específico em detrimento da formação pedagógica é uma realidade nas instituições de ensino superior. A partir de resultados parciais de duas dissertações, este trabalho buscou identificar as concepções de professores universitários, dos cursos diurnos de Ciências Biológicas da UFSC, quanto à sua formação pedagógica, bem como possíveis condicionantes desta formação. A partir de três contextos formativos: a atividade docente na universidade, o curso de graduação e a pós graduação, as análises evidenciam que a formação pedagógica fica restrita à própria prática docente e que ainda predomina a concepção tecnicista de formação. Palavras chave: Docência universitária; Formação dos formadores; Racionalidade técnica. INTRODUÇÃO Ao final da década de 1980, as pesquisas sobre o desenvolvimento profissional dos professores focaram, mesmo que de forma descritiva, no currículo e no contexto de formação, dos professores em formação e nos formadores de professores. Entre 1990 e 2007, a revisão de André (2010) aponta que houve uma ampliação das pesquisas acadêmicas sobre a formação de professores. Com o decorrer do tempo, mudanças significativas se estabeleceram frente aos objetos de estudo de tais trabalhos. Nos anos 1990 os objetos centravam-se na formação inicial: licenciatura, pedagogia e escola normal, o que nos mostra uma descontinuidade e certo silenciamento quanto à formação dos formadores nas universidades. Nos anos 2000 a temática passou a ser a identidade e a profissionalização docente. “O foco agora é o professor, suas opiniões, representações, saberes e práticas” (ANDRE, 2010, p.176). De acordo com a autora, os

estudos revelam a intenção de dar voz aos professores e de conhecer melhor o seu fazer docente, mas é preciso ir além. Andre (2010) salienta que investigar as práticas, representações e saberes dos professores, sem articulação com os contextos em que emergiram e as circunstâncias em que foram produzidos, pode induzir a produção de um conhecimento parcelado e incompleto sobre uma docência também compreendida de forma fragmentada.

Os

trabalhos

acabam não

tratando,

efetivamente,

do

desenvolvimento

profissional como um processo de aprendizagem da docência ao longo da vida. Contudo, percebe-se um avanço na medida em que, ao observarem a prática de ensino, as pesquisas compreendem a necessidade de outros conhecimentos, distintos do conhecimento a ser ensinado, desmitificando a concepção tecnicista da formação. Esta, baseada no fato de que bastaria deter o conteúdo técnico que naturalmente o professor saberia ensiná-lo (GIROUX, 1997). Apesar dos avanços, a visão pragmática sobre a formação exige cautela, pois, sem um contexto, os olhares sobre o professor e sua prática poderiam reforçar a visão midiática e de amplo apoio popular, de que o professor seria o único responsável pelo sucesso e/ou fracasso escolar (ANDRE, 2010). O que negaria o complexo processo de ensino-aprendizagem como interdependente de condições materiais, sociais e histórico-culturais diversas. Nessa lógica, Zeichner (2009) relata que as pesquisas precisam focar mais nas conexões entre as características dos professores, sua aprendizagem e suas práticas de ensino como elementos que se dão em determinado espaço-tempo social, político e econômico. O professor tem papel fundamental na produção de conhecimentos pedagógicos e de saberes significativos a sua profissão, mas devemos estar atentos a outros elementos igualmente importantes, presentes de forma direta ou indireta em seu contexto de ensino. Dentre eles: a atuação dos gestores; o clima da instituição de ensino; as formas de organização do trabalho pedagógico; os recursos físicos e os materiais disponíveis; a participação de agentes externos e internos à instituição; as políticas educativas e os processos de formação pedagógica no e para o trabalho. Nesse ponto Oliveira e Vasconcellos (2011), observando o cotidiano das instituições de ensino superior, revelam que dentro do panorama institucional, cada vez mais, fica clara a necessidade da formação pedagógica dos professores universitários. Para as autoras “trata-se de um requisito essencial para o exercício do magistério superior de boa qualidade” (OLIVEIRA; VASCONCELLOS, 2011, p.1013). É com essa premissa que este trabalho busca identificar como professores universitários reconhecem sua formação para a

prática de ensino nas disciplinas que ministram, com o intuito de analisar possíveis condicionantes da sua formação pedagógica. METODOLOGIA Para realizar a análise deste artigo partimos da associação dos resultados parciais de duas dissertações (A e B)1 , oriundas do Programa de Pós Graduação em Educação Científica e Tecnológica da UFSC.

