A Dimensão Fotográfica: Uma Observação ao Trabalho de Francesca Woodman

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Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa

A Dimensão Fotográfica: Observação ao trabalho de Francesca Woodman

Alexandre Alagôa

Resumo O seguinte ensaio pretende apresentar algumas reflexões e interpretações à obra fotográfica de Francesca Woodman, destacando várias questões principais: desde preocupações com o espaço, com o corpo e com o próprio domínio das propriedades da máquina. O texto está estruturado em três capítulos principais. O primeiro, A Dimensão Fotográfica, explora a questão paradoxal da fotografia como fixadora da realidade e como criadora de uma dimensão espectral invisível ao olhar humano. O segundo capítulo trata uma discussão em torno do auto-retracto e da introdução do corpo da própria artista nas suas obras. O terceiro e último capítulo procura analisar a relação e integração do corpo no espaço, destacando o carácter performativo frequente no trabalho de Woodman. O objectivo do ensaio incide portanto numa observação e análise ao trabalho de Francesca Woodman, tentando também estabelecer relações com outros artistas que exploram problemáticas conceptuais paralelas.

Índice Introdução........................................................................................................ 1 A Dimensão Fotográfica...................................................................................3 Acerca do Auto-Retracto................................................................................. 9 O Corpo e o Espaço: Performance e Construção............................................13 Conclusão......................................................................................................... 17 Referências....................................................................................................... 19 Catálogo de Imagens........................................................................................ 21

Introdução Francesca Woodman nasce em Abril de 1958 numa família de artistas, Betty e George Woodman, na cidade de Denver, Colorado, onde reside durante a sua infância, sendo Itália um destino recorrente para a sua família. Em 1972 estuda numa escola privada em Andover (Massachusetts), a Abott Academy, sendo aí, com cerca de 13 ou 14 anos, após receber a primeira máquina fotográfica - uma Yashica oferecida pelo seu pai - que inicia a sua relação com a fotografia. Mais tarde, em 1975, frequenta a Rhode Island School of Design e desenvolve grande parte do seu trabalho, não só como aluna, mas como artista. Em 1977 viaja a Roma como parte de um programa honorário da RISD, e volta em 1978 para acabar o curso. Em 1979 muda-se para Nova Iorque para dar continuidade ao seu trabalho como artista da fotografia e para divulgar o seu portfólio, contudo, em 1981, com 22 anos, comete suicídio. Muitas das obras de Francesca Woodman foram desenvolvidas ao longo do seu percurso como aluna de fotografia. Sendo assim, várias das obras são, certamente, respostas a exercícios e projectos de âmbito escolar. Contudo, apesar de ter tido um percurso curto e jovem, o trabalho de Francesca Woodman não é apenas o de uma mera aluna, mas sim o de uma verdadeira artista da fotografia. Como aluna, o seu trabalho estaria ainda, concerteza, numa fase de constante desenvolvimento e evolução, porém, Francesca demonstrava já uma grande intimidade técnica, corporal, mental e conceptual pela fotografia; um domínio tal pelo próprio medium, tanto atrás da máquina como a ser captada por ela - como artista e como modelo. O trabalho de Francesca Woodman é deveras fascinante. Segundo Chris Townsend, o arquivo da artista contém mais de 800 fotografias e desde a segunda metade dos anos 80, alguns anos após a sua morte, a sua obra tem vindo a ganhar cada vez mais prestígio, admiração e respeito pela história e teoria da arte. A sua obra revela-nos um amplo conjunto de questões e problemáticas desde o corpo como objecto, construção; a relação entre corpo e o espaço que o delimita; questões do auto-retracto e auto-representação: artista modelo; a dimensão espectral da fotografia: o vestígio e os espectros; a deformação; entre outros - que eram também exploradas por vários artistas seus contemporâneos, tanto na fotografia como na performance, na pintura, etc, como Duane Michals, a artista portuguesa Helena Almeida, Hans Bellmer, Ana Mendieta, entre outros, e que continuam ainda, obviamente, a ser temáticas importantes e presentes nos dias de hoje. O seguinte texto pretende então explorar algumas das principais ideias que se podem encontrar no trabalho de Francesca Woodman. 1

O ensaio está dividido em três capítulos principais - “A Dimensão Fotográfica”; “Acerca do Auto-Retracto”; “O Corpo e o Espaço: Performance e Construção” - que abordam questões essenciais a todo o trabalho de Woodman. No primeiro capítulo explora-se a ideia em torno dos fantasmas e dos espectros, dos fumos e da transparência, do corpo que perde a sua forma. Faz-se uma reflexão à fotografia enquanto um medium que, apesar de partir de uma captação mimética da realidade visual, possibilita, ao mesmo tempo, a criação de uma outra dimensão que é invisível ao olhar humano. Discute-se a relação entre o corpo que é captado pela máquina e o corpo que por ela é revelado na imagem. De seguida, em “Acerca do Auto-Retracto”, elabora-se uma discussão em torno da temática do auto-retracto devido à artista se inserir constantemente nas suas fotografias. Revela-se que há alguma tendência para tentar compreender um artista através das suas criações e ainda para criar histórias romantizadas em torno das mortes dos mesmos devido à relação criador-criação. Afirma-se o duplo papel de Woodman: artista-modelo. Por último, no capítulo “O Corpo e o Espaço: Performance e Construção”, faz-se precisamente uma relação entre o Corpo e os elementos referidos no título. Aqui menciona-se a interligação que Woodman estabelece entre um corpo (por vezes o seu) e o espaço que o envolve. Analisa-se a ideia da transformação do corpo com a parede e ainda a duração temporal que Woodman introduz nas suas obras através da longa exposição, destacando um carácter performativo. Este estudo de investigação surge devido a um gosto e interesse pessoal em tentar explorar e compreender a obra fotográfica de Francesca Woodman. O ensaio tem portanto o objectivo de apresentar e analisar várias das noções e ideias inerentes à obra fotográfica de Wooman, tentando ainda estabelecer algumas relações com o trabalho de outros artistas.

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A Dimensão Fotográfica Desde os primórdios da sua invenção, a máquina fotográfica tem vindo a permitir uma maior aproximação à captação mimética da realidade, destacando-se como um dispositivo de (uma aparente) apresentação da verdade. Bazin iria dar início ao seu texto A Ontologia da Imagem Fotográfica precisamente com uma discussão em torno desta ideia da preservação da aparência: «Fixar artificialmente a aparência corporal do ser é retirá-lo do fluxo do tempo, prendê-lo à vida» (BAZIN, 2013, p. 261). Bazin considera então que a arte se tinha desenvolvido sobre uma necessidade (ou dependência) base fundamental de lutar contra a inevitabilidade que o tempo impõe na condição humana: a morte. E esta ideia seria inicialmente apresentada pelo autor através da mumificação. No antigo egipto, o embalsamento era uma técnica utilizada com o objectivo de conservar o corpo humano para que a alma fosse preservada e pudesse alcançar o outro mundo, a vida eterna. «Revela-se, assim, nas origens religiosas da estatuária, a sua função primordial: salvar o ser com a aparência.» (BAZIN, 2013, p. 261). Assim como as múmias, estas primeiras estátuas, os retractos dos Reis da Idade Média seriam igualmente criados através de uma representação realista do corpo humano, como forma de o preservar no tempo, de o imortalizar, de o conservar na memória histórica. No fundo, a ideia essencial que Bazin apresenta aqui tem que ver com o facto desta necessidade de lutar contra a morte (e o esquecimento) estar inevitavelmente dependente de uma imagem (realista) do corpo humano. Bazin continua o seu argumento ao referir que a fotografia e o cinema, sendo os aspectos mais evoluídos desta dimensão realista do mundo que se instalava desde o Renascimento, iriam revelar uma “crise espiritual e técnica” na pintura (na arte). O autor diz-nos que a concepção da perspectiva, juntamente com a invenção de sistemas científico-mecânicos (ele dá o exemplo da câmara escura de da Vinci) que se começavam a infiltrar na produção artística, desencadearam um desequilíbrio entre a função mágica da pintura (que começava a perder-se) e a sua capacidade para absorver, captar e imortalizar, por meio da imitação, a natureza exterior, levando assim o artista a «afastar-se da preocupação fundamental da realidade espiritual expressa por meios autónomos» (BAZIN, 2013, p. 263), para se preocupar mais com a representação da ilusão realista do mundo. A fotografia destaca-se aqui pois é ela mesma, na sua essência, que vem satisfazer definitivamente a obcessão pelo realismo, pela apropriação da semelhança que assombrava a pintura. E se a fotografia satizfaz então, de uma vez por todas, esta busca incansável que por tanto tempo pesava sobre as artes plásticas, então ela é, ao mesmo tempo, a cura e a doença, pois é a própria fotografia que, ao elevar a função do 3

