Spectrum - Projecto Audio Visual (Versão em Português)

Share Embed


Descrição do Produto

SPECTRUM 2013 - 2014

Projecto Audio Visual desenvolvido durante o segundo ano de Licenciatura no curso de Arte Multimédia - Vertente de Audio Visuais na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa de Alexandre Alagôa

SPECTRUM por Alexandre Eduardo Manta Alagôa dos Santos Claro O seguinte texto corresponde a um registo das principais etapas do processo de desenvolvimento do Projecto Spectrum O Objecto Final pode ser observado em plataformas como o Vimeo: https://vimeo.com/98206643

Sinopse: O seguinte Projecto foi desenvolvido durante o meu segundo ano de Licenciatura no curso de Arte Multimédia - Vertente de AudioVisuais na Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. Contudo, penso que as várias ideias e conceitos inerentes ao trabalho podem ainda continuar a ser explorados, estudados e desenvolvidos através de outros vídeos, elementos audio-visuais ou experiências artísticas. O Objecto AudioVisual Final do Projecto pretende evocar um universo caótico habitado por sombras e espectros que procuram um envolvimento com o olhar do observador até que este fique completamente mergulhado nessa mesma dimensão fantasmagórica. O desenvolvimento do trabalho partiu da noção de Alegoria e transportou-se para uma pequena viagem por alguns conceitos que se correlacionam entre si e que são inerentes a um grande tema principal - a Imagem - e que vão desde: a Sombra; a questão da relação Ausência/Presença; a ideia do Vestígio (Indice) e das Transparências, Espectros e/ou Fantasmas; o Espelho, a Tela ou a Parede como Ecrãs, como criadores de um mundo virtual; a Projecção e o Reflexo como Dualidade; a ideia da Máscara como Barreira e Escondimento de um Corpo; entre outros. Palavras-Chave: Sombra, Ausência/Presença, Projecção/Reflexão, Ecrã. NOTA: Os links inseridos ao longo do texto são interactivos, basta clicar em qualquer um e será aberta uma janela no browser que levará ao respectivo vídeo.

Primeira Fase O Projecto teve início com a ideia de explorar o tema da Alegoria... A primeira fase de trabalho incidiu sobre uma tentativa de compreender o significado do próprio termo Alegoria: qual a sua definição, quais os exemplos de algumas obras Alegóricas que poderia ler/ver, e que questões ou ideias estas leituras iriam desencadear... A pesquisa iniciou-se com a leitura da definição de Alegoria no Dicionário de Termos Literários de Carlos Ceia, no qual o conceito é definido como uma representação de certas ideias ou significados que, numa maneira abstracta e através de uma série de figuras, personagens, pessoas, animais e/ou eventos de uma determinada narrativa literária (com um limite indefinido) ou pictorial/visual (pintura, vídeo, fotografia), tem um significado duplo ou figurado que vai para lá do seu sentido literal. De certa forma, Alegoria significa “dizer outro” ou “dizer alguma coisa diferente” e substitui um termo mais antigo - hyponoia (que quer dizer “significação oculta”) - que era utilizado na interpretação dos mitos de Homero como uma personificação de princípios morais. Existe sempre uma relação entre a narrativa e o seu exterior, a Alegoria tenta identificar um significado profundo de carácter moral, como por exemplo a obra portuguesa do Sermão aos Peixes do Padre António Vieira. Ainda no Dicionário de Termos Literários, é referido que a Alegoria se diferencia da linguagem e significação metafóricas e afasta-se da plurissignificação e da ambiguidade, ou seja, a narrativa Alegórica não deve desenvolver múltiplas interpretações ou significados do seu sentido abstracto pois daria origem a uma perda de coerência entre o sentido literal e o sentido moral. Desta forma a Alegoria tenta encaminhar o leitor/observador para uma conclusão e nunca o tenta desviar da sua compreensão. Assim como o corpo é considerado como um vaso (e por vezes como um disfarce) para a alma, podemos por exemplo dizer que a parte literária de uma história ou narrativa pertencem à fisicalidade ou aparência da Alegoria, enquanto que a parte moral diz respeito ao seu espírito, à essência da obra - a alma. Após a leitura e a tentativa de compreensão (apesar de achar que ainda deverei compreender várias coisas) da definição de Alegoria, encaminhei-me para a Alegoria da Caverna de Platão e mais tarde para a Divina Comédia de Dante. Na Alegoria da Caverna há como uma exploração da condição do ser humano como um prisioneiro de hábitos, práticas e costumes adquiridos desde a infância que criam uma determinada percepção de ver mundo de uma forma limitada e distorcida. O texto trata