Apesar de terem especificidades nos pressupostos teórico-

metodológicos sobre a formação pedagógica, chegam a resultados muito parecidos. Para compreendermos a correlação possível destes trabalhos acadêmicos e a análise que fazemos, é necessário atentarmos a algumas de suas características. Ambas as dissertações buscam identificar e compreender as concepções e os objetivos dos professores atuantes nos cursos diurnos (bacharelado e licenciatura) de Ciências Biológicas (CB) da UFSC, no que se refere às situações de ensino em práticas pedagógicas específicas. A dissertação A concentra sua análise nas Práticas Pedagógicas como Componente Curricular e a B analisa as aulas práticas com cruzamento de drosofilídeos no laboratório de Genética Clássica. O trabalho A fez uso de questionário para identificar e selecionar quatro professores, que tem no planejamento de suas disciplinas um momento de PPCC, enquanto que o trabalho B tem como critério interagir com todos os três professores responsáveis pela disciplina de Genética Clássica do curso. No total foram sete os sujeitos pesquisados e cinco considerados para esse artigo. Dois sujeitos, um de cada pesquisa, não são considerados por não apresentarem falas representativas que elucidem as categorias analisadas. Ambas as pesquisas acadêmicas se caracterizam como predominantemente qualitativas (CHIZZOTTI, 1995), fazendo uso de entrevistas semi-estruturadas (LUDKE; ANDRE, 1986) para identificar as concepções e objetivos dos professores formadores com suas práticas de ensino. A entrevista semiestruturada permite ao entrevistado discorrer sobre o tema proposto pelo entrevistador. Neste instrumento, cada ator social é caracterizado em sua participação como um agente imerso em uma historicidade, grupo social, ideológico e cultural próprios, na discussão sobre a representação do fenômeno estudado (MINAYO, DESLANDES, GOMES, 2012) e por isso, o sujeito possui uma compreensão não só individual, mas também social do tema investigado.

1

Dissertação A: PEREIRA, B. Entre concepções e desafios: a Prática Pedagógica como Componente Curricular na perspectiva de professores universitários de Ciências Biológicas Dissertação B: PROBST, I. As aulas práticas de Genética Clássica: cruzamentos com Drosophila como recurso didático.

