Não fumantes de Jacinto Benavente: uma tradução

May 31, 2017 | Autor: Rodrigo Conçole | Categoria: Translation, Teatro español
Share Embed


Descrição do Produto

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

NÃO FUMANTES

1

Jacinto Benavente

Tradução de Rodrigo Conçole Lagei*

ANEDOTA2 EM AÇÃO em um ato e em prosa

Estreado no TEATRO LARA3 na noite de 3 de Março de 1904, no beneficio de Leocadia Alba4

O texto utilizado foi a da edição publicada pela Societad de Autores Españoles de Madri, em 1904. Disponível em: . O texto em espanhol reproduz literalmente a versão dessa edição, inclusive com alguns pontos (.) apagados pelo tempo nas reticências e na abreviação do nome dos falantes, o que foi corrigido na tradução. 1

De acordo com o Dicionario da Real Academia Española chascarrillo é uma “anedota ligeira e picante, contosinho agudo ou frase de sentido equívoco e gracioso”, isto é, um chiste. Disponível em: . 2

Teatro de Madri construído em 1879. Várias peças de Benavente estrearam nesse teatro: El marido de la Téllez (1897), Los intereses creados (1907), La losa de los sueños (1911), La ciudad alegre y confiada (1916), La Inmaculada de los Dolores (1918), La honra de los hombres (1919) e Al amor hay que mandarlo al colegio (1950). Fonte: WIKIPEDIA: Teatro Lara. Disponível em: . 3

Leocadia Alba y Abad foi uma extraordinária atriz e soprano de zarzuela espanhola, filha do ator Pascual Alba, nascida em Valência, em 22 de janeiro de 1866. Leocadia atuou, com destaque, em algumas peças de Benavente: La fuerza bruta (1908), La escuela de las princesas (1909), La losa de los sueños (1911), La ciudad alegre y confiada (1916), La Inmaculada de los Dolores (1918) e La honra de los hombres (1919). Ela abandonou os palcos, em 1933, depois de ter atuado na comédia dos irmãos Serafín Alvarez Quintero e Joaquín Alvarez Quintero intitulada Lo que hablan las mujeres, representada no dia 11 de junho do mesmo ano, em Madri. Faleceu no dia 10 de dezembro de 1952, em Madri. 4

1

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

DISTRIBUIÇÃO PERSONAGENS

ATORES

----

----

UMA SENHORA

Srta. Alba.

UMA SENHORITA UM CAVALHEIRO

Rodríguez. SR.

UM REVISOR

Santiago. Alemão.

Vozes do lado de dentro

ATO ÚNICO

Um vagão de primeira

CENA ÚNICA

O CAVALHEIRO, depois a SENHORA e a SENHORITA

Voz (Dentro.) - Ooo! Ooo! Três minutos. Ooo! Três minutos. Outra voz - Água fresquinha, água! Quem quer água? Outra - Aguadeira!... Aqui!... (Entram a senhora e a Senhorita.) Sen. - Ande rápido, que para muito pouco... Pensei que não dávamos com o vagão. Viu se falta algo? Um, dois... ¡A cestinha, a cestinha!... Sen.a - Aqui está, mamãe.

