Perspectivas Epistemológicas sobre o Jogador de Videogame

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UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MINAS GERAIS FACULDADE DE EDUCAÇÃO

David José

Perspectivas Epistemológicas Sobre o jogador de videogame

Artigo desenvolvido a partir de leituras no período de 2011-2012 como objetivo da pesquisa acadêmica junto ao Poiesis, espaço de tecnologia na educação do curso de Pedagogia da Faculdade de Educação, UEMG

1.

Introdução “(...) o antropólogo é obrigado a incluir a si mesmo e seu próprio modo de vida em seu objeto de estudo, e investigar a si mesmo. Mais precisamente, já que falamos do total de capacidade de uma pessoa como ‘cultura’, o antropólogo usa sua própria cultura para investigar as outras, e para estudar a cultura em geral1”. Roy Wagner, A invenção da cultura

A intenção do presente artigo é apresentar um registro das reflexões sobre o jogador de videogame, de um ponto de vista epistemológico com o objetivo de traçar idéias pedagógicas para os jogos de videogame, ou, se esse objetivo não puder ser conseguido, traçar idéias sobre a apropriação educacional dos jogos. Porém, os dois objetivos citados carecem de um paradigma antropológico para que o que estiver relacionado com os objetos da cultura possa ser revelado. Os videogames são artefatos de uma cultura. Localizar os novos grupos, comunidades linguísticas, na antropologia significou durante o século XX a procura das sociedades primitivas, exóticas, possibilitando a imagem e noção de humanidade, fazendo as respostas sobre o que a espécie humana realiza com as mãos, a razão, a emoção se enriquecer . Também esforços foram feitos no sentido de investigar a “sociedades complexas” do jogador de videogame, localizadas mais entre os citadinos urbanos das sociedades industriais, e suas tribos urbanas. No século XX os índios brasileiros finalmente foram descobertos do ponto de vista da ciência, como no trabalho de Roquete Pinto, o antropólogo brasiliano que usou primeiramente o cinema e o rádio para registrar sua etnografia entre as nações indígenas, na década de 1915. As populações humanas que vivem em terras brasileiras substituíram em poucas centenas de anos vários modelos produtivos, e o atual, o industrial, possibilita que a mercadoria possa ser o elo entre membros de culturas diferentes; mercadorias e estados mentais em comum. A emergência de novas sociedades, cognitivamente tão complexas como a dos indígenas brasilianos, tem causalidade semelhante a das novas formas culturais digitais, os mecanismos adaptativos que os modelos produtivos oferecem, a epistemologia dos novos sujeitos. No desenvolvimento das tecnologias digitais, quem faz a pergunta sobre a idade das crianças diante de um teclado, talvez muito semelhante à pergunta sobre a idade da imersão das crianças na vida e nos mistérios de um idioma, crença, hábitos ou natureza. Verticalizando a problemática das perspectivas antropológicas, que tanto procura grupos lingüísticos ancestrais, antigos, como os novíssimos, há a questão das formas de se etnografar uma população escolhida, o caminho. Será que é preciso ser indigenista para estudar os índios? Seria necessário ser um jogador de videogame para estudar o videogamer? A semelhança estéticas entre as populações citadas é pouca, os planos conceituais. Na verdade é sobre a forma de estudar um grupo que se trata, se refere, a tentativa de falar do jogador de videogame, ainda que populoso grupo. Os etnógrafos dos índios se dispuseram a encarar a relação com estes de maneira demolidora dos próprios fundamentos que o cientista leva consigo para a pesquisa de campo. 1

Roy Wagner. A invenção da cultura. http://antropologiadascoisas.blogspot.com.br/2010/08/roy-wagner-e-invencao-dacultura.html

Antropólogos contemporâneos como o americano Roy Wagner e o brasileiro Eduardo Viveiros descrevem a atitude metodológica da antropologia relacionada com uma busca epistemológica, uma busca pelo saber de uma cultura, pelo pensamento vivo de uma cultura, e as possíveis formas de registro dessa pesquisa, porque a relação do pesquisador com o saber, originário de um grupo humano diverso, transforma este pesquisador em um sujeito de fronteiras, de alguma forma habilitado a descrever o fato cultural abordado, a fenomenologia das experiências objetais humanas. Assim como um etnógrafo de índios pode voltar para sua academia afirmando que a vida ecológica é importante, o etnógrafo do videogamer pode afirmar que o playstation 2 pode ser usado na educação. O significado, a extensão de um conceito, como o conceito de nativo ajuda a configurar uma população que se pesquisa? É mais fluido predeterminar que as características identificantes do objeto seja assim delimitada? Ou nativo é um termo pejorativo, castrador? A atitude de usar ao extremo os conceitos acumulados nos anos da antropologia enquanto ciência, relativizando-os, pode ser uma atitude mental necessária para níveis mais objetivos de análise da realidade. Se empregarmos a expressão nativo da cultura digital descrevemos algum fenômeno humano, ou não. Penso que a inclusão de si mesmo e seu próprio modo de vida é uma atitude científica, parte de uma metodologia de estudo. Se a cultura de onde partimos é a acadêmica, com suas ferramentas, e objetivos, como o de habilitar o olhar pedagógico sobre os fenômenos sociais, as outras culturas são totalizantes, das capacidades de uma pessoa. O esforço de observar a vida digital em suas pormenoridades educacionais de modo a utilizar a descrição do jogador de videogame como instrumento de uma ação pedagógica, se necessária, quando necessária, ou mesmo se for o objetivo principal utilizar as mídias digitais na educação. A inauguração de uma descrição da experiência humana vinculando a crítica ao conceito de cultura, do ponto de vista da cognição é uma suave e efetiva forma de introduzir uma busca de elementos que permitam a descrição da experiência de vida do videogamer. Com o intuito de trazer alguma iluminação sobre termos apropriados, ou não, e sobre o sentido contemporâneo de etnografia pretendo citar alguma leitura e insights sobre a adequação e apropriação do conceito de nativo, o de aprendiz e o de sujeito, este último no sentido da interação entre o pesquisador e a população estudada, ou pelo fato de ser gamer também. Meu objetivo com o presente ensaio é refinar a perspectiva metodológica, “como” investigar, participar da mentalidade dos novos sujeitos contemporâneos. Uma nova população, surgindo simultaneamente em centenas de grupos etnicos pelo mundo, provocados e inclinados ao consumismo das novidades eletrônicas, digitais, às tendências do desenvolvimento tecnológico, mas ao mesmo tempo exercitando uma cognição e uma visão de mundo particulares, específicas, um agir político polifônico, e é esse o ponto que o caminho etnográfico talvez possa me levar; à compreensão da experiência de jogar videogame quando essa experiência determina a constituição de um grupo humano característico, que têm aumentado, e dos saberes específicos adquiridos pela prática de jogar. 2. Conhecimento antropológico sobre o videogamer O contexto do século XXI é o da imersão nas novidades digitais, na teleologia da eficiência das máquinas eletrônicas humanas, de tal forma que a história do desenvolvimento dessas máquinas não é