Para identificar a compreensão dos professores sobre sua prática de ensino, os trabalhos possuem blocos de análise particulares. Neste artigo, as similaridades exploradas estão nas compreensões que os professores têm de sua formação pedagógica para docência na universidade, o que corresponde à categoria “trajetória profissional” de ambas as pesquisas acadêmicas. Buscando relacionar elementos constitutivos da formação pedagógica dos formadores entrevistados, apresentamos nossos dados a partir de três contextos centrais. São eles: a concepção dos professores sobre a formação pedagógica para sua prática de ensino na universidade, a formação pedagógica no contexto da graduação e por final a formação pedagógica no contexto da pós graduação e sua relação com a formação docente. AS UNIVERSIDADES E A FORMAÇÃO DE PROFESSORES UNIVERSITÁRIOS A primeira universidade brasileira surgiu somente em 1920, a partir da união de algumas escolas que já existiam no Rio de Janeiro, e que continuaram funcionando totalmente separadas e sem qualquer mudança curricular (MENDONÇA, 2000). Foi com a concepção de universidade como um conglomerado de escolas profissionalizantes, que o ensino superior se desenvolveu e expandiu nas décadas de 1950 e 1960 (MENDONÇA, 2000). Para Mendonça (2000), nesse período a comunidade científica em ascensão, seguindo modelos internacionais, lutou por uma reforma universitária que priorizasse o desenvolvimento científico e através da autonomia institucional. Seguindo tais discussões e propondo o desenvolvimento nacional para a competição econômica internacional, em 1968, durante a ditadura militar no Brasil, foi promulgada a Lei da Reforma Universitária (MENDONÇA, 2000). Uma das premissas dessa lei é que a instituição universitária deve constituir-se como um local de ensino, pesquisa e extensão, os quais devem ser indissociáveis (CUNHA, 2011). A partir disso, foram realizados grandes investimentos para a consolidação das Pós-Graduações no Brasil, fomentando cursos de mestrado e doutorado, com o objetivo de aprimoramento da formação dos já então professores universitários (DOTTA; LOPES; GIOVANNI, 2011). A reforma universitária também instituiu a departamentalização, o que para Cunha (2011, p.448) desajustou os professores universitários que se encontravam “em torno de carreiras e cursos e articulou o corpo docente em torno de especialidades dos ramos das ciências”. Para a autora, a reforma priorizou a pesquisa, dando a ela visibilidade socioeconômica e função estruturante da carreira docente até então ausente. Institucionalizouse uma situação onde “a pesquisa passa a ser a principal atividade acadêmica e os méritos dela advindos são acumulados na forma de capital científico” (DINIZ-PEREIRA, 2007, p.154),

enquanto o ensino de graduação é desvalorizado e não contribui para a acumulação deste capital. Diniz-Pereira (2007) salienta que antes de 1968, a formação de professores na universidade já possuía menor status que a pesquisa e que a reforma legitimou e determinou o papel da universidade na sociedade brasileira pós-golpe, tendo a produção de conhecimentos científicos – a pesquisa – o seu principal objetivo. De acordo com o autor a profissão docente em todos os níveis é pouco valorizada socialmente, pois além de ser composta por alto número de mulheres em uma sociedade patriarcal, não teve a pesquisa educacional como uma atividade de status científico, difundida antes e durante a reforma universitária (DINIZPEREIRA, 2007). Por isso, as faculdades de Filosofia, responsáveis pela formação didática, eram desvalorizadas frente às faculdades que se responsabilizavam pelas disciplinas de “conteúdo científico” para o desenvolvimento da ciência e de “atitudes de pesquisa” (DINIZPEREIRA, 2007). A partir do contexto histórico do surgimento e do desenvolvimento das universidades no Brasil é possível observar o crescimento e a influência do modelo epistemológico da racionalidade técnica na docência universitária. Esse modelo, em especial nas ciências exatas e da natureza, intenta ser a “condição definidora do conhecimento socialmente legitimado” (CUNHA, 2008, p.10). Com essa premissa, o contexto acadêmico acaba por supervalorizar o conteúdo teórico-científico e desvaloriza os conhecimentos pedagógicos, estes muitas vezes concebidos como não científicos. Para Tardif (2000, p.18) o modelo da racionalidade técnica “não é somente ideológico e epistemológico, é também um modelo institucionalizado através de todo o sistema de práticas e de carreiras universitárias”. Nesse contexto, espera-se dos professores universitários somente o domínio do campo científico na sua área de pesquisa. A atividade docente enraízase na transmissão deste conhecimento aos alunos, os quais devem aplica-los na prática. Constitui-se assim um modelo aplicacionista do conhecimento nas graduações (TARDIF, 2000). Fica estabelecida a ideia de que, para ser professor e ministrar aula, basta saber o conteúdo disciplinar. (CUNHA, 2008). Os conhecimentos pedagógicos, ligados ao como ensinar tais conteúdos disciplinares, são negados ou desvalorizados na atividade docente. Logo, é compreensível a lógica de que, quanto maior for o investimento em pesquisa, melhor caracterizados e atualizados seriam os conteúdos disciplinares, ampliando a qualidade do

ensino

e da suposta formação.

