Decadência administrativa (L. 9784, art. 54) contada da aposentadoria originária da pensão por morte

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VOTO-VISTA ADMINISTRATIVO. EMBARGOS INFRINGENTES. PENSÃO POR MORTE. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO. VANTAGEM DO ART. 192, II, DA LEI 8.112/90. SUPRESSÃO. DECADÊNCIA. LEI 9.784/99. 1. A Lei nº 9.784/99 incorporou em seu art. 54 a matriz objetiva francesa da segurança jurídica, dispondo que a ausência de máfé – que equivale à ausência de dolo –, associada ao decurso de prazo, justificam a convalidação de atos administrativos com efeitos favoráveis que sejam contrários à lei. Assim, preenchidos os requisitos a que alude o art. 54 da Lei 9.784/99, não há óbice para que se configure a decadência administrativa, que atinge tanto os atos nulos quanto os anuláveis. (STJ, 2ª Turma, REsp 1157831, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 24.04.2012; STJ, 5ª Turma, AgRg no REsp 1.147.446, Rel. Min. LAURITA VAZ, DJe 26.09.2012; STJ, 3ª Seção, MS 13.407, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJe 02.02.2009). 2. Embora consubstanciem benefícios autônomos, naquilo que o valor da pensão decorrer direta e necessariamente da aposentadoria, o termo a quo para a correção de eventuais equívocos é a data em que concedida a aposentadoria. (STJ, AI 1.319.255, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJe 10.03.2014; TRF2, 7ª Turma Especializada, AMS 72832, Rel. Des. Fed. REIS FRIEDE, DJ 17.12.2008; TRF5, 1ª Turma Especializada, APELREEX 25038, Rel. Des. Fed. MANOEL ERHARDT, DJe 14.03.2013). 3. Ofende o art. 54 da Lei 9.784/99 a supressão de vantagem paga a beneficiária de pensão por morte se o fato determinante de sua invalidade ocorreu há mais de 5 anos e quando da concessão da aposentadoria ao servidor falecido. 4. Vantagem incorporada aos proventos do ex-servidor anteriormente à edição da Lei 9.784/99. Termo a quo do prazo decadencial de anulação contado a partir da vigência da referida lei, em 01.02.1999 (STJ, MS nº 9.112/DF e 9.157/DF, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJ 14.11.2005; MS nº 9.115/DF, Rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA, DJ 07.08.2006).Termo ad quem, por conseguinte, em 01.02.2004. 5. Embargos infringentes conhecidos e providos.

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O EXMO. SR. DESEMBARGADOR FEDERAL RICARDO PERLINGEIRO Cuida-se, na origem, de ação ordinária com pedido de antecipação de tutela ajuizada por ANA LUCIA CARNEIRO DE SAMPAIO CORREA em face da UNIÃO FEDERAL, objetivando a reinclusão da vantagem prevista no art. 192, II da Lei 8.112/90 em sua pensão por morte, bem como a devolução das quantias recebidas a esse título que lhe foram descontadas para fins de reposição ao erário. A demandante é pensionista do ex-servidor Mauro Júlio de Sampaio Correa, vinculado à época ao Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE), e que se encontrava aposentado por invalidez desde 1989 (fl.11). A partir do falecimento do referido ex-servidor, em 05 de março de 2009, passou a demandante receber o benefício de pensão por morte, calculado na forma do art. 40, §7º, da Constituição e do art. 2º da Lei 10.887/2004 (fls. 85/86). Ocorre que, em novembro de 2009, a mesma foi comunicada sobre uma revisão realizada em seu benefício, na qual se apurou que a vantagem prevista no art. 192, II, da Lei 8.112/90 havia sido equivocamente incluída, a partir de 1998, nos proventos de seu falecido esposo. Por conseguinte, determinou a Administração Pública que o valor correspondente à referente parcela fosse suprimido do benefício de pensão e também que a demandante ressarcisse o que recebera a tal título (fl. 25). Argumenta a interessada que a vantagem em questão já vinha sendo recebida pelo ex-servidor há mais de dez anos, de forma que não seria possível ao órgão pagador pretender excluí-la após certo período de tempo. A decisão de fl. 28 deferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, determinando a reinclusão da vantagem no cômputo da pensão da demandante. A União Federal interpôs o Agravo de Instrumento nº 2010.02.01.001190-1 (fls. 40/48), cujo seguimento foi negado em virtude da perda superveniente de seu objeto, eis que proferida sentença no processo originário.