percebida pelas crianças que já nascem nesse contexto, ou talvez apenas como alegoria da diferença, quando um professor compara imagens de objetos tecnológicos da década de 1980 com os de 2010, por exemplo. As exigências sociais, econômicas das sociedades complexas, metropolitanas, urbanas, pósmodernas do início do século XXI trouxeram a vida informatizada para os habitantes dessas sociedades, dos laboratórios de engenharia da década de 1950 para as residências em 1990. Se os instrumentos que nos proporcionam investigar esses fenômenos são eles parte da própria cultura que pretendo estudar, o estranhamento do antropólogo diante dos fatos de sua própria cultura, ou, a percepção do surgimento de grupos econômicos, relevantes, coesos a tal ponto que possuam uma linguagem entre eles, uma racionalidade, um acordo linguístico, grupos arraigados de hábitos, não partilhados com toda a sociedade circundante em que vivem: possuidores de um conjunto de atitudes dinâmicas, que constituem sujeitos específicos, e, o mais acadêmico, a antropologia é uma ciência que também estuda a inventividade e a epistemologia dos comportamentos, os sujeitos criativos. Os sujeitos criativos, inventivos e interativos convocam os objetos, a criação de objetos, a constituição de hábitos. O videogame surge na década de 1960, se populariza na década de 1970, passa a compor obras de arte em 1990, e se torna uma grande e influente indústria na década de 2010, agregando enorme evolução teórica em todas as fases de sua produção, envolvendo uma grande população humana, divulgação e comercialização dos videogames, assim como potencializando os níveis de entretenimento, aprendizagem, identificação do jogador. Como descrever uma atividade contemporânea do ponto de vista da universalidade de fenômenos psíquicos que ela pode guardar com outras experiências ancestrais? Talvez já possuísse o ser humano o conjunto de habilidades mentais requeridas na prática do jogo digital, exercitada em outras atividades relacionadas aos mesmo mecanismo fisiológico. Talvez a descrição dos sujeitos inovadores, aqueles que determinam pontos de complexificação da linguagem, seja esse algo em comum, mas mesmo assim, não é possível determinar isso, se foi por causa da invenção do videogame que a nova habilidade surgiu, como consequência, penso que esses fenômenos não são encontrados sem antes executar o método de estudo. O conceito de ‘nativo’ dota o objeto, ou sujeito estudado de uma subjetividade, uma expectativa de sucesso adaptativo2. Os objetivos da antropologia da educação, ou a antropologia do conhecimento, por exemplo, essas linhas específicas de estudo, geral dados muito bem aproveitados por profissionais da educação, do marketing, da comunicação. O jogador de videogame, sua existência, sua vida, é um fenômeno de aprendizagem humana, e das razões políticas e econômicas de algumas sociedades humanas. Os videogames atuais possuem uma estrutura tão complexa quanto o cinema, e na verdade a maioria dos filmes de animação feitos para crianças são oriundos dos videogames, ou se tornam jogos depois. Belo Horizonte é uma cidade de cultivo da prática de jogar videogame? Como poderíamos medir as respostas a essa pergunta, em termos quantitativos, nas descrições das singularidades das várias comunidades de jogadores, ou nos eventos regulares que essas comunidades 2

Ao constituir um sujeito nativo, um tipo ideal, dentro de uma abordagem descritiva, o observador que aponta a realidade que irá descrever se torna o antropólogo, para tomar aparente para si o conhecimento que ele pode sistematizar a partir da relação com esse nativo, e essa seria a razão do emprego da etnografia como procedimento. Como relação social entendo os acordos, as semelhanças estéticas entre grupos afetados por fenômenos semelhantes da vida tecnológica, as divergências, as surpresas que se pode ter quando se aproxima a população estudada e seus comportamentos linguísticos.

realizam para se encontrar, como os campeonatos de jogos, encontros de fabricantes, desenvolvedoras e distribuidoras, e feiras de cosplayers, bancas de camelôs de jogos piratas nos shoppings populares? Esses eventos começaram a acontecer na cidade de Belo Horizonte na década de 2005. Na década de 1980, os fliperamas foram comuns nas ruas do centro da cidade, principalmente na Rua da Bahia, eram salas comerciais com sete, oito máquinas de fliperama, e atraíam os jovens, principalmente os estudantes e trabalhadores que transitavam por ali, em jogos de 32 bits. Num período em que o videogame começou a se popularizar como entretenimento doméstico por razões econômicas na classe média brasileira. A época dos fliperamas foi o momento em que a arte gráfica e a filosofia dos jogos se complexificou, máquinas com jogos como Donkey Kong, Ikari warions, Vulgus, Ghost Globilins, 1942, Tokio atraíam centenas de jogadores diariamente nas ruas. O Atari e o Nintendo eram muito vendidos para a prática doméstica dos jogos. A pedagogia é a ciência que estuda a educação, os fenômenos educacionais que são vividos por crianças e jovens, a maior parcela da população de jogadores, lá eles descrevemos mecanismos da educação, e também os conteúdos morais vinculados por estes. O hábito de jogar videogame, como uma prática imersiva da arte seria uma prática cognitiva tão significativa que os cientistas da educação se interessariam por ela, como um estudo pragmático de elementos que estão ligados à construção do saber escolar? Ou mesmo de um saber sobre a experiência humana? Se for essa uma opção, o caminho da etnografia sobre os videogamers, que abordasse os nativos das práticas digitais como um grupo, uma população de riqueza etnográfica. No caso específico da sociedade de Belo Horizonte, as razões para tal recorte é a problematização são os dados, o exercício de busca de referência, de proporção da população de usuários dos jogos, e dos referenciais teóricos. Mas a extensão da comunidade de jogadores leva às perguntas sobre as particularidades de cada estado, em termo de legislação para jogos, de cada região, ou seja, que um estudo dos contextos mundiais.

Período

1990 – 1998

1999 – 2002

Grupo etário

Perspectiva tecnológica

Estética

As crianças nascidas na década de 1980 e os jovens da década de 1970. O desenvolvimento dos primeiros computadores na década de 1950, e as várias gerações de cientistas da tecnologia.