A atividade docente institucionalizada é vista,

primordialmente, como um ato de pesquisa. Mesmo com o discurso da indissociabilidade do

tripé universitário, o ensino propriamente dito e a extensão universitária passam a ser o ônus da carreira profissional nas Instituições de Ensino Superior (CUNHA, 2008). É com a departamentalização, na reforma ao molde norte-americano, e o foco sobre a produção científica na valorização dos planos de carreira, que podemos entender os atuais professores universitários atuantes em um contexto de internacionalização das universidades. Estas, além de se responsabilizarem pela formação, são centros de competição simbólica e econômica global. Os professores passam a ser regidos pela lógica do “Publish or Perish2 ”, pressionando-os a uma forma descontrolada de competição e produtivismo acadêmico (BIANCHETTI, ZUIN, 2012). É com essa lógica, de valorização da produção acadêmica nos departamentos em contraposição ao ensino nos cursos de graduação, que podemos entender a desvalorização da formação pedagógica formal na concepção dos formadores do curso de CB da UFSC. As falas representativas no quadro a seguir apontam as concepções dos professores a respeito de sua prática de ensino: “[...] então apesar da minha carreira ser unicamente voltada pra ciência enquanto pesquisa, meu eu professor já estava se manifestando ai, na prática. Claro que ali eu fui me interessar em ler alguma coisa, então eu digo assim que essa minha formação como professor foi quase que uma coisa autodidata de procurar ler e tal, do que de uma formação formal assim.” Professor ao ser questionado sobre a formação para sua prática pedagógica na universidade. “E eu digo pra você que de novo foi muito mais a minha vivência, a minha prática, que me levou ao que eu faço.” Professor ao ser questionado sobre a formação para sua prática pedagógica na universidade. “tenho a pretensão de achar que eu não sou um simples professor, né?, eu gostaria de ser visto como um educador. [...] Eu sou um ignorante sob o ponto de vista de teorias de educação… ou coisa parecida, né? Mas eu tenho a impressão de que eu tenho algumas práticas, eu não sei [...] que nome, que rótulo que isso tem, mas eu acho que eu faço isso.” Professor ao ser questionado sobre a formação para sua prática pedagógica na universidade. Como podemos perceber, as três falas representativas argumentam que a formação para o ensino foi constituída na própria prática pedagógica cotidiana, durante as disciplinas que ministram. Expressão da vivência individual, fica claro que a prática parece se autojustificar nela mesma, sendo as questões do ensino desvalorizadas ou silenciadas. Esse fato é preocupante, pois demonstra um tipo de laissez-faire sobre a ação pedagógica, que vem justificando a redução ou ausência do papel da formação pedagógica formal para a prática de tais profissionais. 2