realismo ao seu ponto mais alto e ao tomá-la para si mesma, liberta a pintura desse fardo e permite que volte a investir na sua expressividade espiritual, mágica. Nos últimos pontos do seu texto, Bazin menciona que a objectiva da câmara fotográfica é, precisamente, objectiva. Ao contrário da pintura e da escultura, a imagem fotográfica não é produzida pela mão do ser humano. Apesar de escolher o espaço a ser fotografado, intervir sobre a selecção, orientação de enquadramento e o controlo de exposição, o sujeito não interfere directamente na concepção da própria imagem, não tem um papel interpretativo sobre ela; ela gera-se de forma automática, como que aparecendo por magia na superfície plana da chapa. E assim, o estatuto do artista é então como que colocado em questão pelo autor:

Pela primeira vez, entre o objecto inicial e a sua representação apenas se interpõe um outro objecto. Pela primeira vez, forma-se automaticamente uma imagem do mundo exterior sem intervenção criadora do homem, de acordo com um determinismo rigoroso. (...) Todas as artes se baseiam na presença do homem; só na fotografia desfrutamos da sua ausência. (BAZIN, 2013, p. 264)

Ainda paralela a esta questão, Bazin refere que a «fotografia beneficia de uma transferência de realidade da coisa para a sua reprodução» (BAZIN, 2013, p. 264). Ou seja, no acto fotográfico dá-se um processo químico no qual a luz substitui a função do artista: a imagem obtida é fruto de uma transferência analógica de um referente, de um objecto captado pelo olhar cru da câmara. Deste modo, a imagem fotográfica funciona como uma reprodução mecânica da realidade, como uma duplicação física achatada de algo que é captado pelas lentes e transportado para dentro de uma máquina; no fundo, ela revela-nos um vestígio daquilo que esteve diante da objectiva e que agora é tornado para sempre presente, o que, por conseguinte, faz com que a fotografia esteja mais próxima da impressão digital e da pegada, e portanto da ideia de índice (evocando e aliando aqui as ideias de Bazin e de Pierce), do que propriamente da pintura ou do desenho. Esta breve leitura ao texto de Bazin que aqui se apresenta serve precisamente para criar uma reflexão (e como que uma introdução) a algumas das questões inerentes à fotografia enquanto medium que se consideram importantes para compreender o trabalho da Francesca Woodman, à maneira como ela lida com a sua obra. Apesar da Fotografia se ter vindo então, como refere Bazin, a impôr nesta busca pelo realismo, oferecendo uma prova de que alguma coisa esteve num determinado local, é preciso entender que a fotografia, sendo uma representação de uma outra coisa (e não a coisa em si mesma), sendo um produto de uma máquina - de um aparelho mecânico, de um automatismo -, não deve ser tratada exclusivamente como uma mera apresentação do que esteve diante da lente - desse corpo cuja aparência se conserva agora por esta ferramenta imagética. 4

Desta forma, há que considerar que a ideia de captação da realidade torna-se, ao mesmo tempo, uma duplicação da realidade, e assim, esta imagem, esta realidade agora “achatada” (tornada plana) deve ser tratada como uma outra coisa, uma coisa em si mesma - uma dimensão em si própria -, não devendo ser confundida com a coisa a que remete. Enquanto no Mundo-Real somos seres de carne e osso, no Mundo-Imagem somos todos espectros, criaturas de luz e sombra. Ainda que a fotografia, enquanto medium, seja então objectiva na sua essência nessa transferência de luz para o suporte -, o conteúdo imagético é, fundamentalmente, uma construção: é fruto da imaginação, da mente, do conhecimento, do estudo e/ou da vontade daquele que, não só tira a fotografia, mas que compõe, escolhe e/ou manipula todos os elementos que nos são revelados por ela (ainda que a sua mão não tenha um contacto directo com a superfície do papel fotográfico no acto de criação - mas como refere o próprio Bazin, já antes da máquina fotográfica eram utilizadas uma série de outras ferramentas na concepção artística). Considerando as ideias do texto de Bazin, e agora recorrendo a algumas das questões discutidas no livro On Photography de Susan Sontag, há, então, de facto, uma certa tendência para tratar a Fotografia como uma Janela para entender e conhecer o mundo devido à sua dependência da representação realista do mesmo. O ser humano recorre à Imagem Fotográfica como tentativa de organizar e (re)construir o que está à sua volta devido ao seu carácter mimético e documental que possibilita a concepção de uma aparente prova incontroversa de um determinado acontecimento, ou que determinada coisa existe ou existiu num determinado ponto espacial-temporal. Porém, ainda que permita uma relação mais precisa com a realidade visual (do que a própria pintura ou o desenho), a Fotografia é, ao mesmo tempo, meramente uma Imagem da realidade, uma dualidade, um vestígio, uma ilusão, e pode muitas vezes ser enganadora (falsa) caso não haja qualquer explicação a acompanhá-la. A imagem fotográfica é, como refere Barthes, uma mensagem sem código, ela não é simbólica como a palavra nem icónica como a pintura. Vários autores têm então discutido acerca desta capacidade da imagem fotográfica para mentir, este seu poder para criar uma dimensão que não corresponde à realidade humana, que no fundo se desdobra precisamente desta relação entre o carácter automático e objectivo do próprio aparelho (e daí a referência inicial a Bazin) e a crença no seu poder de verdade: Margarida Medeiros iria mencionar algumas curiosas histórias de indivíduos que recorriam à fotografia para comunicar com fantasmas, seres do outro mundo, no seu livro Fotografia e Verdade; Susan Sontag, em alguns pontos de On Photography, discutiria acerca da nossa dependência e obcessão pela imagem (muitas vezes deixando-nos enganar por ela) e pela forma como tem vindo a ser utilizada como meio de controlo; e Roland Barthes iria falar acerca dos processos de conotação e produção de fotografia utilizados pela imprensa em «A Mensagem Fotográfica», 5