Surgimento do Nintendo, Dreamcast. O Super Nintendo vendeu cerca de 50 milhões de unidades em todo o mundo, com centenas de jogos de sucesso.

Apple II (1977), Apple Macintosh (1984), Sinclair ZX80 (1980), Commodore 64 (1982), 486 (1985), Pentiun MMX (1996), windows 3.0, Windows 95, Windows 98, AMD Atlon (1998). Computadores eram grandes e não havia tantos notebooks

Jogadores de 30 anos, crianças entre 5 de 6 anos ainda em pouco número. Aumenta o número de mulheres jogadoras de videogames.

Playstation 2 é a máquina de videogame mais vendida no mundo. Até 2010, mesmo depois do fim da produção de jogos para Playstation 2, cerca de 140 milhões de unidades já foram vendidas em todo mundo

Pentiun III, Windows Me, Windows Vista. Surgimento de telas de LED, places de vídeo potentes, hiperrealismo fotográfico possível

2008 – 2012

Vários grupos etários diferente possuem hábitos de consumo diferenciados, com produtos cognitivamente particularizados

Playstation 3 é lançado. X-box 360, celulares com sistemas operacionais semelhantes ao Windows possibilita jogos, Playstation portátil, Nintendo Wii, jogos em knect. O Playstation 3 vendeu 65 milhões de unidades desde março de 2012

Pentiun IV, Windows 8, Core 2. Jogos de excelente qualidade para celulares, tablets e notebooks

A codificação da experiência é a expressão da imaginação que deve ser abordada. As gerações humanas tendem a estabilizar certos hábitos linguísticos, ricos do ponto de vista da economia simbólica, inclusiva, pois os hábitos de consumo da população de jogadores são a constante aquisição das máquinas estimulantes da mente; os videogames. As crianças da década de 1990 foram potenciais progenitores na década de 2010, e a chance de que, hábitos de jogar videogame sejam cultivados nesse tipo de família. A presença de inovações tecnológicas na vida das pessoas que habitam a sociedade industrial é muito intensa. O formato de um fliperama é o mesmo de um caixa eletrônico. A ergonomia da prática das partidas de fliperama na década de 1980 é a mesma de um usuário de banco sacando seu dinheiro apertando botões, utilizando os dedos, e a interação com a tela como milhares de adolescentes belorizontinos já faziam nos anos oitenta. Se a prática de jogar um fliperama é um hábito linguístico, então podemos abordar o uso do videogame com teleológico, ou seja, antecipador de futuras práticas sócioeconômicas. Ou não, ou talvez não haja nenhuma teleologia e a era digital é um fenômeno passageiro na experiência das populações humanas porque esta sedimentada em um desgaste tão intenso do meio ambiente; as sociedades industriais onde os videogames são produzidos e consumidos está de tal maneira apartada da vida natural, da relação saudável com o meio ambiente que o desgaste do fluxo energético é cada vez maior para suprir esses hábitos linguísticos que necessitam do uso contínuo de energia elétrica para serem realizados, ou seja, demanda uma forma estruturante de relação prejudicial às reservas energéticas do planeta terra. Período

Jogo

Inovações

1996

Quake 1 (Id softwares, EUA)

Jogo com estória complexa, narrativa empolgante, a visão do jogador é a de uma “primeira pessoa” (você não vê você mesmo, vê o cenário a frente de seus olhos), excelente jogabilidade, windows 95 e windows 98

2005

Resident Evil 4 (Capcon, JAP)

Playstation 2 e PCs, um dos jogos mais vendidos na história dos videogames, gráficos superrrealistas. Seis milhões de cópias em mais de 50 países.

2009

Call of Duty: Modern Warfare 3 Microsoft Windows, PlayStation 3, Xbox 360, Windows Mobile, Wii, Nintendo DS. Segundo sites da internet, o jogo vendeu 9 milhões de cópias (Activision, EUA) apenas no primeiro dia de vendas, e mobiliza milhões de jogadores on line.

A composição destes quadros, com dados históricos e informações estéticas do universo dos jogos digitais ajuda a localizar os fatos mais significativos. Como parte da busca e sistematização de dados, elaborei alguns quadros como estes. O quadro acima apresenta uma possibilidade estética da historicidade da formação de um hábito, uma identidade semântica, econômica, comportamental entre jogadores que compõem as linhagens de máquinas e softwares. Pertencer a um grupo de pessoas que realizam as mesmas tarefas, que vivenciam experiências imaginárias da mesma ordem, as semelhanças de biotipo, de racionalidade, e a expectativa da indústria na capacidade de consumo contínuo das novidades eletrônicas, um grupo de pessoas que está constantemente aberto para o que ainda há de vir, de melhor: a teleologia do realismo sempre crescente é um argumento comum aos gamers. Este quadro é apenas uma representação simples, em uma tentativa de figurar fatos, intercalar dados, que faz parte do esforço em compreender o jogador de videogame se coloca numa fronteira entre a realidade e a ficção, o advir da imaginação material a mentalidade dos jogadores, uma vez que um nativo do universo gamer é um consumidor de jogos, com habilidades psicomotoras específicas, consciente de que um jogo possibilita a simulação intensa dos universos imaginários. A evolução técnica na industria dos jogos participa dessa teleologia do hiperrealismo. Em 1996, com o jogo Quake era uma grande experiência virtual, os jogadores manipulavam a personagem do jogo com a sensação de extensão, pela precisão dos movimentos, e pela velocidade da ação. O ritmo da luta com os monstros conectava o jogador a personagem de uma forma nova, ainda não vista, possível pela evolução das maquinas e da linguagem de programação. Dez anos depois, um outro jogo aperfeiçoa ainda mais a manipulação da personagem, e os detalhes gráficos das imagens; Resident Evil 4, nos gráficos do Playstation 2. Já no jogo Call of Duty modern warfare, de 2009 o realismo é quase fotográfico, o que faz a imersão do jogador ser muito maior. Isso demonstra que os jogadores de videogames são indivíduos que acompanham as tentativas de digitalização da vida, e problematizam situações específicas como estas recorrências ao realismo, à busca do jogo mais fisicamente fiel, ainda que nas alegorias do maravilhoso, do fantástico, do surreal. Mas a determinação da melhor forma de representar a realidade, que hoje é a fotografia, a qualidade fotográfica das imagens, por toda história de credibilidade que a fotografia traçou no imaginário, seria essa a tendência dos jogo; um realismo fotográfico, ou não, seria este o maios dos prazeres, manipular a realidade tal como ela é, eis uma pergunta. A evolução tecnológica, as soluções eletrônicas, a indústria da produção de jogos, da competição contribui para a consolidação das comunidades de gamers espalhadas pelas várias sociedades, uma imbricação entre indústria, consumo, e cognição que vai residuando, em seu processo de desdobramento, novas mentalidades, dias e noites na vida dos indivíduos, novas formas de ser e estar socialmente, e que podem não estar sendo captadas por nosso olhar analítico: a vida de videogamer ainda é tida como lugar de um preconceito social, um lugar contraditório, pois os jogadores fazem com que a indústria dos jogos