O

ensino

“Publique ou pereça” tradução livre

deixa de ser uma atividade profissional produtora de

conhecimentos próprios e passa a reproduzir os conhecimentos oriundos das pesquisas acadêmicas, os chamados produtos da ciência, resultando em uma formação técnica e acrítica (FREIRE, SHOR, 2011). Percebemos que o discurso tecnocrata de formação não se justifica, pois as dificuldades enfrentadas e superadas na vivência dos professores são oriundas da prática, e cada vez menos estão ligadas aos conhecimentos da área disciplinar que ensinam. Os problemas apontados pelos professores estão muito mais relacionados aos saberes da atividade de ensino, que por fazerem referência ao fenômeno educativo, possuem diferentes naturezas (CUNHA, 2008). De acordo com Cunha (2008), a docência universitária é mais do que conhecimentos provenientes da racionalidade técnica, e possui uma dimensão ética, valores, saberes cotidianos e interesses sociais próprios. O sentido da função “ensinar” requer a aquisição de vários conhecimentos pedagógicos, relacionados à organização do trabalho docente, como a compreensão de políticas educacionais, sistemas curriculares, comunicação na situação de ensino, o planejamento e a avaliação da aprendizagem, dentre outros (OLIVEIRA; VASCONCELLOS, 2011). Para Tardif (2000) além da pesquisa acadêmica, os professores universitários deveriam pesquisar e refletir sobre suas próprias práticas pedagógicas e os contextos teóricos que as subsidiam, questionando, assim, não só o que ensinam, mas também a forma e os objetivos com que ensinam. Ao perceber a concepção dos professores universitários investigados de que se aprende a ser professor na prática e, tendo por consequência, o papel reduzido do conhecimento pedagógico na sua prática de ensino, questionamos como foi o acesso à formação pedagógica formal durante os cursos de graduação. “Quando eu estava fazendo a minha graduação... a graduação e o início do mestrado... eu dei aula em vários lugares, em cursinhos pré-universitários, em outras áreas, até na área de Botânica, Literatura e Português que eu gostava muito, e depois numa faculdade. ” Professor ao ser questionado sobre a formação pedagógica na graduação. "Eu não acho que eu seja um bom professor, eu não tenho técnica. Porque é isso. Eu não estudei para estar em sala de aula. Minha formação é toda em pesquisa. Nunca fui realmente um cara que foi trabalhar para ser professor. ” Professor ao ser questionado sobre a formação pedagógica na graduação. Percebe-se que, coerentemente ao modelo de racionalidade técnica, mais uma vez houve ausência de relatos sobre uma formação sólida no campo pedagógico, sendo a prática de ensino reduzida à técnica ou à vivência. Uma possível explicação a essa lacuna está no fato de que, nos cursos de CB, devido à supervalorização do bacharelado, é comum uma grande

quantidade de professores universitários não terem feito licenciatura, estando sua formação direcionada à pesquisa acadêmica somente em áreas relacionadas às Ciências Biológicas. O que corresponde a nossa amostra, uma vez que apenas dois professores entrevistados são licenciados. A proposta formativa vivenciada por esses sujeitos acaba sendo uma contradição do ponto de vista profissional, uma vez que não existe a profissão regulamentada de pesquisador (MARTINS, 2013). O resultado é que tais profissionais acabam atuando como pesquisadores nas universidades, mesmo sendo contratados para o cargo de professor, ou seja, tendo também o ensino como sua atribuição. Cabe ressaltar que, apesar de o cargo ser para professor, nas atuais estruturas universitárias, a organização e seleção dos candidatos é realizada pelo departamento, setor responsável pela produção científica. E por isso, os critérios na maior parte das vezes são científicos e não pedagógicos (MARTINS, 2013). Pimenta e Anastasiou (2011) salientam a diferença entre a prática científica e a prática educativa. Se considerarmos o período de ciência normal como aponta Kuhn, a primeira seria regida pela objetividade e coletividade do conhecimento científico, e por isso seria corrigida e alterada com base em seus resultados, comparados a modelos prévios e às alterações do processo de análise. A prática educativa, no entanto, não é guiada por um modelo prévio, totalmente racional e objetivo, tendendo sempre a reproduzir práticas sócio-histórica e culturalmente dominantes. Para superá-las, em seus resultados e processos, é necessário um desvelar dos sentidos e das ações pedagógicas, explicitando seu caráter histórico e devolvendo à consciência docente do professor o domínio de seus saberes. A docência é práxis, por isso é uma prática direcionada a um fim pedagógico e está em permanente articulação dialética entre teoria e prática, ação e reflexão e objetividade e subjetividade