destacando a capacidade da imagem fotográfica para mentir quando, por exemplo, nos é apresentada num contexto totalmente diferente do seu original. Neste paradigma da Imagem como enganadora e ilusória da realidade, a Caverna de Platão poderá também ser um exemplo interessante a ser mencionado (ainda que seja um exemplo talvez recorrente, penso que é válido), na medida em que as Sombras projectadas pelos objectos reais transmitem aos prisioneiros uma falsa noção da realidade. Neste sentido, o objecto (o corpo ao qual as sombras pertencem) e a sua imagem (a projecção das sombras) são completamente diferentes e enganadores um do outro. A Parede da Gruta serve então como um Ecrã no qual habitam uma série de Sombras que são retiradas do seu contexto normal - a sombra deixa de ser sombra para passar a ganhar as características do próprio objecto a que pertence, dando origem então a uma falsa realidade, a uma experiência alucinatória, quase como se os prisioneiros vivessem do outro lado do espelho ou da tela, no próprio Mundo-Imagem, completamente alienados da condição a que foram submetidos, esses seres habitantes de um universo espectral. Os prisioneiros encaram a sombra não como uma representação de outra coisa, mas como si mesma, como uma coisa falsa que remete para si mesma como verdadeira (mas que não o é). O que se pretende reflectir com estas várias referências é que a fotografia, esta projecção ou captação realista do mundo exterior, ainda que esteja dependente de uma relação primordial com o seu objecto referente (a coisa que fotografa), ela é, ao mesmo tempo, um medium de trabalho artístico, um suporte para a imaginação, um meio pelo qual se constroiem e revelam ilusões da realidade. A fotografia, assim como a pintura ou qualquer outro meio artístico, tem a capacidade para nos apresentar uma dimensão que transcende totalmente os limites que são impostos pelo universo físico e exterior do ser humano. No caso da Alegoria, seria a própria escuridão da gruta - a relação luz-sombra - a criadora dessa outra dimensão na qual a Imagem domina o olhar, e no caso da fotografia de Francesca Woodman é o próprio mecanismo, as propriedades da máquina fotográfica, dessa caixa escura, que possibilitam a criação de uma outra dimensão que é invisível ao olhar humano: o mundo dos espectros e dos fantasmas, destes corpos que desvanecem entre o ar ou a parede. É aqui que a imagem fotográfica confere ao objecto que é fotografado uma duplicidade: o corpo retratado deixa de ser o (aquele) corpo e passa a ser um outro, um outro que não é o mesmo, que é diferente, e por vezes até oposto. Este corpo capturado é transportado para uma outra dimensão, um outro universo - uma dimensão que existe dentro da própria imagem fotográfica (ou antes, até dentro da escuridão do laboratório ou do mecanismo da câmara). Esta duplicidade depende do objecto real sim, mas ganha uma vida própria dentro dessa tal dimensão fotográfica, assim como a Sombra da Caverna ganha uma autonomia (uma vida própria) quando abandona (ou deixa de remeter para) o objecto a que pertence. Esta é então uma questão inicial que parece importate ser destacada nesta observação à 6

obra fotográfica da artista. Esta função paradoxal da máquina fotográfica que vem, por um lado, permitir uma captação mimética do real (de tal modo que até nos revela dedos que se infiltram no canto da objectiva, ou a presença de objectos que, no mundo real, nem sabíamos que estavam lá: a imagem fotográfica surpreende-nos), que nos oferece um registo documental de um determinado acontecimento, de uma pequena lembrança para o albúm de família, ou que muitas vezes se torna fundamental para o arquivo histórico (social, cultural, político, ...) do ser humano, e que, por outro, mas ao mesmo tempo, vem possibilitar a construção de um outro mundo, vem revelar ao olho humano uma dimensão até então invisível, na qual habitam os fantasmas, os espectros, as transparências e os mortos (já Bayard se teria retractado morto, como afogado) é uma das questões centrais no livro Fotografia e Verdade: Um História de Fantasmas de Margarida Medeiros, e está ainda presente no trabalho fotográfico de outros artistas que poderiam, certamente, ter servido de influência e inspiração para Francesca Woodman, como seria o caso de Duane Michals(1). Escreve então a autora:

O erro fotográfico, tão combatido desde as primeiras horas da invenção fotográfica, o pesadelo dos pioneiros (o flou, o tremido, o grão excessivo, a falta de contraste) parece ter encontrado, nas últimas décadas do século outra finalidade: não já a da representação realista e naturalista, nem mesmo a de uma estética fotográfica mais simbolista, mas pura e simplesmente a de suporte epistémico de uma nova metafísica: a do Oculto, do paranormal, do Invisível. (MEDEIROS, 2010, p. 227-228)

Francesca revela precisamente um interesse por estas várias questões, pela capacidade da fotografia para ir além da mera apresentação da verdade subjugada pelo realismo objectivo que durante tanto tempo se pensou ser a sua principal função. Ela tem consciência de que a fotografia é algo mais; de que a sua função não se limita ao registo documental dos acontecimentos. A fotografia pode funcionar também como uma encenação, como um meio criador de histórias que remetem para o Oculto e que se baseiam nesses corpos desvanecidos que o “erro” fotográfico revelava. Elizabeth Janus refere que, ao frequentar a livraria Maldoror, Woodman tinha acesso a livros, periódicos, revistas e artigos acerca de artistas relacionados com o Surrealismo, o Futurismo, etc., e que foi provavelmente lá que a artista descobriu um artigo acerca de um caso de um cientista que teria inventado uma máquina de desaparecer, mas que seria apenas uma farsa criada a partir de técnicas fotográficas. Estas ideias iriam directamente ao encontro de algumas premissas do livro de Margarida Medeiros, e da própria reflexão que aqui se procura apresentar: a fotografia como criadora de uma dimensão que vai para além da mera representação mimética da realidade. ___________________________________ (1) Uma curta relação entre o trabalho de Michals e o de Francesca será referido na página 14.

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(...) Woodman likely saw an article and series of photographs by a Hungarian scientist who claimed to have invented a “disappearing machine”. The pictures show a hand gradually fainter from one frame to the next and then disappearing completely. Later found to be a hoax and renounced by the publishers, the pictures remain a fascinating exposé on photographic manipulation and bear a remarkable similarity to certain of Woodman’s own photographs, including the Angel series, which expanded on her interest in photographically capturing transparency. (SCHWARZENBACH, 1998, p. 27)

Francesca Woodman apropria-se então desta dimensão obscura e mágica inseparável da fotografia (e que é a própria máquina que torna visível através dos desfoques, dos arrastamentos, das longas exposições que captam o movimento do corpo e que, por sua vez, evidenciam uma duração na fotografia) para criar corpos que se desintegram, que se evaporam, que desaparecem, que se tornam em fantasmas, que se transformam e interagem com o espaço que os envolve. Estes espectros não são reais, concretos, ou melhor, fotografáveis, eles nascem precisamente dentro da própria máquina fotográfica, no próprio Mundo-Imagem, na Dimensão Fotográfica, no universo de Alice. Ao revelar-nos esta aspecto espectral nas suas fotografias, estes corpos fantasmagóricos e mutáveis cujos desvanecimentos e aparições se tornam possíveis apenas através dos mecanismos e das propriedades da máquina, Francesca Woodman demonstra então uma profunda intimidade, habilidade e destreza pela prática e pela técnica da fotografia assim como um conhecimento e um interesse pelas matérias conceptuais que a envolvem enquanto medium artístico, principalmente numa idade tão jovem. Francesca reconhece melhor que ninguém esta dupla capacidade da fotografia para dizer a verdade e a mentira, para funcionar como um mero documento ou para servir o interesse do artista, e deste modo afastam-se quaisquer interpretações que têm tendência para relacionar a sua morte com essa dimensão espectral do seu trabalho. O trabalho de Woodman não é de todo ilustrativo, vai muito mais além que isso. É preciso compreender que não estamos a olhar para meros efeitos, corpos ou objectos que são inserios ao acaso na imagem, mas estamos sim realmente a lidar com uma artista curiosa, estimulada e interessada por uma série de problemáticas ligadas à fotografia e à arte - sejam elas relacionadas com o Surrealismo, com o Retracto, com o Gótico, com a Performance (corpo - espaço), com a fotografia como ficção/encenação (artista - modelo), com questões do corpo como objecto, ou até com as propriedades técnicas do meio, e por aí em diante... Nos próximos capítulos tentar-se-à oferecer algumas observações a várias destas questões que parecem então envolver a artista.