2

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Sen. - Ai, que susto tomei! Se chega a perder-se!... O primeiro que nos encomendou sua tia... acreditaria que o tínhamos perdido, aposto!... Muito boas tardes, cavalheiro!... Cav. - Vosso servo!... E vocês me perdoem. Como ia só, ainda que diga: «Não fumantes...» Sen. - Por Deus! Não se prive você... fume você tudo o que quiser... se a mim não me incomoda, nem a minha filha tampouco... estamos muito acostumadas. Seu pobre pai, meu primeiro marido, que esteja na gloria, não tirava o cigarro da boca; acendia um na ponta do outro... E meu segundo, que descanse em paz, o mesmo5... E eu, uma vez sofri umas faltas de ar, e os médicos começaram a discutir se era asma, se não era asma, tive que fumar uns cigarrinhos aromáticos que não me serviram de nada, entre parêntesis6. Assim sendo, veja você, por nós... Menina! Como você colocou essa cesta? Não vê que tem buraquinhos na parte de dentro e vai sufocar o animalzinho? É um gato, você sabe? uma encomenda que nos deu uma tia dela, minha cunhada.... Está nos dando a viajem, porque o travesso, é mostrar-se o Revisor, que começa a incomodar como um descosturado... Esta tem que pôr-se a cantar como uma louca para silenciá-lo... assim o Revisor não sabe quem incomoda. Digo-lhe que há encomendas!... Voz (Dentro) - Senhores viajantes, ao trem! Senhores viajantes, ao trem! Sen. - Se nos descuidamos!... Mas não tenha você escrúpulos em fumar!... Veja você... Nós vínhamos no reservado de senhoras, e o mudarmos para este vagão, fazendo tudo o que podíamos, foi porque há gente com a qual não se pode viajar... nem ir a parte alguma. Parece que, ao viajar de primeira, todo mundo devia ter educação, mas não senhor! Acredite você que tanto como na mesa e no jogo, na viajem é onde se conhece as pessoas. Vinha no vagão uma senhora, digo senhora porque não sei como qualifica-la, com uma acompanhante, digo eu que seria acompanhante... Digo a você que eu vinha embaraçada... Que conversação entre as duas! Como se estivessem sozinhas! Eu por mim, compreenda você, que duas vezes viúva, de que vou assustar-me... mas a menina... Eu mandei que fosse todo o tempo na janela, mas o dia está fresco, e veja você, se constipou... e lhe foi colocado um Literalmente “dois quartos do mesmo”. Quer dizer que uma coisa é igualmente aplicável a outra. As duas não são exatamente iguais, mas são suficientemente iguais para que se possa aplicar. 5

“Entre parêntesis” é uma expressão espanhola utilizada na linguagem oral para indicar que se introduz um comentário que não está relacionado diretamente com o assunto tratado. 6

3

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

carvãozinho no olho, que veja você como foi posto... Ela que o melhor que tem são os olhos. Sen.a - Por Deus, mamãe! Que vai dizer este cavalheiro? Não faça caso de mamãe. Sen. - Cale-se você, por Deus! Que senhoras! Não paro aqui... Depois, você acredita que uma delas, cansada de tagarelar, tira um livro e se põe a ler... E que livro! Na sobrecapa tinha uma mulher de camisa e abanando-se! Cav. - Que calor! Sen. - Diga-me você que livro seria! (o cavalheiro recolhe, com dissimulação, um livro que havia deixado sobre o assento.) Cav. - Quem sabe! Muitas vezes os editores... Para chamar a atenção!... E depois o libro não tem nada de extraordinário... Sen. - Cale-se! Se de repente começa a rir as gargalhadas do que lia, e a outra a perguntar do que ria!... E a outra se põe a ler em voz alta... Eu aqui não aguentei mais. Achei-me na posição de suplicar-lhes que tivessem consideração a menina! Nunca o tivesse dito! Como nos puseram! Não toquei a campainha de alarma para que parassem o trem ali mesmo porque estava desarrumada. Digo a você que não se pode viajar com essas pessoas, que sem mais nem menos, armam uma conversa e contam suas histórias como se estivessem em sua casa. E que não se deve falar sem saber! O melhor é se fala mal de uma pessoa diante de você, de don Fulano, por exemplo, que se é isto ou aquilo outro, e resulta que é seu pai. E quem diz seu pai, diz um tio, ou outro qualquer da família... Veja você que papelão! Rev. - Senhores! Sen. - Menina, os bilhetes! Onde colocou os bilhetes? Sen.a - Se tu os guardastes, mamãe! Sen. - Que não, filha! Se os dei a ti a última vez que nos pediram! Você nos perdoe... (Incomoda o gato.) Menina, menina! (A senhorita começa a cantar.) Não os encontro! Se os tens tu!... Que dizes? Ah, aqui, espere, tome. Rev. - Muito boas tardes. (Vai-se.) Sen.a - Não vê que não podia deixar de cantar?

