Estética da violência e ética da liberdade: do amor à guerra e da guerra à arte

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www.brota.noblogs.org Estética da violência e ética da liberdade: do amor à guerra e da guerra à arte Ensaio-experimento para desintoxicação moral e religiosa: Recomendações: Ler este texto, percorrendo os links que ele indica livremente; aqueles que considero importante que sejam vistos inteiramente (até o fim) estão marcados com um asterisco (*); É recomendável exercitar a capacidade de escuta, procurando deixar-se contaminar pela diferença dx outrx. Observar os movimentos do pensamento, em particular, tendências eventuais à repulsa e oposição. >>>

Neste texto falaremos de arte, em parte, porque assim podemos ter a atenção de instituições mais ou menos ajustadas à lógica de funcionamento do Estado, bem como das pessoas que com ele se relacionam mais ativamente, via órgãos de fomento à produção poética, por exemplo. Partimos do princípio de que o campo da arte revela uma brecha que devemos saber explorar no campo da cultura. Apostamos na tendência desta brecha à esquerda, mas se bem a entendemos, vemos que ela também interessa às pessoas que, por medo, ceticismo ou comodismo, tendem à direita. Pois falamos de arte sabendo que até mesmo Burke, pilar do pensamento conservador, interessava-se pela espécie muito particular de prazer a ela relacionado. E de qualquer modo, não nos parece possível que um número significativo de pessoas esteja de fato à “direita”, acreditando que maior policiamento e repressão seriam a solução para o problema da desigualdade e de seus efeitos sobre a maneira como vive a imensa maioria das pessoas na Terra. Link sobre desigualdade: http://cartamaior.com.br/?/Editoria/Economia/Os-62-individuos-mais-ricos-possuem-tantoquanto-a-metade-mais-pobre-da-populacao/7/35350 ; Se temos em vista a diversidade das culturas e as reivindicações de movimentos sociais, precisamos nos dispor a questionar as hierarquias estabelecidas, como propõe, por exemplo, Jacques Ranciére, bem como a legitimidade das estruturas e instituições que pretendem assegurar a preservação de um modelo de organização global absolutamente questionável. Nesse sentido, uma das coisas que precisam ser urgentemente repensadas é o modelo de segurança pública vigente. * Sobre diversidade cultural e tentativas de diálogo com o Estado: https://www.youtube.com/watch?v=eGp_0aqlKSc&feature=youtu.be)

Sobre segurança pública e tentativas de diálogo, entendimento mútuo, com o modelo instituído pelo Estado: http://marlonteza.blogspot.com.br/2015/11/reflexao-sobre-acoes-policiais-e.html#commentform Um chamado à ação direta: O que se propõe aqui é considerar as batalhas que vem sendo travadas em nossa época em relação ao campo da arte - entendendo aí “o mundo”, como já sugeria Hélio Oiticica (“museu é o mundo”). Pensemos na arte que se produz nas ruas. Tenhamos ouvidos para ela: https://www.youtube.com/watch?v=E2xYfyEANMw* Se temos em conta a “filosofia da diferença” atualmente em voga, deve estar claro que não precisamos gostar de um só tipo de música, ou que desejável seria a existência somente dos estilos que nos agradam. Podemos ter nossas preferências, é claro, mas o mais importante é que eventuais diferenças possam ser plenamente possíveis. Falamos, com isso, das condições necessárias para o desenvolvimento de heterotopias, entendidas como “utopias realizáveis”. Desde uma perspectiva libertária, isto requer considerar com mais atenção o que implica falar de noções como a de horizontalidade “em campo expandido”, para que então as hierarquias mais tradicionais que pretendem assegurar a ordenação do campo social possam ser suspensas. Para que isso se efetive, é fundamental exercitar nossa capacidade de escuta. O uso do verbo, como já o movimento do corpo, revela sempre uma forma de manifestação do espírito. Qualquer coisa que nos pareça grosseira, pobre, vulgar, ou condenável, é nesse sentido, efeito de condições que impedem esta manifestação de ser outra. Tanto maior a importância de tais manifestações por isso. Uma ética da liberdade inspirada em um paralelo possível entre arte e natureza exige a suspensão de toda espécie de julgamento. Exige, em outras palavras, dispor-se de modo a estar aberto à potência afetiva dx outrx, pois é a tendência ao julgamento que ocasiona as cisões que estão na origem, por exemplo, da ideia de bem e do mal. Podemos assim considerar o problema da violência no discurso, pela maneira como, segundo juízos mais ou menos determinados, ele parece representar, ou mais propriamente encarnar, um mal imaginado. Considerando, por exemplo, a moral que sustenta os discursos hegemônicos acerca de gênero e sexualidade, por exemplo, como avaliar o modo como se exprimem as pessoas designadas como “lésbicas”; essas que antes de pretender representar uma classe qualquer (a de mulheres lésbicas, no caso), querem simplesmente poder ser livres no exercício de suas singularidades: https://www.youtube.com/watch?v=YSxD7bSLbo8&list=PLLzS3sYwDuOu2d45qJyq454P8ejpM 7Ff_&index=5 (SapaBonde)