vários prisioneiros que se encontram na escuridão de uma Caverna, num estado de total inconsciência e alucinação causado pela projecção de sombras numa parede que se encontra em frente dos seus olhares, sendo essas sombras provocadas pelo mundo exterior - através da relação entre a luz e o movimento de objectos (humanos, animais, etc...) no exterior da gruta. A um certo momento, um dos prisioneiros liberta-se da gruta e é confrontado com o mundo que não fazia ideia ser o real. Aqui comecei a notar que existe uma forte relação de oposições e contrastes nesta ideia de “Tornar Livre”. Este Processo de Libertação é tratado no texto como extremamente doloroso, tanto internamente (psicologicamente) como exteriormente (fisicamente). Psicologicamente existe a força do hábito, da familiaridade e dos costumes de um mundo que é conhecido pelo prisioneiro e considerado como o mesmo como o real - o mundo das sombras, das projecções, dos espectros, dos fantasmas. Este mundo de escuridão entra em conflito com a curiosidade e o conhecimento implícito no desejo, na vontade, determinação e curiosidade em entrar e experienciar este novo mundo (o mundo real) desconhecido para o priosioneiro que se encontra num completo estado de angústia e ignorância, sem sequer se conhecer a si mesmo(a) ou o que é ser Ser, ele (ela) é apenas um Outro. Fisicamente o prisioneiro precisa de habituar o olhar a um novo brilho, a uma nova luminosidade e percepção das coisas através de um processo completamente inverso ao que um humano livre faria; enquanto o humano livre partiria de uma observação primeiramente do objecto e só depois da sombra que ele projecta, o prisioneiro quando tivesse o primeiro contacto com o mundo real olharia inicialmente para as sombras e imagens (pois era a única coisa que conhecia) e só depois para o objecto em si, e só no fim olharia para o próprio Sol (como é referido no texto). É então esta fusão de pólos (Conhecimento/Desconhecimento, Libertação/Aprisionamento, Luz/Escuridão, Dor/ Prazer) que transforma a ideia de Tornar Livre num processo de adaptação à realidade extremamente difícil e de certa forma trágico. É importante salientar a parte final do texto na qual é referido que o prisioneiro, após conhecer e experienciar o mundo real exterior, deve voltar à escuridão e revelar a todos os outros prisioneiros a ignorância em que têm vivido, guiando-os então pelo mesmo processo, mesmo que resulte na sua morte... Embora o principal ensinamento na Caverna de Platão seja que o caminho para alcançar a verdade e a liberdade, embora doloroso e difícil, deva ser perseguido, o filósofo recorre à Sombra e à Luz, às Projecções e Reflexões, à Parede como um Ecrã, à Imagem e portanto ao universo do Visual, revelando então o impacto que o Olhar e a Imagem têm na nossa percepção do mundo, do saber, da história, o impacto na nossa condição humana.

