Uma viagem pela comunicação não verbal da Galiza até o Brasil: contribuição para a análise de alguns quinemas e aloquinemas significativos em narrativas orais em galego, basco, catalão, espanhol e português

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UMA VIAGEM PELA COMUNICAÇÃO NÃO VERBAL DA GALIZA ATÉ O BRASIL: CONTRIBUIÇÃO PARA A ANÁLISE DE ALGUNS QUINEMAS E ALOQUINEMAS SIGNIFICATIVOS EM NARRATIVAS ORAIS EM GALEGO, BASCO, CATALÃO, ESPANHOL E PORTUGUÊS Aitor Rivas UFV 1. Breve introdução à comunicação não verbal É difícil saber quando começou o estudo dos gestos, mas, na Antiguidade clássica já havia preocupação com a gestualidade, como podemos comprovar na Institutio Oratoria de Quintiliano: “toda ação, como disse, divide-se em duas partes: voz e gesto, destas duas uma move os olhos e outra os ouvidos; por estes dous sentidos todas as impressões penetram no espírito.” Até os anos quarenta do século passado não começaram a aparecer os estudos mais importantes referentes à quinésica e aos gestos. Danguitsis publica, em 1943, uma monografia dialectal que inclui um apartado sobre os gestos. Logo aparecem os inventários culturais de gestos de Boas e Efron (1936), os estudos teóricos de Efron (1941), os trabalhos de Hall (1959) e um interessante atlas do folclore suíço de Geiger e Weiss (1950). Nessa altura temos o primeiro trabalho de quinésica de Ray L. Birdwhistell: o antropólogo estadunidense iniciador dos estudos quinésicos marcou um fito nos estudos de comunicação com a sua conhecida análise da cena do cigarro (Birdwhistell, 1984). Depois das contribuições de autores como Birdwhistell, Hall, Effron, Ekman, Friesen ou Knapp, nas últimas décadas do século XX o número de trabalhos sobre a comunicação não verbal se multiplicou exponencialmente.

Mas, como podemos analisar esses movimentos? Qual é a unidade mínima da quinésica? Birdwhistell (1970) e Poyatos (1994) —entre outros autores— propuseram uma série de unidades mínimas do movimento do corpo equivalentes aos fonemas e grafemas na linguagem verbal (oral e escrita). Esta é a definição de quinema que nos oferece Birdwhistell (1970, p.193): “À semelhança do fonema, a unidade distintiva mais pequena, o quinema é a mais pequena unidade de ação perceptível, cuja variante é o aloquinema.” A todo o material que interatua, transforma e dá um valor particular à corrente cinética o chama de paracinético. Herculano de Carvalho (1979, p.649) refere-se, nos seus trabalhos, à existência de uma forma de linguagem não-verbal do ser humano, a linguagem dos gestos, “constituída por movimentos e atitudes do corpo, e particularmente das mãos e da cabeça”. Para Knapp (1992) o comportamento quinésico —que ele identifica no primeiro momento com o movimento do corpo— inclui os gestos, os movimentos corporais, os das extremidades, as mãos, a cabeça, os pés, as expressões faciais, a conduta dos olhos e mais a postura. Poyatos (1994) acrescenta, para além disso, que os referidos movimentos podem ser conscientes ou inconscientes, ilhados ou combinados, aprendidos ou espontâneos, de percepção visual, audiovisual ou quinestésica —quer dizer táctil. A quinésica é, em resumo, o conjunto dos movimentos e posições que têm qualquer valor comunicativo. Mas, quem se ocupa hoje do estudo da comunicação não verbal? Psicólogos, antropólogos, artistas, etnólogos, designers, linguistas, entre outros. São necessários muitos investigadores de diferentes disciplinas para compreender o funcionamento da comunicação não verbal e melhorar o desenvolvimento das suas

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atividades. Por muitos anos ficamos à margem dos principais campos de estudo, mas ultimamente está ganhando força o trabalho sobre a não verbalidade. 2. Linguagem não verbal ou comportamento não verbal? Hoje a psicologia não adota a denominação de linguagem verbal e esta foi substituída pela noção de comportamento não verbal. Como refletimos em trabalho anterior (RIVAS, 2009), não se trata de uma linguagem stricto sensu, mas sim de um conjunto de ações e atitudes físicas que formariam parte de um comportamento não verbal. Assim, mesmo que possamos afirmar que o comportamento não verbal e a linguagem verbal têm algumas coisas em comum, não partilham as mesmas estruturas nem os mesmos elementos básicos. O comportamento não verbal influencia e intervém diretamente na oralidade e na linguagem verbal. Por isso preferimos, de agora em diante, utilizar a denominação de comportamento não verbal. 3. Qual é a importância do comportamento não verbal e da quinésica? Morant e Peñarroya (2004) comentam, no seu trabalho, que durante a persecução nazi inumeráveis judeus se denunciaram —eles próprios— pelos movimentos das mãos, se reconhecendo como mais desenvolvidos e gesticulantes do que o resto de alemães. Esta é uma questão interessante para refletir, pois nós, mesmo de forma inconsciente, percebemos que enganar com o corpo não é tão simples como com a palavra. Como disse Cabodevilla (1973) a análise desta linguagem não verbal merece uma atenção especial, por resultar mais fidedigna do que a transmitida através das palavras. Devido ao

escasso controle que exercemos sobre este código, o corpo muitas vezes nos delata. Se apagarmos do discurso de um político qualquer a parte verbal, seria muito simples observar a veracidade do seu comportamento não verbal, comprovando se o que diz com as palavras (verbalmente) é o mesmo que transmite o corpo (quinésica). Um outro tipo de engano, muito comum nos políticos de hoje em dia, consiste em imitar e agachar o seu comportamento não verbal. Nos últimos anos compreenderam perfeitamente que a política é uma questão de aparência, razão pela qual a maioria deles recorre a consultores de linguagem corporal para ajudá-los a criar a imagem de sinceros, honestos e responsáveis, principalmente quando não são. Poderíamos fazer um teste com afásicos porque, como explica Gruen (1995), é impossível mentir a um afásico. Não distinguem as palavras, por isso não os podemos enganar com palavras; mas captam com uma segurança infalível as formas de expressão que as acompanham de uma forma tão acertada, espontânea e involuntária como nunca poderia ser fingida, o que é por demais fácil de fazer com as palavras. Mas não são os políticos os únicos a mentirem. Seria interessante rever as prateleiras das nossas bibliotecas e livrarias para observar quantos títulos de livros de “autoajuda” incluem a pseudoanálise do comportamento não verbal.