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Em contestação (fls. 56/62), a ora embargada aduziu que a vantagem prevista no art. 192, II, da Lei 8.112/90 era devida apenas ao servidor que completasse o tempo de serviço para aposentadoria com proventos integrais. Ocorre que, no momento da concessão da pensão por morte, a Administração constatou que o falecido servidor havia se aposentado por invalidez (e não por tempo de serviço), não atendendo aos requisitos necessários para a obtenção da referida vantagem. Dessa forma, afirma a União que, consoante o disposto no art. 53 da Lei 9.784/99, o referido ato deve ser anulado, com o consequente cancelamento da vantagem prevista no art. 192, II, da Lei 8.112/90 e a devolução de todos os valores recebidos a esse título pelo ex-servidor e a demandante. A sentença de fls. 124/126, com fulcro no art. 54 da Lei 9.784/99, concluiu que havia decaído o direito da Administração Pública de proceder à revisão do benefício, tendo em vista que a vantagem foi incorporada definitivamente aos proventos do exservidor no ano de 1998 (fl. 17), e que a referida revisão somente ocorreu em 2009. Destaco o seu dispositivo: Por todo o exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido, para condenar a União Federal a incluir nos proventos de pensionista da autora a vantagem prevista no artigo 192, II da Lei 8.112, percebida por Mauro Julio de Sampaio Correia até a data de seu óbito. Deverá a União, ainda, pagar à autora os valores devidos desde a data de supressão até a data em que venha a ser novamente implantada, acrescidos de juros de mora de 0,5% ao mês, a contar da citação e com aplicação de correção monetária na forma da tabela de cálculos da Justiça Federal até 29 de Junho de 2009, data da edição da Lei 11690. A partir de então, deverão incidir os índices de correção monetária e de juros aplicados às cadernetas de poupança. Em regime de tutela de urgência, diante do caráter alimentar da demanda, deve a União cumprir a obrigação de fazer estabelecida na sentença (reimplantar o pagamento da vantagem e se abster de efetuar descontos a título de reposição ao erário), no prazo de trinta dias a contar da intimação da sentença, sob pena de multa arbitrada em mil reais por mês de atraso, revertida em favor da autora.

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No recurso de apelação (fls. 128/139), afirmou-se que não incidiria a decadência quanto ao direito de revisar a pensão por morte, em razão de este ser um benefício distinto da aposentadoria da qual decorreu. Asseverou-se, ainda, que em consequência do vício de legalidade da vantagem em comento, impossível seria a sua incorporação ao benefício da apelada, impondo-se à Administração Pública o dever de anulá-la. A Egrégia 5ª Turma Especializada deste Tribunal deu provimento, por maioria, ao respectivo recurso de apelação (fls. 164/165). Inicialmente, o acórdão assinalou que, identificada a ilegalidade no pagamento da vantagem, a Administração teria o dever de saná-la a qualquer tempo, não sendo possível reconhecer a incidência do art. 54 da Lei 9.784/99 por tratar-se de ato nulo. No entanto, ainda que se entendesse aplicável o prazo decadencial, a sua consumação não teria ocorrido, pois, a despeito da decadência do direito de revisar a aposentadoria, o mesmo não se verificaria quanto à pensão, na medida em que consubstanciam benefícios autônomos. Assim, uma vez que pensão foi concedida em março de 2009 e sua revisão ocorreu em novembro do mesmo ano, o quinquênio decadencial previsto no art. 54 da Lei 9.784/99 não teria se concretizado. Em contrapartida, o voto vencido (fls. 170/172) posicionou-se no sentido de que o prazo decadencial para exclusão da parcela já havia se materializado, eis que decorridos mais de cinco anos entre o início do recebimento da vantagem pelo instituidor da pensão (em 1998) e a respectiva revisão (em 2009). Embargos infringentes opostos às fls. 178/180, pugnando pela manutenção do entendimento esposado no voto vencido. Parecer do Ministério Público Federal (fls. 195/200) opinando pelo não provimento dos embargos infringentes. Em seu voto, o MM. Relator negou provimento aos presentes embargos, sustentando a inaplicabilidade da decadência ao caso, visto que, além de tratar-se de ato nulo, que pode ser revisado a qualquer tempo, também não houve o transcurso de cinco anos entre a concessão da pensão e a correção do erro. Destacou, ainda, tratar-se a pensão por morte de relação de trato sucessivo, o que impede apenas que as parcelas