seja uma das mais lucrativas mundialmente. Para um saber mais problematizador é necessário jogar algumas partidas de videogame. Há vários jogos específicos de computador portátil (PC) e jogos específicos de consoles, como os da Nintendo, Sony, Mircosoft, que são os mais populares. Os jogos podem ser baixados pela internet ou adquiridos em lojas, e eles rodam e são jogáveis a depender da configuração correta e dos requisitos tecnológicos adequados, como placas de vídeo, bom funcionamento dos aparelhos, compreensão básica de inglês por parte do jogador, etc. 3. Etnografia O etnógrafo se familiariza com a história documentada do objeto de suas indagações, seu objeto teórico, que inicialmente é um sujeito ideal descrito, e que ganha contradição e alma no momento da ação etnográfica, ou seja, a prática da convivência com o nativo: os registros sobre o universo simbólico que pretende imergir, conhecer, descrever e que vão encaminhar os diálogos possíveis com os seres humanos investigados. A história dos videogames está documentada em uma estrutura hegemônica de desenvolvimento do universo da linguagem humana, do próprio videogame na atualidade, que é a internet. O veículo de propaganda do videogame foi desde a criação dos videogames a televisão, e as revistas especializadas. Conhecer os lugares onde se joga videogame, em casa, em lojas, no trabalho, no transporte público, é parte de um trabalho, de entendimento do esforço imersivo que desprende prazeirosamente do jogador, que quanto mais envolvido com as narrativas e motricidades, mais transforma seus objetos de uso domésticos em parte simbólica de suas práticas. Ou não. Enquanto a televisão incentivava os jogos, vendia as marcas e sugeria os hábitos de consumo para tal, as revistas de videogames, muitas delas feitas pelos fãs dos jogos, que se popularizaram na década de 1980 cativaram jogadores mais especializados e na verdade realizavam a integração entre os desenvolvedores, os comentadores e os jogadores, aqueles que desfrutam do entretenimento em si estes últimos. Nessas revistas análises filosóficas eram possíveis de serem encontradas, e também reflexões sobre a dimensão educacional, educativa, pedagógica desse tipo de jogo humano. A internet a partir da década de 2000 estabelece para si a missão de guardar a história humana, e se torna instrumento para acúmulo de saber também sobre videogames; informação sobre as empresas de desenvolvimento de videogames, artistas que trabalham com videogames, programas, comentários e os próprios jogos, para todas as plataformas, dos computadores aos consoles. A portabilidade, o grande portal por onde entram os gamers diariamente aos milhões se configura em áreas onde grupos identificados com hábitos semelhantes de raciocínio, gostos, signos, símbolos, partilhando informações e gerando debates complexos. O jogador de videogame é necessariamente o navegador da internet, ainda que essa realidade seja recente, como acima mencionamos. A televisão brasileira quase não propaga os videogames. Jogos como Diablo II (EUA, 2001) tiveram seus comerciais proibidos, diferente das propagandas do console Atari que eram muito comuns de serem vistas na década de 1980 na TV. Também o hábito de jogar videogame é pouco abordado em novelas ou programas, constituindo uma programação underground que existe em pouca quantidade. Os jogadores geralmente quando se consideram ou são considerado viciados é porque

sua habilidade no jogo excede à dos demais, uma habilidade conquistada pela prática da vitória sobre o conjunto de obstáculos epistemológicos que são oferecidos pela jogatina. Como já descrevemos anteriormente, vicio além de se referir ao aperfeiçoamento cognitivo, representa também a situação de escravidão com que o jogador se relaciona com o hábito de jogar. A pesquisa sobre o jogador pode abordar os elementos materiais da possibilidade do jogo digital: os saberes que as desenvolvedoras detêm sobre eles, o saber sobre como o jogador vai resolver os dilemas lógicos a partir da psicomotricidade fina que será necessária para que o jogo evolua, na conexão do jogador com a interface, com os comandos, com os objetos intermediários como mouse, teclado, joystick, manetes, etc. a pesquisa sobre o jogador, para construir um jogo começa na humanidade do próprio desenvolvedor, e com os jogadores profissionais que são pagos para testar jogos. Porém, o mercado consumidor possui a fluidade e as resiliências de várias ordens, o que faz com que as empresas precisem conhecer melhor os jogadores, e interagir com eles. A historicização da relação com os jogos, a presença dos cenários dos jogos na vida psíquica dos sujeitos, os nativos das comunidades virtuais de jogadores, alguma herméticas demais linguisticamente, é útil para uma visão espacial da quantidade de jogadores, sua influência econômica e a trajetória de um jogo na história das máquinas, pois um jogo, mesmo feito na década de 1980 continua encontrando suporte eletrônico para ser jogado até hoje, o que faz de um jogo um artefato histórico que é gerador de acomodação3. A Nanco-Bandai, uma desenvolvedora japonesa de jogos vendeu no ano de 2011 23 milhões de unidades de jogos em todo o mundo 4, para serem jogados em Playstation 3, X-box 360 e videogames portáteis5. A luta pelos direitos autorais com as plataformas anteriores, como Playstation 2 eram ferozes, e os jogos atuais exibem dispositivos de rastreamento pela internet, assim como as máquinas passaram a ser mais refinadas do ponto de vista do não-hackeamento. Mas boa parte ainda dos jogos são comprados e vendidos nos sistemas informais de economia, a chamada pirataria. Outra empresa desenvolvedora com sucesso de vendas é a Capcom, criadora da série de jogos de horror 3D Resident Evil. Um dos jogos famosos da Capcom, que pode ser jogado em fliperamas, computadores, consoles e portáteis é o Vulgos, um jogo em 2D, que possui um tamanho pequeno, gráficos 32 bits criado em 1984. Os jogos da década de 1980 eram jogados em consoles pessoais, domésticos, com recursos tecnológicos limitados, ou podiam ser jogados em fliperamas, máquinas de jogos que ficavam em locais públicos. Em Belo Horizonte a Rua da Bahia, próximo à praça da Estação era um lugar de grande concentração de casas de jogos de fliperama, e milhares de jovens e adultos frequentavam. Nos eletrodomésticos como Atari, máquinas para se jogar em casa, o público maior era de crianças. Os fliperamas e os consoles domésticos da década de 1990 contribuíram para que o hábito de jogar videogame fosse fixado, e a competição entre as empresas fabricantes, a perspectiva de se jogar em casa, um hábito doméstico, mudou já na década de 2000 a forma de jogar videogame, atualmente mais doméstica mesmo, com os fliperamas em muito menor número, e 3