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Acerca do Auto-Retracto Devido a grande parte das questões e temáticas que são exploradas na obra fotográfica de Francesca Woodman terem sido desenvolvidas e elaboradas através da presença do corpo da própria artista, o auto-retracto tem-se destacado como um dos géneros mais discutidos no qual o seu trabalho tem vindo a ser categorizado. Sendo que Francesca Woodman, assim como já foi referido, cometeu suicídio numa idade jovem, há uma tendência por parte de alguns teóricos para, ao apoderarem-se deste acontecimento, analisarem e interpretarem a obra fotográfica da artista de uma maneira intensamente psicológica e auto-biográfica. Ou seja, que com as suas deformações, com o seu corpo transformado num fantasma ou num anjo, com os desfoques e desvanecimentos, Francesca Woodman estaria a caminhar para uma certa recusa ou fuga da realidade e, por conseguinte, da própria vida, e que isso de alguma maneira reflectiria a personalidade da própria pessoa que era Woodman. No fundo, há uma inclinação para romantizar a obra de arte com a morte do seu criador, e isto porque, de certa maneira, a própria arte, como criação, não deixa de ser parte do Ser que a cria, que lhe dá vida. Desta forma, a personalidade, a entidade e a individualidade de um artista têm sido, desde sempre, exploradas através das suas imagens, das suas criações, assim como aparentemente o próprio Ser Humano se tenta compreender a si mesmo através de uma entidade superior, de um suposto Deus (o Deus que cria o homem à sua imagem). Esta é uma característica que tem estado presente ao longo da história da arte (já na pintura, com o exemplo do próprio Van Gogh, o quadro que é tido como o seu último, Campo de Trigo com Corvos, apesar de não se tratar de um auto-retracto, é considerado por muitos como se o artista estivesse a caminhar para a sua própria morte - ideia com que pessoalmente discordo completamente) assim como da própria história da humanidade (se a imagem surge na pré-história como reflexo, diria até como documento ou apontamento dos costumes, das actividades e dos rituais das civilizações antigas é porque ela, a imagem, diz de facto algo acerca do Ser que a cria). Contudo, as ideias aqui apresentadas afastam-se distintivamente dessas interpretações fantasiosas, romantizadas e trágicas que são muitas vezes atribuídas tanto ao trabalho de Francesca Woodman como à propria personalidade da artista. Francesca diz realmente algo acerca de si mesma com as suas obras, mas é algo completamente diferente dessa ideia de fuga, de alguém que foge à condição imposta pela própria vida. O auto-retracto é uma temática artística com uma longa tradição desde o desenho à pintura e que veio também prolongar-se e estabelecer-se na fotografia visto esta funcionar como uma reprodução mecânica e analógica da realidade, uma aparente prova instantânea do real. Porém, apesar de nos revelar o próprio artista (a sua cara, o seu corpo, a sua figura, aparência), o auto-retracto não deixa de ser uma representação, 9

uma imagem, uma encenação, uma construção de poses, de olhares, de gestos, de movimentos, e assim, há que ter em conta que o auto-retracto não nos oferece um total acesso ao carácter físico, mental ou íntimo de um indivíduo. Como refere Chris Townsend em Francesca Woodman, uma obra literária que ajudou na compreensão e análise das várias ideias aqui apresentadas, o auto-retracto não nos oferece uma clara percepção da personalidade da artista: But we need to remember that the self-portrait, as representation, is anything but transparent, anything but reflective. Though we might imagine that the image - and particularly the photographic image - offers a clear insight into the personality of the artist, we do not see through a window into the artist’s soul (TOWNSEND, 2006, p. 55)

As várias fotografias onde Francesca Woodman se insere a si mesma revelam-se então muito mais complexas do que a mera ideia de auto-retractos, pois a sua aproximação à fotografia e a maneira como se insere nas suas imagens parecem desafiar a própria tradição do género. «We think we know Woodman, and she wants us to think we know her (...). In Woodman’s self-portraits we have a thoroughgoing critique of her medium’s incapacity to identify a subject truthfully» (TOWNSEND, 2006, p. 56). Considerada como uma das suas primeiras fotografias, senão realmente a primeira, o seu auto-retracto aos treze anos - Self Portrait at Thirteen (ver pág. 21) demonstra já, de certa maneira, uma preocupação ou um interesse por parte da artista pela ideia da encenação (talvez até a característica da performatividade já esteja também aqui presente) que a fotografia, e a própria imagem como ficção, vinham permitir. O nosso olhar é guiado desde a parte inferior da imagem, pelo que aparenta ser o disparador remoto do obturador, até à mão de Francesca e, de seguida, caminhamos pelo braço até à sua cara que se encontra tapada pelo próprio cabelo da artista. Ao negar-nos o seu rosto, a sua entidade, Francesca nega as propriedades descritivas intrínsecas à própria imagem fotográfica. Numa das suas fotografias em Rhode Island (pág 32, fig. 22), observa-se que o espelho abandona a verticalidade e o lugar tradicional a que pertence - a parede (o tal ecrã das sombras de Platão) - e é colocado na horizontal, no chão. O espelho deixa de ser um lugar no qual o corpo se projecta e reflecte, um lugar de identificação do “eu” ou do “outro”, e transforma-se numa dimensão em si mesma; torna-se num espaço onde o corpo se insere ou de onde um corpo emerge, um corpo que desvanece, que se converte em fumo, num vestígio, numa transparência. Se por vezes o pintor parte de uma relação primordial com o espelho para a criação de um auto-retracto, então parte de uma imagem do seu próprio corpo para criar uma outra imagem de si mesmo. O auto-retracto torna-se uma imagem de uma imagem. O espelho vem então afirmar ao artista uma dualidade: o sujeito torna-se observador e observado. O espelho deixa de 10