4

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Sen. - Você viu? Mas o que tem este animalzinho com o revisor!... Digo a você que é uma incumbência. Se não fosse porque estou em relações muito tensas com minha cunhada, e por isso mesmo não quero que tenha o que dizer... Tudo porque levou tão a mal que eu voltasse a me casar... Veja você, como se houvesse esquecido a meu primeiro marido por isso... Ponha-se você em meu lugar; viúva aos vinte seis anos, sem recursos... E que homem que me cortejaria, sem ofender ao primeiro, e sem privar ninguém de seu mérito, era o melhor homem que houve no mundo. Por isso morreu! Se tivesse sido um perdido!... Ai! O que está acontecendo? Cav. - Entramos em um túnel. Sen. - Ai, que medo! (Túnel.) Não olhe para este cavalheiro... Fui eu quem te agarrou o braço... Cav. - Senhora!... Sen. - Pois não acredite que tenham acabado os desgostos... Porque minha cunhada tem um gênio muito dominador. Como é a pessoa rica da família e todos estão a adulá-la e a estar em volta... e eu não tenho caráter para isso!... Porque se digo algo que não sinto, que arrebente aqui mesmo. Agora se resolveu casar minha filha com outro sobrinho seu a que não conhecemos. Veja você, um assunto tão delicado! Eu creio que é um bom rapaz, porque eu tenho me informado muito bem, e embora alguém me tenha dito... Menina, mostre-se na janela! que é grande apreciador de saias, isso não tem nada de especial, todos os homens são o mesmo. Veja você, ao meu primeiro marido, aos oito dias de casados, lhe surpreendi abraçando a babá. Cav. - Vocês tinham babá aos oito dias de casados? Sen. - De uma irmã minha pequena! O que você havia pensado, por Deus? Sen.a - Mamãe, mamãe! Veja quantos borregos7. Sen. - Deixa-te de borregos. Já pode vir. Falávamos de teu futuro. Sen. - E o que diz este cavalheiro? Sen. - Diz o mesmo que eu. Que sem conhecer-lhe a fundo... E diz muito bem. Cav. - (Aparte.) De onde tirou esta senhora que eu lhe disse algo? 7

Cordeiro desde que nasce até que completa um ano.

5

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Sen. - Chegamos a uma estação? Sen.a - Já vão cinco estações. Cav. - Eu, com permissão de vocês, desço um instante. Sen. - Veja você se para bastante. Cav. - Creio que sim. A máquina deve receber água. Voz - Aaaa, dois minutos! Aaaa, dois minutos! Outra - Água! Quem quer água? Outra - Biscoitos de canela, biscoitos de canela! Sen.a - Mamãe, vou comprar biscoitos. Sen. - Deixe de biscoitos. Já sabe que em viagem é preciso ter muito cuidado com o que se come. Vê como fiz muito bem em mudar de vagão? Que cavalheiro mais decente! Tem ares de ser comerciante... Eu tenho a impressão de tê-lo visto em Madri com uma senhora gorda, uma tarde em que estivemos no Lírico8 para ver O anel de ferro9... Aquela senhora, que estava diante de nós com um chapéu que não te deixava ver... Sim, não te recordas? Uma senhora que chorava muito nas cenas tristes? Sen.a - Não me recordo, mamãe. Sen. - Eu, vendo uma pessoa uma vez não me esqueço de sua aparência. Quando voltar vou lhe perguntar. Vozes - Senhores viajantes, ao trem! Sen. - Ai, já chamam!... E esse senhor não vem... Veja se fica em terra... Não o vê? Sen.a - Não.