O sentido da acomodação pode ser apropriado como o de fixação de um aprendizado, de um conhecimento, de um hábito, que se acomoda entre os demais comportamentos, mentais, psíquicos, motores do sujeito, para que sua performance contínua aconteça. 4

5

http://www.bandainamco.co.jp/files/2012E69CACE6B1BAE7AE97E8A39CE8B6B3E8B387E69699EFBC_2.pdf (27/06/2012).

http://www.baixakijogos.com.br/noticias/23976-dark-souls-e-o-jogo-mais-vendido-da-namco-bandai-no-ultimo-ano-fiscal (27/06/2012).

paralelo a esse fenômeno o surgimento de feiras e competições em vários níveis para jogadores. Desde a década de 1980 revistas especializada em jogos preenchem o espaço da teoria na vida dos jogadores, são especulações, matérias, reportagens, artigos, teses, informação, spoilers, uma grande soma de idéias e perspectivas que faz com que jogar videogame não seja apenas uma tarefa mecânica, mas represente participar de um universo de ideias, com correntes filosóficas divergentes e tudo o mais. A estética dos jogos 2D é bem simples em termos do hiperrealismo da profundidade, a personagem central do jogo se move em duas direções apenas, e a visão que o jogador possui de seu avatar é apenas uma superfície. Entretanto tais jogos oferecem um complexo desafio intelectual e psicomotor para o jogador, e apresenta cenários belos e ótima jogabilidade, fazendo com que até hoje jogadores ainda o procurem. Os jogos 2D da década de 1980 ofereciam apenas dois planos espaciais, o realismo da física, quando a personagem salta, corre, ataca entretanto já era crescente, e os obstáculos epistemológicos oferecidos passaram a se complexificar, demandando estruturas mentais diversas para enfrentar os desafios lógicos, motores, a mescla de estimulações sensoriais. Eram, entretanto, jogos curtos, cerca de 3 horas para um jogador com adquirida habilidade concluir, e possuíam poucos cenários. Os jogos da década de 2010 além de serem mais complexos, do ponto de vista da realidade são bem mais longos, alguns com até 10 horas de jogatina para se jogar. A etnografia usada para estudar, para a proximidade com a população de jogadores, passa pelo estudo dessas revistas especializadas, para compreender que a população de gamers se divide em muitos subgrupos, que realizam as várias atividades desse universo relacional. Há os desenvolvedores, que preparam os jogos, os comentadores e estudiosos, e os jogadores. A pesquisa sociológica sobre as empresas desenvolvedoras de jogo, sobre as feiras anuais que reúnem milhares de jogadores, os eventos públicos em que se reúnem diversos jogadores também é uma possibilidade de quantificação, de correlação de dados, e possibilita o encontro com esse público. Nas feiras de encontros entre gamers se pode perceber que a comunidade de jogadores possui uma multidimensionalidade; os jogadores estão inseridos em uma cultura que vai além dos jogos, e do jogar. Em geral os jogos contemporâneos são também materializados em diversos produtos, como revistinhas em quadrinho, brinquedos, roupas, cosméticos, o que faz com que a característica de consumidor seja uma das mais fortes características desse grupo, portanto estudar os hábitos de consumo pode possibilitar o acumulo de dados importantes para a descrição do fenômeno. Também os estilos de vestimenta, a linguagem, as músicas, as referências que os jogos trazem constituem influência entre os aficionados. Os estudos sobre o trabalho de Eduardo Viveiros de Castro, Jean Lave e Roy Wagner perspectivaram um olhar sobre o público gamer, uma perspectiva antropológica que pode ter uma consistência explicativa, são três teóricos que pretendo ler com mais acuidade, pois estes abordam conceitos que são instrumentos para a análise dos jogadores de videogame: o pertencimento do jogador a uma coletividade fechada, os processos de aprendizagem que novatos e veteranos realizam e a criatividade. Estes autores serão lidos adiante. No texto o nativo relativo Viveiros de Castro aborda as especificidades cosmológicas que um grupo a ser pesquisado possui e que podem ser alcançadas pelo antropólogo mediante considerações sobre a relação entre o pesquisador e o pesquisado: a relação entre os dois como fonte de conhecimento, e a simulação mental que o antropólogo pode fazer admitindo objetividade nos conceitos e elementos da

explicação de mundo que o nativo usa. A própria prática de jogar coloca um pesquisador em contato com esse grupo, a pesquisa junto aos cursos universitários que formam os desenvolvedores de jogos, a presença nos eventos e o acompanhamento dos fóruns virtuais onde os jogadores apresentam seus debates. Porém a fronteira entre a mentalidade do jogador e as necessidades do método de pesquisa da antropologia, a tensão do pertencimento e do não pertencimento a cultura que se estuda, ao grupo que se estuda é importante. Estudar um fenômeno como esse, os jogadores de videogame, é relevante academicamente? A consideração desses indivíduos como nativos, portadores de um universo linguístico próprio que não pode ser abarcado sem precisão metodológica, ou, que ainda não está sendo descrito com minúcias das interrelações entre as variantes que possibilitam esse fenômeno, ou, que está em pleno movimento de formação de hábitos, de existência, uma grande novidade que ainda não está sendo acompanhada, ou a necessidade de acompanhar a significativa produção acadêmica de textos, artigos e teses sobre jogadores de videogame, especificamente do ponto de vista antropológico e pedagógico. A antropóloga Jean Lave, que estuda o fenômeno da aprendizagem entre trabalhadores, o modo como novatos se tornam aprendizes, e como os jogos de linguagem existentes nas relações de trabalho são aprendidos e jogados pelos que se inserem. Os jogos de videogame são autodidatas, olhos e mãos são desenvolvidos para fluírem em complexidade de acordo com a evolução das habilidades do jogador, o próprio jogo se transforma, se desdobra; a apropriação das possibilidades do jogo se dá quando o jogador amplia seu nível de atenção, suas qualidades motoras, perceptivas. As comunidades de jogadores acontecem com a convivência de todos os níveis, entretanto os mais experientes vivem esferas diferentes do significado. A prática do jogo é o fator determinante: jogar é trabalhar com o corpo, com a mentalidade. Estudar o jogador de videogame em termos de seu processo de aprendizagem do jogo, ou melhor, da formação de grupos que cooperam para o desenvolvimento ou não das habilidades dos jogadores novatos, ou mesmo estabelecer uma pesquisa em que os grupos de jogadores possam ser estudados de acordo com o nível de habilidade e a posição dentro das sociedades que se forma em torno da prática de jogar também podem ser perspectivas antropológicas férteis para novas ideias sobre o tema. O antropólogo Roy Wagner, no sexto capítulo de seu livro a invenção da cultura aborda o tema da criatividade, uma filosofia da criatividade humana, que é um dos fatores de transformação da cultura. O sujeito criativo, o indivíduo em crise de reelaboração. O universo dos games é um universo onde a criatividade é uma ferramenta primordial, tanto no desenvolvimento dos programas de softwares, a pesquisa e criação de máquinas de diversão, e, criatividade no desenvolvimento das estratégias do próprio jogador. Essa criatividade do ponto de vista da cognição, da identidade entre os membros dessas comunidades, e principalmente dos novos rumos, das constantes inovações acrescentadas a cada geração de jogos, demonstram que ser criativo é um dos requisitos ideais para a vida de videogamer, mas é ser criativo dentro de um conjunto de limites, da materialidade. Esse tema, da criatividade é um dos mais importantes a serrem explorados do ponto de vista etnográfico, principalmente quando é sobre o jogador. O lugar ideal para uma etnografia sobre os gamers é a Coreia do sul, pois tem altas estatísticas de jogadores entre a população total, e possui grandes desenvolvedoras de jogos, seria um lugar onde eu praticaria etnografia, para ver o nível de importância da vida de jogador para as famílias, para a economia, para as formas linguísticas, para a mentalidade.