Que espécie de coisas o julgamento comum condena? Pode a diferença ser mais propriamente apreciada antes de simplesmente condenada?

https://www.youtube.com/watch?v=QcoVM3hNfHE&list=PLLzS3sYwDuOu2d45qJyq454P8ejp M7Ff_&index=66 (de Espaldas al patriarcado) https://www.youtube.com/watch?v=Jjfl_JuWy9s&list=PLLzS3sYwDuOu2d45qJyq454P8ejpM7F f_&index=2 (Ana Tijoux) https://www.youtube.com/watch?v=MB2LQlWVWKU&index=9&list=PLLzS3sYwDuOu2d45qJy q454P8ejpM7Ff_ (Tarja Preta) Se percebemos “violência” na manifestação dx outrx é que estamos consciente ou inconscientemente identificados com forças contra as quais aquela forma de manifestação se coloca. Somos, com efeito, o outro daquela espécie de manifestação do espírito, e nesse sentido, encarnamos forças que a constrangem. A violência sempre indica, nesse sentido, um jogo de forças em que diferentes tendências estão postas em causa: opressão, resistência, fortalecimento, expansão... Se estamos sensíveis a este jogo de forças, isto é, dispostos a reconhecer o princípio da violência, temos ao nosso alcance a possibilidade de transmutar possíveis tensões em experiências mutuamente satisfatórias. É quando a possibilidade de arte se torna efetiva.

Em danças e cânticos de guerra, talvez de modo mais emblemático, este jogo de forças pede apreciação. O ponto a reconhecer, é que a violência tem sempre o intuito de assegurar condições que possibilitem plena realização do espírito, segundo uma determinada singularidade. Não há guerra se a diferença for propriamente admitida. Além do mais, como parece sugerir Battaile, a tensão que está no princípio da violência nunca está distante da possibilidade de prazer, na medida em que as singularidades e diferenças em causa podem ser modificadas em um livre jogo. É o que permite que as expressões do espírito na forma da música, por exemplo, passem a ser outras de acordo com a época e a cultura (considere por exemplo a agressividade muito particular do rap e do punk).

Discutir a estética da violência requer aceitar operar em relação à potência de transformação do espírito. É quando uma espécie de ‘diplomacia’ pode ser reconhecida como a grande função política e espiritual comum entre a arte e o xamanismo. Podemos dizer que o espírito deseja resistir em sua forma, não necessariamente por um conservadorismo, mas antes por certo sentimento de (com)unidade, sentimento que nas mais diversas culturas é origem do amor e da divindade. A nossa tendência histórica à guerra se explica assim pelo elemento mais verdadeiramente significativo das relações afetivas que, com maiores ou menores problemas, dão origem às unidades de que nos consideramos (ou não) partes: Deus; nação; família; classe; gênero...

HAKA; dança de guerra Maori (ver vídeo) Mais precisamente, a guerra se estabelece quando estas unidades estão postas em disputa, como se ao invés da diferença resultante de plena liberdade, o desejável fosse uma grande unidade. Ora, como escrevia Paulo Freire, é apenas na diversidade que uma unidade qualquer pode ser concebida (Paulo Freire, Política e Educação, pg.37). A expressão “estética da violência” pretende evocar a nossa capacidade de apreciação em relação à disposição do espírito à guerra, frequentemente a partir da conclamação de unidades comuns e da subsequente tendência à oposição. É por isso também expressão que revela a urgência de questionar a legitimidade das hierarquias estabelecidas (sempre entre [com]uns), e de falar mais amplamente de horizontalidade, pois toda unidade deve ser livre para manifestar-se segundo sua própria forma. É mais propriamente, afinal, a diferença que dá origem a uma nova unidade, de tal modo que não tanto a unidade quanto as condições que permitam a expressão da diferença, como fazem questão de destacar pensadores como Pierre Clastres (”o um é o mal”) e Gilles Deleuze (“n-1”), devem ser resguardadas. Do contrário, a unidade pretendida será a própria origem do totalitarismo.