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4. Análise de relatos orais não planificados1 A seguir apresentaremos a nossa proposta de análise de narrativas orais não planificadas, nas quais os narradores contam alguma experiência pessoal. Gravamos cinco vídeos de cinco pessoas em cinco idiomas diferentes e analisamos o seu comportamento quinésico.2 Alguns traços comuns são que todos eles têm espontaneidade gestual. Não tinham preparado a sua fala, o seu discurso. A orientação que lhe passamos antes de gravar era a seguinte: que recordassem alguma história da sua vida, sem roteiro nem esquema prévio, e que a explicassem no momento da gravação. Vamos escolher apenas alguns fotogramas de cada narração que nos ajudem a explicar a quinésica desses narradores e narradoras. 4.1. Raquel (galega) A narradora conta-nos uma história humorística de dois amigos que trabalhavam às noites, em discotecas e dos problemas de saúde que tiveram. Ela parece tímida e fica com as mãos e os braços pegados ao corpo no início, mas quando ela tem de explicar o que acontece depois ela começa a mover os braços e as mãos para a frente, separando-as amplamente e demonstrando a perspectiva linear do tempo: o antes fica atrás; o depois, na frente. Este movimento pode se ver na seguinte sequência de fotogramas (Imagens 1, 2 e 3):

1 Os cinco vídeos analisados estão disponíveis no seguinte endereço: https://vimeo.com/channels/analisequinesica

Imagem 1

Imagem 2

Imagem 3 Trata-se de um marcatempos (POYATOS, 1994) de passado, presente ou futuro. Os marcatempos fazem referência a diversos pontos do passado, presente e futuro e à repetição e duração dos 2 Contamos com a autorização para o uso de imagem e depoimentos de todas as pessoas que participaram na nossa pesquisa e às quais agradecemos sinceramente a sua colaboração voluntária e a sua disponibilidade.

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acontecimentos. Quando se referem ao futuro imediato, normalmente transmitem-se com movimentos curtos diante do rosto.

para abaixo e as sobrancelhas ficam arqueadas (Imagem 6). Aqui o olhar da narradora vai para cima, imitando com toda probabilidade como seria o olhar do doutor nesse momento. A surpresa do doutor transmite-se na expressão facial da narradora, representado neste emblema.

Imagem 4 Mais adiante, quando ela fala de um ciclo —“este ciclo repetíase día tras día, todos os días da semana”— ela imita o movimento de uma roda, com os dedos virando em círculos. Seguindo com a narração do relato, tem um momento em que se produz um breve silêncio e parece que a narradora tem problemas para continuar com o discurso. A solução encontrada (muito comum também noutros narradores) é descer o olhar e procurar as palavras que seguem na narração fora do espaço da história que nos conta. Nesta retenção ou interrupção do gesto (Imagem 5), há uma metáfora da busca: o olhar delimita um plano, que não pertence à história, mas à realidade e ao momento da enunciação. Temos, assim, dois planos: o primeiro, que se corresponde com o espaço onde se movem as personagens da narração; e o segundo, onde só pode entrar a narradora para buscar coisas que precisa para continuar com a narração. Quase sempre são pequenas “viagens gestuais” feitas pela narradora a esse seu plano, onde só ela pode acessar. Um pouco depois, no discurso verbal, o doutor pergunta: “–E nunca bebedes algo de zumo?”. Quando a narradora fala essas palavras o seu olhar vai para cima, a boca fecha-se com os laterais

Imagem 5 Este é um exteriorizador com o que se mostra a reação fronte à realidade atual, passada, imaginada por outras pessoas. Os exteriorizadores podem se exprimir quinesicamente, mas também se manifestam mediante a paralinguagem, mediante a proxémica, mediante uma reação dérmica, entre outros.

Imagem 6 4.2. Iñaki (basco): Aparentemente, o narrador de língua basca (ou euscara) tem pouco movimento de braços. É significativo, pois provavelmente devido ao nervosismo, tem os braços muito perto do corpo. Porém, ao longo do relato percebemos uma

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gestualidade mais completa, também com outras partes do corpo (cabeça e olhar principalmente), diferente ao doutros falantes da Península Ibérica. Mesmo assim, no primeiro fotograma que vamos analisar (Imagem 7), ele coloca os olhos para cima, quando tem uma lacuna na narração, quando não sabe como continuar. É uma coisa comum a todos os narradores que conhecemos. Depois de “aiau ginanian gehixen harrittu oskun gauzia izan zan”3 ele perde o fio do discurso e fica um momento procurando as palavras nesse espaço metafórico do que falamos anteriormente.

Imagem 8

Imagem 7

Imagem 9

No seguinte trecho, ele fala: “pobriena oso pobria da eta kalian lo itten daue”4 e acompanha as palavras com o braço. É um marcador espacial que nos indica a distância e a situação, neste caso onde é que estão os pobres (Imagem 8) e onde os ricos. Com os braços e a direção do olhar ele divide os dois espaços e grupos de pessoas: os pobres (à esquerda) e os ricos (à direita). Depois, o narrador fala sobre a água na Índia e dos conselhos que lhes deram antes de viajar de não beberem água não engarrafada. Mas ele disse: “bueno, guk hala ta be hartu ta edan”5. Nesse momento, como se pode ver no fotograma (Imagem 9) o narrador explica a ação de beber água com um emblema.