ser apenas o ponto de partida para a criação de um auto-retracto, como é ele mesmo o mundo no qual o pintor, o artista, a artista - Francesca Woodman - se insere: o mundo da imagem. Numa outra fotografia (pág. 31, fig. 21) observa-se a presença de três modelos que escondem os próprios rostos com auto-retractos de Woodman, sendo que a modelo mais à direita é a própria Francesca. Chris Townsend, ao discutir esta obra, refere que a artista esconde a sua entidade com a sua própria entidade: «What hides Woodman’s identity here is her identity; she disappears behind a self-portrait. The image as representation obliterates the spectator’s capacity to identify the subject it represents» (TOWNSEND, 2006, p. 57). Observa-se ainda nesta mesma fotografia um quarto retracto de Woodman que é colocado na parede. Na obra House #3 (pág. 35), assim como em várias das fotografias de Woodman, observamos a artista, como modelo, a transformar-se na parede, a inserir-se na parede, a trabalhar no espaço da parede. Desta forma, com esta fotografia das três modelos, com estes inúmeros retractos de Woodman dentro de uma fotografia (imagem dentro de imagem) que servem como máscara, como escondimento à entidade do sujeito, pode considerar-se que Francesca Woodman ao inserir-se dentro da imagem fotográfica deixa de ser ela própria - a artista, a pessoa Francesca Woodman - e torna-se numa multiplicidade de seres e de objectos, numa modelo de si mesma. O sujeito na imagem, como modelo, torna-se um ser mutável com a possibilidade de ser transformado em múltiplas coisas; a sua entidade como Ser não é colocada em risco, pois no fundo trata-se disso mesmo - de um modelo -, da apropriação de um corpo para a representação de alguma coisa e não de si. Assim como um pincel é um elemento fundamental para um pintor, o corpo, seja ele de uma modelo ou da própria artista (como modelo), torna-se, parece-me, um elemento fundamental à obra fotográfica de Francesca Woodman. O corpo é um componente (um objecto de trabalho) através do qual a artista realiza e explora as suas temáticas, as suas ideias... Pretende-se então salientar que, de acordo com os exemplos e as discussões que aqui foram apresentados, Francesca Woodman não procura demonstrar ou criar um corpo de trabalho necessariamente auto-retractivo, que nos revele quem ela é; ela não tem o propósito de se auto-representar como Francesca, de se mostrar a si mesma como ser, de revelar a sua personalidade nem sequer de evidenciar qualquer intenção para fugir à realidade. A artista reconhece essa mesma tendência que há para tentar (re) conhecer um artista através dos trabalhos (das imagens) que cria, e assume então um papel duplo - de artista e de modelo. Sloan Ranking, uma amiga de Francesca Woodman que colaborou na suas fotografias não só como modelo mas também atrás da camâra a carregar no botão (como por exemplo nas fotografias com Charlie, pág. 39), refere no capítulo “Peach Mumble: Ideas Cooking” que o facto de a artista se inserir a si própria nas suas fotografias deve-se principalmente à conveniência de estar sempre disponível: «I asked Francesca 11

why she took off her clothes to pose and why she was so often the subject of her own photographs. “It’s a matter of convenience, I’m always available,” she said». Assim, Francesca Woodman demonstra que as suas fotografias não têm uma finalidade auto-representativa, começando também a evidenciar uma certa noção de performatividade. Se a obra de Francesca nos diz algo acerca dela, é então esta vontade constante para estar sempre a representar, a trabalhar na fotografia, a inserir-se nas suas imagens... Com isto não se pretende argumentar que a fotografia não pode ser auto-retractiva, pois ela pode obviamente sê-lo. Discute-se é que, no caso de Woodman, em grande parte das fotografias onde a artista insere o seu corpo, a sua presença não parece ter uma função auto-representativa, pois o seu trabalho vai além da apresentação do real, torna-se algo mais que isso... Volta-se à ideia de que a máquina fotográfica apesar de permitir uma aproximação imitacional à realidade, ao captar um corpo, um rosto, uma pessoa, um gesto, não nos diz nada acerca da entidade dessa mesma pessoa. A fotografia é nua, ela mostra-nos tudo... Mas mostra-nos tudo a partir de miragens... Essa nudez não se torna palpável, física, ela é uma falsa nudez... É fantasia, porém mágica... O que se pretende aqui reflectir é, de novo, que Francesca Woodman trabalha não só com (ou apartir da) a fotografia, mas trabalha também dentro da própria Dimensão Fotográfica. É lá, nesse universo ficcional e espectral que ela se transforma, deixa de ser ela mesma, torna-se numa multiplicidade de coisas, de seres, de entidades... Ela revela-nos o seu corpo, os seus traços, as suas feições (ou um desfoque dos mesmos), mas ao mesmo tempo não é ela que lá está. Francesca Woodman demonstra-nos assim a relação íntima e pessoal que tem com a fotografia e ainda o conhecimento e domínio técnico que tem acerca das particularidades e propriedades da mesma como medium. Ela está a par da ideia de que o observador pensa que a conhece ao vê-la ali na fotografia, contudo a artista reconhece que no mundo da representação, o verdadeiro eu está sempre fora da imagem.

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O Corpo e o Espaço: Performance e Construção Uma das principais questões presente no trabalho de Woodman e que se pretende aqui discutir incide sobre a relação do corpo com o espaço que o envolve, que o delimita, ou no qual ele se insere. Como se observa em algumas das fotografias de Woodman, como a série House (House #3 e House #4 na página 35), assim como na maior parte dos projectos onde Francesca trabalha em interiores, os espaços escolhidos pela artista correspondem geralmente a edifícios em deteriorimento, em degradação, que caiem, espaços não-habitados. E parece haver uma preocupação por parte da artista em como ocupar este espaço, ou como posicionar o corpo neste espaço, ou como poderá o corpo tornar-se parte deste espaço: I am interested in the way people relate to space. The best way to do this is to depict their interactions to the boundaries of these spaces. Started doing these with ghost pictures, people fading into a flat plane - i.e. becoming the wall under the wallpaper or of an extension of the wall onto the floor. Close to what I am doing now is my beggining last spring of [M.] of myself enclosed by a glass coffee table. Also video tapes - people becoming, or emerging from environment (entradas no diário de Francesca Woodman in TOWNSEND, 2006, p. 244)

Na obra House #3 observa-se então um corpo (o da própria artista) que actua como orquestrador de movimento, interagindo com o espaço arquitectónico que o envolve e, ao mesmo tempo, tornando-se parte dele, quase como se houvesse uma metamorfose entre ambos. Esta ideia de movimento - do corpo que se desloca no espaço e no tempo - é apresentada pelo desfoque da figura devido às longas exposições frequentes no trabalho de Woodman, dando origem a uma duração na imagem fotográfica que, por conseguinte, transmite então uma certa noção de performatividade. A imagem deixa de ser apenas uma captação instantânea para se tornar num registo (numa “gravação” por assim dizer) de um momento espacial-temporal no qual um corpo actua - um corpo que se transforma, que é absorvido por aquele espaço, por uma construção (uma elevação do homem) que agora volta ao seu estado primordial. A parede desfaz-se e o papel de parede cai para o chão, os tijolos ou azulejos partem-se, a água infiltra-se e consome a madeira... É interessante verificar que a ausência do homem no espaço arquitectónico leva a um retorno desse mesmo lugar (arquitectura, verticalidade, objecto) ao seu estado “natural” (chão, horizontal, matéria). Numa sequência de estudos para a série Space2 (pág. 29), um projecto desenvolvido ao longo do período que esteve na Rhode Island School of Design, Francesca Woodman adopta o formato quadrado da imagem fotográfica precisamente para explorar a questão de um espaço (en)quadrado, um espaço 13