“...pode um saber dominante escutar uma fala subalterna quando ela se manifesta?” Jota Mombaça

Considerando ainda os efeitos sobre o campo social da horizontalidade reivindicada a partir de uma consciência de absoluta imanência, de que forma se expressaria a pessoa “preta”, “pobre”, “vadia”, “degenerada” se ao invés de assim julgada, ela fosse pela dita ‘classe dominante’ propriamente escutada? https://www.youtube.com/watch?v=fWmjnhEl4qA *; (Anarcofunk) * É necessário sabermo-nos sempre ativos diante da violência, para então descobrir formas de não se sentir atingido por ela. É necessário perceber mais propriamente sua origem, pois compreender os fundamentos da violência é a libertação do “mal” que ela encerraria. É necessário, por isso, que uma ética da liberdade possibilite a apreciação de sua legitimidade. Caberia no caso considerar a razão de um Molotov; a legitimidade de um convite para sabotar o estado; e o significado de uma expressão como “racha macho”. Ora, estas letras revelam o desejo legítimo de eliminação do elemento opressor do homem, do estado e do capitalismo: revelam a recusa de uma unidade que em sua transcendência pretensamente soberana, não as compreende. *

Não é preciso concordar totalmente com estas ideias; nem muito menos gostar destas músicas. Uma das razões de reconhecer a importância de retomar o projeto de educação estética da humanidade junto a uma ampla proposta de desescolarização é que o exercício da arte ensina a suspender o gosto: com a arte aprendemos que o mais importante é que a diferença seja plenamente possível. Quer dizer, se insistimos no interesse de investir em processos de desescolarização através da criação de espaços de arte - entendidos como espaços que possibilitem a livre manifestação de diferença, e portanto como “heterotopias” -, é que acreditamos que em espaços de arte diferenças possam ser mais propriamente consideradas, de modo que aí podem ser encontradas condições mais justas para o desenvolvimento dos processos eventualmente necessário de “hibridação”, como propõe Nestor García Canclini, através de cruzamentos e interpenetração que possibilitem que a relação entre diferenças se dê de modo mais amplamente satisfatório. * Do amor livre ao que tem sido mais comum em nossa experiência possível, pela própria economia de forças que o atual regime político propõe com sua lógica de representação, é prudente considerar o que tem a nos dizer o direito sobre outros modos de organização social possíveis. Pois que outras ordens podem ser efetivamente reivindicadas? Se falamos de democracia direta e liberdade, é importante que tenhamos participação na escritura das leis.

https://www.youtube.com/watch?v=pCSvu_47Y1M (Direito e anarquia)

https://www.youtube.com/watch?v=ZEyaCPm68yI (Parte II) https://www.youtube.com/watch?v=2zjS2btcKwY (Direito alternativo)

https://www.youtube.com/watch?v=qP7fiRJ2SvI (Pluralismo Jurídico)

* O “juízo final” como “indeterminação do juízo reflexivo”:

O “mal” que irradia do centro do “outro mundo”, o mundo que não é o nosso, como pensava Herman Hesse através de seu personagem Sinclair, no pequeno livro “Demian”, é uma espécie de reflexo de um bem imaginado. Pgs 62 e 63 do livro Demian*. Recomendações:

Não temer “o mal”; questionar a crença em um mal; reconhecê-lo antes como efeito de uma concepção de bem incompleta em si mesmo; uma espécie de ilusão; sintoma de um dualismo a ser superado pelo pensamento, ou mais propriamente, pela capacidade de escuta, diálogo e compaixão. Em Yin e Yang, atentar ao movimento entre as partes; não há oposição, mas um jogo de forças contínuo; transformação. Já é hora de nos colocarmos mais amplamente “além do bem e do mal”, para apreciar o movimento que determina o modo como as relações de força tem se exprimido entre nós. A polarização simples produz discursos que alimentam a guerra na medida em que incitam à violência, e ignoram completamente a potência de arte (não oposição) na relação com x outrx: https://www.youtube.com/watch?v=6Q3Pwchr1kA

(padre

contra

o

desarmamento)

É necessário reconhecer mais amplamente a atualidade da chamada Teologia da Libertação, com a qual, aliás, Paulo Freire via-se identificado. A direita conservadora, com sua tendência à naturalização da miséria, e com seu ceticismo em relação às ideias progressistas tem sustentado o inferno na Terra: muito mais a luta por sobrevivência do que a vida propriamente dita. Sabendo que a democracia prevê conflitos, pois o imperativo de plena realização do espírito supõe liberdade a todas as pessoas, como podemos efetivamente assegurar condições que possibilitem o desenvolvimento de tão diversas singularidades? Como proceder em relação ao risco de embate entre diferenças? Ao invés de pensarmos em armas, talvez por um reflexo tendente à eliminação do outro que pode nos parecer uma ameaça, pensemos antes, como propõe Foucault, em relações de poderes, e então, a partir daí, na possibilidade de investir no caráter formal do exercício político. Isto é, pensemos nas artes e nos jogos. Pois se então com alguma insistência desejarmos voltar a pensar em armas, pensamos na arte da guerra, e levamos a possibilidade de enfrentamento para um nível muito diverso desse que o Estado vem propondo com a polícia militar, por exemplo. Quer dizer, em se tratando de uma real democracia, toda e qualquer possibilidade de enfrentamento requer tratamento minucioso; um nível de elaboração formal que torne as relações menos desiguais, ou mais precisamente justas, e apreciáveis. Pensemos antes, por isso, no corpo como uma possível arma, considerando potencias afetivas; energias. Quando a disputa é realizada em termos estéticos, em batalhas de música, dança e poesia, por exemplo, não há quem perca ou ganhe - ainda que às vezes possa-se pretender o contrário. Geralmente, como ocorre em alguns saraus, há nestas ocasiões assegurado o direito de manifestação de diferença. Aí temos uma fórmula possível para uma cultura mais rica, diversa e livre, enfim. Investir mais amplamente no campo da arte, colocando nossa inteligência para dialogar mais francamente é uma estratégia. Exatamente aí cabe considerar a utilidade da noção de jogo no