Os emblemas definem-se como comportamentos não vocálicos que se podem traduzir verbalmente de um jeito direto, ou seja, podem ser substituídos por uma palavra. Por exemplo, quando inclinamos a cabeça para diante e para baixo várias vezes, para a nossa comunidade de fala que estamos afirmando, dizendo “sim”. Neste fotograma o emblema significa “copo”. Ekman e Friesen (1969) classificaram os emblemas como “condutas não verbais”. A respeito da sua utilização, sublinham que os emblemas se empregam de jeito intencional e consciente em contextos nos que outros tipos de mensagens verbais são difíceis ou, como no nosso exemplo, para transmitir uma situação sem precisar das

3 “a primeira coisa que nos impressionou” (tradução do euscaro). 4 “os pobres são muito pobres e dormem na rua” (tradução do euscaro).

5 “bom, nós, de toda maneira, bebemos” (tradução do euscaro).

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palavras. Ainda quando se trata de sinais arbitrários, a tradução de um emblema é conhecida por todos os membros de um determinado grupo social e não deixa lugar a dúvidas dentro desse grupo. Os problemas podem se produzir quando se desconhece a cultura na qual se utilizam ou o seu significado.

Imagem 10 Na análise do discurso deste narrador observamos várias vezes uns movimentos da cabeça que estão provocados por autocorreções lexicais. Na oração “baitta izan zan trafiko kontua”6 o narrador tem de se corrigir até em quatro ocasiões (Imagem 10). Acompanhando o discurso oral, faz um movimento que consiste em fechar os olhos e adiantar a testa com violência (como golpeando-a para as palavras saírem). A reparação lexical é tipicamente precedida ou acompanhada por movimentos da cabeça, sendo os mais comuns acenos laterais, por vezes pequenos tremores laterais ou frontais. Esse movimento, já caracterizado por marcar relações de contraste entre enunciados, marca, no caso das correções, um contraste de caráter mais intrapessoal do que interpessoal, e é uma reminiscência de um apagar ou afastar de alguma coisa (CARVALHO, 1979). 6 “que nos surpreendeu foi o tema do trânsito” (tradução do euscaro).

Por último, é importante refletirmos sobre a posição do corpo e da cabeça do narrador. Num momento da sua história “berdin dau paso de zebria egon, semaforua gorri egon”7 o narrador coloca as mãos nos quadris e ergue a cabeça sinalando com ela um ponto do espaço, provavelmente referindo-se ao semáforo (Imagem 11). A cabeça é utilizada para localizar um referente no espaço, para orientar alguém ou alguma coisa para o referente e é usada também metaforicamente para localizar pontos no espaço. A expressão das imagens mentais dos personagens —diferentes posturas de cabeça por parte do falante, quando se refere ou representa a alguém— oferece diferentes informações sobre estatuto social ou altura da personagem da narração. Quando os narradores estão imitando outra pessoa colocam-na mentalmente —e muitas vezes também visualmente— num espaço real: “Isso significa que o falante tem uma imagem mental dessa personagem e que usa a posição da cabeça para fornecer esse conteúdo” (CARVALHO, 1979, p.865).

Imagem 11

7 “tanto faz se tem uma faixa de pedestres, semáforo fechado” (tradução do euscaro).

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4.3. Clara (catalã) A terceira narração que analisamos é de uma moça que nos fala sobre os castells (torres humanas) da Catalunha e da vergonha que ela sentiu num concurso que se celebra cada dois anos. É uma história de experiência pessoal e, já no começo, a sua gestualidade demonstra que fica nervosa novamente ao relembrar a história. Quiçá é por isso que ela ri tantas vezes durante a sua narração. Não sabe onde colocar os braços (cruza-os à altura do peito) nem o que fazer com as mãos e por isso toca repetidas vezes a própria face (Imagem 12).

Uma outra característica do comportamento não verbal desta narradora é a grande quantidade de pictografias que utiliza (Imagens 13 e 14). Este tipo de movimentos servem-lhe para desenhar coisas no espaço. Assim acontece em “abans era una antiga plaça de toros”8, ao desenhar a forma circular da praça com as duas mãos.

Imagem 13

Imagem 12 Isto é um autoadaptador, quer dizer, um movimento onde uma parte do corpo entra em contato com outras. Os autoadaptadores podem durar mais ou menos tempo, mas sempre vão precedidos e seguidos de uns movimentos de abertura e de encerramento que os delimitam. Algumas funções dos autoadaptadores são adotar posturas universais ou culturais, facilitar certas necessidades somáticas, ocultar algumas destas necessidades, ajudar em atividades relacionadas com o corpo, facilitar ou impedir a emissão ou recepção sensorial, expressar ou ocultar reações emocionais, distrair a mente, entre outros. 8 “antes era uma antiga praça de touros” (tradução do catalão).

As pictografias, segundo Poyatos (1994), são movimentos, sobretudo manuais, que acompanham a conversação, desenhando no ar —ou em uma superfície— a forma, o contorno ou o volume de um referente bidimensional ou tridimensional. A referência verbal à que acompanham nem sempre corresponde exatamente à quinésica, pois às vezes iniciamos a pictografia antes de mencionar o referente, como acontece no exemplo de “tens totes les graderies”9, onde antes de falar o nome, ela realiza a sua pictografia.

9 “você tem toda a plateia” (tradução do catalão).