Aparentemente é uma sociedade que oferece muitos elementos dessa cultura gamer já inseridos fortemente na vida social. Uma pesquisa que possa levar o antropólogo a viver entre os coreanos, ou mesmo em outros locais de grande vivência dos gamers favorece a experiência pessoal, os níveis de relacionamento humano para a imersão antropológica necessária. Como parte de uma experiência etnográfica pretendo pesquisar a sociedade coreana por seis meses, para conhecer a relação entre a educação formal e o entretenimento digital. 3.1. Etnografia no inconsciente coletivo O conceito de inconsciente coletivo de Carl Jung trata dos universos simbólicos partilhados de maneira inconsciente por uma população humana, que habitam juntos ou partilham de hábitos comuns de sobrevivência. A materialidade das demandas pelo alimento, pela segurança, a vida pulsional cotidiana, adequada às rotinas de sociedades altamente produtivas do ponto de vista dos recursos tecnológicos e do consumo. Todos os seres humanos sonham; sonhar durante o sono é um mecanismo fundamental para a psique humana, e dormir também é, são fatores ancestrais, são comportamentos fisiológicos. Com a criação dos objetos de uma cultura, e com as conexões que o cérebro humano pode fazer com esses objetos, como livros, bicicletas, garfos, a experiência mental se altera, e talvez a cada novo objeto de uso maciço das populações humanas, herdados geracionalmente pela pedagogia apropriada em ciclos de ensino-aprendizagem, cada vez mais determinantes para os Estados, como por exemplo os processos que a sociedade brasileira sofreu para se adaptar ao uso dos caixas eletrônicos, e assim foi e é com o uso do arco e flecha ou a prática de um idioma. Para uma imersão inicial abordo agora o jogo Manhunt 2, jogo de Playstation 2 e PC. No jogo controlamos a personagem Danny Lamb um presidiário que acorda em uma penitenciária judicial no momento de uma rebelião, sua oportunidade de fugir, passando por psicopatas assassinos, homens cruéis, para ganhar a liberdade e resolver o enigma de sua prisão e dos fatos que estão acontecendo com ele6. Um forte apelo às imagens primitivas do nascimento, e de todo sofrimento pela conquista da autonomia e reconhecimento social que um ser humano enfrenta pode ser metaforizado para tramas em que heróis surgem em condições desfavoráveis, na verdade a metáfora do nascimento é horrificada ao extremo, e a realidade é convertida num verdadeiro inferno onde todas as demais personagens do jogo estão ao encalço de Danny. O cenário é quase sempre noturno, marginal, locais onde se espera sempre que algo de ruim e horroroso aconteça, uma expectativa de que o ser humano se comporta de maneira natural, selvagem, nas trevas, na escuridão, no sono noturno, como uma espécie da tragédia surge. Esse cenário provoca uma tensão no jogador que se entrega à fruição, e ela piora quando a movimentação da personagem dentro do jogo não corresponde à urgência psicomotora do jogador no manuseio do teclado ou das manetes, ou outras formas de jogá-lo. A emoção provocada pelo cenário e pela jogabilidade acontece no momento simbólico específico do jogador, acompanha sua capacidade de abstração, de construir em sua imaginação a narrativa, os seus estados mentais, oníricos. Em geral a relação inicial do jogador com um jogo é intensa, e se ele adquire habilidades suficientes para que o jogo flua, ou, encontra agradabilidade na prática, ou se refugia nela, então temos o trabalho de jogar, quando 6

Curiosamente o jogo manhunt 2 começa com um despertar, o vácuo de uma transição entre o jogador e a personagem, parte da narrativa necessária.

três, quatro, cinco horas da vida de um sujeito são vividas na relação com o videogame, com o programa. Um conjunto de fatores faz com que a experiência de estudo dos gamers revele as patologias associadas ao jogo. Manhunt 2 é um jogo desenvolvido a partir de 2005, pela empresa Rockstar games, é uma sequência de Manhunt 1, e foi jogado por milhares de jogadores. A narrativa do jogo trata de um presidiário que acorda livre mas dentro de um caos O jogo propõe ambientes provocadores de tensão emocional, como foi dito, e é indicado para maiores de 17 anos. As classificações para jogos são feitas por pessoas baseadas na psicologia, na pedagogia e nas razões criminais, pois existe uma admissão de que um jogo de videogame é capaz de educar para certos comportamentos, seja estimulando dimensões obscuras das personalidades ou ensinando práticas violentas como atropelar, esfaquear, insultar, agredir. Mas se a admissão de uma dimensão educacional nos jogos é a base para uma classificação etária, temos mais pressupostos protegidos por essa admissão, e uma dessas dimensões é imaginação, como a imaginação do jogador é afetada pela sua prática constante de jogar, como imagens, palavras, lugares, paisagens, estéticas são manuseadas em cada aventura de um jogo? Seria necessário estudar os mecanismos da imaginação, em sua base fisiológica, psicomotora, partindo da estimulação do jogo até encontrar os resíduos oníricos, os sonhos sobre os jogos? Então uma pergunta inicial para os jogadores, em uma aproximação seria: você sonha com os jogos que joga? O inconsciente coletivo é mensurado também pela opção exposta comercialmente em uma população, além do exame dos sonhos de um grupo de jogadores em uma investigação mais lenta. As vendas são a resposta imediata da profundidade onírica de um jogo, mais do que o sucesso de um bom marketing, ou não? As filas de jovens sul-coreanos nas portas de lojas de jogos de videogame são famosas pelo mundo; há jogos que vendem milhões de cópias em suas primeiras horas de venda, possibilitando ciclo de imersão dos jogadores, e ciclos de grande produtividade econômica, uma vez que um grande jogo desses de massa leva de dois a dez anos para serem desenvolvido e ao logo desse desenvolvimento centenas de profissionais trabalham no desenvolvimento de cada jogo, o que nos leva a incluir o imaginário desses profissionais como parte do fluxo de ideias e hábitos envolvidos no ato de jogar videogame. Para falar das categorias de sujeitos que vivem o universo dos videogames penso ser possível organizar a seguinte estética:

Desenvolvedores

Comentadores

Jogadores

Composto por programadores,

Especialistas em videogames, jornalistas

Pessoas de todas as idades que praticam

filósofos da tecnologia, escritores de

especializados, educadores, jogadores

jogo de videogame, cosplayers,

jogos, analistas de programação,

profissionais, youtubers, antropólogos, ...

consumidores da cultura periférica dos

artistas plásticos, empresários da

jogos (roupas, revistas, estilos,

tecnologia, engenheiros da

linguagem, ...)

computação, ...

Realizam a experiência estrutural de

Fazem a propaganda dos jogos, tem uma

Possuem a experiência da imersão,

um jogo, geram a possibilidade técnica

relação direta com os desenvolvedores e

fantasiam, se emocionam, se alienam,

para a existência dos aparatos do

com os jogadores também, realizam

compram os jogos, se vestem de

videogame. Trabalham em equipes

análises, fazem críticas, estipulam faixa

personagens, se divertem, ...

multidisciplinares, se reúnem em

etárias permitidas, criam estratégias,

universidades, feiras de jogos.

fazem spoilers (ensinam como jogar),

Compreendem os jogos de videogame

montam tutoriais (principalmente no

e os jogadores do ponto de vista

youtube), promovem discussões

econômico e tecnológico...

filosóficas, ...

Todas essas pessoas estão envolvidas, desde o momento em que o jogo é desenvolvido até o momento em que ele é jogado. Um jogo como Manhunt 2 esteve e ainda está presente em bancas de camelôs, o mercado ilícito dos jogos, únicas possibilidades de certas classes econômicas acessar. Manhunt 2 ainda é encontrado como novidade por jovens de periferia que estão tendo acesso ao Playstation 2 apenas agora em 2012. Um console destes pode ser comprado por 300 reais nas ruas do centro de Belo Horizonte, e cada jogo a 5 reais. Mesmo que a pirataria signifique dano econômico a empresas e Estados, ela é a única forma de grupos econômicos periféricos terem acesso a cultura dos jogos digitais, e de alguma forma legítima isso representa uma alfabetização digital, pela razão de que a forma de jogar, o ato de jogar, se converte em prática substantiva de outras práticas da vida atual das sociedades complexas, urbanas industriais, da mesma forma que o fliperama é a imagem estética do caixa eletrônico, e, como ocorre em certas sociedades, como a Coréia do Sul o letramento é realizado tanto no texto analógico como no virtual. Um debate interessante sobre esse tema seria do de nos perguntarmos qual a idade que uma criança deve ter o teclado de um computador como instrumento de aprendizagem formal, oficial nas escolas, se isso é pertinente ou não. Perguntar também se o videogame será um dia incorporado em sala de aula como instrumento de ensino. O ser humano é uma soma de dimensões, a economia individual alimentar; o que comeremos hoje, como dormiremos, o que vestiremos, as preocupações imediatas, fisiológicas, são acompanhadas de uma significação muito elaborada, de forma que em sociedades industriais. Personagens de desenhos animados são parte da propaganda de produtos alimentícios, sociedades competitivas, instrutivas, tecnológicas. Nesses grupos populosos humanos, a castração das aspirações individuais é aperfeiçoada pelas garantias civis, democráticas, mas também pela desigualdade de oportunidades reais para etnias diferentes, ou estratos econômicos diferentes, ou relações de trabalho e produções. Mas a fantasiação do cotidiano, vista numa novela da televisão brasileira diariamente, por exemplo, amortiza as frustrações dos operários que vão ao paraíso, trazem além disso representações míticas, religiosas, dos conflitos e tragédias humanas, palavras, novidades; consumo da arte de forma que são fatores educativos para o sucesso da vida social. O videogame é também sucesso da vida social, um investimento econômico altamente lucrativo para os jogos de sucesso, incluso obras de arte. Arte que alguns jogos são potentes pela extrema habilidade dos desenvolvedores, e os jogadores de videogame acompanham a história de sua sociedade, da arte de sua sociedade, pela evolução tantos dos aparatos tecnológicos quanto pela evolução das perspectivas gráficas e filosóficas dos jogos, de maneira a historicizar os jogadores, localizar sua mentalidade, suas opções pessoais no mundo digital. Muitos profissionais se tornam desenvolvedores e