Penso que isto poderá ser um exemplo de uma alucinação transformada em ilusão. Na actualidade, esta experiência ilusória das Sombras na Parede foi transportada para a Tela com a Pintura, e para o Ecrã com o Cinema, a Televisão e o Computador. E aqui comecei então a encontrar alguns dos diferentes conceitos que poderiam ser explorados e trabalhados ao longo do Projecto. A ideia de vários seres humanos (espectadores / observadores) a olharem fixamente para uma Parede (Ecrã) com Sombras (Imagens) em movimento lembrou-me inevitavelmente das salas de Cinema. A relação entre um Corpo que observa (olha) e um Corpo que é observado, projecções e reflexos, ou a relação entre um Corpo e o seu Duplo como numa Projecção num Espelho (outro Ecrã). Apesar de descobrir estas várias ideias, tornou-se interessante verificar que na Caverna de Platão os Prisioneiros encontram-se tão imersos (ou submersos, absorvidos) no acto de olhar (de contemplação) para as Sombras, que se colocavam a si próprios num estado de completa alucinação, confundindo a Realidade com a sua Representação (Imagem - Projecção/Reflexão), enquanto que no caso do Cinema ou do encarar o Espelho estamos completamente cientes do que é realidade e imagem, o que nos fascina é exactamente essa consciência em deixarmo-nos “enganar” pela miragem, por esse mundo das aparências, dos simulacros, o que desencadeia então uma ilusão e até um fingimento (penso eu) - a tentativa de ser O Outro e não O Mesmo, de certa forma, simular uma saída de um corpo para habitar outro (não sei se faz sentido): esse corpo no espelho, do outro mundo, do mundo das sombras, das fantasias, dos espectros... Com a Alegoria da Caverna de Platão comecei então a encontrar as problemáticas iniciais do meu trabalho. Encontrei a ideia da Dualidade no prisioneiro, a ideia de dois mundos opostos, um mundo de Escondimento e um mundo de Revelação; as Sombras na Parede; a Parede, a Tela ou o Ecrã como uma Janela ou até mesmo uma Porta para outro mundo; Projecções, Reflexões, Espelhos; entre outras... Todas estas questões revelam algo em comum, todas pertencem à estrutura básica de um elemento - a IMAGEM. Após explorar a Caverna, caminhei para o Inferno ao ler algumas partes da obra Divina Comédia de Dante. Penso que foi um pouco difícil para mim, a obra parece bastante complexa e profunda, quase como fosse preciso um dicionário para compreender todas as figuras da história e da mitologia que o autor refere e evoca ao longo da sua jornada. Todos os pecados que são apresentados por Virgilio ao longo dos nove círculos do Inferno, toda esta dimensão caótica da natureza humana (que me fascina) começou a lembrar-me de algumas das obras de Hieronymus Bosch como por exemplo o Jardim das Delícias, o Juízo Final e As Tentações de Santo Antão, que demonstram uma

contemplação de um Caos total e de uma dimensão de pecado e excentricidade humana.

Hieronymus Bosch (c.1450 – 1516) Jardim da Delicias | The Garden of Earthly Delights (1504) Óleo sobre Madeira – 220 x 389 cm

Hieronymus Bosch (c.1450 – 1516) Juizo Final | Final Judgement (c. 1482) Óleo sobre Madeira – 99,2 x 60,5 cm (painel central) | 99,5 x 28,7 cm (paineis laterais)

Hieronymus Bosch (c.1450 – 1516) Triptico das Tentações de Santo Antão | Temptation of St. Anthony (c. 1500) Óleo sobre Madeira – 131,5 x 119 cm (painel central) | 131,5 x 53 cm (paineis laterais)

Estas foram então algumas das obras visuais e literárias que me inspiraram e ajudaram na exploração de várias ideias como a Máscara, a necessidade para um Escondimento, o “não ser visto”, a criação de uma Barreira através de elementos como o Gorro ou os Visores Negros (“censored” - esta ideia que acabou por não ser explorada), que esconda uma certa Imagem, uma revelação, um olhar, uma cara, mas ao mesmo tempo uma Dualidade que resultasse desse mesmo Escondimento, o ser um Duplo, um Outro do Mesmo, um Clone... Aqui deu-se o início das experiências em vídeo. De seguida serão mostradas imagens que pertencem a momentos dos cinco pequenos ensaios em vídeo que fiz com o objectivo de explorar estas várias questões que referi. As primeiras duas imagens pertencem a um mesmo vídeo no qual tento experimentar a Dualidade e Escondimento através da Clonagem e do Gorro Negro que serve de Máscara. Nos quatro vídeos seguintes testo as mesmas ideias com o Espelho através do Reflexo e da ausência deste, no último vídeo o Gorro é substituído pelo Lençol.

Espectro e Dualidade (1ª Experiência) Outubro / Novembro 2013. Vídeo - 41 segundos Esta experiência pode ser vista no seguinte link: https://vimeo.com/82722818

Escondimento, Projecção, Reflexão e Clones Novembro 2013 3 Videos - 1 minuto e 7 segundos no total Link: https://vimeo.com/87815961

Espelho (Ecrã, Escondimento, Reflexão, Projecção) (Experiências) Janeiro 2014 | Vídeo - 34 segundos Link: https://vimeo.com/87664995