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provavelmente para evitar os nervos ou para não gesticular em excesso. Logo depois de exprimir algumas ideias, quando fala “yo no me fío mucho de lo que son normalmente los parámetros económicos”11 começa a gesticular —abrindo as mãos e os braços—, e utilizando-os ao serviço do seu discurso (Imagem 16).

Imagem 14 Por último, queremos destacar um dos marcadores pronominais e adjetivais que utiliza a narradora catalã. Trata-se de um tipo de dêitico paralinguístico (Imagem 15). São movimentos corporais que acentuam ou enfatizam o referente do discurso. Por exemplo, quando ela diz “esperant que jo aixequés el cul d'allà”10 intensifica esse “jo” graças à utilização deste autoadaptador.

Imagem 15 4.4. Horacio (argentino) Este narrador argentino faz uma reflexão pessoal sobre a relação existente entre a economia geral de um país e a felicidade dos cidadãos. Ele parece estar bem consciente do seu comportamento não verbal, começando com os braços cruzados, 10 “esperando que eu levantasse a bunda de lá” (tradução do catalão). 11 “eu não acredito muito no que são normalmente os parâmetros econômicos” (tradução do espanhol).

Imagem 16 No seu relato, podemos destacar muitos ilustradores e marcadores discursivos. Quando ele fala “me guío mucho más”12 e separa seu braço direito para dar três golpes no ar que reforçam o discurso verbal (Imagem 17) observamos um marcador gramatical. Estes marcadiscursos, termo acunhado por Poyatos (1994), são condutas fundamentalmente quinésicas —conscientes ou inconscientes— que reforçam a sucessão acústica e gramatical de palavras e frases e viriam coincidindo com os signos de pontuação, da representação escrita da fala. Do ponto de vista da fala viva, os marcadores representam um dos elementos mais importantes, pois são a essência visual de cada idioma, o mais difícil de identificar, definir e descrever em uma dada conversa.

12 “me guio muito mais” (tradução do espanhol).

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Friesen (1969), definiram a ideografia como um movimento que mostra um caminho ou direção do pensamento, traçando o itinerário duma viagem lógica, mas em realidade também pode ser um movimento acompanhado de um som paralinguístico. Imagem 17 Em “por el estado de felicidad de la gente”13, logo depois da palavra “felicidad” ele mostra um amplo sorriso (Imagem 18), ora pela alegria que lhe provoca a ideia ora como uma brincadeira.

Imagem 18 É frequente, no discurso verbal, acharmos muitas vezes adjetivos ou substantivos que nos remitem imediatamente a uma imagem gráfica, a qual logo fica associada a esse conceito. No trecho “que es una sociedad absolutamente apática”14 o narrador descreve com o seu corpo qual é a característica principal dessa sociedade. No movimento horizontal que realiza com o seu braço direito e a mão aberta (Imagem 19) fica às claras qual é o significado que tem esta ideografia. Para ele a apatia é uma linha plana, sem altibaixos. Estamos falando em ideografias. Ekman e 13 “pelo estado de felicidade das pessoas” (tradução do espanhol). 14 “que é uma sociedade absolutamente apática” (tradução do espanhol).

Imagem 19 Quando ele fala em “pintadas, arte callejero, exposiciones”15 estamos diante de uma enumeração prototípica, na qual o narrador acompanha com a cabeça e com os dedos de uma mão cada um dos conceitos e palavras que vai enumerando (Imagem 20). Herculano de Carvalho (1979, p. 867) disse que “quando se faz uma listagem ou enumeração de conceitos, a cabeça move-se com cada elemento da lista, geralmente para a posição oposta àquela em que se encontrava durante a produção do elemento antecedente.”.

15 “grafites, arte de rua, exposições” (tradução do espanhol).

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intervêm na intensidade e modifica o seu significado. Esta será maior quanto mais dure o silêncio, pois tem a função portadora e determina o efeito das palavras que se acabam de pronunciar. Neste exemplo o longo silêncio e a posição estática indicam claramente que o discurso chegou ao seu final. Imagem 20 No exemplo, este movimento funciona também como um indicador da conceptualização espacial de entidades (concretas ou abstratas) e, para além da cabeça, o narrador reforça a enumeração com todo o corpo. Houve investigadores que analisaram os movimentos de cabeça para o árabe, búlgaro, coreano e inglês africano dos Estados Unidos, mas concluíram que os acenos laterais na função de marcar intensificação e as mudanças de posição da cabeça no início do discurso direto narrado se verificam através de várias culturas, mas não são universais. Nas culturas observadas, os movimentos usados nas contagens (enumerações) são predizíveis. (GALHANO RODRIGUES, 2007) O final da narração vem marcado por um longo silêncio e a adoção de uma postura estática, o que denominamos quietude significativa. Depois de falar “y todas essas pamplinas” (e todas essas tolices) o narrador faz uma pausa, conscientemente, e isso faz com que essas últimas palavras se prolonguem mais intensamente na nossa mente, transportadas e aumentadas pelo silêncio que as amplifica e define muito melhor o seu significado —e com mais eficácia— do que se ele tivesse continuado falando. O efeito do silêncio fica intensificado quando está acompanhado simultaneamente da quietude (Imagem 21). A duração do silêncio

Imagem 21 Como escreveu Poyatos (1994), o silêncio e a quietude podem se decodificar como signos propriamente ditos. O significado, a verdadeira mensagem, não vem da carência dos signos esperados, mas sim do próprio silêncio, sem referência a outra coisa. Com efeito, o silêncio e a quietude podem se interpretar em virtude das atividades físicas ou puramente intelectuais que acontecem simultâneas. O que faz com que o som e o movimento sejam o que são, o que os define, é o que muda, mas no silêncio e na quietude o único que muda é o que têm arredor. Sob o ponto de vista da interação social, este é o aspeto semiótico mais interessante do silêncio e da quietude. Trata-se da sua capacidade para atuar como portadores da atividade imediatamente precedente. Uma das aplicações mais interessantes destas funções portadoras do silêncio está em ler ou contar contos para as crianças ou, no caso que estudamos, nas narrações de adultos.