tridimensional que é convertido numa superfície plana pela própria imagem. A artista constrói novos espaços dentro do próprio espaço da fotografia e revela-nos um corpo fantasmagórico, num acto performativo, que se coloca e desloca em diferentes posições e direcções numa relação interior/exterior com os limites da composição: o corpo introduz-se e absorve-se nos (assim como interage e quebra com os) limites espaciais que o envolvem. Esta ideia da performance e da relação do corpo com o espaço que o delimita é uma questão importante e interessante no trabalho de Woodman, podendo talvez ser estabelecida uma relação com o trabalho de Helena Almeida, tendo como exemplo a obra Tela Habitada (pág 58): a artista evidencia um confronto e um rompimento com o suporte da tela e revela-nos que a fotografia funciona não apenas como um registo de uma performance, como se torna ela própria o meio pelo qual o acto performativo ganha vida, pelo qual é desencadeado na sua relação com o espectador. Outra obra de Woodman a integrar um acto performativo é a série Angels (ver pág. 41 e 42) que, por sua vez, remete para outro artista cujo trabalho seria provavelmente familiar a Woodman: Duane Michals. Chris Townsed refere que Michals é um dos artistas que mais se parece relacionar com Francesca; nota-se que o trabalho de ambos os fotógrafos toca em vários pontos comuns. Assim como Francesca nas House Series, Michals trabalha por vezes em interiores cujas paredes parecem envelhecer, como por exemplo nas várias fotografias de A Violent Act (pág. 53). Nas obras de Michals afirma-se também a questão da performance, não só devido à duração na imagem (revelada pelos arrastamentos dos corpos) mas também por causa das frequentes sequências de imagens: A Violent Act ou The Fallen Angel na página 56; em Francesca os Estudos para Space2, pág. 29, ou os Self-Deceit na pág. 47 e 48; e ainda em Helena Almeida a própria sequência da Tela Habitada. O movimento dos corpos e o recorrer a longas ou duplas exposições como criadores de arrastamentos, fantasmas e espectros também seriam evidentes no trabalho de ambos: em Michals esta ideia está presente em The Spirit Leaves the Body (pág 53), People Eat People (pág. 54) ou The Young Girl’s Dream (pág. 54). Um outro aspecto paralelo aos dois parece ser a figura do anjo (de novo: The Fallen Angel em Michals, na pág 56; e as Angel Series em Woodman, pág. 41 e 42). E ainda o facto de escreverem nas margens das fotografias, como em Then at one point I did not need to translate the notes; they went directly to my hands (ver pág. 36) e True Identity of Man (pág. 55): mas enquanto Michals insere a palavra como forma de atribuir um título à imagem ou oferecer uma extensão do seu conteúdo, no caso de Woodman, apesar de também o usar para os títulos, o texto por vezes não tem uma relação directa com o que é apresentado pela fotografia. Um conjunto de fotografias com Charlie (um modelo na Rhode Island School of Design) apresentam não só uma interacção de um corpo com o 14

espaço, como também uma comunicação entre dois corpos, evidenciando de novo um carácter performativo na fotografia da artista (ver pág. 39). Sloan Rankin, amiga de Francesca, esteve presente e foi quem tirou as fotografias:

Charlie’s size and disarming simplicity made her nervous, so she asked me to be present during her photographing sessions with him. As always, she was tempted to jump into the pictures herself, and within minutes Francesca was alongside Charlie, nude, playing with the cat in the studio, adjusting mirrors, and I was now shooting pictures of the two of them. (palavras de Rankin em SCHWARZENBACH, 1998, p. 36)

Numa outra imagem da série Space2 Woodman vai novamente criar um envolvimento com a materialidade do espaço ao revestir-se com o papel de parede (pág. 36, fig. 30). A parede abraça-a (voltamos à parede, ao lugar das sombras, mas agora como espaço e não somente como ecrã). Enquanto que a House #3 apresenta mais uma espécie de transformação ou fusão, nesta fotografia o corpo apresenta-se já como um elemento estático e fixo da construção. Woodman começa a incorporar-se e a materializar-se no espaço arquitectónico ao inserir o corpo na sua superfície - na parede - e explora a transgressão não só dos limites de um espaço (como se observa nos Estudos para Space2) como simultaneamente do próprio corpo. O corpo da artista deixa de ser apenas corpo e torna-se parte da arquitectura. Aqui começa a destacar-se outra questão: não propriamente a do corpo numa relação performativa com o espaço, mas talvez mais uma transformação do corpo numa parte desse espaço. Em Then at one point (...) o papel de parede volta a abraçar um corpo, quase como se estivesse envolvido num casúlo (pág. 36). E ainda numa outra fotografia o corpo parece tornar-se num pilar de mármore (pág 50, fig. 59). Esta ideia da transgressão dos limites aos quais o corpo está sujeito, do corpo que excede as suas extremidades (quase como uma forma que se liberta do seu contorno), da fusão entre corpo e espaço, do corpo enquanto uma construção, parece então remeter, de certa maneira, para o mito de Dafne - a ninfa que, ao fugir do amor possessivo de Apollo (visto este ter sido atingido por uma seta do Cupido), é convertida numa árvore (ver pág. 57, fig. 71). Esta seria uma temática já presente no trabalho de Woodman em Colorado (fig. 5 na pág. 23) assim como mais tarde em Hampshire (pág. 51), e que se pode também encontrar na obra de Ana Mendieta, uma artista contemporânea de Woodman (pág. 57, fig. 72). O corpo torna-se não só parte de um espaço, como também se converte num objecto. Isto poderá, de certa maneira, transmitir algumas problemáticas associadas ao feminismo com as quais Wooman poderia estar a par - a mulher e o corpo feminino como objecto de prazer visual, questões de género. Continuando nesta idea do corpo como parte de um espaço, ou como construção de espaço, Michael Rose refere que em duas fotografias de Nova Iorque (na pág. 49), a artista já não está numa fusão com a parede, nem como 15

parte da mesma, mas encontra-se numa relação com a sua superfície que se encontra em detrimento e que revela o seu interior. Na segunda fotografia (fig. 57) observamos a artista do lado esquerdo da composição, com as costas voltadas para o observador, e com uma roupa que se assemelha à tonalidade e à textura da parede, segurando o que parece ser uma espinha de um peixe que é colocada no lugar da sua própria coluna: Woodman revela-nos assim a sua própria estrutura (ou construção) interior assim como a parede que apodrece revela também o seu suporte interno, as diferentes camadas que a constituem e elevam... No fundo, poderá então reflectir-se acerca de uma relação entre o ser orgânico/biológico e o inorgânico/arquitectónico: assim como o ser humano, o próprio edifício apresenta igualmente uma estrutura, um esqueleto, que eventualmente acaba também por se deteriorar, apodrecer, cair e morrer. Há então toda uma fisicalidade envolvida no trabalho de Woodman, e esta ideia é bastante evidente em algumas fotografias onde há uma deformação ou distorção do corpo (ver por exemplo fig. 2 na pág. 21, e fig. 34 na pág. 38) remetendo de certo modo para o trabalho de Hans Bellmer (pág. 60, fig. 76). Por último, surge a tendência para fotografar o canto, alinhar o corpo com o canto de um espaço, o ponto onde há um encontro (uma intersecção) não só entre o horizontal e vertical (chão e parede) como também entre vertical e vertical (parede e parede) (figuras 4, 7, 8, 9, 11, 12, ...). Esta questão é mencionada por George Baker durante uma retrospectiva ao trabalho de Francesca Woodman que teve lugar no Museu Guggenheim em Junho de 2012. George Baker refere que a câmara fotográfica tem a capacidade para funcionar como uma técnica de desfamiliarização com a continuadade espacial real. Baker dá o exemplo de Irving Penn (na página 60) como referência de um precedente a explorar a ideia do canto; menciona ainda o Suprematismo de Malevich (pág. 59), o quadro que sai da sua dimensão bidimensional e plana da parede e assume uma nova relação com o espaço arquitectónico; e também Robert Morris com as peças de canto (pág. 59) (BAKER, 2012). O diálogo do corpo com o espaço apresenta-se então como uma das principais questões em todo o trabalho fotográfico de Woodman. A artista revela um interesse tanto pelo espaço do formato do enquadramento como demonstra também a relação do corpo com os próprios limites espaciais dentro desse mesmo enquadramento. Woodman interage com o espaço; convida outro corpo a actuar com ela nesse mesmo espaço; transforma-se numa parte desse espaço, numa parte dessa construção; deixa-se envolver pelos limites de um espaço (a parede), tornando-se parte dele...