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pagas há mais de cinco anos sejam cobradas, sem que haja qualquer óbice à regularização das parcelas posteriores. Vieram os autos para vista. É o breve relatório. Consoante relatado, trata-se de embargos infringentes opostos por Ana Lucia Carneiro de Sampaio Correa, objetivando a reforma do acórdão que determinou a supressão da vantagem prevista no artigo 192, II, da Lei 8.112/90 de seu benefício de pensão por morte e a reposição ao erário dos valores recebidos a esse título. No caso dos autos, a embargante é beneficiária de pensão por morte de servidor aposentado do Tribunal Regional Eleitoral do Rio de Janeiro (TRE/RJ), falecido em março de 2009. Ocorre que, nove meses após a concessão do benefício, a Administração Pública apurou que o instituidor da pensão vinha recebendo irregularmente a vantagem prevista no art. 192, II, da Lei 8112/90 desde 1998 (fls.84). Consequentemente, determinou a Administração Pública que essa parcela fosse suprimida do benefício da embargante, efetuando descontos relativos aos valores pagos nos últimos cinco anos. Argumenta a Fazenda Pública que o art. 192, II, da Lei 8.112/90 impõe como requisito à percepção da vantagem ali prevista que o servidor conte com tempo de serviço suficiente para a concessão de aposentadoria com proventos integrais. Entretanto, no caso em tela, a aposentadoria com proventos integrais decorreu de invalidez (fls.11), e não de tempo de serviço. De tal sorte, assevera que a supressão da referida parcela é conduta que se impõe, sob pena de perpetuação dos efeitos de ato inválido. O voto vencedor exarado no julgamento do recurso de apelação posicionou-se no sentido de que, tendo o pagamento da vantagem se dado de forma irregular, não haveria que se falar em prazo decadencial para sua anulação, porquanto tal ato poderia ser revisto a qualquer tempo. Acentuou-se, entretanto, que mesmo que tal prazo incidisse, a decadência ainda não teria se consumado. Considerando que a pensão por

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morte tem configuração diversa da aposentadoria, o termo a quo para correção do erro se verificaria em março de 2009, momento em que a pensão foi concedida. Dessa forma, como a supressão da vantagem se deu em novembro de 2009, o prazo previsto no art. 54 da Lei 9784/99 não teria se esgotado. Por sua vez, o voto vencido considerou que o prazo decadencial para anulação do ato teve início com a concessão da vantagem ao ex-servidor, em 1998. Consequentemente, o deferimento da pensão não teria o efeito de reabrir o prazo para a revisão do benefício. Cinge-se a controvérsia à incidência do prazo decadencial do art. 54 da Lei 9.784/99 para anulação de vantagem pecuniária irregularmente concedida a servidor público inativo, bem como à determinação do termo a quo de tal prazo quando a referida irregularidade somente é verificada após a concessão de pensão por morte aos dependentes do ex-servidor. Inicialmente, convém ressaltar que, no âmbito de um Estado Democrático, é absolutamente legítima a expectativa mantida pelos cidadãos de que os atos administrativos possuam os requisitos necessários à regular produção de seus efeitos. Entretanto, quando tal expectativa é frustrada, manifesta-se a necessidade de proteger aqueles que, sem qualquer conduta dolosa, foram beneficiados por ato administrativo aparentemente legal, cuja irregularidade somente foi verificada em momento posterior. Nesse contexto, exsurge o princípio da segurança jurídica como um contraponto ao poder de autotutela administrativa, de forma a salvaguardar os direitos daqueles atingidos pela anulação de ato administrativo que anteriormente se reputava válido. Com efeito, o princípio da segurança jurídica apresenta duas vertentes, uma subjetiva e outra objetiva, cuja distinção se faz necessária ao deslinde das questões postas nos autos. Em sua vertente subjetiva, a segurança jurídica consubstancia o princípio da confiança legítima, que permite a convalidação de ato irregular favorável ao interessado independente de prazo ou de previsão legal. Para tanto, além da ausência de dolo,