Após pesquisar e trabalhar nestes vários conceitos e experiências em vídeo, começaram a surgir e a ser discutidas outras ideias, como por exemplo a dimensão (ideia/problemática [por vezes é difícil arranjar a palavra certa]) da Sombra ou do Reflexo, mas agora numa tentativa de os conjugar [e parte do meu projecto/trabalho/ pesquisa tenta fundir ou combinar diferentes conceitos e noções inerentes à essência da Imagem]. Foram trabalhadas algumas ideias como colocar alguém ou alguma coisa a sair do Espelho, da Tela ou da própria Pintura, com o propósito desse corpo poder experienciar dois Universos, o da Imagem e o Real. A investigação continuou com a leitura de algumas partes do livro Uma Breve História da Sombra de Victor Stoichita, ainda com a visualização do filme Poltergeist, com obras como La Reproduction Interdite e Les Amants de Magritte, e Escapando à Crítica de Pere Borel del Caso, com a finalidade de compreender melhor as diferentes ideias e questões que o Projecto explora... Comecei então por ler algumas partes do livro Uma Breve História da Sombra no qual o autor explora a importância da Sombra desde as origens da Imagem. Primeiramente, o autor discute a Imagem como parte da relação Ausência/Presença, a Ausência de um corpo e a Presença da sua projecção. Stoichita menciona a obra História Natural de Plínio, o Velho, na qual se explora as raízes da pintura através da história mítica de uma rapariga que desenha o contorno da sombra do seu amante, a história é representada por vários artistas com o nome de Dibutades ou A Origem da Pintura, e trata a Imagem como tendo uma origem não na observação do ser humano mas sim na captura da sua projecção. A Imagem é procurada na interrupção da relação entre dois corpos, sendo que a captura da projecção da sombra funciona como um substituto na ausência do corpo a que pertence, com uma intenção de o tornar presente, de fazer um momento durar no tempo, de o tornar eterno, de tornar um corpo imortal e ao mesmo criar um Outro, esse outro que é um Duplo, um Espectro... Algumas outras ideias foram exploradas como o espelho como identificação com o Eu e a Sombra como identificação com o Outro, assim como a ligação da sombra com alma e com uma interioridade obscura ou dupla. O filme Poltergeist mostra o terror e a força demoníaca que sai da televisão e absorve uma rapariga, o Ecrã funciona como uma espécie de portal entre dois mundos distintos, como também é visto na Caverna de Platão - a Parede torna-se um mundo de Imagens, de sombras e ilusões, um mundo obscuro de certa forma... Na Pintura esse mundo torna-se a Tela.

Poltergeist Filme de Tobie Hooper EUA: Metro-Goldwyn-Mayer (MGM) | 1982

Jean-Baptiste Regnault (1754 – 1829) Dibutade Desenhando o perfil do seu Amado ou A Origem da Pintura (1786) Óleo sobre Tela

René Magritte (1898 – 1967) La Reproduction Interdite (1937) Óleo sobre Tela | 81,3 x 65 cm

Pere Borrell del Caso (1835 – 1910) Escapando à Critica (1874) Óleo sobre Tela | 76 x 63 cm

René Magritte (1898 – 1967) Les Amants I (1928) Óleo sobre Tela | 54 x 73 cm

René Magritte (1898 – 1967) Les Amants II (1928) Óleo sobre Tela

Com estas novas referências comecei de novo a experimentar novas ideias que podem ser observadas em três videos. Agora é introduzido o elemento da Tela (ou do Quadro) como um portal entre os tais dois Universos - o da Imagem e o Real. Ha uma continuação do uso do lençol como um Escondimento e ainda apresentada a ideia de Transparência. Com os primeiros dois vídeos (Tela I / Tela II) tento explorar o acto de “trespassar o espelho” (neste caso a Tela) que não estava presente anteriormente. Contudo estas experiências estavam ainda demasiado ilustrativas, sendo que me foquei então no terceiro vídeo (Ausência e Presença), que se difere dos outros dois. Nesta última experiência recorri ao uso de uma cadeira como um dos elementos mais próximos à figura (ou forma) humana numa pose sentada; usei também o lençol para esconder tanto o rosto como o corpo da figura transparente que se encontra suspensa no ar, como um espectro ou um fantasma. Nesta última experiência tive algumas dificuldades técnicas, tanto na gravação como edição, devido à sombra que se encontra na parte esquerda do vídeo, sendo que esta experiência foi regravada e retrabalhada de modo a corrigir este erro, a versão melhorada é apresentada aqui com o título Ausência e Presença (2ª Versão).