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4.5. Raul (brasileiro): Raul tem uma forte recordação do primeiro jogo de futebol internacional ao que assistiu e conta-nos a história de como o vivenciou. Aparentemente ele não tem “muita gestualidade”, mas cumpre diferenciar entre a quantidade, a qualidade e a variedade dos gestos. Mesmo que os seus gestos não tenham muita amplitude e comece com os braços agarrados atrás das costas, logo vai mudar o seu comportamento em momentos especiais do relato.

Imagem 22 Neste caso temos a demonstração visual do comportamento não verbal de um outro lapso, como acontece com tantos outros narradores e falantes no dia a dia. (Imagem 22). Depois de rematar a frase “e de falta” há um silêncio de quase dois segundos, que está acompanhado por três gestos inconscientes que se complementam para mostrar a intenção do narrador: aparta o olhar para acima, fecha os olhos brevemente e faz um movimento com a língua e a boca, se preparando para continuar com a narração. Durante esses instantes de silêncio vemos o olhar perdido, o que nos leva a pensar que o narrador anda à procura do fio condutor. Este gesto é, como já vimos, uma metáfora espacial da busca. Os olhos procuram a continuação do relato em algum

lugar perdido, lá em cima, esse segundo plano no que se encontram as palavras e as histórias do narrador.

Imagem 23 O seguinte movimento gestual significativo ocorre quando descreve rapidamente como o goleiro “cruzou todo o campo”, acompanhando a frase com um movimento de sua mão direita (Imagem 23) que atravessa por diante do tronco, no sentido contrário. É interessante comprovar como, após concluir esse gesto, sua mão toca o próprio rosto (outro autoadaptador), coça a barba (Imagem 24) e logo depois volta a recolher os braços para trás.

Imagem 24 Para acabarmos com esta análise, destacamos um gesto que realiza quando ele fala “pedindo a Deus” e separa os braços do tronco, abrindo as mãos brevemente, como fazem alguns padres na igreja (Imagem 25). É um exteriorizador que, como já dissemos, transmite a reação de alguém diante de um sucesso.

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Este tipo de gestos são aprendidos, muito provavelmente, e imitados inconscientemente.

Imagem 25 A gestualidade deste narrador ao longo do relato fica centralizada principalmente no seu rosto, mas contra o final tem alguns momentos especialmente expressivos em que ele utiliza os braços e mãos para intensificar o que está contando. 5. Considerações finais Como já tínhamos constatado em estudos anteriores (RIVAS, 2006) ao analisarmos o comportamento quinésico de uma pessoa —neste caso de cinco narradores e narradoras— podemos concluir que a produção —e a transmissão— do humor não é algo simplesmente oral, intervindo no mesmo outros aspetos e comportamentos não verbais que provocam o riso, as duplas intenções e a cumplicidade com os ouvintes. Mesmo tendo marcas de estilo e diferenças particulares nas suas narrações, conseguimos apreciar algumas características comuns em todos os narradores: - Quando eles têm alguma lacuna mental, eles colocam os olhos para um lateral ou para acima, para ajudá-los na pesquisa do fio condutor da sua história.

- Os marcadores espaciais metafóricos (principalmente com os movimentos dos olhos e da testa) são recorrentes em todas as pessoas que analisamos e são realizados do mesmo jeito. - O discurso é linear e, nas nossas culturas, o tempo avança sempre para a frente. As mãos contribuem a fazer avançar o discurso e também servem para levarem o ritmo. - Os lapsos, dúvidas, imprecisões e repetições no discurso oral favorecem a aparição de elementos da comunicação não verbal. Como disse Torralba (2006) em sua obra, o gesto é físico, é tangível, é vivencial e direto. As pessoas são dinâmicas e se expressam através de gestos. Por isso o gesto corre mais rápido do que a palavra e a razão. Depois desta pequena análise das narrações destas cinco pessoas, podemos afirmar que, efetivamente, o gesto é mais representativo e transmite muito mais e mais diretamente do que a palavra. Por isso, para uma análise real dos comportamentos não verbais, temos de incluir as investigações em outros campos do conhecimento conjuntamente com profissionais de outras disciplinas que nos ajudem a descobrir todos os significados possíveis dos gestos. Referências BIRDWHISTELL, R.L. Kinesics and Context: Essays on Body Motion Communication. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 1970. ______. Un ejercicio de kinésica y de lingüística: la escena del cigarrillo. In: BATESON, G. et al., La nueva comunicación. Ed. Yves Winkin. Barcelona: Kairós, 1984.

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ANEXO - Transcrições e traduções dos textos 1. Raquel (Frades, Galiza) Texto em galego: Bueno, vouche contar unha historia que... lle aconteceu a unha xente que coñecín cando vivía en Compostela. O caso é que, bueno, é unha historia de... de dous rapaces, que eles vivían de noite, non? Un... traballaban nunha discoteca... e entonces o que facían era... [pola ma... o que era]... pola noite levantábanse a iso das oito ou nove da noite, almorzaban, e... [sa] e... arreglábanse para ir a traballar de noite á discoteca, estaban na na discoteca hasta as cinco da mañá, despois eles seguían de marcha hasta iso das nove ou dez da mañá, e... ían a un bar a comer o seu bocata de zorza i dispós volvían para a casa i volvían a dormir, e así este ciclo repetíase día tras día todos os días da semana e... menos o... luns, que o luns para o martes descansaban, non? O caso é que... un día nesta vida nocturna (un día) un dos rapaces díxolle ao seu compañeiro: - Ei, que, noto como que a miña mandíbula se move. Parece que me caen os dentes. Non sei que me pasa... no? Teño esa sensación de que caen os dentes. E o seu compañeiro lle dixo: - Jo, eu tamén teño (esta) esta mesma sensación. E téñoa desde hai unha semana, máis ou menos. Ti? - Eu tamén. Desde hai unha semana. Non sei que pasa. O caso é que decidiron ir ao médico, no? porque estaban así un pouco inquietos. E o médico, bueno, flipou un poquiño porque, cando chegou, cando chegaron e lle contaron o que lle estaba pasando e lle fixo, pois unha revisión i tal, o médico díxolle: - Nunca, nos meus vinte anos de... de traballo como médico vin esta enfermidade. Pensei que xa estaba erradicada. É imposíbel que no século XX, a [no sé...] a principios do século XXI, haxa xente que poida ter, no mundo occidental, esta