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coação ou ameaça, é preciso que a atuação administrativa tenha transmitido para o interessado credibilidade quanto aos seus efeitos, não lhe sendo possível perceber a existência de qualquer irregularidade. De origem germânica, tal princípio atualmente encontra previsão no §48, número 2 do Código Alemão de Procedimentos Administrativos/ VwVfG. Por outro lado, a vertente objetiva consagra os limites à retroatividade dos atos do Estado dentro de certo lapso temporal, relacionando-se ao direito adquirido, ao ato jurídico perfeito e à coisa julgada. No direito administrativo francês, a manifestação do princípio da segurança jurídica em seu viés objetivo orienta a ideia de que, caso haja modificação de uma situação estabilizada, porém ilegal, a Administração francesa deve conciliar os princípios de segurança jurídica com a “obrigação de restabelecer uma situação conforme o direito” e, assim, a decisão administrativa constitutiva de “direitos” contra legem pode ser desfeita, mas desde que dentro de um prazo.1 Em âmbito nacional, contrariando parcialmente os dizeres da Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal (“A Administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornem ilegais, porque deles não se originam direitos…”), a Lei nº 9.784/99 incorporou em seu art. 54 a matriz objetiva francesa da segurança jurídica, dispondo que a ausência de má-fé – que equivale à ausência de dolo –, associada ao decurso de prazo, justificam a convalidação de atos com efeitos favoráveis que sejam contrários à lei. No caso vertente, afirmou-se no voto vencedor a impossibilidade da incidência de prazo decadencial, tendo em vista que, sendo nulo o ato de concessão da vantagem ao ex-servidor, sua manutenção implicaria em frontal violação ao princípio da legalidade. Decerto, as atuações administrativas podem conter vícios de forma e de conteúdo, do ponto de vista fático ou jurídico. A margem de apreciação das autoridades, 1

M. FROMONT, Droit administratifdêsÉstatseuropéens, Paris, PUF, 2006, p. 261-269.

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quando equivocadamente exercida, pode implicar diversos graus de invalidade: nulidade absoluta, nulidade relativa, anulabilidade, irregularidade. Porém, seja qual for o grau de invalidade ou a natureza do vício, deve a Administração Pública responder pelos danos que causar aos que com ela se relacionam licitamente, tanto pela manifestação do princípio da confiança legítima quanto pela configuração da decadência. Nesse contexto, merecem destaque algumas considerações de Almiro do Couto Silva2 sobre a aplicação do art. 54 da Lei 9.784/99: No referente ao art. 54, o legislador determinou que após o transcurso do prazo de cinco anos sem que a autoridade administrativa tivesse exercido o direito de anulação de ato administrativo favorável, ela decairia desse direito, a menos que o beneficiário tivesse agido com má-fé. Como se trata de regra, ainda que inspirada num princípio constitucional, o da segurança jurídica, não há que se fazer qualquer ponderação entre o princípio da legalidade e o da segurança jurídica, como anteriormente à edição dessa regra era necessário proceder. O legislador ordinário é que efetuou essa ponderação, decidindo-se pela prevalência da segurança jurídica, quando verificadas as circunstâncias perfeitamente descritas no preceito. Atendidos os requisitos estabelecidos na norma, isto é, transcorrido o prazo de cinco anos e inexistindo a comprovada má-fé dos destinatários, opera-se, de imediato, a decadência do direito da Administração Pública de extirpar do mundo jurídico o ato administrativo por ela exarado.

Depreende-se dos autos que todos os requisitos impostos pelo art. 54 da Lei 9.784/99 para incidência do prazo decadencial ali previsto foram preenchidos. Com efeito, o pagamento da vantagem por mais de dez anos decorreu de equívoco imputável unicamente à Administração, porquanto não houve qualquer conduta dolosa empreendida pelo ex-servidor ou pela pensionista que possa ter levado a autoridade administrativa a erro.