Tela I 15 Dezembro 2013 Vídeo - 1 minuto e 36 segundos

Tela II 15 Dezembro 2013 Vídeo - 1 minuto e 36 segundos

Ausência e Presença (1ª Versão) 11 Dezembro 2013 Vídeo - 48 segundos

Ausência e Presença (2ª Versão) | Março 2014 | Vídeo - 1 minuto e 49 segundos Link: https://vimeo.com/90132719

Com estas experiências e testes comecei então a focar-me numa tentativa de criar uma fusão entre os vários elementos como a Tela, o Lençol, o acto de ir para lá (para o outro lado da tela), as Transparências, o Escondimento, as Sombras. O último vídeo que gravei nesta primeira fase (ou primeira metade) do Projecto foi outra tentativa em combinar as múltiplas questões exploradas durante este processo de investigação:

Moldura | Janneiro 2014 | Vídeo - 5 minutos and 19 segundos Link: https://vimeo.com/87668650

Segunda Fase Algumas das primeiras experiências que criei nesta Segunda Parte do Projecto incidem sobre figuras sem identidade (espectros) a expirarem fumo:

Fumo (Transparência) | Fim de Janeiro 2014 | Vídeo - 40 segundos Link: https://vimeo.com/87672569

Houve aqui um certo recúo porque voltei ao uso do gorro como uma máscara, escondimento ou barreira, porém houve também algum progresso pois surge o fumo como uma transparência, algo sem forma e impossível de agarrar, algo que desvanece. Esta questão do fumo (ou da nuvem) pareceu-me interessante e penso que poderá estar muito ligada à Imagem visto ser algo que existe como um vestígio e que remete para uma das ideias principais do Projecto, a questão de Ausência/Presença. Dentro desta noção da Imagem como um vestígio surge então a Fotografia que nos transporta para a ideia do espectro e do fantasma. Alguns artistas como por exemplo Francesca Woodman (Space - Providence, Rhode Island - 1975-8) e Duane Michals (The Spirit Leaves the Body - 1968), assim como a obra literária On Photography de Susan Sontag foram algumas das referências que me ajudaram a encontrar o próximo passo e sentido no Projecto. Susan Sontag em On Photography faz uma comparação entre a Fotografia e a Sombra, ao referir que a fotografia é apenas uma mera Imagem da realidade e que pode muitas vezes ser enganadora caso nao haja qualquer explicação a acompanhá-la, assim como acontece na Caverna de Platão, a Sombra projectada pelos objectos reais transmite aos prisioneiros uma falsa noção da realidade, neste sentido o objecto e a sua imagem são completamente diferentes e enganadores um do outro. Com este exemplo a autora menciona que há uma têndencia para tratar a Fotografia como uma Janela para entender e conhecer o mundo, o ser humano recorre à Imagem como tentativa de organizar e reconstruir o que está à sua volta.

Duane Michals | The Spirit Leaves the Body | 1968

2 Francesca Woodman | Space | Providence, Rhode Island | 1975-8

Francesca Woodman | Untitled | Providence, Rhode Island | 1976

Francesca Woodman | Angel Series | Roma, Itália | 1977

Francesca Woodman | Sem Título | Roma, Itália | 1977-8

Tendo como referência algumas partes do livro de Susan Sontag e algumas obras fotográficas de Francesca Woodman e Duane Michaels, começou por ser explorada a ideia de colocar uma pessoa (um corpo sem identidade) fora do plano. Até aqui, em todas as experiências que tinha realizado, uma pessoa (sem identidade) era colocada em plano escondidada ou com uma máscara (gorro ou lençol), confrontado-se com o seu reflexo no espelho, com o duplo de si mesmo ou trespassando uma moldura. Agora substitui-se a moldura e o espelho e em vez de haver um lençol a envolver ou a apriosionar um corpo, ele é colocado estendido na vertical criando uma espécie de ecrã/barreira/janela onde habitam os reflexos e projecções do tal corpo. Ou seja, a pessoa está agora ausente do plano apesar do corpo (ou talvez melhor dizendo projecção do corpo) continuar presente, dá-se lugar aos espectros e aos fantasmas, às transparências e às sombras. Estas experiências com o lençol como uma espécie de Ecrã marcaram o início do processo até ao objecto final. Após estes primeiros testes em vídeo, procurou-se estabalecer uma relação da Imagem com a descida ao Inferno de Dante, tentei então conjugar diferentes vídeos de modo a criar um ambiente mais caótico entre as sombras e as transparências:

Experiências com um Lençol, Número 2 | Março 2014 | Vídeo - 3 minutos e 10 segundos Link: https://vimeo.com/90490885

Experiencias com um Lençol (Preto e Branco) | Número | 7 Março 2014 | Vídeo - 3 minutos e 10 segundos | Link: https://vimeo.com/90585767