Teatro criado em 1902 pelo empresário Luciano Berriatúa que tinha o objetivo de fazer dele a sede da ópera espanhola. 8

É uma zarzuela (gênero lírico-dramático espanhol no qual se alternam cenas faladas, cantadas e danças). El anillo de hierro, em três atos, foi composta por Pedro Miguel Juan Buenaventura Bernadino Marqués em 1878. 9

6

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Sen. - Eh, que não ande, que falta um cavalheiro!... Onde estará? Digo, me parece!... Que parte o trem!... Que fica! Em que tem pensado?... Que transtorno! Sen.a - E não se foi para outro vagão, porque deixou a bagagem... Sen. - Claro que não! O melhor é jogá-la pela janela. Já a encontrará! Será um transtorno a menos! Sen.a - Isso sim... Lhe faremos esse favor. Sen. - Ajuda-me! Sen.a - Lá vai! Sen. - É de um cavalheiro que perde o trem! Entreguem-na vocês! Agora parte... Mas que descuido! Como si não soubesse que o trem não espera a ninguém? Sen.a - Ficou o livro. Sen. - Deixai-o, não seja como o de outrora!... Mas, vamos, que foi uma ocorrência. Sen.a - Ok, ok! Sen. - Se tarda em passar outro trem... e sua família lhe espera e não pode avisar... Vamos, não quero pensar nisto! Sen.a - Ok, ok! Sen. - O Senhor nos livre! Eu o sinto, porque sempre íamos acompanhadas... e tinha uma conversa muito agradável; se via que era pessoa de educação. Sen.a - E muito simpático. Olhe, mamãe, foi o braço onde me agarraste no túnel? Sen. - Por que perguntas? Sen.a - Por nada. É que me dói. Sen. - É que sou tão nervosa, e os túneis me dão um medo... Qualquer coisa que acontecesse em um túnel!... Mas, pobre senhor, pobre senhor! Olha, não sentes fome? Sen.a - Eu, sim. O trem me dá muita fome.

7

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Sen. - Devias estar viajando sempre para ver se te alimentavas. Pareces a dama da meia amêndoa10... Alcança a cesta... De passagem veja como vai esse animalzinho. Sen.a - Ai, como bufa! Gatinho, gatinho! Ui, que olhos! Parecem brasas! Sen. - Milagre será que não nos dê um desgosto. Vamos lanchar. Sen.a - Outra estação. Sen. - Melhor, assim podemos providenciar tudo. Voz - Taaa, um minuto! Taaa, um minuto! Voz - Água! Quem quer água? Sen. - Estas costeletas empanadas devem estar deliciosas. Coloque aqui este papeis, a toalha de mesa... Assim, o guardanapo... que não se derrame o vinho... (Entra o Cavalheiro.) Cav. - Senhoras... Sen. - Hã? Sen.a - Ah! Sen. - Você? Você está aqui? Cav. - Sim, ia no vagão de carga da traseira. Sen. - Você não ficou em terra? Sen.a - Nós pensávamos... Cav. - E minha bagagem? O que é isto? Sen. - Ai, você perdoe! Sen.a - Cavalheiro... Sen. - Pensávamos que você havia perdido o trem e para fazer-lhe um favor... Sen.a - A jogamos pela janela... La dama de la media almendra é um conto popular andaluz segundo o El folk-lore andaluz: organo de la sociedad de este nombre (2008, p. 470) publicado pela Sociedad Del Folk-Lore Andaluz, Editorial MAXTOR. 10