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SILVA, Almiro do Couto. O princípio da segurança jurídica (proteção à confiança) no Direito Público Brasileiro e o direito da Administração Pública de anular seus próprios atos administrativos: o prazo decadencial do art. 54 da Lei do Processo Administrativo da União (Lei 9.784/99). In: Revista Brasileira de Direito Público - RBDP, Belo Horizonte, ano 2, n. 6, p. 21-22, jul./set. 2004.

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Além disso, o E. Superior Tribunal de Justiça (STJ) já exarou orientação no sentido de que a incidência do prazo decadencial do art. 54 da Lei 9784/99 alcança tanto os atos nulos quanto os anuláveis. Confira-se os precedentes: ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. INCORPORAÇÃO DE QUINTOS. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA. AUSÊNCIA DE OFENSA AO ART. 535 DO CPC. RECURSO ESPECIAL NÃO PROVIDO. 1. A solução integral da controvérsia, com fundamento suficiente, não caracteriza ofensa ao art. 535 do CPC. 2. A autotutela administrativa dos atos - anuláveis ou nulos - de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários está sujeita ao prazo de decadência quinquenal, previsto no art. 54 da Lei 9.784/1999. A regra não se aplica de forma retroativa, e, nos atos anteriores à citada norma, o termo a quo é o dia 1º.2.1999, data em que a lei entrou em vigor. Precedentes do STJ. 3. O ato concessivo do benefício é de 1997, e sua anulação é de 2007. Está caracterizada, portanto, a decadência do direito de revisar o ato administrativo. 4. Foram oferecidos memoriais pela recorrida, os quais não inovam na discussão nem alteram o resultado do julgamento. 5. Recurso Especial não provido. (STJ, 2ª Turma, REsp 1.157.831, Rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJe 24.04.2012, grifo nosso). MANDADO DE SEGURANÇA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO CIVIL. PROCESSO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR. CARGO PÚBLICO. HABILITAÇÃO LEGAL. FALTA. EXONERAÇÃO EX OFFICIO. AUSÊNCIA DE MOTIVAÇÃO. MÁ-FÉ. DECADÊNCIA ADMINISTRATIVA. ART. 54 DA LEI Nº 9.784/99. I- O prazo decadencial para a Administração anular atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis aos administrados decai em cinco anos, contados de 1º/2/1999, data da entrada em vigor da Lei nº 9.784/99. Contudo, o decurso do tempo não é o único elemento a ser analisado para verificação da decadência administrativa. Embora esta se imponha como óbice à autotutela tanto nos atos nulos quanto nos anuláveis, a má-fé do beneficiário afasta sua incidência. II - Na hipótese dos autos, a impetrante foi contratada em 15/6/1985 e retornou ao serviço público por meio de portaria concessiva de anistia de 24/11/1994. Muito posteriormente, em 20/8/2007, teve contra si instaurado processo administrativo disciplinar, que culminou na sua exoneração ex officio em 24/1/2008.III - Incumbiria à Administração Pública expor, no ato decisório, as razões de fato e de direito que fundamentariam a nãoaplicação do art. 54 da Lei nº 9.784/99, analisando especificamente a existência de má-fé da impetrante. A falta de motivação, neste ponto,

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acarreta a nulidade do ato de exoneração. Segurança concedida para reconhecer a nulidade da Portaria 8/2008 por vício de motivação, determinando-se a reintegração da impetrante no cargo em que retornou por anistia. (STJ, 3ª Seção, MS 13.407, Rel. Min. FELIX FISCHER, DJe 02/02/2009, grifo nosso). PREVIDENCIÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. AUTOTUTELA ADMINISTRATIVA. PRAZO DECADENCIAL. APLICÁVEL AOS ATOS NULOS E ANULÁVEIS. PRECEDENTES.1. O prazo decadencial para que a Administração Pública promova a autotutela, previsto no art. 54 da Lei n.º 9.784/99, é aplicável tanto aos atos nulos quanto aos anuláveis. [..] (STJ, 5ª Turma, AgRg no REsp 1.147.446, Rel. Min. LAURITA VAZ,DJe 26/09/2012, grifo nosso)