Contudo este conjunto de testes e ensaios em video não resultou muito bem, os movimentos eram ainda um pouco previsíveis e a dimensão caótica não estava muito presente. Precisava de encontrar uma sequência não-linear onde o observador não conseguisse antecipar os movimentos daqueles fantasmas, era preciso que o observador se encontra-se imerso e absorvido naquele oceano de sombras.. Decidi então criar apenas uma sequência e sobrepô-la múltiplas vezes:

Lençol e Ecrã | Experiência Numero 3 (19-05-14) | 19 Maio 2014 | Vídeo - 4 minutos Sequência Final: https://vimeo.com/96700428

Esta nova sequência marcou o resultado final do Projecto no que diz respeito à parte visual. Sendo que agora precisava de procurar um som que, juntamente com a Imagem, permiti-se que o espectador ficasse imerso naquele caos infernal de sombras e de espectros, um som que conseguisse puxar o observador lá para dentro, para aquele mundo de fantasmas, que o absorve-se. Depois de mostrar este vídeo final a alguns amigos e pedir uma opinião relativamente ao som, muitos comentaram uma dimensão macabra (ou obscura) e reparei que havia sempre em comum a sugestão do sussurro ou murmúrio e do grito. Reparei que se centravam muito no esforço da voz do corpo e que os dois elementos se contrastam entre si - sussurro: pouco esforço da voz / grito: elevado esforço da voz. A relação entre os dois pareceu-me interessante e foi então aqui que encontrei o som que poderia inserir no meu Projecto: a Respiração. Respirar é um elemento essencial ao Corpo, é o que o anima, o que lhe dá vida! A minha primeira experiência com som focou-se numa respiração constante que aumentava progressivamente de volume ao longo do vídeo. Contudo esta experiência ainda não permitia uma imersão do observador, a certo ponto desviava-o da Imagem para se concentrar apenas no som. Decidi melhorar este aspecto ao experimentar criar um ínicio com o volume muito baixo, quase mesmo como um sussurro, à medida que a Imagem vai surgindo o som acompanha alguns impactos da boca ou da mão no lençol (nesta película) e os movimentos fantasmagóricos daquele corpo espectral. Com esta última experiência de som que fiz, penso que som e a Imagem já deixam de se confrontar e passam a envolver-se um no outro, permitindo ao observador mergulhar naquele ecrã caótico de sombras...

Spectrum | Vídeo Final. Frame da Sequência Final - minuto 0:52. Total: 4 minutos Vários momentos da Sequência Final. Objecto Final: https://vimeo.com/98206643

Spectrum | Vídeo Final. Frame da Sequência Final - minuto 2:15. Total: 4 minutos

Spectrum | Vídeo Final. Frame da Sequência Final - minuto 2:30. Total: 4 minutos

Spectrum | Vídeo Final. Frame da Sequência Final - minuto 3:10. Total: 4 minutos

SPECTRUM 2013 - 2014

Projecto Audio Visual de Alexandre Alagôa Breve Resumo do Processo de Trabalho Criado e desenvolvido durante a segunda metade de 2013 e o ínicio de 2014, ao longo do segundo ano no curso de Arte Multimédia - Vertente de Audio Visuais da Faculdade de Belas Artes da Universidade de Lisboa. Obrigado!

Referências ALIGHIERI, Dante, A Divina Comédia. Alfragide: Ediclube, 1996. ISBN 84-4080025-8 CEIA, Carlos, «Alegoria» in Dicionário de Termos Literários. [Consultado 201310-31].

Disponível

em

HOOPER, Tobe, Poltergeist. EUA: Metro-Goldwyn-Mayer (MGM), 1982. Filme [114 min.] MEDEIROS, Margarida, Fotografia e Verdade: Uma História de Fantasmas. Lisboa: Assírio & Alvim, 2010. ISBN: 978-972-37-1561-3 MOISÉS, Massaud, «Alegoria» in Dicionário de Termos Literários. São Paulo: Cultrix, 2004. ISBN 85-316-0130-4 Platão, A República. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1983. SONTAG, Susan, On Photography. Nova Iorque: RosettaBooksLLC, 2005. ISBN 0-7953-2699-8 STOICHITA, Victor, A Short History Of The Shadow. Londres: Reaktion Books, 1997. ISBN 1-86-189-000-1

Lihat lebih banyak...

Comentários

Copyright © 2017 DADOSPDF Inc.