8

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Cav. - Senhoras! E quem mandou vocês...? Sen. - Cavalheiro, nós, com a melhor intenção... Sen.a - Quem ia imaginar... Cav. - E o que eu faço agora? Demônio de mulheres!... Vocês tinham que fazer alguma atrocidade! Sen. - Ouça você, cavalheiro! Se o toma você assim... Cav. - Como hei de tomá-lo? Sen. - E por que você não avisou aonde ia? Cav. - Só faltava também que eu tivesse de levantar o dedo! Se não fossem vocês loucas!... Sen. - Escute você! A mim não me chame você de louca e a minha filha muito menos. . Seria melhor que você tivesse educação... Cav. - Senhora! Você sim que não a conhece! Sen. - Você está me desrespeitando e você não sabe com quem fala! Sen.a - Mamãe, mamãe! Voz - Senhores viajantes ao trem, senhores viajantes, ao trem! Sen. - Quando chegarmos a outra estação, você verá... Cav. - Faça você o que quiser!... Minha bagagem, minha bagagem! Sen. - Se não se pode viajar mais senão no reservado! Cav. - Você podia ter ido na perrera11... Sen. - Eu na perrera? Sen.a - Mamãe, mamãe! (continuam discutindo.) CORTINA

11

Perrera em espanhol é uma seção que há nos trens destinada ao transporte de cachorros.

9

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

No Fumadores CHASCARRILO EN ACCIÓN en un acto y en prosa

Estrenado en el TEATRO LARA la noche del 3 de Marzo de 1904, en el beneficio de Leocadia Alba.

REPARTO PERSONAJES ----

ACTORES ----

UNA SEÑORA

Srta. Alba.

UNA SEÑORITA

Rodríguez.

UN CABALLERO

Sr. Santiago.

UN REVISOR

Alemán.

Voces dentro

ACTO ÚNICO Un coche de primera

ESCENA ÚNICA El CABALLERO, después la SEÑORA y la SEÑORITA

Voz (Dentro.) - ¡Ooo! ¡Ooo! Tres minutos. ¡Ooo! Tres minutos.

10

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Otra voz - ¡Agua fresquita, agua'¿Quién quiere agua? Otra - ¡Aguadora!... ¡Aquí!... (Entran la señora y la Señorita, j Señ. - Anda lista, que para muy poco... Creí que no dábamos con el coche. ¿A ver si falta algo? Uno, dos. . ¡La cestita, la cestita!... Señ.a - Aquí está, mamá. Señ. - ¡Ay, qué susto he llevado! ¡Si llega á perderse! .. Lo primero que nos encargó tu tía... ¡creería que la habíamos perdido aposta!... ¡Muy buenas tardes, caballero!... Cab. - ¡Servidor de ustedes!... Y ustedes perdonen. Como iba sóIo, aunque dice: «No fumadores...» Señ. - ¡Por Dios! No se prive usted... fume usted todo lo que quiera... si á mí no me molesta, ni á mi hija tampoco... estamos muy acostumbradas. Su pobre padre, mi primer marido, que esté en gloria, no se quitaba el cigarro de la boca; encendía uno en la punta de otro... Y mi segundo, que en paz descanse, dos cuartos de lo mismo... Y yo, una vez que padecí unos ahoguillos, y los médicos empezaron á decir que si era asma, que si no era asma, tuve que fumar unos cigarrillos aromáticos que no me sirvieron de nada, entre paréntesis. Conque ya ve usted, por nosotras. . ¡Niña! ¿Cómo has puesto esa cesta? ¿no ves que tiene los agujeritos á la parte de dentro, y se va á ahogar el animalito? Es un gato, ¿sabe usted? un encargo que nos ha dado una tía de ésta, cuñada mía.... Nos está dando el viaje, porque el indino, lo mismo es asomar el Revisor, que empieza á mallar como un descosido... Esta tiene que ponerse á cantar como una loca para taparle... así el Revisor no sabe quién malla. ¡Le digo a usted que hay encargos!... Voz (Dentro) - ¡Señores viajcros, al tren! ¡señores viajeros, al tren! Señ. - ¡Si nos descuidamos!...¡Pero no tenga usted reparo en fumar!... Si verá usted... Nosotras veníamos en el reservado de señoras, y el cambiarnos á este coche, en cuanto hemos podido, ha sido porque hay gente con la que no se puede viajar... ni ir á ninguna parte. Parece que, al viajar en primera, todo el mundo debía tener educación, ¡pues no señor! Crea usted que tanto como en la mesa y en el juego, en viaje es donde se conoce á las personas. Venía en el coche uma señora, digo señora porque no sé cómo calificarla, con una acompañanta, digo yo que sería acompañanta... Le digo á usted que yo venía avergonzada... ¡Qué conversación entre las dos! ¡Como si fueran solas! Yo por mí, comprenda usted, que dos veces viuda, de qué voy á asustarme... pero la niña... Yo la maudé que fuera todo el 11