Dessa forma, preenchidos os requisitos a que alude o art. 54 da Lei 9.784/99, não há óbice para que se configure a decadência administrativa, independente da espécie de vício que atinja o ato em questão. No que tange à determinação do termo a quo do prazo decadencial, verifica-se que o erro em que a Administração incidiu quando da instituição da aposentadoria somente foi detectado após a concessão da pensão por morte do servidor aposentado. Não se olvida que a aposentadoria e a pensão por morte dela decorrente sejam benefícios autônomos, titularizados por pessoas diversas e, em regra, com prazos decadenciais de anulação iniciados em momentos distintos. Entretanto, naquilo que o valor da pensão decorrer direta e necessariamente da aposentadoria, o termo a quo para a correção de eventuais equívocos é a data em que concedida a aposentadoria. No caso em tela, o erro cometido pela autoridade administrativa quando da concessão da aposentadoria foi determinante para o cálculo inicial da pensão concedida à embargante. Assim, é a concessão da aposentadoria a atuação administrativa passível de desfazimento, sendo o recálculo da pensão por morte uma mera consequência. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), analisando caso similar ao dos autos, entendeu que o prazo decadencial para anular vantagem indevidamente atribuída a

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servidor inativo inicia-se com a aposentadoria, não se cogitando, pois, do surgimento de um novo prazo quando concedida a pensão por morte dela decorrente. Confira-se o precedente: [...] Verifica-se nos autos que às fls. 30 e 35/36, o servidor Paulo Graça Araújo a partir de sua aposentadoria, em 12/01/1996, passou a perceber Gratificação de Atividade Executiva - GAE e Gratificação de Estímulo à Docência - GED, integrando tais gratificações a base de cálculo da função comissionada que exercia em atividade, sendo certo que estas verbas foram mantidas no momento da concessão de pensão à impetrante por morte do servidor, em 26/01/2006 ( fl. 33). Todavia, da leitura dos documentos de fls. 31/32 - Memorando-Circular no 33/07-GR, vê-se que, somente em 24 de setembro de 2007, a autoridade coatora determinou que procedesse o cálculo das FC's sem a inclusão da GAE e GEO, os quais integram os proventos de pensão percebidos pela impetrante. Depreende-se, pois, que em 1996 o servidor passou a receber as funções comissionadas. Mas, a impetrante, em 2006, passou a receber os vencimentos por morte do servidor e, em 2007, foi implementado novo cálculo retificando os proventos recebidos pela beneficiária. Dessa forma, transcorreu o prazo de decadência quinquenal, na forma do art. 54 da Lei nº 9.784/99, conforme entendimento firmado no precedente acima, cujotermo a quo dá-se a partir da vigência da Lei nº 9.784/99, não podendo a Administração anular atos inválidos indefinidamente, sob pena de gerar instabilidade nas relações jurídicas. Conforme registrado no acórdão recorrido, o instituidor da pensão aposentou-se em 12/1/96, ocasião em que passou a perceber as gratificações integradas ao cálculo de seus proventos. Dessa forma, a situação do aludido servidor, em janeiro de 2004, já estava consolidada, sendo certo que a pensão foi concedida em 26/1/06. Ante o exposto, nego provimento ao agravo de instrumento (STJ, AI 1.319.255, Rel. Min. ARNALDO ESTEVES LIMA, DJe 10.03.2014, grifo nosso).