enfermidade. Non o poido crer. Non o poido crer. E a verdade é que, claro, estas palabras do médico... puxeron un pouco nerviosos a estes rapaces porque era como... - Que pasa? Que pasa? Temos unha enfermidade rara. Que...? Que pasa? Que pasa? E o médico empezoulle a preguntar: - Bueno, a ver, vós que tipo de vida levades? - Bueno, non, é que nós é que traballamos de noite. Traballamos nunha discoteca. - Vale: Que bebedes? - Bueno... bebemos bastante cocacola con ron e, claro, cubatas i tal. - Vale: i que comedes? - Bueno, comemos bastante... bastante... carne, xeralmente un dos nosos platos favoritos é bocata, un bocadillo con zorza. - I nunca bebedes algo de zumo? - No, a verdade é que no, só bebemos... claro bebemos moito cubata, a verdade é que zumos non é... non é a nosa bebida favorita. - Pois mirade, vós o que tedes é escorbuto, principios de escorbuto, que é unha... é esa enfermidade que matou os mariñeiros (da, do...) dos barcos de Colón cando viaxaba a América ou mataba tamén os presos, nas cadeas, cando estaban e... presos, pois por exemplo na época de Franco, na ditadura. Pero o increíble é que hoxe en día, no ano dous mil tres vós teñades os principios de escorbuto... Só con tomarvos un cubata con zumo de... con cas de laranxa teriades o suficiente zumo e suficientes vitaminas como para poder... para que o voso corpo non teñades esta enfermidade. E así foi como estes dous rapaces pasaron de beber cubatas con cocacola... a beber cubatas con fanta limón. Tradução: Bom, vou te contar uma história que... aconteceu com uma gente que conheci quando morava em Compostela. O caso é que, bom, é uma história de... de dois garotos, que eles viviam de noite, né? Hum... trabalhavam numa discoteca... e então o que faziam

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era... [pela manh... o que era]... à noite acordavam por volta das oito ou nove da noite, almoçavam, e... [sa] e... se preparavam para ir trabalhar de noite na discoteca, estavam na na discoteca até as cinco da manhã, depois eles seguiam de festa até perto das nove ou dez da manhã, e... iam em um bar para comer o seu sanduíche de zorza e depois voltavam para casa e voltavam a dormir, e assim este ciclo se repetia dia após dia todos os dias da semana e... menos na... segunda, que da segunda para a terça descansavam, né? O caso é que... um dia nesta vida noturna (um dia) um dos garotos falou com o seu companheiro: - Ei, que, estou notando como a minha mandíbula se move. Parece que me caem os dentes. Não sei o que é que está acontecendo... né? Tenho essa sensação de que caem os dentes. E o seu companheiro lhe disse: - Puxa, eu também tenho (esta) esta mesma sensação. E tenho faz uma semana, mais ou menos. E você? - Eu também. Faz uma semana. Não sei o que acontece. O caso é que decidiram ir ao médico, né? Porque estavam assim um pouco inquietos. E o médico, bom, se assustou muito porque, quando chegou, quando chegaram e lhe falaram o que estava acontecendo e lhes fez, pois, uma revisão e tal, o médico disse: - Nunca, nos meus vinte anos de... de trabalho como médico vi esta doença. Achei que já estava erradicada. É impossível que no século XX, a [não sei...] no princípio do século XXI, tenham pessoas que possam ter, no mundo ocidental, esta doença. Não posso acreditar. Não posso acreditar. E a verdade é que, claro, estas palavras do médico... deixaram um pouco nervosos estes garotos porque era como... – O que acontece? O que acontece? Temos uma doença rara. O que...? O que acontece? O que acontece? E o médico começou a perguntar: - Bom, vamos ver, vocês que tipo de vida levam? - Bom, não, é que trabalhamos de noite. Trabalhamos numa discoteca. - Ótimo: O que é que vocês

bebem? - Bom... bebemos bastante coca-cola com rum e, claro, batidas e tal. - Bom: e o que comem? - Bom, comemos bastante... bastante... carne, geralmente um dos nossos pratos favoritos é sanduíche, um sanduíche com zorza. - E vocês nunca bebem nada de suco? - Não, na verdade não, só bebemos... claro bebemos muita cubata, na verdade sucos não são... não são a nossa bebida favorita. - Pois olhem, o que vocês têm é escorbuto, início de escorbuto, que é uma... é essa doença que matou os marinheiros (da, do...) dos barcos de Colombo quando viajava pra América ou matava também os presos, nas cadeias, quando estavam é... presos, por exemplo na época de Franco, na ditadura. Mas o incrível é que hoje em dia, no ano dois mil e três vocês tenham princípios de escorbuto... Era só beberem uma batida com suco de... com refrigerante de laranja que teriam suco suficiente e vitaminas suficientes para poder... para que o seu corpo não tivesse esta doença. E foi assim que estes dois garotos passaram de batidas com coca-cola... a beber batidas com refrigerante de limão. 2. Iñaki (Oñati, Euskal Herria) Texto em basco: Kaixo. Ni Iñaki naiz eta Indiako esperientziak kontaukotzuet. Bueno, Indiara aiau ginanian gehixen harrittu oskun gauzia izan zan kontraste haundiko herrialde bat dala. Hau da, pobrienetik aberatsenera izugarrizko diferentzia dau: pobriena oso pobria da eta kalian lo itten daue; eta aberatsenak, berriz, izugarrizko etxetzarra, munduko lujo danak, eta bai-bai, diferentzia oso haundixa zan. Gero, aparte da herrialde bat, baitta, naturalki diferentzia haundixak dakona. Hau da, desiertuak dauz eta sikute askoko lekuak dauz; eta gero, beste batzuk oso umelak dianak. Hau