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Conclusão Francesca Woodman revela uma extrema intimidade com a fotografia, uma grande proximidade e domínio pelo medium. A máquina fotográfica é-lhe apresentada ainda na infância, e é desde então um meio pelo qual a artista cria, e nos dá a contemplar, um universo de imagens impressionantes. Com esta análise geral a várias das suas obras, observa-se que Woodman apresenta um leque abrangente de interesses e conteúdos conceptuais e artísticos. Parece ser no corpo que se encontra o ponto de encontro no qual assentam todas estas relações que a artista estabelece entre o espaço, a dimensão do espectro, a performance, a construção, a deformação... O corpo da artista e das suas modelos parece tornar-se numa ferramenta pela qual se evocam e desvendam todas estas matérias, e que eram já, também, de uma certa maneira, temas comuns a outros artistas da sua época, como seria o caso de Duane Michals. No primeiro capítulo - “A Dimensão Fotográfica” - discutiu-se, de uma forma breve, a função paradoxal da fotografia. A máquina fotográfica veio impôr-se no lugar do desenho e da pintura no que diz respeito à aproximação mimética da realidade, mas estabeleceu-se ao mesmo tempo como um meio pelo qual uma nova dimensão se torna visível (presente) ao olhar. Esta analogia entre a imagem como documento e a imagem como ficção, com o exemplo da parede que servia de ecrã às sombras na Caverna de Platão, serviu para demonstrar que a fotografia de Woodman recorre precisamente às propriedades e funcionalidades da própria máquina fotográfica enquanto mecanismo (aparelho, dispositivo) para criar um arrastamento, um desvanecimento, um desaparecer ou uma transparência nos corpos através do movimento e da durabilidade. Esta é uma questão interessante, pois a imagem (a obra de arte) deixa de ser criada somente pela artista e é também desenvolvida pelo automatismo (e individualidade) desta máquina, desta caixa metálica mágica, negra, obscura e captadora de luz. Com o segundo capítulo - “Acerca do Auto-Retracto” - explorou-se a relação de ausência/presença entre corpo e entidade devido ao facto de Francesca Woodman se inserir nas suas próprias fotografias. Sendo o auto-retracto uma temática histórica e clássica no universo artístico, a presença do corpo do próprio artista nas suas obras tem uma carga, tradicionalmente, auto-representativa; o artista parece revelar-se ao público ou querer demonstrar parte do seu Ser, da sua personalidade, da sua entidade. Contudo, Woodman revela-nos o seu papel duplo para com a fotografia - de artista e de modelo, de criadora e de criação. Aqueles corpos deformados pelos arrastamentos, desvanecidos e fantasmagóricos não nos mostram nem evidenciam a artista como uma pessoa que foge à realidade e à vida (a tal interpretação que geralmente lhe é atribuída) mas sim uma fotógrafa que 17

compreende que um artista, como criador, pode assumir os papéis e as funções que quiser e que considera serem indispensáveis para demonstrar as várias noções e conceitos que o seu trabalho pretende investigar, estudar e exprimir. Por fim, no capítulo “O Corpo e o Espaço: Performance e Construção”, observa-se que, na obra fotográfica de Francesca Woodman, o corpo é considerado como um elemento de trabalho quase tão fundamental como a própria máquina. É através dele que a artista estabelece uma relação, uma convivência e uma transformação com o espaço que o envolve. A artista demonstra-nos a interacção de um corpo com o espaço vazio, abandonado e em degradação; o corpo transporta-se para a parede, para esse elemento de construção e delimitação de um espaço, e é-nos revelado meio desfocado, arrastado e metamorfoseado devido à sugestão do movimento captado pela máquina através da longa exposição, revelando então a tal questão da duração e da presença de tempo na obra. O corpo move-se e actua perante o olhar da objectiva com uma finalidade crucial à criação da imagem - a tal de transformação ou fusão com a parede - e assim Woodman faz desencadear, através da fotografia, a ideia de que estamos também perante uma performance. Desta forma, pretende-se então com este pequeno ensaio, não só expor um conjunto de observações em torno da obra de Woodman, mas também contribuir para que o trabalho da artista continue a ser cada vez mais explorado, reconhecido e elevado pela história e teoria da arte e da fotografia, pois a sua obra é não só visualmente deslumbrante como também conceptualmente rica; e ainda apelar para que tenhamos também uma observação mais atenta e preocupada para com o desenvolvimento dos artistas jovens (estudantes ou não-estudantes) e emergentes na actualidade.

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Referências BAKER, George (2012) In Through the Lens of Francesca Woodman (part 1 of 2). [Em linha] Vídeo de várias apresentações e discussões em torno do trabalho de Francesca Woodman, publicado na ocasião de uma exposição da artista no Solomon R. Guggenheim Museum, de 16 de Março a 13 de Junho de 20. Duração (hh-mm-ss): 01:14:24. Disponível em BAZIN, André (2013) «A Ontologia da Imagem Fotográfica» In Ensaios Sobre Fotografia: de Niépce a Krauss. Lisboa: Orfeu Negro, 1ª Edição (Introdução, selecção e organização de Alan Trachtenberg; Tradução de Luis Leitão, Manuela Gomes e João Barrento). ISBN: 978-989-8327-19-2 KELLER, Corey (ed. lit.); et al. (2012) Francesca Woodman. Nova Iorque: D.A.P; San Francisco: San Francisco Museum of Modern Art (Obra publicada por ocasião da exposição organizada e patente no San Francisco Museum of Modern Art, de 5 de Nov. de 2011 a 20 de Fev. de 2012 e no Solomon R. Guggenheim Museum, em Nova Iorque (Estados Unidos), de 16 de Março a 15 de Jun. de 2012). ISBN: 978-1-935202-66-0 KRAUSS, Rosalind (1999) Bachelors. Cambridge, Massachussetes: The MIT Press. ISBN: 0-262-11239-6 MEDEIROS, Margarida (2010) Fotografia e Verdade: Uma História de Fantasmas. Lisboa: Assírio & Alvim. ISBN: 978-972-37-1561-3 ROSE, Michael (2013) Transformations and Disappearances: The Presence of the Artist in the Work of Francesca Woodman [Em linha]. Publicação online: 20 de Maio. Disponível em SCHWARZENBACH, Alexis (ed. lit.); et al. (1998) Francesca Woodman. Nova Iorque: Scalo (publicado no contexto de uma exposição na Fondation Cartier pour l’Art Contemporain, Paris; tradução de Rana Dasgupta). ISBN: 3-931141-96-9

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SONTAG, Susan (2005) On Photography. Nova Iorque: RosettaBooksLLC. ISBN: 0-7953-2699-8 SUNDEL, Margaret (1996) «Vanishing Points: The Photography of Francesca Woodman», In Institute of Contemporary Art (Boston, Estados Unidos), Inside the Visible: An Elliptical Traverse of 20th Century Art In, Of, and from the Feminine. Cambridge: The MIT Press, pp. 435-439. ISBN: 0-26254081-9 TOWNSEND, Chris (2006) Francesca Woodman. Londres: Phaidon. ISBN: 0-7148-4430-6

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Catálogo de Imagens

Figura 1. Francesca Woodman, Self-Portrait at Thirteen (1972). Boulder, Colorado.