Cumpre ressaltar que o acórdão impugnado perante o E. STJ no precedente acima citado era oriundo deste próprio E. Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2), em processo de relatoria do Desembargador Federal Reis Friede, em cujo julgamento de 17.12.2008, a 7ª Turma Especializada, seguindo o mesmo

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posicionamento do E. STJ, negou provimento a recurso de apelação por unanimidade. A propósito, destaco do respectivo julgado o seguinte trecho: [...] Porém, a partir da edição da Lei nº 9784/99, o prazo decadencial de cinco anos é contado de sua vigência em relação ao ato praticado anteriormente. Em relação ao caso concreto, observe-se que ocorreu a perda do exercício da autotutela pela Administração para revisão do ato administrativo, que deferiu benefício pecuniário ao instituidor da pensão, ora defendido, pela Impetrante. Verifica-se nos autos que às fls. 30 e 35/36, o servidor Paulo Graça Araújo, a partir de sua aposentadoria, em 12/01/1996, passou a perceber Gratificação de Atividade Executiva - GAE e Gratificação de Estímulo à Docência - GED, integrando tais gratificações a base de cálculo da função comissionada que exercia em atividade, sendo certo que estas verbas foram mantidas no momento da concessão de pensão à impetrante por morte do servidor, em 26/01/2006 ( fl. 33). Todavia, da leitura dos documentos de fls. 31/32 - Memorando-Circular nº 33/07-GR, vê-se que, somente em 24 de setembro de 2007, a autoridade coatora determinou que procedesse o cálculo das FC's sem a inclusão da GAE e GED, os quais integram os proventos de pensão percebidos pela impetrante. Depreende-se, pois, que em 1996 o servidor passou a receber as funções comissionadas. Mas, a impetrante, em 2006, passou a receber os vencimentos por morte do servidor e, em 2007, foi implementado novo cálculo retificando os proventos recebidos pela beneficiária. Dessa forma, transcorreu o prazo de decadência qüinqüenal, na forma do art. 54 da Lei nº 9784/99, conforme entendimento firmado no precedente acima, cujo termo a quo dá-se a partir da vigência da Lei nº 9784/99, não podendo a Administração anular atos inválidos indefinidamente, sob pena de gerar instabilidade nas relações jurídicas. (TRF2, 7ª Turma Especializada, AMS 72832, Rel. Des. Fed. REIS FRIEDE, DJ 17.12.2008, grifo nosso).

Ainda sobre o tema, merece ressaltar precedente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5). No caso em comento, considerando que a aposentadoria fora concedida em 1991, a pensão por morte em 20083, com a respectiva revisão somente em 2009, entendeu a Corte pela decadência da pretensão anulatória da Administração Pública. Confira-se: 3 Processo nº 0001266-44. 2010.4.05.8100, oriundo da Seção Judiciária do Ceará. Disponível em Acesso em 21.10.2014.

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ADMINISTRATIVO. DNOCS. PENSÃO POR MORTE. REVISÃO DE ATO DE APOSENTADORIA CONCEDIDO EM DATA ANTERIOR À LEI 9.784/99. DECADÊNCIA. PRINCÍPIO DA SEGURANÇA JURÍDICA. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. IMPOSSIBILIDADE. 1. O cerne da controvérsia consiste em se averiguar a ocorrência (ou não) da decadência em relação ao ato da Administração que revisou benefício de pensão por morte do demandante, em decorrência de erro na concessão inicial, tendo em vista o posicionamento do instituidor da pensão na classe C/IV. 2. No caso dos autos, como bem ressaltou o Juízo de Primeiro Grau, o ato de concessão de aposentadoria do instituidor da pensão é datado de 20.02.91 (fls. 85), de modo que, segundo o entendimento do egrégio STJ, “o prazo decadencial quinquenal teve início com a vigência da Lei 9784/99, findando em janeiro de 2004.” 3. Assim, tendo o DNOCS procedido a revisão do ato de concessão da aposentadoria do instituidor da pensão apenas em março de 2009 (fls. 19), verifica-se que já se operou a decadência do direito de revisão. E a fim de preservar o princípio da estabilidade das relações jurídicas, a referida autarquia não pode rever o ato em questão, uma vez que teve efeitos favoráveis ao demandante e não se sustentou má fé na concessão. 4. Nessa linha de raciocínio, torna-se descabida a discussão acerca da reposição ao Erário de valores indevidamente pagos ao pensionista, visto que, conforme restou acima explicitado, diante do instituto da decadência do direito da administração de revisar seus próprios atos, o ato de concessão de aposentadoria restou convalidado pelo decurso do tempo, na forma em que foi inicialmente concedido, não havendo valores a serem restituídos pelo demandante. 5. Apelação e remessa oficial improvidas. (TRF5. 1ª Turma Especializada, APELREEX 25038, Rel. Des. Fed. MANOEL ERHARDT, DJe 14.03.2013, grifo nosso).