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

tiempo á la ventanilla, pero el día está fresco, y ya ve usted, se ha constipado... y se le ha metido un carboncito en ojo, que ya ve usted cómo se le ha puesto... Ella que lo mejor que tiene son los ojos. Señ.a - ¡Por Dios, mamá! ¿Qué va á decir este caballero? No haga usted caso á mamá. Señ. - ¡Calle usted, por Dios! ¡Qué señoras! No paró aquí... Luego figúrese usted que unade ellas, cansada de charlotear, saca un libro y se pone á leer... ¡Y qué libro! ¡En el forro tenía una mujer en camisa y abanicándose! Cab. - ¡Vaya un calor! Señ. - ¡Dígame usted qué libro sería! (el caballero recoge, con disimulo, un libro que habia dejado sobre el asiento.) Cab. - ¡Quién sabe! Muchas veces los editores... ¡Por llamar la atención!. . Y luego el libro no tiene nada de particular... Señ. - ¡Calle usted! ¡Si de pronto empieza á reir á carcajadas la que leía, y la otra á preguntar de qué se reía!... Y la otra se pone á leer em uoz alta... Yo aquí no pude más. ¡Me creí en el caso de suplicarles que tuvieran consideración á la niña! ¡Nunca se lo hubiera dicho! ¡Cómo nos pusieron! No toqué el timbre de alarma para que parara el tren allí mismo, porque estaba descompuesto. Le digo á usted que no se puede viajar com esas personas, que sin más ni más, arman conversación y cuentan sus historias como si estuvieran en su casa. ¡Y que no se debe hablar sin saber! A lo mejor se habla mal de una persona delante de usted, de don Fulano, por ejemplo, que si es esto, que si es lo otro, y resulta que es su padre de usted. Y quien dice su padre de usted, disse un tío, ó cualquiera de la familia... ¡ya ve usted qué plancha! Rev. - ¡Señores! Señ. - ¡Niña, los billetes! ¿Dónde has puesto los billetes? Señ.a - ¡Si te los has guardado tú, mamá! Señ - ¡Que no, hija! ¡Si te los di á tí la última vez que nos los pidieron! Usted perdone.. (Malla el gato.) ¡Niña, niña! (La señorita empieza á cantar.) ¡No los encuentro! ¡Si los tienes tu!... ¿Qué dices? ¡Ah, aquí, espere usted, tome usted. Rev - Muy buenas tardes. (Vase.)