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da, Himalaya eta zona horreittan euri asko itten omen dau, eta ba oso umelak dia, berde berdiak eta. Oso politta orokorrian India ta. Bueno, beste gauza bat harrittu oskuna baitta izan zan trafiko kontua; hau da, han zorua letxe konduzitten daue; berdin dau paso de zebria egon, semaforua gorri egon. Eurak igual-igual pasau. Bozinia jo, eta aurrera. Hori bai, danak eskuzabal-eskuzabalak eh. Kaletik zoiazen heinian, anda "etorri gure etxera, etorri gure etxera". Gu etxera sartu, ta danak ur baso bat, taka. Eta hori guri hamen esan oskueila eh: ura eskainketan botzue botilakua izateko; ez izateko grifokua, ez ezebe. Itxuria guri horrek kalte itten dosku ta. Bueno, guk hala ta be hartu ta edan. Ba bueno, tripatik kalterik eztu euki, tripako kalterik eztu euki. Ta pozik gauz. Tradução: Olá, sou Iñaki e vou contar as nossas experiências na Índia. Bom, quando chegamos na Índia a primeira coisa que nos impressionou foi que é uma terra de muitos contrastes. Quer dizer, entre o mais pobre e o mais rico há uma diferença muito grande: os pobres são muito pobres e dormem na rua; os ricos, porém, têm uma casa enorme, todos os luxos e, sim, havia grandes diferenças. Depois, além disso, é uma terra com paisagens muito diferentes. Quer dizer, há desertos e espaços muito secos; e depois outros que são muito úmidos. Por exemplo, no Himalaia e naquela região dizem que chove muito, e é muito úmido, bem verde. Em geral a Índia é muito bonita. Bom, outra coisa que nos surpreendeu foi o tema do trânsito; na verdade, dirigem como malucos; tanto faz se tem uma faixa de pedestres, semáforo fechado. Eles passam sempre. Tocam a buzina e seguem. Isso sim, são todos muito generosos, né? Você vai pela rua e “venha na nossa casa, venha na nossa casa”. Nós entrávamos nas casas e todos (trazem) um vaso

de água, taca. E o que nos disseram aqui: ei, se eles oferecem água para vocês, tem de ser mineral; que não seja da torneira, nem nada. Bom, parece que faz mal pra gente. Bom, nós, de toda maneira, bebemos. Mas no fim não nos fez mal. E estamos muito contentes.

3. Clara (Barcelona, Catalunha) Texto em catalão: Al concurs de castells normalment ja la nit abans m'he anat a dormir bastant nerviosa i... pendent de veure com anirà l'endemà perquè és un dia que és molt important, perquè només passa un cop cada dos anys i... així que em llevo ja estic intentant concentrar-me al màxim, no pensar en rés més que fer la feina ben feta, i deixant de banda altres... altres coses que em puguin despistar. Llavors, un cop arribes a plaça, clar, ja... totes les colles mirant-te, ja sents la pressió, és un lloc que abans era una antiga plaça de toros, i que ara van rehabilitar, però clar, tens totes les graderies amb tots els aficionats allà, animant, aplaudint, és... és com una olla a pressió, realment. És com si estiguessis a un camp de futbol, que tothom està pendent de tu. I... de normal, intento no posar-me gaire nerviosa per... quan fem castells, però allà és que és inevitable. I suposo que deu ser que per això que el primer any que hi vaig pujar al folre... ahhh... de tan nerviosa que estava, com que totes les altres colles, i em sembla que n'hi havia potser trenta altres colles més tots els aficionats, i per cada colla potser hi ha com dues-centes persones, doncs... com que tothom estava mirant-me vaig voler pujar molt ràpid i pujant ràpid a la soca em va... vaig... em vaig quedar el peu travat i, vaig quedar de tal manera, que no... va enganxar en el fons amb el peu i vaig caure

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entre mitjans d'altres persones... i no podia aixecar-me i no podia aixecar el cul... i clar, estava totes les... no sé si n'hi ha quinze mil persones, no sé, n'hi ha un munt. Estava tothom esperant-me, que jo aixequés el cul d'allà, fos capaç d'aixecar-me i anés al meu lloc, i... la veritat és que ho vaig passar molt malament. I després, quan finalment va caure el castell, ja era que tot hi havia anat molt malament d'entrada i que no podia... Tradução: No concurso de castells normalmente já na noite anterior me deitei bastante nervosa e... pendente de ver como será o dia amanhã porque é um dia muito importante, porque ele acontece apenas uma vez a cada dois anos e... logo quando acordo já estou tentando me concentrar ao máximo, não pensar em mais nada a não ser fazer o trabalho bem feito, e deixando de fora outras... outras coisas que possam me distrair. Então, quando você chega na praça, claro, já... todas as agrupações estão olhando para você, você já sente a pressão, é um lugar que antes era uma antiga praça de touros, e que agora reformaram, mas é claro, você tem toda a plateia, com todos os torcedores lá, animando, aplaudindo, é... é como uma panela de pressão, realmente. É como se estivesse num campo de futebol, em que todas as pessoas estão atentas a você. E... normalmente, tento não ficar muito nervosa por... quando fazemos castelos, mas lá é inevitável. E acho que deve ser por isso que o primeiro ano que eu subi ao folre... ahhh... de tão nervosa que estava, como que todas as outras agrupações, e acho que tinha perto de trinta outras agrupações além de todos os torcedores, e de cada agrupação talvez tinha duzentas pessoas, então... como todos estavam me olhando eu quis subir muito rápido e subindo rápido na base fiquei... fiquei... com o pé preso e, e fiquei de tal jeito, que não... fiquei presa no fundo com o pé e caí