comentadores de jogos de videogames após uma experiência inicial como jogador aliando o conteúdo imaginário com a capacidade científica de construir programas. A fantasia é um estado mental em que a psique humana coordena, esteticamente, uma série de regularidades nas imagens e realidades que a criatividade pode descrever. A mesma capacidade criadora que os desenvolvedores exibem, como mecanismo criador de soluções alternativas para a performance de um trabalho ser eficiente, os jogadores do outro lado da mercadoria também possuem. E também os comentadores dos jogos de videogame. Um número potencializando pelas inovações tecnológicas e pelo apelo ao consumo que a industria de jogos tem e faz em várias culturas no planeta. Existem os rumores de que os jogos de videogame são tão lucrativos quanto o cinema ou a industria dos cosméticos, movimentando bilhões de dólares a partir da década de 2000, quando os hábitos, as estratégias pedagógicas dos vários grupos formadores de desenvolvedores, comentadores e jogadores têm conseguido êxito em seus esforços para ampliar, o grande grupo final, fonte de fenomenologias pessoais. 3.2. Os limites e valores do ato de jogar videogames A pergunta inicial deste tópico é sobre os arquétipos, os fatores arqueológicos envolvidos no comportamento de jogar videogame. Se fosse perguntado: “Aristóteles, o filósofo grego, não sabe andar de bicicleta”, a forma de responder que se refira ao fato de que os comportamentos humanos estão associados aos objetos históricos que são fabricados: Uma bicicleta é resultado de um evento técnico, epistemológico de outras culturas, e mesmo que Aristóteles possuísse todas as condições fisiológicas para a habilidade de pedalar e se equilibrar, ficaria sem a imersão, que é responsável pela formação das ideias, segundo ele mesmo disse. A geração que vive os videogames, composta por pessoas consideradas inicialmente entre as que participam das três comunidades citadas anteriormente, possui a imersão na máquina de jogos, no desembolar dos programas, e mesmo como resultado das habilidades adquiridas, assim como nas metodologias de produção dos jogos e das máquinas. Entre os comentadores de jogos os valores e os limites, os limites e os valores, são polos dialéticos de uma série de mensagens. Os vlogs tratam a si mesmos como terceiras pessoas, num lugar de jogador, ,as ao mesmo tempo de sábio, e atualmente divulgando para empresas. Para consumir certos jogos e produtos, para possuir moralidade, para adquirir idioma específico do universo gamer, existem muitas finalidades. A seguinte estética reproduz a imagem de alguns dos subgrupos funcionais do levantamento inicial de dados:

Plataforma

Conteúdo

Tipos ideais

Internet

---no site YOUTUBE podem ser encontradas milhares de gravações em vídeo feitas por jogadores, comentadores, negadores, desenvolvedores, desde tutoriais para se aprender a jogar até tutoriais se ensinando a

--- No YOUTUBE há muitos vlogs onde comentadores, verdadeiros filósofos falam dos jogos. Muitos desses comentadores trabalham para empresas divulgadoras de vendas de jogos, por isso

construir programas de computador para jogos, recebem conteúdo específicos. Três assim como sites onde análises filosóficas são podem ser citados aqui como exemplo: feitas. “Zangado”, “Guilhermegamer” e --- A internet aumentou a difusão dos jogos de “Edugames” videogame, e pode ser acessada também pelos consoles como Playstation 3. as vendas de --- É muito interessante assistir a análise programas, jogos, assim como downloads de jogos feitas por crianças. É muito desses arquivos, e também as páginas das comum se encontrar vídeos com análises empresas. Os blogs de jogadores e fóruns e narrativas ao som da voz da criança também possibilitam o aumento da população revelando que dominam o saber digital e relativizando a experiência de de jogadores. distanciamento com relação à inferioridade intelectual da infância.

Revistas impressas

--- dezenas de publicações brasileiras mensais, semanais tratam de jogos de videogame, enfocando vários aspectos principalmente a visualização de fotos dos jogos, de cenas dos jogos, assim como editoriais e matérias que abordam os jogos, e os jogadores. --- as publicações custam em média de 10 a 15 reais, algumas possuem DVDs de jogos para serem instalados. Também servem de veículod e propaganda para as empresas de videogame, assim como ajudam os jogadores iniciantes a encontrarem os hábitos de consumo relacionado ao sucesso da vida de jogador de videogame.

Livros e cursos universitários

--- Start (guia para Playstation, editora Crazy Turkeyor,) --- Eletronic Gaming Monthly (revista mensal sobre jogos, Ziffi Davis Media inc.) --- artigos escritos por designs de jogos, e por roteiristas. Análises de pedagogos sobre a faixa etária dos jogos sua adequação, etc. Há muitas revistas que fornecem gratuitamente jogos. Obtive grandes jogos, como Bet on soldier (França, 2006), adquirido em uma revista como brinde. A revista continha informações sobre o jogo assim como artigos e editorial sobre games.

--- Em Belo Horizonte há vários cursos voltados para a formação de profissionais nas áreas de jogos digitais. Cursos de graduação em nível acadêmico com duração de 2 a 3 anos. Há também especializações lato senso.

--- as disciplinas técnicas, matemáticas, são as mais efusivas nos cursos de formação dos desenvolvedores de jogos. Entre os comentadores a profissão de jornalista, professores universitários, filósofos. Entre os jogadores a maioria é --- Grande parte da formação é feita em cursos de estudantes, um traço identitáriotécnicos de computação e design gráfico, a operatório. grande maioria dos estudantes são adolescentes do sexo masculino.

Uma experiência iluminadora para a descrição do jogador de videogame, o sujeito e modelo epistemológico com o qual é possível dialogar, sendo ou não um gamer é a experiência de acompanhar tutoriais na internet, e ao longo do segundo semestre de 2011 e primeiro semestre de 2012 concluí um

percurso da reflexão: como um videogame pode ser um instrumento da pedagogia, mesmo da pedagogia de projetos, como acontece na formação de aviadores e tripulação profissional de aviões comerciais e militares que usam jogos de simulação para desenvolver hábitos operatórios, motores da habilidade. E as leituras que fiz nesse período, principalmente artigos de revistas especializadas, e os tutoriais e análises filosóficas dos jogos, essa atitude trouxe perguntas sobre o jogador, sobre as pessoas, os sujeitos, os mecanismos psíquicos, e finalmente os dados sociológicos. Todos esses elementos são de auxílio à antropologia da educação quando algum saber só puder ser alcançado em uma simulação, os simulacros, comportamentos recorrentes que convertem os praticantes em sujeitos habilidosos nos jogos, alguns muitíssimo habilidosos, e outros que investem muito dinheiro em jogos, principalmente em jogos on line pela internet. Outro grande grupo tem insucesso nos jogos e segue experimentando, migrando de plataforma até encontrar a adequada, seguindo a evolução gráfica e emotiva dos jogos, o hiperrealismo já citado, e o caráter de universalidade das produções mais ousadas, os grandes jogos de milhões de jogadores mundiais, como Diablo III.

Referências --- CARVALHO, Alysson Massote e ALVES, Luciana. Videogame e sua influência em teste de atenção. http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S1413-73722010000300009&script=sci_arttext --- KEIFER-BOYD, Karen. Jogos computacionais: arte no século XXI. IN: SANTAELLA, Lúcia (org.). Mapa do jogo: a diversidade cultural dos games. São Paulo: Cengage Learning, 2009. pgs 123-136 --- ZAGALO, Nelson. Emoção interativa na linearidade narrativa. In: FERNANDES, Anita (org.). Jogos eletrônicos: mapeando novas perspectivas. Florianópolis: Vsual books, 2009. pgs 73-111

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