12

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Señ.a - ¿No ves que no podía dejar de cantar? Señ. - ¿Lo ve usted? ¡Pero qué tendrá este animalito con el revisor!... Le digo á usted que es una incumbencia. Si no fuera porque estoy en relaciones muy tirantes con mi cuñada, y por lo mismo no quiero que tenga que decir... Todo porque llevó muy á mal que yo volviera á casarme... Ya ve usted, como si hubiera olvidado á mi primer marido por eso... Póngase usted en mi caso; viuda á los veintiséis años, sin recursos... Y que el hombre que me pretendía, sin ofender al primero, y sin quitarle á nadie su niérito, era el hombre más de bien que ha habido en el mundo. ¡Por eso se murió! ¡Si hubiera sido un perdido!... ¡Ay! ¿Qué pasa? Cab. - Entramos en un túnel. Sen. - ¡Ay, qué miedo! (Túnel.) No mires á este caballero... He sido yo quien te he agarrado el brazo... Cab - ¡Señora!... Señ. - Pues no crea usted que han acabado los disgustos.,. Porque mi cuñada tiene un gênio muy dominante. ¡Como es la persona rica de la familia y todos son á adularla y hacerle la rueda... y yo no tengo carácter para eso!... Porque si digo algo que no sienta, que reviente aquí mismo. Ahora se le ha puesto casar á mi hija con otrosobrino suyo á quien no conocemos. ¡Ya ve usted, un asunto tan delicado! El creo que es un buen muchacho, porque yo me he informado muy bien, y aunque alguien me ha dicho... ¡Niña, asómate á la ventanilla! que es muy aficionado á faldas, eso no tiene nada de particular, todos los hombres son lo mismo. Ya ve usted, á mi primer marido, á los ocho días de casados, le sorprendí abrazando a la niñera. Cab. - ¿Tenían ustedes niñera á los ocho días de casados? Señ. - ¡De una Hermana mía pequeña! ¿Qué había usted pensado, por Dios? Señ.a - ¡Mamá, mamá! Mira cuántos borregos. Señ. - Déjate de borregos. Ya puedas venir. Hablábamos de tu futuro. Señ. - ¿Y qué dice este caballero? Señ. - Dice lo mismo que yo. Que sin conocerle á fondo... Y dice muy bien. Cab. - (Aparte.) ¿De dónde habrá sacado esta señora que yo he dicho nada? Señ. - ¿Llegarnos á una estación? 13

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Señ.a - Ya van cinco estaciones. Cab. - Yo, con permiso de ustedes, bajo un momento. Señ. - Mire usted si para bastante. Cab. - Creo que sí. Debe tomar agua la máquina. Voz - ¡Aaaa, dos minutos! ¡Aaaa, dos minutos! Otra - ¡Agua! ¿Quién pide agua? Otra - ¡Bizcochos de canela, bizcochos de canela! Señ.a - Mamá, voy á comprar bizcochos. Señ. - Déjate de bizcochos. Ya sabes que en viaje hay que tener mucho cuidado con lo que se come. ¿Ves como he hecho muy bien em cambiar de coche? ¡Qué caballero más decente! Tiene trazas de ser comerciante... Yo tengo idea de haberle visto en Madrid com una señora gruesa, una tarde que estuvimos en el Lírico á ver El anillo de hierro... Aquella señora, que estaba delante de nosotros con un sombrero que no te dejaba ver... Sí, ¿no te acuerdas? ¿Una señora que lloraba mucho en las escenas tristes? Señ.a - No me acuerdo, mamá. Señ. - ¡Yo, en viendo á una persona una vez no se me despinta. Cuardo vuelva voy á preguntárselo. Voces - ¡Señores viajeros, al tren! Señ. - ¡Ay, ya tocan!... Y ese señor no viene... A ver si se queda en tierra... ¿No le vee? Señ.a - No. Señ. - ¡Eh, que no ande, que falta un caballero!... ¿Dónde estará? ¡Digo, ya me figuro!... ¡Que se marcha el tren!... ¡Que se queda! ¿En qué habrá estado pensando?... ¡Qué trastorno! Señ.a - Y no se ha ido á otro coche, porque ha dejado el equipaje... Señ. - ¡Claro que no! Lo mejor es echárselo por la ventanilla. ¡Ya lo encontrará! ¡Será un transtorno menos!