No caso concreto, como o ex-servidor passou a receber definitivamente a parcela em questão a partir de 1998 (fls.84), tem-se como termo a quo a data de 01.02.1999, considerando o entendimento consolidado da Corte Especial do E. Superior Tribunal de Justiça (STJ) no sentido de que o prazo decadencial para a anulação dos atos administrativos praticados anteriormente ao advento da lei 9.784/99 deve ser contado a partir da vigência do referido diploma legal (STJ, MS nº 9.112/DF e 9.157/DF, Rel. Min. ELIANA CALMON, DJ 14.11.2005; MS nº 9.115/DF, Rel. Min. CESAR ASFOR ROCHA, DJ 07.08.2006).

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Consequentemente, o termo ad quem do prazo quinquenal para supressão da referida vantagem encerrou-se em 01.02.2004. Logo, tendo a pretensão anulatória da Administração sido manifestada apenas no ano de 2009, isto é, cinco anos após a expiração do prazo que dispunha para tanto, é certo que essa não procede. Ressalte-se, ainda, que a supressão do valor correspondente à vantagem discutida e os descontos para ressarcimento ao erário certamente ocasionariam impacto considerável no orçamento da embargante, eis que trata-se de pessoa maior de setenta anos, que tem na referida pensão por morte sua única fonte de renda. Nesse quadro, o reconhecimento da decadência acarretará não somente efeitos ex tunc, como também ex nunc, isto é, além de não ser necessário restituir o valor recebido, mantém-se para o futuro a vantagem que se acreditava correta. Assim, deve a autoridade reincorporar definitivamente à pensão da embargante a vantagem prevista no art. 192, II, da Lei 8112/90, cessando os descontos a título de reposição ao erário. Além disso, deverá restituir todas as parcelas indevidamente descontadas desde a revisão do benefício, acrescidas de juros de mora e correção monetária. Tendo em vista que os descontos foram iniciados a partir de novembro de 2009, devem ser aplicados os índices oficiais de remuneração básica da caderneta de poupança a título de correção monetária, conforme estabelecido no art. 5º da Lei nº 11.960, de 29 de junho de 2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da Lei nº 9.494/97, até que o STF se manifeste sobre o pedido de modulação dos efeitos da inconstitucionalidade declarada nas ADIs 4357 e 4425. Nesse sentido, decidiu a 5ª Turma Especializada deste próprio tribunal (APELREEX 200751010062080, Rel. Des. Fed. MARCUS ABRAHAM, E-DJF2R 7.7.2014; AC 200751090006724, Rel. Des. Fed. ALUISIO MENDES, E-DJF2R 5.6.2014) e a 7ª Turma Especializada (APELREEX 200651010000707, Rel. Juiz Fed. Conv. ALEXANDRE LIBONATI, EDJF2R 15.7.2014). Quanto aos juros de mora, a jurisprudência dos Tribunais Superiores e desta Corte consagrou o entendimento de que a partir do advento da Lei nº 11.960, de 29 de

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junho de 2009, que deu nova redação ao art. 1º-F da lei nº 9.494/97, deverão incidir conforme os índices oficiais aplicados às cadernetas de poupança (STJ, Corte Especial, REsp Representativo de Controvérsia 1.205.946, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, DJE 2.2.2012; AgRg no REsp 1.086.740/RJ, Rel. Min. ASSUSETE MAGALHÃES, DJE 10.2.2014; AgRg no REsp 1.382.625, rel. Min. HERMAN BENJAMIN, DJE 7.3.2014; TRF2, APELREEX 200051010111096, Rel. Des. Fed. MARCUS ABRAHAM, E-DJF2R 26.6.2014; AC 200551010246662, Rel. Des. Fed ALUISIO MENDES, E-DJF2R 24.6.2014). Ante o exposto, DOU PROVIMENTO AOS EMBARGOS INFRINGENTES. É como voto.

RICARDO PERLINGEIRO Desembargador Federal

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