(PIMENTA; ANASTASIOU,

2011). Nessa perspectiva, não há como

compreender o desenvolvimento da atividade pedagógica por ela mesma, é necessário um permanente processo formativo, pois ela constantemente se relaciona aos múltiplos sujeitos, contextos

e conhecimentos muitas vezes contraditórios

socio-historicamente

(FREIRE,

SHOR, 2011). Se na análise da compreensão dos professores sobre seu cotidiano de ensino no curso de CB da UFSC e em sua graduação não encontramos elementos concretos de uma formação pedagógica formal que lhes seja significativa, questionamos, em que momento, de fato, tais profissionais deveriam ter essa formação? Que bases legais regem tais processos formativos? Em 1996 foi promulgada a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (BRASIL, 1996). Essa legislação institui em seu Art. 66 que a formação docente para o ensino superior

deve ocorrer no âmbito da pós-graduação stricto sensu, especificamente em programas de mestrado e doutorado. Entretanto, existiram poucas iniciativas para realizar a formação pedagógica no âmbito das pós-graduações, como no caso da USP, que em 1992 criou as disciplinas de Metodologia do Ensino Superior e Estágio de Docência. Seguindo a LBBEN 1996, foi instituída a Resolução CNE/CES 3 de 1999, a qual afirma que, quando a pós-graduação for destinada a formação de professores para o ensino superior, deve-se assegurar enfoque pedagógico, além do conteúdo específico do curso (BRASIL, 1999, Art.5, 1º parágrafo). Entretanto, essa diretriz acabou tornando-se contraditória, já que os programas de pós-graduação têm como objetivo formar pesquisadores em suas áreas de conhecimento e não possuem finalidades de formação para a atividade docente (CUNHA, 2009). Tanto que, no ano de 1999, a CAPES instituiu o Estagio de Docência obrigatório apenas para seus bolsistas, cabendo aos programas de pós-graduação o oferecimento ou não de disciplinas pedagógicas específicas (MARTINS, 2013). Desta forma, Martins (2013) aponta que devido à falta de clareza prática da legislação levantam-se limites quanto à formação didático-pedagógica do professor universitário, constituindo-se uma forma de silêncio sobre a questão. Assim, na prática, as demandas e responsabilidades necessárias à formação pedagógica são retiradas dos programas de pósgraduação, transformando exigências em recomendações gerais, percebidas de forma distinta por cada curso de quarto grau. “As minhas experiências antes de entrar aqui na UFSC foram experiências assim, pontuais, eu nunca tinha sido professora, eu nunca fui professora substituta nem nada… então assim, as minhas experiências foram, na época do mestrado. Eu fui bolsista CAPES." Professor ao ser questionado sobre a formação pedagógica na pós-graduação. O Estágio de Docência, apontado na fala, possui grande importância, uma vez que, muitas vezes, é o único momento em que se pretende uma formação pedagógica para o professor universitário. Entretanto, de acordo com o art. 18 da Portaria MEC/CAPES nº 76 de 2010 parece que o objetivo do estágio não é apenas ser um espaço de formação de professores, pois esse estágio “é parte integrante da formação do pós-graduando, objetivando a preparação para a docência e a qualificação do ensino de graduação (...)” (CAPES, 2010, p.8). Desta forma, o estágio teria duplo objetivo, tanto auxiliar na formação pedagógica do bolsista, quanto auxiliar na graduação, podendo o ultimo objetivo se sobrepor ao primeiro. Martins, (2013) aponta que, apesar de ser comum o bolsista acompanhar e/ou ministrar aulas junto a um professor supervisor em disciplinas da graduação, não está claro junto à