trabalho de desconstrução de tendências à oposição e à competitividade. Como sugere Peter Pál Pelbart lembrando Deleuze, podemos experimentar como um modelo o Go ao invés do xadrez: O xadrez é um jogo de Estado: as peças são codificadas, elas têm propriedades intrínsicas e movimentos próprios. Os peões de go, ao contrário, são grãos, pastilhas, sem propriedades próprias , tudo depende da situação, do meio de exterioridade, de suas relações com nebulosas, constelações. O xadrez é um a guerra, mas institucionalizada, regrada, codificada, com um fronte, uma retaguarda , batalhas. O go, ao contrário, é sem afrontamento nem retaguarda, no limite sem batalha. Enquanto no xadrez se vai de um ponto a outro, no go se preserva a possibilidade de surgir em qualquer ponto. Ou seja, o movimento se torna perpétuo, sem destino, sem partida nem chegada.

Podemos experimentar desescolarizar o mundo. Questões: A história de nossa época pode contar com o desenvolvimento de uma ficção combinada para que ela possa desenvolver-se de modo mais amplamente satisfatório? Podemos nos utilizar de uma instituição fictícia, como o projeto Brota, para eleger nomes “aleatórios” que nos possibilitem mover processos efetivos de modificação sócio-cultural?

Sobre o uso de instituições: a arte, a universidade e o projeto “Brota”.

Pensemos então em elaborar a partir de nossa capacidade de criação uma ficção conjunta a partir desse nome: Brota. O nome é uma espécie de chamado.

O Brota é um trabalho que surge como um pedido de palavra vindo de algum lugar um tanto quanto indeterminado do campo da arte. É um experimento transdisciplinar que pretende configurar um canal para o desenvolvimento de um processo mais ou menos organizado de desescolarização, e para encorajar o exercício do que poderíamos chamar “democracia direta”. Sua possível natureza contraditória é assumida sem grandes problemas como uma estratégia. A realização do projeto Brota envolve o mapeamento de espaços e pessoas, a realização de deslocamentos e aproximações, a aquisição de materiais, a produção de impressos, e a realização de estudos e eventos. Seu intuito principal é ativar uma rede entre espaços e de algum modo incrementar a estrutura técnica e tecnológica que, bem ou mal, estes espaços possuem. Para dizer de outro modo, seu objetivo é investir na potência de transformação destes espaços, possibilitando, por exemplo,o desenvolvimento de pesquisas oriundas de campos muito diversos do

conhecimento. Pois se por um lado o Brota é uma proposta “conceitual”, por outro ele é também uma proposta de artes aplicadas. Para viabilizar a mais ampla execução deste projeto é nossa estratégia explorar a “autonomia universitária” comunicando, ainda que informalmente, o projeto Brota à parte de Extensão do máximo possível de cursos e instituições, convocando pesquisadorxs/trabalhadorxs para atuar mais ativamente junto a “pontos de cultura” reconhecidos e não reconhecidos pelo Estado, como ocupações de arte e moradia, espaços autônomos, comunidades indígenas e estações de agrofloresta, agroecologia e permacultura, como ecovilas e ecoaldeias. Dando a conhecer estes espaços, assim como as questões envolvidas no desenvolvimento destas iniciativas, o projeto Brota acredita cumprir desde aí, com a distribuição de materiais gráficos pelas ruas, e com este blog, por exemplo, sua função educativa. Investir na potência destes espaços atuando em um amplo processo de desescolarização e transformação por contaminação; trabalhar no desdobramento e na potencialização de fenômenos como aqueles que xs estudantes secundaristas de São Paulo provocaram entre fins de 2015 e início de 2016; encorajar a descentralização. https://www.youtube.com/watch?v=UxpwFW62i7M *

Lucas Jara Soares Estrada Vírgula Terra

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