Figura 2. Francesca Woodman, Sem T]itulo (c. 1972-75). Boulder, Colorado. 21

Figura 3 Francesca Woodman Sem Título (c. 1972-75) Boulder, Colorado

Figura 4 Francesca Woodman Sem Título (c. 1972-75) Boulder, Colorado

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Figura 5. Francesca Woodman, Sem Título (c. 1975). Boulder, Colorado

Figura 6 Francesca Woodman Sem Título (c. 1974-75) Andover, Massachusettes

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Figura 7. Francesca Woodman, Sem Título (c. 1975-76). Providence, Rhode Island

Figura 8. Francesca Woodman, Sem Título (c. 1975-78). Providence, Rhode Island

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Figura 9. Francesca Woodman, Sem Título (1976). Providence, Rhode Island

Figura 10. Francesca Woodman, Sem Título (1976). Providence, Rhode Island

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Figura 11. Francesca Woodman, My House (1976). Providence, Rhode Island

Figura 12. Francesca Woodman, Sem Título (1976). Providence, Rhode Island

26

Figura 13. Francesca Woodman, Sem Título (1975-76). Providence, Rhode Island

Figura 14. Francesca Woodman, Space2 (1976). Providence, Rhode Island

27

Figura 15. Francesca Woodman, Sem Título (1976). Providence, Rhode Island

Figura 16. Francesca Woodman, Sem Título (1975-78). Providence, Rhode Island

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Figura 17 Francesca Woodman Estudos para Space2 (1976) Providence, Rhode Island

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Figura 18. Francesca Woodman, Space2 (1976). Providence, Rhode Island

Figura 19. Francesca Woodman, Space2 (1976). Providence, Rhode Island

30

Figura 20. Francesca Woodman, Self Portrait Talking To Vince (1976-77). Providence, Rhode Island

Figura 21. Francesca Woodman, Sem Título (1976). Providence, Rhode Island

31

Figura 22. Francesca Woodman, Sem Título (1976). Providence, Rhode Island

Figura 23. Francesca Woodman, Sem Título (1975-78). Providence, Rhode Island

32

Figura 24. Francesca Woodman, Sem Título (1976). Providence, Rhode Island

Figura 25. Francesca Woodman, Sem Título (1977)

33

Figura 26. Francesca Woodman, Sem Título (1976). Providence, Rhode Island

Figura 27. Francesca Woodman, Sem Título (1976). Providence, Rhode Island

34

Figura 28. Francesca Woodman, House #3 (1976). Providence, Rhode Island

Figura 29. Francesca Woodman, House #4 (1976). Providence, Rhode Island

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Figura 30. Francesca Woodman, Space2 (1976-77). Providence, Rhode Island

Figura 31. Francesca Woodman, Then at one point I did not need to translate the notes; they went directly to my hands (1976). Providence, Rhode Island 36

Figura 32. Francesca Woodman, Polka Dots #5 (1976). Providence, Rhode Island

Figura 33. Francesca Woodman, Polka Dots (1976). Providence, Rhode Island

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Figura 34. Francesca Woodman, Horizontale (1976). Providence, Rhode Island

Figura 35. Francesca Woodman, Verticale (1976). Providence, Rhode Island

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Figura 36. Francesca Woodman, Charlie the Model #6-9 (1976-77). Providence, Rhode Island

Figura 37. Francesca Woodman, Charlie the Model #5 (1976-77). Providence, Rhode Island 39

Figura 38. Francesca Woodman, Sem Título (c. 1975-78). Providence, Rhode Island

Figura 39. Francesca Woodman, Sem Título (1977). Concord, New Hampshire

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Figura 40. Francesca Woodman, From Angels Series (1977). Roma, Itália

Figura 41. Francesca Woodman, From Angels Series (1977). Roma, Itália

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Figura 42. Francesca Woodman, Angels Series (1977). Roma, Itália

Figura 43. Francesca Woodman, Angels Series (1977). Roma, Itália

42

Figura 44. Francesca Woodman, From Angels Series (1977-78). Roma, Itála

Figura 45. Francesca Woodman, On Being an Angel #1 (1976-77). Providence, Rhode Island 43

Figura 46. Francesca Woodman, Sem Título (c. 1977-78). Roma, Itália

Figura 47. Francesca Woodman, Sem Título (c. 1977-78). Roma, Itália

44

Figura 48. Francesca Woodman, Sem Título (c. 1977-78). Roma, Itália

Figura 49. Francesca Woodman, Sem Título (c. 1977-78). Roma, Itália

45

Figura 50. Francesca Woodman, Yet Another Leaden Sky (c. 1977-78). Roma, Itália

Figura 51. Francesca Woodman, Sem Título (c. 1977-78). Roma, Itália

46

Figura 52. Francesca Woodman, Self-Deceit #1 (1978). Roma, Itália

Figura 53. Francesca Woodman, Self-Deceit #3 (1978). Roma, Itália

47

Figura 54. Francesca Woodman, Self-Deceit #5 (1978). Roma, Itália

Figura 55. Francesca Woodman, Self-Deceit #7 (1978). Roma, Itália

48

Figura 56. Francesca Woodman, Sem Título (1979). Nova Iorque

Figura 57. Francesca Woodman, Sem Título (1979). Nova Iorque

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Figura 58. Francesca Woodman, Sem Título (1979-80). Nova Iorque

Figura 59. Francesca Woodman, Sem Título (1979). Nova Iorque

50

Figura 60. Francesca Woodman, Sem Título (1980). MacDowell Colony, Peterborough, New Hampshire

Figura 61. Francesca Woodman, Sem Título (1980). MacDowell Colony, Peterborough, New Hampshire 51

Figura 62. Francesca Woodman, páginas do livro Some Disordered Interior Geometries (1980-81)

Figura 63. Francesca Woodman, páginas do livro Some Disordered Interior Geometries (1980-81) 52

Figura 64. Duane Michals, The Spirit Leaves the Body (1968)

Figura 65. Duane Michals, A Violent Act (1966)

53

Figura 66. Duane Michals, The Young Girl’s Dream (1969)

Figura 67. Duane Michals, People Eat People (1974)

54

Figura 68. Duane Michals, True Identity of Man (1972)

Figura 69. Duane Michals, The Fallen Angel (1968)

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Figura 70. Duane Michals, The Fallen Angel (1968)

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Figura 71 Gian Lorenzo Bernini Apolo e Dafne (c. 1622-25) Mármore Galeria Borghese, Roma

Figura 72 Ana Mendieta Tree of Life (1976)

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Figura 73. Helena Almeida, Tela Habitada (1976)

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Figura 74. Kazimir Malevich, Black Square (1915) Última Exposição Futurista: 0.10, Petrogrado (actual S. Petersburgo), Dezembro 1915

Figura 75 Robert Morris Sem Título (Corner Piece) 1964 Contraplacado Pintado 198,1 x 274,3 cm

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Figura 76. Hans Bellmer, A photograph of Unica Zurn (1958)

Figura 77 Irving Penn Marcel Duchamp Nova Iorque, 1948

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