14

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Señ.a - Eso sí... Le haremos ese favor. Señ. - ¡Ayúdame! Señ.a - ¡Allá va! Sen. - ¡Es de un caballero que pierde el tren! ¡Entréguenselo ustedes! Ahora saldrá... ¡Pero qué descuido! ¿Como si no supiera que el tren no espera á nadie? Señ.a - Se ha quedado el libro. Señ. - ¡Déjalo, no sea como el de marras!... Pero, vamos, que ha sido ocurrencia. Señ.a - ¡Ya, ya! Señ - ¡Si tarda en pasar otro tren... y su familia le espera y no puede avisar. . ¡Vamos, no quiero pensarlo! Señ.a - ¡Ya, ya! Señ. - ¡El señor nos libre! Yo lo siento, porque siempre íbamos acompañadas... y tenía uma conversación muy agradable; se veía que era persona de educación. Señ.a - Y muy simpático. Oye, mamá, ¿fué del brazo de donde me cogiste en el túnel? Señ. - ¿Por qué lo preguntas? Señ.a - Por nada. Es que me duele. Señ. Es que soy tan nerviosa, y los túneles me dan un miedo... ¡Cualquier cosa que sucediera en un túnel!... ¡Pero, pobre señor, pobre señor! Mira, ¿no sientes apetito? Señ.a - Yo, sí. El tren me da mucho apetito. Señ. - Debías estar viajando siempre á ver si te nutrías. Pareces la dama de la media almendra... Alcanza la cesta... De paso mira cómo va ese animalito. Señ.a - ¡Ay, cómo bufa! ¡Michito, michito! ¡Uy, qué ojos! ¡Parecen ascuas! Señ. - Milagro será que no nos dé un disgusto. Vamos á merendar. Señ.a - Otra estación.

15

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Señ. - Mejor, así podemos arreglarlo todo. Voz - ¡Taaa, un minuto! ¡Taaa, un minuto! Voz - ¡Agua! ¿quién quiere agua? Señ. - Estas chuletas empanadas deben estar riquísimas. Pon aquí estos papeles, de mantel... Así, la servilleta... que no se vierta el vino... (Entra el Caballero.) Cab. - Señoras... Señ. - ¿Eh? Señ.a - ¡Ah! Señ. - ¿Usted? ¿Está usted aquí? Cab. - Sí, iba en el furgón de cola. Señ. - ¿No se ha quedado usted en tierra? Señ.a - Nosotras creímos... Cab. - ¿y mi equipaje? ¿Qué es esto? Señ. - ¡Ay, usted perdone! Señ.a - Caballero... Señ. - Creímos que había usted perdido el tren y por hacerle un favor... Señ.a - Lo hemos tirado por la ventanilla... Cab. - ¡Señoras! ¿Y quién les manda á ustedes...? Señ. - ¡Caballero, nosotras, con la mejor intención... Señ.a - Quién iba á figurarse... Cab. - ¿y qué hago yo ahora? ¡Demonio de mujeres!... ¡Tenían ustedes que hacer alguna atrocidad! Señ. - ¡Oiga usted, caballero! Si lo toma usted así... Cab. - ¿Cómo he de tomarlo? Señ. - ¿y por qué no advirtió usted á dónde iba? 16

revista dEsEnrEdoS ISSN 2175-3903 ano VIII - número 25 teresina - piauí agosto de 2016

Cab. - ¡No faltaba más que hubiera levantado el dedo! ¡Si no fueran ustedes locas!... Señ. - ¡Oiga usted! A mí no me llame usted loca y á mi hija mucho menos. . Más valía que tuviera usted educación... Cab. - ¡Señora! ¡Usted sí que no la conoce! Señ. - ¡Me está usted faltando y usted no sabe con quién habla! Señ.a - ¡Mamá, mamá! Voz - ¡Señores viajeros al tren, señores viajeros, al tren! Señ. - Cuando lleguemos á otra estación , verá usted... Cab. - ¡Haga usted lo que quiera!... ¡Mi equipaje, mi equipaje! Señ. - ¡Si no se puede viajar más que en reservado! Cab. - Podía usted haber ido en perrera... Señ. - ¿Yo en perrera? Señ.a - ¡Mamá, mamá! (siguen disputando.)

TELON

Graduado em História (UNIFSJ), Especialista em História Militar (UNISUL). Professor de História da Secretaria de Estado de Educação do Rio de Janeiro -SEEDUC. *

17

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.