no meio das outras pessoas... e não podia me erguer e não podia levantar a bunda... e claro, estavam todas as... sei lá, quinze mil pessoas, não sei, havia muita gente mesmo. Estava todo o pessoal esperando que eu levantasse a bunda de lá, fosse capaz de me erguer e fosse para o meu lugar, e... na verdade passei muito mal. E depois, quando finalmente caiu o castelo, era porque nada tinha dado certo desde o início e que não podia... 4. Horacio (La Plata, Argentina) Texto em espanhol da Argentina: Bueno, eh... he estado pensando eso de que quizás lo mejor es... para... para... para... para evaluar una... el estado de desarrollo de una sociedad... eh... yo no me fío mucho de lo que son normalmente los parámetros económicos o las estadísticas o las referencias al consumo, sino más bien, eh... me guío mucho más por... por el estado de felicidad de la gente, no? de... y más que el estado de felicidad, el estado de producción artística que uno encuentra en un lugar determinado y... y a veces hay modelos económicos que pueden dar como que hay una sociedad que teóricamente es mejor, tiene una mayor abundancia, tiene más recursos, tiene un PBI interno industrial más importante, pero uno descubre que es una sociedad absolutamente apática, anodina... y en cambio hay otros lugares del mundo en donde uno, por ejemplo, descubre que... eh... probablemente ese país no figura en determinadas estadísticas económicas, que el producto bruto interno industrial no es tan bueno, pero descubre que en las calles la gente es feliz, que hay una producción artística deslumbrante, que hay mucha gente haciendo cosas: pintadas, arte callejero, exposiciones, eh... grupos de música y, en este sentido, si hay un indicador de la felicidad, para mí ese es uno de los principales; y que normalmente difiere muchísimo con el de las estadísticas de

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los organismos internacionales de... como el fondo monetario y todas esas pamplinas. Tradução: Bom, eh... estive pensando isso de que talvez o melhor é... para avaliar uma... o estado de desenvolvimento de uma sociedade... eh... eu não acredito muito no que são normalmente os parâmetros econômicos ou as estatísticas ou as referências ao consumo, mas, eh... me guio muito mais por... pelo estado de felicidade das pessoas, não é? de... e mais do que o estado de felicidade, o estado de produção artística que a gente encontra num lugar determinado e... e às vezes há modelos econômicos que podem sugerir que há uma sociedade que teoricamente é melhor, tem uma maior abundância, têm mais recursos, têm um PBI interno industrial mais importante, mas a gente descobre que é uma sociedade absolutamente apática, sem graça... e porém há outros lugares do mundo onde a gente, por exemplo, descobre que... eh... provavelmente esse país não figura em determinadas estatísticas econômicas, que... o produto interno bruto não é tão bom, mas descobre que nas ruas as pessoas são felizes, que há uma produção artística deslumbrante, que há muitas pessoas fazendo coisas: grafites, arte de rua, exposições, eh... grupos de música e, neste sentido, se há um indicador da felicidade, para mim esse é um dos principais; e que normalmente difere muito mesmo com o das estatísticas dos organismos oficiais de... como o Fundo Monetário e todas essas tolices. 5. Raul (Belo Horizonte, Brasil) Texto em português do Brasil:

Eeeh... eu pensei em contar uma história que foi a primeira vez que eu fui ver um jogo internacional, no estádio do Mineirão, no estádio onde o meu time, o Cruzeiro, joga. Eu fui com meu pai e alguns amigos dele. Eu devia ter uns treze anos na época. O jogo era uma Recopa, se eu não me engano, uma Recopa Sul-americana e... era um jogo do Cruzeiro, o meu time, e o Vélez Sársfield, da Argentina. Na época o goleiro do Cruzeiro era o Dida, depois veio jogar no Milan, da Itália, e hoje em dia joga no Internacional de Porto Alegre. É... um goleiro conhecido por fazer defesas de pênalti e de... e de falta. E do outro lado tinha o Chilavert, um goleiro conhecido por fazer golos, na verdade, principalmente de bola parada. E... e já no segundo tempo, se eu não me engano, o Cruzeiro cometeu um pênalti e o Chilavert cruzou todo o campo pra cobrar a penalidade e estávamos o amigo do meu pai, o Mário Luso, que é o dono do bar onde meu pai sempre vai, ele estava do meu lado esquerdo, meu pai do meu lado direito. E nesse momento, nessa transição que o Chilavert fez de cruzar o campo para bater a penalidade ele... sentou na arquibancada e começou a rezar pedindo a Deus que o Dida fizesse aquela defesa e que Chilavert não marcasse o golo. Ele... rezava e rezava e rezava. Foi nesse momento que meu pai olhou pra o lado e falou: Raul, não fique assim, porque isso é que é só um jogo, é só futebol, não é nada importante. E... Acabou que Chilavert fez o golo, de pênalti. O Cruzeiro perdeu o jogo e a Recopa, por um a zero do Chilavert. Eu lembro da bola entrando, e a bola batendo na trave, no travessão, e o travessão tremendo. Mas foi a minha primeira experiência com jogo internacional que foi triste, mas foi um grande aprendizado. E eu acho que foi o Nelson Rodrigues, que disse que das coisas desimportantes o futebol é a mais importante, mas continua sendo uma coisa desimportante.

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