comunidade acadêmica, quais são os critérios, fins e meios dessa atividade. As especificidades do estágio são definidas por cada programa de pós-graduação e universidade. O que pode provocar desde uma super exploração do bolsista, até a apatia em relação às práticas pedagógicas como aponta a fala acima. Para que o Estágio de Docência se torne um espaço de fato dedicado à formação de professores, é preciso ampliar as discussões sobre o significado de tais experiências. Efetivando-as, organicamente, a uma reflexão didático-pedagógica baseada nas problemáticas contemporâneas pelas quais vêm passando as universidades brasileiras (MARTINS, 2013). Para Dotta, Lopes e Giovanni (2011), a formação para a atividade docente no ensino superior fica a cargo de iniciativas muito individuais de professores e dos regimentos das instituições. De acordo com os autores, ao priorizar a pesquisa, os cursos de mestrado e doutorado reproduzem a ideologia tecnicista, mesmo que não intencionalmente. Cunha (2009) também afirma que a carreira universitária do professor está mais ligada à produção científica do que às atividades de ensino. Ela destaca que, nessa visão de mundo, pode-se inferir que formar mestres e doutores através das pós-graduações, por si só, qualifica os professores à docência universitária, o que não corresponde à realidade observada e as dificuldades enfrentadas pelos professores entrevistados. Entretanto, do ponto de vista ideológico, esse discurso se faz presente nos sujeitos entrevistados como aponta a fala a seguir. "Eu costumo dizer que eu não fiz mestrado e doutorado pra ser um pesquisador bom, eu fiz mestrado e doutorado pra ser um professor melhor.” Ao ser questionado frente a sua formação na pós-graduação, o professor relata que devido à alta qualidade de sua formação em pesquisa, naturalmente ele se tornaria um bom professor. Os cursos de quarto grau devem indicar as competências do pesquisador, porém, do ponto de vista legal, isso não deveria resumir a totalidade da formação a que o professor universitário tem acesso. Na ausência de estudos pedagógicos mais profundos, normalmente o sujeito se espelha nas atividades e valores dos seus ex-professores. Esta reprodução pode resultar no desenvolvimento de saberes e práticas com êxito, mas dificilmente o professor consegue refletir sobre sua prática docente (CUNHA, 2009), inviabilizando a criticidade enquanto objetivo, tanto de sua formação, quanto de seus discentes. CONSIDERAÇÕES FINAIS Orientados por uma concepção tecnicista de formação, os professores parecem relacionar a profissão docente apenas à transmissão de conteúdos biológicos, onde conteúdos e objetivos sobre o ensino, por exemplo, tornam-se ausentes. Nesse sentido, eles remetem sua

formação pedagógica apenas às experiências que tiveram em sala de aula, no Estágio de Docência e/ou enquanto docentes. Acreditamos que estas concepções não possam ser desvinculadas do contexto e das condições de trabalho destes professores. Isso porque, o processo de avaliação das universidades e dos docentes e as demandas das instituições superiores constituem diversas dificuldades e desafios para a formação pedagógica. REFERÊNCIAS ANDRE, M. Formação de professores: a constituição de um campo de estudos. Educação, Porto alegre, v.33, n.3, 2010. BIANCHETTI, L. ZUIN, A. A. S. O intelectual universitário e seu trabalho em tempos de “pesquisa administrada”. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 28, n.3, 2012. BRASIL. Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996. Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional. Casa Civil, Brasília, DF, 1996. ______. Resolução CNE/CES 03 de 5 de outubro de 1999. Fixa condições de validade dos certificados de cursos presenciais de especialização. Casa Civil, Brasília, DF, 1999. CAPES. Portaria 76 de 14 de abril de 2010. Aprova novo regulamento do Programa de demanda social – DS. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 2010. CHIZZOTTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. 6ª ed. São Paulo, Cortez. 1995. CUNHA, M. I. Inovações pedagógicas: o desafio da reconfiguração de saberes na docência universitária. Cadernos da Pedagógica Universitária da USP, 2008. ____________. Trajetórias e lugares da formação do docente da educação superior: do compromisso individual à responsabilidade institucional. Revista Brasileira de Formação de Professores, v.1, n.1, 2009. ____________. Indissociabilidade entre ensino, pesquisa e extensão: a qualidade da graduação em tempos de democratização. Perspectiva, v.29, n.2, 2011. DINIZ-PEREIRA, J. E. Formação de professores: pesquisas, representações e poder. 2.ed., 1.reimpr. Belo Horizonte: Autêntica, 2007. DOTTA, L. T.; LOPES, A.; GIOVANNI, L. M. Educação superior e formação de professores: o

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